ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana...

56
A Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa é uma revista editorialmente independente, propriedade da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia (FSPOG). A revista publica trabalhos científicos originais avaliados por revisores, em todas as àreas relacionadas com a Ginecologia e Obstetrícia. O objectivo principal da revista é a promoção e divulgação da investigação científica nestas àreas, sobretudo entre os médicos da Especialidade. Outro objectivo é a divulgação da investigação científica realizada em Portugal em meios internacionais de grande impacto. É uma revista bilingue que aceita artigos escritos em inglês ou em português, sendo sempre necessário a inclusão de um Título e um Sumário em inglês. As submissões de artigos devem ser feitas on-line no site: www.aogp.com.pt A revista é publicada trimestralmente, sendo enviada gratuitamente a todos os Especialistas e Internos Complementares de Ginecologia e Obstetrícia, inscritos na FSPOG. Os pedidos adicionais de subscrição devem ser dirigidos à Empresa Editora. A publicidade inserida na revista é da responsabilidade única da Empresa Editora. Todos as solicitações para inclusão de publicidade devem ser dirigidos a: Momento Médico, Praça de Alvalade 9, 3º B, 1700-037 Lisboa; Tel: 217828060; Fax: 217828069; e-mail: [email protected]. Os direitos de autor dos artigos publicados nesta revista são automaticamente transferidos dos autores para a FSPOG na altura da aceitação para publicação. É da responsabilidade dos autores informar os editores, na altura da submissão, de quaisquer impedimentos existentes para esta transferência destes direitos, bem como de conflitos de interesse existentes, relativos à investigação realizada e à publicação do artigo. É expressamente proibida a reprodução ou fotocópia de parte ou totalidade desta revista para distribuição, sem permissão da FSPOG. A cópia da revista é apenas permitida para uso interno e pessoal. Indexada em Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa is an editorially independent publication, property of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology (FSPOG)). The journal publishes original, peer reviewed, scientific work in all areas related to Obstetrics and Gynecology. The main aim of the journal is the promotion and disemination of scientific research in these areas, predominantely between clinicians in the speciality. Another aim of the journal is the international dissemination at high impact levels of scientific research carried out in Portugal. It is a bilingual journal, accepting articles written either in English or in Portuguese, but in all cases needing the inclusion of a Title and an Abstract in English. Article submission should be made on-line at the site: www.aogp.com.pt The journal is published every three months and send free of charge to all Specialists and Residents in Obstetrics and Gynecology registered at the FSPOG. Addicional subscription orders should be directed to the Publisher. Advertisments included in the journal are the sole responsibility of the Publisher. All advertisement booking should be addressed to: Momento Médico, Praça de Alvalade 9, 3º B, 1700-037 Lisboa; Tel: +351217828060; Fax: +351217828069; e-mail: [email protected]. Copyright of articles published in this journal is automatically transferred from the authors to the FSPOG at the time of acceptance for publication. It is the responsibility of authors to inform the editors, at the time of submission, of any circunstance affecting this transfer of copyright, as well as to disclose any existing conflicts of interest regarding the conducted research and publication of the article. Reproduction and photocopying of the whole or part of this journal for general distribution without permission of the FSPOG is expressily forbidden. Copying of the journal is allowed for strictly internal and personal use. ISSN 1646-5830 Depósito Legal nº 257465/07 ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA Órgão oficial da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia Official journal of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology Director CARLOS FREIRE DE OLIVEIRA Editor-Chefe/Editor in Chief DIOGO AYRES-DE-CAMPOS Corpo Editorial/Editorial Board JOÃO BERNARDES CARLOS CALHAZ-JORGE NUNO CLODE ANA ROSA COSTA ALEXANDRA MATIAS FERNANDO MOTA JOSÉ ALBERTO MOUTINHO JOSÉ MARIA MOUTINHO PAULO MOURA FILOMENA NUNES CARLA RAMALHO ISABEL TORGAL Editor de Produção/Production Editor Editora/Publisher MARILDA SANTANA MOMENTO MÉDICO, LDA Administração/Administration PAULO LEITE Conselho Científico: Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves, João Dória, Luís Mendes da Graça, Carlos Marques, José Martinez de Oliveira, Teresa Mascarenhas, Nuno Montenegro, Daniel Pereira da Silva, Carlos Plancha, David Rebelo, João Luís Silva Carvalho, Mário Sousa, José Vicente Pinto SOCIEDADE PORTUGUESA DA CONTRACEPÇÃO

Transcript of ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana...

Page 1: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

A Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa é uma revista editorialmente independente, propriedade da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia (FSPOG). A revista publica trabalhos científicos originais avaliados por revisores, em todas as àreas relacionadas com a Ginecologia e Obstetrícia. O objectivo principal da revista é a promoção e divulgação da investigação científica nestas àreas, sobretudo entre os médicos da Especialidade. Outro objectivo é a divulgação da investigação científica realizada em Portugal em meios internacionais de grande impacto. É uma revista bilingue que aceita artigos escritos em inglês ou em português, sendo sempre necessário a inclusão de um Título e um Sumário em inglês.

As submissões de artigos devem ser feitas on-line no site: www.aogp.com.pt

A revista é publicada trimestralmente, sendo enviada gratuitamente a todos os Especialistas e Internos Complementares de Ginecologia e Obstetrícia, inscritos na FSPOG. Os pedidos adicionais de subscrição devem ser dirigidos à Empresa Editora.A publicidade inserida na revista é da responsabilidade única da Empresa Editora. Todos as solicitações para inclusão de publicidade devem ser dirigidos a: Momento Médico, Praça de Alvalade 9, 3º B, 1700-037 Lisboa; Tel: 217828060; Fax: 217828069; e-mail: [email protected].

Os direitos de autor dos artigos publicados nesta revista são automaticamente transferidos dos autores para a FSPOG na altura da aceitação para publicação. É da responsabilidade dos autores informar os editores, na altura da submissão, de quaisquer impedimentos existentes para esta transferência destes direitos, bem como de conflitos de interesse existentes, relativos à investigação realizada e à publicação do artigo.

É expressamente proibida a reprodução ou fotocópia de parte ou totalidade desta revista para distribuição, sem permissão da FSPOG. A cópia da revista é apenas permitida para uso interno e pessoal.

Indexada em

Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa is an editorially independent publication, property of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology (FSPOG)). The journal publishes original, peer reviewed, scientific work in all areas related to Obstetrics and Gynecology. The main aim of the journal is the promotion and disemination of scientific research in these areas, predominantely between clinicians in the speciality. Another aim of the journal is the international dissemination at high impact levels of scientific research carried out in Portugal. It is a bilingual journal, accepting articles written either in English or in Portuguese, but in all cases needing the inclusion of a Title and an Abstract in English.

Article submission should be made on-line at the site: www.aogp.com.pt

The journal is published every three months and send free of charge to all Specialists and Residents in Obstetrics and Gynecology registered at the FSPOG. Addicional subscription orders should be directed to the Publisher.

Advertisments included in the journal are the sole responsibility of the Publisher. All advertisement booking should be addressed to: Momento Médico, Praça de Alvalade 9, 3º B, 1700-037 Lisboa; Tel: +351217828060; Fax: +351217828069; e-mail: [email protected].

Copyright of articles published in this journal is automatically transferred from the authors to the FSPOG at the time of acceptance for publication. It is the responsibility of authors to inform the editors, at the time of submission, of any circunstance affecting this transfer of copyright, as well as to disclose any existing conflicts of interest regarding the conducted research and publication of the article.

Reproduction and photocopying of the whole or part of this journal for general distribution without permission of the FSPOG is expressily forbidden. Copying of the journal is allowed for strictly internal and personal use.

ISSN 1646-5830

Depósito Legal nº 257465/07

ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESAÓrgão oficial da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia

Official journal of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology

DirectorCARLOS FREIRE DE OLIVEIRA

Editor-Chefe/Editor in ChiefDIOGO AYRES-DE-CAMPOS

Corpo Editorial/Editorial Board JOÃO BERNARDES CARLOS CALHAZ-JORGE NUNO CLODE ANA ROSA COSTA ALEXANDRA MATIAS FERNANDO MOTA JOSÉ ALBERTO MOUTINHO JOSÉ MARIA MOUTINHO PAULO MOURA FILOMENA NUNES

CARLA RAMALHO ISABEL TORGAL

Editor de Produção/Production Editor Editora/Publisher MARILDA SANTANA MOMENTO MÉDICO, LDA

Administração/AdministrationPAULO LEITE

Conselho Científico: Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves, João Dória, Luís Mendes da Graça, Carlos Marques, José Martinez de Oliveira, Teresa Mascarenhas, Nuno Montenegro, Daniel Pereira da Silva, Carlos Plancha, David Rebelo, João Luís Silva Carvalho, Mário Sousa, José Vicente Pinto

SOCIEDADE PORTUGUESA DA CONTRACEPÇÃO

Page 2: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

Capa

Vol. 5 Nº 3 Julho/Setembro 2011

Page 3: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

Editorial

Qualidade da evidência e robustez das recomendaçõesQuality of evidence and strength of recommendationsCarlos Calhaz-Jorge . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107

Artigos de Revisão/Review ArticlesDermatoses específicas da gravidezSpecific skin diseases associated with pregnancyErmelindo Tavares, Elicha Fernandes, César Martins . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122

Factores de risco pré-natais e esquizofreniaPrenatal risk factors and schizophreniaAna Eduarda Ribeiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132

Tratamento actual da osteoporose pós-menopausicaCurrent treatment of post-menopausal osteoporosisHelena Canhão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137

SUMÁRIO/SUMMARYVol. 5 Nº 3 Julho/Setembro 2011

Desfecho obstétrico na placenta préviaPregnancy outcome for women with placenta previaAna Maria Coelho, Luciana Patrício, Nuno Clode, Luis Mendes-da-Graça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109

Carcinoma primário das trompas de Falópio — revisão clínico-patológica de 10 casosPrimary fallopian tube carcinoma - clinicopathological review of 10 casesMárcia Rodrigues, Adriana Cruz, Eugénia Cruz, Rita Sousa, Daniel Pereira-da-Silva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114

Artigos Originais/Original Articles

Casos Clínicos/Case ReportsTumor filoide borderline da mama com metastização para o couro cabeludo – caso clínicoBorderline phyllode tumour of the breast metastatic to the scalp - a case reportCarlos Garrudo Rodrigues, José Fiel, Madalena Nogueira, José Teixeira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143

Lipoleiomioma uterinoUterine lipoleiomyomaCatia Carnide, Joana Raposo, Carla Rodrigues, Fernanda Geraldes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148

Lesão aórtica durante a salpingectomia laparoscópicaAortic injury during laparoscopic salpingectomyPaulo Gonçalves Dias, Pedro Paz Dias, Sérgio Manuel Sampaio, Augusto Rocha Silva, Roberto Roncon Albuquerque . . . 153

Page 4: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,
Page 5: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

107

EDITORIAL

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):107-108

Em cada caso clínico concreto, a ponderação das variáveis em presença que precede a tomada de de-cisões terapêuticas constitui um complexo cálculo de probabilidades. A correcção deste difícil exercício, cuja importância é supérfluo realçar, tem como ele-mentos basilares o saber individual e a experiência acumulada por quem o efectua. No entanto, a enorme soma de conhecimentos actuais e a frequência reduzi-da de algumas situações, torna muito difícil que cada clínico domine, em cada momento, todas as áreas da sua especialidade, mesmo com recurso a leitura siste-mática das insubstituíveis publicações médicas.

Nas últimas décadas tem-se acentuado um movi-mento para a elaboração de recomendações quer de orientação e/ou diagnóstico quer de opções terapêuti-cas, que possibilitam a cada clínico encontrar apoio, muitas vezes online, perante situações que lhes dei-xam dúvidas.

Mas, que credibilidade possuem essas recomenda-ções? Até aos anos 80 do século passado, o habitual era pedir a um perito que procedesse a uma revisão da literatura e integrando a sua experiência, produzisse um texto que passava a ser considerado a orientação mais adequada na área em análise. Surgiu depois a fi-losofia da Medicina Baseada na Evidência, em grande parte resultante da valorização generalizada dos con-ceitos subjacentes aos ensaios clínicos aleatorizados, obedecendo a normas de estruturação que tornavam mais sólidos os seus resultados. Daí resultaram, so-bretudo com o impulso de concepções originárias das comunidades médicas do Reino Unido, Estados Unidos, países do norte da Europa e Austrália, no-vos paradigmas de recomendações a que, de acordo com a qualidade da evidência em que se baseiam, são

atribuídos graus diferentes de robustez. O exemplo porventura mais difundido na nossa especialidade é o conjunto de normas oriundas do National Institute of Clinical Excelence inglês mas várias outras estão disponíveis.

É evidente que, por um lado, nem todas as reco-mendações se baseiam em evidências suficientemen-te fortes. Isso fica bem patente na ainda muito elevada proporção de recomendações com a sigla GPP (Good Practice Point, reflectindo apenas a opinião consen-sual do grupo de peritos) aplicada a circunstâncias/situações em que não há estudos que originem níveis de evidência suficiente para atribuição de graus mais elevados de robustez à recomendação. Por outro lado, é preciso ter presente que, mesmo quando fortemente alicerçadas em estudos credíveis e correctos, as reco-mendações são generalizações baseadas em estudos em populações que têm com certeza muito de comum com o nosso doente mas em que este possui uma in-dividualidade de características que tem que ser valo-rizada e tida em conta.

Por ter presente estas e outras críticas à transpo-sição pura e simples de evidências resultantes de es-tudos para recomendações, surgiu há alguns anos o GRADE Working Group que incorpora na definição da força das suas recomendações não só a qualida-de da evidência, mas também a ponderação de con-sequências desejáveis e não desejáveis de estratégias alternativas possíveis, a variabilidade nos valores e preferências dos doentes, bem como os custos. Além disso, a opção deste grupo foi apresentar as recomen-dações como “intervenção/acção/opção”: 1) forte-mente recomendada; 2) fracamente recomendada; 3) fracamente não recomendada; e 4) fortemente não re-

Qualidade da evidência e robustez das recomendaçõesQuality of evidence and strength of recommendations

Page 6: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

108

comendada. Trata-se de uma perspectiva mais ampla e eventualmente mais útil do ponto de vista clínico.

Mas, regressando ao tema da qualidade da evidên-cia, é indispensável ter em conta uma hierarquia ge-neralizadamente aceite hoje quanto à qualidade dos estudos. No nível mais elevado estão as meta-análi-ses de múltiplos estudos em aleatório e no nível mais baixo as opiniões de peritos, situando-se entre estes extremos (por ordem decrescente de qualidade) os es-tudos controlados em aleatório, os estudos de coorte, os estudos de caso-controlo e os casos clínicos/séries de casos clínicos.

É, pois absolutamente fundamental que, sem des-primor para os casos clínicos realmente raros e in-

formativos, comecemos a valorizar adequadamente a vertente de investigação clínica e nos esforcemos por dar origem a evidências suficientemente credíveis para poderem ser tidas em conta na elaboração de re-comendações que apoiem cada vez mais a actuação clínica concreta.

Na sua função pedagógica, a Acta tem procu-rado incentivar e/ou promover a disseminação de informação sobre estes pontos. Exemplos de con-cretizações específicas foram as duas reuniões ocorridas sobre Medical Writing em que partici-pou. Tendo em conta a adesão dos participantes, julgo que pode ser afirmado que tiveram resultados muito promissores.

Carlos Calhaz JorgeEditor Associado

Page 7: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

109

Artigo Original/Original Article

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):109-113

Abstract

Objective: to evaluate pregnancy outcomes in pregnant women with placenta previa (PP) and to correlate these with the different types of PP.Methods: review of the clinical files of 67 gestations complicated with PP who delivered at our department between October 2003 and July 2009. Data extracted included demographic characteris-tics, risk factors for PP, number of vaginal bleeding episodes, need for and duration of hospitaliza-tion, gestational age at delivery, need for an urgente intervention, maternal morbidity (post-partum hemoglobin < 8.0 g/dl, need for blood transfusion, surgical intervention for post-partum haemorrha-ge) and mortality.Results: a total of 36 women (53.7%) had a complete PP, 8 (11.9%) had a parcial type, and 23 (34.3%) had a marginal PP. At least one risk factor was present in 57 women (85%), and 33 (58%) had two or more risk factors. Thirty-nine (58%) women were hospitalized due to vaginal bleeding and 29 (43.3%) required an urgent/emergente cesarean delivery. Sixteen women (23.8%) had sig-nificant morbidity. Except for gestational age at delivery (which was lower for complete PP) and duration of hospital stay (which was higher for complete PP), no statistically significant difference in outcomes was seen with the different types of PP.Conclusions: PP is associated with a significant risk of maternal morbidity, irrespective of its typeKeywords: placenta previa; pregnancy outcomes; vaginal bleeding; morbidity; mortality.

Desfecho obstétrico na placenta préviaPregnancy outcome for women with placenta previa

Ana Maria Coelho*, Luciana Patrício*, Nuno Clode**, Luís Mendes-da-Graça***

* Interna do Complementar de Ginecologia e Obstetrícia** Chefe de Serviço

*** Director do Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina de Reprodução

Centro Hospitalar Lisboa NorteHospital de Santa Maria, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa

INTRODUÇÃO

As situações de inserção placentária sobre ou na proximidade do orificio interno do colo uterino, de-signadas por placenta prévia (PP), complicam cerca de 0,3-0,5% de todas as gestações. Vários estudos

têm identificado factores de risco associados a PP, nomeadamente idade materna avançada, raça negra, hábitos tabágicos, multiparidade, antecedentes de parto por via abdominal ou de aborto cirúrgico, gra-videz múltipla e gravidez pós-técnicas de reprodução medicamente assistida.1

Clinicamente, assume importância como causa de hemorragia na segunda metade da gravidez e associa-se a morbilidade e mortalidade materna e perinatal, estando descritos riscos acrescidos de hemorragia

Page 8: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

110

ante-, intra- e pós-parto, necessidade de histerectomia puerperal e de suporte transfusional.2

O objectivo deste estudo foi o de avaliar o desfe-cho obstétrico das gestações consoante o tipo de PP.

MATERIAL E MÉTODOS

Realizámos um estudo retrospectivo das gestações complicadas pelos vários tipos de PP – definidos por oclusão total (PP total) ou parcial do orificio interno do colo uterino (PP parcial) ou por inserção do bordo pla-centário na margem do orifício interno do colo a uma distância inferior a 20mm do mesmo (PP marginal) – diagnosticada após a 28ª semana de gestação, e cujo parto ocorreu entre Outubro de 2003 e Julho de 2009. Foram excluídas as PP com vasa previa associada.

Em todas as gestações em que ocorreu hemorra-gia, após um curto internamento para vigilância no primeiro episódio hemorrágico, foi norma manter o internamento até ao fim da gestação em caso de novo episódio de hemorragia vaginal. Na ausência de he-morragia grave, o parto foi efectuado por cesariana electiva após a 37ª semana de gestação.

Através da análise dos processos clínicos foram registados os dados demográficos e outros factores de risco descritos associados a PP: idade, raça, hábitos tabágicos, paridade, antecedentes de cesariana ou de aborto cirúrgico e tipo de gravidez.

Para cada tipo definido de PP foram avaliados o número de internamentos e de episódios de hemorra-gia vaginal, a idade gestacional à data da cesariana, as situações de morbilidade (anemia grave definida por hemoglobina pós-parto <8gr/dL e/ou variação de hemoglobina ante e pós-natal >3gr/dL, necessidade de suporte transfusional, necessidade de manobras cirúrgicas para controlo de hemorragia puerperal) e mortalidade materna.

Para a análise estatística utilizámos o Teste Qui-Quadrado e a Análise de Variância Múltipla e con-siderou-se haver significado estatístico para p<0,05.

RESULTADOS

Durante o período definido, foram admitidas para o parto 73 gestações complicadas por PP, das quais 6

foram excluidas por impossibilidade de obter registos completos. Das 67 analisadas, 36 (53,7%) eram PP totais, 8 (11,9%) eram PP parciais e 23 (34,3%) eram PP marginais.

Na população analisada (n=67), 62 gestantes (92,5%) eram caucasianas e 41 (61,2%) eram mul-típaras; a mediana da idade materna no momento do parto era de 34 anos (21-43). Treze gestações (19,4%) foram obtidas por técnicas de reprodução medica-mente assistida, 6 (9%) eram múltiplas e apenas 8 grávidas (11,9%) referiam hábitos tabágicos. Em ges-tações precedentes, 12 (17,9%) tinham sido sujeitas a cesariana, das quais 3 (25%) tinham antecedentes de 2 partos por via abdominal. Quatorze (20,9%) das grávidas estudadas tinham ainda antecedentes de pelo menos um aborto cirúrgico. Globalmente, 57 (85%) grávidas apresentavam pelo menos 1 factor de risco e 33 (58%) destas tinham 2 ou mais factores de risco associados.

A maioria das gestações (58%) necessitou de in-ternamento por episódio(s) de hemorragia vaginal que, em 22 (56%) casos, ocorreram antes da 34ª se-mana de gestação. O período de internamento ante-parto variou entre 1 e 56 dias e a maioria das grávidas teve 1 episódio de hemorragia havendo no entanto 2 casos de 5 episódios. A mediana da idade gestacional em que ocorreu o parto foi de 37 semanas e em 29 (43,3%) casos houve necessidade urgente/emergente de cesariana por hemorragia vaginal grave. Ocorre-ram 16 (23,8%) situações de morbilidade materna. O periodo de internamento pós-parto variou entre 2 e 16 dias.

A Tabela I mostra o desfecho da gestação conso-ante o tipo de PP. Não se registaram diferenças esta-tisticamente significativas entre os tipos de PP relati-vamente aos seguintes desfechos estudados: número de casos que não registaram episódios de hemorragia, número de casos que necessitaram de internamento por hemorragia antes da 34ª semana de gestação e número de episódios de hemorragia. No que diz res-peito ao número de dias de internamento ante-parto, este foi maior nas gestações complicadas por PP total (p=0,04). Quanto à idade gestacional à data do parto, esta foi menor igualmente nas gestações complicadas por PP total relativamente às situações de PP margi-

Coelho AM, Patrício L, Clode N, Mendes-da-Graça L

Page 9: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

111

nal (p = 0,03). Relativamente ao número de casos que necessitaram de intervenção urgente/emergente por cesariana, aos que se complicaram com alguma das situações de morbilidade materna definidas ou ao número de dias de internamento pós-parto, a diferen-ça registada entre os vários tipos de PP não foi esta-tisticamente significativa.

As situações de morbilidade materna referidas em casos de PP total e marginal consistiram em anemia grave no pós-parto, necessidade de suporte transfu-sional, necessidade de tamponamento cirúrgico ou de histerectomia para controlo da hemorragia, conforme particularizado na Tabela II.

Não se registaram casos de mortalidade materna.

DISCUSSÃO

A existência de uma placenta prévia é, sem dúvida, uma situação de elevado risco obstétrico e os nossos resultados corroboram o que a literatura descreve:

mais de metade dos casos necessitou de internamento hospitalar por ter ocorrido pelo menos um episódio de hemorragia vaginal, em 43,3% houve necessidade de proceder a uma cesariana urgente/emergente pela gravidade da hemorragia e em 24% registou-se mor-bilidade puerperal significativa. De facto, encontra-se bem documentado que as diversas formas de placenta baixamente inserida (prévia total, prévia parcial ou apenas inserida a menos de 20mm do orifício interno do colo mas sem contactar com este) têm um risco acrescido de hemorragia ante-parto (risco relativo [RR] 9,81), intra-parto (RR 2,48) ou pós-parto (RR 1,86)2 sendo a morbilidade/mortalidade materna sig-nificativa nesta população.

A PP está associada à existência de factores de risco como multiparidade, etnia africana ou asiática, idade materna avançada, existência de hábitos tabá-gicos, gravidez múltipla e antecedentes de cesariana ou de aborto cirúrgico. A presença de pelo menos um factor de risco era evidente em 85% (57 casos) da nossa população, sendo que 58% (33 casos) destes apresentavam mais do que um dos factores descritos associados.

A multiparidade foi o factor de risco com maior prevalência na nossa população (61%); segundo Gilliam3, associa-se a um RR de 1,72 (intervalo de confiança [IC] 95% 1,12-2,64). Não é conhecida a razão pela qual a implantação do trofoblasto ocorre no segmento inferior do útero em multíparas mas su-gere-se que haja uma alteração endometrial no local

Tabela I – Desfecho obstétrico consoante o tipo de PP

PP Total PP Parcial PP Marginal N=36 (%) n=8 (%) n=23 (%) p

Sem internamento por hemorragia 14 (38,9) 3 (37,5) 11(47,8) 0,53Internamento por hemorragia< 34ª semana de gestação 14 (20,9) 2 (25) 6 (26,1) 0,52Episódios de hemorragia * 1,25 ± 1,3 0,75 ± 0,7 1,00 ± 1,23 0,46Dias de internamento ante-parto * 17,8 ± 18,1 12,3 ± 21,5 6,3 ± 10,1 0,04Idade gestacional no parto (sem) * 35,7 ± 2,38 37,5 ± 0,92 36,7 ± 1,66 0,03Cesariana urgente / emergente 19 (52,8) 2 (25) 8 (34,8) 0,21Morbilidade materna 9 (13,4) 0 7 (30,4) 0,23Dias de internamento pós-parto * 4,0 ± 2,8 3,5 ± 0,8 3,7 ± 1,9 0,81

* dados referem-se a média e desvio padrão

Tabela II – Morbilidade materna consoante o tipo de PP

PP Total PP Marginal N =36 (%) N =23 (%)

Anemia grave pós-parto 9 (25) 7 (30,4)Suporte transfusional 5 (13,9) 3 (13)Tamponamento uterino 2 (5,5) 0Histerectomia 1 (2,8) 1 (4,3)

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):109-113

Page 10: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

112

onde se dá a implantação, tornando-o menos propício para tal em gestações subsequentes4.

