Administrativo responsabilidade civil do municipio

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Apelação Cível n. 2011.062605-9, de Palhoça Relator: Des. Jaime Ramos ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS - ACIDENTE DE TRÂNSITO - AREIA AMONTOADA NA PISTA DE ROLAMENTO - AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃO QUE PREJUDICOU MANOBRA DEFENSIVA E OCASIONOU COLISÃO DE VEÍCULO - OMISSÃO DA MUNICIPALIDADE - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA - DEVER DE INDENIZAR - DANOS MATERIAIS - "QUANTUM" INDENIZATÓRIO ADEQUADO - DANO MORAL - VALOR QUE SE MOSTRA EXCESSIVO - REDUÇÃO - REEXAME E RECURSO PROVIDOS PARCIALMENTE. O Município que não sinaliza a presença de obstáculo na via pública deve responder pela indenização dos danos materiais e morais causados ao condutor do veículo que passava pelo local e, não tendo a oportunidade de desviar, acabou colidindo e sofrendo prejuízos, inclusive corporais. O "quantum" da indenização do dano moral há de ser fixado com moderação, em respeito aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, levando em conta não só as condições sociais e econômicas das partes, como também o grau da culpa e a extensão do sofrimento psíquico, de modo que possa significar uma reprimenda ao ofensor, para que se abstenha de praticar fatos idênticos no futuro, mas não ocasione um enriquecimento injustificado para o lesado. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2011.062605-9, da Comarca de Palhoça (1ª Vara Cível), em que é apelante Município de Palhoça, e apelado Francisco Cesar de Melo: A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso e à remessa oficial. Custas na forma da lei. Do julgamento realizado em 1º/09/2011, presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Cláudio Barreto Dutra, com voto, participou o Exmo. Sr. Desembargador José Volpato de Souza.

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ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAISE MORAIS - ACIDENTE DE TRÂNSITO - AREIA AMONTOADA NA PISTA DE ROLAMENTO - AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃO QUE PREJUDICOU MANOBRA DEFENSIVA E OCASIONOUCOLISÃO DE VEÍCULO - OMISSÃO DA MUNICIPALIDADE - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA - DEVER DE INDENIZAR - DANOS MATERIAIS - "QUANTUM" INDENIZATÓRIO ADEQUADO - DANO MORAL - VALOR QUE SE MOSTRA EXCESSIVO - REDUÇÃO - REEXAME E RECURSO PROVIDOS PARCIALMENTE

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Apelação Cível n. 2011.062605-9, de PalhoçaRelator: Des. Jaime Ramos

ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DOMUNICÍPIO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAISE MORAIS - ACIDENTE DE TRÂNSITO - AREIA AMONTOADANA PISTA DE ROLAMENTO - AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃOQUE PREJUDICOU MANOBRA DEFENSIVA E OCASIONOUCOLISÃO DE VEÍCULO - OMISSÃO DA MUNICIPALIDADE -RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA - DEVER DEINDENIZAR - DANOS MATERIAIS - "QUANTUM"INDENIZATÓRIO ADEQUADO - DANO MORAL - VALOR QUESE MOSTRA EXCESSIVO - REDUÇÃO - REEXAME ERECURSO PROVIDOS PARCIALMENTE.

O Município que não sinaliza a presença de obstáculo na viapública deve responder pela indenização dos danos materiais emorais causados ao condutor do veículo que passava pelo locale, não tendo a oportunidade de desviar, acabou colidindo esofrendo prejuízos, inclusive corporais.

O "quantum" da indenização do dano moral há de ser fixadocom moderação, em respeito aos princípios da razoabilidade e daproporcionalidade, levando em conta não só as condições sociaise econômicas das partes, como também o grau da culpa e aextensão do sofrimento psíquico, de modo que possa significaruma reprimenda ao ofensor, para que se abstenha de praticarfatos idênticos no futuro, mas não ocasione um enriquecimentoinjustificado para o lesado.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.2011.062605-9, da Comarca de Palhoça (1ª Vara Cível), em que é apelante Municípiode Palhoça, e apelado Francisco Cesar de Melo:

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, darprovimento parcial ao recurso e à remessa oficial. Custas na forma da lei.

