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1 Aliança Global Wycliffe – Programas de Tradução da Bíblia Divulgado pelo Diretor Executivo, Kirk Franklin (1º de novembro de 2013; atualizado em fevereiro de 2015) Índice analítico Aliança Global Wycliffe -- Programas de tradução da Bíblia: Declaração de filosofia ..................1 Apêndice................................................................................................................................................................... 10 Definição dos conceitos-chave relativos à Aliança: Programas de tradução da Bíblia -- Declaração de filosofia.................................................................................................................................. 10 Os métodos/processos de tradução e a participação da igreja, por Paul K. Kimbi ..... 14 Mobilização da comunidade para participação e apropriação: A Experiência da CABTAL nos Camarões, por Michel Kenmogne ................................................................................................... 21 Algumas das melhores práticas para Parcerias do Reino em programas de tradução da Bíblia, por Sebastian Floor ........................................................................................................................... 28 Como desenvolver um impacto holístico como organização focada na tradução da Bíblia: LETRA/Paraguai como modelo nacional emergente, por Victor A. Gómez ............................. 39 Aliança Global Wycliffe -- programas de tradução da Bíblia: Declaração de filosofia Introdução O objetivo desta declaração de filosofia de programas de tradução da Bíblia é inspirar e guiar organizações participantes da Aliança Global Wycliffe (a Aliança). É uma expressão dos valores e crenças fundamentais sobre: i. A justificativa dos programas de tradução da Bíblia encontrados dentro da missão de Deus (missio Dei); ii. A importância de manter um foco em contribuir para a construção e apoio do processo de transformação holística e seu impacto no seio das comunidades linguísticas e além, e iii. Princípios fundamentais que podem orientar a resposta estratégica das organizações participantes aos variados contextos em que ocorrem os programas de tradução da Bíblia. Esta declaração de filosofia e princípios prevê o papel fundamental da orientação do Espírito Santo em todos os programas de tradução da Bíblia, pois é Deus quem permite que seja cumprida a Sua missão. A Aliança também reconhece que outras pessoas e entidades envolvidas em programas de tradução da Bíblia podem ter filosofias ou premissas distintas, que orientam o seu envolvimento.

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Aliança Global Wycliffe – Programas de Tradução da Bíblia Divulgado pelo Diretor Executivo, Kirk Franklin

(1º de novembro de 2013; atualizado em fevereiro de 2015)

Índice analítico

Aliança Global Wycliffe -- Programas de tradução da Bíblia: Declaração de filosofia ..................1

Apêndice................................................................................................................................................................... 10

Definição dos conceitos-chave relativos à Aliança: Programas de tradução da Bíblia --Declaração de filosofia .................................................................................................................................. 10

Os métodos/processos de tradução e a participação da igreja, por Paul K. Kimbi ..... 14

Mobilização da comunidade para participação e apropriação: A Experiência da CABTAL nos Camarões, por Michel Kenmogne ................................................................................................... 21

Algumas das melhores práticas para Parcerias do Reino em programas de tradução da Bíblia, por Sebastian Floor ........................................................................................................................... 28

Como desenvolver um impacto holístico como organização focada na tradução da Bíblia: LETRA/Paraguai como modelo nacional emergente, por Victor A. Gómez ............................. 39

Aliança Global Wycliffe -- programas de tradução da Bíblia: Declaração de filosofia

Introdução O objetivo desta declaração de filosofia de programas de tradução da Bíblia é inspirar e guiar organizações participantes da Aliança Global Wycliffe (a Aliança). É uma expressão dos valores e crenças fundamentais sobre: i. A justificativa dos programas de tradução da Bíblia encontrados dentro da missão de

Deus (missio Dei); ii. A importância de manter um foco em contribuir para a construção e apoio do processo

de transformação holística e seu impacto no seio das comunidades linguísticas e além, e iii. Princípios fundamentais que podem orientar a resposta estratégica das organizações

participantes aos variados contextos em que ocorrem os programas de tradução da Bíblia. Esta declaração de filosofia e princípios prevê o papel fundamental da orientação do Espírito Santo em todos os programas de tradução da Bíblia, pois é Deus quem permite que seja cumprida a Sua missão. A Aliança também reconhece que outras pessoas e entidades envolvidas em programas de tradução da Bíblia podem ter filosofias ou premissas distintas, que orientam o seu envolvimento.

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I. Justificativa para programas de tradução da Bíblia da Aliança a) Demonstrações do núcleo da Aliança Visão: Indivíduos, comunidades e nações transformadas através do amor e da Palavra de Deus expressada em suas línguas e culturas. Missão: Em comunhão com Deus e dentro da comunidade de Sua Igreja, incentivamos e facilitamos os movimentos de tradução da Bíblia que contribuem para a transformação holística de comunidades linguísticas em todo o mundo. Valores Essenciais

Afirmação Descrição

A glória de Deus entre as nações

Viver e servir para a glória de Deus, para que pessoas de todas as nações possam conhecer e glorificá-Lo.

Semelhança de Cristo na vida e na obra

Seguir o exemplo de Cristo em tudo que somos e fazemos (por exemplo, no pensamento, comportamento e ação).

A Igreja como central na missão de Deus

Acreditar que a Igreja é criada, chamada e equipada por Deus para evangelizar o mundo e discipular as nações.

A Palavra traduzida Confiar em Deus para transformar vidas através da Sua Palavra traduzida para as línguas e culturas dos povos do mundo.

Dependência de Deus Depender de Deus e de Sua suficiência para nos equipar e sustentar durante toda a vida e missão.

Parceria e serviço Servir em parceria interdependente como expressão da unidade dos crentes. Servir como comunidade através do ministério holístico que facilita a tradução, acesso e uso da Palavra de Deus.

b.) Discernimento da missão de Deus, a Igreja, e as caraterísticas essenciais do nosso Deus

Trino1 que somos chamados a refletir em nossa vida e trabalho.

1. O ministério de tradução da Bíblia é construído sobre a missão de Deus (Dt 10. 12-22; Ez 36.13-32, Rm 8.21-30, Ef 4, Jo 14.15-17).

a) A auto-revelação de Deus como Aquele que ama o mundo é fundamental para a Sua missão. O envolvimento de Deus no/com o mundo, bem como a natureza e atividade de Deus, abrangem tanto a Igreja como o mundo. Como parte da Igreja, experimentamos essa revelação em nossa vida comunitária e somos chamados a tornar-nos participantes, com Ele, da Sua missão de revelação, redenção e restauração.

b) A missão de Deus tem como objetivo resgatar toda a criação -- tentar restaurar o relacionamento mantido com ele antes da "queda".

c) Entre muitos acontecimentos históricos, destacam-se a Encarnação e Pentecostes como manifestações de que Deus pode revelar-se e que a Sua Palavra é, essencialmente, traduzível em qualquer idioma e significativo para todas as

1 Estas perspectivas foram originalmente derivadas de reflexões missiológicas entre organizações participantes da Aliança

e, posteriormente, revisadas por todos os participantes neste processo.

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culturas. A tradução da Bíblia é um dos principais métodos que Deus usa hoje em dia para se revelar em muitas culturas e comunidades linguísticas.

2. Deus chama a Igreja a participar com Ele no avanço da sua missão (Ap 7.9, At 10).

a) Entendemos que a Igreja é a comunidade de indivíduos resgatados através da fé em Jesus Cristo pela graça de Deus. Esta Igreja está unida para a participação na missão de Deus através da adoração, a comunhão e o serviço, pela inspiração e orientação do Espírito Santo. (Quando se emprega a letra inicial minúscula ["igreja"], referimo-nos às expressões locais da Igreja.)2

b) A Aliança se entende como parte da Igreja.3 c) A Aliança serve às igrejas de povos de diversas culturas e línguas.

3. Nosso Deus Trino nos chama a refletir o Seu caráter e atributos quando

participamos de Sua missão (At 2; Jo 17; Ef 3-4, 1 Co 12.12-31; Sl 133; Cl 3.1-17; Mt 25.3-46). a) A demonstração do amor de Deus pela Sua criação tem sido sempre uma

combinação de proclamar a verdade e afirmá-la através da ação. Cristo veio para compartilhar as Boas Novas, para revelar o amor do Pai através de sua vida e de sua morte. Assim também, devemos refletir o amor de Deus através da proclamação e as ações que revelam Seu amor pelos perdidos, os desfavorecidos e os marginalizados e oprimidos. Isto pode exigir a nossa própria experiência do sofrimento, injustiça ou privação.

b) A Trindade revela a relação de interdependência divina que faz parte da essência de Deus e reflete o Seu amor. Deus chama a Igreja a refletir o Seu amor, vivendo e trabalhando através de relações interdependentes, enquanto se estende com compaixão aos perdidos, alquebrados e desfavorecidos. Tal comportamento demonstra o amor de Deus por toda a Sua criação.

c) A metáfora do Corpo, usado pelo apóstolo Paulo em suas cartas, também oferece uma imagem para compreender como o amor de Deus é revelado através de inter-relações divinas; cada parte é única e essencial, mas só prospera com o apoio das outras partes. Quando uma parte resolve comportar-se de uma maneira egoísta, o Corpo inteiro sofre.

d) Ao trabalhar com relações de interdependência que demonstram que valorizamos e respeitamos os outros pelo que eles são e não apenas por causa dos recursos que eles têm ou as tarefas que podem executar, optamos por construir relacionamentos e redes em vez de trabalhar em isolamento; escolhemos a inclusão e promovemos a participação em Sua missão. Dessa maneira, buscamos refletir o Seu caráter e demonstrar amor, humildade, graça, perdão, reconciliação e paciência.

4. Seguindo o exemplo da obediência de Cristo implica na vulnerabilidade sacrificial (Fp

2.1-11; Tg 1-2; 2 Tm 2.1-13; 2 Co 6.3, 11). a) A vulnerabilidade começa com o reconhecimento da soberania de Deus em todos

os assuntos e nossa total dependência dEle. Significa, também, reconhecer a nossa

2 A igreja institucional é reconhecida como possuindo e destacando-se por uma diversidade de estilos, realidades

históricas, ensinamentos, nuanças e expressões culturais. 3 Valor fundamental da Aliança: a Igreja como central na missão de Deus.

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compreensão limitada de como Deus está agindo, cumprindo Sua missão em cada comunidade e o papel que Ele deseja que nós desempenhemos.

b) O processo de tradução da Bíblia envolve trazer a Palavra divina e eterna de Deus em linguagem humana. Embora aparentemente impossível, é na verdade a estratégia de Deus para promover a Sua missão. Por isso, apela a todos os envolvidos a dependerem de Deus neste trabalho humanamente impossível.

c) A vulnerabilidade sacrificial é o cerne da encarnação, conforme ela se revela no nascimento, na vida e na morte de Cristo na cruz. Quando Deus Filho se tornou um ser humano, Ele se submeteu voluntariamente ao Seu Pai. Através da encarnação Deus revelou a graça do Seu amor por nós. Nunca poderíamos compreender plenamente o Seu amor sem a morte sacrificial de Seu Filho.

d) Da mesma forma, o sofrimento e as dificuldades devem ser esperados como nós, e o resto da Igreja, participamos da missão de Deus. Desta forma, somos um modelo da imagem de nosso bondoso Pai Celestial. Deus não poupa os crentes do sofrimento causado neste mundo por guerras, fome, perseguição e injustiça, mas ele promete dar-lhes a força necessária para resistir e persistir.

e) Um dos dons de Deus para proporcionar conforto e segurança é o corpo de crentes, a Igreja.

5. A missão de Deus é holística e integral. Ele deseja a mudança transformadora (Os 2.

14-23; Mt 4, 11, 28; Tg 1; Cl 3.23). a) A obra de Deus no mundo, a missio Dei, tem a ver com a criação e manutenção de

shalom. Shalom não é apenas a ausência de hostilidade, mas "a paz com justiça". É uma paz holística que considera todos os nossos relacionamentos em quatro níveis: com Deus, com a criação, com outras pessoas e com nós mesmos. Significa ter prazer em servir a Deus, deliciar-nos com nosso ambiente físico, deliciar-nos com a comunidade humana e com o que significa ser um filho de Deus.

b) Por “integral”, queremos dizer que são essenciais tanto “a proclamação como a demonstração do Evangelho".4 Isso enfatiza a necessidade de integrar a diversidade de atividades ministeriais que contribuem para o trabalho de transformação holística de Deus.

c) A amplitude e profundidade das mudanças necessárias para a transformação holística exigirão perseverança por um longo tempo, até mesmo gerações.

6. A missão de Deus é abençoar as comunidades e aqueles que as servem (Tg 2, 2 Pe

3.9, 1 Tm 2.4, Ap 7.9, Rm 5.1-5; Fp 4.10, 2 Co 8 e 9, At 11). a) Deus dá aos seres humanos línguas e lhes permite formar culturas que os ajudam

a compreender a sua identidade e formar comunidades. A comunidade é um conjunto de indivíduos conscientes de um importante elo que os une, fornecendo-lhes um senso de identidade e permitindo que eles dependam uns dos outros.

b) A amorosa solicitude de Deus toca a cada indivíduo, mas é na comunidade da Igreja que pode ocorrer a mais completa experiência do amor de Deus. Da mesma forma, como as comunidades linguísticas experimentam a transformação holística que a missão de Deus consegue para elas, vão experimentar e refletir mais completamente o amor de Deus, tanto individual como coletivamente.

4Diretrizes da Parceria Rede Miqueias - dezembro de 2005.

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c) Por ser alimentada a "apropriação" através da participação da comunidade e por Deus ter dado valiosas qualidades a todas as pessoas, é importante reconhecer isso e encontrar formas de incentivar a ampla participação em programas de tradução da Bíblia. A propriedade/apropriação é um componente crítico para a sustentabilidade. Assim como Deus convida a Igreja a participar de Sua missão para que ela possa crescer até atingir a maturidade através da participação, Deus deseja que as comunidades participem da sua própria transformação. Um componente fundamental para alcançar a sustentabilidade da mudança a longo prazo é a realização de programas de tradução da Bíblia, de modo que a propriedade das metas e do processo se estabeleça na comunidade.

d) É importante que os programas de tradução da Bíblia reconheçam os desfavorecidos e excluídos e tomem a iniciativa de trazê-los para a vida da comunidade.

e) Para aqueles de fora da comunidade, uma das grandes bênçãos é a transformação do seu relacionamento com a comunidade; entrar como convidados e trabalhar como colaboradores lhes permitirá sair como amigos.

f) Deus também abençoa aqueles que servem, por edificar sua fé e moldar seu caráter através de desafios e dificuldades. Ele demonstra Sua fidelidade, trazendo alegria e o fruto do Espírito para aqueles que trabalham em formas que O honram. Ele também mostra o Seu amor, deixando que aqueles que servem compartilhem o Seu coração, enquanto a comunidade responde, ou não, às manifestações de Seu amor.

