ÁLVARES MACHADO UMA GRANDE MULTIDÃO DE ROSTOS … · As moças de bem raramente saiam de suas...

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ÁLVARES MACHADO DE OUTRORA UMA GRANDE MULTIDÃO DE ROSTOS E PAISAGENS Fotos: comunidade do Bairro Guaiçara, 1938 Avenida das Américas, em 2006 Prefeito municipal: Luiz Takashi Katsutani. Vice-prefeito: Athos Boigues. Secretário Municipal de Educação: Antônio Pereira da Silva. Presidente da Câmara Municipal: Cecília Setsuko Suzuki Katsutani. Este livro eletrônico é uma contribuição ao resgate e a preservação da memória de Álvares Machado, assentada em vestígios que falam das suas diversas etapas. O que a cidade guarda de si mesma para caracterizar sua personalidade, afirmar sua identidade e o conhecimento do seu EU como um todo. Coletar e armazenar informações sobre a história da cidade, e deixá-las dispo- níveis, significa também produzir fontes para futuras pesquisas. A história da cidade é parte direta da história do país. NO TEMPO LONGÍNQUO A CIDADE NOS SEUS PRIMEIROS PASSOS Uma cidade erguida no sertão, pelo impulso da vinda da ferrovia e composta por gente modesta, de origem em toda parte. Era no princípio, e em suas primeiras décadas, cidade dependente da roça, dos pequenos sítios de agricultura de subsistência, acessíveis por um emaranhado de caminhos estreitos e pequenas estradas que iriam ter um importante papel na expansão sócio-econômica local. Tudo chegava da roça, desde mantimentos à lenha dos fogões, e por vezes, a própria água de beber.

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ÁLVARES MACHADO DE OUTRORA

UMA GRANDE MULTIDÃO DE ROSTOS E PAISAGENS Fotos: comunidade do Bairro Guaiçara, 1938 Avenida das Américas, em 2006 Prefeito municipal: Luiz Takashi Katsutani. Vice-prefeito: Athos Boigues. Secretário Municipal de Educação: Antônio Pereira da Silva. Presidente da Câmara Municipal: Cecília Setsuko Suzuki Katsutani. Este livro eletrônico é uma contribuição ao resgate e a preservação da memória de Álvares Machado, assentada em vestígios que falam das suas diversas etapas. O que a cidade guarda de si mesma para caracterizar sua personalidade, afirmar sua identidade e o conhecimento do seu EU como um todo.

Coletar e armazenar informações sobre a história da cidade, e deixá-las dispo- níveis, significa também produzir fontes para futuras pesquisas. A história da cidade é parte direta da história do país.

NO TEMPO LONGÍNQUO A CIDADE NOS SEUS PRIMEIROS PASSOS

Uma cidade erguida no sertão, pelo impulso da vinda da ferrovia e composta

por gente modesta, de origem em toda parte. Era no princípio, e em suas primeiras décadas, cidade dependente da roça, dos pequenos sítios de agricultura de subsistência, acessíveis por um emaranhado de caminhos estreitos e pequenas estradas que iriam ter um importante papel na expansão sócio-econômica local. Tudo chegava da roça, desde mantimentos à lenha dos fogões, e por vezes, a própria água de beber.

Por muitos anos Álvares Machado esteve ligada dire- tamente à lavoura. Isto condicionou o seu povo que custou a perder o caipirismo. Mas, desde o princípio da fundação do antigo povoado de São Luiz, em 1916, de origem na construção da Estrada de Ferro Sorocabana já se assistia ali uma grande efervescência. Eram os trabalhadores da derrubada da floresta, os proprietários de pequenas glebas, operários que ajudavam o núcleo a nascer do nada, colocando tijolo sobre tijolo, tábua ao lado de tábua. Os maquinistas de café, caixeiros-viajantes que em cada visita encontravam mais gente, mais entusiasmo e mais negócios. Estrangeiros que chegavam dispostos a eleger o solo na fase embrionária de desbrava-mento sua nova pátria. Foram necessários muitos anos para a cidade começar a se modernizar. O fogão aceso a carvão vegetal, por exem- plo, quando surgiu, substituindo o fogão à lenha causou verdadeira revolução que limpou as cozinhas da fumaça e da fuligem. Para serem abastecidos vieram as carvoarias. Depois, a vez dos fabricantes de fogões portáteis de ferro, de fácil locomoção de um lugar a outro. As primeiras ruas tinham os espaços divididos pelos burricos carregando os feixes de lenha que ia ser queimada. Eram soluções corriqueiras desembarcadas junto com os imigrantes e se transformavam em novidades incríveis. Em 1924 o comércio machadense, que apenas emergia, foi saqueado pela tropa revolucionária do General Isidoro Dias Lopes, mais tarde renascendo das cinzas e reiniciando a jornada.

