AGRICULTURA E ALIMENTOS...

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AGRICULTURA E ALIMENTOS 2017 BR Por dentro do MATOPIBA Foto: Tiago Forest

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INTRODUÇÃO

NOSSO OBJETIVO

O Cerrado é a maior savana da América do Sul e a mais rica em biodiversidade

no planeta, com 44% de endemismo das espécies de plantas. É também a segunda maior formação vegetal do continente, ocupando 1/4 do território brasileiro, que corresponde a 2 milhões de Km² ou a soma das áreas de Espanha, França, Alemanha, Itália e Reino Unido. É considerado berço das águas por ser fundamental para oito das 12 bacias hidrográficas brasileiras. Além disso, todos os afluentes meridionais do Amazonas, com exceção do Juruá e Purus, nascem nesse bioma, assim como vários rios do Maranhão e Piauí.

O material em suas mãos é um compilado de informações sobre uma área específica do Cerrado brasileiro nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, conhecida como Matopiba.

Essa área é considerada a última fronteira agrícola e nos últimos anos tem perdido grande parte de sua vegetação nativa para a produção de

soja e pecuária, principalmente. De forma geral, o Código florestal permite até 80% de desmatamento legal nas propriedades rurais da região e, assim, a dramática taxa de desmatamento pode encontrar amparo legal.

Alguns fatores podem acelerar ainda mais a tendência de desmatamento no Matopiba neste e nos próximos anos, tais quais: o aumento das chuvas após cinco anos de seca (com capitalização dos produtores); a melhoria das condições econômicas do país; a aprovação da lei de compra de terras por estrangeiros; o aumento da competitividade da soja brasileira e as possíveis mudanças no licenciamento da atividade agropecuária.

Atualmente, o Matopiba vem sendo alvo de forte especulação imobiliária. Estudos recentes em municípios chave da região indicam um aumento médio de preço da ordem de 2.000%, entre terras com Cerrado em 2005 e terras já abertas em 2016.

Fomentar diálogos intersetoriais acerca da ocupação do solo no Matopiba, de forma que aspectos sociais, ambientais e econômicos sejam considerados. Reunimos, de maneira resumida, informações sociais, econômicas e agrárias de várias fontes, com o intuito de informar sobre ameaças e fortalezas da região para que, no futuro, haja um ordenamento territorial da produção de commodities de forma a não destruir habitats e ecossistemas únicos de ocorrência local, em um dos

A área do matopiba é considerada a última fronteira agrícola e nos últimos anos tem perdido grande parte de sua vegetação nativa para a produção de soja e pecuária, principalmente.

biomas mais importantes do planeta e que responde por um terço da biodiversidade brasileira, o Cerrado.

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ÁREA MATOPIBA

BIOMA CERRADO

ÁREA DESMATADA DO CERRADO: 50%

73 MILHÕES DE HECTARES

Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito Federal, São Paulo, Minas Gerais, Tocantins, Maranhão, Piauí e Bahia.

51% da área total dos 4 estados.

• O desmatamento do Cerrado entre 2003-2013 emitiu 870mi ton CO2, o que significa 93ton CO2/ha.

• 40 mi ha podem ser desmatados legalmente no Cerrado, seguindo o Código Florestal

Comunidades locaisAs comunidades locais preferem se estabelecer nos vales entre platôs (os “baixões) pela presença de corpos d’água e espécies usadas no extrativismo. Muitas não têm título da terra e ocupam Reservas Legais e áreas de preservação permanente de fazendas – o que as deixa em situação muito vulnerável.Território ocupado por indígenas, quilombolas, agricultores familiares, quebradeiras de coco e agropecuaristas.

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6,1 MILHÕES DE HECTARES COBERTOS POR

VEGETAÇÃO NATIVA

CONSTATA-SE QUE O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH) TEM CRESCIDO NA REGIÃO. PORÉM, O COEFICIENTE DE GINI DEMONSTRA UM QUADRO DE DESIGUALDADE SOCIAL.