A percentagem da nossa população descrita com consumo tabágico (11,9%) refere-se àquelas que mantiveram os hábitos até à data do parto; não in-clui as grávidas que cessaram o consumo no início ou durante a gravidez. Esta associação encontra-se bem documentada por Naeye5, segundo o qual a frequên-cia de PP é maior em fumadoras, particularmente nas que descrevem hábitos tabágicos com mais de 6 anos de duração. Mais recentemente, em 1996, Chelmow6 corroborou estes resultados descrevendo um risco três vezes superior de PP entre as grávidas com consumo mantido durante a gestação. No caso do tabagismo materno, admite-se que a razão da associação resida no facto da hipoxémia, relacionada com os altos teo-res de monóxido de carbono, poder causar hipertrofia placentária compensadora e, portanto, condicionar uma maior probabilidade da massa placentária atingir o orifício cervical4.

A associação com os antecedentes obstétricos, nomeadamente o número de partos por via abdomi-nal, encontra-se descrita em vários estudos publica-dos.7,8,9,10 Apesar da etiologia desta associação não estar ainda claramente definida, pensa-se que a exis-tência no segmento inferior do útero de uma cicatriz apresentando maior concentração de tecido fibroso dificulta o crescimento e consequente migração pla-centária8. Esta hipótese explicaria a menor percenta-gem de migração de placentas baixamente inseridas diagnosticadas ecograficamente no 2º trimestre em mulheres com cesariana nos antecedentes resultando numa maior incidência de PP no termo8. Em 1995, Clark8 analisou dados de 97799 gestações (entre 1977 e 1983) e concluiu que o risco de PP num útero sem cirurgia prévia era de 0,26%, mas observava-se um aumento quase linear com o número de cesarianas anteriores, sendo de 10% em grávidas com 4 ou mais partos por via abdominal. Em 2005, Laughon9 confir-mou estes dados descrevendo, no momento do parto um risco 3,95 vezes superior (IC 95% 1,49-10,5) de PP após 1 cesariana, aumentando 2,93 vezes (IC 95% 1,6-5,39) por cada cesariana adicional nos anteceden-tes. Mais recentemente, Daltveit10 publicou os resul-tados de um estudo de coorte que se baseou na análi-

se dos registos médicos de nascimento entre 1967 e 2003 na Noruega e, entre outras complicações de uma cesariana nos antecedentes em gestações subsequen-tes, indica a PP (RR 1,5; IC 95% 1,3-1,8) e a placen-ta acreta (RR 1,9; IC 95% 1,3-2,8). Na população de estudo, 18% (12) tinham pelo menos 1 cesariana nos antecedentes, das quais 3 grávidas tinham história de 2 partos por via abdominal.

As gestações complicadas por PP que evoluem com episódios de hemorragia vaginal, por vezes re-correntes, constituem um motivo de internamento frequente e prolongado na última metade da gravidez. A atitude expectante na abordagem da PP tem sido defendida há mais de 7 décadas como forma de me-lhorar o prognóstico fetal. O recurso à tocólise e ao suporte transfusional, bem como a disponibilidade de técnicas para avaliação da maturidade pulmonar, têm permitido minimizar as sequelas da prematuridade. Simultaneamente, a contínua optimização dos cuida-dos neonatais tem proporcionado, em certos casos, o término prematuro de forma electiva da gestação com mais segurança para o recém-nascido e para a mãe do que um parto mais tardio em situação urgente/emergente por hemorragia ou início de trabalho de parto. Apesar destes avanços, um número significa-tivo de grávidas desenvolve hemorragia moderada a grave com risco de mortalidade materna e fetal e, consequentemente, cerca de dois terços das gestações complicadas por PP terminam antes das 36 semanas de gestação11.

Na população por nós avaliada, a prevalência de hemorragia vaginal foi significativa e levou a que se efectuasse cesariana urgente/emergente em 43,3% das grávidas. No entanto, não registámos diferenças estatisticamente significativas entre os vários tipos de PP quanto ao número de casos que necessitaram de internamento por hemorragia vaginal, ao número de episódios de hemorragia ou ao número de casos que necessitaram de intervenção urgente/emergente por cesariana. Apenas no que concerne ao número de dias de internamento ante-parto e à idade gestacional em que o parto ocorreu observámos uma diferença com significado estatístico entre os tipos de PP, sendo res-pectivamente maior (p=0,04) e menor (p=0,03) nas gestações complicadas por PP total. Embora a relação

Coelho AM, Patrício L, Clode N, Mendes-da-Graça L

Page 11: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

113

entre PP e prematuridade esteja documentada12 (RR de parto entre as 28 e as 36 semanas de gestação va-ria entre 2,7 e 4,0 sendo que aproximadamente 12% dos partos prematuros se devem a situações de PP), na nossa casuística, o tipo de placenta prévia não foi determinante na previsão quer do número de episó-dios de hemorragia quer do número de casos que ne-cessitaram de cesariana urgente/emergente. Tal facto leva-nos a considerar que a mera existência de uma placenta baixamente inserida, independentemente do seu tipo, deve ser tida como o factor determinante do risco obstétrico.

O mesmo se observou quanto à morbilidade ma-terna significativa, que ocorreu em um quarto da po-pulação (9 grávidas com PP total e 7 com PP mar-ginal). Das 16 puérperas, 8 necessitaram de suporte transfusional e 4 requereram intervenção cirúrgica (tamponamento com balão de Bakri e/ou histerecto-mia) como forma de controlar a hemorragia puerpe-ral. Neste grupo, em 7 tinha sido realizada cesariana numa gestação anterior e, as duas situações em que houve necessidade de recorrer a histerectomia, ocor-reram em grávidas com 2 cesarianas nos anteceden-tes. Num destes casos havia suspeita de acretismo placentário associado (posteriormente confirmado) e necessitou de admissão subsequente em Unidade de Cuidados Intensivos. Estes dados corroboram os resultados de um estudo observacional publicado em 2007 com análise de 868 grávidas (252 com 1 cesa-riana, 76 com 2 cesarianas e 53 com 3 ou mais ce-sarianas nos antecedentes)3 que mostrou que, à me-dida que a frequência de partos por via abdominal aumentava, acresciam as complicações e desfechos maternos adversos, nomeadamente coagulopatia, ne-cessidade de suporte transfusional, acretismo placen-tário, necessidade de histerectomia e de admissão em Unidade de Cuidados Intensivos, respectivamente de 6,3% (sem cesarianas) para 15,8% (para 1 cesariana), 50% (para 2 cesarianas) e 81% (para 3 ou mais cesa-rianas)3. Adicionalmente, em 2009, Bodelon13 corro-borou estes dados ao descrever um risco aumentado

de histerectomia periparto (RR 7,9; IC 95% 4,1-15,0) em gestações complicadas por PP.

Concluímos que, pela elevada percentagem de episódios de hemorragia vaginal durante a gravidez e a contínua articulação com a equipa de Neonato-logia, torna-se necessário vigiar e programar o parto de gestações complicadas por PP, qualquer que seja o seu tipo, em hospitais da rede de Hospitais de Apoio Perinatal Diferenciado. Adicionalmente, dado o ris-co considerável de morbilidade materna subjacente, particularmente no grupo de grávidas com cesarianas nos antecedentes, deve merecer uma atenção especial a programação dos cuidados intra-parto por parte de uma equipa multidisciplinar que inclui, necessaria-mente, um cirurgião ginecológico, anestesistas/inten-sivistas e disponibilidade transfusional permanente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Oyelese Y, Smulian J. Placenta previa, placenta accreta, and vasa previa. Obstet Gynecol 2006; 107: 927-40

2. Crane JM, Van den Hof MC, Dodds L et al. Maternal complications with placenta previa. Am J Perinatol 2000; 17: 101-5

3. Gilliam M, Rosenberg D, Davis F. The likelihood of placenta previa with greater number of cesarean deliveries and higher parity. Obstet Gynecol 2002; 99: 976-80

4. Cardoso C. Síndromes hemorrágicos da gravidez avançada e do pós-parto. In: Medicina Materno-Fetal (3ª edição). Graça LM et al. Lidel; 2005: 373-86

5. Naeye R. Abruptio placentae and placenta previa: frequency, perinatal mortality, and cigarette smoking. Obstet Gynecol 1980; 55: 701-4

6. Chelmow D, Andrew E, Baker E. Maternal cigarette smoking and placenta previa. Obstet Gynecol 1996; 87: 703-6

7. Taylor V, Kramer M, Vaughan T et al. Placenta previa and prior caesarean delivery: how strong is the association? Obstet Gynecol 1994; 84: 55-7

8. Clark S, Koonings P, Phelan J. Placenta previa/accreta and prior cesarean section. Obstet Gynecol 1985; 66: 89-92

9. Laughon S, Wolfe H, Visco A. Prior cesarean and the risk for placenta previa on second-trimester ultrasonography. Obstet Gynecol 2005; 105: 962-5

10. Daltveit A, Christophersen T, Pihlstrom H et al. Cesarean delivery and subsequent pregnancies. Obstet Gynecol 2008; 111: 1327-34

11. McShane P, Heyl P, Epstein M. Maternal and perinatal morbidity resulting from placenta previa. Obstet Gynecol 1985; 65: 176-82

12. Ananth C, Demissie K, Smulian J et al. Relationship among placenta previa, fetal growth restriction, and preterm delivery: a population-based study. Obstet Gynecol 2001; 98: 299-306

13. Bodelon C, Bernabe-Ortiz A, Schiff M et al. Factors associated with peripartum hysterectomy. Obstet Gynecol 2009; 114: 115-23

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):109-113

Page 12: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

114

Artigo Original/Original Article

ABSTRACT

Introduction: Primary fallopian tube carcinoma (PFTC) is an extremely rare tumour, accounting for 0,14 to 1,8% of all gynaecologic malignancies. Its incidence may be underestimated due to the difficulty in differentiating from ovarian cancer, especially in advanced cases.Objective: To evaluate clinical and histological-pathological features of primary fallopian tube carcinoma.Study Design: Retrospective observational study.Material and Methods: Ten cases with the diagnosis of PFCT were identified between 1991 and 2008 and their clinical records were reviewed. We assessed clinical presentation, stage, histology, grade, laterality, treatment rendered and overall survival. The overall incidence in our population was also evaluated.Results: Adenocarcinoma was the most common histological finding. Three patients had FIGO stage IA, two had stage IC, four had FIGO stage IIA and one patient had FIGO stage IV. Essentially half the cases of PFTC had moderate differentiation; all were unilateral. Mean follow-up was 52 months (range two months to eleven years), with a free survival period of 28 months. At the time of analysis six women are alive, one with residual disease.Conclusion: Primary fallopian tube carcinoma is a rare disease. The prognosis seems to be poor, and this is usually related to the advanced stage of the disease at diagnosis.Keywords: Fallopian tube carcinoma; incidence; survival; gynecological malignancies

Carcinoma primário das trompas de Falópio — revisão clínico-patológica de 10 casos

Primary fallopian tube carcinoma — clinicopathological review of 10 cases

Márcia Rodrigues*, Adriana Cruz**, Eugénia Cruz***, Rita Sousa****, Daniel Pereira-da-Silva*****

* Interna Complementar de Ginecologia/Obstetrícia** Assistente Hospitalar de Ginecologia/Obstetrícia

*** Assistente Hospitalar Graduada de Anatomia Patológica**** Assistente Hospitalar de Ginecologia/Obstetrícia

***** Director de Serviço de Ginecologia

Serviço de Ginecologia — Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil de Coimbra

INTRODUÇÃO

O carcinoma primário das trompas de Falópio é uma doença rara1,2,3,4,5,6, correspondendo a 0,14-1,8%1 dos cancros ginecológicos. O prognóstico é adverso2,11,18,

sendo as suas características clínicas e histológicas semelhantes ao carcinoma do ovário2.

É possível que a sua verdadeira incidência seja su-bestimada1,2,10, em parte devido à grande dificuldade em diferenciar este tipo de tumor de um carcinoma do ovário, sobretudo nos casos avançados4,10.

Foi descrito pela primeira vez por Renaud em 184718, mas só em 1888 foi publicado o primeiro caso por Orthmann18 e, até à data, foram descritos aproxi-

Rodrigues M, Cruz A, Cruz E, Sousa R, Pereira-da-Silva D

Page 13: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

115

madamente 2776 casos1 na literatura, embora a maio-ria dos trabalhos apresente pequenas séries.

A etiologia é desconhecida2,13,16, contudo alguns estudos sugerem que a nuliparidade9, a infertilidade e a salpingite crónica6,13 poderão constituir factores de risco que predispõem a este tipo de tumores. Vários estudos relacionaram as mutações dos genes BRCA1 e BRCA2 com o CPTF2,4,14,17, e alterações no p53 são comuns nesta patologia2, tendo sido também sugerido que estas alterações poderão reduzir a sobrevivência2. Foi demonstrado que mulheres que são portadoras de mutações na linha germinativa em BRCA1 e BRCA2 apresentam maior risco de desenvolverem carcinoma da trompa16.

Pode surgir em qualquer idade18, embora a maio-ria dos casos documentados tenham ocorrido em mu-lheres pós-menopáusicas9.

O pico de incidência do CPTF é na 6ª década6,13 de vida, com uma média de idade de 64 anos1 e a sua incidência aumenta com o avançar da idade.

Aproximadamente um quarto dos casos são tumo-res bilaterais (10-27%)1,18, sobretudo na doença me-tastática9.

O adenocarcinoma é a forma histológica mais fre-quente9,13, embora também possam surgir sarcomas, linfomas, tumores mullerianos mistos, carcinomas das células de transição ou endometrióides e carci-nossarcomas6,9,13.

As vias de disseminação deste tumor são seme-lhantes às do carcinoma do ovário7. A disseminação intra-peritoneal é a via mais frequente7,8, que resulta da exfoliação6,17 das células malignas para o lúmen da trompa com disseminação directa6 para a cavidade peritoneal, quer por contiguidade, com envolvimen-to dos órgãos adjacentes. No entanto estes tumores também poderão disseminar-se por via linfática ou venosa5,6, sendo a metastização à distância um evento tardio no decurso da doença8.

O diagnóstico pré-operatório do CPTF é difícil (2-3%)1,18, uma vez que não tem uma apresentação clíni-ca ou imagiológica específica10,18, e só é estabelecido aquando da laparotomia10 e do estudo histológico9.

A associação da ressecção cirúrgica completa com quimioterapia adjuvante continua a ser a melhor op-ção terapêutica para estas doentes1,2.

MATERIAL E MÉTODOS

Análise retrospectiva de 10 casos clínicos de carci-noma primário da trompa de Falópio, tratados no pe-ríodo compreendido entre 1991 e 2008. A incidência desta neoplasia nesse período de tempo foi de 0,25%.

O diagnóstico de tumor primário da trompa de Fa-lópio foi realizado pelos critérios estabelecidos por Hu et al., e amplamente aceites no diagnóstico destes tumores.

O estadiamento foi realizado de acordo com a classificação da Figo (1991)15 para o carcinoma da trompa de falópio. A classificação baseou-se nos achados cirúrgicos obtidos durante a laparotomia.

Foram avaliados neste estudo os dados referentes às características clínico-demográficas (idade, idade da menarca, método contraceptivo, idade da meno-pausa, clínica de apresentação) e às características tu-morais (diagnóstico pré-operatório, tratamento, histo-logia, estadiamento, terapêutica adjuvante, intervalo livre de doença, sobrevivência).

De acordo com o grau de diferenciação, os tumo-res foram classificados em G1, G2, G3 e G4, isto é, bem diferenciado, moderadamente diferenciado, mal diferenciado e indiferenciado, respectivamente.

Para a determinação das curvas de sobrevivência e do intervalo livre de doença foi utilizado o método de Kapplan-Meyer.

RESULTADOS

As características da população estudada estão suma-rizadas na tabela nº I. A idade média das doentes foi de 64,2 anos (variando entre 50-80 anos).

Apenas uma das mulheres do grupo de estudo era pré-menopáusica, tendo sido a idade média da meno-pausa de 51,9 anos (variando entre 49-58 anos). Nenhu-ma das doentes era nulípara ou apresentava antecedentes de infertilidade. Apenas uma mulher usou contracepção hormonal como método contraceptivo, durante 15 anos.

Clinicamente, 60% (6/10) das doentes apresenta-vam metrorragias pós-menopausa (MPM), associa-das a uma massa pélvica em dois dos casos. Apenas em um caso houve uma massa pélvica sem outra sin-tomatologia associada.

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):114-121

Page 14: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

116

Em nenhum dos casos houve suspeita de carcino-ma da trompa de Falópio no período pré-operatório. Na tabela nº II apresentam-se o diagnóstico pré-ope-ratório e o doseamento do marcador tumoral Ca 125 no mesmo período, para cada caso clínico.

Apenas uma mulher realizou tratamento neo-ad-juvante com ciclofosfamida e platinum por suspeita de tumor maligno do ovário, tendo todas efectuado cirurgia [Tabela nº III]. Todas as doentes, à excepção de uma, foram submetidas a histerectomia total (HT) com anexectomia bilateral (AB), omentectomia infra-cólica e múltiplas biópsias das goteiras parieto-cóli-cas. Em apenas metade dos casos foi efectuada linfa-

Tabela nº I – Características da população

Características Clínicas Média Mínimo – Máximo %

Idade (anos) 64,2 50 – 80 Menarca (anos) 13,9 12-17 Método contraceptivo (nº) O 1 Coito interrompido 6 CHO 1 Preservativo 1 Desconhecido 1 Menopausa pré-menopausa 1 pós-menopausa 9 90%Idade da menopausa (anos) 51,9 49-58 Manifestação clínica MPM 4 40% MPM + massa pélvica 2 20% Hemorragia uterina anormal 1 10% Massa pélvica + algias pélvicas 3 30%

CHO=contraceptivo hormonal oral; MPM=metrorragias pós-menopausa

Tabela nº II – Diagnóstico pré-operatório e valor do marcador tumoral CA 125

Casos Diagnóstico Pré-operatório CA 125 pré-operatório

1 Carcinoma endométrio 362 Carcinoma ovário 15503 Carcinoma ovário Não determinado4 Tumor benigno do ovário 305 Carcinoma ovário 21,26 Carcinoma ovário 11757 Metrorragias pós-menopausa recidivantes Não determinado8 Carcinoma ovário 101009 Endometriose pélvica 3210 Carcinoma endométrio Não determinado

denectomia pélvica±para-aórtica, não se verificando positividade em nenhum gânglio, ou lesão residual.

Relativamente ao estadiamento da doença, cons-tatou-se que a maioria das doentes se encontrava no estadio IIA (4), seguido do estadio IA (3). Verifican-do-se apenas um caso no estadio IV.

Histologicamente, 90% (9/10) dos CPTF eram adenocarcinomas. Outros sub-tipos histológicos fo-ram diagnosticados, tais como: carcinoma das célu-las de transição (2), carcinoma das células claras (1), NOS (2). Foi também diagnosticado um carcinoma indiferenciado (1). Aproximadamente em metade dos casos eram moderadamente diferenciados, não

Rodrigues M, Cruz A, Cruz E, Sousa R, Pereira-da-Silva D

Page 15: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

117

Tabela nº III – Tratamento cirúrgico, estudo histo-patológico e estadiamento tumoral da população estudada

Casos Tratamento Cirúrgico Tipo Histológico Grau de diferenciação Estadiamento

1 HT + AB Adenocarcinoma NOS G2 IIA2 HT + AB + OP + Apendicectomia Adenocarcinoma G3 IV + Biópsias goteiras parieto-cólicas papilar seroso3 HT + AB + OP + Biópsias goteiras Cistoadenocarcinoma G2 IC parieto-cólicas + Exérese parede papilar-seroso posterior da vagina4 HT + AB Adenocarcinoma desconhecido IA papilar seroso5 HT + AB + OP + Biópsias goteiras parieto-cólicas Adenocarcinoma de desconhecido IIA + Linfadenectomia pélvica células claras6 HT + AB + OP + Múltiplas biópsias Adenocarcinoma NOS G3 IIA7 HT + AB (*) Carcinoma de células G2 IA de transição8 HT + AB + OP + Múltiplas biópsias Carcinoma de células G3 IC + Linfadenectomia pélvica de transição9 HT + AB (*1) Carcinoma G4 IA indiferenciado10 HT + AB + OP Adenocarcinoma desconhecido IIA + Linfadenectomia pélvica papilar seroso

HT=histerectomia total; AB=anexectomia bilateral; OP=Omentectomia parcial

(*) Realizado num 2º tempo cirúrgico laparotomia de estadiamento: lavado peritoneal + omentectomia parcial infra-cólica + linfa-denectomia pélvica e peri-aórtica + múltiplas biópsias(*1)= (*) + Linfadenectomia peri-aórtica

Tabela nº IV – Terapêutica adjuvante e estado actual das doentes

Casos Terapêutica Adjuvante Outros tratamentos Sobrevivência Estadiamento

1 Nenhuma Nenhum Morte por cancro IIA2 Adriamicina Nenhum Morte por cancro IV3 Recusou fazer terapia Exérese metástase Morte por cancro IC adjuvante + bromocriptina inguinal4 Nenhum Exérese de nódulo pulmonar Viva sem doença IA5 Paclitaxel + Carboplatina Nenhum Morte por cancro IIA6 Paclitaxel + Platinum Paclitaxel para recorrência Viva com IIA lombo-aórtica doença residual7 Nenhuma Nenhum Viva sem doença IA8 Nenhuma Radioterapia da Viva sem doença IC recidiva vaginal9 Nenhuma Nenhum Viva sem doença IA10 Adriblastina+Ciclofosfamida Nenhum Viva sem doença II +Platinum

se verificando nenhum caso bem diferenciado. Sete tiveram origem na trompa direita e três na trompa es-querda.

Em mais de metade dos casos foi proposta qui-mioterapia adjuvante, tendo uma efectuado terapêu-

tica em monoterapia com adriamicina e três foram submetidas a poliquimioterapia com paclitaxel + platinum (2) e adriblastina + ciclofosfamida + plati-num (1), uma doente recusou a terapêutica adjuvante e outra faleceu antes de a iniciar [Tabela nº IV ].

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):114-121

Page 16: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

118

A recorrência foi documentada em 50% (5/10) das doentes. Os locais onde foi verificada a recorrência da doença foram: cúpula vaginal (2), pulmão (1), gân-glios lombo-aórticos (1), e região inguinal e pélvis (1). Apenas quatro doentes efectuaram tratamento da recorrência, que consistiu: radioterapia, exérese do nódulo pulmonar, quimioterapia com paclitaxel e exérese do nódulo inguinal associado a bromocriptina (10mg id) respectivamente.

O intervalo médio livre de doença foi de 28 me-ses (variando entre 6 e 93 meses). Aproximadamente 58,3% dos casos encontravam-se livres de doença ao fim de 14 meses, e apenas 21% após 93 meses [Figura 1].

O período de follow-up médio foi de 52 meses (va-riando entre 2 e 138 meses). Constatou-se que 61,7% das doentes se encontrava livre de doença ao fim de

36 meses de follow-up, sendo apenas de 46,3% ao fim de 40 meses de follow-up [Figura 2].

Seis doentes encontram-se vivas, cinco das quais sem evidência de doença. Quarenta por cento das do-entes (4/10) faleceram, correspondendo aos seguintes estadios da doença: IC (2), IIA (1) e IV (1).

DISCUSSÃO

O carcinoma primário das trompas de Falópio conti-nua a ser uma neoplasia rara, sendo a sua incidência de 0,25% nesta série, semelhante à descrita na litera-tura (0,14 a 1,8% de todos os tumores ginecológicos malignos).

A idade média das doentes com este tipo de tumor oscila entre 55-65 anos16, idêntica à verificada no gru-po que estudámos que foi de 64 anos1.

Figura 1. Intervalo livre de doença [ILD (meses)]

 ILD

1251007550250

Cum

Sur

vival

1,0

0,8

0,6

0,4

0,2

0,0

CensoredSurvival Function

Survival Function

Rodrigues M, Cruz A, Cruz E, Sousa R, Pereira-da-Silva D

Page 17: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

119

Clinicamente, a MPM foi o sinal mais frequente-mente encontrado, seguida da massa pélvica, e asso-ciadas em alguns casos a algias pélvicas, secundárias provavelmente à distensão da trompa1,18. Contudo, existem relatos na literatura de metástase cerebral8 e inguinal5 como forma de apresentação inicial da do-ença, sem outra sintomatologia associada, no entanto são situações raras.

A forma clássica de apresentação do CPTF, tam-bém conhecida por tríade de Latzko5,10,18 consiste em hemorragia ou corrimento vaginal aquoso (hydrops tubae profluens)9,16, dor pélvica13 e massa anexial, contudo só é constatado num número reduzido de doentes (<10%)10. Tipicamente, consiste em uma dor tipo cólica, intermitente, aliviada subitamente por leucorreia aquosa, e acompanhada por diminuição do tamanho da massa abdominal10.