Quase nenhuma comida doméstica podia ser guardada sem o risco de azedar, porque geladeira era coisa restrita dos coronéis, dos seus principais correligionários e dos fazendeiros que foram surgindo no percurso. Em meio a tudo isso havia os proprietários de glebas, umas pequenas, outras maiores, adquiridas dos sucessores de José Theodo-ro de Souza, primeiro desbravador do Oeste de São Paulo.

A jardineira do precursor Antônio Prado: ligava a cidadezinha à zona rural

A exemplo dos coronéis, os fazendeiros tinham banheiro dentro de casa, e contíguos, quartos de dormir e de vestir, dotados de grandes guarda-roupas feitos de marcenaria fina. E mais os gabinetes, uma mistura de biblioteca com escritório particular, o dormitório de empregada, salas de jantar, de almoço, de engomar a roupa, copa, ante-sala da cozinha.

Os pobres continuaram pobres, sem ter oportunidade de evoluírem para uma vida ao menos um pouco melhor. Ao revolvermos a História encontramos edições de jornais (matérias geralmente pagas) destacando as mansões dos fazendeiros e dos coronéis. Eram casas funcionando com a ajuda de criados bem treinados, dentro dos meandros da etiqueta.

Moradias confortáveis em todo o sentido da palavra. Possuíam cômodos corretamente agenciados. Ia-se de uma área de serviço, de estar ou repouso, a outra sem invadir a terceira, um perfeito esquema de corredores e oportunas escadas de serviço. As cozinhas espaçosas e organizadas racionalmente, por indivíduos especializados nesse ramo.

O táxi pé-de-bode : luxo para a época Mas não significava uma novidade, pois ricos sempre moraram bem, dentro

da modernidade de cada época, por- que esta sempre se traduz pelo uso sistemático de tudo que há de bom e de novo. Às vezes, na mesma região das casas modernas, ficavam as habitações do povo comum, geralmente construídas com tábuas e de pau-a-pique. A periferia não tinha denominação correta. E nem podia ser chamado de cidade aquele lençol de casinholas, uma espécie de acampamento arranhando o fundo dos terrenos erodidos. Desde seu princípio Álvares Machado recepcionou uma expressiva parcela de população pobre, mesmo no auge do café, outra fonte de riqueza que gerou uma nova leva de milionários. Desde o começo da formação urbana existia aqui uma gente refinada que se dava ao luxo de comprar roupa nas grandes capitais. No entanto, como acontecia no lado paupérrimo também se confrontava com a ameaça de ter a comida azedada. O refrigerador elétrico, importado de fabricantes norte-americanos só entrou nas casas a partir de 1932. E só nas residências ricas, nas casas pobres apenas se ouvia falar da chegada do lindo aparelho, que possuía o

compressor exposto no alto, fazendo barulho, acordando os velhos de sono leve, toda vez que o dono o colocava para funcionar. Mais tarde veio a enceradeira elétrica que substituiu o pesado escovão feito de ferro fundido que era esfregada comprimindo-a sobre o assoalho, usando ora um chumaço de palha de aço para raspar e limpar, ou uma flanela para polir a cera esfregada com a pessoa de joelhos.

Depois surgiu o aspirador de pó, uma novidade do tempo da guerra. Tudo manipulado pela empregada doméstica, já passando a dormir na edícula, a novidade essencialmente brasileira. Os habitantes pobres compravam no armazém ou na quitanda pelo sistema de cadernetas, onde, no fim do mês, as despesas eram somadas, e na ocasião do recebimen- to, o comerciante costumava oferecer de brinde uma lata de conserva ou uma garrafa de vinho. O açougueiro mandava o menino de bicicleta percorrer a freguesia e ir anotando a encomenda a ser entregue nas casas no dia seguinte bem cedinho. Deixou-se de torrar e de moer café em casa, porque apareceram as torrefadoras que já vendem o café moído. A princípio a idéia não pegou fácil e torrefadores precisaram mergulhar no saquinho de papel, escondidos no meio do pó, brindes, como cálices, miniaturas, bibelôs e pequenas xícaras.

Isso tudo ainda acontecia em meado da década de 30, a época em que o aparelho receptor de rádio já era usado em uma parte das casas de Rancharia. Na década anterior o rádio começara a funcionar timidamente com o emprego de uma pedra galena onde, com duas agulhas e fones nas ore- lhas, o ouvinte procurava o ponto exato da sintonia.

Nos anos 30 as famílias escutavam empolgadas e em conjunto os programas musicais e peças teatrais com uma perfeita sonoplastia e já podia andar nos primeiros táxis, os suntuosos pé-de-bode.

POBRES CONTINUARAM MORANDO MAL . Na casa pobre quase tudo

se realizava em dois, no máximo três cômodos. Ficava-se à vontade na cozinha, tocava-se viola na cozinha, ouvia-se o radinho na cozinha, costurava-se na cozinha, as crianças faziam a lição escolar na mesa da cozinha, toda a família se reunia aos domingos na cozinha para a refeição e ouvir o jogo de futebol.