II. O impacto transformacional que Deus deseja para as comunidades linguísticas guia e forma os programas de tradução da Bíblia (Cl 3.9-17) a) Deus deseja ver as comunidades transformadas, conciliadas as relações entre as pessoas

e Ele mesmo, uns com os outros e com a Sua criação, para que eles possam experimentar a plenitude (shalom) que Ele lhes destina através de Cristo. Isto, sim, traz-Lhe glória. A transformação é um processo que ocorre continuamente, e que continuará por toda a vida do crente.

b) Deus deseja a transformação de todas as comunidades linguísticas. Ele realiza sua missão através da participação coletiva de muitas organizações e o contínuo engajamento significativo das comunidades. A participação envolve os indivíduos, mas também as organizações e instituições locais, especialmente as igrejas.

c) A tradução da Bíblia é uma atividade fundamental que Deus usa para promover a transformação holística. Os programas de tradução da Bíblia, em seu núcleo, possibilitam o processo de "habitação" da Palavra de Deus numa língua, e no coração e mente de seus falantes. Assim, esses falantes são mais capazes de participar e viver em comunhão e harmonia da comunidade do Deus Uno e Trino.

d) É razoável, então, que os programas de tradução da Bíblia sejam planejados e implementados de modo que contribuam não só à tradução das Escrituras e o desenvolvimento da linguagem, mas também para a construção de uma base sustentável de Deus para o Seu trabalho em curso de transformação.

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III. Princípios fundamentais para programas de tradução da Bíblia da Aliança

1. O ministério de tradução da Bíblia é construído sobre a missão de Deus

Princípio: Uma vez que a missão começa com Deus, uma resposta inicial deve ser de procurar conformar a nossa vontade com a Sua vontade através da oração e súplica, por parte da Igreja e aqueles que desejam se engajar num programa de tradução da Bíblia. a) Ao ouvirmos a Deus, também vamos ouvir a comunidade e outros parceiros para que

o início do programa, a relação de desenvolvimento, planejamento e implementação possa progredir em resposta à inspiração de Seu Espírito. Promover externamente uma estratégia pré-determinada mina tal objetivo.

b) A obra de Deus acontece no tempo de Deus e a transformação holística de qualquer comunidade será um processo em curso. O modelo interdependente de trabalho do Reino (alguns semeiam, outros regam, alguns cuidam, outros colhem) exige a construção de uma sólida base relacional para o progresso sustentável a longo prazo.

c) Embora a participação ideal de todos os parceiros em potencial não seja possível deste lado da eternidade, Deus é honrado quando é praticada e alcançada a participação verdadeiramente interdependente.

2. Deus chama a Igreja a participar com Ele no avanço da sua missão

Princípio: O contexto presente e futuro da Igreja é um fator crítico para orientar o planejamento e implementação de todos os programas de tradução da Bíblia.

a) A realização do impacto transformacional é criticamente dependente do

envolvimento ativo da igreja em programas de tradução da Bíblia. b) Procuramos servir à Igreja universal e à igreja que existe no contexto do programa de

tradução da Bíblia. Espera-se que as igrejas vão desempenhar o mais cedo possível um papel importante na tomada de decisões, obtenção de recursos e processos de controle da qualidade dos programas de tradução da Bíblia.

c) Embora os programas possam começar com limitadas funções da igreja, a ampliação dessa participação deve ser uma prioridade contínua até ocorrer um envolvimento significativo . Além disso, por ser segmentada a realidade da Igreja em determinado contexto, a tradução da Bíblia deve ser desenvolvida como um meio estratégico, e não ameaçador, de promover a unidade entre as igrejas relevantes.

d) Uma vez que uma igreja local pode não estar presente em alguns contextos, a Igreja universal está presente em todas as comunidades linguísticas através da oração e de outras intercessões. Um esforço para apoiar o desenvolvimento de uma presença da igreja local deve sempre fazer parte das considerações a longo prazo de um programa de tradução da Bíblia. Neste sentido, será importante construir relacionamentos com a Igreja ao nível nacional ou além, e posicionar os programas de tradução da Bíblia dentro desses relacionamentos. Assim, a tradução da Bíblia poderia desempenhar um papel pioneiro de promover a divulgação da Igreja em novas áreas.

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3. Nosso Deus Trino nos chama para refletir o Seu caráter e atributos quando participamos de sua missão

Princípio: Construir a base necessária de relações interdependentes entre os programas de tradução da Bíblia para contribuir para a transformação exige que as organizações da Aliança modelem o caráter de Deus.

a) Espera-se que uma grande variedade de pessoas e organizações acabem por se

envolver em programas de tradução da Bíblia, que busquem a transformação holística -- a comunidade, as igrejas, as organizações parceiras, as entidades seculares e o governo.

b) Construir e manter relacionamentos do Reino entre os parceiros deve ser um valor fundamental para as organizações participantes da Aliança porque o comportamento da Aliança, que reflete a Trindade, reforça a mensagem da Palavra e desafia quaisquer esforços de separar os parceiros e trabalhar separadamente. As organizações participantes da Aliança são chamadas a ser agentes de reconciliação e restauração.

Princípio: O crescimento e amadurecimento são reforçados através da humilde recepção e consequente ação, de acordo com o feedback [reações/sugestões] das pessoas com quem se tem relacionamento.

a) É através de processos de aprendizagem intencionais e transparentes que as

organizações participantes da Aliança conseguem demonstrar o seu compromisso de melhorar continuamente a forma como elas refletem a imagem e o carácter de Deus enquanto participam da implementação de programas de tradução da Bíblia.

b) Trabalhar desde dentro dos relacionamentos é um dom e um desafio. As relações do Reino exigem um compromisso contínuo; portanto as estratégias do programa de tradução da Bíblia devem equilibrar essa necessidade quando desafiada por prazos específicos do programa.

4. Seguir o exemplo da obediência de Cristo implica na vulnerabilidade sacrificial

Princípio: Para os programas de tradução da Bíblia se alinharem com a missão de Deus, é necessária a unidade espiritual entre os parceiros cristãos. A formação e manutenção desta unidade é a maior prioridade para os envolvidos.

a) Todas as culturas têm apenas uma compreensão parcial do que significa viver e

trabalhar de maneira vulnerável, confiando em Deus para a colheita. Sem unidade espiritual, construída por meio de relações vulneráveis, aqueles que se envolvem em programas de tradução da Bíblia terão uma compreensão ainda mais limitada de como Deus está agindo em seu contexto. Compartilhar e criar uma compreensão mais abrangente de como Deus está presente e ativo é fundamental para cada programa de tradução da Bíblia.

b) O exemplo de como os parceiros cristãos colaboram e tratam uns aos outros revela poderosamente o amor de Deus para a comunidade linguística e todos os demais interessados. A capacidade de trabalhar em comunidade é um dos dons de Deus para

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aqueles que participam de Sua missão. Mas isso requer a intencionalidade de realizar essa unidade. São necessários tempo e recursos, bem como indicadores de avaliação bem pensados para produzir planos de trabalho de colaboração e atividades frutíferas. É necessário um processo fundamental de construção de relacionamentos antes de se começar o planejamento e implementação do programa.

c) Os processos de tomada de decisões precisam incluir a reflexão intencional, o discernimento e uma ampla participação para que a voz de Deus seja mais facilmente entendida e a unidade de direção estabelecida.

Princípio: Reconhecer e responder à soberania de Deus requer a procura de como Deus está agindo quando os planos, cronogramas e outros objetivos não forem alcançados ou quando os recursos não estiverem disponíveis.

a) Enquanto o planejamento, metas e gerenciamento atribuem muito valor aos

projetos, Deus procura muito mais do que rendimento na Sua missão. Ao invés de julgar o grau de sucesso pela realização dos planos, é importante buscar a compreensão daquilo que Deus está fazendo quando os nossos planos não dão certo. O discernimento do propósito de Deus e Sua atividade deve informar não apenas as avaliações feitas, como também a forma do planos futuros.

b) Muitas vezes, a perturbação causada pela perda de um recurso crítico do programa (pessoas, dinheiro, permissões, etc.) pode ser um lembrete para olharmos para a maneira como Deus está agindo, e pode ajudar a revelar como Deus está oferecendo conforto no meio das dificuldades decorrentes da ruptura.

c) A dependência de Deus, mantendo em foco a fé e a confiança, é um elemento crítico para o planejamento.

Princípio: Por ser essencial o bem-estar de cada membro da comunidade que trabalha num programa de tradução da Bíblia, correr riscos físicos deve ser uma decisão em comum, ao invés de individualmente. A vulnerabilidade e a obediência permitem que o Espírito atue através de muitos canais, inclusive a unidade da comunidade.

a) Historicamente, o poder e o prestígio dos países "enviadores" acompanhavam os

missionários. Neste contexto, a tomada de decisões não costumava ser compartilhada com os anfitriões/participantes. Mas os programas de tradução da Bíblia, que buscam a transformação, são construídos nas comunidades de participantes, não sobre o trabalho de um indivíduo. O progresso sustentável exigirá redes de pessoas, instituições e organizações comprometidas a cooperar umas com as outras, reconhecendo sua vulnerabilidade através do trabalho interdependente, não auto-suficiente.

b) O conjunto de forças que resistem aos programas de tradução da Bíblia é grande, poderoso e capaz de causar grande dano aos crentes e as pessoas envolvidas. Mesmo sendo Deus mais forte, Ele opta por manifestar Sua força através da comunidade dos crentes que trabalham juntos. Portanto, cada participante deve encontrar a sua força em Deus e na comunidade dos crentes, não em qualquer outro sistema ou poder fora deste.

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5. A missão de Deus é holística e integral. Deus deseja a mudança transformadora Princípio: A mudança transformadora requer um compromisso de expansão e aprofundamento por parte de todos os envolvidos.

a) Um ampla coalizão, que compartilha uma visão e um compromisso, é fundamental

para a criação de processos sustentáveis que servirão à comunidade ao longo do tempo.

b) Os provedores de recursos externos também devem adotar uma visão abrangente com relação aos programas de tradução da Bíblia, de modo que não incentivem involuntariamente atividades insustentáveis através da maneira como apoiam aspectos específicos que mais lhes interessam.

c) Atuando em prol de uma maior interdependência, o aumento da capacidade e desenvolvimento de processos sustentáveis, a comunidade irá aumentar o potencial da comunidade para um maior envolvimento e sucesso a longo prazo.

d) Embora muitas organizações diferentes façam as suas contribuições, a transformação é um processo em curso, portanto é fundamental que sejam formadas redes, parcerias e alianças fortes, patrocinadas por interessados locais, que possam crescer em eficácia ao longo do tempo.

6. A missão de Deus é abençoar as comunidades e aqueles que as servem

Princípio: As línguas, culturas, identidades e a consciência de comunidade são dons concedidos por Deus e destinados a abençoar os seres humanos.

a) A missão de Deus é feita com e para as pessoas e comunidades. Todos aqueles de

fora da comunidade, que têm uma parceria ou trabalham em conjunto, devem respeitar a comunidade e agir de forma a manter ou melhorar a sua dignidade.

b) Para aqueles de fora da comunidade, uma das grandes bênçãos é a transformação do seu relacionamento com a comunidade; entrar como convidados e trabalhar como colegas lhes permitirá sair como amigos.

c) Para os programas de tradução da Bíblia refletirem as preocupações locais, as comunidades, pessoas e instituições devem participar da tomada de decisões com os parceiros externos, conscientes de sua responsabilidade definitiva no setor da hospitalidade. As relações de poder devem ser monitoradas para que não diminuam a sustentabilidade.

d) As organizações externas, como parceiros de recursos, precisam ter um compromisso de trabalhar com a comunidade para promover um saudável senso de propriedade e crescimento em sua capacidade e habilidade para orientar o processo de transformação local. Isso afirma o chamado para relações de interdependência e uma consciência de comunidade dentro da missio Dei, e não para a auto-suficiência.

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APÊNDICE Nota: Os apêndices a seguir são oferecidos como recurso para gerar comentários sobre a Declaração. Eles incluem exemplos de como elementos da Declaração estão influenciando várias Organizações da Aliança.

Definição dos conceitos-chave relativos à Aliança: Programas de tradução da Bíblia -- Declaração de filosofia

As definições contidas neste documento são destinadas a ajudar o leitor da Declaração de filosofia de tradução da Bíblia da Aliança Global Wycliffe a compreender o significado por trás dos conceitos-chave. Mesmo não sendo definições “padronizadas”, elas representam o entendimento e acordo entre os envolvidos no desenvolvimento da declaração atual. A missio Dei A missio Dei, ou “missão de Deus”, se entende como abrangendo quatro ideias-chave. Em primeiro lugar, o seu objetivo final é estabelecer o domínio de Cristo sobre toda a criação redimida. Em segundo lugar, a Igreja -- o Corpo de Cristo -- é instituída por Cristo, mas realizada concretamente pela obra do Espírito Santo. Em terceiro lugar, a Igreja na sua formação e vida destina-se a ser o reflexo da relação de interdependência e comunhão que constitui a essência do Deus Trino. E em quarto lugar, Deus é o dono, o iniciador e o principal agente da missio Dei, mas a Igreja existe para servir e participar. Através desse serviço obediente, a Igreja deve ser um reflexo da comunidade de amor que existe no Deus Uno e Trino. Programa de tradução da Bíblia Um programa de tradução da Bíblia é interpretado como uma série de atividades que apresentam as Escrituras em outras línguas como âncora para o desenvolvimento da língua, educação multilíngue, alfabetização e engajamento com as Escrituras. Isto é feito a fim de promover o reinado de Cristo entre as comunidades receptoras. Tradução da Bíblia A tradução da Bíblia é o processo de “habitação” da Palavra de Deus numa língua para que os falantes dessa língua possam participar e viver na comunhão e harmonia da comunidade de crentes cristãos aqui na terra, e com todos os fiéis na eternidade. Esta “habitação” é consequência das muitas maneiras em que Deus se revela, incluindo principalmente a Sua Palavra, mas também através da vida e testemunho dos crentes, especialmente aqueles imediatamente relacionados com uma comunidade linguística. Movimento de tradução da Bíblia O movimento de tradução da Bíblia abrange todos aqueles que participam da missão de Deus, contribuindo para as metas amplamente definidas de tradução das Escrituras. É uma comunidade de organizações, igrejas e indivíduos com interesses e atividades em comum , e não uma única entidade organizada ou estruturada.