Do julgamento realizado em 1º/09/2011, presidido pelo Exmo. Sr.Desembargador Cláudio Barreto Dutra, com voto, participou o Exmo. Sr.Desembargador José Volpato de Souza.

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Florianópolis, 1º de setembro de 2011.

Jaime RamosRELATOR

Gabinete Des. Jaime Ramos

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RELATÓRIO

Na Comarca de Palhoça, Francisco Cesar de Melo ajuizou "ação dereparação de danos causados em acidente de veículos cumulada com indenizaçãopor perdas e danos" contra o Município de Palhoça alegando que no dia 05/05/2005trafegava com sua motocicleta Yamaha YBR 125, placas MFA-8381, ano/modelo2005, pela Rua Leopoldo Schutz, "atendendo todas as exigências de trânsito"; queem determinado trecho foi surpreendido por uma quantidade de areia despejadasobre a pista; que se acidentou e sofreu lesões de natureza grave e danos materiaisexpressivos; que no local não havia sinalização a respeito da irregularidade na pista;por fim, pediu a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

A gratuidade foi indeferida e as custas iniciais foram recolhidas.Citada, a municipalidade contestou sustentando que não vieram aos

autos provas incontestes da existência de danos materiais e morais indenizáveis; quea indenização requerida a título de danos morais é desarrazoada; que "a incidênciada correção monetária deverá ter seu marco inicial na data do aforamento da ação e oíndice de atualização deve ser o INPC"; que os juros moratórios deverão incidir dacitação.

Impugnados os argumentos da contestação, colhido o depoimentopessoal do autor e ouvida uma testemunha, o digno Juiz de Direito, Dr. VilmarCardozo, sentenciou:

"Julgo procedentes os pedidos formulados por Francisco Cesar de Melocontra o Município de Palhoça e, em conseqüência, condeno-o:

"a) ao pagamento do valor atualizado pelos índices divulgados pelaCorregedoria-Geral de Justiça de 2.189,90 (dois mil cento e oitenta e nove reais comnoventa centavos) referente aos danos materiais;

"b) ao pagamento da importância de 50 (cinquenta) salários mínimos,que hoje perfaz o montante equivalente a R$ 25.500,00 (vinte e cinco mil equinhentos reais ), a título de danos morais;

"c) ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios,que fixo em 10% (dez cento) sobre o valor da condenação.

"Sem condenação ao pagamento de custas (art. 35, alínea h, da LeiComplementar Estadual n. 156/97, com as alterações da LC n. 161/97).

"Tratando-se de responsabilidade civil extracontratual, pelo que condenoo réu ao pagamento de juros moratórios, sobre o total da condenação, desde a datado evento danoso, de 1% ao mês (CC/2002, art. 406 c/c art. 161, 1., do CTN)".

Inconformado, o Município de Palhoça apelou arguindo que o apelado éparte ilegítima para pleitear a indenização dos danos materiais, porquanto "nãocomprovou ser o proprietário da motocicleta que utilizava no momento do acidente,nem comprovou ter pagado pelo conserto dos respectivos danos"; que inexiste danomoral indenizável no feito; que, caso esse não seja o entendimento, a indenizaçãodeve ser reduzida; que deve ser declarada a reciprocidade da responsabilidade pelaverbas sucumbenciais.

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Sem contrarrazões, não obstante a intimação para tanto, os autosascenderam a esta Superior Instância.

VOTO

Impende esclarecer, desde logo, que a sentença condenatória proferidacontra o Município de Palhoça (Fazenda Pública Municipal) sujeita-se ao duplo graude jurisdição a que se refere o art. 475, inciso I, do Código de Processo Civil, porquea condenação ou direito controvertido supera o valor de sessenta (60) saláriosmínimos.

Por tratarem dos mesmos temas, o reexame necessário e o apelo serãotratados em conjunto.

Há que se dar provimento parcial à remessa necessária e ao apelo.1. Inicialmente, convém analisar a responsabilidade civil para o caso em

questão.Trata-se de ação de indenização ajuizada por Francisco Cesar de Melo

contra o Município de Palhoça, por ter sofrido danos materiais e morais emdecorrência de acidente de trânsito ocasionado pela existência de um monte de areiana via pública sem a devida sinalização no local.