A ecografia pélvica e a tomografia computorizada abdomino-pélvica (TAC) são as primeiras armas ima-giológicas de auxílio no diagnóstico9,16, tornando-se também instrumentos importantes na avaliação da ex-tensão tumoral, de forma a permitir um planeamento adequado do tratamento. No entanto poderão ser in-suficientes para um diagnóstico correcto. Nestes ca-sos, a ressonância magnética(RM) poderá ser eficaz na diferenciação com outras lesões9,13.

O diagnóstico pré-operatório é difícil devido à sintomatologia e achados inespecíficos em exames complementares5,10, tendo sido os diagnósticos preli-minares na maioria dos nossos casos de carcinoma do ovário seguido do carcinoma do endométrio.

De acordo com o 26th Annual Report da FIGO (2006), aproximadamente 1/3 dos casos encontram-se no estadio I, 22,9% no estadio II, 38,9% no estadio

Figura 2. Sobrevivência global das doentes (meses)

 

meses125,00100,0075,0050,0025,000,00

Cum

Sur

vival

1,0

0,8

0,6

0,4

0,2

0,0

CensoredSurvival Function

Survival Function

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):114-121

Page 18: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

120

III e apenas 6,9% no estadio IV, e no nosso grupo constatámos que 40% (4/10) das doentes apresenta-vam extensão da doença para a pélvis, com apenas um caso com doença extra-pélvica, traduzindo a di-ficuldade em realizar o diagnóstico num estadio pre-coce.

Tal como descrito na literatura, a forma histológica mais frequentemente encontrada foi o adenocarcino-ma9,13. Na nossa série, verificou-se que relativamente ao grau de diferenciação, estes tumores variaram en-tre moderadamente diferenciados a indiferenciados.

Todas as doentes apresentaram envolvimento uni-lateral da trompa. A bilateralidade é mais frequente na doença metastática9. Nesta série verificou-se ex-tensão do tumor para o ovário ipsilateral em 4 casos e noutro caso envolvimento do útero e colo uterino.

No diagnóstico diferencial do CPTF deve consi-derar-se hidro, pio ou hematossalpinge, neoplasia do ovário, fibromioma uterino e abcesso tubo-ovárico6,9.

O estadiamento do CPTF é cirúrgico17, baseando-se nos achados obtidos durante a laparotomia explo-radora, de acordo com a classificação da FIGO15,20.

O tratamento de escolha nos CPTF é o cirúrgi-co1 (cito-redutor), consistindo na histerectomia total, anexectomia bilateral e omentectomia6,18. A linfade-nectomia pélvica e para-aórtica está recomendada no estadiamento5,11. No nosso grupo de estudo, atenden-do à idade avançada de uma das doentes, optou-se por realizar apenas HT + AB, tendo as restantes sido submetidas ao tratamento standard preconizado, não se constatando doença residual em nenhum dos casos (Tabela nº III).

Atendendo à propensão para a disseminação mi-croscópica à distância e ao relativo risco de recor-rência, apesar de uma ressecção cirúrgica completa, a quimioterapia parece ter um papel importante como terapêutica adjuvante nas mulheres em estádios ini-ciais da doença. A quimioterapia de escolha na actua-lidade consiste na combinação de derivados da plati-na e taxanos1,16,17.

A radioterapia adjuvante não está recomendada uma vez que não se verificou melhoria da sobrevida aos 5 anos6.

A sobrevivência global das mulheres com CPTF aos 5 anos é de aproximadamente 56,4%, sendo no

estadio I de 81,3%, 66,9% para o estadio II, 41,3% para o estadio III e de 33,3% para as doentes no es-tadio IV20.

Neste estudo a sobrevivência foi inferior, obser-vando-se que aos 3 anos foi de 46%, tendo sido seme-lhante ao fim de 5 anos. O estadio FIGO e a profun-didade de invasão da parede tubar parecem constituir importantes factores de prognóstico. A presença de doença residual após a cirurgia, a idade da doente e o estadio avançado também estão associados a diminui-ção da sobrevivência.

O prognóstico é mau2,11 em parte pela dissemina-ção linfática precoce. Está descrita metastização para os gânglios linfáticos em mais de metade dos casos (>50%)4,11, não se verificando tal facto no nosso gru-po de estudo, no qual não se constatou qualquer atin-gimento ganglionar.

Assim sendo, a associação da ressecção cirúrgica completa com quimioterapia adjuvante continua a ser a melhor opção terapêutica para estas doentes.

Devido à raridade do diagnóstico, a análise pros-pectiva dos resultados e eficácia do tratamento tor-nam-se difíceis.

CONCLUSÕES

O diagnóstico precoce destes tumores malignos é di-fícil, devido à sintomatologia inespecífica, sendo o seu diagnóstico habitualmente um achado incidental. O prognóstico é mau, estando habitualmente associa-do ao estadio avançado da doença no momento do diagnóstico.

BIBLIOGRAFIA

1. Pectasides D, Pectasides E, Papaxoinis, Andreadis C, Papatsibas G, Fountzilas G, Pliarchopoulou K, Macheras A, Aravantinos G, Economopoulos T. Primary fallopian tube carcinoma: Results of a retrospective analysis of 64 patients. Gynecologic Oncology 2009; 115: 97-101.

2. Stewart SL, Wike JM, Foster JL, Michaud F. The incidence of primary fallopian tube cancer in the United States. Gynecologic Oncology 2007; 107: 392-397.

3. Boronow RC. Fallopian tube cancer: radical surgery, extended field radiation and chemeotherapy in 24 cases with “intent to cure” Gynecology Oncology 2008; 111: 517-522.

4. Moore KN, Moxley KM, Fader AN, et al. Serous fallopian tube carcinoma: A retrospective, multi-institutional case-control comparision to serous adenocarcinoma of ovary. Gynecologic

Rodrigues M, Cruz A, Cruz E, Sousa R, Pereira-da-Silva D

Page 19: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

121

Oncology 2007; 107: 398-403.5. Cho J, Grumbine FC, Díaz-Montes TP. Inguinal node metastasis as

the initial presentation of primary fallopian tube cancer – Case report. Gynecologic Oncology 2006; 103: 759-762.

6. Courville XF, Cortés Z, Katzman PJ, Rosier RN. Bone metastases from Fallopian Tube Carcinoma. Clinical Orthopaedics and Related Research 2005; 434: 278-281.

7. Hidaka T, Nakamura T, Shima T, Sumiya S, Saito S. Cerebral metastasis from a primary adenocarcinoma of fallopian tube – Case report. Gynecologic Oncology 2004; 95: 260-263.

8. Raff JP, Anderson P, Sands C, Makower D. Fallopian Tube Carcinoma Presenting with a Brain Metastasis. Gynecologic Oncology 2002; 85: 372-375.

9. Apaydin FD, Duce MN, Özer C, Yildiz A. Serous adenocarcinoma of the fallopian tube: US and CT findings. European Journal of Radiology Extra 2004; 49: 75-77.

10. Romagosa C, Torné A, Iglesias X, Cardesa A, Ordi J. Carcinoma of the fallopian tube presenting as acute pelvic inflamatory disease – Case report. Gynecologic Oncology 2003; 89: 181-184.

11. Klein M, Rosen A, Lahousen M, Graf AH, Rainer A. The relevance of adjuvant therapy in primary carcinoma of the fallopian tube, Stages I and II: irradiation vs. chemotherapy. Int. J. Radiation Oncology Biol. Phys. 2000; 48 (5): 1427-1431.

12. Rosen AC, Ausch C, Hafner E, Klein M, Lahousen M, Graf AH, Reiner A. A 15-Year overview of management and prognosis in primary fallopian tube carcinoma. European Journal of Cancer 1998; 34 (11): 1725-1729.

13. Ekici E, Vicdan K, Danisman N, Emin Soysal M, Cobanoğlu Ö, Gőkmen O. Ultrasonographic appearance of fallopian tube carcinoma – Case report. International Journal of Gynecology & Obstetrics 1995; 49: 325-329.

14. Palma L, Marcus V, Gilbert Lucy, Chong G, Foulkes W. Synchronous occult cancers of the endometrium and fallopian tube in an MSH2 mutation carrier at time of prophylactic surgery – Case report. Gynecologic Oncology 2008; 111: 575-578.

15. FIGO Committee on Gynecologic Oncology. Current FIGO staging for cancer of the vagina, fallopian tube, ovary, and gestational trophoblastic neoplasia. International Journal of Gynecology & Obstetrics 2009; 105: 3-4.

16. Mota F. Cancro da trompa de Falópio. Manual de Ginecologia 2009; 1 (26): 443-447.

17. Berek JS, Natarajan S. Câncer do ovário e da tuba uterina. Berek & Novak Tratado deGinecologia 14ª edição; 35: 1122-1124.

18. Nappi R, Resta L, Nappi L, Loizzi Pasquale. Primary carcinoma of the fallopian tube: report on two cases. European Journal of Obstetrics & Gynecology and Reproductive Biology 1996; 70: 93-96.

19. Krasevic M, Stankovic T, Petrovic O, Severinski NS. Serous borderline tumor of the fallopian tube presented as hematosalpinx: a case report. BMC Cancer 2005; 5:129.

20. Heintz APM, Odicino F, Maisonneuve P, Quinn MA, Benedet JL, Creasman WT, Ngan HYS, Pecorelli S, Beller U. Carcinoma of the Fallopian Tube. 26th Annual report on the results of treatment in gynecological cancer – International Journal of Gynecology and Obstetrics 2006; 95(1): S145-S160

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):114-121

Page 20: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

122

Artigo de Revisão/Review Article

ABSTRACT

Skin lesions associated with pregnancy may be classified into the physiological and pathological types. These latter one include pre-existing dermatoses and the specific dermatoses of pregnancy. Specific dermatoses of pregnancy comprise many skin diseases with different severities, some of which have importante maternal and/or fetal implications. Spontaneous disappearance in the pos-tpartum period is the rule and recurrences in subsequent pregnancies may occur in a few cases.Keywords: skin dideases; pregnancy

Dermatoses específicas da gravidezSpecific skin diseases associated with pregnancy

Ermelindo Tavares*, Elicha Fernandes*, César Martins**

Tavares E, Fernandes E, Martins C

Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Distrital de Santarém

* Interno(a) do Internato Complementar** Assistente Hospitalar Graduado

INTRODUÇÃO

A gravidez é um estado fisiológico transitório du-rante a qual ocorre um conjunto de alterações envol-vendo todos os órgãos e sistemas.

As alterações cutâneas da gravidez podem ser agrupadas nos tipos fisiológicos e patológicos. As alterações fisiológicas são as mais comuns e seu re-conhecimento reveste-se de grande importância uma vez que permite evitar pedidos desnecessários de exames complementares. A maioria surge no início da gravidez e, geralmente, desaparece no fim desta ou após o parto. Em termos clínicos, as lesões podem ser discretas ou, nalguns casos, severas a ponto de mere-cem um tratamento adequado.

O segundo grupo engloba as dermatoses pré-existentes susceptíveis de agravamento ou melhoria

durante a gravidez e as dermatoses específicas da gra-videz, sendo estas últimas as mais preocupantes, uma vez que algumas delas podem comprometer o bem-estar materno e/ou fetal.1,2

Neste trabalho serão abordadas apenas as derma-toses específicas da gravidez, fazendo referência aos seus aspectos etiopatogénicos, clínicos e terapêuticos.

PÁPULAS E PLACAS URTICARIFORMES E PRURIGINOSAS

DA GRAVIDEZ (PPUPG)

PPUPG ou PUPPP (acrónimo inglês para Pruritic Ur-ticarial Plaques and Papules of Pregnancy) é a derma-tose específica da gravidez mais comum.2 Estima-se que ocorra numa em cada 160 gestações (Quadro I).3 A grande prevalência de PUPPP nas primíparas é re-latada por muitos autores.2 Contudo, vários estudos apontaram para a sua habitual ocorrência também nas multíparas.4,5 O aumento excessivo de peso e a hiper-

Page 21: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

123

tensão arterial durante a gravidez também constituem factores de risco. 2,5,6

A etiopatogenia do PUPPP permanece incerta.6 Pensa-se que a rápida distensão cutânea abdominal conduza ao estiramento do tecido conectivo e con-versão de partículas inócuas em antigénios, contra os quais surge uma resposta imunológica.2,4,6 Níveis ele-vados de progesterona e quimerismo periférico (de-pósito materno cutâneo de ADN fetal) também foram apontados como possíveis causas.7

Classicamente, PUPPP inicia-se na parede abdo-minal anterior, em particular sobre as sugilações e, tipicamente, poupa a área periumbilical, situação contrária ao que se verifica no PG (Fig. 1). 2 O início do prurido abdominal intenso coincide com o apare-cimento de pápulas e placas eritematosas, não foli-culares, polimorfas e, por vezes, pseudovesiculares, 2 que em poucos dias se estendem para as mamas, extremidade proximal das coxas e membros superio-res. Lesões em alvo, anulares ou policíclicas podem ser visualizadas num número reduzido de casos.2 A PUPP poupa, habitualmente, a face, as palmas, as plantas e as membranas mucosas.2,6 Embora seja uma

dermatose prevalente no ter-ceiro trimestre de gravidez, em cerca de 15 por cento dos casos pode ocorrer no perío-do postpartum.4

Os exames laboratoriais de rotina são normais e os acha-dos histopatológicos inespecí-ficos. As imunofluorescências directa e indirecta são negati-vas.2,6

O diagnóstico diferencial engloba várias entidades. As lesões urticariformes e pruri-ginosas podem surgir na der-matite de contacto, urticária alérgica de etiologia variada e no exantema viral ou medi-camentoso.2 O PG figura-se como o principal diagnós-tico diferencial.2 O ELISA NC16A é um teste altamente

sensível e específico e que com alguma rapidez per-mite diferenciar PG de PUPPP.8

A corticoterapia tópica, os anti-histamínicos orais2 e os emolientes6 conferem alívio dos sintomas e re-solução das lesões em quase todas as doentes. Num estudo, o propionato de fluticasona a 0.05% foi des-crito como sendo uma opção terapêutica eficaz e com poucos afeitos adversos.9 As situações severas reque-rerem corticoterapia sistémica.2 A resolução ocorre, tipicamente, 7-10 dias após o parto.2 O prognóstico materno-fetal é excelente, sendo rara a sua ocorrência em gravidezes subsequentes.2,10

PRURIGO DA GRAVIDEZ

O prurigo da gravidez (Prurigo of Pregnancy - PP) afecta 1 em cada 300 grávidas.11 Embora tenha sido descrita em todos os trimestres de gravidez, o PP ocorre mais frequentemente entre a 20ª e 34ª semana de gestação.12

A patogenia é desconhecida.3 Trata-se de uma erupção cutânea pruriginosa intensa em que predomi-nam as escoriações, sugerindo um componente emo-

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):122-131

Figura 1. Pápulas e placas urticariformes e pruriginosas da gravidez. (Fonte: Ser-viço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Distrital de Santarém).

Page 22: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

124

cional. Igualmente, é comum uma história pessoal de atopia, 6 assim como níveis séricos elevados de IgE.2

Clinicamente, são observadas pápulas por vezes foliculares ou lesões nodulares, com ou sem crosta central, medindo entre 0.5 e 1.0 cm, localizadas pre-dominantemente sobre as superfícies extensoras das pernas e membros superiores, podendo também afec-tar a porção superior do tronco ou a área abdominal. 2,6 Pústulas foliculares ou não foliculares podem ser visualizadas, mas as bolhas são raras.2 A doença pode persistir durante semanas ou meses após o parto e re-cidivar em gestações subsequentes.2

A avaliação laboratorial é, por definição, normal e a histologia das lesões cutâneas é inespecífica.2 A imunofluorescência (directa e indirecta) é negativa.2 Em 1988, Alcalay et al.13 relataram o caso de uma grávida com lesões pruriginosas, cuja imunofluores-cência directa revelou depósito linear de IgM ao lon-go da MB dermo-epidérmica, tendo denominado esta entidade por Doença IgM linear da gravidez. Segun-do alguns autores, tal achado é inespecífico e, para outros, trata-se duma nova dermatose, com caracte-rísticas clínicas semelhantes ao PP, sendo a presença de IgM na IFD a única forma de distinguir as duas patologias.

Em termos de diagnóstico diferencial, a colestase intra-hepática da gravidez deve ser excluída, assim como as foliculites bacterianas.2

Relatos isolados demonstraram a eficácia dos cor-ticóides tópicos de potência moderada e anti-histamí-nicos orais no tratamento desta afecção, sem alusão a efeitos adversos materno-fetais.

FOLICULITE PRURIGINOSA DA GRAVIDEZ

Trata-se duma dermatose rara, sendo sua incidência estimada em 1/3.000 gestações.14 Contrariamente ao seu nome, o prurido não constitui um achado proemi-nente, e sua apresentação pode, em alguns casos, ser confundida com a foliculite bacteriana. Aparece, geral-mente, entre o quarto e o nono mês de gravidez e sua resolução verifica-se, na maior parte dos casos, duas a três semanas após o parto.15 Porém, tal período pode estender-se entre um ou dois meses.13 Recorrências em gestações subsequentes não foram relatadas.15

A etiologia da foliculite pruriginosa da gravidez (FP) é desconhecida. A sua semelhança com o acne induzido pela corticoterapia ou progestativos chamou a atenção para o papel das variações hormonais du-rante a gravidez.15 Contudo, Vaughan Jones et al. 16

não demonstraram alterações significativas nos níveis séricos de androgénios nas mulheres com FP relativa-mente ao grupo controlo.

Em termos clínicos, a FP manifesta-se como uma erupção acneiforme, caracterizado por múltiplas pápulas e pústulas foliculares, por vezes pruriginosas, medindo entre 2 e 4 mm,6 localizadas habitualmente na porção superior do tronco, braços, ombro e região abdominal.6,15 O diagnóstico é clínico e, em alguns casos, requer exclusão doutras erupções.

O exame histológico revela uma foliculite inflama-tória inespecífica e a imunofluorescência é negativa.6,15 O diagnóstico diferencial engloba o prurigo da gravi-dez, foliculites de etiologia bacteriana e a sarcoptose.15

Verifica-se, no geral, boa resposta ao peróxido de benzoílo tópico a 10%,17 fototerapia com ultravioletas B 4,18 ou esteróides tópicos.19

COLESTASE INTRA-HEPÁTICA DA GRAVIDEZ

A colestase intrahepática da gravidez (CIG) é um dis-túrbio obstétrico raro, cuja prevalência oscila entre 1/1.000 e 1/10.000 gestações.20 Trata-se da segunda causa mais comum de icterícia gestacional, sendo a primeira a hepatite viral.2 É observada comummente em gestantes de idade avançada, multíparas e mulhe-res com história pessoal de colestase por contracep-tivos orais.21 Relata-se, igualmente, história familiar positiva em cerca de 50 por cento dos casos e elevada incidência em gestações gemelares.2

Embora haja variabilidade, o diagnóstico de CIG é estabelecido por parâmetros clínicos e laboratoriais, nomeadamente prurido generalizado com ou sem icterícia e sem história de hepatite viral ou tóxica, ausência de lesões cutâneas, presença de colestase, resolução completa após o parto e recidiva durante gestações subsequentes.2

CG é apontado como um distúrbio multifactorial, contribuindo para a sua génese os factores hormonais, genéticos e ambientais.20

Tavares E, Fernandes E, Martins C

Page 23: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

125

Relativamente aos factores hormonais, os níveis séricos de estrogénios parecem desempenhar um pa-pel importante. Sabe-se que esta dermatose ocorre predominantemente no terceiro trimestre de gravidez e em multíparas, situações caracterizadas por níveis séricos elevados de estrogénios. A conjugação dos ácidos biliares pode ser inibida por estrogénios con-jugados.2 A administração de progestativos exógenos durante o último trimestre de gravidez pode desenca-dear CIG.22

História familiar de CIG em até 50 por cento dos casos,2 elevada incidência em certos grupos popu-lacionais e associação com antigénios leucocitários humano (HLA-A31 e HLA-B8) 6 apontam para uma predisposição genética. A mutação do gene MDR3 (multidrug resistant 3) foi implicada como um dos factores desencadeantes da CIG em algumas famí-lias.23 O MDR3 codifica uma glicoproteína da mem-brana canalicular dos hepatócitos (ABCB4) implica-da na excreção da fosfatidilcolina, cujo deficit está implicado em várias doenças hepatobiliares.22

Em relação aos factores ambientais, a deficiência de selénio como um possível co-factor na génese da CIG foi sugerido por Reyes et al.24

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

Doença maternaO prurido constitui a sintomatologia clássica inicial e aparece, geralmente, no terceiro trimestre2 atingindo as palmas e plantas, progredindo para o tronco e res-tantes áreas cutâneas. As escoriações cutâneas podem estar presentes e é comum o agravamento nocturno do prurido.2 A resolução completa verifica-se 48 ho-ras após o parto.25 A icterícia ocorre em 10 a 25 por cento dos doentes e pode aparecer nas primeiras qua-tro semanas após o inicio do prurido26, resolvendo-se, tipicamente, um a duas semanas após o parto.2 Outras queixas incluem anorexia, epigastralgias e esteator-reia, colúria e acolia fecal.2

A morbilidade e mortalidade materna são baixas. Contudo, a deficiência da vitamina K por malabsor-ção intestinal, se severa ou prolongada, conduz a um prolongamento do tempo de protrombina e da hemor-ragia durante o trabalho de parto.2 Colelitíase e co-

lecistite são observadas com elevada frequência nos doentes com CIG.2

A elevação sérica dos ácidos biliares totais, com níveis até 10-25 vezes acima dos valores normais, constitui o principal achado laboratorial, observando-se um aumento do ácido cólico, uma diminuição do ácido quenodesoxicólico e, consequentemente, um aumento marcado do ratio ácido cólico/ácido cheno-desoxicólico.25 Nos doentes sem icterícia, a elevação dos ácidos biliares na presença de prurido pode ser a única alteração presente (prurido gravidarum).2 Em 60 por cento das grávidas observa-se subida ligeira das transaminases séricas, sendo raro o aumento dos valores de TGO e TGP duas vezes acima do limite superior da normalidade.25 Se estiver presente a hi-perbilirrubinémia, tipicamente os seus valores não ul-trapassam os 6 mg/dL.25. A ecografia hepática revela, geralmente, um parênquima normal.2

A biópsia hepática, embora não seja obrigatória para estabelecer o diagnóstico, quando executada, demonstra colestase centrolobular, sem necrose ou inflamação portal.2

As recidivas em gestações subsequentes ocorrem em 60-70 por cento dos casos, podendo também ser desencadeadas por contraceptivos orais.19

Doença fetalA etiologia das complicações fetais permanece pouco compreendida, podendo estar relacionado com o flu-xo aumentado de ácidos biliares na circulação fetal.27

Num estudo realizado por Glantz A et al., 28 demons-trou-se que a presença de complicações fetais só se verifica na presença de níveis séricos de ácidos bi-liares iguais ou superiores a 40 μmol/L. Verificaram, igualmente, um aumento de um a dois por cento no risco de parto pré-termo espontâneo, de eventos asfi-xiantes e coloração meconial do líquido amniótico, da placenta ou das membranas por cada μmol/L adicio-nal de ácidos biliares séricos.

Parto prematuro, sofrimento fetal (demonstrado por coloração meconial anormal do líquido amnióti-co e anomalias cardiotocográficas) e morte súbita in-tra-uterina constituem as principais complicações da CIG,27 assim como a hemorragia intracraniana, nos raros casos de elevação importante do tempo de pro-

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):122-131

Page 24: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

126

Quadro I

Trimestre de Morfologia Localização Alteração Aumento daDermatose Prevalência gravidez em das lesões habitual laboratoria mortalidade que ocorre fetal

PPUPG 1/160 Terceiro Pápulas e pápulas Abdómen - - urticariformes Extremidade proximal dos membros

PP 1/300 Segundo ou Pápulas foliculares Superfície - - terceiro e não foliculares extensora Nódulos eritematosos dos membros e escoriados

FPG 1/3.000 Segundo e Lesões Tronco e - - terceiro acneiformes membros (pápulas e pústulas foliculares)

CIG 1/1.000- Terceiro Escoriações Tronco Aumento das Sim -10.000 Palmas transaminases Plantas hepáticas, bilirrubinas, sais biliares e tempo de protrombina

PG 1.50.000 Terceiro Lesões Tronco Eosinofilia Não vesículobolhosas (abdómen) periférica Membros IgG anti-BP180 superiores circulante Depósito de C3 ± IgG ao longo da MB

IH S.D. (Poucos Terceiro Lesões Tronco Anemia Sim casos descritos eritema- Membros Leucocitose na literatura topustulosas Generalizado Neutrofilia

mundial) Aumento VS Hipocalcémia Hipofosfatémia Hipoalbuminémia Aumento da creatinina e ureia

PPUPG – Pápulas e placas urticariformes e pruriginosas da gravidezPP – Prurigo da gravidezFPG – Foliculite pruriginosa da gravidezCIG – Colestase intra-hepática da gravidezPG – Penfigóide gestacionalIH – Impetigo herpetiformeMB – membrana basalS.D. – Sem dados

Quadro I. Dermatoses específicas da gravidez: Aspectos epidemiológicos, clínicos, laboratoriais e prognósticos.