Estação de trem em construção: inaugurada em 1919

Aqueles da faixa acima da linha vermelha da pobreza moravam em cortiços,

que se compõem de quartos escuros, divididos por um corredor descoberto. Registros mostram porões altos, onde os moradores cozinhavam e guardavam coisas, inclusive as ferramentas de trabalho.

As vendas em várias prestações melhoraram o quadro, em que se misturavam promiscuidade e sujeira. Facilitaram a compra de muitas coisas, permitindo também aos pobres levar para casa o que antes só os ricos possuíam. Hoje são comuns moradias dotadas de modernos aparelhos de som, televisão, geladeira, de forno microondas, misturados aos outros eletrodomésticos. O que, porém, não significa que o proletariado esteja vivendo de maneira confortável nas suas mal construídas casinhas de periferia.

E se percebe outra diferença entre o agora e o passado nesses recantos da cidade. Os vizinhos não são mais do tipo comunitário. Antes, todos se conheciam, se saudavam, se visitavam, se ajudavam mutuamente, as ruas eram espaço de lazer muito utilizados. Nelas se jogava futebol, peteca, rodava pião, pulava corda, amarelinha, soltava papagaio, namorava, a vizinhança sentava na frente das casas para conversar, fazia cabanas de galhos na poda das árvores.

Os testemunhos falam do cinema dominical, pois havia o Cine Jardim, onde está hoje a Praça Getúlio Vargas. O cé-lebre footing na Avenida das Américas. Havia os bailes públicos, com os salões de madeira abertos durante o ano todo, a cidade apresentava ao país a Zona do Meretrício onde geralmente os rapazes se iniciavam sexualmente sem o risco de a AIDs atacar.

Aliás, não existia AIDS, só o perigo de pegar uma doença venérea, mas bastava uma injeção cavalar de antibiótico aplicada pelo farmacêutico amigo, que não contava isso pra ninguém e a moléstia sumia de um dia para o outro.

As moças de bem raramente saiam de suas casas sem estarem acompanhadas de um parente, entretanto, havia igualmente as moças de cabaré, que rapazes e os senhores chamavam de prostitutas de luxo. Ao contrário do que se assiste atualmente elas não ficavam a garimpar parceiros pelas ruas. Preferiam o confinamento no bordel.

Essas personagens zelosas Assumiam na sociedade um papel importantíssimo de entretenimento, ao lado do cine- ma mudo, saudoso Cine Progresso, que ficava onde está hoje a igreja matriz, com um locutor narrando o que a fita mostrava e o som levado ao público por um gramofone. Era uma casa de madeira, onde seu Luiz Bacco, gerente, cuida-va também de apresentações teatrais, por grupos locais e de fora e os bailes de sábado à noite. Mais tarde veio o Cine Jardim, instalado na Praça Getúlio Vargas.

Cine Jardim, em 1942

As moças de família não freqüentavam o footing, festa domingueira na rua principal, porque os pais diziam que aquilo não era coisa de senhoritas de bem. Mas quando terminava a sessão no cinema, sorrateiramente passavam no local com aquele jeito de quem nada quer e se deixavam ambicionar pelos rapazes, que nas idas e vindas rua acima, rua abaixo, tentavam arrumar namorada.

O alto-falante no alto de um prédio, operado por um orgulhoso locutor aumentava o encanto da rua, tocando canções românticas e anunciando a oferta de músicas aos moços e moças desse ambiente que também acabou.

OS RICOS IAM COMER NO RESTAURANTE ITALIANO , de Luiz

Bacco, que na década de 30, estreou nova atividade, a do cinema, em Álvares Machado e Rancharia. A prática do lazer estava indissoluvelmente ligada ao conceito de co- municação humana, sociabilidade, e tinha um fundamental papel na vida das pessoas.

Avenida das Américas (hoje centro comercial) em 1936

O divertimento era feito em comum, sempre partilhado com outras pessoas.

A conversa nas portas das casas era uma instituição de lazer da maior importância, sobretudo nos bairros populares e de classe média mais modesta.

Se o tempo estivesse bom, era só arrastar a cadeira e puxar o assunto com os vizinhos, sobre o clima, a política, o futebol. A conversa podia durar até horas, reforçava os laços de vizinhança comunitária. A informação estava na rua.

Só entrou para dentro de casa com a vinda do rádio e a televisão. Era comum fazer visitas depois do jantar, com as mulheres ganhando dos homens. Ia-se ver um compadre, um amigo, o irmão. Cada moradia tinha os seus habitues que muitas vezes apareciam quando a família ainda estava em volta da mesa de jantar. Era só arrastar a cadeira e juntar-se à prosa, se inteirar das novidades. Nas calçadas, nas ruas, existiam as rodas de conversa, que freqüentadores mais assíduos da área central identificavam de longe.