No caso em análise, em que se alega a omissão do Municípiodecorrente da ausência de sinalização acerca da existência de areia na pista, o quefoi a causa determinante do acidente que culminou com os danos cujas indenizaçõesforam pleiteadas na exordial, patente a aplicabilidade da teoria da responsabilidadecivil dos entes públicos.

Segundo o art. 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988 e o art. 15, daConstituição do Estado de Santa Catarina, "as pessoas jurídicas de direito público eas de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos queseus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito deregresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

Por sua vez, os arts. 43, 186, 927 e 932, inciso III, do Código Civil de2002, definem a responsabilidade, mesmo subjetiva, do Município, pelos atospraticados com culpa que causarem prejuízo a outrem, devendo reparar o dano. Parao êxito da ação de indenização fundada em ato ilícito é imprescindível a presença doselementos caracterizadores da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta ilícita, odano, e o nexo de causalidade.

Não obstante a exigência, pelo Código Civil, da demonstração de culpapor ato comissivo ou omissivo do agente público, firmou-se a orientação doutrinária,em face do texto constitucional, de que a responsabilidade civil do Estado é objetivano sentido de que o ente público responde sempre pelos atos, culposos ou não, deseus agentes, desde que demonstrado o nexo causal entre aqueles e os prejuízossofridos pelo administrado. Essa responsabilidade civil objetiva é baseada na teoriado risco administrativo, que admite exclusão ou atenuação da responsabilidade noscasos de força maior, caso fortuito, culpa da vítima ou de terceiro que não seja oagente público.

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Mas também se consolidou o entendimento de que, nos casos deomissão, a responsabilidade civil do Estado não é objetiva, mas sim subjetiva,devendo ser demonstrada a culpabilidade.

Sobre o assunto, extrai-se da lição de CARLOS ROBERTOGONÇALVES:

"Em excelente artigo sobre a 'Responsabilidade extracontratual doEstado por comportamentos administrativos', publicado na RT, 552:11-20, o Prof.Celso Antônio Bandeira de Mello, da Universidade Católica de São Paulo, apresentavárias conclusões, algumas das quais, por pertinentes, merecem ser aqui transcritas:

"[...]"'h) Quando o comportamento lesivo é omissivo, os danos são causados

pelo Estado, mas por evento alheio a ele. A omissão é condição do dano, porquepropicia sua ocorrência. Condição é o evento cuja ausência enseja o surgimento dodano.

"'i) No caso de dano por comportamento omissivo, a responsabilidade doestado é subjetiva. Responsabilidade subjetiva é aquela cuja irrupção depende deprocedimento contrário ao Direito, doloso ou culposo.

"'j) O Estado responde por omissão quando, devendo agir, não o fez,inocorrendo no ilícito de deixar de obstar àquilo que podia impedir e estava obrigado afazê-lo'" (in Comentários ao Código Civil. v. 11. São Paulo: Saraiva, 2003, p.104/105).

No mesmo sentido doutrina LÚCIA VALLE FIGUEIREDO:"Deveras, ainda que consagre o texto constitucional a responsabilidade

objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado nahipótese de omissão, a não ser pela teoria subjetiva.

"Assim é porque, para se configurar a responsabilidade estatal pelosdanos causados, há de se verificar (na hipótese de omissão) se era de se esperar aatuação do Estado.

"Em outro falar: se o Estado omitiu-se, há de se perquirir se havia odever de agir. Ou, então, se a ação estatal teria sido defeituosa a ponto de secaracterizar insuficiência da prestação de serviço" (Curso de Direito Administrativo, 7.ed., São Paulo: Malheiros Ed., 2004, p. 269).

Outro não é o entendimento de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DEMELLO:

"Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado(o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de se aplicar a teoriada responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode,logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-locaso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo sedescumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo.

"Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir oacontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportarpatrimonialmente as conseqüências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por atoomissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo

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responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois nãohá conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não sejaproveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberadopropósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolosão justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva" (Curso de DireitoAdministrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 895-896).