CRESCIMENTO DE

253%INFRAESTRUTURA

BAIXO CUSTO

LOGÍSTICO

com alta ou média aptidão para desmatamento/conversão.

de escoamento de produção em plena expansão

de 30 a 50% menor que Sorriso-MT, refletindo em preços mais elevados da soja no Matopiba.

Cidades

Renda

A maioria das cidades não são tão estruturadas e urbanizadas. Os serviços públicos são deficientes, as condições sanitárias ruins e há um aspecto de abandono na maioria das cidades;

O PIB per capita é menos da metade do PIB do país e, ainda inferior ao PIB médio do Nordeste.

Existe um relevante risco social e vulnerabilidade das comunidades locais: ausência de título da terra, êxodo rural, conflitos de diferentes ordens com a cadeia de soja (deriva de agroquímicos, água, impactos na disponibilidade de recursos extrativistas e na pesca), crise em serviços públicos por inchaço das cidades, entre outros.

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De 2000 a 2014 a área de soja teve um crescimento de 253%. E a maior parte da expansão agrícola no Matopiba ocorreu sobre vegetação nativa.

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DE 1 MILHÃO PARA

DE HECTARES DE SOJAsobre vegetação nativa de cerrado

19% fora do matopiba

68% da área do matopiba

6% fora do matopiba

63% da área do matopiba

3,4 MILHÕES

Estudos indicam desmatamento de 6,6mi ha com baixa aptidão produtiva – com riscos de desertificação e colapso de serviços ecossistêmicos. Evidência de falta de ordenamento territorial da expansão.

2000 - 2007 2007 - 2014

SafraNa safra 2015/2016, a região do Matopiba foi responsável por 9,28% da produção de grãos do país. (fonte: Conab)

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Estudos recentes mostram que em municípios chave da região há uma valorização média de 2.000% entre terras com Cerrado em 2005 e terras já abertas em 2016.

(fonte: Agroícone/INPUT)

(fonte: Agroícone/INPUT)

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MATOPIBA EM PÍLULAS

PRODUÇÃO DE COMMODITIES AGRÍCOLAS: com relevo propício à mecanização, existe capacidade tecnológica crescente na região, com a presença de centros de pesquisa orientados e financiados pelo agronegócio, dedicados ao melhoramento genético e ao desenvolvimento de técnicas adaptadas às condições de clima e vegetação específicas da região, que se diferem muito de outros centros produtores, como o Mato Grosso. Esse desenvolvimento tecnológico inclui parcerias com empresas de destaque em melhoramento genético (como a Embrapa) e transgenia (como a Monsanto). Apesar do crescimento da cadeia, a produção de soja não gera muitos postos de trabalho, ainda assim, é relevante para a economia local – empregando pessoas da zona rural em trabalhos menos técnicos.

Extraído do relatório de viagem da EXPEDIÇÃO MATOPIBA realizada pelas organizações da sociedade civil que compõem o Grupo de Trabalho da Soja – GTS no período de 19 a 30 de setembro de 2016. O relatório foi baseado nas entrevistas e percepções a campo.

PERFIL DO PRODUTOR: relativamente profissionalizados, com propriedades que normalmente excedem 2.000 ha – 10% das propriedades rurais ocupam cerca de 70% das terras. Deficiente adoção de práticas de conservação do solo, à exemplo de curvas de nível e do plantio direto – que não alcança 10% das áreas de soja no Matopiba. Geralmente mantêm as estradas rurais em boas condições. Poucos fazendeiros desenvolvem interações mais próximas, como construção de escolas, creches, etc.

DESMATAMENTO: no Matopiba o desmatamento é muitas vezes utilizado como mecanismo de afirmação de posse. Cidades da região estão com frequência na lista de campeãs do desmatamento no Brasil. Grandes áreas são abertas em fazendas sem que sejam efetivamente plantadas,

algumas sequer usam 30% das áreas já desmatadas. Isso implica em exposição desnecessária dos solos, perda de habitats, ameaça às espécies e riscos de colapso de serviços ecossistêmicos. Observam-se alguns casos dramáticos como um desmatamento legal (autorizado pelo órgão competente) de área contínua de 60 mil hectares, em uma única fazendo no estado do Piauí – área equivalente ao Parque Nacional Chapada dos Veadeiros. Bancos públicos, incluindo o principal deles, o Banco do Nordeste, financia o desmatamento do Cerrado.

