Agrodok-15-Piscicultura de água doce em pequena escala

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Agrodok 15 Piscicultura de água doce em pequena escala Eira Carballo Assiah van Eer Ton van Schie Aldin Hilbrands

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  • Agrodok 15

    Piscicultura de gua doce em pequena escala

    Eira Carballo Assiah van Eer Ton van Schie Aldin Hilbrands

  • Fundao Agromisa e CTA, Wageningen, 2008 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicao pode ser reproduzida qual-quer que seja a forma, impressa, fotogrfica ou em microfilme, ou por quaisquer outros meios, sem autorizao prvia e escrita do editor. Primeira edio em portugus: 1996 Segunda edio: 2004 Terceira edio revista: 2008 Autores: Eira Carballo, Assiah van Eer, Ton van Schie, Aldin Hilbrands Editor: Eira Carballo Illustraes: Linda Croese, Oeke Kuller, Barbera Oranje, Mamadi B. Jabbi, Olivier Rijcken Design grfico: Eva Kok Traduo: Lli de Arajo Impresso por: Digigrafi, Wageningen, Pases Baxos ISBN Agromisa: 978-90-8573-079-8 ISBN CTA: 978-92-9081-372-9

  • Prefcio 3

    Prefcio

    Este Agrodok tem por objectivo fornecer informao bsica de como montar uma explorao pisccola de pequena escala para fins de sub-sistncia.

    Na medida em que as prticas de piscicultura so muito diversas, limi-tar-nos-emos piscicultura de gua doce, em pequena escala, nas re-gies tropicais. E, visto que a piscicultura em tanques a forma mais comum de criao de peixes nestas reas, a informao fornecida cen-tra-se na construo e maneio dos tanques.

    A primeira parte deste Agrodok (captulos 1 a 4) descreve os princpi-os da piscicultura, tipos de explorao pisccola, mtodos de piscicul-tura e manuteno e monitorizao dos tanques. Tambm foi introdu-zida uma seco dedicada piscicultura baseada no perifiton, uma tecnologia nova e promissora. A segunda parte deste livrinho apresen-ta linhas bsicas de orientao para o estabelecimento duma explora-o pisccola e inclui a seleco do local apropriado, do tipo de explo-rao e das espcies de peixes a serem cultivadas. Aspectos como se-jam a nutrio, sade, reproduo, colheita e ps-colheita pisccola, so tratados de maneira sucinta.

    A Agromisa acolhe com agrado comentrios quanto ao contedo deste livro, tal como informao adicional, visando melhorar edies futu-ras.

    Wageningen, 2008.

    Eira Carballo

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 4

    ndice

    Parte I: Piscicultura: princpios bsicos 6

    1 Introduo 6

    2 Prticas de piscicultura 9 2.1 Mtodos de piscicultura 9 2.2 Produo em tanques 11

    3 Tanques de piscicultura 13 3.1 Diversos tipos de tanques 13 3.2 Linhas de orientao para o desenho e construo do

    tanque 16 3.3 Paus no lodo: piscicultura base de perifiton 28

    4 Manuteno e monitorizao 36

    Parte II: Planificao duma explorao pisccola 42

    5 Introduo 43

    6 Seleco do local de construo e do tipo de explorao pisccola 45

    6.1 Seleco do local 45

    7 Escolha das espcies de peixe 51 7.1 Espcies de peixes mais vulgarmente cultivadas 55

    8 Nutrio, sade e reproduo dos peixes 73 8.1 Nutrio dos peixes 73 8.2 Sade do Peixe 76 8.3 Reproduo dos peixes 78

    9 Colheita e ps-colheita 80

  • ndice 5

    9.1 A colheita do peixe 80 9.2 Ps-colheita 85

    Anexo 1: Sinopse das espcies de peixes mais vulgarmente cultivadas e as suas preferncias alimentares 87

    Anexo 2: Caractersticas de materiais de calagem 88

    Leitura recomendada 90

    Endereos teis 92

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 6

    Parte I: Piscicultura: princpios bsicos

    1 Introduo

    Durante sculos o peixe tem constitudo uma parte importante da dieta alimentar das populaes, em muitas partes do mundo. No decorrer dos ltimos cem anos a captura de peixe aumentou rapidamente devi-do aos avanos da tecnologia, o que possibilitou o emprego de moto-res mais poderosos e de equipamento sonar. Tal levou a uma sobre-pesca e causou um decrscimo dos stocks selvagens a nvel mundial. Como consequncia, desde mais ou menos 20 anos deixou de registar-se um aumento de captura de peixe. Assim, a necessidade de aumentar a produo de peixe por meio da piscicultura tornou-se uma questo de extrema urgncia.

    O termo aquacultura cobre todas as formas de cultivo de plantas e animais aquticos em gua doce, salobra e salgada. O objectivo da aquacultura o mesmo do da agricultura, ou seja, aumentar a produ-o alimentar acima do nvel que possvel alcanar atravs da pro-duo natural. Actualmente a aquacultura responsvel por uma parte, sempre em crescimento, da produo global de peixe, que aumentou de 3,9% em 1970 para 31,9% em 2003 (FAO, 2005).

    Esta publicao centra-se no cultivo em pequena escala de, principal-mente, espcies de peixes de gua doce. Tal como no caso da agricul-tura, as tcnicas de piscicultura abrangem: ? remoo das plantas e animais indesejveis ? substituio por espcies de peixes desejveis ? melhoramento destas espcies atravs de cruzamentos e de seleco ? aumento da disponibilidade de nutrientes atravs do uso de fertili-

    zantes ou de raes alimentares

  • Introduo 7

    A piscicultura pode ser praticada em combinao com a agricultura, a criao de gado e prticas de irrigao, conduzindo, desse modo, a uma melhor utilizao dos recursos locais e, em ltima instncia, a um aumento de produo e a lucros lquidos. Esta prtica denominada piscicultura integrada; no Agrodok No. 21 trata-se extensivamente deste assunto.

    A seguir encontram-se sumarizadas algumas vantagens da prtica da piscicultura que so descritas na figura 1.

    Figura 1: Vantagens da piscicultura

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 8

    Vantagens da prtica de piscicultura ? O peixe fornece protena animal de elevada qualidade para o consumo

    humano. ? Um agricultor pode, frequentemente, integrar a piscicultura na sua explo-

    rao agrcola de modo a criar um rendimento adicional e a melhorar o maneio da gua.

    ? O crescimento do peixe em tanques pode ser controlado: so os prprios piscicultores que seleccionam as espcies de peixe que pretendem criar.

    ? O peixe produzido num tanque pertence ao seu proprietrio, encontra-se seguro e pode ser colhido quando se quiser. Os peixes que se encontram em guas selvagens pertencem a toda a gente, no ficando claro qual ser o quinho individual de cada pessoa.

    ? Os peixes dum tanque encontram-se, normalmente, acessveis. ? Uso eficiente da terra marginal, p.ex. terra que muito pobre ou demasia-

    do cara para se drenar para agricultura pode ser devotada, lucrativamente, piscicultura, caso tenha sido adequadamente preparada para esse fim.

  • Prticas de piscicultura 9

    2 Prticas de piscicultura

    2.1 Mtodos de piscicultura A piscicultura pode revestir vrias formas: desde tanques de subsis-tncia no quintal traseiro da casa at grandes empresas industriais. Os sistemas de produo podem ser expressos em termos de nveis de insumos.

    Na piscicultura extensiva, os insumos econmicos e de mo de obra so normalmente baixos. A produo de alimentao natural desem-penha um papel muito importante e a produtividade do sistema rela-tivamente baixa. Para aumentar a fertilidade e, consequentemente, a produo de peixe, podem-se usar fertilizantes.

    A piscicultura semi-intensiva requer um nvel moderado de insumos e o aumento da produo de peixe obtido atravs do uso de fertili-zantes e/ou alimentao suplementar. Tal implica mais trabalho e cus-tos mais elevados de alimentao, sendo estes, compensados, em grande medida, por uma produo mais elevada de peixe.

    A piscicultura intensiva envolve um nvel mais elevado de insumos e o povoamento dos tanques com o maior nmero possvel de peixes. Os peixes so alimentados com comida suplementar, enquanto que a produo de alimentos naturais desempenha um papel menor. Neste sistema podem surgir problemas de difcil maneio, decorrentes das altas densidades de povoamento de peixes (aumento da susceptibilida-de a doenas e carncia de oxignio dissolvido). Os elevados custos de produo foram a alcanar um preo elevado no mercado de forma a fazer com que a produo de peixe seja economicamente vivel.

    Este Agrodok centra-se nas prticas de piscicultura extensiva e semi-intensiva.

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    Figura 2: Mtodos extensivos (A), semi-intensivos (B) e intensi-vos (C) de piscicultura

  • Prticas de piscicultura 11

    2.2 Produo em tanques A maioria dos peixes de gua doce criada em tanques. Canaliza-se para o tanque a gua retirada dum lago, rio, poo ou de qualquer outra fonte natural. A gua ou passa uma vez atravs do tanque, sendo, en-to, escoada, ou pode ser parcialmente renovada de modo a que uma certa percentagem da gua total dum sistema seja retida. Os sistemas de tanques que tm a maior produo de peixes somente renovam a gua que se perde atravs da evaporao e infiltrao. O fluxo de gua reduz, geralmente, a produo em sistemas de tanques nas regies tro-picais.

    A piscicultura em tanques varia em tamanho que vai desde algumas dzias de metros quadrados at a vrios hectares (ha). Os tanques pe-quenos so usados normalmente para a desova e a produo de crias juvenis (fingerling, pequenos peixes com o tamanho de um dedo) en-quanto os tanques maiores so usados para o perodo de crescimen-to/maturao. Os tanques de produo com mais de 10 ha so difceis de gerir e no so muito populares para a maior parte dos produtores. Os tanques ilustrados servem apenas como exemplos. O tipo de tan-que que um agricultor construir depende, em grande parte, dos recur-sos, do equipamento e das condies locais.

    Os tanques localizam-se, normalmente, em terrenos com uma ligeira inclinao. Tm formas rectangulares ou quadradas, diques bem aca-bados e no recolhem a gua escoada dos arredores da bacia hidrogr-fica (linha divisria das guas) (ver figura 2). importante que se dis-ponha de gua suficiente para encher todos os tanques dentro de um perodo de tempo razovel e para manter o mesmo nvel de gua no tanque. Tambm se deve poder drenar completamente o tanque quan-do se faz a colheita do peixe. Os lados de inclinao devem ser 2:1 ou 3:1 (cada metro de altura necessita de 2 ou 3 metros de distncia hori-zontal), o que permite um acesso ao tanque e reduz o risco de proble-mas de eroso.

    De modo a prevenir o roubo do peixe, bom localizar o tanque o mais perto possvel da casa. Um outro mtodo para manter os intrusos afas-

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 12

    tados do tanque pisccola colocar na gua canas de bambu ou ramos, o que impossibilita a pesca com rede ou linha. Para alm da preven-o contra roubos, os paus e ramos fornecem alimento natural adicio-nal para os peixes. Esta prtica denomina-se piscicultura baseada no perifiton e ser descrita em pormenor no captulo 3.

    No quadro 1 apresentamos as principais caractersticas de um tanque de piscicultura.

    Quadro 1: Caractersticas de um bom tanque pisccola.