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Shalom O termo shalom aponta para a totalidade, através da justiça e da verdade, que inspira confiança naquilo que se espera (Ag 2.7-9, Is 2.2-4; 11.1-9). Há uma sensação de completude, tanto em termos de restauração (perdão), paz, segurança, bem-estar e reconciliação com Deus e com o próximo. Entendemos esta totalidade como incluindo cada parte da criação e todos os aspectos da atividade e da vida humana (Rm 14.17; 8.6). O Shalom também tem complexidade, uma vez que representa o estado da criação após cumprir-se a missão de Deus , mas também algo que pode ser experimentado parcialmente agora mesmo na vida da comunidade de crentes e algo que a comunidade de crentes pode trazer para a mundo através de ações feitas em obediência à orientação do Espírito Santo. Assim, o conceito de shalom vai muito além da paz interpretada como ausência de guerra, para significar um estado onde tudo está funcionando da maneira que o Criador ordenou. Programa linguístico Um programa linguístico é um processo intencional de planejamento e organização, que tem como objetivo o desenvolvimento da língua e serviço dos objetivos das comunidades que falam as respectivas línguas. Nota: Esta definição é oferecida com uma ressalva: A frase “Programa linguístico”, em nossas conversas internas, é praticamente definida pela SIL Internacional como incluindo os programas que seguem os três objetivos da SIL. A fim de promover a noção de que a Aliança não está desenvolvendo uma filosofia sobre os programas linguísticos da SIL, temos a intenção de usar a frase "programa de tradução da Bíblia" para referir-nos ao envolvimento total da Aliança. Esta abordagem proporciona à SIL e à Aliança duas perspectivas complementares a partir das quais elas se aproximam do trabalho no campo, permitindo a imbricação e oferecendo oportunidades para uma colaboração eficaz. A Igreja A Igreja em sua essência é a expressão coletiva de indivíduos resgatados pela graça de Deus através de Jesus Cristo, unidos por sua adoração, comunhão e missão pelo poder do Espírito Santo. A expressão institucional da Igreja é reconhecida como possuindo e destacando-se por uma diversidade de teologias, estilos, realidades históricas, ensinamentos, nuanças e expressões culturais. Por si só, a Igreja não é o Reino. Ao contrário, é a comunidade na qual os sinais do Reino se tornam mais claramente evidentes. É também, como principal instrumento de Deus para Sua missão, a comunidade messiânica ao serviço e testemunho do Reino. Ela é a comunidade encarregada de continuar a missão messiânica no mesmo Espírito e estratégia que caracterizam a missão de Jesus. Facilitação A facilitação do programa de tradução da Bíblia consiste na assistência prática, oferecida sem intenção de controlar, a fim de permitir que todos os participantes possam fazer a sua contribuição adequada para o progresso do programa de tradução da Bíblia, especialmente através da participação na tomada de decisões sobre todos os aspectos do programa de tradução da Bíblia.

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Participação A participação no programa de tradução da Bíblia refere-se à contribuição que os diversos indivíduos e agências fazem num programa de tradução da Bíblia. As abordagens participativas refletem uma mentalidade e uma variedade de ferramentas que ajudam aqueles que serão influenciados pelo programa de tradução da Bíblia a desempenharem um papel eficaz na tomada de decisões e outras contribuições a essas atividades.

Propriedade A propriedade/posse, ou “apropriação”, do programa de tradução da Bíblia se reflete na capacidade da comunidade e igrejas receptoras de atuarem como promotores do programa, participando da formação da visão, a tomada de decisões e a formulação de metas, não só do programa de tradução da Bíblia, mas também do impacto da transformação mais ampla que se almeja.

A missão integral/holística A "proclamação e a demonstração do Evangelho" são componentes inseparáveis da promoção de um compromisso transformador com Jesus Cristo e o Evangelho. A palavra "integral" é usada como reconhecimento da diversidade e variedade de aspectos do ministério e expressões essenciais que devem ser integrados para o ministério holístico que glorifica a Deus e compartilha a verdade e o amor de Deus com todos os povos. Isto segue o exemplo de Cristo a serviço de todas as pessoas. Reconhecendo que todas as pessoas têm necessidades físicas, espirituais e emocionais, a missão integral/holística deseja ver as pessoas e comunidades sadias e íntegras à medida que se vive o Evangelho total em todas as facetas da vida.

Transformação O resultado final dos processos através dos quais Deus restaura (reconcilia) as relações entre os seres humanos e Ele mesmo, de uns com os outros e com toda a Sua criação, para que possam experimentar a plenitude (shalom) que Ele destina para eles por meio de Cristo e, assim, trazer glória a Si mesmo. A transformação é um processo que ocorre continuamente, e que continuará por toda a vida do crente.

Comunidade Uma comunidade é um grupo de indivíduos ou organizações conscientes de uma importante ligação que os une, proporcionando assim o seu sentido de identidade e fazendo com que eles dependam uns dos outros. As caraterísticas de uma comunidade de crentes são demonstradas dentro da Trindade e expressadas em Romanos 12, 1 Coríntios 13, Tiago e 1 João. Tal comunidade do Reino é essencial nos programas eficazes de tradução da Bíblia.

Sustentabilidade A sustentabilidade é a capacidade de continuar a cumprir por muito tempo os propósitos designados. Por exemplo, a igreja institucional continuou por dois milênios; no entanto, as suas caraterísticas têm variado muito ao longo desse período. Ao invés de ser um elemento precisamente definido de um programa, ela é na verdade um "resultado" de (1) seguir as metas holísticas do programa e (2) escolher cuidadosamente o processo pelo qual o

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programa é nutrido e vivificado. O impacto sustentado depende de se as organizações (p.ex., a igreja, o governo, a própria comunidade) se tornam viáveis e desenvolvem continuamente o compromisso, responsabilidade, capacidade e propriedade/apropriação da tradução da Bíblia e de outros programas de desenvolvimento no futuro.

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Métodos e processos de tradução e a participação da igreja Paul K. Kimbi (CABTAL)

Introdução "Tradução da Bíblia" é um termo usado frequentemente para se referir à ampla gama de atividades que resultam na tradução de um texto bíblico e o uso das Escrituras nas comunidades em que essas atividades são realizadas. O objetivo final da tradução da Bíblia é ver as pessoas e suas culturas transformadas pelo amor de Cristo através da Palavra de Deus para Sua glória. Cristo convidou a Igreja a participar com Ele da Sua missão redentora de transformação e restauração (Mateus 28.19). Isto dá a entender que os projetos de tradução devem ser organizados de forma a promover a participação ativa da igreja nessas comunidades. Como pode a igreja, portanto, ser mais envolvida nos processos de tradução da Bíblia? Esta questão pressupõe que a participação da igreja não seja ideal, ou que tenha sido até fraca em muitas áreas. Uma resposta a esta questão é o foco principal deste artigo. Por que a Igreja em algumas áreas não toma responsabilidade pela tradução da Bíblia?

"A Igreja do hemisfério sul tem estado na vanguarda da missão por um bom tempo. Mas seu foco tem sido mais sobre plantação de igrejas que na tradução da Bíblia. Uma razão para isso é a sua percepção daquilo que se envolve no processo de tradução. Muitos plantadores de igrejas veem a tradução como uma tarefa teórica e científica que leva muitos anos para se completar. Eles também a consideram como sendo o trabalho de linguístas e estudiosos estrangeiros da linguagem bíblica". (5Gravelle Gilles)

Em sua declaração, Gravelle fornece alguns elementos da resposta para a pergunta acima. Há uma necessidade de interrogar este ponto de vista e ver até que ponto as organizações de tradução da Bíblia e da Igreja têm ajudado mutuamente uma à outra para iniciar projetos de tradução das Escrituras. Outras razões que tendem a limitar o envolvimento da Igreja em atividades de tradução da Bíblia incluem: 1) a falta de compartilhamento de visão adequada sobre as necessidades de tradução com as igrejas antes do início da tradução em muitas comunidades; 2) a tendência de trabalhar com alguns membros da elite da comunidade, cujos membros podem não ser fortes cristãos naquela comunidade, o qual enfraquece a contribuição da igreja na comunidade; 3) as organizações de tradução muitas vezes não tratam adequadamente a questão da propriedade/apropriação dos projetos no início do trabalho de tradução -- a influência das organizações de tradução tende a ser mais exigente do que descritiva, manifestando-se sob forma de orientação; 4) as organizações de tradução, por vezes, tendem a enfatizar exageradamente os requisitos acadêmicos necessários para a tradução e, assim, desviar a atenção dos crentes de outros tipos de contribuições que a igreja pode fazer; 5) algumas organizações de tradução tendem a se concentrar quase que exclusivamente na publicação do texto escrito, sem abordar adequadamente a questão de um formato adequado em que a tradução será usada, e sem aumentar a capacidade da igreja para o uso das Escrituras.

5 Tradução da Bíblia no contexto histórico: Evolução dos papéis dos obreiros transculturais (rascunho, Arlington TX). (inglês)

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Muitas outras razões podem ser consideradas para a aparente falta de interesse por parte da Igreja em atividades de tradução da Bíblia, mas o objetivo deste trabalho é analisar as práticas dentro das organizações de tradução que tendem a desencorajar o envolvimento da Igreja e sugerir procedimentos que podem integrar mais envolvimento da igreja na tradução da Bíblia. O desafio transcultural na tradução, e a necessidade de uma declaração de propósito num determinado projeto de tradução O objetivo da equipe de tradução é traduzir com precisão e de forma adequada o significado da mensagem original. Mas cada língua tem a sua própria forma única, o seu próprio sistema léxico, a sua própria estrutura gramatical e seu próprio contexto sócio-cultural. Portanto, a fim de comunicar o significado exato e equivalente, a forma da tradução na língua receptora, por vezes, deve ser distinta da forma da mensagem de origem. A “delimitação cultural"6 de palavras e as diferenças nos padrões tácitos de visões conflitantes do mundo é um desafio persistente para os tradutores. Tomemos, por exemplo, o caso da "mulher" em João 2.4. Na língua grego, esta palavra pode significar: mulher, esposa, e uma menina. Na área de Kom nos Camarões, uma pessoa não deve referir-se diretamente à sua mãe como "mulher". Tal referência direta à mãe como "mulher" daria a entender, neste caso, que Jesus se mostrava indelicado ou rude para com a sua mãe. O significado associativo em grego prefere sugerir que esta era uma maneira bem educada de falar. Isto coloca o problema do jogo e incompatibilidade no uso de determinadas palavras e frases na tradução. Os idiomas utilizados na cultura de origem podem ser difíceis de entender e podem ser interpretados literalmente. Quando interpretados literalmente, eles podem comunicar um significado oposto na cosmovisão receptora. A "delimitação cultural” das palavras e as diferenças nos padrões tácitos de visões conflitantes do mundo exigem uma elaboração da filosofia de tradução para ajudar a esclarecer as circunstâncias atenuantes que informam certas escolhas na tradução. Todo texto-fonte é codificado numa fonte cultural, ou seja, quando eu leio a Bíblia em inglês, é o idioma inglês que interage com a mensagem para induzir a compreensão do significado do que tenho lido. Para uma tradução ser relevante e atender à necessidade de se comunicar de forma precisa e eficaz com os seus destinatários, a tradução deve permanecer fiel ao texto de origem e ser também natural na língua receptora. Isso significa que eu deveria ser capaz de usar expressões idiomáticas Kom ou equivalentes Kom de expressões idiomáticas gregas ou hebraicas para me dirigir a um público Kom, a fim de permanecer inteligível, acessível e atraente para este público. Mas, ao mesmo tempo que procuro ser natural, eu também devo procurar processar com precisão o significado do texto original. "Não seria de esperar, portanto, que a simples transcodificação ou transposição [de palavras] ... em outro idioma fosse resultar numa Translatuum útil".7 A transposição de palavras pode vir a ser valiosa para uma tradução específica, mas esse fato deve ser definido desde o início pelas principais partes interessadas. E a igreja local deve desempenhar um papel importante, sendo ela o principal cliente da tradução. Em outras

6 Lowen, Jacob A. de (The Bible Translator Vol 15, No. 4 (outubro de 1964): 189-194).

7 Vermeer, HJ (2012: 192). O termo Translatuum utilizado pelo autor refere-se ao produto final da atividade de tradução ou

seja, a tradução no formato em que foi traduzida. Este pode ser o texto traduzido ou uma versão em áudio do texto, etc.

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palavras, qualquer decisão sobre o tipo de tradução necessário em determinada região deve envolver a igreja para determinar o que é que vai atender melhor às suas necessidades. A igreja como principal interessado numa tradução relevante A maioria das traduções é realizada para fortalecer a igreja em determinadas comunidades. No entanto, por vezes não é muito claro como a expectativa da igreja será realizada e como são determinadas suas necessidades. Compreender a situação contextual da igreja ajudará a determinar o gênio (ethos) da tradução. A relação entre o texto original e o texto-alvo, por exemplo, precisa ser definida em termos do objetivo da tradução como determinado pelas necessidades e o contexto da igreja. A tradução deveria ser descrita como literal, bastante literal, baseada no significado ou estritamente baseada no significado? A resposta a esta pergunta vai ajudar os tradutores a determinar quanta informação implícita precisa ser explicitada. Mas a resposta para a pergunta também depende da taxa de alfabetização da população e o grau de evangelização da área. Quando tomamos o exemplo de traduções e paráfrases, seria útil saber que a versão Boas Novas em inglês (equivalente da Nova Tradução na Linguagem de Hoje em português) se destinava a um público que falava inglês como segunda língua, de modo que a versão Boas Novas foi escrita usando um vocabulário algo limitado. A Bíblia Viva tinha como público-alvo uma determinada faixa etária, qual seja, as crianças. Em outras palavras, há muitos fatores atenuantes que podem influenciar o estilo particular de um determinado projeto de tradução. Esses fatores precisam ser analisados com a igreja da área, que é a principal beneficiária de um projeto de tradução. Em outras palavras, o uso das Escrituras depende da Igreja, e o grau de utilização depende da participação da Igreja nas decisões relativas à tradução. É preciso haver uma declaração de propósito para cada projeto de tradução e isso precisa ser desenvolvido com a igreja/comunidade antes de se iniciar a tradução. Isto é o que tem sido chamado de teoria skopos8 na tradução. O skopos é o objetivo previsto para uma determinada tradução, numa certa comunidade, que irá influenciar as decisões relativas à tradução. Em segundo lugar, traduzir termos-chave de uma forma diferente daquela que a igreja já adotou, sem a participação da igreja na criação de termos novos e mais precisos, cria um conflito de entendimento. Termos-chave como salvação, fé, graça e redenção já estão muitas vezes em uso na igreja local e, por vezes, precisam de uma tradução mais precisa. Em algumas áreas, a "Oração dominical [do SENHOR]" é traduzida de uma forma distinta daquela que a igreja já pratica, mas não se explica à igreja por que a nova tradução é considerada melhor. O envolvimento da igreja no processo pode exigir a concessão de oportunidade para os teólogos locais participarem da tradução. Desejo citar agora um exemplo de tal reflexão que a CABTAL9 pratica na sua parceria com um seminário nos Camarões, o Seminário Teológico Batista dos Camarões (CBTS). A CABTAL projetou e está executando um curso de verão chamado “Equipando líderes rurais da Igreja”. O objetivo do curso é duplo: (1) ensinar líderes de igrejas locais e pastores que não têm muita formação acadêmica ou teológica a se tornarem capazes de usar a tradução e também (2) ampliar sua capacidade de reflexão sobre os desafios teológicos

8 Vermeer, Hans J 2012. Skopos e comissões na ação de tradução. Em Cartilha de estudos de tradução (3 ª ed) Londres:

Routledge. 9 Associação de Tradução e Alfabetização Bíblica em Camarões.