Tavares E, Fernandes E, Martins C

Page 25: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

127

trombina, secundária à carência materna de vitamina K (Quadro I).2

Como tal, a maior parte dos autores advoga a in-dução do trabalho de parto as 38 semanas de gestação nos casos ligeiros e, nas situações severas, as 36 se-manas.19

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL E TRATAMENTO

A hepatite viral deve ser excluída serologicamente. A persistência dos sintomas e das alterações das provas hepáticas após o parto é uma complicação rara; como tal, a sua presença também sugere uma doença hepáti-ca subjacente, especialmente a cirrose biliar primária.2

O tratamento de escolha é o ácido ursodesoxicó-lico (AUDC) na dose de 15 mg/Kg/dia.2 Relatou-se, em alguns estudos, controle dos sintomas e redução do risco de complicações fetais com o AUDC.21

Vários estudos demonstraram a eficácia da dexa-metasona na CIG; contudo, ela atravessa facilmente a placenta e, em altas doses, podem surgir repercussões fetais, nomeadamente baixo peso à nascença e ano-malias no desenvolvimento neurológico.27 Marschall et al. sugeriram a combinação de AUDC e rifampici-na para o tratamento de algumas doenças hepatobi-liares colestáticas, sendo uma alternativa para a CIG severa e resistente à monoterapia com AUDC.29

As vitaminas lipossolúveis, especialmente a vita-mina K, devem ser administradas em caso de suspeita de malabsorção.2

PENFIGÓIDE GESTACIONAL

O penfigóide gestacional (PG) ou herpes gestacional constitui uma dermatose auto-imune rara e exclusiva da gravidez e, sem dúvida, a mais importante a ser excluída perante uma dermatose bolhosa.2

A afecção surge, geralmente, durante o segundo ou terceiro trimestre de gravidez, mas pode ocorrer em qualquer período gestacional e no puerpério.1 As-sociação com coriocarcinomas e mola hidatiforme já foi descrita.2 Estima-se que a sua incidência seja de 1/50.000 gestações,30 estando este valor dependente da frequência do HLA-DR3 em diferentes grupos po-pulacionais.31 No geral, as grávidas apresentam ida-

des compreendidas entre os 19 e os 39 anos (média de 30 anos); 1,32 a multiparidade constituiu um achado importante nalguns estudos, particularmente nos paí-ses não ocidentais, onde as taxas podem atingir os 73 por cento.32

A maior parte das gestantes com PG apresenta an-ticorpos IgG1 contra uma proteína transmembranar hemidesmosómica de 180 kDa designada BPAG2 (Bullous Pemphigoid Antigen 2) ou colagénio tipo XVII, um dos principais constituintes do complexo de adesão dermo-epidérmico.1,2 O seu segmento não-colagénico NC16A constitui o principal local respon-sável pela imunorreactividade.33

A ligação dos anticorpos anti-PBAG2 ao domínio NC16A resulta na activação da via clássica do com-plemento, quimiotaxia e desgranulação dos eosinó-filos e, consequentemente, destruição da membrana basal (MB), com perda de coesão dermo-epidérmica e formação de bolhas.2

O factor que determina a produção de anticorpos permanece incerto.2 O cruzamento entre antigénios placentares e cutâneos é apontado como uma possível explicação, sendo apoiado pelo envolvimento inicial da região periumbilical no PG.13 Estudos imunoge-néticos revelaram grande incidência de antigénios HLA-DR3 e DR4.2,32

Clinicamente, o PG manifesta-se pelo apareci-mento de pápulas e placas urticariformes, prurigino-sas, circulares ou policíclicas localizadas ao tronco (área abdominal), sobre as quais surgem lesões ve-sículo-bolhosas com diâmetro por vezes superior a 0.5 mm 32 e que rapidamente se tornam generalizadas (Fig. 2); tipicamente, as palmas, as plantas, a face e as mucosas são poupadas.2 A maior parte das pacientes encontra-se no último trimestre de gravidez e até 1/4 no puerpério.2,31 O inicio das lesões a nível umbilical ou periumbilical constitui um dado importante, po-dendo ser encontrado em até 73 por cento dos casos.32

A variabilidade em termos de evolução clínica é um achado comum. Grande número de pacientes apresenta resolução espontânea das lesões durante o período final da gravidez2 ou várias semanas ou me-ses após o parto.1,30 Há vários relatos de exacerbação durante gravidezes subsequentes, menstruação ou toma de contraceptivos orais.2,34,35

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):122-131

Page 26: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

128

Lesões urticariformes, vesículas e bo-lhas, geralmente auto-limitadas, podem surgir em 5-10 por cento dos recém-nasci-dos.36 Dados científicos apontam para um risco acrescido de prematuridade e recém-nascidos pequenos para a idade gestacio-nal (PIG).37 Nenhum estudo comprovou o aumento da mortalidade ou morbilidade fetal, assim como benefício da corticotera-pia sistémica na redução do risco de parto prematuro.2

As pápulas e placas urticariformes e prurigino-sas da gravidez (PPUPG) constituem o principal no diagnóstico diferencial do PG, sendo, por vezes, cli-nicamente difícil distinguir as lesões urticáricas que caracterizam cada uma delas.2 As lesões vesículo-bolhosas, envolvimento dos recém-nascidos e os achados na imunofluorêscencia (directa e indirecta) e exame histopatológico estão presentes apenas no PG. A dermatite de contacto alérgica e a erupção medicamentosa são outras entidades a ter em con-sideração.

A corticoterapia sistémica (prednisolona 0.5 mg/kg/dia) está indicada nas formas severas e é eficaz em quase todos os casos.1,2,32 Os corticóides tópicos de potência alta e os anti-histamínicos orais podem ser associados nos casos severos ou constituir o úni-co tratamento nos casos ligeiros a moderados.32 As calcificações placentares e o baixo peso à nascença constituem possíveis efeitos adversos do tratamento

Figura 2. Penfigóide gestacional: (a) Re-gião abdominal e (b) dorso das mãos. (Cor-tesia do Departamento de Dermatologia do Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa).

Tavares E, Fernandes E, Martins C

a

b

Segundo vários autores, as pacientes com história pessoal de PG apresentam um risco elevado de desen-volver outras doenças auto-imunes, nomeadamente a doença de Graves, tiroidite de Hashimoto, doença de Addison, diabetes mellitus tipo 1 e lúpus eritematoso sistémico.38,39

Uma hipereosinofilia periférica pode estar presen-te em 50 por cento das doentes,32 podendo existir cor-relação entre a taxa de eosinófilos, IgG circulante e a gravidade de expressão do PG.40

Classicamente, o exame histológico demonstra vesículas e bolhas sub-epidérmicas e presença dum infiltrado linfo-eosinofílico perivascular.2 O depósito linear de C3, com ou sem IgG, ao longo da MB der-mo-epidérmica na imunofluorescência directa (IFD) de pele peri-lesional contribui para o diagnóstico de-finitivo.2,32 IgG circulante (“factor do herpes gesta-cional”) é detectada por imunofluorescência indirecta (IFI) num grande número de casos.2,32

Page 27: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

129

sistémico.2 A dapsona, a doxiciclina, o metotrexato, a imunoglobulina endovenosa (IgIV), a ciclofosfamida e a ciclosporina foram usados em ensaios não-contro-lados, com resultados variáveis.2

O prognóstico do PG é favorável.32 A prematuri-dade2,32 e PIG2 são possíveis complicações.

DERMATITE AUTO-IMUNE À PROGESTERONA

A dermatite auto-imune à progesterona (DAIP) é uma entidade rara e, embora não seja considerada uma der-matose específica da gravidez, pode aparecer, melhorar ou agravar durante o período gestacional ou no puerpé-rio.2,41,42 A sua etiopatogenia permanece controversa, contudo vários estudos apontam para um processo au-to-imune mediado por linfócitos T helper tipo 1 (Th1), tendo como alvo principal a progesterona.41

Classicamente, as lesões da dermatite auto-imune à progesterona surgem durante a fase lúteínica do ciclo menstrual podendo, clinicamente, apresentar múltiplos espectros (urticária, eczema, eritema mul-tiforme, foliculite, estomatite, dermatite herpetifor-me-like, síndrome de Stephens-Johnson, erupções vesículobolhosas e erosões mucosas).2,41,43 Os níveis elevados de progesterona durante a gravidez podem justificar o agravamento da doença. Em relação à sua melhoria durante esse período, várias são as explica-ções apontadas por inúmeros autores: baixos níveis de progesterona que pode actuar como método de dessensibilização, imunossupressão e produção ma-terna aumenta de glicocorticóides.44,45

Os critérios de diagnóstico da DAIP foram pro-postos por Warrin46 e incluem: (1) lesões cutâneas relacionadas com o ciclo menstrual, (2) positividade para injecção intradérmica de progesterona e (3) me-lhoria clínica com anovulatórios. O teste da proges-terona consiste na injecção intradérmica de 0.01 mL de uma suspensão aquosa de progesterona (50 mg/mL), sendo considerada positiva o aparecimento no local da picada de lesões urticariformes [30 minutos (reacção imediata)] ou eritema e induração [24-48h (reacção retarda)].2,41

O diagnóstico diferencial inclui outras dermatoses caracterizadas por flare pré-menstrual, nomeadamen-te o acne, a dermatite herpetiforme, o eritema multi-

forme, o líquen plano, o lúpus eritematoso sistêmico e a psoríase.43

O tratamento clássico consiste na supressão da ovu-lação recorrendo aos anovulatórios contendo estrogé-nios.2 O tamoxifeno e o danazol são eficazes em alguns casos.2,41 A oofarectomia bilateral é uma opção eficaz nos casos refractários ao tratamento médico.47 Embora falíveis em grande número de doentes, os corticóides e os anti-histamínicos sistémicos podem constituir op-ção terapêutica segura durante a gravidez.48

PSORÍASE PUSTULOSA GENERALIZADA DA GRAVIDEZ

A psoríase pustulosa generalizada da gravidez, tam-bém conhecida por impetigo herpetiforme (IH), é uma dermatose pustulosa rara, de etiopatogenia des-conhecida, descrita pela primeira vez no século XIX por Von Hebra.49 A designação impetigo herpetiforme é imprópria, pois a dermatose não está relacionada nem com o impetigo (infecção estafilocócica) e nem com infecção herpética.

O IH surge geralmente durante o terceiro trimes-tre de gravidez49,50 e caracteriza-se pelo aparecimento de lesões com características clínicas e histopatológi-cas semelhantes às da psoríase.49 Clinicamente, uma erupção eritematopustulosa inicia-se em geral nas pregas e acompanha-se de sintomatologia geral: fe-bre, calafrios, náuseas, vómitos, diarreia, artralgias, mal-estar e convulsões.49,50 O quadro progride com envolvimento bilateral e simétrico de extensas áreas cutâneas por bolhas de conteúdo purulento, cuja rup-tura origina erosões e crostas pouco aderentes, sendo raro o envolvimento das mucosas.49

Em termos histológicos, observa-se pústula sub-córnea preenchida por neutrófilos e um infiltrado inflamatório perivascular constituído por linfócitos e neutrófilos.50 Os achados laboratoriais comummen-te encontrados incluem: leucocitose com neutrofilia, aumento da velocidade de sedimentação (VS), hipo-calcémia, hipofosfatémia, hipoalbuminémia e anemia por deficiência de ferro.49,51 O diagnóstico diferencial inclui toxidermias pustulosas e o penfigóide gestacio-nal, sendo importante a histopatologia para a confir-mação diagnóstica.49

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):122-131

Page 28: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

130

O internamento com vigilância geral e obstétrica é imperativo. A corticoterapia sistémica (prednisona ou equivalente na dose 1 mg/kg/dia, per os) é o trata-mento de primeira linha.49,50 São igualmente impor-tantes o equilíbrio hidroelectrolítico e aplicação cutâ-nea de emoliente. A ciclosporina A pode ser usada nos casos refractários aos corticóides, isoladamente ou em associação aos mesmos.49,50 A antibioterapia sistémica está indicada em caso de infecção bacteria-na secundária.

Em relação ao prognóstico, o risco de morte ma-terno e/ou fetal é elevado.56 As complicações mater-nas, embora pouco observadas na actualidade, in-cluem delírio, convulsões, tetania, insuficiência renal e alterações do ritmo cardíaco. 49,50 Em ternos fetais, podem ocorrer morte fetal, anomalias fetais por insu-ficiência placentar (atraso de crescimento intra-uteri-no) e morte neonatal.50,52 A doença regride no período postpartum e recorre em gravidez subsequentes.41,49,50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Cobo MF, Santi CG, Maruta CW, Aoki V. Pemphigoid gestationis: clinical and laboratory evaluation. Clinics 2009; 69 (11): 1043-1047.

2. Shornick JK. Pregnancy dermatoses. In: Dermatology (2nd edition). Bolognia JL, Jorizzo JL, Rapini RP, et al (eds). Mosby Elsevier; 2008: 1421-1435.

3. Vaughan Jones SA, Black MM. Pregnancy dermatoses. J Am Acad Dermatol. 1999; 40: 233-241.

4. Rudolph CM, Al-Fares S, Vaughan-Jones SA, Müllegger RR, Kerl H, Black MM. Polymorphic eruption of pregnancy: clinicopathology and potential trigger factors in 181 patients. Br J Dermatol. 2006; 154(1): 54-60.

5. Ohel I, Levy A, Silberstein T, Holcberg G, Sheiner E. Pregnancy outcome of patients with pruritic urticarial papules and plaques of pregnancy. J Matern Fetal Neonatal Med. 2006; 19(5):305-308.

6. Sachdeva S. The dermatoses of pregnancy. Indian J Dermatol. 2008; 53:103-105

7. Ahmadi D, Powell FC. Pruritic urticarial papules and plaques of pregnancy: current status. Australas J Dermatol. 2005; 46: 53-58.

8. Powell AM, Sakuma-Oyama Y, Oyama N, et al. Usefulness of BP180 NC16a Enzyme-Linked Immunosorbent Assay in the Serodiagnosis of Pemphigoid Gestationis and in Differentiating Between pemphigoid gestationis and pruritic urticarial papules and plaques of pregnancy. Arch Dermatol. 2005; 141:705-710

9. Scheinfeld N. Pruritic urticarial papules and plaques of pregnancy wholly abated with one week twice daily application of fluticasone propionate lotion: a case report and review of the literature. Dermatol Online J. 2008; 14(11): 4.

10. Matz H, Orion E, Wolf R. Pruritic urticarial papules and plaques of pregnancy: polymorphic eruption of pregnancy (PUPPP). Clin Dermatol. 2006; 24(2): 105-108.

11. Kroumpouzos G, Cohen LM. Dermatoses of pregnancy. J Am Acad

Dermatol. 2001; 45: 1-19.12. Dermatoses bolhosas crónicas. In: Andrews Doenças de pele (10ª

edição). James WD, Berger TG, Elston DM (eds). Elsevier Editora Ltda; 2007: 459-478.

13. Alcalay J, Ingber A, Hazaz B, David M, Sandbank M. Linear IgM dermatosis of pregnancy. J Am Acad Dermatol. 1988; 18(2): 412-415.

14. Roger D, Vaillant L, Fignon A, et al. Specific pruritic diseases of pregnancy: A prospective study of 3192 pregnant women. Arch Dermatol. 1994; 130:734-739.

15. Kede MPV, Costa VFS. Doenças da gravidez. In: Ramos-e-Silva M, Castro MCR, et al. Fundamentos de dermatologia. Rio de Janeiro: Atheneu; 2009: p. 1957-1962.

16. 27. Vaughan Jones SA, Hern S, Nelson-Piercy C, Seed PT, Black MM. A prospective study of 200 women with dermatoses of pregnancy correlating clinical findings with hormonal and immunopathological profiles. Br J Dermatol. 1999; 141:71-81.

17. Alves GF, Nogueira LSC, Varela TCN. Dermatologia e gestação. An Bras Dermatol. 2005; 80 (2): 179-186.

18. Reed J, George S. Pruritic folliculitis of pregnancy treated with narrowband (TL-01) ultraviolet B phototherapy. Br J Dermatol. 1999; 141(1): 177-179.

19. Soutou B, Régnier S, Nassar D, Parant O, Khosrotehrani K, Aractingi S. Dermatological manifestations associated with pregnancy. Expert Review of Dermatology CME. 2009 [cited 2009 Aug 1]; 4(4). Available from: http://cme.medscape.com/viewarticle/706769.

20. Lee NM, Brady CW. Liver disease in pregnancy. World J Gastroenterol 2009; 15(8): 897-906.

21. Reyes H. Review: intrahepatic cholestasis. A puzzling disorder of pregnancy. J Gastroenterol Hepatol. 1997; 12: 211-216.

22. Hardikar W, Kansal S, Elferink RPJO, Angus P. Intrahepatic cholestasis of pregnancy: When should you look further? World J Gastroenterol 2009; 15(9): 1126-1129.

23. Jacquemin E, Cresteil D, Manouvrier S, Boute O, Hadchouel M. Heterozygous non-sense mutation of the MDR3 gene in familial intrahepatic cholestasis of pregnancy. Lancet 1999;353: 210-211.

24. Reyes H, Báez ME, González MC, et al. Selenium, zinc and copper plasma levels in intrahepatic cholestasis of pregnancy, in normal pregnancies and in healthy individuals, in Chile. J Hepatol. 2000; 32(4): 542-549.

25. Lee NM, Brady CW. Liver disease in pregnancy. World J Gastroenterol 2009; 15(8): 897-906.

26. Kondrackiene J, Kupcinskas L. Intrahepatic cholestasis of pregnancy-current achievements and unsolved problems. World J Gastroenterol. 2008; 14(38): 5781-5788.

27. Geenes V, Williamson C. Intrahepatic cholestasis of pregnancy. World J Gastroenterol 2009; 15(17): 2049-2066.

28. Glantz A, Marschall HU, Mattsson LA. Intrahepatic cholestasis of pregnancy: Relationships between bile acid levels and fetal complication rates. Hepatology. 2004; 40(2): 467-474.

29. Elling SV, Powell FC. Physiological changes in the skin during pregnancy. Clin. Dermatol. 1997; 15 (1): 35-43.

30. Holmes RC, Black MM, Dann J, et al. A comparative study of toxic erythema of pregnancy and herpes gestationis. Br J Dermatol. 1982; 106: 499-510

31. Shornick JK, Meek TJ, Nesbitt LT, et al. Herpes gestationis in blacks. Arch Dermatol. 1984; 120: 511-513.

32. Boudaya S, Turki H, Meziou TJ, et al. Pemphïgoide gestationis: une étude de 15 cas. J Gynecol Obstet Biol Reprod 2003; 32: 30-34.

33. Shornick JK Bangert JL, Freeman RG, et al. Herpes gestationis: clinical

Tavares E, Fernandes E, Martins C

Page 29: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

131

and histologic features of twenty-eight cases. J Am Acad Dermatol. 1983; 8: 214-224.

34. Al-Fouzan AS, Galadari I, Oumeish OY. Herpes Gestationis (Pemphigoid Gestationis). Clin Dermatol. 2006; 24:109-112.

35. Engineer L, Bhol K, Ahmed AR. Pemphigoid gestationis: A review. Am J Obstet Gynecol. 2000; 183: 483-491.

36. Shimanovich I, Brocker EB, Zillikens D. Pemphigoid gestationis: New insights into pathogenesis lead to novel diagnostic tools. BJOG 2002; 109: 970-976.

37. Shornick JK, Black MM. Fetal risks in herpes gestationis. J Am Acad Dermatol. 1992; 26: 63-68.

38. Shornick JK, Black MM. Secondary autoimmunes diseases in herpes gestationis (pemphigoid gestationis). J Am Acad Dermatol. 1992; 26: 563-566.

39. Cunningham FG, McDonnald PC, Gant NF, Leveno KJ, Gilstrap LC. William Obstetrics. East Norwalk (Connecticut): Appleton and Lange 1993; 1260-1261.

40. Borrego L, Peterson EA, Diez LI, el al. Polymorphic eruption of pregnancy and herpes gestationis: comparison of granulated cell proteins in tissue and serum. Clin Exp Dermatol. 1999; 24(3): 213-225.

41. Dermatite atópica, eczema e distúrbios não-infecciosos de imunodeficiência. In: Andrews Doenças de pele (10ª edição). James WD, Berger TG, Elston DM (eds). Elsevier Editora Ltda; 2007: 69-138.

42. Herzberg AJ, Strohmeyer CR, Cirillo-Hyland VA. Autoimmune progesterone dermatitis. J Am Acad Dermatol. 1995; 32(2 Pt 2): 333-38.

43. Oskay T, Kutluay L, Kaptanoğlu A, Karabacak O. Autoimmune progesterone dermatitis. Eur J Dermatol. 2002; 12(6): 589-91.

44. Farah FS, Shbaklu Z: Autoimmune progesterone urticaria. J Allergy Clin Immunol 1971, 48:257-261.

45. Bierman SM: Autoimmune progesterone dermatitis of pregnancy. Arch Dermatol 1973, 107:896-901.

46. Warin AP. Case 2. Diagnosis: erythema multiforme as a presentation of autoimmune progesterone dermatitis. Clin Exp Dermatol 2001; 26:107-8.

47. Medeiros S, Rodrigues-Alves R, Costa M, Afonso A, Rodrigues A, Cardoso J. Autoimmune progesterone dermatitis: treatment with oophorectomy. Clin Exp Dermatol. 2010; 35(3): e12-3.

48. Baptist AP, Baldwin JL. Autoimmune progesterone dermatitis in a patient with endometriosis: case report and review of the literature. Clin Mol Allergy. 2004; 2(1): 10.

49. Impetigo herpetiforme (Psoríase pustulosa generalizada da gravidez). In: Dermatologia. Guerra Rodrigo F, Marques Gomes M, Mayer-da-Silva A, Filipe PL (eds). Calouste Gulbenkian; 2010: 539-40.

50. Roth MM, Feier V, Cristodor P, Moguelet P. Impetigo herpetiformis with postpartum flare up: a case report. Acta Dermatovenerol Alp Panonica Adriat. 2009; 18(2): 77-82.

51. Breier-Maly J, Ortel B, Breir F, et al. Generalized pustular psoriasis of pregnancy. Dermatology. 1999; 198: 61–4.

52. Valdés E, Núñez T, Pedraza D, Muñoz H. Recurrent Impetigo Herpetiformis: successfully managed with cyclosporine. Report of one case. Rev Med Chil. 2005; 133: 1071-4.