    Localizao Escolha um terreno com uma ligeira inclinao, aproveitando os con-tornos a existentes.

    Construo Os tanques podem ser cavados na terra; podem estar parcialmente acima ou debaixo do nvel original do terreno. Durante a construo as inclinaes e o fundo devem ser bem acondicionados para se evitar a eroso e a infiltrao de gua. O solo deve conter um mnimo de 25% de argila. Devem-se eliminar dos diques pedregulhos, capim, ramos e outros objectos indesejveis.

    Profundidade do tanque

    A profundidade deve ser entre 0,5-1,0 m na extremidade menos pro-funda, com uma inclinao at 1,5-2,0 m na extremidade de drena-gem.

    Configurao A melhor forma para os tanque rectangular ou quadrada. Lados de inclina-o

    Construir tanques com 2:1 ou 3:1 de inclinao em todos os lados.

    Drenagem A drenagem no deve durar mais de 3 dias. Abastecimento/-entrada da gua

    A tubagem para a entrada de gua deve ter uma capacidade suficien-te de modo a encher cada tanque dentro de 3 dias. No caso de se utilizar a gua de superfcie, deve-se filtrar a gua que entra de modo a se remover plantas e animais indesejveis.

    Volume total de gua

    Deve haver uma disponibilidade suficiente de gua de modo a encher todos os tanques da explorao dentro de algumas semanas e man-t-los cheios durante o perodo de crescimento dos peixes.

    Diques Os diques devem ser suficientemente largos para permitir cortar a erva. Devem-se fazer caminhos no dique de cascalho e plantar-se erva/relva em todos os diques.

    Orientao A localizaco dos tanques deve ser cuidadosamente ponderada para se aproveitar o facto da gua se poder misturar por aco do vento. Em reas em que o vento causa uma onda extensiva de eroso dos diques, coloque os lados mais compridos do tanque com ngulos rectos virados para os ventos dominantes. Se necessrio, utilize arbustos/sebes ou rvores como quebra-ventos.

  • Tanques de piscicultura 13

    3 Tanques de piscicultura

    3.1 Diversos tipos de tanques Dependendo da sua localizao, pode-se escolher entre dois tipos dife-rentes de tanques pisccolas: tanques de desvio da gua ou tanques-barragem.

    Figura 3: Tanque de desvio da gua: A: corrente de gua, B: en-trada de gua, C: canal de desvio, D: abastecimento, E: sada (Bard et al., 1976)

    Tanques de desvio da gua Os tanques de desvio da gua (figura 3) so construdos trazendo para o tanque gua proveniente de outra fonte.

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    So os seguintes os diferentes tipos de tanques desvio da gua (figura 4):

    Tanques-represa (A) Os diques de um tanque-represa so construdos acima do nvel do solo. Um inconveniente deste tipo de tanque que pode ser necessria uma bomba para o encher.

    Tanques escavados (B) O tanque escavado no solo. Um inconveniente deste tipo que ne-cessria uma bomba para drenar o tanque.

    Tanques de contorno (C) A terra resultante da escavao do tanque utilizada para construir os diques mais baixos do tanque. A localizao ideal apresenta uma in-clinao ligeira (1-2%) de modo a que se possa construir o canal de abastecimento da gua um pouco acima e o canal de escoamento ligei-ramente abaixo do nvel do tanque de gua. Visto que se utiliza a gra-vidade natural para encher e drenar os tanques, no necessria uma bomba.

    Figura 4: Vrios tipos de tanques de desvio da gua (Viveen et al., 1985). A: tanque-represa, B: tanque escavado, C: tanque de con-torno, 1:bomba, 2:canal de drenagem, 3: tubo de entrada, 4: canal de desvio, 5: tubo de escoamento/descarga

  • Tanques de piscicultura 15

    Tanques-barragem Os tanques-barragem (figura 5) so construdos com um dique que atravessa uma nascente (fonte natural) de gua. Deste modo, os tan-ques parecem pequenas represas de armazenamento da gua com a vantagem que so fceis de construir. No entanto, muito difcil con-trolar este sistema pois difcil manter os peixes selvagens fora do tanque e, devido corrente, perder-se- uma grande quantidade de alimentos que adicionada ao tanque.

    Um tanque-barragem bem construdo s em circunstncias anormais ficar inundado.

    Figura 5: Tanque-barragem. A: corrente de gua, B: entrada da gua, C: represa/barragem, D: sada da gua, E: desaguadou-ro/vertedouro e escoamento, F: monge (uma das estruturas de drenagem mais comuns, que composta por uma torre vertical com pranchas para regular o nvel de gua e um crivo/tampa para evitar que o peixe se escape do tanque)

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 16

    3.2 Linhas de orientao para o desenho e construo do tanque

    Tamanho e forma Os tanques com formas quadradas ou rectangulares so os mais fceis de construir, mas tambm se podem fazer tanques de outras formas de modo a ajustarem-se ao tamanho e forma do terreno. Um tanque com uma rea de 300 m tem um bom tamanho para um tanque familiar e pode ser construdo sem a utilizao de maquinaria. Os tanques po-dem ser muito maiores mas para uso familiar melhor ter vrios tan-ques de pequenas dimenses que um nico muito grande. E se se tiver mais que um tanque tambm possvel colher peixes mais frequente-mente.

    Profundidade A profundidade da gua , habitualmente, de 30 cm na extremidade menos funda e de 1 metro na extremidade mais funda (figura 6). O tanque pode ter uma maior profundidade caso seja utilizado como re-servatrio de gua durante a estao seca. importante que a gua possa ser completamente drenada aquando da colheita.

    Figura 6: Corte transversal dum tanque (Murnyak, 1990)

    Tipos O tipo de tanque que necessrio construir depende dos contornos do terreno (topografia). Os tipos de tanques diferem segundo as caracte-rsticas do terreno, h uns que so apropriados para terrenos planos e outros para terrenos com elevaes.

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    Os tanques escavados constrem-se nos terrenos planos, cavando-se uma rea com as dimenses do tanque pretendido. O nvel de gua ficar abaixo do nvel original do terreno (figura 7).

    Figura 7: Um tanque escavado (Murnyak, 1990)

    Os tanques de contorno so construdos em terrenos com elevaes ou inclinados. Cava-se o solo no lado superior do tanque e utilizando a terra proveniente da escavao constri-se um aude no lado inferior. O aude/represa tem que ser slido visto que o nvel da gua no tan-que estar acima do nvel original do terreno (figura 8).

    Figura 8: Tanque de contorno (Murnyak, 1990)

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    A construo dum tanque de piscicultura A construo dum tanque pode ser a parte mais difcil e mais onerosa da piscicultura. Um tanque bem construdo um bom investimento que pode ser utilizado durante muitos anos.

    So as seguintes as etapas para a construo dum tanque pisccola: 1 prepare o local de construo 2 construa um ncleo de argila (nem sempre necessrio) 3 cave o tanque e construa os diques 4 construa a entrada e sada da gua 5 proteja os diques do tanque 6 fertilize o tanque 7 coloque uma vedao no tanque 8 encha o tanque com gua 9 povoe o tanque com peixes

    1 Prepare o local de construo Primeiro que tudo remova as rvores, arbustos e pedregulhos, em se-guida capine a rea em que o tanque ser construdo. Mea e delimite com estacas o comprimento e a largura do tanque (figura 9).

    Figura 9: Delimitando o tanque com estacas (Murnyak, 1990)

  • Tanques de piscicultura 19

    Remova a camada superficial do solo que contm razes, folhas, etc. e deposite estes resduos no exterior da rea do tanque (figura 10). Guarde esta terra para ser usada mais tarde, quando se plantar erva nos diques do tanque.

    Figura 10: Remoo da camada superior do solo (Murnyak, 1990)

    2 Construa um ncleo de argila (no caso dos tanques de contorno) O ncleo de argila constitui a fundao para o dique do tanque, que o refora e impede fugas de gua. Em tanques de contorno necessrio que haja um ncleo de argila que construdo por baixo dos lugares do dique em que a gua ficar acima do nvel original do terreno. Nos tanques escavados no necessrio um ncleo de argila visto que, nesse caso, o nvel da gua est abaixo do nvel original do terreno.

    Remova toda a camada superior do solo na rea dos diques do tanque e cave uma vala central tal como faria ao cavar as fundaes duma casa. A vala tem que ser escavada paralelamente ao lado mais baixo

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    do tanque, ao longo de cada metade dos seus lados mais curtos (figura 11). Encha a vala com argila de boa qualidade. Acrescente vrios cen-trmetros de argila duma s vez e ento compacte-a bem. Desta manei-ra obter-se- uma fundao slida sobre o qual se podem construir os diques do tanque.

    Figura 11: Escavando uma vala central (A) (Murnyak, 1990)

    O desenho da figura 12 mostra como uma vala central ajuda a reforar o dique do tanque e previne fugas de gua. Existe a tendncia para a gua se infiltrar atravs do ponto em que o solo novo e a a camada original de solo se juntam.

    Figura 12: A funo do ncleo (Murnyak e Murnyak, 1990). A: gua; B: margem do tanque; C: solo; D:infiltrao da gua; E:ncleo de argila

  • Tanques de piscicultura 21

    Na ilustrao do lado esquerdo da figura 12 no existe uma vala cen-tral e a gua penetra por baixo do novo dique. Esta fuga pode provo-car, eventualmente, que todo o dique se desmonore. Na ilustrao do lado direito, o ncleo de argila faz com que a gua deixe de se infiltrar por debaixo do dique recentemente construdo.

    3 Cave o tanque e construa os diques Use a terra resultante da escavao para fazer a vala destinada ao n-cleo de argila, para construir o dique por cima da vala central. Tome cuidado para no utilizar solo arenoso/rochoso que contenha pedaos de razes, capim, paus ou folhas. Tais resduos decompor-se-o mais tarde e ocasionaro um ponto fraco no dique, atravs do qual podem ocorrer fugas de gua.

    Continue a compactar o solo a intervalos regulares enquanto procede construo do dique. Acrescente de cada vez uma camada de terra sol-ta com 30 cm, calque-a bem enquanto rega o dique com gua. Em se-guida, compacte-a com uma enxada, um pedao de tronco pesado ou um pedao de madeira fixo na extremidade duma estaca (figura 13). Isto reforar o dique.

    Figura 13: Compactando o dique (Viveen et al., 1985)

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 22

    Os diques do tanque devem estar cerca de 30 cm acima do nvel de gua no tanque. Se pretender criar peixe-gato no tanque, construa o dique at 50 cm acima do nvel de gua para impedir que o peixe-gato salte para fora. Quando tiver alcanado esta altura, acrescente um pouco mais de terra para permitir que assente e depois disso no acrescente mais terra no cimo dos diques.

    No caso de ainda no ter escavado suficientemente o tanque, continue a escavar mas retire a terra da rea onde se encontra o tanque. Se colo-car terra em cima dos diques do tanque, estes ficaro demasiado altos e instveis, o que far com que seja difcil trabalhar em redor do tan-que.

    Os diques do tanque devem ser ligeiramente inclinados, o que os for-talecer e impedi-los- de desmoronar-se e desabar dentro do tanque. A maneira mais fcil de fazer os diques inclinados DEPOIS de se ter escavado quase todo do tanque.