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enfrentados pela igreja nos Camarões . Nesse sentido, o curso destaca questões na Religião Tradicional Africano, discipulado, evangelismo e estudos bíblicos participativos nas Escrituras na língua materna. No processo, os professores do seminário são convidados a co-ministrar o curso com o pessoal da CABTAL e também para incentivar os alunos durante o ano escolar normal a embarcarem em reflexões acerca das Escrituras na língua materna. A igreja só pode ministrar o evangelho de forma eficaz se for equipada a reflexionar de forma teológica. As organizações de tradução podem criar plataformas de reflexão através de oficinas, como aquelas voltadas para a tradução de termos-chave. Uma maneira de fazer isso é envolver os teólogos da Igreja nestas oficinas. Em terceiro lugar, a tradução da Bíblia leva um tempo relativamente longo. Às vezes as pessoas se cansam no processo. A visão precisa ser compartilhada durante todo o ciclo de vida de um projeto. Os pastores são frequentemente muito influentes nas comunidades onde servem. A visão da tradução da Bíblia pode, quando compartilhada do púlpito, causar um impacto maior do que se fosse compartilhada do banco ou do lado de fora da igreja. Compartilhar a visão do púlpito garante aos tradutores que as Escrituras serão utilizadas. Isso cria a necessidade de trabalhar em estreita colaboração com os pastores e líderes das igrejas numa determinada área. Na CABTAL, criamos o programa "Domingos de tradução da Bíblia", em parceria com algumas igrejas locais; visitamos as igrejas pelo menos uma vez por ano, compartilhamos informação sobre o que fazemos e comunicamos à igreja nossos pedidos de oração, motivando assim a igreja a dar apoio ao ministério de tradução da Bíblia. Também criamos um programa de treinamento anual para os nossos Comitês Inter-Igreja (ICC). Os ICCs supervisionam os projetos de tradução e “possuem” (“se apropriam”) (d)os projetos. A capacidade dos ICCs precisa ser firmada antes e durante o projeto de tradução pela organização de tradução, preparando a igreja para tomar posse e usar plenamente as Escrituras traduzidas. A Comissão de Tradução 10 e os processos de tradução É necessário que um projeto de tradução tenha uma "comissão de tradução." A "comissão de tradução" destaca a declaração de propósito de um projeto de tradução e do contexto em que a tradução será feita. O contexto de um projecto de tradução afina os métodos a serem adotados no projeto, a fim de dar à tradução sua particularidade e credibilidade. A credibilidade é bidirecional, ou seja, a expectativa popular sobre a natureza da tradução deve ser respeitada (em termos de precisão) e, ao mesmo tempo, a tradução deve ser percebida como sendo natural na língua em que foi feita. Seria difícil medir a credibilidade de uma tradução, se o projeto não tivesse elaborado uma declaração de propósito. Julgar uma tradução literal demasiado, por exemplo, significa ao mesmo tempo que essa tradução não articula naturalmente sua mensagem na língua receptora. Por outro lado, julgar uma tradução demasiado livre também levanta preocupações sobre o grau de precisão da tradução do original. Mas diversas pessoas de diferentes pontos de vista bem podem fazer tais julgamentos errôneos, a menos que aprendam alguns critérios que definem claramente as normas segundo as quais deve ser julgada uma tradução. Estes critérios devem ser explicitados pela comissão de tradução. A comissão de tradução precisa tratar questões sobre:

10 O termo é usado em Teoria Skopos para se referir aos fatores orientadores considerados objetivos de um projeto de tradução. O termo é usado de uma forma sinónima à expressão "resumo de tradução".

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1. O skopos (declaração de propósito) articulando os resultados desejados 2. Quem é que vai se envolver num determinado projeto, ou seja, quem são os principais

interessados? 3. Quem é que vai usar a tradução? A tradução é um projeto inter-confessional, ou foi feita

por uma igreja em particular? Quais são as bases dessa cooperação inter-confessional? 4. Qual será o formato da tradução e em qual variante dialetal será publicado o texto, e

por que? 5. Qual é o calendário/cronograma previsto? 6. O/A procedimento/metodologia da tradução ou os processos que produzirão os

resultados: qual será o estilo dela? 7. Os resultados da tradução, ou seja, a função da tradução: leitura na igreja, proclamação

oral, evangelismo, alfabetização, etc

Passos básicos propostos na tradução

A) Antes do início da tradução 1. Mobilização e visão compartilhada: Unindo as diferentes confissões da igreja numa determinada área e incentivando-as a considerar a Igreja como ator principal na tradução da Bíblia. Com isso, um Comitê Inter-Igreja (ICC) é formada para supervisionar o trabalho da tradução. 2. Consulta e elaboração da comissão de tradução: Organizações de tradução devem trabalhar com as igrejas e outros interessados na criação de comitês que definirão a qualidade eos mecanismos de controle de qualidade em seu contexto específico através de uma declaração de propósito para a tradução que enuncia, entre outras coisas, o estilo desejado na tradução, os resultados esperados da tradução e a utilização prevista das Escrituras traduzidas. 3. Seleção e/ou proposta de pessoal: As organizações de tradução devem trabalhar com a igreja na seleção de pessoal do projeto. Os ICCs precisam exercer alguma supervisão do pessoal, a fim de garantir que a equipe também seja responsável perante a igreja. 4. Consultas sobre termos-chave com a intelligentsia da igreja: Embora a tradução de termos-chave seja uma atividade em curso no ciclo da tradução, há necessidade de oferecer uma oficina sobre as palavras-chave antes de começar a tradução. Esta oficina deve incluir necessariamente teólogos da igreja, líderes religiosos e os intelectuais da Igreja na área. A lista preliminar de termos-chave deveria ser traduzida como passo inicial para eventual verificação e possíveis modificações. B) Os procedimentos de tradução após o início do projeto 1. Estudo preliminar para o significado do texto-fonte (exegese): Pelo menos um membro da equipe de tradução deve ser um exegeta bastante habilidoso. O estudo do significado é um processo contínuo. Devem ser consultados os teólogos da Igreja na tomada de decisões exegéticas que parecerem difíceis e/ou controversas. 2. Esboço preliminar: Pelo menos dois falantes de língua materna/receptora trabalham num primeiro esboço da tradução. 3. Teclado do projecto: Se não digitado já diretamente pelo tradutor, o projecto de tradução deve ser digitado num computador, usando-se o programa “Paratext 6”.

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4. Verificação pela equipe de cheque exegético: Outros tradutores ou toda a equipe se reúne(m) para rever a primeira versão com a participação do exegeta e/ou consultor do projeto. Nas áreas onde estiverem disponíveis os membros do ICC, eles devem ser encorajados a participar de algumas das sessões de cheque exegético, particularmente durante a verificação de algumas passagens bíblicas fundamentais. 5. Revisão dos termos-chave bíblicos com a participação da Igreja: Uma revisão cuidadosa de palavras-chave é uma tarefa contínua do projeto e estes termos devem ser testados nas igrejas. É muito importante, para a comissão de revisão, incluir os líderes da igreja e outros interessados na tradução. 6. Testar o projeto em igrejas e outros ambientes sociais: O projeto é lido para alguns oradores representativos da língua receptora, com perguntas sobre sua clareza e naturalidade. A mesma passagem deve ser testada em pelo menos dois ambientes, pelo menos um dos quais deve ser um ambiente da igreja, como a escola dominical. 7. Rever o projeto: Representantes das igrejas e da comunidade são treinados em princípios básicos de tradução e são convocados em ocasiões apropriadas para rever os projetos em conjunto com a equipe de tradução. 8. Retroversão: Alguém que não tenha participado da tradução da passagem/livro deve fazer isso. Deve bastar uma retroversão literal para permitir que o consultor julgue se a tradução comunica de forma eficaz e com precisão, enquanto ele interage com os tradutores. 9. Verificação do consultor: Um consultor de tradução trabalha com a equipe para verificar a tradução em termos de fidelidade ao texto original hebraico ou grego e ao gênio (ethos) de tradução adotada pela comissão de tradução. Alguns líderes da igreja podem assistir algumas das sessões. 10. Publicação preliminar para uso e revisão nas igrejas: A tradução precisa ser testada amplamente, e uma maneira de fazer isso é imprimir algumas publicações preliminares quando a tradução ainda estiver em curso. Isso vai permitir que as pessoas reajam à tradução para saber se ela demonstra uma semelhança adequada às suas expectativas do texto-fonte e, ao mesmo tempo, se se trata de um estilo de linguagem natural e exibe o tipo certo de registro ou tom. 11. Leitura final para verificação de consistência: A equipe de tradução e os revisores principais devem utilizar ferramentas baseadas no computador para verificar a consistência da tradução. 12. Harmonização de termos-chave e aprovação pelo ICC (líderes religiosos e teólogos): Não há necessidade de que a igreja interrogue aos tradutores sobre sua escolha de palavras-chave, no final de cada projeto de tradução e antes de o texto ser enviado para composição. Representantes de igrejas (especialmente os clérigos e teólogos da igreja quando disponíveis) devem reunir-se em uma ou várias sessões no final da tradução para certificar-se de que os termos essenciais foram devidamente afinados. Isso pode ser feito usando o programa Paratexto para os principais cheques de termos e cheques de passagens paralelas. Os focos-chave de tais sessões devem ser a tradução de termos filiais e outros termos, como Cristo, redenção, graça, salvação, fé, batismo, etc. Os tradutores devem estar prontos para informar esses líderes sobre os fatores atenuantes que influenciaram sua escolha e solicitar a opinião da igreja. Após essa verificação, o ICC deve aprovar os termos antes que a tradução seja enviada para composição. 13. Composição: A tradução está preparada para publicação, nos formatos correspondentes à imprensa e o áudio.

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14. A Igreja organiza uma recepção formal ou dedicação/celebração das Escrituras: A(s) igreja(s) na área deve(m) planejar a cerimônia de dedicação/celebração e iniciar a divulgação/distribuição da tradução num local pré-determinado pela comissão de tradução. Durante esse lançamento, devem ser feitos planos para o uso das Escrituras.

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Mobilização da comunidade para participação e apropriação: A Experiência da CABTAL nos Camarões

Michel Kenmogne

Introdução Em 2001, após 15 anos de existência, a Associação dos Camarões de Tradução da Bíblia e Alfabetização (CABTAL) iniciou um processo para rever seu modo de desenvolver projetos linguísticos operacionais. Até então, a prática da CABTAL fora de moldar projetos desde o início -- identificar e determinar a respectiva necessidade, contratar o pessoal essencial para a realização do projeto e assumir a responsabilidade pelos resultados do esforço. Este sistema permitiu que a CABTAL responsabilizasse a equipe do projeto pela eficiência dele em termos de planejamento e monitoramento do progresso em direção aos objetivos. O alicerce filosófico deste esforço se baseava na percepção do desenvolvimento da língua e tradução da Bíblia como uma tarefa a ser feita, resultando em alguns produtos. Mas o impacto transformacional e a sustentabilidade, embora claramente em vista, nem sempre eram plausíveis após a intervenção da CABTAL. Assim, a CABTAL chegou a entender, com Clinton Robinson (1998:6), que "adotar a sustentabilidade como um objetivo em nosso trabalho significa que o objetivo, desde o início, é incorporar a visão no tecido social". Portanto, a CABTAL iniciou um processo de re-imaginar a sua abordagem de programas linguísticos. Este estudo revisa o raciocínio da CABTAL de mudar a estratégia de seus programas linguísticos, descreve as tentativas de adotar uma nova estratégia e compartilha alguns dos resultados desse esforço. 1. Justificativa de uma nova abordagem Apesar de seu crescimento e atividade nas comunidades linguísticas, a CABTAL foi confrontada por uma série de problemas e dificuldades que impediam a sua eficácia. Como organização externa ao serviço das comunidades linguísticas, CABTAL tomava às vezes decisões inadequadas relativas à seleção de pessoal para o projeto dentro da comunidade. Em tais situações, havia um risco de desvio de fundos do projeto, a ineficiência e a lentidão em direção aos objetivos. A CABTAL, em tais circunstâncias, teve de assumir toda a responsabilidade de resolver o problema, que na maioria das vezes se revelava bastante dispendioso. Além disso, o processo de seleção de um líder do projeto e as expectativas estabelecidas em seu papel significavam que a principal responsabilidade dele, em termos de prestação de contas, era com relação à CABTAL. Neste sentido, o líder do projeto percebeu-se como um oficial da CABTAL, designado para trabalhar numa comunidade para a realização de objetivos definidos pela CABTAL. O comunidade receptora compartilhava geralmente a percepção do líder do projeto em termos da posse e responsabilidade pelo desenvolvimento da língua e do projeto de tradução da Bíblia. Portanto, era bastante limitado o envolvimento da comunidade linguística no processo da tomada de decisões. A equipe de tradutores, alfabetização, uso das Escrituras e pessoal da administração do projeto serviu sob a supervisão do líder do projeto. A participação principal da Igreja na comunidade linguística foi realizada através da comissão de revisão (seleção de catequistas, presbíteros ou clero). O processo de cheque/verificação permitiu que alguns membros da comunidade verificassem a naturalidade da linguagem utilizada nos projetos de tradução.

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Desde outra perspectiva, embora o projeto pudesse render uma série de bons produtos, a CABTAL teve certa dificuldade em conseguir o seu objetivo primordial de transformação espiritual da comunidade. Muitas vezes a literatura ficava no escritório do projeto, e a comunidade raramente sabia de sua existência ou se sentia motivada a usá-lo. A probabilidade de distribuição dos produtos do projeto se baseou fortemente na capacidade de iniciativa e de marketing do líder do projeto e sua equipe. Com isso, a maioria dos projetos ficou aquém do seu objectivo final de permitir que a Igreja alcançasse maior eficácia na evangelização e formação de crentes. As aulas de alfabetização eram bastante limitadas e foi difícil para o projeto atingir sequer 1% de alfabetização na língua materna entre a população em geral durante todo o ciclo de um projeto. Tal situação não garantia um uso sustentável da língua escrita pela comunidade após a conclusão do projeto e a eliminação gradual do envolvimento da CABTAL. Em suma, durante estes primeiros 15 anos, a falta de fiscalização dos projetos da comunidade fez com que os projetos linguísticos fossem percebidos como sendo exclusivamente um esforço e iniciativa da CABTAL. Essa percepção, por sua vez, dificultava a eficácia do projeto em termos de sua capacidade de promover a desejada transformação espiritual das comunidades. O reconhecimento dessa realidade incentivou a CABTAL a explorar formas alternativas de iniciar e gerenciar projetos linguísticos. 2. Novas tentativas de iniciar e gerenciar projetos linguísticos: a estratégia de mobilização da comunidade

2.1 Pressupostos Com base na sua experiência, a liderança da CABTAL alegou que o envolvimento da comunidade receptora, como participante-chave na concepção do projeto e processos de execução, poderia render melhores perspectivas. A suposição era de que a tarefa do desenvolvimento da linguagem e tradução da Bíblia deveria pertencer principalmente à comunidade, que é o "dono" da língua e mantém todos os seus falantes através de uma identidade cultural em comum. Esta suposição é sublinhada por Gerald Helleiner (2002) num estudo sobre a Propriedade local e monitoramento do desempenho dos doadores, na Tanzânia, que define a propriedade da seguinte forma: "A essência da propriedade é que os destinatários gerenciam o processo. Eles dirigem o planejamento, o projeto em si, a implementação, o monitoramento e a avaliação”. Mais recentemente, a SIL também sublinhou o lugar não-negociável da apropriação local na tentativa de atingir movimentos sustentáveis de tradução da Bíblia, fazendo com que a busca pela compreensão da posse/ apropriação e ênfase nela sejam de prioridade principal na sua agenda de pesquisa corporativa. A LEAD/Ásia da SIL, nas palavras de Doug Frasier (2012), afirma as vantagens da apropriação/posse local: "É um imperativo moral, que impede a apatia e resistência, que impede soluções impraticáveis, que recruta a comunidade para o trabalho; é necessária para a sustentabilidade, que coloca a responsabilidade no seu devido lugar e evita fazer mal. A fim de garantir a participação ativa das comunidades num contexto onde anteriormente elas tinham atuado principalmente como beneficiários passivos dos esforços de projetos linguísticos, a CABTAL lançou uma iniciativa conhecida como mobilização comunitária.