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):122-131

Page 30: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

132

Artigo de Revisão/Review Article

ABSTRACT

Schizophrenia is a chronic mental disorder with etiopathogenic mechanisms that are not fully un-derstood. The latest research has focused on the relevance of the prenatal period in neurodevelop-ment, as a period of particular vulnerability to early environmental exposures. This knowledge has strengthened the neurodevelopmental hypothesis of schizophrenia. A broad range of potential early environmental risk factors have been identified, such as gestation and delivery complications, expo-sure to influenza virus, maternal food deprivation, and Rh incompatibility, all of which have been consistently associated with a greater likelihood of developing schizophrenia. In spite of these as-sociations, there are important limitations to currently available evidence, and it is still insufficient to establish a definite causal relationship. Moreover, the physiopathological mechanisms underlying these associations are still unknown.Keywords: prenatal care; risk factors; schizophrenia

Factores de risco pré-natais e esquizofreniaPrenatal risk factors and schizophrenia

Ana Eduarda Ribeiro*

Hospital de Magalhães Lemos — Porto

* Interna Complementar de Psiquiatria

INTRODUÇÃO

A esquizofrenia é uma perturbação mental crónica, que habitualmente se manifesta entre a adolescência e o início da idade adulta, e cuja terapêutica dispo-nível na actualidade é meramente sintomática. Afec-ta menos de 1% da população mundial, sendo a sua incidência discretamente superior nos indivíduos do sexo masculino e nos meios urbanos. Pode ser cau-sa de incapacidade significativa e duradoura e exigir cuidados hospitalares regulares, bem como apoio na reabilitação psico-social, constituindo, nesses casos, um problema nuclear da saúde pública mundial.1

Desconhecem-se os processos etiológicos da es-quizofrenia.1 Apesar dos avanços recentes da biologia molecular, nenhuma mutação genética tem sido con-

sistentemente associada a um risco superior de esqui-zofrenia, e a natureza precisa da contribuição da ge-nética nesta perturbação permanece por esclarecer. A provável diversidade etiológica, os padrões complexos de interacção gene-ambiente e a ausência de esclareci-mento da fisiopatologia da esquizofrenia encontram-se entre as explicações possíveis para a escassa compre-ensão da etiopatogénese da perturbação.2

Têm sido identificados vários factores de risco am-bientais potenciais, como as complicações do parto ou gestacionais, a exposição às epidemias de influenza, a privação nutricional materna na gravidez, a incom-patibilidade Rh ou as condições de nascimento. Estas intercorrências, globalmente designadas por com-plicações obstétricas, verificam-se sistematicamente mais frequentes em doentes esquizofrénicos do que em controlos sem a doença. As complicações mencio-nadas têm sido organizadas, pelos diversos autores,

Ribeiro AE

Page 31: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

133

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):132-136

em intercorrências da gravidez (como hemorragias, diabetes gestacional, pré-eclâmpsia ou incompatibi-lidade Rh), atraso do crescimento e desenvolvimento intra-uterino (como baixo peso à nascença, malfor-mações congénitas ou perímetro cefálico reduzido) e complicações do parto (como hipóxia fetal, cesariana de urgência ou trabalho de parto hipotónico).1

A natureza destes factores ambientais tem sugeri-do que a esquizofrenia resulta de um processo patoló-gico do neurodesenvolvimento, e tem tido um papel crucial na validação do modelo etiológico do desen-volvimento da esquizofrenia e da importância das in-fluências ambientais muito precoces.1,3 Reforça ainda o pressuposto da existência de um período específi-co de maturação, de maior vulnerabilidade cerebral aos fenómenos ambientais.4 Contudo, os mecanismos fisiopatológicos exactos associados a estes factores permanecem desconhecidos.1

Desta forma, a esquizofrenia tem sido reformula-da como uma doença do neurodesenvolvimento.1

COMPLICAÇÕES OBSTÉTRICAS

A primeira referência à possível associação entre com-plicações obstétricas e esquizofrenia foi publicada no American Journal of Psychiatry em 1934 por Rosanoff et al, com base no estudo de 142 pares de gémeos. A es-quizofrenia foi, então, interpretada como uma síndrome de descerebração resultante do traumatismo do parto.3

Em 1956, Pasamanick et al averiguaram a história prévia de complicações obstétricas em crianças com alterações comportamentais e propuseram uma teoria clássica - com grande impacto no campo da pedopsi-quiatria - de um continuum de causalidade reprodutiva, segundo o qual a gravidez e o parto teriam o potencial de condicionar um gradiente de complicações na crian-ça: morte fetal ou neonatal, paralisia cerebral, epilepsia, deficiência mental e perturbações do comportamento.3

Albert e Albee, em 1956, alertaram para o bai-xo peso ao nascer de 52 indivíduos esquizofrénicos, quando comparados com os seus irmãos saudáveis.3

A fase seguinte da literatura incidiu no desenho de “alto risco”, que focava a abordagem em filhos de indivíduos psicóticos - com risco de desenvolver es-quizofrenia dez a quinze vezes superior -, estratégia

que foi abandonada em virtude da avalanche de resul-tados negativos.3

O desenvolvimento das técnicas de neuroimagem trouxe expectativas no que concerne à teoria do com-promisso do neurodesenvolvimento da esquizofrenia, segundo a qual a doença é causada por uma lesão cerebral estática oriunda da interacção de factores genéticos e ambientais, que interferem com os nor-mais processos de maturação cerebrais. Contudo, os avanços no conhecimento baseados na neuroimagem têm-se revelado lenta e subtilmente e desconhecem-se, por enquanto, lesões estruturais específicas res-ponsáveis pela doença.1,3

O primeiro estudo observacional de caso-controlo foi publicado em 1987 por Lewis e Murray e salienta-va o facto de os esquizofrénicos terem mais frequente-mente história de complicações obstétricas do que os indivíduos com outras patologias psiquiátricas. Uma importante consequência deste estudo foi a introdução da escala de Lewis-Murray, de averiguação retrospec-tiva padronizada de 15 tipos de complicações obsté-tricas. A facilidade de realização dos estudos de caso-controlo e a disponibilidade de informação através dos registos clínicos deu origem a um rol de publicações que pretendiam esclarecer a associação entre compli-cações obstétricas e esquizofrenia, no início dos anos 1990s. Contudo, os estudos publicados continham di-versas limitações metodológicas, como a ausência de grupos de controlos, o recurso a controlos irmãos, o uso de variações da escala de Lewis-Murray, a intro-dução de viés de selecção e de informação (memória), entre outros, questões que limitaram a interpretação dos achados. Esta “epidemiologia circular”, com per-severança num nível único de evidência, não permitiu elucidar a associação em causa.3,4

Em 1995, Geddes e Lawrie publicaram uma meta-análise de doze estudos de caso-controlo que utilizavam a escala de Lewis-Murray, concluindo por uma modesta associação entre o que consideraram o laxo conceito de complicações obstétricas e esquizofrenia (OR = 2,0 IC 95% (1,6-2,4)). De forma a obterem maior precisão e po-der estatístico suficiente para detectar associações entre complicações obstétricas específicas, os autores utiliza-ram os dados individuais dos 700 doentes e 835 contro-los que entraram nos vários estudos que analisaram. Pela

Page 32: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

134

primeira vez, averiguaram-se associações significativas entre esquizofrenia e complicações obstétricas específi-cas como a ruptura prematura de membranas (OR 3,11; IC 95% 1,39-6,95; p=0,006) e idade gestacional inferior a 37 semanas (OR=2,44; IC 95% 1,13-5,26; p=0,023); encontraram ainda uma associação entre esquizofrenia e a necessidade de reanimação ou de permanecer numa incubadora (OR=2,21; IC 95% 1,38-3,54; p=0,001). Embora esta meta-análise tivesse permitido investigar associações com complicações obstétricas particulares que individualmente constituíam eventos raros, o estudo apresentou diversas limitações. Utilizou apenas estudos que fizeram uso da escala de Lewis-Murray, facto que terá condicionado um viés de selecção e, eventualmente, uma sobrestimativa do risco. Ainda, o recurso à avalia-ção retrospectiva da exposição poderá ter dado origem a um viés de memória e, consequentemente, ameaçado a validade dos resultados. Os autores também previram viés de publicação, sob a suspeita que pequenos estudos com resultados negativos tivessem sido omitidos.3,5

Desde o final dos anos 1990s que têm surgido múlti-plos estudos prospectivos de grandes dimensões e base populacional, com riscos calculados para complicações obstétricas individuais e com ajustamentos (empare-lhamento ou estatístico) para potenciais confundidores. Cannon et al (2002) publicaram uma meta-análise de oito estudos de coorte prospectivos de base populacio-nal em que, pela primeira vez, foram sistematizados três grupos de complicações obstétricas significativamente associadas a esquizofrenia: 1) complicações da gravi-dez (hemorragia, diabetes, incompatibilidade Rh e pré-eclâmpsia); 2) atraso no crescimento/desenvolvimento fetal (baixo peso ao nascer, malformações congénitas e perímetro cefálico reduzido); 3) complicações do parto (trabalho de parto hipotónico, hipóxia fetal, cesariana de urgência).3 A teoria explicativa mais popular consi-dera que o mecanismo patogénico comum e subjacente às complicações obstétricas associadas à esquizofrenia envolve a perturbação da circulação fetal, com subse-quente hipóxia ou desnutrição fetal crónica.2,3,4 Sabe-se que as regiões cerebrais mais implicadas na esquizo-frenia (ex. hipocampo) são particularmente sensíveis à hipóxia.1 Desta forma, o efeito neurotóxico da hipóxia fetal condicionaria alterações no neurodesenvolvimento precoce e constituiria um factor de vulnerabilidade para

a esquizofrenia. Por isso mesmo, é consensual que em estudos posteriores se impõe a necessidade de um in-dicador de hipóxia mais específico.3,5 Foram ainda su-geridos mecanismos auto-imunes na associação entre incompatibilidade Rh e esquizofrenia. O baixo peso ao nascer foi também considerada uma variável relaciona-da com outra influência adversa, genética ou ambiental, do feto em desenvolvimento.3 Resumindo, os mecanis-mos que estão na base destas associações permanecem por estabelecer.1

Em 2007 Byrne et al publicaram um estudo de caso-controlo aninhado na coorte do Danish national register study, trabalho pioneiro no controlo rigoroso do efeito de vários potenciais confundidores (factores de risco para esquizofrenia, como história familiar de doença psiquiátrica, idade parental, factores so-cioeconómicos ou demográficos (ex.: nascimento em local urbano)), ou variáveis modificadoras de efeito (as restantes complicações obstétricas, sexo, história familiar). Apurou-se um risco acrescido de esquizo-frenia após infecção materna por influenza durante a gravidez, ameaça de parto pré-termo, parto pré-termo, pré-eclâmpsia e sépsis materna, resultados que foram de encontro aos obtidos em trabalhos anteriores. O facto de contemplar apenas esquizofrenias de início precoce (até aos 19 anos de idade) constituiu uma das maiores limitações deste estudo, não sendo os resulta-dos generalizáveis para todos os tipos de esquizofre-nia. Acresce-se ainda um pequeno poder estatístico, apesar de ser o mais abrangente até à data. Foi, no entanto, o trabalho que abordou a gama mais vasta de complicações obstétricas até ao momento, e um dos poucos que colocou o enfoque no período pré-natal.6

Recentemente, as coortes de nascimento têm cons-tituído uma mais-valia na investigação de eventos (sociais, biológicos e ambientais) muito precoces do desenvolvimento implicados na esquizofrenia, com a vantagem de não se colocarem as limitações metodo-lógicas de outros estudos observacionais. A título de exemplo, o Northern Finland 1966 Birth Cohort Study acompanhou 11017 recém-nascidos e permitiu a identi-ficação de factores de risco para a esquizofrenia, nomea-damente o baixo peso ao nascer (OR=2,4) ou parto pré-termo (OR=3,5).7,8 Também o Swedish National Birth Register acompanhou 507516 nascimentos ocorridos

Ribeiro AE

Page 33: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

135

entre 1973 e 1977, tendo encontrado associações entre pré-eclâmpsia (OR=2,5), parto instrumental (OR=1,7) ou malformações neonatais (OR=2,4) e esquizofrenia.4

A título de curiosidade, alguns autores calcularam a fracção atribuível populacional que se revelou bai-xa - 7% (Jones et al, 1998) ou 3 a 7% (Geddes et al, 1999) -, sugerindo que, pelo menos naquelas popula-ções, poucos casos de esquizofrenia seriam preveni-dos pela supressão dos factores de risco pré-natais.4

PERÍODO PRÉ-NATAL

Ultimamente, a atenção científica tem-se centrado no período pré-natal, mais concretamente em variá-veis como infecções víricas, alterações imunológicas, privação nutricional ou exposições tóxicas durante a gravidez. Se os estudos ecológicos permitiram le-vantar hipóteses de variáveis pré-natais específicas, das quais se destacam a exposição ao influenza ou a privação nutricional, posteriormente as coortes de nascimento têm-se revelado primordiais na avaliação prospectiva e mais fiável de potenciais factores de ris-co pré-natais para a esquizofrenia.1,3

Mednick et al sugeriram, pela primeira vez, que os Finlandeses expostos à epidemia de 1957 do influenza tipo A2, durante o segundo trimestre de gravidez, ti-nham uma ocorrência superior de esquizofrenia do que os indivíduos não expostos. A posterior evidência que surge neste sentido ou tem um desenho ecológico, ba-seado nas epidemias de influenza, ou recorre aos relatos retrospectivos das mães para definir a exposição, ques-tões que podem justificar os resultados inconsistentes que têm sido publicados.1,9 De forma a contornar estas limitações metodológicas, Brown et al realizaram, em 2004, um estudo de caso-controlo aninhado numa co-orte de nascimento (Prenatal Determinantes of Schizo-phrenia Study – 1959 a 1966) que acompanhou cerca de 20000 mulheres grávidas da Califórnia do Norte, recorrendo pela primeira vez à análise do soro ma-terno para definir a exposição à infecção. A infecção por influenza documentada serologicamente associou-se a um risco sete vezes superior quando ocorrida no primeiro trimestre, e três vezes superior quando con-siderada na primeira metade da gravidez. Os autores calcularam um risco atribuível populacional de cerca

de 14%, o que, em teoria, parece uma porção razoável de casos potencialmente evitáveis através de medidas simples como a vacinação de mulheres grávidas ou em idade reprodutiva.8,9

Pensa-se que a expressão de citoquinas pró-in-flamatórias e outros mediadores pró-inflamatórios consequentes à infecção possam interferir no normal desenvolvimento cerebral fetal, e que este insulto in-flamatório precoce condiciona alterações cerebrais a longo prazo. Esta teoria tem recebido o apoio de es-tudos com modelos animais, nos quais têm sido detec-tadas alterações comportamentais, cognitivas e neu-roquímicas em ratinhos após a exposição pré-natal ao influenza; algumas destas alterações melhoram após o tratamento com antipsicóticos. Estes resultados su-gerem que alterações imunes pré-natais podem estar causalmente associadas a alterações comportamentais e farmacológicas psychosis-like.10

O trágico Dutch Hunger Winter de 1944 – 1945 constituiu uma oportunidade única de investigação do papel da desnutrição materna no desenvolvimento de outcomes psiquiátricos, devido à sua restrição no espaço e delimitação temporal bem conhecida. O Du-tch Famine Sutdy é um trabalho clássico de natureza ecológica – mas baseado em coortes de nascimento - que representou a primeira evidência de que a priva-ção nutricional materna no período pré-concepcional aumenta em cerca de duas vezes o risco de esquizo-frenia nos descendentes.11

Posteriormente, também a Great Leap Forward Fa-mine na China, decorrida entre 1959 e 1961, originou estudos no mesmo sentido. Song et al comparam três coortes de nascimento (antes, durante e após o perí-odo de fome) e verificaram que a exposição à fome no período pré-natal condicionou um aumento do risco de esquizofrenia em cerca de duas vezes, apenas nas zonas urbanas do país. Os autores salientaram que o seu estudo replicou os resultados obtidos na popula-ção holandesa, apesar das diferenças na dieta, etnia e gravidade da fome. O défice nutricional materno pré-natal, particularmente de folatos, parece ser a ex-plicação mais plausível para estes factos, embora os efeitos psicológicos deletérios da experiência de fome não possam ser excluídos.12,13 Mais uma vez, a grande limitação deste estudo foi o facto de ser baseado num

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):132-136

Page 34: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

136

desenho ecológico, logo o estado nutricional materno não foi documentado ao nível individual.4 No futuro, a privação nutricional deverá ser estudada com mais pormenor, impondo-se a distinção do papel dos vários macro- e micronutrientes individualmente.8

As exposições químicas (ex. chumbo) durante a gravidez também têm constituído um novo alvo de estudo dentro dos determinantes da esquizofrenia. A coorte de nascimento Prenatal Determinants of Schi-zophrenia study dedicou-se a esta exposição, tendo en-contrado um risco de desenvolver esquizofrenia duas vezes superior nos indivíduos expostos ao agente.1,8

CONCLUSÕES

A evidência das últimas décadas tem sublinhado a importância do período pré-natal como um momen-to crucial no neurodesenvolvimento, constituindo um período de particular vulnerabilidade aos potenciais factores de risco para a esquizofrenia.

Por enquanto, os resultados relativos aos eventu-ais determinantes obstétricos e pré-natais são incon-clusivos, estando ainda longe de indiciar causalidade indubitável e consistente. Portanto, é difícil descartar a hipótese de que as associações encontradas se de-vam a efeitos de interacção ou a confundidores, como estilos de vida, factores socioeconómicos ou vulnera-bilidade genética actualmente desconhecida. As limi-tações metodológicas, como a ausência de poder es-tatístico para detectar pequenos efeitos e interacções subtis, também incentivam a uma maior contenção na interpretação dos resultados dos estudos.

Contudo, e à luz do conhecimento actual, o ris-co tem sido evidente para algumas exposições pré-natais, sendo que as mesmas podem ser componen-tes causais nem necessárias nem suficientes para a esquizofrenia. Estas exposições parecem interagir num processo de relações dinâmicas entre os vários factores de risco ao longo da trajectória do neurode-senvolvimento. E a questão que se impõe, face a esta pletora de informação epidemiológica, é se existe a possibilidade de prevenção de casos de esquizofrenia face à optimização dos cuidados pré-natais.

No futuro, os modelos animais de esquizofrenia certamente terão um papel indispensável no escla-

recimento da plausibilidade biológica e causalidade das hipóteses até agora geradas pela epidemiologia. O recurso a abordagens multidisciplinares será útil para elucidar os mecanismos que condicionam estas associações subtis mas importantes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Buchanan RW, Carpenter WT. Schizophrenia and other psychotic disorders. In: Kaplan & Sadock´s comprehensive textbook of psychiatry (8th Edition). Sadock B, Sadock V. (eds). Lippincott Williams & Williams;2005:1329-95.

2. Tandon R, Keshavan MS, Nasrallah HA. Schizophrenia, “just the facts” what we know in 2008. 2. Epidemiology and etiology. Schizophrenia Res 2008;102:1-18.

3. Cannon M, Jones P, Murray R. Obstetric complications and schizophrenia: historical and meta-analytic review. Am J Psychiatry 2002;159:1080-92.

4. Verdoux H, Sutter AL. Perinatal risk factors for schizophrenia: diagnostic specificity and relationships with maternal psychopathology, Am J Med Genet B Neuropsychiatr Genet 2002;114:898-905.

5. Geddes JR, Verdoux H, Takei N, Lawrie SM, Bovet P, et al. Schizophrenia and complications of pregnancy and labor: an individual patient data meta-analysis. Schizophr Bull 1999;25:413-23.

6. Byrne M, Agerbo E, Bennedsen B, Eaton WW, Mortensen PB. Obstetric conditions and risk of first admission with schizophrenia: a Danish national register based study. Schizophr Res 2007;97:51-9.

7. Isohanni M, Jones P, Kemppainen L, Croudace T, Isohanni I, et al. Chidhood and adolescent predictors of schizophrenia in the Northern Finland 1966 birth cohort – a descriptive life-span model. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci 2000;250:311-319.

8. Opler MGA, Susser ES. Fetal environment and schizophrenia. Environ Health Perspect 2005;113:1239-42.

9. Brown AS, Begg MD, Gravenstein S, Schaefer CA, Wyatt RJ, Bresnaham M, et al. Serologic evidence of prenatal influenza in the etiology of schizophrenia. Arch Gen Psychiatry 2004;61:774-80.

10. Meyer U, Feldon J. Neural basis of psychosis-related behaviour in the infection model of schizophrenia. Behav Brain Res 2009;204:322-34.

11. Susser E, Hoek HW, Brown A, Neurodevelopmental disorders after prenatal famine: The story of the Dutch Famine Study, Am J Epidemiol, 1998;147:213-6;

12. Song S, Wang W, Hu P. Famine, death, and madness: schizophrenia in early adulthood after prenatal exposure to the Chinese Great Leap Forward Famine. Soc Sci Med 2009;68:1315-21.

13. Xu MQ, Sun WS, Liu BX, Feng GY, Yu L,Yang L, et al. Prenatal malnutrition and adult schizophrenia: further evidence from the 1959-1961 Chinese famine. Schizophr Bull 2009;35:568-76.

14. Verdoux H. Perinatal risk factors for schizophrenia: how specific are they? Curr Psychiatry Rep 2004;6:162-7.

15. Kunugi H, Nanko S, Murray RM. Obstetric complications and schizophrenia: prenatal underdevelopment and subsequent neurodevelopmental impairment. Br J Psychiatry Suppl 2001;40:s25-9.

16. Clarke MC, Harley M, Cannon M. The role of obstetric events in schizophrenia. Schizophr Bull 2006;32:3-8.

17. Jones PB, Rantakallio P, Hartikainen AL, Isohanni M, Sipila P. Schizophrenia as a long-term outcome of pregnancy, delivery, and perinatal complications: a 28-year follow-up of the 1966 north Finland general population birth cohort. Am J Psychiatry 1998;155:355-64.

18. Brown AS, Susser ES. Prenatal nutritional deficiency and risk of adult schizophrenia. Schizophr Bull 2008;34:1054-63.

Ribeiro AE

Page 35: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

137137

Artigo de Revisão/Review Article

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):137-142

ABSTRACT

Osteoporosis (OP) is a prevalent disease, associated to an increased risk of bone fractures. Fragility fractures cause disability, increased morbidity and mortality and high social and economic impact. In the last years new research findings have clarified novel pathways in the OP pathophysiology. Cen-tral OP regulatory systems as the RANK-RANKL-OPG allowed the development of new targeted ther-apies. Further cell and molecular key pathways could in the future became potential targets for therapy.

In this article we review current OP treatments and put in perspective new therapy targets for future.Keywords: Osteoporosis, Therapy, Biphosphonates, SERMs, RANK-RANKL-OPG

Tratamento actual da osteoporose pós-menopausicaCurrent treatment of post-menopausal osteoporosis

Helena Canhão*

Unidade de Investigação em Reumatologia, Instituto de Medicina Molecular, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e Hospital de Santa Maria, Lisboa

* Professora de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de LisboaConsultora de Reumatologia do Hospital de Santa Maria - CHLNInvestigadora Principal da Unidade de Investigação em Reumatologia, Instituto de Medicina Molecular, Lisboa

INTRODUÇÃO

A osteoporose é uma doença óssea sistémica que se caracteriza por aumento da fragilidade óssea e do risco de fractura1. As mulheres, sobretudo no perí-odo pós-menopausa, sofrem um aumento marcado da reabsorção óssea, com perda acelerada da massa óssea.

É bem conhecido o aumento da ocorrência de fracturas nas mulheres na peri e pós menopausa, co-meçando com uma incidência aumentada das fractu-ras do antebraço distal, de que é exemplo a fractura de Colles, das fracturas vertebrais e, numa idade mais tardia, das fracturas do fémur proximal.

Sabemos que a osteoporose aumenta o risco para fractura, como a hipertensão arterial aumenta o risco para o acidente vascular cerebral ou a hipercolestero-lemia para a doença aterosclerótica coronária.

No entanto, nem sempre é linear a decisão de quan-do tratar, quem tratar e como tratar a osteoporose.

Ao contrário da hipertensão arterial ou da hiperco-lesterolemia que sabemos como medi-las, são conhe-cidos os limiares que requerem tratamento e temos capacidade de monitorizar a eficácia dos fármacos e ajustá-los de acordo com os resultados, as dificul-dades relativamente à osteoporose são muitas e nem sempre objectiváveis.

Várias sociedades científicas, como foi o caso em Portugal da Sociedade Portuguesa de Reumatologia e da Sociedade Portuguesa de Doenças Ósseas Meta-bólicas, elaboraram recomendações para o tratamen-to da osteoporose2. Nestas recomendações sugere-se

Page 36: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

138

que o tratamento está indicado: em mulheres com osteoporose (T score na densitometria óssea inferior a -2,5 desvios-padrão), mulheres com osteopenia se apresentarem concomitantemente factores de risco importantes para fractura e mulheres com fracturas de fragilidade prévias.

O conhecimento sobre a biologia do osso e a fi-siopatologia da osteoporose tem sofrido importantes avanços nos últimos anos. Paralelamente têm surgido no mercado fármacos que têm demonstrado uma ine-quívoca redução do risco de fractura, que é o objectivo principal quando se trata a mulher com osteoporose.

Um dos factores a ter em conta no tratamento des-ta doença é a má adesão à terapêutica. Isto deve-se ao facto de a doença ser frequentemente assintomática e ainda ser crónica, requerendo tratamento por tempo indeterminado.

PREVENÇÃO E TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

A prevenção e o tratamento não farmacológico da os-teoporose consistem na manutenção ao longo de toda a vida de hábitos e estilos de vida saudáveis. Está de-monstrado que o exercício físico é importante: a) na adolescência para a óptima aquisição do pico de

massa óssea, b) os exercícios de carga ao longo da vida têm um

efeito positivo nos osteoblastos e osteócitos que são mecanossensíveis;

c) em idades avançadas, o exercício melhora a força muscular e promove o equilíbrio.

Também uma ingestão equilibrada de cálcio3 e vi-tamina D4 é muito importante para a saúde do osso, bem como uma exposição solar adequada. A evicção do tabaco, do álcool, do café e do sódio em excesso são também medidas importantes.

Nas mulheres pós-menopáusicas e idosos deve ser assegurado o aporte alimentar adequado de cál-cio e de vitamina D e incentivados os exercícios com carga/impacto. Para os idosos com risco de queda, a prevenção de fracturas deve incluir a prevenção de quedas, através de programas de exercício adaptados individualmente (marcha, fortalecimento muscular,

treino de postura e equilíbrio) e se possível a utiliza-ção de protectores das ancas5. Sobretudo em idades mais avançadas em que há uma marcada fragilidade óssea, a evicção de quedas e de traumatismos é funda-mental para se prevenir a fractura6. Medidas simples como a redução de fármacos hipnóticos, a remoção de barreiras físicas em casa, a melhoria da ilumina-ção, por exemplo, são factores modificáveis que po-dem diminuir a ocorrência de quedas.

CRITÉRIOS PARA TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

É fundamental identificar os indivíduos que apre-sentam um elevado risco de fractura e tratá-los adequadamente. Actualmente considera-se que têm indicação para tratamento farmacológico os indiví-duos que apresentem critérios densitométricos de osteoporose (T score < -2,5). Da mesma forma, uma história de fractura de fragilidade é critério para te-rapêutica, independentemente do resultado da densi-tometria. A osteopenia sem fractura, mas que curse com factores de risco importantes, pode justificar uma actuação farmacológica idêntica à do tratamen-to. A osteopenia isolada, em indíviduos sem factores de risco para osteoporose, não justifica terapêutica farmacológica.

Nestes casos, quando as medidas não farmaco-lógicas não são suficientes, é necessário tratar a os-teoporose com fármacos eficazes. Considera-se que um fármaco é eficaz no tratamento da osteoporose, quando demonstrou em ensaios clínicos aleatorizados e controlados, a redução no risco de fracturas no gru-po tratado. Habitualmente os ensaios são multicên-tricos e envolvem um largo número de participantes. Frequentemente também, o desenho grupo tratado vs placebo é mantido durante pelo menos 3 anos. Os cri-térios de inclusão variam entre os ensaios para dife-rentes fármacos, mas englobam invariavelmente uma população com um alto risco de fractura. Este risco é determinado pela existência de fracturas prévias, ou por uma baixa densidade óssea na densitometria. Outra característica importante dos ensaios, que se re-flecte depois na demonstração de eficácia dos fárma-cos, é se a selecção das mulheres é feita tendo como

Canhão H

Page 37: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

139

base um alto risco de fractura vertebral (nesse caso se o fármaco demonstra eficácia, ela revela-se mais im-portante a nível do osso trabecular), ou se há um risco importante de fracturas da anca na população incluída (nesse caso poderá observar-se a eficácia do fármaco também a nível do osso cortical). Frequentemente, a eficácia a nível do osso cortical é demonstrada ape-nas em sub-análises ou análise ad-hoc dos ensaios clínicos, porque o ensaio não estava desenhado nem potenciado para estudar a prevenção de fracturas da anca. Nem sempre é fácil inferir por isso, a partir de ensaios clínicos, a real eficácia de alguns fármacos a nível do osso cortical.