    Figura 14: Medindo a inclinao do dique (Murnyak, 1990)

    A melhor inclinao para o dique do tanque a que tem uma elevao de 1 metro de altura em cada 2 metros no comprimento. fcil fazer-se um tringulo, tal como mostra a figura 14, para que se possa ter esta inclinao. Uma boa maneira de determinar se o dique demasiado ngreme tentar andar lentamente desde o cimo do dique at ao fundo do tanque. Se isso no for possvel, ento o dique est demasiado n-greme!

  • Tanques de piscicultura 23

    A parte de baixo do tanque tambm deve ser inclinada de maneira que a gua varie em profundidade ao longo do seu comprimento. Alise o fundo do tanque depois de ter atingido a profundidade pretendida, o que far com que seja mais fcil deslizar as redes ao longo do fundo do tanque, aquando da colheita do peixe.

    4 Construa a entrada e a sada de gua A entrada da gua constituda por um canal para abastecimento de gua, uma bacia de captao de sedimentos e um tubo para conduzir a gua para o tanque (figura 15).

    Figura 15: A entrada e a sada de gua dum tanque, vista de cima e corte transversal (Murnyak e Murnyak, 1990). A: canal de entra-da/abastecimento, B: bacia de captao de sedimento, C: tubo de entrada, D: tubo de descarga/escoamento, E: crivo, F: tubo de sa-da

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 24

    A gua que entra no tanque contm, muitas das vezes, uma grande quantidade de terra e de sedimentos o que faz com que o tanque tenha muito lodo. Uma bacia de captao de sedimentos impedir que esta terra entre no tanque. Se se alargar e aprofundar o canal de entra-da/abastecimento mesmo na parte exterior do dique do tanque, a terra assentar nesta cavidade a que se chama bacia de captao de sedi-mentos em vez de entrar no tanque.

    O tubo de entrada de gua corre desde a bacia de captao atravs do dique do tanque at ao tanque. Deve estar cerca de 15 cm acima do nvel de gua de modo a que a gua que entra goteje para dentro do tanque. Dessa maneira impedir-se- que o peixe escape nadando atra-vs do tubo de entrada. Isto tambm ajuda a misturar ar (e, deste modo, oxignio) na gua.

    O tubo de descarga/escoamento de gua apenas usado em caso de emergncia. A gua NO deve sair dos tanques todos os dias. No de-correr de chuvas fortes o tubo de escoamento retira o excesso de gua da chuva e de gua de escoamento para fora do tanque. O tubo de es-coamento pode ser instalado segundo o ngulo indicado na figura 15. No caso de ser instalado debaixo de gua, tal como mostrado, tal impedir que a tampa-crivo (ver mais adiante) fique obstruda com detritos que podem flutuar superfcie do tanque.

    Os tubos de entrada, de sada e de escoamento/descarga podem ser feitos de metal, plstico, bambu, madeira ou outro material. Instale os tubos atravs do dique do tanque, perto da superfcie da gua.

    Os tubos devem estar providos de crivos para impedir que os peixes entrem ou saiam do tanque. O tubo de ENTRADA est tapado com um crivo na sua orla, que se encontra fora do tanque para impedir que peixes selvagens e objectos, como sejam ramos e folhas, entrem no tubo. O tubo de SADA, (tambm chamado tubo de drenagem) est tapado com um crivo dentro do tanque para impedir que os peixes se escapem.

  • Tanques de piscicultura 25

    Estas tampas-crivo podem ser feitas de diversos tipos de materiais (o que importa que a gua possa passar atravs deste crivo mas os peixes pequenos no) (figura 16): ? pedao de metal perfurado ? crivo ou rede metlica ? um pote de barro perfurado ? uma esteira de capim entrelaada de forma folgada

    Figura 16: Materiais utilizados como tampas-crivo (Murnyak and Murnyak, 1990)

    Estes crivos devem ser limpos diariamente.

    5 Proteja os diques do tanque Quando os diques do tanque esto terminados, cubra-os com a camada de cima de solo que havia guardado quando cavou os diques, capim-de-Rhodes (Chloris gavana) ou capim de galinha (Cynodon dactylon), tambm chamado capim de burro e grama de bermuda. No utilize plantas que tm razes compridas ou rvores pois estas enfraquecero os diques e podem causar, consequentemente, fugas de gua. A cama-da superior do solo, que frtil, far que a erva cresa de novo, o que ajudar a proteger os diques contra a eroso.

    Inundaes decorrentes de chuvas fortes (torrenciais) podem destruir os diques do tanque, no caso de haver demasiada gua da chuva e gua escoada que entre directamente no tanque. Este um problema que ocorre mais nos tanques de contorno, construdos em zonas com elevaes de terreno, mas que pode ser evitado se se desviar a gua de escoamento para os lados do tanque. Para tal pode-se cavar um fosso ao longo do lado de cima do tanque. Utilize a terra proveniente da es-

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    cavao deste fosso para fazer um pequeno camalho por debaixo dele. O fosso carregar a gua escoada para fora do tanque o que im-pedir inundaes e protejer os diques do tanque (figura 17).

    Figura 17: Proteco do dique atravs do desvio da gua escoada (Murnyak, 1990). A: fosso, B: dique

    6 Fertilize o tanque Pode-se aumentar a produo de alimentao natural para os peixes no tanque atravs do uso de fertilizantes, tal como estrume animal, com-posto ou adubos qumicos. Espalhe o fertilizante no fundo seco do tanque antes de o encher com gua. Deite o fertilizante na gua do tanque segundo intervalos de tempo regulares, de preferncia todos os dias, no fim da manh ou no incio da tarde. A adio contnua de fer-tilizante no tanque levar a uma produo constante de alimentao natural para os peixes. Para uma informao mais pormenorizada das taxas de aplicao dos vrios fertilizantes, ver o Agrodok No. 21 A piscicultura dentro de um sistema de produo integrado.

    Se o solo for cido, antes de encher o tanque com gua deite, para alm do fertilizante, cal ou cinzas de madeira no fundo o tanque. Use 10-20 kg de cal ou 20-40 kg de cinzas de madeira por cada 100 m do

  • Tanques de piscicultura 27

    fundo/superfcie do fundo do tanque (ver tambm a seco sobre aci-dez , alcalinidade e dureza da gua, captulo 4 e o Apndice 2).

    7 Coloque uma vedao no tanque Uma vedao em torno do tanque impedir que crianas caiam nele e poder ajudar a manter afastados intrusos e animais predadores. Para fazer uma vedao barata e robusta, plante um sebe espessa em volta da berma do tanque ou construa uma vedao utilizando estacas e ra-mos espinhosos.

    8 Encha o tanque com gua Antes de encher o tanque com gua, coloque pedregulhos no fundo do tanque no local onde a gua descarregada, ao entrar pelo tubo de entrada. Tal evitar que a gua que entra faa um buraco e corro o fundo do tanque. Em seguida abra a entrada de gua e encha o tanque.

    Encha o tanque lentamente de modo a que os diques no desabem, devido a no estarem uniformemente molhados. Enquanto se enche o tanque pode-se medir a altura/profundidade da gua com um pau. Pre de encher o tanque quando atingir a altura desejada.

    Para impedir que a gua transborde, no encha demasiado o tanque. A gua no tanque no deve ser corrente (deve, sim, estar parada), visto que, se houver corrente de gua no tanque, tal abrandaria a velocidade de crescimento do peixe, pois a corrente levar consigo a alimentao dos peixes produzida naturalmente. A nica gua a ser acrescentada ao tanque deve ser para compensar a perda de gua ocorrida atravs da evaporao e infiltrao. Os tanques novos geralmente perdem gua devido infiltrao quando so enchidos com gua pela primeira vez, pois o solo retm parcialmente a gua. Continue a acrescentar mais gua durante vrias semanas e, gradualmente, o tanque comear a reter a gua.

    9 Povoe o tanque com peixes Aguarde 4 a 7 dias antes de povoar o tanque com peixes. Tal permite que a produo natural de alimentao atinja um nvel suficiente para

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 28

    manter o crescimento dos peixes. No caso de decidir introduzir subs-tratos no tanque necessrio esperar durante mais tempo antes destes serem colonizados por organismos que podem ser comidos pelos pei-xes (ver a seco seguinte sobre a piscicultura base de perifiton). Introduza devagar os peixes pequenos (crias juvenis) tal como indi-cado na figura 18. De notar que a temperatura da gua donde estes peixinhos procedem deve ser igual temperatura da gua no tanque.

    Figura 18: Povoar o tanque com peixes

    A partir deste momento importante manter o tanque em bom estado e monitorizar a qualidade da gua, tal como descrito no captulo 4.

    3.3 Paus no lodo: piscicultura base de perifiton

    O perifiton um grupo de algas, bactrias, fungos e outros organismos aquticos que se agarram a substratos (material duro) presentes na gua. Estes organismos formam um agregado, uma espcie de camada pegajosa a que se chama esteira de perifiton. Observou-se que a produo de peixe mais elevada em tanques onde existem substratos, tais como ramos ou canas de bambu colocados verticalmente por todo o tanque, do que em tanques sem substratos (figura 19). Esta prtica conhecida como piscicultura base de perifiton e foi inspirada pela

  • Tanques de piscicultura 29

    piscicultura tradicional em guas naturais, nas quais se distribuiam vegetao ou ramos no corpo aqutico com o propsito de atrair peixe e outros animais.

    Figura 19: Tanques com e sem substratos - A: tanque sem subs-tratos, B: tanque com paus e ramos colocados ao acaso, C: tan-que usado em experimentaes cientficas com canas de bambu colocadas com o mesmo espaamento

    So os seguintes os benefcios da piscicultura base de perifiton:

    Alimentao adicional Uma das principais vantagens de colocar substratos nos tanques que as canas ou ramos que se encontram no fundo do tanque so rapida-mente colonizados por uma variedade de organismos minsculos que podem servir de alimento aos peixes (figura 20). Na piscicultura base de perifiton, a disponibilidade de alimentao no tanque, aumen-ta, de modo natural, reduzindo-se, desta maneira, a necessidade de fertilizar o tanque ou de fornecer raes suplementares aos peixes.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 30

    Tal reveste-se de grande importncia, tanto dum ponto de vista econmico como ambiental: as raes suplementa-res e os fertilizantes podem ser caros, tratando-se, de qualquer maneira, de um processo ineficiente, visto que a maioria dos nutrientes se perdem no ambiente na forma de desperdcios. A vantagem do perifiton que a fraco de nutrientes retida no peixe colhido aumenta consi-deravelmente, comparada com peixes que provm de tanques onde se acres-centou alimentos artificiais ou fertilizan-tes (fertilizantes inorgnicos, composto, estrume, etc.).

    Os peixes utilizam os recursos de modo mais eficiente nos tanques base de perifiton. A razo disto que algumas espcies pastam mais eficientemente a partir duma estrutura tridimensional como seja uma cana de bambu (perifi-ton) do que de alimentos que passam atravs da coluna de gua (fitoplncton = algas microscpicas)

    Abrigo Um outro benefcio importante decorrente da introduo de substratos no tanque proteger os peixes contra predadores como sejam pssa-ros, sapos ou cobras. Embora as canas tambm possam ser utilizadas para os pssaros que comem peixes nelas se empoleirarem, podem-se tomar medidas para impedir que os pssaros apanhem os peixes. Por exemplo, os pssaros que apanham peixe a partir do lugar em que se empoleiram nas canas dependem da altura da cana acima da coluna de gua. Se se aumentar o comprimento das canas, tal causar problemas ao pssaro. Quando se trata de pssaros mergulhadores, a densidade

    Figura 20: Cana de bam-bu colonizada pelo perifi-ton

  • Tanques de piscicultura 31

    das canas no tanque forma um obstculo, reduzindo, assim, o risco de predao. Para alm dos animais predadores, tambm se pode reduzir o roubo por seres humanos quando se colocam canas/estacas ou ramos nos tanques.