Também é enfática a lição de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO:"(...) a omissão na prestação do serviço tem levado à aplicação da teoria da culpa doserviço público ('faute du service'); é a culpa anônima, não individualizada; o dano nãodecorreu de atuação de agente público, mas de omissão do poder público (cf.acórdãos in RTJ 70/704, RDA 38/328, RTJ 47/378)" (Direito administrativo. 14. ed.São Paulo: Atlas, 2002, p. 531).

Nesse sentido são os precedentes do Supremo Tribunal Federal e doSuperior Tribunal de Justiça:

"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. DANO MORAL.RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO EDAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇOPÚBLICO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: MORTE DE PRESIDIÁRIO POROUTRO PRESIDIÁRIO: RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA:'FAUTE DE SERVICE'. C.F., art. 37, § 6º.

"I - A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e daspessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público, responsabilidadeobjetiva, com base no risco administrativo, ocorre diante dos seguintes requisitos: a)do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e aação administrativa.

"II - Essa responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo,admite pesquisa em torno da culpa da vítima, para o fim de abrandar ou mesmoexcluir a responsabilidade da pessoa jurídica de direito público ou da pessoa jurídicade direito privado prestadora de serviço público.

"III - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidadecivil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, numa de suas três vertentes,negligência, imperícia ou imprudência, não sendo, entretanto, necessárioindividualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, afaute de service dos franceses.

"IV - Ação julgada procedente, condenado o Estado a indenizar a mãedo presidiário que foi morto por outro presidiário, por dano moral. Ocorrência da fautede service" (STF, Segunda Turma, RE 179147/SP, Min. Carlos Veloso).

"No campo da responsabilidade civil do Estado, se o prejuízo adveio deuma omissão do Estado, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva" (STJ,REsp n. 549.812, Des. Franciulli Netto).

E desta Corte de Justiça:"Nos casos de omissão por parte do Estado, a responsabilidade é

considerada subjetiva. Cumpre, portanto, àquele que sofreu os efeitos do fato danosodemonstrar que a Administração, através de seus agentes, incorreu em uma das

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modalidades de culpa - negligência, imprudência ou imperícia."Não é suficiente para auferir a culpa subjetiva do Estado a simples

suposição de que a vítima não se encontrava em seu estado normal emocional, énecessária a apresentação de provas concretas nesse sentido" (TJSC, AC n.º1999.0021117-3, Des. Luiz Cézar Medeiros).

Para decidir-se sobre a obrigação de indenizar da municipalidade, cabeverificar se houve a conjugação dos três fatores indispensáveis à responsabilizaçãocivil: a omissão da demandada na sinalização da existência de corpo estranho na viapública; a efetiva ocorrência de danos ao autor, seja de ordem material ou moral; e arelação de causalidade entre o dano e a conduta culposa do réu.

Para tanto, serão transcritos os motivos expendidos na sentença, quepassam a integrar os fundamentos deste acórdão, porquanto as provas carreadas aosautos foram examinadas com muita percuciência pelo douto Magistrado "a quo", Dr.Vilmar Cardozo:

"O depoimento de fls. 154/155 demonstra a existência do 'monte' deareia alegado pelo autor, o qual foi a causa do acidente por ele sofrido.

"[...]."O nexo causal é evidente e os danos também. Aliás, não foram

contestados pelo réu (fls. 118/127), o que faz incidir a presunção de veracidadedisposta no art. 302, caput, do CPC. Não bastasse isso, a testemunha ouvida às fls.154/155 atestou de forma segura e coerente o nexo entre a colisão do autor no'monte' de areia e as lesões por ele sofridas.

"[...] entendo que a culpa está cabalmente demonstrada nos autos pelanegligência do Município.

"O acidente deu-se aos dias 05/05/2005, por volta das 22:30 horas, naRua Leopoldo Schutz, segundo consta no Boletim de Ocorrência acostado à fl. 14.

"Com esteio, a falta de sinalização da rua, especificamente quanto aodepoimento de fls. 154/155, respectivamente, atesta a culpa do Município peloacidente ocorrido: 'que não havia nenhuma sinalização relativa a areia depositadapelo caminhão da prefeitura'.