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2.2 O que é a mobilização comunitária? A mobilização da comunidade, como definida pela CABTAL, foi inicialmente um processo de formação da visão para o desenvolvimento linguístico e a tradução da Bíblia nas comunidades linguísticas, com o objetivo de estimular as entidades locais a proporcionarem supervisão local para esses projetos. Para alcançar este objetivo, a CABTAL recrutou jovens facilitadores de novos projetos, também chamados de pioneiros, e os colocou em comunidades linguísticas onde não fora realizado antes nenhum trabalho de desenvolvimento linguístico. Os pioneiros não eram oriundos dos grupos linguísticos onde serviam. Cada um deles tinha uma tarefa específica, exigindo dois anos de trabalho. O objetivo desta missão era incentivar uma resposta, por parte da comunidade local, para a formação da visão. Desde o início, a CABTAL imaginava que o projeto não fosse entrar em produção, se não estivessem presentes os seguintes indicadores: a existência de uma comissão inter-igrega (ICC) atuando como guardião da tradução da Bíblia ao nível da comunidade, e uma comissão linguística comprometida com o desenvolvimento e promoção da língua. 2.3 Processo e conteúdo da mobilização comunitária

2.3.1 Recrutamento e orientação dos pioneiros: O processo de mobilização começou com o recrutamento e formação de jovens comprometidos, crentes maduros com “canudo” acadêmico na mão, para servirem como mobilizadores (também chamados de pioneiros). Eles receberam orientação básica sobre a visão e a importância da tradução da Bíblia, a história da Wycliffe e a SIL, uma introdução à CABTAL, princípios de envolvimento da Igreja na tradução da Bíblia, princípios bíblicos de angariação de fundos, tradução da Bíblia e a guerra espiritual, uma discussão sobre a propriedade e apropriação de um projeto de tradução da Bíblia pela Igreja e a comunidade, habilidades de facilitação e leituras selecionadas sobre várias questões relacionadas ao seu ministério. Eles também visitaram um projeto linguístico em curso para observar o processo de tradução e os diversos componentes de um típico projeto linguístico. Depois desses preparativos, a liderança da CABTAL os apresentou aos líderes comunitários e religiosos nas áreas de sua atribuição geográfica. 2.3.2 A atribuição/designação de pioneiros Ao atribuir/designar os pioneiros, a CABTAL esperava que eles fossem facilitar: a) A apropriação/posse da Igreja e a sua capacitação operacional: Desde a sua criação, as igrejas locais devem gerenciar um projeto. Para que isso se torne eficaz, o projeto-piloto deve realizar o seguinte:

Ajudar no estabelecimento de um Comitê Inter-Igreja (ICC), cuja principal função seria de supervisionar o planejamento e execução do projeto de tradução da Bíblia;

Ajudar no estabelecimento e treinamento de um comitê de tradução da Bíblia (TC), se não existe ainda no lugar, ou na renovação do comitê já existente, se for o caso;

Educar os líderes da igreja sobre a necessidade das Escrituras acessíveis na língua materna para o ministério eficaz;

Planejar a fase de tradução e produção da Bíblia com os líderes das igrejas;

Buscar o comprometimento das pessoas e de recursos materiais e financeiros de cada igreja e comunidade;

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Ajudar as igrejas locais na identificação e orientação do Gerente de Projetos Linguísticos do ICC. Será dada preferência ao recrutamento de pastores para servirem como gerentes de projetos/exegetas.

b) Fomento e estímulo do envolvimento da comunidade

Ajudar a iniciar um comitê linguístico ou renovar o existente;

Identificar e fomentar a visão dos governantes, as pessoas de recursos, e os porta-vozes da comunidade;

Identificar e mobilizar grupos de desenvolvimento que funcionam na comunidade (Comitê de desenvolvimento da aldeia, ONGs etc.)

c) Preparação espiritual: Recrutar apoio na oração ao nível local, nacional e internacional;

Procurar conhecer e escrever a história espiritual da comunidade e comunicar temas precisos de oração;

Identificar as fortalezas e poderes espirituais das trevas que reinam sobre a comunidade;

Produzir um perfil espiritual e social da comunidade com a finalidade de obtenção de apoio na oração e planejamento do programa.

d) Transição para a fase de produção Após a fase inicial (dois anos) de "apropriaçã/posse e operação pela igreja", a CABTAL gostaria de entrar na "fase de produção". O facilitador de inauguração daria lugar a um agente de ligação entre grupos linguísticos, um técnico da CABTAL no terreno que pudesse dar ao comitê de tradução da Bíblia e ao líder do projeto acesso contínuo aos recursos técnicos da CABTAL e facilitar as parcerias locais em curso.

O experimento inicial aqui descrito foi realizado durante um extenso período de dois anos e meio, produzindo resultados que levaram à modificação pela CABTAL da sua abordagem do trabalho de campo.

3. Alguns resultados Como resultado da aplicação de uma nova estratégia de inauguração, que enfatiza a participação e a partilha de apropriação do projeto pela comunidade linguística, houve uma mudança significativa na forma como as comunidades desempenham papel importante na tomada de decisões, o financiamento global e a execução de projetos de desenvolvimento linguístico e tradução da Bíblia em CABTAL.

3.1 Eficiência na resolução de problemas pelas comunidades locais O projeto de desenvolvimento linguístico Bum e tradução da Bíblia na língua Bum se situa a uns 700 km da sede da CABTAL, e são precisos cerca de dois dias de viagem em estradas precárias para chegar ao local dsse projeto. Foi criado após uma fase de dois anos de mobilização da comunidade. As igrejas tinham concordado em formar um Comitê Inter-Igreja (ICC), que atuava como patrão local e proprietário do projeto. O líder do projeto (Filipe) tinha sido selecionado pelo ICC após um processo de escrutínio que garantiu o acordo de todos os envolvidos. Como resultado, embora a CABTAL ainda fornecesse grande parte da capacidade técnica e alguns dos fundos para o projeto,

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Filipe se sentia responsável perante o ICC. Infelizmente, depois de servir por cerca de dois anos como líder do projeto, Filipe ficou gravemente doente. Sua condição mental se deteriorou e ele não era mais capaz de desempenhar a sua responsabilidade. No contexto da aldeia, passaram umas semanas antes de os habitantes reconhecerem evidentemente a sua doença mental. Enquanto isso, ele continuou a tentar exercer as suas funções, como de costume. A CABTAL estava bem preocupada quando chegou a notícia da condição de Filipe. Um oficial da CABTAL foi enviado para a comunidade Bum para avaliar o que estava acontecendo. Numa reunião com o ICC, ele perguntou sobre a situação. O ICC informou sobre o plano criado para resolver a crise. Em primeiro lugar, como uma associação de líderes de igrejas, eles se comprometeram a orar por Filipe e discernir se sua doença mental era resultado de um ataque espiritual. Sua premissa era que, estando ele envolvido em trazer a Palavra da Luz de Deus para a língua e cultura do povo Bum, a doença poderia ter sido causada pelas forças da escuridão. Eles também tomaram medidas adequadas para prestar cuidados e conforto para a família de Filipe durante esse tempo tão difícil. Em segundo lugar, o ICC tomou todas as chaves do escritório de projetos da custódia de Filipe e proporcionou liderança provisória para a equipe de projeto. Ao fazer isso, a propriedade do projeto ficava segura e o projeto, embora num ritmo mais lento, continuava progredindo.

Infelizmente, Filipe faleceu depois de alguns meses de doença. Este foi um grande golpe para um projeto que já estava em pleno funcionamento. Depois do enterro do Filipe, a CABTAL reuniu-se novamente com o ICC para discutir os planos para o futuro do projeto. O ICC declarou que era da alçada dele determinar a sucessão da liderança através da criação de um processo para identificar o próximo líder do projeto. Após um período de cerca de dois meses, e para total surpresa de CABTAL, o ICC identificou um jovem que estava morando e trabalhando numa cidade e persuadiu-o a voltar para casa, na região rural, a fim de servir e dar a liderança para o projeto. Este jovem tem servido fielment sob o ICC, proporcionando uma boa liderança para o projeto Bum, que já completou todo o Novo Testamento e está atualmente fazendo algumas verificações finais com um consultor. A eficácia do ICC local ao resolver este problema foi algo humilhante e repleto de lições para a administração da CABTAL. 3.2 A história Mmen com uma linguísta sueca Após uma fase de mobilização da comunidade, o projeto Mmen foi lançado com a atribuição (pela CABTAL) de uma linguísta sueca para servir por um período de dois anos. A comunidade tinha formado um comitê linguístico, que atuava como representante geral dos falantes da língua Mmen. Os principais objetivos do comitê linguístico foram realizar o desenvolvimento e padronização da língua, promover o seu uso dentro da comunidade e fomentar salas de aula de alfabetização em toda a comunidade. Mas o primeiro passo seria o desenvolvimento de uma análise fonológica, que, em seguida, levaria a uma declaração ortográfica e um alfabeto. Foi neste contexto que os membros da comunidade acolheram com entusiasimo a recém-chegada linguísta Lena, que ia ajudá-los. Os falantes do Mmen, através de seu comitê linguístico, decidiram suprir uma morada para Lena. Durante a sua permanência e serviço, Lena desfrutava o uso de um apartamento confortável sem pagar aluguel. O chefe da aldeia encorajou todos a darem a Lena todo o apoio necessário para que ela pudesse realizar sua tarefa em tempo oportuno. De tempos em tempos, o comitê lhe pedia relatórios de

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atualização sobre seu trabalho. Todos se alegraram com notícias de qualquer progresso, por mínimo que fosse, e o ICC Mmen mobilizou apoio em oração nas igrejas para o trabalho de Lena no desenvolvimento da língua Mmen. A supervisão local, a comunidade de acolhimento, o constante incentivo e o apoio em oração desafiaram a Lena a fazer todo o possível para ajudar a saciar a sede dessa comunidade. Durante um período de dois anos, Lena trabalhou arduamente para produzir um esboço da fonologia Mmen, uma declaração ortográfica, um léxico provisório e um alfabeto. Estes resultados foram recebidos com alegria e comemorações -- e o projeto de tradução pôde então começar. 3.3 O impacto dos processos locais no engajamento com a Escritura Após a fase de mobilização, a comunidade Tunen enfrentou uma dificuldade relacionada à escolha de um líder de projeto. Dado o perfil pessoal elaborado com a CABTAL, o ICC sentiu que seria apropriado que um pastor ocupasse a referida posição. No entanto, os membros estavam relutantes em liberar para esse papel um dos seus pastores mais qualificados e adequados. Os dois primeiros candidatos de sua proposta tinham sido analisados com a CABTAL, mas achou-se que eles não satisfaziam ao perfil exigido. Finalmente, o ICC pensou no Pastor Balehen. Este homem era tão essencial para a Igreja Batista que a Igreja não estava disposta a liberá-lo. Mas o ICC finalmente convenceu a Igreja Batista a secundar/“emprestar” o Pastor Balehen para o projeto. Na discussão que se seguiu sobre o salário do líder do projeto, o ICC e as igrejas sentiram que não seriam capazes de fornecer a contribuição mensal necessária, a fim de remunerar ao Pastor Balehen. Comprometeram-se para angariar fundos dentre suas congregações e os membros de sua diáspora que residiam nas cidades. Mas as igrejas que tinham sido abordadas preferiam canalizar os seus fundos para a promoção da alfabetização. Portanto, a Igreja Batista propôs que o Pastor Balehen servisse ao projeto em regime de tempo parcial, mantendo ainda sua posição na igreja. Nesta base, a Igreja Batista seria capaz de fazer uma contribuição através do empréstimo de um apartamento no complexo da escola bíblica para sua hospedagem. O Pastor Balehen, o ICC, a Igreja Batista e a CABTAL aprovaram mutuamente este arranjo. O Pastor Balehen assumiu assim a liderança do projeto e continuava com algumas responsabilidades dentro da Igreja Batista.

Três anos após o início do projeto, dentre suas responsabilidades na igreja, ele foi designado para pastorear uma pequena assembleia localizada a 20 km de distância da pequena cidade onde ficava o escritório do projeto. Esta assembleia foi fundada no final de 1940. A pequena igreja feita de blocos moldados estava quase caindo aos pedaços. A igreja tinha menos de quinze membros, todos idosos. Quando o Pastor Balehen assumiu a liderança da igreja, ele decidiu testar na igreja o impacto do uso das Escrituras na língua Tunen. Por esta altura, o evangelho de Lucas já foi publicado. O pastor abriu uma aula de alfabetização na igreja e dirigiu todos os cultos na língua materna. Quando visitei esta assembleia em setembro de 2012, após um ano de ministério na língua materna, fiquei espantado. A igreja agora tem uma adesão de mais de setenta pessoas. A maioria das pessoas na igreja eram vizinhos que haviam deixado a igreja por causa do uso do francês. Outros vieram da cidade vizinha, simplesmente porque gostavam do culto na língua Tunen. Os desenvolvimentos atuais no projeto

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Tunen, os resultados de parcerias e relacionamentos em vários níveis permitem que o projeto atinja muito mais do que o que seria de esperar se o projeto fosse dirigido exclusivamente pela CABTAL, sem o envolvimento da comunidade.