MERCADO DE TERRAS E GRILAGEM: questão problemática em toda a região é a titulação das terras. Confusões cartoriais e judiciais fazem com que municípios da Bahia, Piauí e Maranhão tenham no papel (documentos cartoriais ou contratos de compra e venda) três ou quatro vezes mais área do que o real. Boa parte dos títulos é de origem fraudulenta, dentro de um processo de grilagem que teve início em períodos diferentes entre os estados. Complementar à grilagem de terras, a especulação imobiliária também aparece

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como driver de usa da terra. Uma vez titulada e aberta, a terra pode saltar de um valor inicial entre USD 60/ha a USD 5k-15k/ha. Estudos recentes mostram que em municípios chave da região há uma valorização média de 2.000% entre terras com Cerrado em 2005 e terras já abertas em 2016. Essa valorização espetacular tem atraído o interesse especulativo de investidores internacionais e fundos de pensão em busca de ganhos a qualquer custo, acelerando sobremaneira a posse irregular e o desmatamento na região. Esse processo tende a agravar-se com as medidas recentes que voltam a autorizar a compra de terras por entes privados estrangeiros. Apesar de não haver uma estatística oficial disponível, estimava-se, com base no balanço patrimonial de empresas que atuam na região e que dispõem de dados públicos, que pelo menos 1 milhão de hectares de terras seriam controladas por 10 maiores empresas, das quais pode-se citar: Radar (do grupo Cosan), Brookfield BR (fundo de investimento canadense), SLC Agrícola (empresa gaúcha com capital aberto na BM&F Bovespa), e Brasilagro (controlada pela grupo argentino Cresud e com capital aberto na BM&F

Bovespa), Insolo (controlada pela família Ioschpe), Agrinvest (fundada em 2007 com suporte financeiro de um fundo norte-americano), Ceagro (controlada pelo grupo argentino Los Grobo), Tiba Agro (controlada pela gestora de investimentos Vision Brazil Investments), Agrifirma (fundo de investimento criado em 2008), XinguAgri (subsidiária da trading Multigrain, controlada pelo grupo japonês Mitsui), Calyx Agro Brasil (empresa de investimentos em terras controlada pela trading Louis Dreyfus Commodities e AIG Investments), Sollus Capital (empresa de investimentos em terras controlada Vinci Partners, Touradji Capital Management e Grupo Los Grobo).

ADEQUAÇÃO À AGRICULTURA: na região do Matopiba é comum o plantio imediato da soja já no primeiro ano após o desmatamento. Segundo relatado, o passo a passo da ocupação seria: derrubada do Cerrado com uso de “correntão”, enleiramento da galhada, queima das leiras, recolhimento manual de galhos e raízes, novo enleiramento e queima, uso de grade e adubação/corre-ção do solo com calcário (por repetidas vezes, até 12 toneladas de calcário por ha em algumas regiões), uso de arado, adubação mineral e plantio da soja.

ASPECTOS CLIMÁTICOS: com uma precipitação entre 800 e 1200 mm anuais e concentração de chuvas em determinados períodos do ano, há uma limitação natural da produção, sendo raros os anos em que é possível cultivar a chamada safrinha. Segundo relatos, a região tem uma dinâmica de 3-4 anos consecutivos de seca, seguidos por 6-8 anos de chuvas. O ano de 2016 teria sido exatamente o quarto ano de seca, e a expectativa é de boas safras a partir de 2017, tendo como resultado negativo a potencialização o desmatamento. Um estudo da TNC analisou a medição de um período de 30 anos de estações fluviométricas do

Oeste da Bahia. Constatou tendência generalizada de diminuição das vazões dos rios e aumento ou diminuição cada vez mais frequente e intenso dos picos de precipitação, o que é preocupante em uma região que depende de um aquífero que necessita de recarga direta da chuva e ainda contribui para a vazão dos rios. Estas áreas de recarga são exatamente as áreas mais desejadas pelo agronegócio, planaltos em que a adoção de boas práticas agrícolas deveriam ser a regra e não a exceção.