    A sade dos peixes Normalmente pensa-se que a sobrevivncia dos peixes ser maior em tanques em que se usam substratos do que em tanques sem substratos. H uma evidncia crescente que o perifiton pode ter um efeito positi-vo sobre a sade dos peixes. O perifiton pode agir como um antibiti-co contra uma variedade de bactrias causadoras de doenas presentes nos tanques, ou como um tipo de vacina para os peixes que dele se alimentam. Para alm do mais, observou-se que os peixes se esfregam contra os ramos ou as canas para expulsar os parasitas.

    Figura 21: Benefcios da piscicultura base de perifiton. A: ali-mentao, B: abrigo, C: sade

    Estudo de caso: Projecto LIFE (Locally Intensified Farming Enterprises) da CARE-Bangladesh O tipo e a densidade do substrato, a quantidade e a qualidade do perifiton, as espcies de peixes, a densidade de povoamento dos peixes e a qualidade da gua, tudo isto so factores que influenciam o sucesso do sistema.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 32

    Substratos Para os piscicultores em Bangladesh, o processo de tomada de deciso so-bre qual tipo de substrato usar, baseou-se no conhecimento local, derivado da piscicultura tradicional. Os factores por eles considerados antes de selec-cionarem o substrato foram a flexibilidade dos vrios substratos depois de se-rem imersos na gua, os possveis problemas de qualidade da gua e o po-tencial para o crescimento do perifiton.

    Dum modo geral, o bambu o mais adequado mas caro. A escolha de substrato depender da disponibilidade local e se a sua utilizao nos tan-ques pisccolas no entrar em conflito com outras actividades do agregado familiar (domsticas), por exemplo, necessidade de lenha para combustvel. O bagao de cana, a palha do arroz (arroz em casca) e o jacinto de gua tambm tm estado a ser usados com algum sucesso.

    No que se refere densidade do substrato, a abordagem testada pela maior parte dos piscicultores diferia da levada a cabo nas estaes experimentais. Durante as experimentaes, pretendia-se colocar as canas/estacas de subs-trato segundo intervalos regulares por todo o tanque, numa densidade uni-forme. No obstante, na prtica, a maior parte dos piscicultores usaram uma mistura de canas de bambu e ramos de densidades desconhecidas. As canas eram normalmente colocadas a intervalos de 1 1,5m, enquanto os ramos eram colocados ao acaso, na superfcie do tanque. Observou-se que os pis-cicultores colocavam as canas/estacas num determinado ngulo de modo a aumentar a superfcie para crescimento do perifiton, o que normalmente ser passa nos 30-45 cm da parte de cima da coluna de gua.

    Baseada em experimentaes, uma estimativa aproximada da quantidade apropriada de substrato a ser usada que a rea da superfcie do substrato mais ou menos igual rea do tanque. Por exemplo, em relao a um tanque de 100 m2 utilize, aproximadamente, 6-10 estacas/canas por m.

    O momento oportuno para a introduo do substrato nos tanques importan-te na medida em que leva dias ou at mesmo semanas antes que tenha crescido suficiente perifiton e que possa sustentar o crescimento do peixe. A maior parte dos piscicultores em Bangladesh introduziam os substratos cerca de um ms aps terem povoado o tanque com peixes, em vez de o fazerem antes de povoarem o tanque com peixes.

    Por ltimo, observou-se que retirar os substratos do tanque (com o objectivo de possibilitar a colheita) danificava as esteiras/tapetes de perifiton, visto que as mesmas secavam. O perifiton levava 1-2 semanas a recuperar-se e isto atrasava o ciclo pisccola seguinte, o que constituia uma grande preocupao para os piscicultores.

  • Tanques de piscicultura 33

    Quantidade e qualidade do perifiton A presso provocada pela pastagem do peixe a crescer no tanque ir afectar a capacidade de regenerao do perifiton. Tal implica que a densidade de povoamento dos peixes no dever exceder esta veloci-dade de regenerao. Sabe-se pouco sobre as eficincias de pastagem das vrias espcies de peixes, assim que necessrio mais estu-dos/ensaios sobre este aspecto.

    Uma maneira possvel de melhorar a qualidade nutricional das esteiras de perifiton assegurar que a gua contenha nutrientes em quantidade suficiente (principalmente fsforo e azoto, mas tambm silcio). Pode ser til adicionar composto no tanque.

    Espcies e densidades de peixes Na India e em Bangladesh fizeram-se experimentaes de modo a de-terminar quais as espcies de peixe que eram boas candidatas para uma policultura (a prtica de criao de mais do que uma espcie de peixe no mesmo tanque, ver captulo 5) base de perifiton. Nestas experimentaes usou-se bambu como substrato.

    Chegou-se concluso que a tilpia vermelha e que a espcie de carpa indiana denominada rohu (Labeo rohita), e kalbaush (L. calbasu) co-mem perifiton. Para alm disso, a combinao da carpa rohu com um peixe com hbitos de alimentao complementares, a carpa catla (Ca-tla catla) a uma razo de 60%-40%, teve como resultado uma produ-o de peixe muito alta, superior monocultura de ambas as espcies. Quando ao sistema rohu-catla se acrescentou o peixe kalbaush que se alimenta no fundo do tanque, a produo total ainda aumentou mais.

    A experincia mostrou que a maioria das espcies de peixes, excep-o dos carnvoros puros, iro beneficiar do perifiton. Desta forma, recomenda-se aos piscicultores que procedam a experimentaes de modo a encontarem os substratos adequados para estimular o cresci-mento de perifiton nos seus tanques, e para compararem os aumentos de produo com a produo dos anos transactos.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 34

    Qualidade da gua Os diferentes tipos de substratos causam efeitos vrios no que se refe-re qualidade de gua no tanque. Por exemplo, o bambu mais resis-tente e requer menos oxignio dissolvido que substratos orgnicos fa-cilmente degradveis, tais como bagao de cana de acar ou palha de arroz. Igualmente, dependendo da posio do substrato na coluna de gua, as esteiras de perifiton ou bem so produtoras de oxignio (ca-mada superior da gua) ou consumidoras (camada inferior da gua). Ao se controlar a distribuio dos substratos na coluna de gua, pode-se ajudar a impedir carncias de oxignio no tanque. Para mais infor-mao sobre a qualidade da gua, ver captulo 4.

    A esteira de perifiton armadilha os slidos suspensos, o que melhora a transparncia da gua e, desse modo, a penetrao da luz solar no tan-que. A esteira de perifiton tambm retm compostos que so txicos para os peixes, como seja o amonaco e o nitrato e decompe a mat-ria orgnica.

    A toxicidade do amonaco constitui um constrangimento importante para a intensificao da piscicultura em tanques. Nos tanques em que se utiliza perifiton, as bactrias decompositoras podem colonizar a superfcie dos substratos localizados na coluna de gua bem oxigena-da. Estas esteiras formam um biofiltro que mantm baixos os nveis de amonaco.

    Custos e constrangimentos duma piscicultura base de perifiton Na India fizeram-se clculos dos custos e dos lucros dum ensaio de policultura com carpa, numa tentativa de se estimar o aspecto econ-mico da piscicultura base de perifiton. Este ensaio foi feito com car-pas catla, rohu e carpa comum. O substrato utilizado foi o bagao de cana de acar em diferentes densidades: 0, 7, 14 and 28 kg/100 m2. O rendimento/produo do peixe aumentou em todos os ensaios realiza-dos nos quais se usaram substratos, excepo dos ensaios com 14 e 28 kg/100 m, em que o rendimento era quase o mesmo. Por isso, os custos associados com o ensaio de 14 Kg/100m foram usados para

  • Tanques de piscicultura 35

    comparao com o ensaio onde no foram usados substratos. Os cus-tos adicionais referentes ao transporte, mo-de-obra e materiais para a instalao do substrato totalizaram Rs 5.960 (rupias indianas), enquan-to o aumento de rendimento proveniente das vendas do peixe se cifrou em Rs 24.500.

    Pode-se falar nos seguintes constrangimentos graves no que respeita piscicultura base de perifiton: ? Necessidade de mo-de-obra adicional para a instalao do substra-

    to e para a sua remoo antes da colheita ? Possveis conflitos quanto ao uso do substrato no agregado familiar

    (como combustvel ou noutras actividades produtivas) ? Custo do substrato no caso de este no se poder obter na explorao ? Deflorestao local potencial se a procura de substratos aumentar ? Problemas com a qualidade da gua se o sistema no for gerido

    adequadamente ? Conhecimento insuficiente sobre a biologia do sistema: espcies de

    peixes ou combinao de espcies a serem utilizadas, densidade de povoamento do peixe, tipo e densidade de substrato, etc.

    Concluso Apesar dos constrangimentos supra-mencionados, a piscicultura base-ada no perifiton oferece muitos benefcios potenciais para os piscicul-tores em todo o mundo. Em primeiro lugar, verifica-se um aumento da produo de peixe e uma diminuio da predao e da pesca ilcita. Em segundo lugar, trata-se de uma tecnologia relativamente simples que utiliza os recursos locais, (materiais e mo-de-obra) e pode ser aplicada maioria dos sistemas segundo vrios nveis de intensidade, dependendo dos recursos disponveis. Por ltimo, melhora a sustenta-bilidade ao aumentar a percentagem dos nutrientes de insumos retidos nos produtos colhidos e diminui a descarga de desperdcios e os po-luentes potenciais do meio ambiente.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 36

    4 Manuteno e monitorizao

    Para se alcanar uma elevada produo de peixe no tanque so cruci-ais uma manuteno e monitorizao regulares. Um maneio dirio engloba: ? controlar a qualidade da gua (oxignio, pH, cor, transparncia,

    temperatura) ? verificar se no h fugas de gua no tanque ? limpar o crivo da entrada e sada de gua ? observar os peixes quando comem: esto a comer normalmente?

    Esto activos? Em caso contrrio e se eles vierem para superfcie procura de ar para respirar, o nvel de oxignio na gua demasiado baixo. Pare de alimentar e fertilizar e deixe a gua correr no tanque at que os peixes se comportem de novo normalmente ou procure sintomas que possam indicar uma doena. ? prestar ateno a predadores ou sinais da presena de predadores

    como sejam pegadas e tome precaues, caso necessrio ? remover do tanque ervas daninhas aquticas

    A qualidade da gua um factor vital para uma boa sade e cresci-mento dos peixes. A seguir descrevem-se as caractersticas mais im-portantes da gua.