Eram rodas de dentistas, comerciantes, proprietários de pequenas glebas, de estudantes, amigos que se reuniam para um drinque no Bar do Espiga, ou na casa de um deles. O cabaré também viveu sua gloriosa época de ouro em Rancharia, com ênfase maior nos anos 40. Compunha-se de mulheres cheirando talco, os braços cheios de jóias que ninguém roubava, porque bandido era uma figura incomum. Orquestras tocando ao vivo e existiam até os cabaretiers procedentes de Buenos Ayres, na Argentina.

Era uma mistura bem dosada de bar e pista de dança, os homens compareciam sozinhos, as senhoras e as moças de família nunca freqüentavam. A dama do cabaré era mulher semi-prostituída cuja função principal constituía de atiçar o clima para o consumo de cervejas pelos cavalheiros, ao lado das mariposas. Essa dama, que era dona da casa, só eventualmente acertava um programa sensual.

Já o bordel também chamado zona do meretrício e onde se podia chegar viajando em charrete ou no táxi pé-de-bode, consistia de verdadeiro colégio de mulheres da vida. Elas permaneciam o dia todo ali, sob o olhar vigilante da cafetina e o controle dos rufiões. Havia casas de todos os preços e a partir de certa categoria, tinham como batismo o nome da proprietária: Casa da Sandra, Casa da Débora, Casa da Marta, Casa da Selma e por aí afora.

O CARNAVAL FOI A UMA ATRAÇÃO ANUAL DA CIDADE no seu

passado longínquo, levando a juntarem-se diferen-tes classes sociais. A maior expressão concentrava-se na hoje Avenida das Américas. Era o áureo tempo de escolas de samba e de blocos.

Era uma coisa finíssima. Os carros abertos circulavam lentamente, moças sentadas na capota, rapazes de pé no estribo, caixas de serpentina e saquinhos de confete amon- toados no chão do veículo, tudo movido por um entusiasmo extraordinário e a disciplina que funcionava como marca registrada da festa.

O chão da rua parecia um enorme lençol de serpentina. As famílias se cumprimentavam, os mocinhos iam invadir o carro das mocinhas conhecidas, tudo isso com muito riso, com muitas brincadeiras e blocos fantasiados.

Os ricos aproveitavam para exibir os seus carrões de luxo, o povo comum levava banquinhos e cadeiras para colocar nas calçadas, transportando-os suspensos acima da cabeça. Da mesma forma as festas familiares tiveram um papel importantíssimo no lazer e na sociabilidade. Durante dias, vizinhos preparavam croquetes, doces, empadas, pastéis, para serem consumidos em tais ocasiões. Os adolescentes organizavam brincadeiras com músicas na sala da frente da casa e todos se juntavam para dançar.

Ao movimento se associavam as quermesses, que já no fim da década de 20, ganhavam preferência dos moradores. Eram para arrecadar dinheiro, a ser usado na construção da igreja matriz.

Podia-se sair de casa, a pé, percorrer grande distância e voltar a pé, durante a madrugada, sem risco da presença de bandido no roteiro. Era a Álvares Machado antiga, provinciana, porém, ela foi perdendo a velha fisionomia. Chegaram os malfeitores, o povo se trancou em casa, ficou com medo de ir cumprimentar a rua, ao escurecer.

Ao lado dessas metamorfoses vieram as plásticas urbanas, e os cirurgiões encarregados de operá-las, com a recomendação de melhorar as aparências também foram longe demais. A cidade ainda possui as praças históricas, mas os bancos não são os mesmos, os primitivos se foram, e nada se sabe dessas relíquias que se mantidas, hoje seriam um repositório notável do acervo histórico-cultural.

O entretenimento começou a se estender ao futebol, com a criação, em 1943, do Paulista Futebol Clube, e sua escalação imbatível, com Roca, Cocada, Gordinho, Tico, Jô, Amarílio, Aparecido, Leco, Antenor, Mineiro e Pedro Maz- zaro, como mostra a foto abaixo.

Paulista Futebol Clube em 1943

O carnaval encantava o povo nas ruas

Registros muito desgastados pelo tempo mostram uma cidadezinha rodeada pela floresta a perder de vista no Sertão do Vale do Paranapanema. Córregos e ribeirões seguiam, nos seus cursos solitários, as águas engolindo as sinuosas veredas, sumindo na vastidão da floresta.

Além dos índios, ninguém ousava acompanhar-lhes as pegadas, pois iria deparar-se com a flecha dos índios, ou as garras dos grandes felinos. A terra, um precioso bem, era tesouro que os milênios guardavam e a vegetação protegia contra a chegada da civilização. Um dia, porém, surgiram alguns homens auda- zes para iniciar a ocupação do território longínquo. Os índios reagiram, mas o grupo fincou no solo rústico dessas terras sua baliza demarcatória.

Aqueles homens precursores abriram a primeira picada na floresta, e Logo, caíam os primeiros cedros, perobas, marfins, jaquiris, paudálhos, ipês, jabuticabeiras, mognos, figueiras jacarandás, timbaúvas, bálsamos, um mundo de árvores recobertas de cipós e epífitas, ultrapassando 30 metros de altura.