"Outrossim, aduz o requerente em seu depoimento de fls. 152/153, quepassou pelo local do acidente no dia dos fatos, pela manhã, quando se dirigia aotrabalho e que o 'monte de areia' não estava no local: 'refere que na data do fatopassou pelo local no período matutino, nada tendo vislumbrado, sendo que aoretornar deparou-se com um pequeno monte de areia que se encontrava localizadono leito da pista', o que confirma a testemunha em seu depoimento: 'que a areia foidepositada no local do acidente, por uma caçamba da prefeitura por volta das 16 às16:30 horas; que havia o logotipo da prefeitura municipal de Palhoça na caçambaantes referida'.

"Ainda neste norte, à deficiência da iluminação pública no local doacidente também contribuiu para a ocorrência dos fatos: refere que no trecho ondeocorreu o acidente não eram boas as condições de iluminação pública (depoimentopessoal do autor, fl. 152); indagado sobre as condições de luminosidade respondeuque sua residência se localiza bem no meio entre dois postes de iluminação pública

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existentes para cada lado da via onde ocorreu o acidente (depoimento datestemunha, fl. 154)".

Dessarte, resta evidente que, diante da existência de monte de areiacolocada por agente municipal na pista de rolamento da rua, sem a devidasinalização, em que pese a insistência do Município em negar a prática de qualqueromissão, a responsabilidade pela ocorrência do acidente é da municipalidade, quedeveria zelar pela conservação da via pública, retirando a areia espalhada ou,imediatamente, colocando sinalização de advertência que prevenisse o motorista, afim de que ele, com antecipação suficiente, pudesse tomar as providências e realizaras manobras necessárias para desviar com segurança.

Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência:"RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - BURACO

NA VIA PÚBLICA - INEXISTÊNCIA DE SINALIZAÇÃO NO LOCAL - OMISSÃO DOMUNICÍPIO NA CONSERVAÇÃO DO LOGRADOURO - COMPROVADO O DANO, ONEXO CAUSAL E A CULPA - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA DAADMINISTRAÇÃO CARACTERIZADA - CULPA EXCLUSIVA DO AUTOR AFASTADA- QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS) -DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS - SENTENÇA REFORMADA -RECURSO DO MUNICÍPIO IMPROVIDO - RECURSO DA AUTORAPARCIALMENTE PROVIDO.

"Nos casos de omissão por parte do Estado, a responsabilidade éconsiderada subjetiva. Cumpre, portanto, àquele que sofreu os efeitos do fato danosodemonstrar, além do comportamento omissivo, do dano e do nexo causal, que aAdministração operou com culpa, ainda que não se possa individualizá-la." (AC n.2006.045438-0, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, da Capital)". (TJSC, AC n.2011.021633-9, de Joinville, Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, julgada em28/06/2011).

"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS,ESTÉTICOS E MATERIAIS - ACIDENTE DE TRÂNSITO CAUSADO PELAEXISTÊNCIA DE BURACO NÃO SINALIZADO NA PISTA - OMISSÃO DO PODERPÚBLICO MUNICIPAL VERIFICADA - NEGLIGÊNCIA - DEVER DE RESSARCIR OSPREJUÍZOS CAUSADOS AO MUNÍCIPE RECONHECIDO - SENTENÇA MANTIDA -RECURSO DESPROVIDO.

"Constatado que o acidente somente ocorreu por culpa do Município,que foi negligente ao deixar de conservar e sinalizar via pública, resta configurado onexo de causalidade entre sua omissão e o dano sofrido pelo Munícipe e o dever deressarcir os danos daí advindos". (TJSC, AC n. 2010.031326-9, de Joinville, Rel. Des.Cid Goulart, julgada em 27/05/2011).

Desse modo, é inquestionável a obrigação do Município de Palhoça deindenizar os danos causados ao autor pelo acidente de trânsito. Portanto, noparticular, mantém-se a sentença para reconhecer a ocorrência do ato ilícito e aresponsabilidade civil da municipalidade pelo evento danoso narrado na inicial.

2. Quanto à discussão acerca dos danos materiais, há que seesclarecer, inicialmente, que a alegação aventada pelo Município/apelante de que o

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apelado seria parte ilegítima para pleitear a indenização dos danos materiais no casoem comento não foi aventada durante a instrução processual, representandoinovação recursal, razão por que o apelo deixa de ser conhecido neste tema.