IRRIGAÇÃO: O método de irrigação mais utilizado é com uso de pivô central (140 mil ha). Em 2016, na região de Barreiras-BA, em função da forte redução de vazão nos rios, foi acordada uma maior racionalização ou mesmo a descontinuidade do uso dos pivôs durante o período mais seco. Ainda assim, com todas as dúvidas sobre a capacidade suporte, há projetos de expansão do uso de pivôs para até 500 mil há.

QUALIDADE DA ÁGUA: tem sido observada a diminuição de disponibilidade da água devido ao desmatamento, compactação do solo,

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irrigação e à seca. Foi relatada por comunidades locais a redução da pesca, em função da construção de represas nas fazendas e do uso de agroquímicos que, além de prejudicarem a pesca, causam morte de animais, ressecamento dos cultivos agrícolas comunitários, problemas de saúde (náusea, diarreia, coceira), entre outros. Além disso, a pulverização de agroquímicos por aviões agrícolas (prática bastante difundida no Matopiba) compromete a produção orgânica e agroecológica das comunidades – já que é quase impossível evitar a deriva pelo vento.

CERTIFICAÇÃO DA PRODUÇÃO: a certificação é algo ainda muito incipiente no Matopiba, mas há grande potencial de expansão. O principal elemento facilitador é que o novo standard RTRS (Mesa Redonda da Soja Responsável) define que fazendas desmatadas até junho de 2016 são elegíveis à certificação, desde que não desmatem mais. A certificação pode ser uma boa forma de garantir a adoção das melhores práticas e de comunicar ao mercado mais exigente sobre o compro-misso com uma produção responsável e com a eliminação do desmatamento e conversão do Cerrado. No Matopiba,

uma das instituições que lideram o processo de ampliação do número de fazendas certificadas com o selo RTRS é a Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor de Exportação Norte – Fap-cem, em Balsas-MA.

AVANÇO DA INFRAESTRUTURA: o custo logístico no Matopiba é entre 30 e 50% menor do que em Sorriso-MT, cidade referência do agronegócio no Brasil. De forma geral, as estradas da região encontram-se em bom estado de conservação, em especial, nos eixos ro-doviários principais. Está em conclusão uma ferrovia (e suas ramificações) que corta a região produtora e a liga a portos no Nordeste. A rodovia Transcerrado está sendo pavimentada no estado do Piauí, cortando 340 km da área de maior relevância produtiva. As estradas rurais, em sua maioria, são mantidas em boas condições pelos próprios produto-res. Todos os grandes portos da região têm projetos de expansão considerável, um deles deve dobrar sua capacidade, o porto de Itaqui-MA. Há ainda a hidrovia Tocantins-Araguaia, e seus terminais de transbordo, que tem projeto de viabilização em estágio avançado.

MERCADO REGIONAL: há uma forte indústria granjeira instalada na região nordeste, que segundo estimativas dos próprios produtores, nos estados do Piauí e Maranhão, deve comprar entre 20 e 30% da produção de soja, e mais de 50% do milho e milheto – podendo chegar a 100% em algumas regiões. Estudos atestam que a existência de diferentes mercados amplia as possibilidades de negociação e trazem maior segurança ao produtor e, por outro lado, podem favorecer ainda mais a especulação imobiliária e o desmatamento.

FINANCIAMENTO: ainda que as taxas de juros de tradings sejam maiores que a de bancos públicos, a participação das tradings e outros agentes privados no financiamento produtivo teve alto nível de importância em 2016, devido à dificuldade de acesso ao crédito do Plano Safra e a descapitalização do produtor por anos seguidos de seca. Há evidências de forte correlação entre a operação de tradings e a expansão do desmatamento em áreas novas. Bancos públicos financiam o desmatamento, a exemplo do Banco do Nordeste, bastando a apresentação da autorização de supressão emitida pelo órgão ambiental.

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