AGRICULTURA / IRRIGAÇÃO As potencialidades agrícolas do Vale...

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AGRICULTURA / IRRIGAÇÃO As potencialidades agrícolas do Vale do see Francisco P elos números tem-se idéia de um país: 640 quilômetros quadrados, área superior à da França, ou mais que o dobro da Itália, e dezenove vezes a Holanda. População: 12 milhões de habi- tantes - maior do que a da Bolívia e Chile. A população é muito pobre, tendo, em 1980, uma renda per capita de US$ 466 contra US$ 1.700 da média brasileira. O padrão de vida é muito baixo, o índice de analfabeto é elevado e o despreparo é geral para uma agricultura que, segundo, Eliseu Alves, Presidente da CODEV ASF, sai ra- pidamente, de um estágio dos tempos do Império vara o século XXI. A população áo meio rural foi bastante discriminada; no que diz respeito a investimento em saúde e educação. O vale do São Francisco é bastante ri- co de recursos naturais. Tem abundância de água e pode gerar energia elétrica, com um potencial de 21.126 MW dos quais 5.326 MW estão em operação e 2.085 em Cons- trução. Essa fartura de energia leva con- forto às grandes e pequenas cidades e im- pulsiona as indústrias, mas ainda beneficia muito pouco o setor rural. Para essa região muito pobre e poten- cialmente rica em recursos naturais já fo- ram elaborados diversos planos de salva- ção. Em 1852, bastante preocupado com o abandono das populações do Vale e com a importância que o Rio São Francisco re- presenta como via de transporte, Dom Pe- dro II contratava o serviço do engenheiro alemão Henrique Fernando Halfeld para proceder um levantamento completo do rio, da cachoeira de pirapora até a foz. O le- vantamento apontou problemas que ainda hoje são discutidos, sem solução. A draga- gem de alguns trecho difíceis para a nave- gação, por exemplo: só em 1969, mais de cem anos após as recomendações feitas por Halfeld, esse serviço seria começado em caráter defenitivo pelo DNPVN (Departa- mento Nacional de Portos e Vias Navegá- veis). Nenhurã dos planos feitos para salvar o Vale conseguiu, até hoje, modificar substancialmente as condições de miséria em que vive a grande parte de sua popula- ção. O primeiro grande plano global, para cuja execução foi criada em 1948 a Co- missão do Vale do São Francisco (CVSF), obteve rcsultaoos apenas paliativos. Com recursos financeiros de I <;f, da renda tribu- tária da União, a CVSF tinha um prazo de vinte anos para "balança" com a estrutura atrasada da região, executando serviços de regulaização do rio, uavcgação, eletrifica- ção, transporte, comunicações, educação, saneamento, saúde e assistência, fomento à produção agropccuária, reflorestamento, irrigação e colonização. Alguns pontos do programa - tão vasto quanto o subdesenvolvimento do Vale - foram tocados em partes. Outros não chegaram sequer a ser começados. A obra mais importante que deixou foi a barragem de Três Marias. Com a reestruturação em 1967, a Co- missão virou SUV ALE (Superintendência do Vale do São Francisco) - que se deparou com os problemas de uma região quase tão subdesenvolvida quanto em vinte ou trinta anos atrás. Depois da SUV ALE veio a CODEV ASF (Companhia de Desenvolvi- mento do Vale do São Francisco), mas o "país" do São Francisco vive ainda em ex- trema pobreza apesar do seu potencial. O programa de irrigação que o Governo está implantando é uma forma de acabar com estes problemas, caso, os recursos sejam bem aplicados. Com a irrigação o Vale do São Fran- cisco pode ser um "paraíso" já diziam há muito tempo técnicos políticos e literatos. Pode. A irrigação feita pela iniciativa governamental e pela iniciativa privada quando foram oferecidas condições míni- mas - mostra, inclusive, nas áreas semide- sérticas ocupdas pela caatinga, algumas "manchas verdes", verdadeiros oásis. Mas ao redor desses oásis continuam a