    Oxignio O oxignio um gs que produzido por todas as plantas no tanque (por isso tambm pelo fitoplncton) com a ajuda da luz solar. Quanto mais luz solar entra no tanque e quanto maior for a quantidade de fito-plncton, tanto mais elevada ser a produo de oxignio. O oxignio produzido dissolve-se parcialmente na gua e o resto libertado para o ar. O nvel de oxignio na gua varia durante um perodo de 24 ho-ras porque a produo e absoro de oxignio pelas plantas muda com a luz e a escurido. O fitoplncton no tanque apenas produz oxignio quando h luz. De noite necessita de oxignio, tal como qualquer ou-tra planta ou animal no tanque, mas devido falta de luz solar no se pode produzir oxignio. A quantidade de oxignio dissolvida na gua

  • Manuteno e monitorizao 37

    diminui, consequentemente, depois do pr do sol (figura 22). O nvel de oxignio atinge, normalmente, o seu mximo ao fim da tarde (o oxignio foi produzido durante o dia) e o seu nvel mnimo de manh cedo (o oxignio foi usado durante a noite). A falta de oxignio a principal causa de morte dos peixes quando o tanque foi fertilizado com estrume ou se lhes deu demasiada comida. Para se obter uma boa produo de peixe importante manter-se um nvel suficientemente alto de oxignio.

    Figura 22: Nvel de oxignio durante o dia

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 38

    Se o peixe est superfcie da gua, procura de oxignio, este pro-blema pode ser solucionado acrescentando mais gua doce ao tanque. Remexer a gua no tanque tambm ajuda a aumentar a quantidade de oxignio dissolvido. Nessa altura no alimente nem fertilize o tanque pois esta , muitas das vezes, uma das razes da falta de oxignio. Uma outra causa possvel de problemas de falta de oxignio pode ser um sobrepovoamento de peixes no tanque. Isto pode causar um stress de oxignio para o peixe, o que pode resultar em surtos de doenas e em mortalidade.

    Acidez, alcanilidade e dureza da gua Outras caractersticas importantes da qualidade da gua so a acidez, a alcanilidade e a dureza.

    A gua que apropriada para a piscicultura deve ter um certo grau de acidez, indicado pelo valor de pH da gua, que deve situar-se, de pre-ferncia, entre 6,7 e 8,6 (figura 23). Os valores que se situam acima ou abaixo deste leque inibem um bom crescimento e reproduo do pei-xe. O fitoplncton necessita de um pH de cerca de 7 e o zooplncton (animais minsculos no tanque de gua dos quais os peixes se alimen-tam) de uma alcalinidade um pouco mais baixa, um pH de 6,5.

    Figura 23: O efeito do pH no crescimento do peixe (Viveen et al. 1985)

    Por vezes o pH da gua do tanque pode mudar rapidamente. Por exemplo, chuvas torrenciais podem carregar para o tanque, a partir do solo e atravs da gua de escoamento, substncias cidas dissolvidas. Desta maneira a gua do tanque torna-se mais cida, o que diminui o valor do pH.

  • Manuteno e monitorizao 39

    A melhor forma para aumentar de novo o valor do pH, at se atingir um valor neutro (mais ou menos 7), acrescentar cal gua do tanque (Apndice 2).

    A alcalinidade da gua a medida da capacidade que a gua tem para prender o cido (capacidade tampo), que o contrrio da acidez da gua. Tal quer dizer que quando a alcanilidade da gua elevada, ne-cessita-se de mais substncias cidas para que o valor do pH da gua diminua.

    A dureza da gua a medida da totalidade de sais minerais solveis na gua. Se a gua contiver muitos sais chama-se dura e caso contenha poucos sais suave. Um outro mtodo para medir a dureza da gua, consiste em examinar, cuidadosamente, os diques do tanque, onde se encontra a linha de gua. No caso de haver uma linha branca no dique mesma altura do nvel da gua, isso quer dizer que a gua contm sais, que secaram nos diques do tanque. A gua dura importante para que os peixes cresam bem. No caso da gua ser demasiado su-ave (i.e. a quantidade de sais solveis na gua ser baixa), o piscicul-tor pode aumentar a sua dureza acrescentando cal gua. Deste modo aumenta-se a fertilidade da gua, provocando a produo de alimenta-o natural o que levar, consequentemente, a um aumento da produ-o de peixe no tanque.

    Pode-se alterar a acidez, alcanilidade e dureza da gua acrescentando cal gua do tanque, tal como j mencionmos anteriormente. Estas trs medidas da qualidade da gua NO so iguais mas normalmente encontram-se associadas umas s outras da seguinte maneira:

    Alcanilidade baixa pH baixo pouca dureza

    Deste modo, o propsito de acrescentar cal ou aumentar a alcanili-dade, a dureza da gua ou o pH da gua do tanque (at mais ou menos 7). Os tanques recm-construdos necessitam de um tratamento dife-rente ao dos tanques em que j se foi acrescentada cal anteriormente.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 40

    Tanques recm-construdos Estes devem ser tratados com 20 a 150 kg de cal para fins agrcolas por 100 m2 (Apndice 2). Mistura-se a cal com a camada superior do solo (5 cm) do fundo do tanque. Subsequentemente enche-se o tanque com gua at uma altura de 30 cm. Dentro de uma semana o pH da gua do tanque deve ter atingido 7 e pode-se comear a fertilizar o tanque.

    Tanques com calagem anterior Estes devem ser tratados com 10 a 15 kg de cal viva por 100 m2, acrescentados ao fundo hmido do tanque para eliminar patgenos, parasitas e predadores dos peixes. Aps um perodo de 7 a 14 dias de-vem-se encher os tanques de novo com gua. Depois de se encher o tanque at 30 cm de profundidade, pode-se ajustar o pH da gua, acrescentando cal para fins agrcolas. (Apndice 2).

    Turvao Turvao o termo utilizado para a quantidade de sujidade e de outras partculas dissolvidas e em suspenso na gua, que lhe conferem uma cor acastanhada. Uma grande turvao da gua pode diminuir a produ-tividade do peixe, na medida em que reduz a penetrao da luz na gua e, portanto, a produo de oxignio pelas plantas aquticas. Sli-dos dissolvidos, em suspenso, tambm obstruem os crivos e causam danos nas guelras dos peixes.

    Um mtodo utilizado para medir a transparncia da gua e, portanto, uma maneira indirecta de calcular a turvao, o disco Secchi ilustra-do na figura 37 (ver captulo 7). Um mtodo adequado para reduzir a turvao a utilizao duma bacia de captao de sedimentos. Trata-se dum reservatrio pequeno colocado na entrada do tanque. A gua corre para o reservatrio e fica a at que o lodo assente no fundo. Nessa altura deixa-se que a gua entre no tanque dos peixes.

    Uma outra forma para limpar a gua lamacenta colocar feno e/ou estrume no tanque e deix-lo a para que se decomponha (tornando-se em sedimentao ou partculas de lodo). Este mtodo no deve ser

  • Manuteno e monitorizao 41

    utilizado na poca quente pois, nesse caso, o feno comear a apodre-cer muito rapidamente, podendo causar uma escassez de oxignio no tanque.

    No caso da causa principal da turvao no ser a abundncia de fito-plancton (a gua no apresenta uma cor esverdeada), mas que se deva a outros factores, existem algumas prticas amplamente usadas para diminuir esta turvao. Por exemplo, antes de povoar o tanque com peixes, coloque estrume animal razo de 240 g/m2. Proceder deste modo trs vezes com um intervalo de trs a quatro dias entre as apli-caes. Um outro mtodo para diminuir a turvao aplicar gesso de Paris (gipso) ou, de preferncia, almen, a 1 grama por 100 litros de gua.

    Contudo, a nica soluo real para a turvao, a longo prazo, de desviar do tanque a gua lamacenta e, em ltima anlise, proteger os diques contra a eroso, o que causa uma elevada turvao da gua.

    Substncias txicas A presena de substncias txicas na gua que abastece o tanque pode diminuir, drasticamente, a produo de peixe, assim que sensato in-vestigar se existem (ou h o potencial) fontes de gua poluda na vizi-nhana do tanque. Muitos dos produtos qumicos utilizados na criao de gado e nas culturas agrcolas so venenosos para os peixes. Portan-to, nunca se devem usar produtos qumicos na rea ao redor do tanque, evitando, especialmente, a pulverizao desses produtos em dias ven-tosos.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 42

    Parte II: Planificao duma explorao pisccola

    Figura 24: Planificao duma explorao pisccola

  • Introduo 43

    5 Introduo Os factores naturais mais importantes que necessitam de ser avaliados so a terra, a gua e as condies climticas. Quando se escolhe um local para montar uma explorao pisccola, deve-se considerar o efei-to que pode ter no meio ambiente. reas naturais importantes (p.ex. terras de viveiros de peixe como sejam florestas pantanosas) no de-vem ser usadas para a piscicultura. Um dos requisitos primordiais a disponibilidade de gua, tanto em termos de qualidade como de quan-tidade. O tipo de explorao de aquacultura e de espcies de animais ou plantas que poder cultivar depende, em grande medida, das pro-priedades do local de construo.

    Tambm se devem enfatizar os riscos envolvidos na piscicultura. Para que cresam e se reproduzam, os peixes necessitam de protena. Tal implica que podem tornar-se competidores pelos produtos que, doutra maneira, poderiam ser usados directamente para o consumo humano. Para alm disso, o custo de produo bastante elevado e, portanto, a criao de peixes em tanques nem sempre pode competir financeira-mente com a pesca livre ( peixes apanhados na natureza).

    O estabelecimento duma explorao pisccola envolve um elevado investimento inicial e custos de produo altos, assim como riscos econmicos. por isso que o futuro piscicultor deve considerar alguns factores importantes antes de se aventurar a iniciar uma empresa de piscicultura. Por exemplo:

    1 Recolha de informao: Os futuros piscicultores quando iniciam uma explorao pisccola po-dem, muitas das vezes, obter apoio dos servios de extenso, sob a forma de assessoria tcnica. Em alguns casos at se pode obter apoio financeiro.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 44

    2 Finanas: Uma estimativa dos custos deve englobar o custo da terra, assim como as despesas de capital para o povoamento de peixes, a construo do tanque, mo-de-obra, produo e colheita.

    3 Local da construo: O solo tem que poder reter a gua. Deve-se poder dispor de gua de boa qualidade e em quantidade suficiente, a um custo razovel. O lo-cal de construo deve ser perto da casa e devem-se calcular as perdas potenciais devido a roubos. Deve-se saber quem o proprietrio da terra e se so necessrias licenas governamentais e obter essas licen-as. O local de construo e os caminhos de acesso devem ser transi-tveis e no estar sujeitos a inundaes.

    4 Unidades populacionais (ou stock) de peixe: preciso decidir se ir criar/reproduzir o seu prprio peixe ou com-pr-lo a terceiros. Se o plano comprar o peixe dever poder contar-se com uma fonte confivel de um stock de peixes de boa qualidade. No caso de se decidir criar os prprios peixes, ser necessrio ter um es-pao adequado para a manuteno do peixe reprodutor maduro e a produo dos peixes jovens (crias juvenis).

    5 Produo: Ser que a alimentao/rao disponvel para as espcies selecciona-das de peixes corresponde prefncia destas espcies?

    6 Colheita: Tem que poder contar-se com um nmero suficiente de pessoas para fazer a colheita do peixe. preciso descobrir qual o mtodo mais econmico para a colheita. possvel que se necessite de infraestrutu-ras de armazenamento para o peixe que foi colhido.