Os fármacos podem actuar inibindo a reabsorção óssea e/ou estimulando a sua formação.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

Os fármacos antireabsortivos incluem os bifosfona-tos (alendronato, risedronato, ibandronato e zoledro-nato), raloxifeno, calcitonina e, mais recentemente, o denosumab. Os fármacos formadores incluem a para-tormona e o análogo 1-34 desta, a teriparatida. O ra-nelato de estrôncio, por seu lado, é um fármaco com efeito formador e antireabsortivo. Os estudos aleato-rizados e controlados que demonstraram eficácia dos fármacos anti-osteoporóticos foram realizados adi-cionando suplementos diários de 500 a 1000 mg de cálcio e/ou 400 a 800 UI de vitamina D. Em idosos, especialmente institucionalizados, acamados e com mau estado de saúde, a utilização de suplementos de cálcio e de vitamina D e de medidas de prevenção de quedas podem constituir o tratamento mais adequado.

FÁRMACOS ANTI-REABSORTIVOS

Actualmente, os fármacos mais utilizados na terapêu-tica da osteoporose são anti-reabsortivos. Nas mulhe-res pós-menopáusicas, os fármacos anti-reabsortivos são particularmente eficazes. O mecanismo fisiopa-tológico predominante da osteoporose pós-menopau-sica resulta de um marcado aumento da reabsorção. Este deve-se à diminuição súbita dos níveis de estro-génios que exercem um efeito inibitório na reabsor-ção óssea.

Os moduladores selectivos dos receptores de es-trogénios (SERMs), são fármacos com um modo de acção muito interessante ao apresentarem a capa-cidade de se comportarem como agonistas e anta-gonistas dos receptores de estrogénios em diversos tecidos-alvo. Actualmente o raloxifeno é o único SERM comercializado e é administrado na dose oral diária de 60 mg. O estudo MORE confirmou a eficácia do raloxifeno na prevenção das fracturas vertebrais em mulheres pós-menopáusicas, demons-trando inequivocamente o seu efeito benéfico a nível do osso trabecular7. A sua eficácia a nível do osso cortical (fracturas da anca e fracturas não vertebrais) não foi observada. Observaram-se com o tratamen-to com o raloxifeno, também efeitos extra-esquelé-ticos, como seja uma diminuição da agressividade das neoplasias invasivas na mama. No entanto, este fármaco pode constituir um factor agravante do sín-drome vaso-motor da perimenopausa e aumentar o risco de fenómenos venosos tromboembólicos. Por este motivo, o raloxifeno é mais utilizado na tera-pêutica da osteoporose pós menopáusica em mulhe-res já sem sindrome vaso-motor sintomático, mas ainda sem envolvimento importante a nível do osso cortical. A sua indicação major é a diminuição do risco de fracturas vertebrais.

Os bifosfonatos são actualmente um dos grupos de fármacos mais frequentemente prescritos na terapêu-tica da osteoporose pós-menopáusica. Actuam a nível da via do mevalonato, aumentando a apoptose dos osteoclastos. Estes fármacos demonstraram também eficácia noutras indicações para além da osteoporose pós-menopausica, como a osteoporose secundária à corticoterapia e também em homens com osteoporose secundária à utilização de terapêutica anti-androgéni-ca para a neoplasia da próstata.

Os bifosfonatos são eficazes na prevenção de frac-turas vertebrais8,9,10,11,12,13,14,15 e, em grupos de risco, em fracturas não vertebrais16,17,18. Foram comercia-lizados inicialmente com posologias diárias pouco cómodas. Actualmente, o alendronato e o risedronato apresentam formulações semanais e o ibandronato mensal, todas orais. O zoledronato é o bifosfonato mais recentemente comercializado e é administrado anualmente por via endovenosa.

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):137-142

Page 38: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

140

O painel de indicações é vasto e podem ser admi-nistrados em ambos os sexos e em qualquer idade, inclusivé em crianças. No entanto tem havido alguma controvérsia na sua utilização nas mulheres na idade fértil. Como apresentam uma longa retenção, há du-vidas quanto a potenciais efeitos na embriogénese de uma futura gestação. O seu uso está contra-indicado na gravidez.

Os bifosfonatos orais são mal absorvidos e impli-cam uma administração em jejum e com intervalo li-vre até à toma do pequeno-almoço. Podem ser causa de dispepsia e esofagite, mas de uma forma geral são bem tolerados.

FÁRMACOS FORMADORES

O ranelato de estrôncio tem efeitos antireabsorti-vos e anabólicos no osso. Demonstrou eficácia na prevenção de fracturas vertebrais e, nos idosos com densidade mineral óssea diminuída a nível do fémur, reduz as fracturas não vertebrais19,20. É administrado diariamente por via oral. Pode causar sintomas gas-trointestinais como náuseas e diarreia, mas de uma forma geral é bem tolerado. A sua utilização é mais frequente em doentes que apresentam intolerância ou ineficácia ao tratamento com bifosfonatos.

Os derivados da paratormona estimulam a forma-ção óssea e demonstraram eficácia na prevenção das fracturas vertebrais e não vertebrais. Mas são fárma-cos de administração subcutânea diária, mais dispen-diosos do que os fármacos referidos até agora e que demonstraram segurança se utilizados por um perío-do máximo limitado até 18 meses - 2 anos21. Por isso, a sua utilização é considerada em casos específicos de osteoporose fracturária refractária.

OUTROS FÁRMACOS

A terapêutica hormonal de substituição foi considerada durante muitos anos uma das opções de eleição na pre-venção e tratamento da osteoporose pós-menopáusica. As dúvidas bem conhecidas quanto à segurança da sua utilização a longo prazo e o aparecimento no mercado de alternativas eficazes para o tratamento da osteopo-rose, fizeram com que esta terapêutica continue a ser

muito utilizada, mas apenas quando há indicação para a sua utilização devido aos seus efeitos extra-esquelé-ticos22. No entanto, são fármacos com inequívoca efi-cácia a nível do osso. Está demonstrada a eficácia da terapêutica hormonal de substituição na manutenção da massa óssea e na prevenção de fracturas osteopo-róticas. Continuam por isso a ser fármacos úteis para prevenir fracturas na peri-menopausa, ainda que actu-almente, quando o motivo da introdução de um fárma-co é exclusivamente ósseo, geralmente consideram-se outras terapêuticas de primeira linha em detrimento da terapêutica hormonal de substituição.

A calcitonina é actualmente pouco utilizada na te-rapêutica da osteoporose. Demonstrou efeito antireab-sortivo com prevenção de fracturas a nível do osso tra-becular23. No entanto, a sua eficácia parece ser inferior à dos outros fármacos antiosteoporóticos. Utiliza-se sobretudo em casos de hiperalgesia associada a fractu-ras vertebrais agudas muito sintomáticas, pois tem um efeito estimulador das endorfinas24. A posologia é de 200 UI diárias e a administração por via nasal. De uma forma geral é um fármaco seguro, podendo raramente causar reacções de hipersensibilidade, sobretudo quan-do administrada por via subcutânea.

Outros fármacos por vezes utilizados como a tibo-lona, os fitoestrogénios, as estatinas e os androgénios não apresentaram até hoje estudos com evidência na prevenção de fracturas osteoporóticas.

ASSOCIAÇÃO DE FÁRMACOS

Nos últimos anos tem-se discutido qual a melhor for-ma de optimizar a terapêutica farmacológica nesta doença crónica. Alguns autores defendem a utiliza-ção sequencial e cíclica de fármacos com diferentes mecanismos de acção. Há também autores que defen-dem pausas na utilização de fármacos como os bifos-fonatos (bisphosphonate holiday) para prevenir uma reabsorção marcada e sustentada que possa causar situações extremas de ossos adinâmicos. Outros au-tores ainda, defendem a associação de fármacos com diferentes mecanismos de acção como acontece para o tratamento da hipertensão arterial. Mas actualmen-te, a eficácia e a segurança da associação de fármacos antireabsortivos na terapêutica da osteoporose não

Canhão H

Page 39: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

141

está demonstrada. Também não dispomos de evidên-cias que favoreçam a associação entre fármacos for-madores e antireabsortivos.

NOVOS FÁRMACOS

Tem sido registado nos últimos anos um avanço sig-nificativo na compreensão da fisiopatologia da oste-oporose. Estava bem estabelecido desde há vários anos, que a reabsorção e a formação ósseas ocorrem acopladas. Nos anos 90 foi identificado um sistema de mediadores proteicos que estabelece a comunica-ção entre os osteoblastos e os osteoclastos. Os oste-oblastos produzem o ligando do RANK (RANKL), uma molécula transmembranar, que ao ligar-se ao seu receptor RANK existente nos osteoclastos e nos seus precursores, estimula a osteoclastogenese e con-sequentemente a reabsorção óssea. Mas, por outro lado, os osteoblastos produzem também um receptor solúvel, a osteoprotegerina, que ao ser libertada no meio, liga-se ao RANKL, impedindo a ligação deste ao RANK e deste modo a osteoclastogenese.

O denosumab é um anticorpo monoclonal total-mente humanizado anti-RANKL que apresenta uma acção semelhante à osteoprotegerina endógena. Ao li-gar-se ao RANKL impede a ligação deste ao RANK, impedindo a osteoclastogenese e, consequentemen-te, diminuindo a reabsorção óssea. O denosumab foi aprovado muito recentemente pela Agência Europeia do Medicamento (EMA) para o tratamento da osteo-porose em mulheres na pós-menopausa e para o tra-tamento da perda óssea associada à ablação hormonal em homens com cancro da próstata e é administrado por via subcutânea na dose semestral de 60 mg. O estudo FREEDOM permitiu demonstrar a eficácia do denosumab na prevenção de fracturas vertebrais e não vertebrais25. Espera-se a comercialização do denosumab para breve em Portugal.

Estão em desenvolvimento novos fármacos que interferem em etapas-chave da fisiopatologia da oste-oporose. Alguns são anti-reabsortivos como um agen-te anti-catepsina que impede a acção de uma protease do osteoclasto, ou anti-integrina que impede a fixação do osteoclasto ao osso, inibindo a sua acção. Outros interferem com a formação óssea como um agente an-

ti-esclerostina que inibe a acção da esclerostina que é um mediador produzido pelos osteócitos que inibe a formação óssea.

No futuro, surgirão com grande probabilidade no-vas opções terapêuticas, desenhadas de acordo com a fisiopatologia da osteoporose e que demonstrem efi-cácia e segurança para serem utilizadas a longo prazo nesta doença crónica e silenciosa, mas que aumenta de prevalência e causa marcada co-morbilidade, di-minuição da esperança de vida e custos económicos muito importantes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Consensus Development Conference. Diagnosis, prophylaxis and treatment of osteoporosis. Am J Med 1993; 94: 646-50

2. Tavares V, Canhão H, Melo Gomes JA, Simões E, Romeu JC, Coelho P, Santos RA, Malcata A, Araújo D, Vaz C, Branco JC. Sociedade Portuguesa de Reumatologia e Sociedade Portuguesa de Doenças Ósseas Metabólicas. Recomendações para o diagnóstico e terapêutica da osteoporose. Acta Reuma Port 2007; 32: 49-59

3. European Commission Scientific Committee on Food. Opinion of the Scientific Committee on Food on the tolerable upper intake level of Calcium. [http://www.ec.europa.eu/food/fs/sc/scf/out194_en.pdf]

4. European Commission Scientific Committee on Food. Opinion of the Scientific Committee on Food on the tolerable upper intake level of vitamin D. [http://www.ec.europa.eu/food/fs/sc/scf/out157_en.pdf]

5. Singh S, Sun H, Anis AH. Cost-effectiveness of hip protectors in the prevention of osteoporosis related hip fractures in elderly nursing home residents. J Rheumatol 2004; 31: 1607-13

6. American Geriatric Society, British Geriatric Society and American Academy of Orthopaedic Surgeons Panel on Falls Prevention. Guideline for the prevention of falls in older persons. JAGS 2001; 49: 664-72

7. Ettinger B, Black DM, Mitlak BH, Knickerbocker RK, Nickelsen T, Genant HK, Christiansen C, Delmas PD, Zanchetta JR, Stakkestad J, Gluer CC, Krueger K, Cohen FJ, Eckert S, Ensrud KE, Avioli LV, Lips P, Cummings SR. Reduction of vertebral fracture risk in postmenopausal women with osteoporosis treated with raloxifene: results from a 3-year randomized clinical trial. Multiple Outcomes of Raloxifene Evaluation (MORE) Investigators. JAMA 1999; 282: 637-45

8. Black DM, Cummings SR, Karpf DB, Cauley JA, Thompson DE, Nevitt MC, Bauer DC, Genant HK, Haskell WL, Marcus R, Ott SM, Torner JC, Quandt SA, Reiss TF, Ensrud KE. Randomised trial of effect of alendronate on risk of fracture in women with existing vertebral fractures. Fracture Intervention Trial Research Group. Lancet 1996; 348: 1535-41

9. Ensrud KE, Black DM, Palermo L, Bauer DC, Barrett-Connor E, Quandt SA, Thompson DE, Karpf DB. Treatment with alendronate prevents fractures in women at highest risk: results from the Fracture Intervention Trial. Arch Intern Med 1997; 157: 2617-24

10. Cummings SR, Black DM, Thompson DE, Applegate WB, Barrett-Connor E, Musliner TA, Palermo L, Prineas R, Rubin SM, Scott JC, Vogt T, Wallace R, Yates AJ, LaCroix AZ. Effect of alendronate on risk of fracture in women with low bone density but without vertebral fractures: results from the Fracture Intervention Trial. JAMA 1998;

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):137-142

Page 40: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

142

280: 2077-8211. Harris ST, Watts NB, Genant HK, McKeever CD, Hangartner T, Keller

M, Chesnut CH 3rd, Brown J, Eriksen EF, Hoseyni MS, Axelrod DW, Miller PD. Effects of risedronate treatment on vertebral and nonvertebral fractures in women with postmenopausal osteoporosis: a randomized controlled trial Vertebral Efficacy With Risedronate Therapy (VERT) Study Group. JAMA 1999; 282: 1344-52

12. Reginster J, Minne HW, Sorensen OH, Hooper M, Roux C, Brandi ML, Lund B, Ethgen D, Pack S, Roumagnac I, Eastell R. Randomized trial of the effects of risedronate on vertebral fractures in women with established postmenopausal osteoporosis. Vertebral Efficacy with Risedronate Therapy (VERT) Study Group. Osteoporos Int 2000; 11: 83-91

13. Delmas PD, Recker RR, Chesnut CH 3rd, Skag A, Stakkestad JA, Emkey R, Gilbride J, Schimmer RC, Christiansen C. Daily and intermittent oral ibandronate normalize bone turnover and provide significant reduction in vertebral fracture risk: results from the BONE study. Osteoporos Int 2004; 15: 792–8

14. Miller PD, McClung MR, Macovei L, Stakkestad JA, Luckey M, Bonvoisin B, Reginster JY, Recker RR, Hughes C, Lewiecki EM, Felsenberg D, Delmas PD, Kendler DL, Bolognese MA, Mairon N, Cooper C. Monthly oral ibandronate therapy in postmenopausal osteoporosis: one year results from the MOBILE study. J Bone Miner Res 2005; 20: 1315–22

15. Chesnut III CH, Skag A, Christiansen C, Recker R, Stakkestad JA, Hoiseth A, Felsenberg D, Huss H, Gilbride J, Schimmer RC, Delmas PD; Oral Ibandronate Osteoporosis Vertebral Fracture Trial in North America and Europe (BONE). Effects of oral ibandronate administered daily or intermittently on fracture risk in postmenopausal osteoporosis. J Bone Miner Res 2004; 19: 1241-9

16. McClung MR, Geusens P, Miller PD, Zippel H, Bensen WG, Roux C, Adami S, Fogelman I, Diamond T, Eastell R, Meunier PJ, Reginster JY; Hip Intervention Program Study Group. Effect of risedronate on the risk of hip fracture in elderly women. N Engl J Med 2001; 344: 333-40

17. Black DM, Thompson DE, Bauer DC, Ensrud K, Musliner T, Hochberg MC, Nevitt MC, Suryawanshi S, Cummings SR; Fracture risk reduction with alendronate in women with osteoporosis: the Fracture Intervention Trial. J Clin Endocrinol Metab 2000; 85: 4118–24

18. Felsenberg D, Miller P, Armbrecht G, Wilson K, Schimmer RC,

Papapoulos SE. Oral ibandronate significantly reduces the risk of vertebral fractures of greater severity after 1, 2, and 3 years in postmenopausal women with osteoporosis. Bone 2005; 37: 651-4

19. Meunier PJ, Roux C, Seeman E, Ortolani S, Badurski JE, Spector TD, Cannata J, Balogh A, Lemmel EM, Pors-Nielsen S, Rizzoli R, Genant HK, Reginster JY. The effects of strontium ranelate on the risk of vertebral fracture in women with postmenopausal osteoporosis. N Engl J Med 2004; 350: 459–68

20. Reginster JY, Seeman E, De Vernejoul MC, Adami S, Compston J, Phenekos C, Devogelaer JP, Curiel MD, Sawicki A, Goemaere S, Sorensen OH, Felsenberg D, Meunier PJ. Strontium ranelate reduces the risk of nonvertebral fractures in postmenopausal women with osteoporosis: Treatment of Peripheral Osteoporosis (TROPOS) study. J Clin Endocrinol Metab 2005; 90: 2816-22

21. Neer RM, Arnaud CD, Zanchetta JR, Prince R, Gaich GA, Reginster JY, Hodsman AB, Eriksen EF, Ish-Shalom S, Genant HK, Wang O, Mitlak BH. Effect of parathyroid hormone (1-34) on fractures and bone mineral density in postmenopausal women with osteoporosis. N Engl J Med 2001; 344: 1434–41

22. Rossouw JE, Anderson GL, Prentice RL, LaCroix AZ, Kooperberg C, Stefanick ML, Jackson RD, Beresford SA, Howard BV, Johnson KC, Kotchen JM, Ockene J; Writing Group for the Women’s Health Initiative Investigators. Risks and benefits of estrogen plus progestin in healthy postmenopausal women: principal results from the Women’s Health Initiative randomized controlled trial. JAMA 2002; 288: 321–33

23. Chesnut CH 3rd, Silverman S, Andriano K, Genant H, Gimona A, Harris S, Kiel D, LeBoff M, Maricic M, Miller P, Moniz C, Peacock M, Richardson P, Watts N, Baylink D. A randomized trial of nasal spray salmon calcitonin in postmenopausal women with established osteoporosis: the prevent recurrence of osteoporotic fractures study. PROOF Study Group. Am J Med 2000; 109: 267-76

24. Ofluoglu D, Akyuz G, Unay O, Kayhan O. The effect of calcitonin on beta-endorphin levels in postmenopausal osteoporotic patients with back pain. Clin Rheumatol 2007; 26: 44-9

25. Cummings SR, San Martin J, McClung MR, Siris ES, Eastell R, Reid IR, Delmas P, Zoog HB, Austin M, Wang A, Kutilek S, Adami S, Zanchetta J, Libanati C, Siddhanti S, Christiansen C; FREEDOM Trial. Denosumab for prevention of fractures in postmenopausal women with osteoporosis. N Engl J Med 2009; 361: 756-65

Canhão H

Page 41: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

143

Caso Clínico/Case Report

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):143-147

ABSTRACT

Phyllodes tumours of the breast are unusual fibroepithelial tumours that according to the World Health Organisation are histologically classified in benign, borderline and malignant. Generally they have a benign clinical course. The malignant ones have increased probability of local recurrence and distant spreading. Maybe because of its rarity the clinical behaviour of these tumours is not fully understood and the histologic classification of this neoplasm correlates poorly with the patient’s prognosis.

As example of this difficulty the authors present the case of a 61 year-old woman with a border-line phyllode tumour of the left breast submitted to mastectomy. The tumour recurred locally and became metastatic to the scalp, lungs and spleen. The patient died 15 months after the mastectomy. To our knowledge, this patient represents only the second reported case of phyllodes tumours meta-static to the scalp. Keywords: Phyllodes tumours, prognosis factors, metastatic disease, scalp

Tumor filoide borderline da mama com metastização para o couro cabeludo – caso clínico

Borderline phyllode tumor of the breast metastatic to the scalp - a case report

Carlos Rodrigues*, José Fiel**, Madalena Nogueira**, José Teixeira***

Hospital de Santarém

* Interno de Ginecologia e Obstetrícia** Assistente Graduado de Ginecologia e Obstetrícia

*** Director do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia

INTRODUÇÃO

Os tumores filoides são lesões fibroepiteliais da mama, que representam menos de 1% das neoplasias mamárias1,2.

Foi pela primeira vez descrito por Johannes Mul-ler em 1838, baptizado como cistosarcoma filoide. Foi rapidamente compreendido que estes tumores

quísticos não eram verdadeiros sarcomas quer na sua histologia, quer no seu comportamento, e portanto só a metade “filoide” da sua designação é que estaria correcta pois faz referência às projecções em folha que se observam em corte histológico. Inicialmente era sempre enfatizada a sua natureza benigna, até ser descrito o primeiro caso de tumor filoide metastático em 1931 por Lee and Pack1,3.

Esta entidade já teve cerca de 60 designações dife-rentes, até que em 1981 a OMS adoptou a designação de tumor filoide, omitindo a palavra sarcoma. Para evi-

Page 42: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

144

tar confusões futuras, esta doença foi definida como sendo um tumor com um arranjo estrutural em forma de folha, constituído por tecido conjuntivo e elementos epiteliais, tal como os fibroadenomas, mas caracteri-zado por maior celularidade do tecido conjuntivo2,4,5.

Análises clonais realizadas a tumores filoides do-cumentam que o componente epitelial é policlonal, enquanto o componente estromático é monoclonal, mostrando assim que o estroma representa o compo-nente neoplásico do tumor filoide6.

Estes tumores são classificados como benignos, borderline e malignos, com base numa combinação de características histológicas, incluindo a celularidade estromática, pleomorfismo celular, número de mito-

ses e margens. As incidências de cada subtipo variam bastante entre os vários trabalhos publicados, mas em média cerca de 60% são benignos (Quadro I)7.

As lesões benignas têm o potencial de recorrer lo-calmente e muito raramente de metastização à distân-cia. As lesões malignas têm um risco aumentado de disseminação à distância, no entanto têm um curso clínico indolente na maioria dos casos.

Apesar de tudo é importante referir que o compor-tamento biológico do tumor tem uma fraca correlação com as suas características histológicas, e devido a essa imprevisibilidade vários especialistas sugerem que todos os tumores filoides devem ser avaliados como tendo potencial maligno6,5.

Quadro I – Classificação histológica do tumor filoide

BENIGNO BORDERLINE MALIGNO

Hipercelularidade

Estromática

ligeira moderada intensa

Pleomorfismo celular ligeiro moderado intenso

Mitoses poucas ou ausentes intermédio numerosas

(> 10 por 10 HPF)

Margens tumor bem

circunscrito

intermédio tumor infiltrativo

Padrão Estromático distribuição

estromática uniforme

expansão

heterogénea do

estroma

crescimento

estromático intenso

Diferenciação

estromática

heteróloga

raro

raro

ocasional

Incidência média 60% 20% 20%

Rodrigues C, Fiel J, Nogueira M, Teixeira J

Page 43: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

145

Clinicamente a forma de apresentação mais co-mum é a presença de uma massa mamária palpável que poderá ter um crescimento rápido. Os tumores filoides podem atingir grandes dimensões havendo registo de tumores com mais de 20 cm. A idade média de aparecimento é de 45 anos. Pode ocorrer bilaterali-dade em casos raros6.

Algumas semelhanças que partilham com os fi-broadenomas podem constituir um problema para o seu diagnóstico5, sendo a biópsia (“core biopsy”) um meio precioso para a obtenção de um diagnóstico pré-operatório6,8.

Existem poucas séries na literatura que avaliem as características clínicas, fisiopatológicas e factores de prognóstico deste tumor. Talvez pela sua raridade, o prognóstico e comportamento clínico destes tumores não está totalmente compreendido3.

Apesar disto, os estudos publicados apontam como factores de prognóstico: o tamanho do tumor, margem tumoral infiltrativa, margens de ressecção cirúrgica positivas, grau de actividade mitótica, pre-sença de necrose, atipia celular e proliferação estro-mática9,5,3.

Classicamente a mastectomia tem sido o tratamen-to standard para todos os tumores filoides. Mais re-centemente, abordagens conservadoras têm sido cada vez mais utilizadas em doentes criteriosamente selec-cionadas6,10. Nestes casos importa referir a obrigato-riedade de deixar uma margem de segurança maior que 1 cm 6.

A principal via de disseminação do tumor filoide é hematogénea. Apesar de existirem linfadenopatias em cerca de 20% das doentes, apenas cerca de 5% apresentam metástases axilares6. A literatura actual só defende a linfadenectomia axilar nos casos de axila positiva no exame físico2,6.

A quimioterapia e a hormonoterapia adjuvante ainda não demonstraram trazer benefícios no trata-mento destes tumores6.