desola- ção, a miséria, e a exploração rudimentar e incerta de terras. O Vale dispõe de aroxirnadamente 4,3 milhões de hectares irrigados, cerca de 6,7% da área total. Não há água para irri- gar tanto e tanta energia elétrica produzir, afirma Eliseu Alves. O solo apresenta uma fertilidade mé- dia, havendo áreas férteis e outras muito pobres. Não falta energia solar, tanto em forma de calor como de luminosidade. Duas safras são possíveis com a irrigação, e a produtividade potencial é das mais altas do mundo. No Vale são cultivados diversos pro- dutos, como algodão, feijão, milho, arroz, fumo, mandioca e mamo na (42% do Bra- sil). Dados preliminares indicam uma área Já irrigada de 100 mil hectares, sendo, 46 mil da CODEVASF. Nas áreas irrigadas do submédio, de modo especial, nas regiões circunvizinhas de Juazeiro, na Bahia e Pe- trolina, em Pernambuco, as produtividades são bastantes animadoras, como é o caso do tomate rasteiro, cuja produtividade chega a competir com a da Califórnia (EUA), onde os índices são os mais elevados do mundo. As uvas do Vale são de excelente qualidade e coloração, e produzem duas safras e meia por ano, com produtividade média de 16 toncladas/ha, contra 15 tlha, da média na- cional. A produtividade média comercial de cebola é.de 20 tlha contra apenas 10,3 tlha das outras regiões do País. O pimentão é de excelente qualidade e a região do Submédio é pioneira em ex- portação de pimentão em pó. O melão supera em sabor, qualidade, tamanho e produtividade, os cultivados nas regiões tradicionais brasileiras. Graças à fertilidade do solo, a facilidade da irrigação e a quase total ausência de doenças e pra- gas, a produtividade chega a atingir médias de 1.7 t/ha. O ciclo de produção está em torno de 70-80 dias, contra 120 dias nas outras regiões tradicionalmente produtoras. Praticamente sem o emprego de agro- tóxicos, em virtude das condições climáti- cas da região, o meloeiro pode ser cultivado quase o ano todo, utilizando-se mão-de- obra esepcializada, barata e apresentando o melhor grau brix do Brasil. A extraordinária qualidade do melão do Vale do São Francisco, garante a ex- portação de aproximadamente 20% da pro- dução para p exterior e o restante para o centro-Sul do País. Outra olerícola que está se compor- tando muito bem na região é o aspargo, Cultura típica de clima temperado, já alcan- çou experimentalmente a produvitidade de 10,5 t/ha, enquanto no Rio Grande do Sul, o maior produtor, a média é de 2,0 t/ha. No que se refere a fruteiras, o Vale produz figo, goiaba e manga de excelente qualidade. A goiaba e figo em virtude das condi- ções climáticas da região geram frutos mais doces, com qualidade superior, menos pro- blemas fotossanitários e permitem a pri- meira frutificação em dois anos após o plantio, enquanto em outras regiões só ocorre após quatro anos. O Submédio São Francisco, de modo particulr, o município de Juazeiro, vem cultivando cana-de-açúcar há 8 anos e já possui 5 mil hectares irrigados, alcançndo uma produtividade de 130 t/ha, contra 56 t/ha do sul do país. O ciclo de maturação da cana produzi- da na região de Júazeiro i de apenas 12 meses contra 18 meses do resto do Brasil. Com 1 tonelada de cana são produzidos 110/115 Kg de açúcar, enquanto nas de- mais regiões brasileiras, a produção é de apens 80/90 Kg. Até tâmara que é cultura típica de re- giões quentes e secas como o Vale do Nilo, Arábia e Pérsia, está se comportando bem .no Vale do São Francisco. Nos países de origem - A frica e Argélia - a tamareira produz com oito anos, no Vale, está produ- zindo com apenas dois anos. F. Lopes Filho - Pesquisador do CPATSA/EMBRAPA. Fontes: Alves, E. R. lrrigação), um ótimo negócio, - COUEV ASF, Jornal da Irrigação n~ 12, 1986. . ltaú Rural, n~72, 1986. . O Vale da Esperança. Revista Realidade, março 1972. FATOS DO VAl.Es Setembro/Outubrn 86 3.5