O córrego Brejão, meandro furando o sertão, ora em linha reta, ora em curvas, umas fortes, outras suaves, possuía nos seus pântanos vastos arrozais nativos, aonde as anhumas, ararunas, outras aves galináceas e os patos selvagens iam se alimentar. O sertão ainda causava medo, provocava arrepios.

Ouviam-se notícias sobre a presença, na beira daquelas águas, de sucuris medindo 12, 15 e até 20 metros de cum-primento. Vivia-se com receio das investidas dos selvagens, à espreita no intrincado da floresta e solidão dos campos que se estendiam para além. Doenças epidêmicas também eram comuns ali. Há referências às psicoses causadas por elas, cuja terapêutica consistia de medicamentos heróicos, como a pimenta malagueta, gengibre, pólvora, raspas dos esporões das anhumas e tabaco de fumo.

Havia também o flagelo dos mosquitos borrachudos que atacavam dia e noite, não dando trégua aos pioneiros. E se do alto das árvores caia sobre alguém um dos bolos de carrapatos, impunha-se à vítima livrar-se da roupa, para que outra pessoa lhe corresse pelo corpo uma bola de cera, arrancando os terríveis insetos. Aplicava-se sumo de fumo de corda nas feridas, na tentativa de aliviar a dor.

Avistavam-se por toda parte as grandes ararunas e as anhumas. Quando essas aves se punham a gritar é que havia onça ou gente pela vizinhança. Num velho escrito sobre o tema, lemos:

A floresta ia buscar na grotesca desordem orgânica, seu fascinante atrativo . Depois da chuva, freqüente em todas as estações do ano, o sertão tonalizava-se de verde melancólico e úmido. Dos galhos dobrados ao peso do or-

valho, desprendiam trepadeiras parasitárias, luxuriantes e floridas, rojando-se ao solo tapeçado de folhas moles e cheirosas.

Num emaranhado de moitas sombrias e compactas, um frêmito apavorante vinha denunciar a multidão dos seres que as povoavam. Pássaros maiores formavam vôos rastei-ros, enxugando as asas, e dos ninhos metidos na ramagem estufada e escura, os cochichos vinham orquestrar-se aos gemidos fundos dos ipês que se abraçavam como gigantes em luta livre. Álvares Machado ainda guarda reminiscências do áureo tempo do cinema, quando as produções brasileiras eram as mais exibidas, para um público fanático pela arte. Ao povo da cidade, se juntava o aglomerado nos sítios e fazendas. Era comum o tilintar de esporas na sala de projeção, pois ali estavam também expectadores que desceram do lombo de seus cavalos e muares, agora amarrados lá na rua em frente, depois da viagem com seus donos da roça ao cinema.

As fitas não tinham voz original, um orgulhoso cidadão da cidade, narrava as cenas, enquanto o som procedia de um gramofone, aquele aparelho esquisito, que já em 1878, Tomás Edison lutava para aperfeiçoá-lo entre suas, depois da tentativa feita em 1856, por Leão Scott. O salão do cinema servia igualmente de ambiente para apresentações teatrais e bailes.

Mesmo ociosa, a estação férrea mantém a sua pose, onde começa a Estrada da Amizade

A FUNDAÇÃO E OS PRIMEIROS ANOS DE ÁLVARES MACHADO foi uma jornada extraordinária. Ainda que já surgissem as primeiras casas de moradia e de comércio, e pressionados pela pressa da civilização, os remanescentes dos índios tivessem desaparecido, no aglomerado recém-formado, as peripécias se iam repetindo, diante das dificul- dades num lugarejo ainda desprovido até mesmo de infra-estrutura elementar. O ano de 1919 amanheceu para o lugarejo que se erguia, sem sorrisos e sem promessas. E foi assim, até os alvores de 1920. O lugarejo resumia-se a poucas casas espalhadas na galharia em desordem que as roças ostentavam. Não havia água potável, nem muitos amores e casamento, pois no meio daquele inferno verde (a floresta nativa) existia uma mulher para cada 15 homens.

As doenças endêmicas grassavam com inusitado índice de óbitos. A terrível úlcera de Bauru não perdoava os que penetravam na floresta, cuja sombra invadiu

os telhados rarefeitos da povoação, se ressaltando a malignidade dos casos que chegavam a 50 feridas na pele de uma só pessoa.

E no meio da sociedade ainda rodeada pela vegetação nativa , as pouquíssimas mulheres que o desprendimento e a coragem iam recrutando para a futura cidade nos dias melancólicos e sombrios, todas as tardes assentavam-se na haste seca caída de enorme figueira de uma roça. Ali elas escutavam o barulho dos felinos, vindos dos fundos das grutas próximas de onde estavam.

As roças de milho circundantes não chegavam ainda ao ponto das ruas que viriam no rumo da atual estação ferroviária. Sob outra figueira de dois metros de diâmetro foram encontradas as ossadas de animais que uma enorme onça, morando ali desde muito tempo, tinha devorado.