O uso de radioterapia é controverso. Alguns au-tores defendem a utilização de radioterapia adjuvan-te em doses de 50 a 60 Gy nas doentes em que não foram conseguidas margens negativas. Nas doentes em que foram conseguidas margens de segurança (>1 cm) a radioterapia não está recomendada6,10.

Em aproximadamente 15% dos casos de tumor filoide ocorrerá uma ou mais recidivas locais, prova-velmente por mau controlo local da doença após a ci-rurgia, apesar do comportamento biológico do tumor ser um importante determinante6,11.

Alguns autores defendem que a utilização de ra-dioterapia adjuvante poderá ter algum interesse após excisão da recidiva6,10.

A metastização à distância ocorre em cerca de 5-10% das doentes com tumor filoide, apesar dessa incidência subir para 20% nos doentes com tumores malignos6,12. As lesões metastáticas, histologicamente são compostas apenas pelo componente estromático. Estas situações têm um mau prognóstico com uma sobrevivência média inferior a 2 anos. Os locais mais frequentes de doença à distância são o pulmão, osso e vísceras abdominais. A experiência clínica com quimioterapia nestas situações é limitada, parecendo que quando ocorrem respostas estas são de curta duração. A radioterapia poderá ser usada como paliação no alívio localizado da dor6.

Neste artigo será descrito um caso de tumor filoide com recidiva local e metastização para o couro cabe-ludo, que representa de acordo com a pesquisa biblio-gráfica efectuada, o segundo caso publicado.

CASO CLÍNICO

Mulher de 61 anos, Gesta1 Para1, menopausa natural aos 52 anos, enviada à consulta de Senologia por apre-sentar aumento de volume e sinais inflamatórios da mama esquerda (Fig.1). Como antecedentes pessoais

Fig. 1 – Aspecto da mama na primeira consulta.

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):143-147

Page 44: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

146

destaca-se: obesidade, hipertensão arterial, epilepsia e síndrome depressivo. Na observação apresentava um volumoso tumor mamário envolvendo os quadrantes superiores e região retroareolar, mamilo extremamente congestionado e axila clinicamente positiva. A imagio-logia mostrava a presença de uma volumosa massa de natureza sólida ocupando vários quadrantes mamários. Foram realizadas duas biópsias com agulha grossa e uma biópsia do mamilo que foram inconclusivas. Pe-rante a suspeita de malignidade decide-se efectuar mastectomia simples com exame extemporâneo que revelou a presença de volumoso tumor filoide bor-derline com15 x 12 cm (diagnóstico avançado como muito provável no exame extemporâneo e de seguida confirmado no estudo anatomo-patológico definitivo). No mesmo tempo operatório foi realizado esvaziamen-to axilar do qual resultaram 18 gânglios com infiltrado inflamatório (reactivos). Descrição microscópica da peça de mastectomia: “neoplasia constituída por estro-ma moderadamente celular com atipia moderada iden-tificando-se 5 mitoses por 10 HPF e bordos infiltrativos extensamente necrosado e ulcerado. A celularidade es-tromal é mais acentuada nas zonas periductais”.

A doente teve uma primeira recidiva local 6 meses após a cirurgia, tendo sido realizada excisão alarga-da de todos os locais de recidiva incluindo a cicatriz operatória (Fig.2). Segunda recidiva local e metástase no couro cabeludo passados 4 meses, efectuando-se novamente excisão das lesões (Fig.3). Tanto nas re-

cidivas locais como na metastização existiu sempre confirmação histológica e foi efectuada a revisão de lâminas do estudo anatomo-patológico. Houve sus-peita de metastização pulmonar e esplénica em tomo-grafia computorizada realizada 2 meses depois (1 ano após a MRM). A doente faleceu 3 meses depois por falência multi-orgânica como consequência directa da neoplasia (15 meses após a mastectomia).

É importante referir que o acompanhamento clíni-co da doente foi muito difícil pois faltava frequente-mente às consultas e exames.

DISCUSSÃO

O tumor filoide da mama é uma neoplasia rara, mas está longe de ser inocente. A classificação histológica destes tumores em benigno, maligno e borderline ain-da não provou ter uma boa correlação com o prognós-tico das doentes na medida em que formas benignas se podem manifestar com metástases, enquanto que alguns casos de tumores malignos podem apresentar um curso clínico excelente13. É um problema para o qual é necessário encontrar resposta e que este caso pretende exemplificar, na medida em que este tumor filoide borderline teve um comportamento clínico claramente maligno.

Por outro lado, apesar deste tumor ter sido classi-ficado como borderline, apresentava alguns factores

Fig. 2 – Recidiva local.Fig. 3 – Metástase no couro cabeludo.

Rodrigues C, Fiel J, Nogueira M, Teixeira J

Page 45: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

147

de mau prognóstico que em parte podem explicar este desfecho: tumor de grandes dimensões, margem tu-moral infiltrativa e necrose extensa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Staton JB, Costello TH, Donovan FD et al. Cystosarcoma phyllodes metastatic to the mandible: Report of a rare case and literature review. Ear, nose and throat Journal 2003;82(5):380-1.

2. Custódio S, Saleiro S, Dias M et al. Evaluation of 11 cases of breast sarcoma. Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa 2007;1(1):15-18.

3. Barrio AV, Clark BD, Goldberg JI et al. Clinicopathologic features and long-term outcomes of 293 phyllodes tumors of the breast. Annals of Surgical Oncology 2007;14(10):2961-70.

4. Belkacémi Y, Bousquet G, Marsiglia H et al. Phyllodes tumors of the breast. International. Journal of Radiation Oncology Biology Physics 2008;70(2):492-500.

5. Fajdic J, Gotovac N, Hrgovic Z et al. Phyllodes tumors of the breast – diagnostic and therapeutic dilemmas. Oncologie 2007;30:113-18.

6. Telli ML, Horst KC, Guardino AE et al. Phyllodes tumors of the

breast: natural history, diagnosis and treatment. Journal of the National Comprehensive Cancer Network 2007;5(3):324-30.

7. Bellocq JP, Magro G. Fibroepithelial tumours. In: Tumours of the breast and female genital organs, pathology and genetics. World Health Organization classification of tumors. Fattaneh A, Tavassoli, Devilee P (eds). WHO; 2005:99-103.

8. Jacklin RK, Ridgway PF, Ziprin P. Optimising preoperative diagnosis in phylloides tumor of the breast. Journal of Clinical Pathology 2006;59:454-59.

9. Oktar A, Mustafa MU, Kay B et al. Risk factors for recurrence and death after primary surgical treatment of malignant phyllodes tumors. Annals of Surgical Oncology 2004;11(11):1011-17.

10. Chaney AW, Pollack A, McNeese MD. Primary treatment of cystosarcoma phyllodes of the breast. Cancer 2000;89:1502-11.

11. Ross WK, Kaye P, Dent DM. Factors leading to local recurrence or death after surgical resection of phyllodes tumours of the breast. British Journal of Surgery 1999;86:396-99.

12. Parker SJ, Harries SA. Phyllodes tumours. Postgraduate Medical Journal 2001;77:428-35.

13. Stamatakos M, Tsaknaki S, Kontzoglou K et al. Phylloides tumor of the breast: a rare neoplasm, though not that inocent. International Seminars in Surgical Oncology 2009;6:6.

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):143-147

Page 46: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

148

Caso Clínico/Case Report

ABSTRACT

Uterine lipoleiomyoma is a rare benign tumour arising from the myometrium and composed of smooth muscle cells and mature adipocytes. The authors describe a case of a patient with 66 years, with a diagnosis of uterine lipoleiomyoma. This type of tumor is easily misdiagnosed as an ovarian teratoma on imaging studies.Keywords: Uterine leiomyoma; Imaging avaliation.

Lipoleiomioma uterinoUterine lipoleiomyoma

Cátia Carnide*, Joana Raposo**, Carla Rodrigues***, Fernanda Geraldes****

Serviço de Ginecologia, Maternidade Bissaya Barreto, Coimbra

* Interna Complementar Ginecologia e Obstetrícia, Maternidade Bissaya Barreto** Interna Complementar de Anatomia-Patológica, Centro Hospitalar de Coimbra*** Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia, Maternidade Bissaya Barreto**** Assistente Graduada de Ginecologia, Maternidade Bissaya Barreto

INTRODUÇÃO

O lipoleiomioma uterino é um tumor benigno raro, representando 0.03% a 0.2% de todos os leiomiomas uterinos (1). Histologicamente, é um tumor mesenqui-matoso misto constituído por adipócitos maduros e células de tecido muscular liso, com quantidade vari-ável de tecido conjuntivo fibroso, sem atipia celular1.Este tumor é mais frequentemente encontrado no cor-po uterino e é geralmente intramural. São tumores de tamanho variável, de superfície lisa, de limites bem definidos, com uma cápsula fina de tecido conjuntivo, e estão geralmente associados a outros leiomiomas.Ocorrem quase exclusivamente na mulher pós-meno-páusica, entre os 50 e 80 anos.

Na sua maioria são assintomáticos, podendo ma-nifestar-se clinicamente em 25 a 30% dos casos, sen-

do os sintomas semelhantes aos do leiomioma uteri-no (massa palpável, metrorragia, dor ou sensação de peso pélvico)2.

A maioria dos casos clínicos descritos na litera-tura foram diagnosticados após cirurgia, tendo sido diagnosticados no pré-operatório como teratoma do ovário3.

CASO CLÍNICO

Doente de 66 anos de idade, com menopausa espontâ-nea aos 52 anos, que recorre à Consulta de Ginecolo-gia por incontinência urinária de esforço invalidante, sem outras queixas ginecológicas associadas. Apre-sentava como patologia associada hipotiroidismo, hi-pertensão arterial e dislipidemia. Os seus anteceden-tes ginecológicos e obstétricos são irrelevantes.

Carnide C, Raposo J, Rodrigues C, Geraldes F

Page 47: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

149

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):148-152

O exame físico ginecológico revelou uma atrofia vulvo-vaginal e, à palpação bimanual, um útero glo-boso, ligeiramente aumentado de dimensões. O stress teste e o TVT teste foram positivos. A citologia do colo do útero foi negativa para lesão intraepitelial.

Foi realizada uma ecografia endovaginal que re-velou uma massa hiperecogénica na região anexial esquerda, bem definida, com 32x37mm (Fig. 1), e útero com um diâmetro antero-posterior de 22,4mm e endométrio com 3,1mm de espessura.

A Tomografia Axial Computadorizada (TAC) com contraste mostrou uma massa oval de limites regula-

res com 36 mm, hipodensa, heterogénea, a nível da pélvis, concluindo tratar-se de um teratoma/quisto dermóide anexial esquerdo, sem outras alterações, nomeadamente adenomegalias (Fig. 2).

Analiticamente, o CA 125 foi de 4,4 U/ml.Perante a hipótese diagnóstica de teratoma do ová-

rio esquerdo, a doente foi proposta para realização de anexectomia esquerda por laparoscopia e correcção de incontinência urinária. Durante a intervenção la-paroscópica identificou-se uma formação miomatosa, subserosa, com cerca de 5cm, localizado no fundo e corno uterino direito, tendo sido realizada miomec-tomia.

O estudo anatomopatológico revelou tratar-se de “uma neoplasia benigna constituída por células fusi-formes sem atipia à mistura com numerosos adipóci-tos maduros”, concluindo tratar-se de um leiomioma com metaplasia adiposa extensa (Fig. 3). Foi feito o estudo imunohistoquímico, tendo-se observado imu-norreactividade universal para a desmina e actina

Figura 1 – Ecografia transvaginal onde se visualiza o diâ-metro antero-posterior do útero de 22mm, a espessura en-dometrial de 3mm (a) e uma formação hiperecogénica na região anexial esquerda com 32x38mm (b).

Figura 2 – Tomografia Axial Computadorizada pélvica onde se visualiza uma massa oval, heterogénea pré (a) e pós-contraste (b).

Page 48: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

150

muscular lisa nas células fusiformes e focal para o CD34, não tendo havido reactividade para os anticor-pos anti-proteina S100 nem Vimentina.

DISCUSSÃO

O lipoleiomioma é um tumor uterino raro, que ocorre tipicamente na mulher menopáusica.

É composto por tecido muscular liso e quantida-des variáveis de tecido adiposo maduro. Dependendo dos seus constituintes, pode variar desde lipoma ute-rino puro, lipoleiomioma ou fibromiolipoma, sendo os dois últimos as variantes mais frequentes do leio-mioma4. Esta presença de tecido adiposo no miomé-trio é anómala.

A patogenia deste tumor benigno é desconhecida mas, no entanto, há duas teorias para a sua génese: (a) degenerescência “lipomatosa” das células musculares lisas e (b) origem em células adiposas embrionárias ou células mesenquimatosas ectópicas1,5,6,7,8. Apesar de controverso7,9, a primeira teoria é universalmente con-siderada o mecanismo mais aceite no desenvolvimento do lipoleiomioma3,11,12,22. O estudo imunohistoquímico permite confirmar a natureza do tumor como sendo do músculo liso, uma vez que os adipócitos demonstram ter reactividade para a vimentina, desmina e actina, e ausência de reactividade para antigénios histiocitários como CD-68 e MAC 3898,13,14, o que também apoia a teoria da degenerescência lipomatosa8,12.

Existe uma elevada incidência de leiomiomas ute-rinos concomitantes. A apresentação clínica do lipo-leiomioma é semelhante ao do leiomioma, sendo a maioria das doentes assintomática.

A transformação maligna do lipoleiomioma ute-rino é extremamente rara4,15,16. Alguns autores de-fendem que, nos casos raros de leiomiossarcomas uterinos concomitantes com lesões lipomatosas, não está provado que a malignização decorra da degene-rescência da lesão lipomatosa9.

Quando há um alto índice de suspeição, o diag-nóstico pré-operatório é possível através de exames imagiológicos, como ecografia, TAC e Ressonância Magnética Nuclear (RMN). No entanto, o diagnós-tico radiológico de lesões exofíticas ou pediculadas pode ser difícil devido à semelhança que o lipoleio-mioma pode ter com outros tumores anexiais.

Ecograficamente, o componente lipomatoso do li-poleiomioma revela-se como uma massa hiperecogé-nica uterina bem definida, rodeada por um anel hipoe-cogéncio, o qual representa o miométrio que rodeia a massa lipomatosa2,3,17. Esta aparência ecográfica é ca-racterística mas não é específica do lipoleiomioma. As-sim, a ecografia isoladamente pode não ser suficiente para o diagnóstico, uma vez que estes tumores podem mimetizar outros tumores uterinos malignos ou ovári-cos e, no caso de grandes massas, pode não ser capaz de identificar exactamente o órgão de origem7,18,19.

A TAC e a RMN permitem a melhor caracterização do tumor através da confirmação do exacto órgão de origem e da sua natureza lipomatosa, e assim o pla-

Figura 3 – Imagens do estudo anatomo-patológico, com coloração hematoxilina & eosina, visualizando-se feixes de células fusiformes misturadas com áreas de tecido adi-poso maduro na ampliação 50x (a), e na ampliação 200x (b), não se identificando atipia celular nem mitoses.

Carnide C, Raposo J, Rodrigues C, Geraldes F

Page 49: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

151

neamento do tipo de cirurgia necessária2,10,11. A TAC revela uma massa de limites bem definidos, hipoden-sa, rodeada por tecido miometrial e, após contraste, há realce da homogenicidade dos tecidos moles e da he-terogenicidade do componente lipomatoso central18. A RMN é mais sensível na identificação do componente lipomatoso e do órgão de origem do tumor e, assim, seria idealmente o exame de eleição18. Este revela um comportamento característico, o tumor uterino tem um sinal baixo em todas as sequências, e tem perda do si-nal na sequência com saturação de gordura, o que con-firma o seu componente lipomatoso18,20.

O diagnóstico diferencial mais importante a ser feito é com o teratoma do ovário, o qual requer tra-tamento cirúrgico. A apresentação ecográfica do te-ratoma do ovário pode ser muito variada, podendo visualizar-se uma lesão quística com um tubérculo ecogénico projectado no lúmen do cisto (nódulo de Rokitansky); finos ecos difusos no interior do quisto (fios de cabelo); massa ecogénica difusa ou parcial-mente difusa com sombra acústica posterior; nível líquido-líquido pela presença de material sebáceo e seroso21. As características do teratoma do ovário à RM são a presença de gordura no interior da lesão (com perda do sinal na sequência com saturação de gordura), de calcificações com hipossinal (dentes), e “plugs” dermóides aderentes à parede do cisto. As-sim, o que se torna essencial na diferenciação destes tumores é a identificação o órgão de origem do tumor. Radiologicamente, o “beak sign”, que consiste na de-formação do contorno uterino provocada pela massa lipomatosa, pode também ser útil na identificação da origem uterina do tumor18.

Devem também ser excluídos os diagnósticos de tumor lipomatoso não-teratomatoso do ovário, li-poma benigno pélvico, liposarcoma, mielolipoma extra-adrenal de localização pélvica, linfadenopatia lipoblástica, hamartoma cística retroperitoneal, an-giolipoma e angiomiolipoma.

Embora a maioria dos tumores uterinos sejam trata-dos cirurgicamente, os tumores assintomáticos benig-nos lipomatosos podem não exigir este tipo de trata-mento. Os achados da ecografia, da TAC (atenuação do componente lipomatoso) e da RMN (perda do sinal na sequência com saturação de gordura) do lipoleiomio-

ma são característicos, permitindo a vigilância clínica nos casos assintomáticos, sendo a ecografia o exame mais indicado. São sinais a favor de benignidade a ma-nutenção do tumor dentro da cápsula e o aumento do componente lipomatoso. No caso de haver crescimen-to do tumor num curto intervalo de tempo pode não ser necessariamente uma degeneração maligna, podendo-se optar por uma vigilância imagiológica mais regular ou por uma intervenção cirúrgica7.

Como ilustrado neste caso, o diagnóstico de uma massa pélvica pode ser feito através do exame ecográ-fico e da TAC, podendo diagnosticar-se erradamen-te um teratoma do ovário, uma vez que os achados imagiológicos podem não ser suficientemente espe-cíficos. Nos casos em que persistem dúvidas relativa-mente ao diagnóstico após a realização destes exames auxiliares de diagnóstico, a RMN pode ser útil uma vez que este é mais sensível na identificação do órgão de origem e do componente lipomatoso.

Perante um diagnóstico pré-operatório de terato-ma do ovário é importante ter em mente que este faz diagnóstico diferencial com o lipoleiomioma uterino, podendo o correcto diagnóstico possibilitar a dimi-nuição da realização de intervenções cirúrgicas des-necessárias.

BIBLIOGRAFIA

1. Dellacha A, Di Marco A, Foglia G, Fulcheri E. Lipoleiomyoma of the uterus. Patológica 1997; 89:737–741.

2. Dosdá R, Ripollés T, Rodrigo C, Morote V. Lipoleiomioma uterino. A propósito de un caso. Radiologia 1998; 40:136-7.

3. Chan Hhl, Chau Mt, Lam Chl, Cheung Scw. Uterine Lipoleiomyoma: Ultrasound and Computed Tomography Findings. J HK Coll Radiol 2003; 6:30-32.

4. Pounder DJ. Fatty tumors of the uterus. J Clin Pathol 1982; 35:1380–1383.

5. Gentile R, Zarri M, De Lucchi F, Bellone F, Lapertosa G. Lipoleiomyoma of the uterus. Pathologica 1996; 88(2):132-4.

6. Sieinski W. Lipomatous neometaplasia of the uterus. Report of 11 cases with discussion of histogenesis and pathogenesis. Int J Gynecol Pathol 1989; 8(4):357-63.

7. King A, Patel H, Dass C, Caroline D. Uterine Lipoleiomyoma: Role of Sonography, CT, and MRI in Management. www.womensimagingonline.arrs.org 2009.

8. Lopez A, Zarza B, Murga I, Herran E, Estevez I. Lipoma uterino: presentación de dos casos. Actas Hispanoamericanas de Patologia 2006.

9. Hadj O, Bouraoui S, Fadhel C, Lahmar A, Regaya S. Approche clinique et éthiopathogénique de sept cas de lésions lipomateuses de l’utérus avec étude immunohistochimique de leur histogenèse. La tunisie Medicale 2010; 88(12):916 – 919.

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):148-152

Page 50: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

152

10. Loffroy R, Nezzal N; Mejean N, Sagot P, Krausé D. Lipoleiomyoma of the uterus: imaging features. Gynecol Obstet Invest 2008; 66(2):73-5.

11. Tsushima Y, Kita T, Yamamoto K. Uterine lipoleiomyoma: MRI, CT and ultrasonographic findings. The British Journal of Radiology 1997; 70: 1068-1070.

12. Resta L, Maiorano E, Piscitelli D, Botticella M. Lipomatous tumors of the uterus. Clinico-pathological features of 10 cases with immunocytochemical study of histogenesis. Pathol Res Pract 1994; 190(4):378-83.

13. Shintaku M. Lipoleiomyomatous tumors of the uterus: a heterogeneous group? Histopathological study of five cases. Pathol Int 1996; 46:498–502.

14. Aung T, Goto M, Nomoto M, Kitajima S, Douchi T, Yoshinaga M, Yonzawa S. Uterine lipoleiomyoma: a histopathological review of 17 cases. Pathol Int 2004 Oct; 54(10):751-8.

15. Wang X, Kumar D, Seidman J. Uterine lipoleiomyomas: a clinicopathologic study of 50 cases. Int J Gynecol Pathol 2006; 25(3):239-42.

16. Scurry J, Hack M. Leiomyosarcoma arising in a lipoleiomyoma.

Gynecol Oncol 1990; 39(3):381-3.17. Pham C, Atri M, Senteman M. Ultrasonographic appearance of uterine

lipoleiomyoma. Can Assoc Radiol J 1993; 44(6):463-5.18. Balaji R, Ramachandran K, Somanthan T. Imaging appearances of

uterine lipoleiomyoma with pathological correlation - Report of two cases and literature review. Journal of Pelvic Medicine & Surgery 2009; 15(3):93-96.

19. Hertzberg B, Kliewer M, George P, Mcdonald J, Carroll B. Lipomatous uterine masses: potential to mimic ovarian dermoids on endovaginal sonography. Journal of Ultrasound in Medicine 1995; 14(9):689-692.

20. Souza L, Faintuch S, Goldman S, Louveira M, Ajzen S, Szejnfeld J. Avaliação por ressonância magnética das massas pélvicas. Rev Imagem 2003; 25(1):5–11.

21. Fereeira A, Nicolau L, Gallarreta F, Filho F, Jordão J, Oliveira F. Pode a ecografia fornecer o diagnóstico de teratoma ovariano de maneira similar ao diagnóstico histopatológico? Feminina 2009; 37(3).

22. Willen R, Gad A, Willen H: Lipomatous lesions of the uterus. Virchows Arch A Pathol Anat Histol 1978; 377:351–361.

Carnide C, Raposo J, Rodrigues C, Geraldes F

Page 51: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

153

Caso Clínico/Case Report

ABSTRACT

Major vascular injuries represent the second most common cause of death for laparoscopic procedures after anesthesia-related causes, with its incidence being probably underestimated. Although it is a safe and well-tolerated technique, the risk of damage to vascular structures must not be forgotten. Failure to rapidly identify aortic or vena cava injury can result in the patient’s death. Early diagnosis and im-mediate emergency vascular surgery should, therefore, be ensured. Prevention and knowledge of the iatrogenic causes and mechanisms are essential and a high level of alertness must be maintained at all times. Access to the peritoneal cavity is the most crucial and dangerous phase, since the majority of injuries occur during insertion of the Veress needle and the first trocar. We report a case of aortic and iliac lesions during a laparoscopic salpingectomy. The incidence, pathophysiology, diagnosis, manage-ment and prevention of major vascular injuries in laparoscopic surgery are discussed. Keywords: laparoscopy, major vascular injury, aortic iatrogenic injury, retroperitoneal hemorrhage, salpingectomy

Lesão aórtica durante a salpingectomia laparoscópicaAortic injury during laparoscopic salpingectomy

Paulo Gonçalves Dias*, Pedro Paz Dias*, Sérgio Manuel Sampaio**, Augusto Rocha Silva*, Roberto Roncon Albuquerque***

Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular, Hospital de São João,Faculdade de Medicina do Porto

* Assistente Hospital** Assistente Hospitalar, Professor Auxiliar*** Director de Serviço , Professor Agregado

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):153-156

INTRODUÇÃO

A laparoscopia tem demonstrado ser um procedi-mento seguro e bem tolerado, com validade com-provada em cirurgia geral, urológica e ginecológica. É uma técnica efectiva, com múltiplas aplicações diagnósticas e terapêuticas e com taxas de morbili-dade e mortalidade globalmente inferiores à cirurgia convencional.1,2,3 Todavia, apesar de popularidade e generalização crescentes, existem complicações es-

pecíficas e quase exclusivas desta técnica que devem merecer atenção e conhecimento adequados. É o caso das lesões vasculares major que, apesar de extrema-mente raras, são potencialmente fatais. Este artigo pretende apresentar um caso clínico de laceração aor-to‐ilíaca durante salpingectomia laparoscópica e dis-cutir o diagnóstico, tratamento e prevenção das lesões vasculares na cirurgia laparoscópica.