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AGRICULTURA / IRRIGAÇÃO

As potencialidades agrícolas doVale do see Francisco

Pelos números tem-se idéia de umpaís: 640 quilômetros quadrados,área superior à da França, ou mais

que o dobro da Itália, e dezenove vezes aHolanda. População: 12 milhões de habi-tantes - maior do que a da Bolívia e Chile.A população é muito pobre, tendo, em1980, uma renda per capita de US$ 466contra US$ 1.700 da média brasileira. Opadrão de vida é muito baixo, o índice deanalfabeto é elevado e o despreparo é geralpara uma agricultura que, segundo, EliseuAlves, Presidente da CODEV ASF, sai ra-pidamente, de um estágio dos tempos doImpério vara o século XXI. A populaçãoáo meio rural foi bastante discriminada; noque diz respeito a investimento em saúde eeducação.

O vale do São Francisco é bastante ri-co de recursos naturais. Tem abundância deágua e pode gerar energia elétrica, com umpotencial de 21.126 MW dos quais 5.326MW estão em operação e 2.085 em Cons-trução. Essa fartura de energia leva con-forto às grandes e pequenas cidades e im-pulsiona as indústrias, mas ainda beneficiamuito pouco o setor rural.

Para essa região muito pobre e poten-cialmente rica em recursos naturais já fo-ram elaborados diversos planos de salva-ção. Em 1852, bastante preocupado com oabandono das populações do Vale e coma importância que o Rio São Francisco re-presenta como via de transporte, Dom Pe-dro II contratava o serviço do engenheiroalemão Henrique Fernando Halfeld paraproceder um levantamento completo do rio,da cachoeira de pirapora até a foz. O le-vantamento apontou problemas que aindahoje são discutidos, sem solução. A draga-gem de alguns trecho difíceis para a nave-gação, por exemplo: só em 1969, mais decem anos após as recomendações feitas porHalfeld, esse serviço seria começado emcaráter defenitivo pelo DNPVN (Departa-mento Nacional de Portos e Vias Navegá-veis).

Nenhurã dos planos feitos para salvaro Vale conseguiu, até hoje, modificarsubstancialmente as condições de misériaem que vive a grande parte de sua popula-ção. O primeiro grande plano global, paracuja execução foi criada em 1948 a Co-missão do Vale do São Francisco (CVSF),obteve rcsultaoos apenas paliativos. Comrecursos financeiros de I <;f, da renda tribu-tária da União, a CVSF tinha um prazo devinte anos para "balança" com a estruturaatrasada da região, executando serviços deregulaização do rio, uavcgação, eletrifica-ção, transporte, comunicações, educação,saneamento, saúde e assistência, fomento àprodução agropccuária, reflorestamento,irrigação e colonização.

Alguns pontos do programa - tãovasto quanto o subdesenvolvimento doVale - foram tocados em partes. Outrosnão chegaram sequer a ser começados. Aobra mais importante que deixou foi abarragem de Três Marias.

Com a reestruturação em 1967, a Co-missão virou SUV ALE (Superintendênciado Vale do São Francisco) - que se deparoucom os problemas de uma região quase tãosubdesenvolvida quanto em vinte ou trintaanos atrás. Depois da SUV ALE veio aCODEV ASF (Companhia de Desenvolvi-mento do Vale do São Francisco), mas o"país" do São Francisco vive ainda em ex-trema pobreza apesar do seu potencial. Oprograma de irrigação que o Governo estáimplantando é uma forma de acabar comestes problemas, caso, os recursos sejambem aplicados.

Com a irrigação o Vale do São Fran-cisco pode ser um "paraíso" já diziam hámuito tempo técnicos políticos e literatos.

Pode. A irrigação feita pela iniciativagovernamental e pela iniciativa privadaquando foram oferecidas condições míni-mas - mostra, inclusive, nas áreas semide-sérticas ocupdas pela caatinga, algumas"manchas verdes", verdadeiros oásis. Masao redor desses oásis continuam a desola-ção, a miséria, e a exploração rudimentar eincerta de terras.

O Vale dispõe de aroxirnadamente 4,3milhões de hectares irrigados, cerca de6,7% da área total. Não há água para irri-gar tanto e tanta energia elétrica produzir,afirma Eliseu Alves.