Um dia, o sol a pino, quatro homens voltaram da mata em que penetraram seis quilômetros, com as roupas em tiras, lanhados de espinhos, sangrando por todo o corpo. Contaram que foram atacados por três índios xavantes hercúleos e seminus armados de tacape.

Os índios dessa tribo eram destacados da maioria dos outros, pela facilidade de varar o mato em carreira só comparada a da jaguatirica. O pavor dos caboclos se sustentava numa razão forte. Soube-se mais tarde que os xavantes que os atacaram, eram três gigantes chamados Alecrim, Ariri e Penduráh, de coragem e argúcia guerreira a qualquer prova.

Os caçadores desprezaram os avisos recebidos dos primeiros machadenses para não entrarem na floresta, porque lá estavam os xavantes agigantados. Acossados por eles, se danaram a correr. Retornaram ao lugarejo, todos nus como vieram ao mundo, com a diferença de não terem mais toda a pele que antes carregavam no corpo.

As lavadeiras iam aos córregos, onde também se toma- va banho. E quantas delas não tiveram que abandonar a trouxa de roupa por abrir e voltar ofegantes para casa, contando histórias de assobios de macacos imensos, de gargalhadas lúgubres.

Terminada a primeira guerra mundial, o café entrou no solo local a pedir mais espaços, empurrando o povoado para a marcha triunfal que o esperava. Os desbravadores arriaram suas matulas. Começava a nascer para São Paulo uma cidade e para essa cidade uma história que foi sendo escrita em derrubadas e roças, afogadas na grande rede de galhos e troncos que o fogo poupara.

Depois os primeiros ranchos foram sucedidos pelas casas de madeira rarefeitas a se misturar sem plano de conjunto, metrificação e sem ordem.

Comunidade de moradores do Bairro Guaiçara em 1938

...Leva-nos a acreditar, do fundo dos nossos corações, que o homem pode parar no seu tempo e, ao encarar a verdade, exemplifi- cá-la através da ação. Leva-nos a acreditar ainda mais que, na verdade, nada menos que isto jamais satisfará o homem. E acredito ser este o significado da jornada que estamos todos fazendo.

-Henry Miller, historiador.

NO COMEÇO DE 1916, NO LOCAL ONDE SE FUNDOU A CIDADE DE ÁLVARES MACHADO , a Estrada de Ferro Soro- cabana já surgia como ousada desbravadora dos sertões do Estado de São Paulo, compreendidos entre os rios Paranapanema e Peixe. No trajeto eram construídos os acampamentos de ranchos para os operários que abriam os picadões, faziam aterros e cortes, aplainavam o terreno, realizavam tarefas necessárias à construção da ferrovia.

Cercado pela floresta bravia, tendo como única saída o rasgo na vegetação primitiva aonde mais tarde, chegariam os trilhos, um desses acampamentos vivia como se abando- nado durante o dia, enchendo-se de movimento ao cair da tarde, quando os braçais voltavam do trabalho trazendo suas ferramentas, para a refeição final do dia e o repouso.

Os feitores desse serviço distinguiam o acampamento dos demais pela designação de Brejão, ou seja, diversos ranchos juntos e uma reverência ao primitivo ribeirão que cortava as terras. Álvares Machado estava começando a nascer, com o nome primitivo de Patrimônio São Luiz.

O INICIADOR DE TUDO ISSO FOI O MINEIRO MANOEL FRANCISCO DE OLIVEIRA, que em 1916, residindo na cidade de São Paulo, viajou de trem, até o povoado de Indiana, e dali, em lombo de mula, às margens da água do Brejão, para a escolha de uma gleba que compraria da viúva Militânia Cândida Marques. A seleção do local para fechar o negó-cio, veio da informação obtida, de que naquele canto do sertão, a Estrada de Ferro Sorocabana construiria uma de suas estações.

Portanto, Álvares Machado foi ponta de trilhos. O seu traçado urbano acompanhou o de outros núcleos abertos no percurso da ferrovia, um plano geométrico conhecido na época como tabuleiro de xadrez. Com as ruas cortando-se em ângulos retos, era o que se adaptava melhor às con-dições topográficas e sociais urbanas. Segundo a História o povoado viveu intensamente a presença de levas migrató-rias, que procuravam as zonas em desbravamento da Alta Sorocabana.

Aos brasileiros juntavam-se imigrantes de alguns países, caso dos japoneses que começaram a chegar em 1918, após desembarcarem do épico navio Kassato-Maru, no Porto de Santos. Outros, do terminal, foram trabalhar em fazendas de café do Interior do Estado. Mais tarde seguiram o exem-plo dos patrícios se fixando na gleba de Manoel Francisco de Oliveira. Ergueram uma colônia, contribuindo com seus braços fortes, e o talento oriental, com a expansão social e econômica do Povoado São Luiz, depois Álvares Machado.