Em relação ao reexame necessário, o digno Juiz de Direito novamenteagiu com acerto, bem apreciando as provas acostadas à inicial, não merecendo asentença reparo neste tema, como segue:

"Quanto aos danos materiais, imprescindível sua específicacomprovação nos autos. O autor argumentou que teve despesas com o conserto desua motocicleta. Para comprovar suas alegações, juntou os orçamentos de fls. 17/20,as quais não foram impugnadas pelo réu, o que faz com que a indenização se limiteàqueles valores, devidamente atualizados e acrescidos de juros moratórios".

Logo, acerca dos danos materiais, nega-se provimento ao apelo e àremessa necessária.

3. No que se refere à indenização do dano moral, impende registrar queesta não tem caráter de reposição, porque a moral não pode ser ressarcida, mas temexclusivamente o objetivo de tentar compensar a dor sofrida pelo lesado em razão deatitudes equivocadas, errôneas ou dolosas de terceiros, para que estes venham atomar as cautelas necessárias a fim de evitar que novos fatos, como o dos presentesautos, venham a acontecer.

Dano moral, segundo MINOZZI, citado por JOSÉ DE AGUIAR DIAS, éaquele que "não é o dinheiro nem coisa comercialmente reduzida a dinheiro, mas ador, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral umadolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuída à palavra dor no mais largosignificado" (Da responsabilidade civil. v. 2. 6. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro:Forense, 1979, p. 414).

Portanto, valor nenhum é capaz de ressarcir ou mesmo compensar ostranstornos causados. No entanto, como não existem outros critérios para compensara dor, atualmente se vem decidindo no sentido de que as indenizações pecuniáriassão a melhor solução para se tentar amenizar as amarguras sofridas pela ofensa oupelo abalo moral.

Nesse sentido são os precedentes do Supremo Tribunal Federal,reproduzidos pelo Superior Tribunal de Justiça:

"Não indenizar o dano moral é deixar sem sanção um direito, ou umasérie de direitos. A indenização, por menor e mais insuficiente que seja, é a únicasanção para os casos em que se perdem ou se têm lesados a honra a liberdade, aamizade, a afeição, e outros bens morais mais valiosos de que os econômicos" (STF -RE n. 97.097, Min. Oscar Correa; STJ 108/287-295).

O Código Civil de 1916 não continha dispositivo expresso autorizando aindenização do dano moral. Até o advento da atual Constituição se entendia que odano moral só seria indenizável se produzisse reflexos patrimoniais ao lesado. O art.159, de tal Estatuto, no entanto, ao determinar que quem por ação ou omissão,imprudência, negligência ou imperícia viesse a causar dano (de qualquer espécie) aoutrem, ficava obrigado a repará-lo.

Mas a Constituição Federal de 1988 previu a possibilidade de reparação

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de danos morais puros ou cumulados com os danos materiais, nos incisos V e X, doart. 5º:

"V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além daindenização por dano material, moral ou à imagem".

"X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem daspessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrentede sua violação".

Para compatibilizar-se com a orientação constitucional, o atual CódigoCivil (Lei n. 10.406, de 10/01/2002), em vigor desde 12/01/2003, corrigiu a omissão doanterior, ao prever expressamente a obrigação de indenizar qualquer espécie de danocausado a alguém, ainda que somente moral:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ouimprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,comete ato ilícito".

"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano aoutrem, fica obrigado a repará-lo".

Não há, contudo, parâmetros legais para a fixação do valor daindenização dos danos morais. É insuficiente a orientação contida no art. 944, e seuparágrafo, do Código Civil de 2002, segundo os quais, "a indenização mede-se pelaextensão do dano" e "se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa eo dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização". Assim, como não tembase financeira ou econômica própria e objetiva, o "quantum" da reparação dos danosmorais é aleatório. Cabe ao magistrado arbitrar o valor que entender justo, adequado,razoável e proporcional.