O solo apresenta uma fertilidade mé-dia, havendo áreas férteis e outras muitopobres. Não falta energia solar, tanto emforma de calor como de luminosidade.Duas safras são possíveis com a irrigação, ea produtividade potencial é das mais altasdo mundo.

No Vale são cultivados diversos pro-dutos, como algodão, feijão, milho, arroz,fumo, mandioca e mamo na (42% do Bra-sil). Dados preliminares indicam uma áreaJá irrigada de 100 mil hectares, sendo, 46mil da CODEVASF. Nas áreas irrigadas dosubmédio, de modo especial, nas regiõescircunvizinhas de Juazeiro, na Bahia e Pe-trolina, em Pernambuco, as produtividadessão bastantes animadoras, como é o caso dotomate rasteiro, cuja produtividade chega acompetir com a da Califórnia (EUA), ondeos índices são os mais elevados do mundo.As uvas do Vale são de excelente qualidadee coloração, e produzem duas safras e meiapor ano, com produtividade média de 16toncladas/ha, contra 15 tlha, da média na-cional.

A produtividade média comercial decebola é. de 20 tlha contra apenas 10,3 tlhadas outras regiões do País.

O pimentão é de excelente qualidade ea região do Submédio é pioneira em ex-portação de pimentão em pó.

O melão supera em sabor, qualidade,tamanho e produtividade, os cultivados nasregiões tradicionais brasileiras. Graças àfertilidade do solo, a facilidade da irrigaçãoe a quase total ausência de doenças e pra-gas, a produtividade chega a atingir médiasde 1.7 t/ha. O ciclo de produção está emtorno de 70-80 dias, contra 120 dias nasoutras regiões tradicionalmente produtoras.

Praticamente sem o emprego de agro-tóxicos, em virtude das condições climáti-cas da região, o meloeiro pode ser cultivadoquase o ano todo, utilizando-se mão-de-obra esepcializada, barata e apresentando omelhor grau brix do Brasil.

A extraordinária qualidade do melãodo Vale do São Francisco, garante a ex-portação de aproximadamente 20% da pro-dução para p exterior e o restante para ocentro-Sul do País.

Outra olerícola que está se compor-tando muito bem na região é o aspargo,Cultura típica de clima temperado, já alcan-çou experimentalmente a produvitidade de10,5 t/ha, enquanto no Rio Grande do Sul,o maior produtor, a média é de 2,0 t/ha.

No que se refere a fruteiras, o Valeproduz figo, goiaba e manga de excelentequalidade.

A goiaba e figo em virtude das condi-ções climáticas da região geram frutos maisdoces, com qualidade superior, menos pro-blemas fotossanitários e permitem a pri-meira frutificação em dois anos após oplantio, enquanto em outras regiões sóocorre após quatro anos.

O Submédio São Francisco, de modoparticulr, o município de Juazeiro, vemcultivando cana-de-açúcar há 8 anos e jápossui 5 mil hectares irrigados, alcançndouma produtividade de 130 t/ha, contra 56t/ha do sul do país.

O ciclo de maturação da cana produzi-da na região de Júazeiro i de apenas 12meses contra 18 meses do resto do Brasil.Com 1 tonelada de cana são produzidos110/115 Kg de açúcar, enquanto nas de-mais regiões brasileiras, a produção é deapens 80/90 Kg.

Até tâmara que é cultura típica de re-giões quentes e secas como o Vale do Nilo,Arábia e Pérsia, está se comportando bem.no Vale do São Francisco. Nos países deorigem - A frica e Argélia - a tamareiraproduz com oito anos, no Vale, está produ-zindo com apenas dois anos.

F. Lopes Filho - Pesquisador doCPATSA/EMBRAPA.Fontes: Alves, E. R. lrrigação), um ótimo

negócio, - COUEV ASF, Jornalda Irrigação n~ 12, 1986.. ltaú Rural, n~ 72, 1986 .. O Vale da Esperança. RevistaRealidade, março 1972.

FATOS DO VAl.Es Setembro/Outubrn 86 3.5