Sho-Kon-Sai: tradição mantida desde 1918 Em 1918 os japoneses fundaram o cemitério Sho-Kon-Sai aonde sepultaram

os seus mortos até 1935. Nesse ano o presidente Getúlio Vargas entendeu a prática como sendo discriminatória. Determinou que os enterros fossem feitos no Cemitério Municipal de Álvares Machado, necrópole dos corpos de todas as raças. Mantiveram o Sho-Kon-Sai, definitivamente integrado ao seu acervo.

A primitiva Maria-fumaça

EM 1916 QUASE TUDO ALI AINDA ERA SERTÃO BRUTO . Os rios e ribeirões seguiam nos seus cursos solitários, com suas águas engolindo a sinuosa vereda, sumindo na mataria a perder de vista. Exceto os silvícolas, ninguém ousava acompanhar-lhes as pegadas, pois iria deparar-se com as flechas das tribos, ou as garras das onças e outros grandes felinos.

A terra, um precioso bem, era um tesouro que os milênios guardavam, e a floresta protegia contra a entrada da civilização. Mas, guiados apenas pelas

estrelas, alguns sertanistas audazes já chegavam ao território para fincar nele sua baliza demarcatória.

Em 1916, a mata ainda permanecia exuberante e compacta. A floresta causava medo, provocava arrepios. A História refere-se à presença, na beira de pântanos ribeirinhos, de sucuris de 12, 15 e até 20 metros de comprimento. Enormes bandos de galináceos, patos selvagens, e outras espécies de uma avifauna extraordiná- ria, iam se alimentar nos arrozais nativos daqueles alagados.

Existiam, mais, os tuiuiús, gaviões-caramujeiros, as grandes araras, carcarás, marrecos-bico-de-colher. Avistavam-se também, por toda parte, as araraunas e anhumas, que quando se punham a gritar, é que havia gente ou onça pela vizinhança.

No entanto, já caiam os primeiros jacarandás, os paudálhos, canelas, faveiros, perobas, cedros, timbaúvas, jequitibás, caviúnas, ipês, figueiras-brancas, aroeiras, árvores recobertas por cipós e epífitas, muitas ultrapassando 30 metros de altura. Os silvícolas reagiram, porém, aqueles homens que chegavam, se encontrando por acaso, no mesmo local, não detiveram sua marcha.

Sabia-se do extermínio, pelas tribos, de expedições inteiras que tentaram se estabelecer no território ermo e longínquo. “Vivia-se ainda com receio das investidas dos selvagens, à espreita no intrincado da floresta e da solidão dos campos que se estendiam para além”, escreveu Amador Nogueira Cobra, em 1923.

Doenças epidêmicas eram comuns ali. Em Relatos Monço- eiros, Taunay se refere a psicoses causadas por elas, e nas tenta- tivas de reduzir os seus efeitos, usavam-se “remédios heróicos”, como pimenta malagueta, gengibre, pólvora, raspas dos esporões das anhumas e fumo de corda. E quando do alto das árvores caia sobre alguém um dos bolos de carrapatos, impunha-se à vítima livrar-se da roupa, para que outra pessoa lhe corresse pelo corpo, uma bola de cera, arrancando os terríveis insetos.

Num velho escrito encontramos este testemunho: A floresta vai buscar na grotesca desordem orgânica o seu fascinante atrati- vo. Depois da chuva que era freqüente em todas as estações do ano, o sertão tonalizava-se de um verde úmido e melancólico. Dos galhos dobrados ao peso do orvalho desprendiam-se trepadeiras parasitárias, luxuriantes e floridas, indo rojar-se ao solo tapeçado de folhas moles e cheirosas.

No emaranhado das moitas sombrias e compactas um frêmito apavorante denuncia a multidão dos seres que as povoam. Os pássaros maiores formavam vôos rasteiros, enxugando as asas, e dos ninhos metidos na ramagem estufada e escura, os cochichos vinham orquestrar-se aos gemidos fundos dos faveiros que se abraçavam como gigantes em luta livre.