Conclusão A adoção de um novo modo de funcionamento, o qual transfere a propriedade do projeto significativo para as comunidades locais, rendeu uma série de benefícios. Em primeiro lugar, as comunidades têm demonstrado uma maior participação no desenho do projeto, a tomada de decisões, a resolução de problemas e a execução do processo. Em segundo lugar, os projetos têm sido mais eficazes, mesmo em meados da sua realização completa, no alcance de alguns importantes impactos de transformação. Através da tradução da Bíblia e a formação de Comitês Inter-Igreja (ICCs), a Igreja -- antes dividida em várias correntes confessionais -- testemunhou a unidade do Corpo de Cristo. Este, por sua vez, trouxe credibilidade para a mensagem do evangelho e favoreceu a sua recepção no seio das comunidades. Em terceiro lugar, a transferência de posse/apropriação para as comunidades locais reposicionou a CABTAL e estas comunidades como "convidados" e "anfitriões", respectivamente. A CABTAL entende que a sua intervenção e papel nas comunidades não é sustentável. Portanto, sua melhor contribuição tem sido investir na capacitação das instituições, sistemas e pessoas de acolhimento. Por sua parte, as comunidades locais foram gradualmente abraçando seu papel de anfitriões. Elas assumiram a responsabilidade de supervisão de projetos e desenvolveram a capacidade de usar a ajuda externa fornecida pela CABTAL e outros interessados. Embora haja ainda mais que aprender e melhorar nessa nova abordagem ministerial, a CABTAL e a SIL/Camarões a acham mais eficaz. É por isso que elas fizeram da mobilização da comunidade um requisito para iniciar qualquer novo projeto. Além disso, elas concordaram em submeter à CABTAL a inauguração de todos os novos projetos para que estes pudessem funcionar dentro desse mesmo paradigma. É importante ressaltar, entretanto, que esse esforço não se realizou sem dificuldades. Demorou para a CABTAL ter a coragem de avaliar sua atuação na área dos programas linguísticos e ter a vontade de explorar novas abordagens. Foi preciso que crentes jovens e motivados saíssem em primeiro lugar, sem muito equipamento para quebrar o solo e aprendendo enquanto iam em frente. Foram igualmente necessários os esforços da liderança CABTAL para defender a mudança no sistema de financiamento e educar os doadores sobre a relevância da nova estratégia para iniciar projetos. Até hoje, todos os parceiros da mobilização de recursos de CABTAL concordam com a estratégia e, naturalmente, incluem a mobilização das comunidades em suas prioridades de financiamento. Além disso, The Seed Company passou a incentivar a CABTAL a modificar sua visão original de mobilização da comunidade para incluir também algumas estratégias de narração de histórias orais que irão contribuir para a preparação da Igreja para as Escrituras na língua materna.

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Algumas das melhores práticas para Parcerias do Reino em programas de tradução da Bíblia

Sebastian Floor O seguinte documento fornece um relato das experiências de vários parceiros, numa região específica da África, colaborando para o objetivo comum de programas sustentáveis de tradução da Bíblia. Como abordagens semelhantes em outros lugares -- pois não estamos afirmando algo totalmente novo ou original -- a nossa abordagem da formação de parcerias foi baseada parcialmente em princípios derivados da missão de Deus (missio Dei) como nós a compreendíamos no momento. Hoje procuramos demonstrar os princípios, como eles se reletem na Filosofia da Aliança Global Wycliffe para programas de tradução da Bíblia. O objetivo deste documento é compartilhar algumas maneiras práticas de formar uma visão de tradução das Escrituras e engajamento com as Escrituras entre uma variedade de parceiros, descobrindo junto com eles uma visão comum para a transformação holística num determinado contexto em que todos estejam envolvidos. No final do documento, alguns estudos de casos ilustram certos pontos destacados. Ao compartilhar o que temos aprendido (e ainda estamos aprendendo), esperamos que os outros possam se beneficiar daquilo que parece estar emergindo como uma série de práticas úteis na busca de parcerias do Reino em programas de tradução da Bíblia. É provavelmente muito cedo para dizer se todas essas práticas são realmente "melhores práticas". Serão precisos uma exploração mais profunda e algum tempo para testá-las. Mas aqui vai a nossa história. 1. Algumas práticas úteis para a identificação de potenciais parceiros e formulação de

uma visão para a participação na missão de Deus

1.1 Identificação de potenciais parceiros, e as primeiras consultas Em nossa experiência, apresenta-se a situação ideal quando uma agência da Bíblia recebe um convite significativo de um parceiro em potencial para trabalhar num país, língua ou comunidade linguística específico. Nesses casos, temos acompanhado aquele parceiro em potencial e, juntos, interagimos com outros participantes-chave da região.

A pergunta que surge imediatamente é: "É necessário ter um convite antes que possa haver qualquer contato?" Como proceder se não houver nenhum convite, sobretudo no caso de pequenas comunidades linguísticas que se sentem menos poderosas ou que estão distanciadas da sociedade principal os dos círculos eclesiásticos? Não estamos sugerindo que não possa haver nenhuma relação antes da recepção de tal convite. Em muitos casos essa relação preliminar é fundamental para a formação de confiança e compreensão. Essa relação pode, então, levar a um convite para trabalhar no país e/ou comunidade. Mas o que estamos dizendo é que um convite formal, feito por indivíduos graúdos e alguns órgãos de representação significativa (como a igreja) deve preceder qualquer projeto em conjunto. Como resposta à pergunta: "Será que os representantes das agências da Bíblia sempre agem como intervencionistas?" respondemos que sim, para pequenos grupos que estão em desvantagem, esforçando-se mas encontrando-se

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em posição inferior na hierarquia das necessidades, que provavelmente irão ficar lá a menos que haja uma intervenção externa. Nesses casos, uma vez que há alguma compreensão do contexto e da cultura, pode ser apropriado mostrar-se mais óbvio na formulação da visão e para assegurar a liderança no processo inicial. Para grupos maiores, por exemplo, como um grupo linguístico específico em Angola com um milhão de falantes e muitas igrejas, exige-se mais avaliação e certo cuidado: Por que não se promove ainda uma tradução da Bíblia? Quais são os desafios neste contexto? Em tais circunstâncias, a abordagem mais sábia pode incluir menos “liderança” e mais atenção prestada. Em cada situação, no entanto, é essencial o desejo e vontade de aprender.

Antes de aceitar qualquer convite e arriscar-se em alguma empresa em comum, até mesmo na formação de relacionamentos, consideramos uma pesquisa de fundo um importante passo inicial. Os recursos que abrangem uma região ou país, como o Projeto Josué, podem oferecer boas informações preliminares sobre parceiros potenciais. A coleta de dados disponíveis sobre os potenciais parceiros se mostrou um bom passo preparativo antes de interagir com os principais intervenientes em qualquer contexto. Passar tempo com as alianças nacionais de igrejas e/ou agências para descobrir quem é quem, e onde é que está, permitiu que verificássemos os dados e ganhássemos uma perspectiva local do contexto. Identificados alguns parceiros em potencial, o próximo passo lógico é entrar em contato com os líderes e encontrar-se com eles. Inicialmente, o foco é estabelecer relacionamentos, conhecer-se um ao outro, para cada líder ter a oportunidade de compartilhar a visão, e encontrar maneiras de transformar a relação em algo agradável e desejável para todos. Viajarem juntos, participarem de eventos organizados por uns e outros, visitar nas casas uns dos outros (se for apropriado nesta fase), desfrutar da comunhão no Senhor, tudo contribui para uma atmosfera de exploração das possibilidades de colaboração, sem a pressão de prazos fixos para alcançar qualquer tipo de acordo de parceria. Este processo pode demorar até um ou dois anos, mas dá tempo suficiente para muitas oportunidades programadas para a compreensão mútua, para a formação de visão do que implica um programa de tradução da Bíblia, e para explorar em conjunto as possibilidades de resultados desejáveis. Muitas vezes é necessário um tempo significativo para o desenvolvimento e circulação de novas ideias.

Uma vez que todas as partes estão prontas para buscar algo mais em termos de uma parceria para tradução da Bíblia e atividades relacionadas, e uma vez recolhidas por todos os envolvidos informações suficientes sobre o contexto local, reunimo-nos em seguida por mais tempo para discutir o projeto de diversos ângulos. Ao fim desse tempo, pode ser possível ter pronto um esboço de um Memorando de Entendimento (MOU). Pode ser necessária uma segunda reunião, ou mesmo uma terceira, para chegar a um acordo detalhado sobre o caminho a seguir. A fase de formação do MOU pode levar vários meses ou até mais, dadas as complexas questões em discussão. Descobrimos que é melhor não apressar o processo, preferindo esperar para as agências de acolhimento definirem o ritmo. O que é crucial nesta fase é deixar claro e discutir a dinâmica “anfitião-convidado”. A comunidade de acolhimento e os parceiros precisam entender claramente que um projeto de tradução não pode ser simplesmente entregue a uma agência da Bíblia para esta assumir a responsabilidade total. A comunidade ainda

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é o anfitrião, portanto tem também os privilégios e responsabilidades de hospedagem. Por isso, é essencial ter uma boa compreensão do que isso significa na cultura e no contexto dessa comunidade em particular. É necessária aqui uma palavra de conselho, quando falamos do tempo: O tempo -- na formação de relacionamentos -- não é a principal medida de qualidade num programa de tradução. Às vezes um grupo tem sido bem preparado de antemão e estamos herdando um bom relacionamento e confiança, e às vezes o Senhor já preparou um grupo, que está apenas à espera da faísca e incentivo para o avanço necessário.

O princípio missional por trás desta abordagem é que nem as expressões locais da Igreja como anfitrião, nem as agências da Bíblia como convidados, trabalham de forma isolada umas das outras, mas sim como comunidade. Esta comunidade de prática é caraterizada pelo conceito de parcerias do Reino. Tais parcerias não são baseadas só em trabalharem juntas para atingir algumas metas comuns ou recursos de compartilhamento, como numa empresa conjunta, senão em compartilharem o evangelho e nossa vida comum em Deus, e só então encontrar maneiras de expressar essa koinonia através de empresas apropriadas e relevantes. Na tradução da Bíblia, essas parcerias são mais eficazes quando dirigidas pelos anfitriões. O anfitrião é definido como alguma expressão local, com base na ekklesia/igreja na qual se insere um programa de tradução. Esta expressão pode ter uma grande variedade de configurações. Em nossa experiência de identificação de possíveis parceiros e configurações de parceria, aqui está uma pequena lista de possibilidades (de forma abrangente):

1. O anfitrião do programa de tradução pode ser a única denominação da igreja

(especialmente quando ela é a única denominação em determinada área, ou a denominação esmagadoramente majoritária numa comunidade linguística). Veja a seguir as histórias de caso dos Makonde e do povo K como exemplos deste tipo de configuração.

2. O anfitrião pode ser uma aliança ad-hoc de várias denominações comprometidas com um ou vários projetos, reunidos num comitê de tradução.

3. O anfitrião pode ser uma rede já existente de denominações e organizações cristãs (por exemplo, a Aliança Evangélica ou o Conselho Nacional de Igrejas).

4. O anfitrião poderia assumir a forma de uma aliança híbrida de denominações e outras organizações cristãs, como as agências de plantação de igrejas e organizações não-governamentais (ONGs cristãs). Veja o estudo de caso JOCUM-Wycliffe a seguir como exemplo deste tipo de configuração.

5. Alguma associação registrada de líderes da igreja ou indivíduos (especialmente em contextos francófonos e lusófonos) poderia servir de anfitrão. Veja o estudo de caso da Sena Prodelise Association a seguir como exemplo deste tipo de configuração.

6. O anfitrião poderia incluir uma projeto em conjunto com a Sociedade Bíblica nacional e as igrejas às quais ela está vinculada. Veja o caso OluMwila a seguir como exemplo deste tipo de configuração.

7. Um instituto de tradução da Bíblia ou promoção das Escrituras, que faz parte de um seminário teológico ou alguma outra instituição de formação cristã, pode hospedar um projeto. Ainda não vimos um exemplo concreto deste tipo de desenvolvimento

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na região, mas foi mencionado por alguns dos nossos parceiros como algo digno de explorar.

Há certamente muitas outras alternativas e configurações, e seria possível uma combinação de quaisquer das acima referidas. Não há um modelo que sirva para todos.

1.2 Formação da visão e das bases do projeto Falando com base na experiência das parcerias que vêm se formando no sul da África, há uma ampla gama de atividades que podem ser desenvolvidas para construir a visão e preparar as bases para uma eventual parceria do Reino:

1. Passar o tempo com os potenciais "campeões" individuais. O que aprendemos é que não se lida, em primeiro lugar, com instituições, mas com pessoas reais. É algo benéfico fornecer a um indivíduo-chave materiais sobre a tradução da Bíblia e o engajamento com a leitura das Escritura. No final, será o apoio de pessoas fortes -- e não o apoio institucional por si só -- que vai trazer o avanço da parceria. (No entanto, temos visto em dois países que, quando o projeto inteiro depende de apenas um patrocinador forte, o trabalho não se estabelece adequadamente no coração das igrejas. Por mais importantes que tais pessoas possam ser, é preciso mais do que alguns patrocinadores individuais.)

2. A tradução da Bíblia e o engajamento com as Escrituras se desenvolvem dentro de um contexto específico, pois eles não existem num vácuo. Ao encontrar-nos dentro do contexto da igreja, descobrimos que é melhor não falar sobre a tradução da Bíblia em si, mas sobre um movimento de maior acesso à verdade. Normalmente, todo o mundo concorda que os programas de desenvolvimento de liderança e discipulado serão enriquecidos por maior acesso às Escrituras.

3. Compartilhar sobre a visão de acesso mais profundo às Escrituras na igreja ou em congressos de redes de igrejas. Vimos um nível notável de interesse, ao apresentar o movimento de tradução das Escrituras dentro do contexto de um movimento de impacto das Escrituras -- ou, em outras palavras, o movimento de tradução dentro de um movimento bíblico. (Mas vimos também em Moçambique que se não houver acompanhamento e atividades adicionais de compartilhamento da visão, a visão e a atividade se enfraquecem. A comunicação pública da visão é muito "light" ou fugaz para ter um impacto sustentável; são necessárias atividades adicionais.)

4. Sempre que se apresenta a oportunidade, descobrimos que vale a pena escrever sobre a tradução da Bíblia e o impacto das Escritura em publicações nacionais apropriadas e relevantes. (Em Angola temos sido convidados a escrever sobre a parceria com a JOCUM na contagem de histórias orais da Bíblia e a tradução bíblica numa publicação especial.)

5. Nas instituições teológicas, tem havido por vezes uma porta aberta para a realização de consultas missiológicas sobre a necessidade de tradução da Bíblia e o papel das Escrituras na língua materna na igreja e sua missão. (Aprendemos, no entanto, que o entusiasmo inicial provocado por um evento como esse, desaparece às vezes, uma vez que os interessados enfrentam a realidade de organizar um evento como esse. Por vezes, há questões políticas entre os líderes da igreja, ou não há comunicação e clareza suficientes sobre o que implicaria tal reunião. Tivemos que cancelar um

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evento deste tipo em Angola por estas razões. Mais reuniões preparatórias poderiam ter impedido isso.)

6. Junto com os parceiros, tivemos algumas oportunidades de oferecer cursos introdutórios de tradução da Bíblia. Onde não existem manuais ou currículos no idioma apropriado de comunicação mais ampla, temos usado materiais provenientes de outros lugares, mas o ideal seria ver estudiosos nacionais produzindo recursos de treinamento (por exemplo, a Iniciativa Francófona na África).

7. Há uma demanda para programas de ensino sobre o engajamento com as Escrituras, como Cura de Traumas e programas sobre HIV/AIDS (SIDA). Além de constituírem valiosos serviços para as comunidades e as oportunidades de formação, esses programas servem muitas vezes como construtores de pontes para ajudar as comunidades a verem o valor de ter a Bíblia em sua própria língua.