    7 Consumo: Qual a finalidade da criao de peixe, auto-consumo ou venda?

  • Seleco do local de construo e do tipo de explorao pisccola 45

    6 Seleco do local de construo e do tipo de explorao pisccola

    6.1 Seleco do local Uma seleco adequada do local de construo constitui, provavel-mente, o factor de sucesso mais importante. Contudo, caso no seja possvel encontrar o local ideal, necessrio fazer-se compromissos. Tambm pode ser que existam conflitos quanto ao uso da terra e da gua que tm que ser resolvidos. Deve-se decidir quais as espcies de peixes que se pretende criar, com base na alimentao/raes dispon-veis (p.ex. sub-produtos agrcolas) e fertilizantes possveis (p.ex. composto ou estrume animal).

    A escolha do local onde se ir implantar o tanque depender do tipo de explorao pisccola que se planifica empreender. Para a construo do tanque necessrio considerar os seguintes factores: tipo de solo, qualidade e quantidade de gua disponvel e as necessidades para en-cher e drenar o tanque.

    Solo A qualidade do solo influencia tanto a qualidade da gua como a pro-dutividade dum tanque. O solo tambm tem que ser adequado para a construo do dique. Para se determinar a adequabilidade do solo as duas propriedades mais importantes a examinar so: a textura do solo (composio do tamanho das partculas) e a porosidade ou permeabi-lidade (capacidade de deixar que a gua passe). O fundo do tanque deve poder reter a gua (ter uma porosidade baixa, como a argila) e o solo tambm deve poder contribuir para a fertilidade da gua atravs da proviso de nutrientes. O melhor solo para a construo de tanques deve conter muita argila. H trs mtodos que se devem seguir de forma a poder-se predizer se o solo ou no adequado para a constru-o do tanque, a saber: o mtodo de apertar, o teste de gua subter-rnea e o teste de permabilidade do solo gua.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 46

    1 Mtodo de apertar (figura 25): a Molhe uma mo cheia de terra com a gua necessria apenas para

    que a terra fique hmida b Aperte a terra, fechando firmemente a mo c Se mantiver a sua forma depois de abrir a palma da mo, o solo

    bom para a construo do tanque.

    Figura 25: O mtodo de apertar (Chakroff, 1976)

    2 O teste da gua subterrnea (figura 26) Deve-se realizar este teste durante a poca seca, de modo a obter-se resultados confiveis: a Cave uma cova com a profundidade de um metro b Cubra-a com folhas durante uma noite para limitar a evaporao c Caso na manh seguinte a cova estiver cheia de gua pode-se cons-

    truir a o tanque mas tome em considerao que, provavelmente, necessitar de mais tempo para drenar o tanque. Tal deve-se aos al-tos nveis de gua do lenol fretico que enchero de novo o tanque.

    d No caso da cova continuar vazia (sem gua) na manh seguinte, no ocorrero quaisquer problemas decorrentes dos nveis elevados de gua do lenol fretico (figura 26) e, provavelmente, o local ser adequado para o tanque de piscicultura. Em seguida dever-se tes-tar a permeabilidade do solo gua.

    3 Teste da permeabilidade (do solo) gua (figura 27): a Encha a cova com gua at acima b Cubra a cova com folhas c No dia seguinte o nvel da gua estar mais baixo devido infiltra-

    o/percolao. Provavelmente as paredes da cova ficaram satura-das de gua e podem reter melhor a gua.

  • Seleco do local de construo e do tipo de explorao pisccola 47

    d Encha de novo a cova com gua at acima e Cubra-a, mais uma vez, com folhas. Controle o nvel da gua no dia

    seguinte. f Se o nvel da gua ainda for alto, o solo suficientemente imperme-

    vel e adequado para nele se construir o tanque. g No caso da gua ter desaparecido de novo, este local no apropri-

    ado para piscicultura, a menos que, primeiramente, se tenha coberto o fundo com plstico ou com argila pesada.

    Figura 26: Teste da gua subterrnea (Viveen et al., 1985)

    O contorno do terreno, em especial a inclinao do mesmo, determina como se deve construir o tanque. A inclinao do terreno pode ser usada para a drenagem do tanque durante a colheita.

    Um terreno completamente plano ou com elevaes e uma inclinao superior a 4% no adequado para construo de tanques. Terrenos com inclinaes que variam entre 2% e 4% podem ser usados para a construo de tanques. Uma inclinao do terreno de 2% indica que por cada metro de distncia horizontal se verifica uma baixa de 2 cm na elevao. Se a inclinao adequada, pode-se encher e drenar o tanque apenas por meio da gravidade. No entanto, preciso tomar cuidado para se prevenir a eroso dos diques do tanque.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 48

    Figura 27: Teste da impermeabilidade (do solo) gua (Viveen et al., 1985)

    gua A disponibilidade de gua de boa qualidade de grande importncia para todos os sistemas de piscicultura mas a quantidade de gua ainda se reveste de uma maior importncia para os sistemas de piscicultura com tanque de terra (escavados). necessrio um abastecimento cons-tante de gua, no apenas para encher o tanque, mas tambm para se recuperar as perdas causadas pela infiltrao ou percolao e pela evaporao (figura 28).

    muito importante fazer-se uma investigao sobre as fontes de gua: ? Qual a quantidade de gua disponvel?

  • Seleco do local de construo e do tipo de explorao pisccola 49

    ? H gua em todas as pocas do ano ou a disponibilidade varia con-soante a poca? ? Quais so as fontes de gua? possvel que estejam poludas?

    Figura 28: Abastecimento e perdas de gua num tanque de peixes (Viveen et al. 1985). a: abastecimento; b: escoamento/descarga; c: evaporao; d: infiltrao/percolao)

    De uma forma ideal deveria haver disponibilidade de gua durante todo o ano. No quadro 2 apresentamos uma lista sobre os vrios tipos de fontes de gua e os seus inconvenientes.

    Temperatura da gua A temperatura da gua constitui uma condio importante para se ava-liar se possvel criar as espcies de peixe seleccionadas. Duma ma-neira geral a temperatura da gua que conveniente para a piscicultura oscila entre 20 C e 30 C.

    Salinidade da gua Um outro factor importante a considerar a variao quanto salini-dade da gua (quantidade de sal dissolvido na gua). Algumas espci-es de peixes podem suportar uma maior amplitude de salinidade que outros: p.ex. a tilpia e o peixe-gato podem suportar uma amplitude lata que vai desde gua doce a gua do mar enquanto a carpa s pode ser criada em gua doce.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 50

    Estes so os critrios mais importantes da qualidade da gua no que respeita escolha do local para implantar o tanque. Existem outras caractersticas importantes da qualidade da gua, mas que so mais facilmente controladas por medidas de maneio. Estes critrios foram descritos no captulo 4.

    Quadro 2: Fontes de gua e os seus inconvenientes principais

    Fonte de gua Inconveniente principal Precipitao Os tanquessky dependem apenas da chu-va para abastecimento de gua

    Dependncia O abastecimento depende em grande me-dida da quantidade de chuva e das flutua-es sazonais

    Vazo/escoamento Podem-se encher os tanques quando a gua proveniente da terra ao redor corre para eles.

    Turvao alta A turvao a quantidade de lodo que se encontra na gua. No caso de vazo a gua pode ficar lamacenta. Perigo de inun-dao e de pesticidas (ou outros poluentes) na gua.

    guas naturais A gua de correntes naturais,(ribeiros, rega-tos, arroios) rios ou lagos pode ser desvia-da para o tanque.

    Contaminaes Animais, plantas e organimos em decom-posio podem causar doenas. Perigo de pesticidas (ou outros poluentes) na gua.

    Fontes ou nascentes A gua duma nascente uma gua subter-rnea que encontrou uma maneira de aflo-rar superfcie. A gua de nascentes boa para os tanques pisccolas visto que nor-malmente se encontra limpa.

    Baixo nvel de oxignio e tempertaura baixa

    Poos Poos so lugares onde se bombeia a gua subterrnea.

    Baixo nvel de oxignio e temperatura baixa

  • Escolha das espcies de peixe 51

    7 Escolha das espcies de peixe

    Quando se escolhem as espcies de peixe adequadas para piscicultura, necessrio prestar ateno a vrios factores biolgicos e econmicos relevantes: 1 preo de mercado e procura (excepto quando o peixe produzido

    para auto-consumo) 2 taxa de crescimento 3 aptido para reproduo em cativeiro 4 cultura simples de peixes jovens (larvas e juvenis) 5 correspondncia entre a alimentao disponvel para os peixes e as

    preferncias alimentares das espcies de peixes escolhidas

    Normalmente possvel escolher entre as espcies que ocorrem lo-calmente e evitar a introduo de espcies exticas para cultura. As caractersticas biolgicas mais importantes (taxa de crescimento, re-produo, tamanho e idade com a primeira maturidade, hbitos ali-mentares, vigor/robustez e susceptibilidade a doenas) determinam a adequabilidade duma espcie para cultura, sob as condies locais.

    Embora algumas espcies de crescimento lento possam ser candidatas a cultura devido ao seu valor de mercado, muitas das vezes torna-se difcil fazer com que a cultura dessas espcies seja lucrativa. melhor que atinjam um tamanho comercializvel antes de atingirem a maturi-dade, assegurando, desse modo, que a maior parte da comida seja uti-lizada para crescimento muscular em vez de para a reproduo. Por outro lado, uma maturidade precoce assegura uma disponibilidade maior do peixe jovem.

    O peixe, passa pelas seguintes fases no seu ciclo de vida: 1 ovo 2 larva (tem uma vescula -ou saco- vitelina, alimentando-se das suas

    prprias reservas e ainda no necessita de alimentos externos) 3 alevino ou alevim (as reservas alimentares j se esgotaram, agora j

    necessita de alimentos vindos de fora)

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 52

    4 juvenil em desenvolvimento (um peixe jovem, mais velho que um alevino mas que no tem, normalmente, mais que um ano e que tem mais ou menos o tamanho dum dedo da que em ingls se deno-mine fingerling)

    5 juvenil desenvolvido: o peixe ainda no est na fase madura 6 adulto: o peixe pode reproduzir-se

    Os termos gerais peixe bebou peixe jovem referem-se, normal-mente, s fases de alevino ou de juvenil em desenvolvimento (finger-ling).

    No caso de no ter a inteno de criar peixe pode ter que depender do aprovisionamento de juvenis em desenvolvimento (que se encontram na natureza, de espcies selvagens). De modo geral esta fonte no confivel, visto que as quantidades de juvenis em desenvolvimento apanhadas na natureza variam imenso de um momento para outro. Tal deve-se ao facto que a reproduo natural dos peixes assenta em facto-res biolgicos imprevisveis (temperatura da gua, disponibilidade de comida, etc.). Para alm disso a recolha de peixes jovens na natureza pode dar origem a conflitos com os pescadores comerciais. melhor escolher espcies de peixes que voc mesmo possa reproduzir facil-mente, ou espcies que podem ser compradas no mercado de peixe ou a um fornecedor digno de confiana, numa estao experimental de cultura de peixes ou nos servios de extenso de piscicultura.

    Os custos de alimentao (raes) constituem, geralmente, o grande mago dos custos totais de produo da piscicultura. Esta a razo pela qual prefervel ter espcies de peixes que se alimentam de plantas (herbvoros) ou que se alimentam de plantas e de animais (omnvoros) visto que consomem os recursos alimentares naturais que ocorrem no tanque. O custo da alimentao destas espcies ser relativamente bai-xo. Por outro lado, as espcies de peixes carnvoras (predadores), ne-cessitam de uma dieta proteica elevada, sendo, por isto, a sua produ-o mais cara. No entanto, de modo a compensar os elevados custos de alimentao, a maioria das espcies carnvoras atingem preos de mercado mais elevados.