CARLOS ALBERTO BITTAR, acerca do valor da indenização, explica:"[...] diante da esquematização atual da teoria em debate, são conferidos

amplos poderes ao juiz para definição da forma e da extensão da reparação cabível,em consonância, aliás, com a própria natureza das funções que exerce no processocivil (CPC, arts. 125 e 126). Com efeito, como julgador e dirigente do processo, podeo magistrado ter conhecimento direto das partes, dos fatos e das respectivascircunstâncias, habilitando-as, assim, à luz do direito aplicável, a definir de modo maisadequado, a reparação devida no caso concreto" (Reparação civil por danos morais.RT, 1993, p. 205/206).

Mais adiante destaca:"[...] a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que

represente advertência ao lesante e à sociedade de que se não se aceita ocomportamento assumido, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto,em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, demodo expresso, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a respostada ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantiaeconomicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio dolesante" (Reparação civil por danos morais. RT, 1993, p. 220).

Pertinentes também são as lições de HUMBERTO THEODOROJÚNIOR:

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"O arbitramento da indenização do dano moral é ato exclusivo eindelegável do Juiz.

"Por se tratar de arbitramento fundado exclusivamente no bom senso ena eqüidade, ninguém além do próprio juiz está credenciado a realizar a operação doquantum com que se reparará a dor moral". (Dano Moral, 2. ed. São Paulo: Juarez deOliveira, 1999, p. 41).

A jurisprudência deste Tribunal não destoa:"INDENIZAÇÃO FIXAÇÃO DO QUANTUM. APRECIAÇÃO DAS

CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. ARBITRAMENTO EM VALOR QUEEXPRESSA A FINALIDADE A QUE SE DESTINA. DESPROVIMENTO DORECURSO PRINCIPAL.

"Incumbe ao juiz o arbitramento do valor da indenização, observando aspeculiaridades do caso concreto, bem como as condições financeiras do agente e asituação da vítima, de modo que não se torne fonte de enriquecimento, tampouco queseja inexpressivo ao ponto de não atender aos fins a que se propõe" (TJSC, AC n.00.013683-2, de Lages. Rel. Des. Sérgio Paladino, julgada em 05/12/2000).

Nessa difícil empreitada, procura-se arbitrar certa quantia queproporcione à parte autora uma compensação material que minimize a dor sofrida, atéporque se a dor, a rigor, não tem preço exato, pode sem dúvida ser atenuada em facede valor que possa trazer algum alento ao beneficiário.

O MM. Juiz de Primeiro Grau condenou a municipalidade ao pagamentode indenização dos danos morais no valor de cinquenta (50) salários-mínimos - R$25.500,00 (vinte e cinco mil e quinhentos reais), o que foi objeto de recurso, que pediua redução do referido "quantum".

O valor fixado na sentença afigura-se desarrazoado e desproporcionalfrente à realidade dos autos, não obstante o autor haja sofrido lesões corporaisgraves. Daí a fixação do "quantum" indenizatório do dano moral na quantia de R$15.000,00 (quinze mil reais), que se considera suficiente para punir a municipalidadepelo fato de ter-se omitido quando tinham a obrigação de agir (colocação da devidasinalização no local ou sua limpeza), a fim de que não mais venha a causar danos aterceiros, a par de significar lenitivo à dor a à angústia do autor, sem lhe oportunizarenriquecimento sem causa, que é vedado pelo ordenamento jurídico.

Dessa forma, dá-se provimento ao recurso do Município e ao reexamenecessário, a fim de minorar o valor da indenização do dano moral para R$ 15.000,00(quinze mil reais), que se considera razoável, proporcional e adequado para estancara dor moral sofrida pelo autor, levando-se em conta as circunstâncias do caso emapreço.

4. O pedido de distribuição proporcional das verbas sucumbenciais nãomerece acolhimento.

Isso porque, ainda que esta Câmara tenha reduzido o "quantum" daindenização do dano moral, o apelado obteve êxito em todos os seus pedidos, nãosendo possível, portanto, falar em sucumbência recíproca, razão por que nega-seprovimento ao apelo do Município, nessa parte.

Pelo exposto, dá-se provimento parcial ao recurso do Município e ao

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reexame necessário, para reduzir o valor da indenização do dano moral para R$15.000,00 (quinze mil reais).

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