8. Pode ser apropriado às vezes o fornecimento de treinamento na oralidade e a contagem oral das histórias da Bíblia para as igrejas. Muitas vezes, quando as igrejas veem a relevância de tais programas de oralidade dentro de suas próprias congregações, elas podem estar mais incentivadas a apoiar programas semelhantes em línguas onde as Escrituras ainda não estão disponíveis.

9. Adotar, com os parceiros, projetos-piloto, como oficinas exploratórias de etno-comunicação,11 para descobrir quais estratégias de comunicação e mídia, e quais formas orais da arte verbal, devem ser melhor utilizadas em determinado contexto.

2. Algumas maneiras práticas de formar parcerias não baseadas em tarefas, mas orientadas para o Reino

2.1 Atividades relacionais Um princípio fundamental que aprendemos é de passarmos juntos tempo suficiente. As parcerias do Reino, quando autênticas, não costumam formar-se rapidamente. Pelo contrário, verificou-se que, no caso de uma parceria formada demasiado rapidamente, podem existir problemas e preocupações ocultos. Mas, como mencionamos acima, por vezes os parceiros de acolhimento estão completamente prontos já. Quando uma parceria se torna coesa em pouco tempo, não há nenhuma razão para atrasar desnecessariamente o progresso dela.

O princípio de passar o tempo juntos se expressa de várias maneiras, com base em experiências agradáveis, como tomar juntos as refeições, viajar juntos, aprender sobre a vida e organizações pessoais uns dos outros (de maneiras culturalmente apropriadas), rir e chorar juntos e entrar no espírito de qualquer coisa (grande ou pequena) que pareça importante. Assim, o relacionamento torna-se cada vez mais uma experiência agradável para todos os envolvidos, com o futuro de contato e comunhão ansiosamente aguardado.

11

Uma oficina de etno-comunicação é uma consulta informal com o(s) parceiro(s) de acolhimento(s) e principais líderes comunitários da língua receptora sobre como funciona a comunicação na língua de acolhimento. Por exemplo, existe uma preferência pela comunicação e aprendizagem oral vs. escrita? Quais as formas de arte verbal utilizadas para comunicar informações importantes (diálogo, monólogo, poesia, provérbios, parábolas, forma oral ou escrita, secreta ou aberta, etc.)? Qual é a função da narrativa e contagem oral de histórias na cultura e quem são os especialistas nessa arte? Como é a interação verbal com outras formas de arte social, como performance dramático e dança, etc.? Esta interação fornece os primeiros passos para uma compreensão maior da comunicação contextual e pode levar a uma etnografia da comunicação potencialmente útil para relacionamentos contínuos e crescimento e desenvolvimento da comunidade.

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Nos casos em que fomos abençoados na formação de uma parceria do Reino, descobrimos que temos em comum um idioma, ou modo de nos relacionarmos, distinto dos de uma parceria baseada em tarefas. Nós e nossos parceiros falamos sobre como podemos conhecer melhor uns aos outros, os nossos sonhos, as nossas limitações, as nossas alegrias e preocupações. Na tentativa de descobrir as necessidades sentidas pelos nossos parceiros, podemos descobrir que em breve também estamos compartilhando as nossas. A linguagem é própria da comunidade e do companheirismo. Obviamente, será necessário explicar aos parceiros o essencial de si mesmo e de sua organização; mas nenhuma das partes promove a sua própria agenda, na qual cada participante procura ansiosamente um parceiro disposto a apoiar a sua visão de ministério. Em vez disso, fica claro que a nossa principal motivação é de cultivar um relacionamento do Reino como indivíduos, bem como organizações. Ao falarmos sobre o vocabulário das parcerias, são usados frequentemente os termos "propriedade", "interessados" e "administração". Seja qual for o termo usado, é importante que a relação "convidado-anfitrião" permaneça clara, saudável e contextual e culturalmente apropriada. É fácil para uma agência da Bíblia que age como recurso e fonte de conhecimento -- seja no espírito da boa administração ou da responsabilidade de um interessado -- tornar-se demasiado dominante e perturbar a dinâmica “convidado-anfitrião”. Nesse caso, perde-se a chamada dinâmica dos "parceiros iguais”. Por isso, preferimos a metáfora anfitrião-convidado e o fato de que o anfitrião é realmente o "dono" e precisa levar a sério as suas responsabilidades de hospedagem (com qualquer ajuda que possa necessitar para o exercício dessa responsabilidade). Como descreveu tão bem um dos membros da diretoria da Wycliffe na África do Sul, a agência da Bíblia como convidado precisa reposicionar-se a si mesma, adotando uma atitude de liderança servidora. Tal mudança é, obviamente, mais fácil dizer/descrever do que fazer, e talvez seja mais uma arte do que apenas uma boa prática.

As parcerias do Reino devem ficar sempre enraizadas em Cristo e incluir parceiros que se tornam amigos em Cristo. Aqui há prazer mútuo em compartilhar num nível pessoal sobre a nossa fé, e sobre a espiritualidade e o evangelho. Nada estimula tão eficazmente um relacionamento do Reino espiritual como a comunicação pessoal a respeito de Cristo. Naturalmente, isso exige sensibilidade cultural, mas o princípio é que, quando o Reino é fundamental para a parceria, falamos sobre a tradução da Bíblia como sendo muito mais do que apenas uma tarefa. É algo que fazemos com referência a nossa comunhão em Cristo e como parte de nossa participação com Deus em Sua missão. Uma experiência que compartilhamos com muitos outros é que o dinheiro pode ser uma pedra de tropeço nestes estágios iniciais. Mas também descobrimos que o envolvimento financeiro pode ser um bom indicador da visão e as atitudes. Como as agências da Bíblia que são facilmente vistas como fontes de financiamento, tivemos de ser cautelosos ao falarmos sobre os gastos e o dinheiro nos estágios iniciais de uma parceria. Nenhuma parceria deve ter o dinheiro como assunto principal de conversa mútua.

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Em reconhecimento dos nossos anfitriões, a nossa postura tem sido de respeitá-los como eles generosamente acolhem o programa de tradução da Bíblia de acordo com a norma prevista em sua cultura. Isso possibilita que os anfitriões façam às vezes uma significativa contribuição financeira para o processo, dada a realidade local, é claro. No entanto, se eles não mostrarem nenhuma vontade de assumir as responsabilidades de anfitrião contextual e culturalmente apropriadas no relacionamento e para a futura parceria de tradução da Bíblia, provavelmente não são os parceiros idôneos neste momento. Mais uma vez, é importante o momento. Tivemos que ser pacientes, dispostos a esperar o momento certo antes de avançar. Muitas parcerias potencialmente boas foram destruídas no início, ou não duraram muito tempo, devido a um avanço muito rápido antes de ser estabelecida uma sólida fundação relacional. Isso nos ajudou a ver que é preciso algum tempo para um parceiro processar as várias facetas da parceria em potencial e contar o custo de se comprometer a longo prazo, fator essencial num programa de tradução da Bíblia. Mesmo quando tentados ao desespero, ao passarem longos períodos sem nada acontecer, descobrimos que por vezes está acontecendo mais do que nós podíamos imaginar; Deus está agindo. Em nossa experiência, uma parceria do Reino boa e sustentável na área de tradução da Bíblia pode levar de um a três anos para se desenvolver, dependendo de uma série de fatores. Se os potenciais parceiros não parecem mostrar desejo e iniciativa sem serem intimados repetidas vezes a fazê-lo, achamos melhor não seguir em frente. A parceria só pode ter sucesso quando é uma iniciativa conjunta/mútua, com todas as partes acrescentando ao processo sua energia real. Se nada acontecer, sem o estímulo constante da agência da Bíblia, pode ser preciso parar e esperar. Podem ser apropriados alguns lembretes suaves, mas só até certo ponto. Pode haver razões culturais (como complexos padrões de respeito) que impedem um parceiro de tomar livremente qualquer iniciativa, mas se houver um bom relacionamento do Reino já estabelecido e em crescimento, deve haver mecanismos para evitar tais restrições. Assim, se não houver boas reações por parte de um parceiro/hospedeiro em potencial após alguns sinais iniciais promissores, a relação provavelmente não vai se desenvolver neste momento. Quando isso acontece, devemos tentar manter a porta aberta para que o relacionamento possa reiniciar-se e crescer em algum momento futuro. Enquanto isso, começamos a procurar outros parceiros, e esperar no Senhor para nos revelar os próximos passos.

2.2 Atividades fundacionais Uma vez que as relações e formação de visão introduziram 1) uma atmosfera de expectativa mútua, 2) o desejo de fazer alguma coisa juntos, 3) uma sensação de paz porque um dos parceiros não está impondo sua agenda no outro, 4) uma consciência de comunidade alegre e 5) confiança suficiente, sentimos que pode ter chegado a hora de discutirmos com mais detalhes uma parceria do Reino para tradução da Bíblia. Pode ser o momento propício para uma "plataforma de formação" mais substancial. Nessas conversas mais avançadas, sugerimos alguns pontos que achamos úteis abordar com o(s) parceiro(s):

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1. Falar sobre relações “anfitrião-convidado” e suas respectivas expectativas. 2. Fazer talvez uma ou várias atividades de formação da visão acima mencionadas,

conforme necessário. 3. Discutir questões contextuais:

a) Qual a perspectiva da comunidade em termos da missio Dei? Há líderes que estão biblicamente treinados, por exemplo?

b) Como está sendo usada a Escritura agora? c) Há disponível já alguma "Escritura inicial" que não esteja sendo usada? E por

que não? d) Qual a Escritura mais necessária inicialmente? e) Que mídia é essencial em primeiro lugar? Qual é o relativo status da oralidade e

da comunicação escrita na comunidade? f) Que necessidades sociais, econômicas, ou de outro tipo poderiam ser bem

integradas numa estratégia de acesso às Escrituras? g) Como é que a comunidade pode desfrutar mais acesso a todo o conselho de

Deus (Bíblias completas, ou transferência posterior ao uso de uma língua de comunicação mais ampla)?

4. Quando o momento for idôneo para fazer acordos específicos, exploramos as condições para um Memorando de Entendimento (MOU). Descobrimos que o MOU pode formar-se em etapas: primeiro um tipo geral de declaração ("eu gosto de você, você gosta de mim, e nós gostaríamos de fazer algo juntos"), seguida, numa fase posterior, de um acordo mais detalhado, cobrindo as expectativas e os diversos papéis de cada parceiro. A cerimônia de assinatura formal e celebração pode ajudar a manter a ênfase na comunhão, quando as coisas chegarem à fase mais formal.

5. Desenvolver um resumo de tradução. O resumo incluirá declarações sobre os textos de origem a serem usados, termos-chave bíblicos preferidos, tipo de tradução e sistemas de estilo, teste e avaliação e de tomada de decisões, e os procedimentos de resolução de problemas.

A ordem dessas atividades não é de maior importância. O que mais importa é sermos sensíveis a Deus e uns aos outros, estando cientes da “hora H” e da adequação a qualquer momento. O estudo de caso JOCUM-Wycliffe (a seguir) é um exemplo em que se empregou a maioria dos passos acima mencionados, numa aprendizagem-processo de tentativa e erro.

3. Alguns exemplos concretos de parcerias do Reino

3.1 Makonde Entre os Makonde do norte de Moçambique, foi iniciado um projeto de tradução em 1993. O Novo Testamento foi completado, a agência da Bíblia encerrou sua participação como parceiro principal, e os tradutores que tinham sido funcionários da agência da Bíblia foram demitidos. Após uma série de discussões entre a agência da Bíblia e a maior igreja entre os Makonde (representando 80% dos crentes), um conselho da igreja -- ativado anteriormente mas dormente durante algum tempo -- foi reativado e crismado o Conselho da Igreja Makonde. A própria igreja escolheu o nome e determinou a agenda deste conselho. Mais do que um simples comitê de tradução da Bíblia, ele foi criado para ser um conselho de líderes da igreja, responsáveis pela

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promoção da Bíblia e da verdade bíblica entre os Makonde. O conselho supervisiona uma escola bíblica para os futuros líderes da igreja, a distribuição das Escrituras e, a partir de 2013, a tradução do Velho Testamento em Makonde. O processo para configurar isso levou mais de um ano. O parceiro de financiamento (The Seed Company, neste caso) terá um Memorando de Entendimento assinado diretamente com a igreja e com o Conselho da Igreja Makonde. Daqui em diante, a agência Bíblia só irá fornecer serviços para o projeto como respostas a pedidos específicos, como nas áreas de consultoria de tradução e desenvolvimento organizacional. A equipe da agência da Bíblia anteriormente residente prestará contas ao Conselho da Bíblia Makonde; além de fornecer consultoria de tradução, essa equipe faz agora o ensino geral da Bíblia na escola bíblica, em resposta à necessidade da Igreja. Tornou-se uma verdadeira parceria do Reino de forma abrangente, para responder às necessidades da igreja.

3.2 O povo K em Moçambique O povo K é um grupo predominantemente muçulmano em Moçambique. Em um caso-modelo de plantação contextualizada de igrejas, uma igreja étnica foi estabelecida entre os K em 2002 e cresceu rapidamente. No entanto, a tradução da Bíblia já havia começado em 1996, poucos anos antes da plantação da igreja. Portanto, estavam disponíveis desde o início porções das Escrituras na língua materna, e estas são amplamente utilizadas até hoje. Os líderes da igreja não só verificaram sua qualidade, mas também autorizaram ativamente a sua utilização, estando diretamente envolvidos em todo o processo desde o início. Há dois tradutores de língua materna e as revisões finais são feitas pelos três líderes mais graúdos da igreja. Esses líderes também assistem a cada sessão das visitas de consultoria. Daqui em diante, a igreja mesma vai empregar os tradutores diretamente. Os financiadores, bem como a agência da Bíblia, responderão diretamente à igreja. A maior liderança da igreja dirige o projeto de tradução e participa diretamente de todo o processo de tradução.

3.3 Sena Durante anos, a associação local registrada (Prodelise) existiu entre o Sena de Moçambique, mas o seu papel foi apenas de consultores para a agência da Bíblia, e isso só ocasionalmente. Apesar do envolvimento limitado, desenvolveu-se lentamente um verdadeiro sentimento de “posse” ao longo dos anos, principalmente por causa das sessões de teste/verificação de tradução realizadas todo sábado à tarde durante mais de 15 anos. Ao mesmo tempo, ocorreu bastante treinamento e formação de visão entre os membros da grande equipe de tradução, fornecidos os materiais pela agência da Bíblia. O Novo Testamento foi completado em 2011. Depois de negociações durante um período de dois anos, a configuração do parceiro para o projeto Velho Testamento já foi ligeiramente modificada. A Prodelise e seu Conselho já tomaram posse completa do projeto. Os tradutores são agora funcionários da Prodelise e não da agência da Bíblia. A agência da Bíblia no país, quando convidada pela Prodelise, presta serviços, como consultoria e assistência ao desenvolvimento organizacional. Os financiadores também já lidam diretamente com a Prodelise e não com a agência da Bíblia.