  • Escolha das espcies de peixe 53

    As espcies de peixe que so robustas e tolerantes a condies desfa-vorveis de cultura sobrevivem melhor em condies ambientes rela-tivamente fracas (p.ex. tilpia). Para alm do efeito que o ambiente tem sobre as espcies de peixes, a influncia das espcies sobre o am-biente tambm deveria ser considerada quando se introduz novas es-pcies de peixes. As novas espcies de peixe introduzidas devem: ? satisfazer uma necessidade que no pode ser preenchida pelas esp-

    cies locais ? no competir com as espcies locais ? no se cruzar com espcies locais e no produzir hbridos indesej-

    veis ? no introduzir doenas e parasitas ? viver e reproduzir-se em equilbrio com o seu meio ambiente

    Quando se introduzem espcies exticas deve-se estar consciente do facto que esta actividade se encontra sujeita a regulamentos nacionais e internacionais rigorosos.

    A criao de vrias espcies de peixe ao mesmo tempo num tanque (policultura) produzir uma produo de peixe mais elevada do que se se criar espcies de peixe separadamente (monocultura).

    Monocultura Cria-se, apenas, uma nica espcie de peixe no tanque. Uma vantagem da monocultura que s existe uma espcie de peixe a considerar no respeitante a preferncia alimentar, sendo, portanto, mais fcil forne-cer certas raes suplementares ao peixe. Um inconveniente o risco que uma nica doena possa matar todos os peixes no tanque. Nor-malmente vrias espcies de peixes so susceptveis a diferentes do-enas.

    Policultura Fala-se de policultura quando se cria mais do que uma espcie de pei-xes no tanque pisccola. Desta maneira utiliza-se melhor os vrios re-cursos naturais de alimentao. Cada espcie de peixe tem uma certa preferncia alimentar que est relacionada com a posio do peixe no

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 54

    tanque (i.e. o peixe que vive no fundo do tanque ou na gua do meio). Por exemplo, a carpa do lodo vive quase sempre no fundo do tanque e alimenta-se de lodo e de detritos, que a se encontram depositados. A tilpia, pelo contrrio, prefere o centro do tanque. Ao se combinarem vrias espcies no mesmo tanque, pode-se aumentar a produo total de peixe, que atingir um nvel mais elevado do que seria possvel caso se cultivasse apenas uma espcie ou at mesmo vrias espcies separadamente. Um exemplo dum sistema de policultura pisccola chinesa a cultura da carpa prateada, carpa cabeuda e carpa do ca-pim, todas estas espcies no mesmo tanque (figura 29).

    Figura 29: Policultura da carpa - A: carpa prateada, B: fitoplncton, C: carpa cabeuda, D: zooplncton, E: carpa do capim, F: plantas aquticas

    A carpa prateada pode alimentar-se principalmente de fitoplncton, a carpa cabeuda de zooplncton e a carpa do capim de plantas aquti-

  • Escolha das espcies de peixe 55

    cas, de modo que praticamente no se verificar qualquer concorrn-cia pela comida. Um outro exemplo muito utilizado a policultura da tilpia com a carpa comum, visto que a tilpia se alimenta principal-mente de fitoplncton e a carpa comum de zooplncton e material do fundo do tanque. Uma forma especial de policultura so as culturas concorrentes da tilpia e ou do peixe-gato ou cabea de cobra (geral-mente um peixe predador) como forma de controlar a reproduo ex-cessiva da tilpia. A nfase deve ser colocada em espcies de peixes que podem viver de diferentes tipos de alimentao.

    7.1 Espcies de peixes mais vulgarmente cultivadas

    A tilpia, o peixe-gato e a carpa so as espcies mais correntemente cultivadas nas regies tropicais.

    Cultura da tilpia As tilpias so espcies nativas de frica e do Mdio Oriente dum grupo de peixe de gua doce tropical. Existem, pelo menos, 77 espci-es conhecidas de tilpia, das quais a tilpia do Nilo ou tilpia niltica a espcie de crescimento mais rpido.

    A tilpia um peixe idealmente adequado para policultura em condi-es ambientais medocres e/ou em que o maneio do tanque constitui uma prioridade baixa. Trata-se de peixes robustos, capazes de suportar temperaturas de gua extremas e nveis baixos de oxignio dissolvido. A desova natural ocorre em quase todos os tipos de gua. A temperatu-ra da gua, para um crescimento e reproduo ptimos, situa-se entre os 20 e os 30 C. A tilpia pode tolerar temperaturas baixas (12 C), podendo mesmo sobreviver durante perodos de tempo prolongados em temperaturas de gua abaixo dos 10 C. Algumas espcies tambm so conhecidas por sobreviverem e crescerem na gua salgada. Sendo verdadeiras omnvoras, as tilpias comem quase tudo e por isso lhes chamam as galinhas aquticas. Devido s caractersticas da cultura supra-mencionadas, a tilpia considerada a espcie de peixe ideal para a piscicultura de pequena escala.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 56

    No obstante, um constrangimento a uma piscicultura lucrativa a reproduo contnua da tilpia. A tilpia atinge a sua maturidade sexu-al com um tamanho de cerca de 10 cm (cerca de 30 gramas de peso do corpo). Esta maturidade precoce e a reproduo frequente causa um sobrepovoamento dos tanques com peixes jovens e leva a uma compe-tio feroz por comida entre as unidades populacionais de tilpia e os peixes recm-nascidos (alevinos ou alevins). Tal, por sua vez, conduz a um decrscimo da taxa de crescimento das primeiras populaes de tilpias, da decorrendo um nmero elevado de tilpias de tamanho pequeno, aquando da colheita.

    O sistema mais comum e mais praticado da cultura da tilpia em tanques de terra de todos os tamanhos. Na cultura em tanques, foram feitas tentativas para superar o problema duma reproduo precoce e, portanto, do sobrepovoamento do tanque. Dos vrios mtodos de con-trolo existentes, o mais simples a colheita contnua. Tal implica a remoo dos peixes maiores usando uma rede selectiva feita de mate-rial natural ou de nylon. Deste modo, ao se remover os peixes com o tamanho de mercado, permite-se, assim, que os peixes jovens restantes possam continuar a crescer. Este mtodo requer muito trabalho embo-ra prolongue o perodo antes de atinjirem a maturidade. Tambm exis-te o risco de deteriorao gentica do stock quando se vendem os pei-xes grandes e de rpido crescimento. Tal implica que os restantes pei-xes, de crescimento lento, sero os reprodutores.

    Um mtodo ligeiramente mais complicado retirar os alevinos do tanque quando esto a sair do ovo, cri-los em tanques de alevinos e, ento, transferir-los para tanques de crescimento. Contudo, tal como foi supramencionado, os peixes tendero a reproduzir-se antes de te-rem atingido um tamanho de mercado, persistindo, assim, o problema do sobrepovoamento.

    O sobrepovoamento pode ser controlado, principalmente em termos econmicos, pelos piscicultores de pequena escala, povoando-se o tanque com peixes predadores (p. ex. peixe-gato ou cabea de cobra) juntamente com as tilpias. Estes predadores comero a maioria dos

  • Escolha das espcies de peixe 57

    alevinos da tilpia, impedindo assim o sobrepovoamento do tanque. So vrios os predadores que so usados em diferentes partes do mun-do: Cichlasoma managuense (El Salvador), Hemichromis fasciatus (Zaire), Nile perch Lates niloticus (Egipto), Micropterus salmoides (Madagascar), Bagrus docmac (Uganda). Normalmente os predatores atingem preos elevados no mercado quando so vendidos.

    Quando se utiliza este mtodo de controlo da reproduo com a til-pia, so os seguintes os factores que devem ser considerados: o tama-nho e a densidade de povoamento tanto da tilpia como do predador e a ocasio em que se povoa o tanque com os predadores. De um modo geral, a tilpia comea a reproduzir-se imediatamente depois de ser introduzida no tanque de modo que os peixes predadores podem ser introduzidos na mesma altura.

    A densidade de povoamento da tilpia de 2/m2 e a dos peixes preda-dores varia consoante a sua voracidade: 83 peixes-gato de, pelo me-nos, 30 cm de comprimento por 100 m2 ou 7 cabeas-de-cobra com um comprimento mnimo de 25 cm por 100 m2.

    Quando se povoa o tanque com outras espcies de peixes predadores tambm se deve considerar, cuidadosamente, o nmero e o tamanho dos peixes com o qual se pretende povoar o tanque. Uma regral geral no que diz respeito ao tamanho de povoamento do peixe predador que o consumo mximo do peixe-presa pelos predadores 40% do seu prprio comprimento. Tal quer dizer que quando se povoa um tanque com tilpias de 10 cm de comprimento, o peixe predador a ser intro-duzido no tanque, deve ter menos de 25 cm (10/0,40) de comprimen-to; pois de outro modo o predador comer o stock de tilpias!

    A densidade de povoamento do predador depende da sua voracidade. Para se calcular a voracidade dum peixe a ser introduzido num tanque, podem-se fazer comparaes entre peixes moderadamente vorazes, como seja o peixe-gato e os altamente vorazes, como o caso do cabe-a-de-cobra.

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 58

    As tilpias macho crescem mais rpido que as fmeas, sendo, por isso, normalmente maiores com a mesma idade. As tilpias macho podem-se distinguir das tilpias-fmea pela ausncia de uma abertura vertical nas papilas genitais (figura 30).

    Figura 30: rgos genitais(papilas)de (a) tilpia feminina e (b) til-pia masculina

    Desova A produo de ovos no apresenta qualquer problema se os peixes de-sovam facilmente no tanque. A temperatura da gua preferida durante a desova de 20 a 30 C.

    Quando se povoa um tanque com tilpias, normalmente as fmeas tm um peso de cerca de 700 g e os machos de 200 g, a uma densidade de povoamento mdia de um peixe por 2 m2 e numa razo sexual de um macho para quatro ou cinco fmeas. As tilpias macho comeam, imediatamente, a escavar buracos no fundo do tanque, atraindo as f-

  • Escolha das espcies de peixe 59

    meas para o buraco, que a libertaro os seus ovos. Se o fundo do tan-que no for solto, podem-se usar potes de cermica ou caixas de ma-deira como material de nidificao. A tilpia poder, ento, reprodu-zir-se cada 3 a 6 semanas.

    O nmero de ovos produzidos por desova depende do tamanho da f-mea: uma fmea de tilpia do Nilo (niltica) com 100 g tem uma de-sova de cerca de 100 ovos, enquanto um peixe de 600-1000g desovar entre 1000 a 1500 ovos. Os alevinos so recolhidos em intervalos mensais e criados em tanques-viveiro at atingirem o estdio de juve-nis em desenvolvimento. A produo mensal mdia de alevinos de cerca de 1500 alevinos/m2.

    Durante a primeira fase, o alevino come a alimentao natural produ-zida pelo tanque. Os alevinos so removidos dos tanques de desova e transferidos para tanques-viveiro ou directamente para tanques de crescimento/maturao. Assim que so transferidos para os tanques-viveiro, do-se-lhes raes suplementares a uma taxa de cerca de 6 a 8% do peso corporal, dependendo do tipo de alimentao. Quando se utiliza farelo de trigo, os nveis de raes dirias podem variar de 4% at 11% do peso do peixe.