CASO CLÍNICO

Doente de 26 anos admitida no serviço de urgência por dor abdominal no quadrante inferior esquerdo

Page 52: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

154

e metrorragias desde há 4 dias. Tratava-se de uma mulher de raça negra, com biótipo leptoasténico (ín-dice de massa corporal, IMC=21), com história de amenorreia prévia de 8 semanas e que não relatava antecedentes relevantes ou gravidezes anteriores. A ecografia transvaginal e o doseamento da bHCG sé-rica permitiram o diagnóstico de gravidez ectópica. Perante a ausência de critérios para atitude expectante ou tratamento médico com metotrexato foi submetida a laparoscopia. Foi confirmada gravidez tubar esquer-da não rota, pelo que foi simultaneamente efectuada salpingectomia total. Durante a cirurgia não foram valorizadas quaisquer complicações e não houve re-gisto de instabilidade hemodinâmica ou alterações do traçado electrocardiográfico.

No pós operatório imediato mantinha queixas de desconforto abdominal e lombar, associadas a astenia marcada. Estava pálida e hipersudorética e apresenta-va hipotensão e taquicardia mantidas, apesar de flui-doterapia adequada. O abdómen era tenso e doloroso à palpação. Três horas após a cirurgia a hemoglobina era de 5,0 g/dL. Em consequência, realizou uma to-mografia axial computorizada (TAC) abdomino‐pél-vica que identificou um hematoma retroperitoneal central mesentérico com 5x17 cm e um pseudo‐aneu-risma aórtico com 4,3 cm de maior diâmetro (figura 1). Perante estes achados procedeu‐se a laparotomia mediana emergente com abordagem da bifurcação aórtica. Verificou-se a presença de duas lacerações (na aorta distal e na artéria ilíaca comum direita) que

Figura 1: TAC abdominopélvica. a e b) falso aneurisma com origem ao nível da bifurcação aórtica; c) volumoso hematoma retroperitoneal empurrando anteriormente o pâncreas

Figura 2: Pormenor da bifurcação aórtica após drenagem de hematoma retroperitoneal e rafia de laceração

Dias PG, Dias PP, Sampaio SM, Silva AR, Albuquerque RR

Page 53: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

155

foram prontamente rafiadas (figura 2). O extenso he-matoma retroperitoneal foi devidamente drenado. A doente recuperou sem complicações relevantes e teve alta ao 10º dia pós-operatório.

DISCUSSÃO

A abordagem laparoscópica para procedimentos ci-rúrgicos continua a aumentar, tendo a sua validade sido amplamente demonstrada em vários estudos de nível de evidência I. Uma agressão cirúrgica diminu-ída, dor pós-operatória reduzida e curta estadia hos-pitalar são características que a tornam extremamente popular, sendo preferida pelos próprios doentes.

É uma técnica segura e efectiva, cujo risco de com-plicações major não é maior do que na laparotomia e as complicações minor são até menos frequentes.3 Todavia, elas existem e incluem perfuração intesti-nal, lesão urológica, infecção, hérnia incisional, lesão vascular da parede abdominal e lesão vascular major. De facto, a lesão dos grandes vasos retroperitoneais (aorta, veia cava inferior e vasos ilíacos) é a compli-cação mais grave, sendo quase específica da técnica laparoscópica. Tem uma incidência relatada de 0,05% e uma mortalidade que varia entre 9 e 17%.1,4,5,6 Sa-lienta-se que estes dados estarão provavelmente su-bestimados, dado que se baseiam em casos clínicos isolados, curtas séries de casos e em análises retros-pectivas, onde a relutância por parte dos cirurgiões em registar estes casos não é minimizada. Torna-se assim muito difícil estimar com precisão a incidência e a taxa de mortalidade das lesões vasculares major a partir da literatura disponível.1,4 São ainda mais re-duzidas as referências a complicações relacionadas com procedimentos tubares laparoscópicos. Entre 1977 e 1981 foram relatadas 29 mortes após esterili-zação tubar ao Centers for Disease Control (CDC), 3 das quais secundárias a lesões vasculares major.7 Um estudo prospectivo de 9475 laqueações tubares lapa-roscópicas não encontrou mortes ou lesões vasculares retroperitoneais, embora o poder estatístico para de-tectar estes eventos fosse limitado.8

O conhecimento das causas e mecanismos de ia-trogenia vascular em procedimentos laparoscópicos é fundamental para a sua prevenção. O acesso à ca-

vidade peritoneal é a fase mais crucial: três quartos das lesões ocorrem durante a introdução da agulha de Veress e do primeiro trocar (as restantes durante a dis-secção cirúrgica).1,4 As causas mais frequentemente responsabilizadas são: a inexperiência do cirurgião; um conhecimento insuficiente das referências anató-micas e da distância entre a pele e o retroperitoneu; a posição e as características físicas do doente; um pneumoperitoneu inadequado; a direcção da agulha e dos trocares, bem como a força aplicada na sua in-serção.1,2,9

As lesões arteriais apresentadas no caso clínico (aorta justa-bifurcação e origem da artéria ilíaca co-mum) são as mais frequentes e realçam a necessida-de do respeito escrupuloso das técnicas de inserção e da atenção que as referências anatómicas merecem. A posição do doente e do cirurgião é outro aspec-to relevante. Em doentes de peso médio a distância estimada dos vasos retroperitoneais à pele é cerca de 6 cm; a posição de Trendelenburg determina uma rotação anterior do promontório sagrado o que apro-xima perigosamente a bifurcação aórtica da pele.10 Assim, o doente deve estar numa posição horizontal a 0°. Aconselha-se a que o cirurgão fique do lado do doente para onde o trocar vai ser introduzido, pos-sibilitando um controlo mais preciso da direcção e força de inserção1 (problema mais notório em fás-cias abdominais mais resistentes, típico de doentes jovens como a do caso clínico apresentado). A mesa cirúrgica deve ter uma altura adequada para permi-tir uma ligeira abdução do ombro do operador que, juntamente com o braço, deve ser usado na geração da força de inserção, que não deve depender apenas do punho e antebraço.11 Com a parede abdominal elevada e mantida tensa, a agulha de Veress deve ser introduzida com uma inclinação caudal a 45° para evitar a bifurcação aórtica (L4). A agulha e o trocar devem seguir uma direcção mediana, devendo ser evitada a inserção lateral. A insuflação da cavidade peritoneal com hiperpressão é importante para criar uma distância segura entre a parede abdominal e as estruturas retroperitoneais.4

Mesmo apesar de asseguradas todas as precau-ções, o cirurgião deve ter em conta que as lesões vasculares em laparoscopia, apesar de raras, de facto

Acta Obstet Ginecol Port 2011;5(3):153-156

Page 54: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

156

ocorrem e que as suas consequências podem ser catas-tróficas. A sua apresentação pode ser diversa: desde um rápido choque hipovolémico agudo até ao desenvolvi-mento de um hematoma retroperitoneal com sintomas clínicos mais frustres e repercussão hemodinâmica in-dolente. Efectivamente, a hemorragia retroperitoneal é um diagnóstico difícil, com achados inespecíficos. Numa revisão da literatura, 84% dos doentes com he-morragia retroperitoneal tiverem dor abdominal ou inguinal, sendo que apenas uma pequena minoria apre-sentou os sintomas clássicos de equimose periumbili-cal ou do flanco (respectivamente, sinal de Cullen e de Grey-Turner).12 A ecografia tem uma baixa sensibilida-de diagnóstica e pode, por vezes, estimular uma falsa sensação de segurança. Atendendo ao potencial de gra-vidade, é razoável afirmar que a TAC pode ser o exame de diagnóstico de primeira linha, como o foi no caso descrito.3 Idealmente, a lesão deve ser detectada duran-te o acto cirúrgico e sinais de alarme intra-operatórios, como alterações hemodinâmicas e electrocardiográfi-cas, devem ser prontamente valorizáveis.

De facto, um diagnóstico precoce é crucial para re-duzir a mortalidade, bem como outras consequências. A intervenção urgente com laparotomia torna-se man-datória. É requerida competência específica em cirurgia vascular, uma vez que clampagens múltiplas e inade-quadas levam a lesões mais extensas e complexas. Na grande maioria dos casos as lesões podem ser resolvidas com sutura simples (figura 2) mas, por vezes, podem necessitar de encerramento com patch ou reconstrução arterial com prótese. A inspecção intestinal após a repa-ração vascular deve ser efectuada para despistar lesões concomitantes. Apesar da gravidade destas situações, elas não provocam sequelas ou danos a longo prazo, se prontamente corrigidas. Alguns autores sugerem que, por implicações legais, os cirurgiões que realizam lapa-roscopia devem operar em centros com capacidade para intervenção vascular emergente ou devem receber treino específico em cirurgia vascular.13,14

Em conclusão, este caso evidencia a possibilida-de de ocorrer uma complicação potencialmente letal num procedimento que geralmente é seguro. A iatro-genia vascular com hemorragia retroperitoneal em cirurgia laparoscópica não deve ser esquecida e me-didas rápidas de diagnóstico e tratamento cirúrgico devem ser providenciadas. Os erros devem ser evita-dos pelo treino adequado e uma prática laparoscópica preventiva deve ser adoptada.

REFERÊNCIAS

1. Roviaro GC, Varoli F, Saguatti L, et al. Major vascular injuries in laparoscopic surgery: still of interest. Surg Endosc 2002; 16: 1192-1196

2. Pasic R, Mullins F, Gable DR, Levine RL. Major vascular injuries in laparoscopy. J Gynecol Surg 1998; 14:123-128

3. Chapron C, Fauconnier A, Goffinet F, Bréart G, Dubuisson J. Laparoscopic surgery is not inherently dangerous for patients presenting with benign gynaecologic pathology. Results of a meta-analysis. Hum Reprod 2002; 17(5): 1334-42.

4. Moore LC, Vazquez NF, Lin H, Kaplan JL. Major vascular injury after laparoscopic tubal ligation surgery. J Emerg Med 2005; 29: 67-61

5. Champault G, Cazacu F, Taffinder N. Serious trocar accidents in laparoscopic surgery: a French survey of 103,852 operations. Surg Laparosc Endosc 1996; 6: 367-370

6. Deziel DJ, MIllikan KW, Economou SG, et al. Complications of laparoscopic cholecystectomy: a national survey of 4,292 hospital and an analysis of 77,604 cases. Am J Surg 1993; 165:9-14

7. Peterson HB, DeStefano F, Rubin GL, et al. Deaths attributable to tubal sterilization in the United States, 1977 a 1981. Am J Obstet Gynecol 1983; 146: 131-6

8. Jamieson DJ, Hillis SD, Duerr A, Marchbanks PA, et al. Complications of interval laparoscopic tubal sterilization: findings from the United States Collaborative Review of Sterilization. Obstet Gynecol 2000; 96: 997-1002

9. Apelgren KN, Scheres DE. Aortic injury: a catastrophic complication of laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc 1994; 8: 689-691

10. Hurd WW, Bude RO, DeLancey JO, Pearl ML. The relationship of the umbilicus to the aortic bifurcation: implications for laparoscopic technique. Obst Gynecol 1992; 80: 48-51

11. Bhoyrul S, Vierra MA, Nezhat RC. Trocar injuries in laparoscopic surgery. J Amm Coll Surg 2001; 192: 677-683

12. Gonzalez C, Penado S, Llata L, Valero C, Riancho JA. The clinical spectrum of retroperitoneal hematoma in anticoagulated patients. Medicine 2003; 82: 257-62.

13. Natali J. Forensic medical implications of vascular injuries in the course of video-endoscopic surgery. J Mal Vasc 1996; 21: 223-226

14. Fruhwirth J, Koch G, Mischinger HJ, et al. Vascular complications in minimally invasive surgery. Surg Lap End 1997; 7: 251-254

Dias PG, Dias PP, Sampaio SM, Silva AR, Albuquerque RR

Page 55: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

157

ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESAÓrgão oficial da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia

Official journal of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology

REGRAS PARA SUBMISSÃO DE ARTIGOS

REGRAS GERAIS

1. Os artigos deverão ser submetidos exclusivamente à Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa, não podendo estar a ser simultaneamente considerados para publicação noutra revista. Serão considerados para publicação artigos que foram previamente rejeitados noutras revistas e os autores são livres de submeter os artigos não aceites por esta revista a outras publicações.

2. Todos os artigos são submetidos à revista por iniciativa dos seus autores, excepto os artigos de revisão que poderão também ser elaborados a convite dos Editores.

3. Os dados constantes do artigo não podem ter sido previamente publicados, total ou parcialmente, noutras revistas. Deste âmbito, exclui-se a publicação sob forma de resumo em actas de reuniões científicas.

4. Os autores poderão no prazo de 3 meses re-submeter uma única vez os artigos rejeitados pela revista, os quais serão encarados como novas submissões.

5. Os requisitos para autoria de artigos nesta revista estão em consonância com os Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals, disponível em www.icmje.org/icmje.pdf.

6. Os autores são responsáveis pela verificação cuidadosa dos textos na primeira submissão, bem como nas eventuais versões modificadas e nas provas finais do artigo.

SUBMISSÃO ONLINE DE ARTIGOS

1. Os artigos são submetidos exclusivamente na página de submissões da revista em www.editorialmanager.com/aogp.

2. A revista aceita cinco tipos diferentes de artigos:• ESTUDO ORIGINAL• ARTIGO DE REVISÃO• CASO CLÍNICO• ARTIGO DE OPINIÃO• CARTA AO EDITOR

3. Todos os artigos necessitam de um título em Inglês que não pode exceder 150 caracteres incluíndo espaços.

4. A lista de autores deve incluir o primeiro e último(s) nome(s) de cada um, juntamente com as funções académicas e hospitalares actuais. Para os artigos de revisão, artigos de opinião e casos clínicos não se aceitam mais do que 5 autores. Para os estudos originais são aceites até 8 autores, podendo este número ser excedido em estudos corporativos que envolvam mais de dois centros. Um dos autores é designado “responsável pela correspondência” e os seus contactos devem ser fornecidos na página de submissões da revista.

5. Os estudos originais, artigos de revisão, artigos de opinião e casos clínicos necessitam de incluir um resumo em inglês que não pode exceder 300 palavras. Este texto não pode incluir qualquer referência aos autotes ou à instituição onde o estudo foi realizado. A estrutura é diferente de acordo com o tipo de artigo: • ESTUDO ORIGINAL – parágrafos com os títulos Overview and Aims, Study

Design, Population, Methods, Results, and Conclusions.• OUTROS – estrutura livre.

6. Os estudos originais, artigos de revisão, artigos de opinião e casos clínicos necessitam de incluir 1 a 5 palavras-chave, segundo a terminologia MeSH (www.nlm.nih.gov/mesh/meshhome.html).

7. Todos os artigos necessitam de um título em Português que não pode exceder 150 caracteres incluíndo espaços.

8. É necessário indicar o nome e localização da(s) instituição(ões) onde a investigação teve lugar.

9. É da responsabilidade dos autores informar os Editores de possíveis conflitos de interesse relacionados com a publicação, bem como de publicações anteriores dos dados.

INFORMATION FOR AUTHORS

GENERAL RULES FOR SUBMMITING ARTICLES

1. Manuscripts should be submitted exclusively to Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa, and may not be under simultaneous consideration for publication in other journals. Manuscripts that have been previously rejected by other journals will be considered for publication, and authors are free to submit those that have been rejected by this journal elsewhere.

2. All manuscripts are submitted to the journal on the authors’ initiative, except for revision articles that may also be submitted on invitation from the Editors.

3. Data presented in the manuscript must not have been previously published, in whole or in part, in another journal. This does not include publications in the form of abstract in proceedings of scientific meetings.

4. Authors may re-submit a rejected article once, within 3 months of the decision. Re-submitted articles will be considered as new submissions.

5. Requirements for authorship of manuscripts in this journal are in accordance with Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals, available at www.icmje.org/icmje.pdf .

6. Authors are responsible for carefully checking their texts before first submission, as well as with subsequent revised versions, and in the final proofs of the manuscript.

ONLINE SUBMISSION OF ARTICLES

1. Articles are submitted exclusively at the journal submission site: www.editorialmanager.com/aogp.

2. The journal accepts five different types of articles:• ORIGINAL STUDY• REVIEW ARTICLE• CASE REPORT• OPINION ARTICLE• LETTER TO THE EDITOR

3. All articles must contain a title in English, which should not exceed 150 caracters in length, including spaces.

4. The list of authors should include their first and last name(s), together with current academic and hospital positions. No more than 5 authors are accepted for review articles, opinion articles and for case reports. For original studies up to 8 authors will be accepted, and this number may be exceeded in corporate studies involving more than two centres. One of the authors will be designated as “responsible for correspondence” and his/her contact information should be made available at the journal submission site.

5. Original studies, review articles, opinion articles and case reports must include an abstract in English, which should not exceed 300 words. The text must not include any reference to the authors or to the institution where research took place. The structure of the abstract varies according to the article type: • ORIGINAL STUDY – paragraphs with the headings Overview and Aims, Study

Design, Population, Methods, Results, and Conclusions. • OTHERS – free structure.

6. Original studies, review articles, opinion articles and case reports must include 1-5 keywords, according to MeSH terminology (www.nlm.nih.gov/mesh/meshhome.html).

7. All articles must include a title in Portuguese, which cannot exceed 150 caracteres in length, including spaces.

8. The names and locations of the institution(s) where research was conducted must be supplied.

9. It is the responsability of authors to inform the Editors about potential conflicts of interest related with the publication, as well as about previous reports of the same data.

Page 56: ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA · PAULO MOURA FILOMENA NUNES ... Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves,

158

PREPARAÇÃO DO TEXTO, TABELAS E FIGURAS

1. Os ficheiros submetidos com o texto principal do artigo, tabelas e figuras não devem ter qualquer referência aos autores ou à(s) instituição(ões) onde a investigação foi realizada.

2. Todos os textos submetidos devem ter duplo espaço entre linhas, usando a fonte Times New Roman de 11 pontos.

3. O texto principal do artigo tem estrutura e dimensão máxima (excluíndo referências) de acordo com o tipo de artigo:• ESTUDO ORIGINAL – secções divididas com os títulos: Introdução, Métodos,

Resultados e Discussão; dimensão máxima 3000 palavras. • ARTIGO DE REVISÃO – estrutura livre; dimensão máxima 5000 palavras.• ARTIGO DE OPINIÃO – estrutura livre; dimensão máxima 1500 palavras.• CASO CLÍNICO – secções divididas com os títulos Introdução, Caso Clínico

e Discussão; dimensão máxima 1500 palavras.

4. As investigações que envolvem seres humanos ou animais devem incluir no texto uma declaração relativa à existência de aprovação prévia por uma Comissão de Ética apropriada. Com seres humanos é ainda necessário incluir uma declaração relativa à solicitação de consentimento informado dos participantes.

5. As abreviaturas devem ser empregues com moderação e definidas por extenso aquando da primeira utilização, tanto no resumo como no texto principal do artigo.

6. Devem ser sempre utilizados os nomes genéricos dos medicamentos, excepto quando o nome comercial é particularmente relevante. Neste caso, devem ser acompanhados do símbolo ®.

7. Os equipamentos técnicos, produtos químicos ou farmacêuticos citados no texto devem ser seguidos entre parentesis do nome do fabricante, cidade e país onde são comercializados.

8. No final do texto principal os autores podem incluir os agradecimentos que queiram ver expressos no artigo.

9. As referências deverão ser numeradas consecutivamente na ordem em que são mencionadas no texto, tabelas ou legendas de figuras, usando números arábicos em sobrescrito; exemplo 1,2,3. Os artigos aceites para publicação mas ainda não publicados podem ser incluidos na lista de referências no formato habitual, usando o nome da revista seguido da expressão in press. As comunicações pessoais, abstracts em livros de resumos de congressos, páginas web e artigos ainda não aceites não podem ser incluídos na lista de referências.• ESTUDO ORIGINAL – máximo de 50 referências. • ARTIGO DE REVISÃO – máximo de 125 referências.• ARTIGO DE OPINIÃO – máximo de 20 referências.• CASO CLÍNICO – máximo de 20 referências.

10. A lista des referências deve seguir as normas do Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals www.icmje.org/icmje.pdf. Os títulos das revistas são abreviados de acordo com a lista da National Library of Medicine, disponível em ftp://nlmpubs.nlm.nih.gov/online/journals/ljiweb.pdf. Exemplo de artigos publicados em revistas:Grant JM. The whole duty of obstetricians. BJOG 1997;104:387-92.Exemplo de Capítulos de livros::Goldenberg RL, Nelson KG. Cerebral Palsy. In: Maternal-Fetal Medicine (4th Edition). Creasy RK, Resnik R (eds). WB Saunders;1999:1194-214.

11. Os quadros são submetidos em formato digital, separadamente do texto principal. Devem ser numerados sequencialmente em numeração romana (I, II, III, IV etc.) e não apresentar linhas verticais internas; as únicas linhas horizontais a incluir são na margem superior e inferior do quadro e após os títulos das colunas. Os dados contidos nos quadros e nas legendas devem ser concisos e não devem duplicar a informação do texto. As legendas dos quadros devem ser submetidas nos mesmos ficheiros dos quadros.

12. As figuras devem ser numeradas sequencialmente na ordem que aparecem no texto, usando numeração arábica (1, 2, 3, etc.) e submetidas em formato digital, em ficheiros separados do texto principal e dos quadros. Podem ser submetidas figuras a preto e branco ou a cores. As legendas das figuras devem ser submetidas dentro do texto principal, numa página separada, após as referências.

13. Após aceitação de um artigo, mas antes da sua publicação, os autores deverão enviar por email à revista o Formulário de Garantia dos Autores, disponível em www.aogp.com.pt/authors_form.pdf, assinado por todos.

CARTAS AO EDITOR

1. As cartas ao Editor referem-se em principio a artigos publicados nos últimos dois números da revista, mas poderão ocasionalmente também ser publicadas cartas sobre outros temas de especial interesse. Se for considerado relevante o Editor Chefe solicitará uma resposta dos autores do artigo original.

2. As cartas ao Editor e as respostas dos autores não devem exceder 750 palavras nem 5 referências.

PREPARATION OF THE MANUSCRIPT, TABLES AND FIGURES

1. Uploaded files containing the main manuscript, tables and figures must not contain any reference to the authors or to the institution(s) where research was conducted.

2. All texts should be submitted double spaced, using an 11-point Times New Roman font.

3. The structure and maximum dimensions (excluding references) of the main manuscript vary according to the type of article:• ORIGINAL STUDY – separate sections with headings: Introdution, Methods,

Results and Discussion; limit of 3000 words. • REVIEW ARTICLE – free structure; limit of 5000 words.• OPINION ARTICLE – free structure; limit of 1500 words.• CASE REPORT – separate sections with headings: Introduction, Case Report

and Discussion; limit of 1500 words.

4. All research involving human subjects or animals should contain a statement in the text regarding the existance of prior approval by an appropriate Ethics Committee. With human subjects it is also necessary to include a statement concerning the request of informed consent from participants.

5. Abbreviations should be used sparingly and written in full extent at first usage, both in the article’s abstract and in the full body of the text.

6. Drugs should always be referred to by their generic names, except when the trade name is of particlular relevance. In this case they should be accompanied by the symbol®.

7. Technical equipments, chemical or pharmaceutical products cited in the text should be followed in brackets by the name of the manufacterer, city and country where they are commercialised.

8. At the end of the main text, authors may include the aknowlegments that they would like published in the article.

9. References should be numbered consecutively in the order that they are first mentioned in the text, tables or figure legends, using arabic numbers in superscript; i.e 1,2,3. Papers accepted for publication but not yet published may be cited in the reference list in the usual format, using the journal name followed by the words in press. Personal communications, abstracts published in congress proceedings, web pages, and articles submitted for publication but still under evaluation may not be cited as references. • ORIGINAL STUDY – maximum of 50 references. • REVIEW ARTICLE – maximum of 125 references.• OPINION ARTICLE – maximum of 20 references.• CASE REPORT – maximum of 20 references.

10. The reference list should follow the guidelines of the Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals www.icmje.org/icmje.pdf. Journal titles should be abbreviated according to the National Library of Medicine list, available at ftp://nlmpubs.nlm.nih.gov/online/journals/ljiweb.pdf. Example of articles published in scientific journals:Grant JM. The whole duty of obstetricians. BJOG 1997;104:387-92.Example of Book chapters:Goldenberg RL, Nelson KG. Cerebral Palsy. In: Maternal-Fetal Medicine (4th Edition). Creasy RK, Resnik R (eds). WB Saunders;1999:1194-214.

11. Tables are to be submitted in digital format, separately from the main manuscript. They should be numbered sequentially with roman numerals (I, II, III, IV etc.) and must not display internal vertical lines; the only horizontal lines that should appear are above and below the table, and following the column headings. Data contained in the tables should be concise and must not duplicate the information given in the text. Table legends should be submitted in the same files as the tables.

12. Figures should be numbered sequentially in the order that they appear in the text, using arabic numerals (1, 2, 3, etc.) and submitted in digital format, in separate files from those of the main manuscript and tables. Both black-and-white and colour figures may be submitted. Figure legends should be submitted within the main manuscript file, on a separate page, following the references.

13. After acceptance of an article, but before its publication, the authors must send to the journal by email the Authors’ Guarantee Form, available at www.aogp.com.pt/authors_form.pdf, signed by all.

LETTERS TO THE EDITOR

1. Letters to the Editor usually refer to articles published in the last two issues of the journal, but those addressing other themes of special interest may ocasionally be published. If considered relevant, the Editor-in-Chief will ask for a reply from the authors of the original article.

2. Letters to the Editor and replies from the authors should not exceed 750 words nor 5 references.