3.4 JOCUM-Wycliffe A missão JOCUM (YWAM) em Angola tem vindo a trabalhar no sudoeste do país entre grupos de pessoas não alcançadas, desde 1995. Missionários angolanos nacionais da

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JOCUM, apoiados por igrejas angolanas, fixaram residência entre vários desses grupos, aprenderam suas línguas, desenvolveram ortografias, plantaram igrejas e, em um caso, iniciaram uma tradução da Bíblia. Considerando as dificuldades de tal empreendimento, a JOCUM enviou pedidos de ajuda à Sociedade Bíblica (nacional e internacional). A Wycliffe ouviu falar desses pedidos, e em fevereiro de 2011 fez o primeiro contato com a JOCUM. Em maio de 2011 a Wycliffe, a Sociedade Bíblica e os líderes da JOCUM viajaram juntos por duas semanas para visitar as remotas situações no sudoeste de Angola. Viajarem todos juntos lhes proporcionou muitas oportunidades para compartilharem necessidades, conhecerem uns aos outros, rirem uns com os outros, tomarem juntos as refeições e discutirem a tradução da Bíblia. A confiança foi crescendo, e depois de mais reuniões durante uns 12 meses, reuniram-se representantes da JOCUM e a Wycliffe (incluindo-se também as entidades Wycliffe Associates e OneStory da SIL/Américas) na Catumbela em maio, 2012, para uma semana de reuniões para negociar um acordo de cooperação. Mais uma vez, o tempo relaxante e agradável de união e partilha levou à decisão de iniciar-se um projeto de historiar a Bíblia oralmente, empregando-se a abordagem “OneStory” em seis idiomas. Cada um dos projetos linguísticos é um projeto da JOCUM, não da Wycliffe. A JOCUM reserva 10 membros do seu pessoal para dedicar 75% do seu tempo a esta parceria. A JOCUM irá disponibilizar as suas instalações e a Wycliffe vai investir na melhoria delas se/quando necessário. A Wycliffe (e, particularmente, Wycliffe Associates) concordou em realizar melhorias de infra-estrutura que beneficiarão indiretamente a parceria e reforçarão significativamente a JOCUM no país. A primeira oficina foi realizada em novembro de 2012. Parte do acordo foi o compromisso de se reunirem regularmente como parceiros: Duas vezes por ano, o Conselho Interno -- composto por líderes Wycliffe e JOCUM -- reúne-se e avalia o progresso, e uma vez por ano, os líderes de ambos se reúnem com o Conselho Externo, onde os líderes nacionais da igreja têm uma oportunidade de participar da parceria.

3.5 Um empreendimento de cinco parceiros Por quase 40 anos, o povo Mwila em Angola vinha solicitando uma tradução das Escrituras, mas por causa da longa guerra civil e tentativas anteriores fracassadas, não foi feito nenhum trabalho de tradução duradouro. Em 2011, a Sociedade Bíblica de Angola convidou a Wycliffe a prestar assistência em iniciar um projeto no idioma OluMwila. Após dois anos de identificação de parceiros, formação da visão e consultas, foi iniciado um projeto mútuo com cinco parceiros. A comissão de tradução (TC) foi estabelecida e reconhecida como um dos cinco sócios. Foi assinado um acordo entre esta comissão, a Wycliffe, a Sociedade Bíblica, e dois financiadores. As igrejas contribuirão com 20% do orçamento, e o papel de cada parceiro está claramente especificado no contrato.

3.6 Parceria da Bíblia San Desde o início de 2011 a Wycliffe/África do Sul tem mantido conversas com as Sociedades Nacionais da Bíblia, igrejas e agências missionárias entre os 50.000 membros do povo San do sul da África (Botsuana, Namíbia, África do Sul e Angola). Após os primeiros contatos com parceiros, uma consulta da Bíblia San foi convocada para novembro de 2011, em Windhoek, Namíbia. Estavam presentes representantes San, e foi enfatizada a situação sócio-econômica do povo San. Os participantes da

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consulta concordaram em lançar a Parceria da Bíblia San para possibilitar acesso à Palavra de Deus entre os San. Por causa das dificuldades de escrita e de alfabetização nas línguas do grupo San, altamente complexas, a consulta resolveu utilizar uma abordagem oral da tradução como estratégia inicial. Também indicou um forte desejo de combiná-la com uma abordagem holística para enfrentar a desesperada situação sócio-econômica dos San. Depois de mais conversas básicas e três oficinas-piloto sobre a etno-comunicação na Namíbia, os parceiros se reuniram novamente em fevereiro de 2013 em Gaborone (Botsuana) para finalizar um Memorando de Entendimento (MOU) e um plano de ação. O trabalho foi iniciado em junho de 2013 em nove línguas do grupo San, acompanhado e orientado por seis parceiros governantes e quatro parceiros no setor de recursos e empreendimento, com uma reunião do comitê de direção duas vezes por ano. Estão previstas as fases segunda e terceira para incluir todas as línguas restantes do grupo San em Botsuana e Angola.

3.7 Parceria M Lucas A Parceria M Lucas foi criada em resposta à descoberta de vários grupos linguísticos sem nenhum acesso à Palavra de Deus. Em 2008, uma agência missionária convidou uma das agências da Bíblia a se envolver. Em 2010, depois de mais avaliação de necessidades e várias consultas, essa agência missionária, trabalhando sob os auspícios de uma das maiores denominações do país, convocou uma reunião de líderes da igreja de seis grupos diferentes. Foi criado um Comitê Inter-igreja (ICC) de tradução, ligado à missão e à denominação, mas separado em termos de controle. Este comitê toma todas as decisões. A elaboração e verificação da tradução está sendo feita em oficinas e os tradutores trabalham como voluntários, sem remuneração nos intervalos entre oficinas.

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Como desenvolver um impacto holístico como organização focada na tradução da Bíblia: LETRA/Paraguai como modelo nacional

emergente Victor A. Gómez

Durante as reuniões de olhe! 2012 em Chiang Mai, na Tailândia, foi organizado pelo Diretor Executivo da Aliança Global Wycliffe um jantar dedicado a programas de tradução da Bíblia. Este evento deu oportunidade para os líderes e diretores compartilharem suas opiniões e pensamentos sobre programas linguísticos dentro da Aliança Global Wycliffe. Todas as organizações envolvidas concordaram que os programas linguísticos deviam ter uma orientação holística e que as organizações participantes deviam ter pelo menos um facilitador ou participante posicionado nesses programas para envolver os outros também. A missão integral/holística é uma missão preocupada com o escopo inteiro da necessidade humana (C. Wright), uma nova descoberta da natureza holística do evangelho bíblico e da missão cristã (Movimento Lausanne). De acordo com o Guia de Princípios de Excelência em Desenvolvimento Transformacional da Rede “Accord”, devemos entrar como convidados nas comunidades com as quais esperamos trabalhar, para nos tornarmos posteriormente colaboradores/parceiros, e eventualmente amigos mútuos. A Bíblia nos diz que o SENHOR é bondoso em tudo o que Ele faz; ele defende a causa dos oprimidos, ama o estrangeiro, alimenta a fome, e sustenta o órfão e a viúva. A Bíblia também mostra que é da vontade de Deus fazer estas coisas através de seres humanos comprometidos com tal ação. Deus responsabiliza especialmente aqueles que são nomeados para a liderança política ou judicial na sociedade, mas todo o povo de Deus recebe ordem -- pela lei e os profetas, os Salmos e Livros de Sabedoria, Jesus e Paulo, Tiago e João -- de refletir o amor e a justiça de Deus, através do amor prático e a justiça para os necessitados (Compromisso Cape Town, em outubro de 2010). De acordo com os princípios acima enunciados, a LETRA/Paraguai fez a tentativa de desenvolver uma orientação global centrada na tradução da Bíblia, ajudando simultaneamente através de projetos sociais e educacionais. Discutimos com as comunidades indígenas quais são as suas necessidades, os recursos que elas possuem para satisfazer as necessidades identificadas, e como podemos trabalhar juntos como uma rede para ajudar a fornecer as ferramentas que elas precisam mas não possuem. Como cristãos que vivemos neste mundo, nas palavras da Rede “Accord”: “Reconhecemos todo o sistema de pobreza que governa no mundo. Vemos todo o sistema de barreiras de índole individual, espiritual, estrutural e relacional que impedem as comunidades de alcançarem seus objetivos e nível de satisfação. A partir de nossas áreas de competência organizacional, os nossos esforços na defesa e capacitação abordam tanto as necessidades imediatas como as causas sistêmicas a longo prazo dos problemas que procuramos resolver”. No Paraguai, por exemplo,mobilizamos igrejas locais para ajudar com as necessidades imediatas: alimentos e roupas. Também suprimos dezenas de bolsas de estudo para estudantes secundários e universitários, como forma de fomentar a

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capacitação a longo prazo. Achamos que esses tipos de atividades, por mais cansativas ou exigentes que sejam em termos de tempo, vão dar às comunidades ferramentas práticas que irão ajudá-las a satisfazer as suas próprias necessidades, não dependendo de estrangeiros ou "padrinhos" nacionais que possam abandonar o local quando forem completados seus próprios planos e projetos. Como cristãos baseados na Bíblia, nós também reconhecemos as forças espirituais que se opõem à obra de Deus no mundo, e estamos prontos para lutar contra essas forças com todas as armas que nos foram confiados em Efésios 6.10-18. Algumas forças podem vir das estruturas econômicas e políticas do país, por exemplo, a desapropriação de terras e de leis não-escritas que afetaram e continuam afetando algumas das comunidades indígenas no Paraguai. Acompanhamos os grupos quando fazem protestos por semanas ou meses na frente dos escritórios do governo. Não vamos fisicamente com eles quando estão lidando com os oficiais, mas lhes damos conselhos e também ajudamos as famílias com alimentos e abrigo quando eles exercem o seu direito de fazer ouvir a sua voz. Em sua "filosofia de desenvolvimento das línguas", a SIL descreve as ações realizadas por falantes de um determinado idioma, assim como defensores da língua de fora da comunidade linguística, para aumentar a possibilidade de que a língua possa servir às necessidades sociais, culturais, políticas, econômicas e espirituais e os objetivos da comunidade de falantes. Como a SIL, a Wycliffe também acredita que cada língua tem valor, que cada comunidade linguística deve ser respeitada, e que as comunidades linguísticas devem ter a oportunidade de desenvolver a(s) língua(s) que lhe sirva(m) bem. Acreditamos que facilitar o desenvolvimento da língua, neste terceiro sentido, é uma forma essencial de expressar o amor de Deus e servir às pessoas nessas comunidades linguísticas. Então, como podemos ver, várias organizações têm tentado resumir os princípios de como tornar-se organizações de tradução focadas na Bíblia, participando ao mesmo tempo de outros aspectos da missão de Deus. Muitas pessoas ao redor do mundo sofrem e têm necessidades não satisfeitas. No Paraguai, acreditamos que, apesar da pequena contribuição que uma organização de tradução da Bíblia possa oferecer (devido aos limites em termos de pessoal, recursos e tempo), mais vale um pouco do que nada! Entre as áreas críticas de participação constam a saúde, a nutrição e a educação. Muitos dos jovens que recebem bolsas de estudo estudam enfermagem, e por isso acreditamos que eles podem trazer uma mudança radical para a saúde e nutrição nos próximos anos. Muitos deles também estudam Ciências Educacionais, de modo a ter as ferramentas adequadas para melhorar o sistema de ensino atualmente precário que vemos nas comunidades indígenas com as quais trabalhamos. Sabemos também que o ensino não consiste apenas em ter bons professores; há também a necessidade de instalações mínimas para possibilitar um bom processos de ensino e aprendizagem. É por isso que procuramos fundações, organizações e embaixadas dispostas a ajudar na construção de salas de aula. Temos ajudado quatro comunidades a consertar e renovar suas instalações existentes e também construir novas. Procuramos ajuda nas universidades e seminários que enviam seus alunos com alguns fundos para materiais e mão de obra. Uma embaixada também nos ajudou a obter fundos para a compra dos materiais.

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Mas, como estamos focados na tradução da Bíblia, buscamos as pessoas idôneas dentro das comunidades para estar na liderança dos projetos de construção, e nós só os ajudamos com a administração de fundos e o encorajamento das equipes de voluntários que vêm de vez em quando. Essas atividades, por mais exigentes que possam parecer em termos de tempo e esforço, são ações que nos ajudam a acompanhar mais de perto o modelo de serviço exemplificado por Jesus para os Seus seguidores. Mas também precisamos estar muito conscientes para não nos esquecer de que o nosso foco é a tradução da Bíblia. Descobrimos que as questões sociais podem ter uma atração tão forte, que se pode facilmente esquecer que nosso objetivo é que as Escrituras possam ter um impacto e efetuar uma transformação profunda e sustentável entre as pessoas. Então, quando supervisionamos um projeto de construção de uma comunidade, continuamos também nossas atividades de tradução, uso das Escrituras, concursos de memorização e discipulado.

Como podemos saber se estamos fazendo a coisa certa? Um par de testemunhos breves podem bastar como exemplos: Recebi um elogio indireto, mas encorajador, quando um dos líderes indígenas orou no meio de um culto na área nova da igreja que ajudamos a construir e mobiliar com 15 bancos: "E por favor , Senhor, dá ao Pastor Victor Gómez cada vez mais dinheiro para continuar a ajudar a nossa comunidade e nossos filhos a crescer!" Essa nova área da igreja foi construída por um grupo de 11 voluntários chilenos que trouxeram recursos para os materiais, e os bancos foram comprados pelas próprias pessoas Aché quando suas famílias pagaram uma quantia simbólica por oitenta sacos de supermercado, de 85 quilos cada, que a Igreja chinesa nos tinha dado como donativo. Outro testemunho tem a ver com a crescente responsabilidade a ser tomada pelos líderes indígenas. Martim A., chefe da comunidade Koentuwy, fez uma oferta em moeda local de cerca de US $22 para uma pessoa doente no hospital, dizendo que ele ia usar o dinheiro no dia anterior a apostar num jogo de futebol, mas "uma voz disse para eu ficar com o dinheiro, e hoje entendo que Deus queria usar o meu dinheiro corretamente para ajudar o meu conterrâneo". Eles reuniram quase 350 dólares localmente e decidiram dar o dinheiro para a LETRA administrar, enviando uma certa quantia a cada semana, de acordo com as necessidades. Isso, para nós, é um grande avanço na compreensão da sua fé e da sua responsabilidade para com os outros, porque o jogo de futebol e vôlei ainda é central para a maneira indígena de "divertir-se". Normalmente, eles diziam que a medicina e a assistência aos pacientes é a responsabilidade dos missionários e do governo. Portanto, a “dica” para o ministério holístico é de envolver o maior número possível de pessoas. Descobrimos que muitas pessoas nas igrejas estão mais do que dispostas a servir em projetos de curto prazo, e também que as atividades sociais de curto prazo são bem apoiadas pelos membros indígenas. Assim, aprendemos a montar atividades sociais, feitas por outros, e atividades da Bíblia iniciadas por nós e relacionadas à tradução. Equipes de curto prazo chegam e vão embora, mas nós permanecemos, e somos vistos como aqueles que ajudam e trabalham no sentido de efetuar uma melhoria global das comunidades com as quais trabalhamos!