    Tanques de crescimento/maturao A cultura da tilpia est orientada, geralmente, para a produo de peixe com um tamanho comercializvel de, pelo menos, 200-300 g. Os tanques usados para culturas extensiva ou semi-intensiva podem variar dum tamanho que vai de alguns metros quadrados at a vrios milhares de metros quadrados. As unidades tpicas de cultivo intensivo so de cerca de 800-1000 m, sendo fcil o seu maneio para o piscicul-tor.

    Recomenda-se uma densidade de povoamento de 2 juvenis em desen-volvimento/m , a par de aplicao de fertilizantes e/ou raes suple-mentares. Uma maior disponibilidade de comida leva a um maior ta-manho na fase de maturidade e a um atraso na frequncia de desova das fmeas. Pode-se atrasar, deste modo, o efeito de sobrepovoamento

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 60

    no tanque pisccola. Podem-se obter duas colheitas por ano quando o tamanho comercializvel de cerca de 200 g. Os tanques podem ser fertilizados com estrume de galinha e fosfato de amnio. As raes suplementares so compostas, frequentemente, por farelo de arroz, farelo de trigo e estrume de galinha seco.

    Raes e fertilizante Embora as tilpias possam ser divididas em espcies que se alimen-tam, principalmente, de plantas aquticas e espcies que se alimentam, maioritariamente, de fitoplncton, sob as condies de cultura no tan-que elas apresentam hbitos alimentares extremamente flexveis. Tal significa que comero quase qualquer tipo de alimentao disponvel. Os detritos que se encontram no fundo do tanque tambm formam uma grande parte da sua alimentao. A fertilizao dos tanques de tilpias com estrume e/ou fertilizantes artificiais aumenta a produo global de alimentos para os peixes.

    Quando se cultivam tilpias em tanques pode-se usar uma grande va-riedade de alimentos. A tilpia jovem depende, principalmente, da produo (natural) de alimentao no tanque. As tilpias adultas po-dem ser criadas com a alimentao produzida no tanque, caso se lhes acrescentar estrume e/ou fertilizante artificial. Esta produo natural de alimentao pode ser suplementada, em maior ou menor extenso, atravs da adio de outras raes. A tilpia pode ser alimentada com materiais vegetais como sejam folhas, mandioca, batata doce, cana de acar, milho, papaia e vrios produtos de desperdcio como sejam desperdcios de destilao, bagao da semente do algodo, bagao de amendoim e polpa de caf.

    O tipo de alimentao utilizado depende da sua disponibilidade e cus-tos locais. Na maioria dos casos as raes so preparadas na prpria explorao pisccola a partir de todos os tipos de produtos e subprodu-tos agrcolas. No quadro 3 apresentam-se alguns exemplos de frmu-las/raes alimentares simples. A quantidade de alimentos para o peixe depende do tamanho do peixe e do tipo de alimento. Uma observao cuidadosa do peixe no tanque enquanto este alimentado, constitui a

  • Escolha das espcies de peixe 61

    melhor maneira de determinar a quantidade a utilizar. No d uma quantidade de alimentos superior a que o peixe pode comer num de-terminado momento.

    Quadro 3: Algumas raes para tilpias usadas em vrios pases (Pillay, 1990)

    Filipinas Africa Central Costa do Marfim 65% farelo de arroz 25% farinha de peixe 10% farinha de copra

    82% bagao de semente de algodo 8% farinha de trigo 8% farinha de sangue de vaca 2% fosfato biclcico

    61-65% farelo de arroz 12% trigo 18% bagao de amendoim 4-8% farinha de peixe 1% concha de ostra moda

    Os sistemas de policultura de tilpia combinada com carpa comum, e salmonete (Mugil cephalus) ou carpa prateada podem contribuir para uma utilizao mxima da alimentao natural presente no tanque. O rendimento do peixe em policultura pode atingir 750-1070 g/m/ano.

    Quadro 4: Exemplos de nveis tpicos de produo obtidos em di-versos sistemas de cultura

    Sistema Nveis de produo Tanques no fertilizados sem stocks de predadores 30-60g/m/ano Tanques no fertilizados, com raes (desperdcios agrcolas) com stock de predadores

    250 g/m/ano

    Tanques fertilizados com estrume (porcos, aves domsticas, etc.) 300-500 g/m/ano Tanques fertilizados e com raes comerciais 800 g/m/ano

    Cultura do peixe-gato O peixe-gato pertence ordem de peixes denominada Siluriformes, subdivida em vrias famlias, que incluem as Ictaluridae, Pangasidae e Clariidae. Esta ordem de peixes composta tanto de espcies de peixes marinhas como de gua doce, que se encontram em quase todo o mundo. Foram registadas mais de 2000 espcies diferentes, das quais metade se encontra na Amrica do Sul. Eis algumas famlias de peixe-gato e as respectivas reas de criao:

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 62

    Ictaluridae; Peixe-gato-do-canal (Ictalurus punctatus) e peixe-gato azul (Ictalurus furcatus) ambos cultivados nos EUA. Pangasiidae; Pangasius sutchi cultivado na Tailndia, Cambodja, Vietname, Laos e India e Pangasius iarnaudi. Clariidae; Peixe-gato asitico (Clarias batrachus) e Clarias microce-phalus cultivados na Tailndia e gato-peixe africano (Clarias gariepi-nus) cultivado em frica e na Europa (figura 31).

    Figura 31: Peixe-gato africano (Clarias gariepinus)

    Todas as espcies de peixe-gato cultivadas so de gua doce e de gua quente, com uma temperatura que varia entre os 16-30 C. O peixe-gato ou tem uma pele lisa ou a sua pele est coberta com placas ossu-das. Isto til para o piscicultor pois quer dizer que o peixe-gato pode ser manuseado facilmente sem que as escamas se desprendam, o que pode causar danos na pele. A sua natureza robusta e a capacidade de se manter vivo fora de gua por perodos de tempo longos adquire um valor especial no pases tropicais. Nestes pases, as temperaturas ele-vadas da gua podem causar problemas prticos, por exemplo, durante o transporte.

    Desova No peixe-gato a abertura urogenital est situada, em ambos os sexos, mesmo atrs do nus. O macho adulto pode distinguir-se da fmea pela forma alongada, projectada para trs do seu rgo genital (papi-la). Na fmea a papila tem uma forma oval. Na figura 32, mostra-se uma fmea madura (A) e um macho (B) de peixe-gato, deitados de dorso. As crias juvenis do peixe-gato no tm uma papila.

  • Escolha das espcies de peixe 63

    O comportamento reprodutivo varia segundo a espcie de peixe-gato. O peixe-gato-do-canal desova quando tem entre 2 a 3 anos de idade e pesa, pelo menos, 1,5 kg. Numa desova natural, o peixe deixado no tanque que contm uma rea adequada de nidificao. Os tan-ques de desova tm uma rea de cerca de 2500 m e a sua densidade de povoamento de 5 a 30 peixes por 1000 m. Na desova em sistema confinado, cada casal de peixes provido com um recipiente de de-sova adequado num abrigo de rede galinheira de 3 a 6 m e com 1 m de profundidade. Em ambos sistemas podem-se deixar os ovos eclodir no tanque ou estes podem ser removi-dos para eclodirem num viveiro. As fmeas produzem entre 3000 e 20 000 ovos por desova; este nmero aumenta com o aumento do peso do corpo. No caso das famlias de peixes-gato Pangasiidae e Clariidae , a mai-oria da semente obtida na natureza na forma de pequenos alevinos. Actualmente na Europa e na sia pratica-se, de forma generalizada, a desova artificial induzida para todos peixes da famlia Pangasiidae visto que os peixes no conseguem desovar de forma natural em cati-veiro, o mesmo se aplicando para algumas espcies da famlia Clarii-dae. Tanto o peixe-gato asitico como o africano podem desovar de forma natural em tanques quando se deixa de o alimentar e se aumenta o nvel de gua, mantendo-o alto. O peixe-gato africano tambm de-sova naturalmente em alguns substratos (p.ex fibras de sisal, folhas de palmeira e pedras).

    Figura 32: Papilas genitais na fmea (A) e no macho (B) do peixe-gato africano (Viveen et al., 1985)

  • Piscicultura de gua doce em pequena escala 64

    Viveiros de peixes Quando os ovos do peixe-gato-do-canal eclodem nos tanques de de-sova, recolhem-se os alevinos e transferem-se para os tanques-viveiro, para continuarem a ser criados. Nos viveiros, os ovos so chocados em recipientes simples de alumnio colocados em gua doce corrente. Desta maneira os ovos so mantidos artificialmente em movimento, de forma a se simular o que os machos fazem enquanto vigiam os ovos. O tempo de incubao dos ovos da famla de peixe-gato Ictaluridae , normalmente, de 5 a 10 dias em gua com uma temperatura de 21- 24C, enquanto que os ovos do peixe-gato da famlia Pangasiidae eclodem em 1 a 3 dias a uma temperatura de 25-28 C.

    Os ovos do peixes-gato asitico so incubados nos ninhos de desova que esto vigiados pelos machos. A incubao tem lugar dentro de 18 a 20 horas depois da desova, a uma temperatura da gua de 25-32 C. Os alevinos do peixe-gato recm eclodidos permanecem nos ninhos e so retirados para tanques-viveiro com uma rede de pesca (arrasto) aps 6 a 9 dias. Cada fmea de peixe-gato produz 2000 a 5000 alevi-nos, consoante o peso do seu corpo. Sob condies da cultura no tanque, o peixe-gato africano desova de maneira natural mas os reprodutores no demonstram qualquer cuida-do paternal para com as suas crias, da decorrendo uma taxa muito baixa de sobrevivncia e de produo de alevinos. por esta razo que a desova induzida e a produo controlada de alevinos se tornou mais comum.

    Produo de alevinos Os ovos de peixe-gato so muito pequenos, de modo que depois de eclodirem, as larvas de peixe tambm so muito pequenas. As larvas do peixe-gato-do-canal eclodem com uma vescula vitelina (ou saco vitelino) muito pequena, que contm uma reserva de alimentos para o peixe depois da incubao e antes que tenha que procurar a sua pr-pria comida. Os alevinos so criados em recipientes num viveiro at que a reserva de matria nutritiva da vescula seja completamente con-sumida e que comecem a alimentar-se das fontes de alimentos naturais

  • Escolha das espcies de peixe 65

    presentes no tanque. Isto dura mais ou menos 4 dias aps a ecloso, ocasio em que se transfere os alevinos para um tanque prprio (tan-que de alevinos).

    Os tanques de alevinos variam de tamanho; a densidade de povoamen-to dos alevinos de 50 por m da superfcie do tanque e comeam a ser fertilizados quando a profundidade do disco Secchi de entre 25 e 50 cm. A fertilizao deve ser feita acrescentando-se estrume animal (5 kg de estrume de vaca ou 3 kg de estrume de galinha/porco por 100 m2) e/ou fertilizantes artificiais (50 g de super fosfato e 100 g de ureia por 100 m2). Aps mais ou menos duas semanas depois do tanque ter sido povoado, a taxa de produo de fitoplncton e de zooplncton deixa de cobrir as necessidades de alimentao dos