Avenida das Américas em 1949: calçada com paralelepípedos A MAIOR ESSÊNCIA HISTÓRICA DA CIDADE É A ESTRADA DE FERRO. Foi em decorrência dela que Álvares Machado nas- ceu. Como foi explicado, no início, um acampamento, para refúgio dos trabalhadores braçais, um aglomerado de ranchos, a migração para o local, trazida pela certeza da vinda dos trens. Surgiu um povoado e dele, a cidade, ainda no meio da floresta e os picadões abertos para o trânsito da franja pioneira. Os bichos e os índios se assustaram, reagiram, atacaram, registrando-se baixas nos dois lados, mas os desbravadores continuaram resistindo e venceram. Durante o dia os ranchos precursores ficavam vazios. Os operários estavam na floresta, fazendo os aterros e os cortes, por onde o leito da ferrovia iria passar. Quando a noite chegava todos voltavam a esses pousos, que a exten- são dos trilhos esvaziaria definitivamente, entretanto, agora havia mais casas, as do povoado de São Luiz, obra do migrante de Minas, Manoel Francisco de Oliveira, iniciada em 19 de março de 1916. Uma medida inicial sua foi construir uma hospedaria, para servir de apoio aos que desciam do trem, dos carros-de-boi e lombo de eqüinos em que viajavam, a procura de se tornarem colonos ou de glebas para comprar. Havia ainda os que apareciam, após dominarem longas distâncias a pé, se juntando aos que já estavam ali. As fontes históricas descrevem o Patrimônio São Luiz, em 1922, como um disperso aglomerado de 15 a 20 casas, erguidas com madeira e barro. Uma estreita abertura na mata, a quem davam o nome de picadão, terminava no luga-rejo e conforme o progresso foi chegando se transformou numa rua, hoje a Avenida das Américas. Era de chão batido, com troncos de árvores derrubadas, nas laterais. Depois vieram a farmácia, a quitanda, a casa de tecidos, o cruzeiro no ponto da floresta onde surgiria a primeira igreja. Há, contudo, uma ressalva. Se a História aponta 19 de março de 1916 como o dia da chegada de Manoel Francisco de Oliveira, para fundação do povoado, as mesmas fontes observam que só em 1921 ele abriu o primeiro loteamento urbano. Ali o Povoado São Luiz começava efetivamente a nascer. Inaugurada em 1919, a estação da Estrada de Ferro Sorocabana já operava precariamente, com o trem de lastro e o nome de Brejão.

Também em 1921 o Governo do Estado substituiu aquela designação pelo nome de Álvares Machado. Foi homenagem a Francisco de Álvares Machado e Vasconcelos, notável personagem do Brasil, conforme resumo de sua biografia, abaixo: Nascido na cidade de São Paulo, em 1791, era filho do cirurgião-mor Joaquim Theobaldo Machado e Vasconcelos e Maria Álvares da Silva Bueno. Ela, neta na sexta gera-ção, de Amador Bueno, personagem de expressiva atuação, na política e na ciência no Governo do Império, que deu-lhe a insígnia de “O Aclamado”. Francisco de Álvares Machado e Vasconcelos era mé-dico-cirurgião. Foi pioneiro da oftalmologia, no Brasil. Se destacou também na política, elegendo-se deputado geral, em várias legislaturas, no período de 1834 a 1846. Em 1840 assumiu a presidência da Província do Rio Grande do Sul, onde seria substituído pelo Duque de Caxias. No auge de sua atividade parlamentar, morreu em 4 de julho de 1846.

A abertura na mata: tarefa inicial para fundação do núcleo urbano

O POVOADO DE SÃO LUIZ AGORA ERA A EMERGENTE CIDADEZINHA DE ÁLVARES MACHADO, ao lado da ferrovia e das águas do Brejão. Veio 1927. Apenas oito anos, desde a chegada de Manoel Francisco de Oliveira àquele trecho do Sertão do Vale do Paranapanema. Agora os moradores defendiam a ascensão do lugar a Distrito de Paz, no Município de Presi-dente Prudente a quem seu território pertencia. Nessa campanha os novos líderes locais se juntaram a Manoel Francisco, o audaz mineiro de Alfenas e o Governo do Estado efetuou a promoção, através da Lei 2.242, de 26 de dezembro de 1927. Anos depois as mesmas lideranças e o apoio de outros destaques que surgiram, iniciaram o movi-mento, para elevar o distrito à casta de município. O êxito se repetiu. O Município de Álvares Machado foi instituído pelo Decreto-Lei Estadual, 13.334, de 30 de novembro de 1944,

reunindo os distritos de Coronel Goulart e Alfredo Marcondes, separando-se de Presidente Prudente. Ao vasculharmos a História, podemos dar este resumo para a fundação da cidade, conforme também o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE):

-Álvares Machado surgiu de uma porção de terras, da antiga Fazenda Pirapó-Santo Anastácio, comprada em 1916, por Manoel Francisco de Oliveira. Essa gleba ficava no lugar denominado Brejão. Aquele colonizador chegou ali, procedente do Povoado de Indiana, onde era lavrador numa fazenda de café. Como não havia estrada e a ferrovia em construção ainda estava distante, ele foi em lombo de muar até o Brejão, se desviando da agressão da tribo dos índios Coroados.

Formalizada a compra da gleba junto a viúva Militânia Cândida Marques, mulher de Manoel Pereira Goulart, pai de Francisco de Paula Goulart, fundador de Presidente Prudente, Manoel Francisco de Oliveira transferiu-se com sua família para o Brejão. Derrubou a mata, numa área de dois alqueires, construiu residência e um estabelecimento comercial. Isto levou outros imigrantes a se instalarem no lugar, se iniciando a formação de um povoado, que ganhou impulso em 1919, com a construção e entrada em operação da estação da Estrada de Ferro Sorocabana.

Em 1921, Manoel Francisco de Oliveira abriu um lotea-mento, vendeu diversas parcelas e deu ao lugar o nome de Patrimônio São Luiz. Nesse mesmo ano o Governo do Estado de São Paulo conferiu à estação o nome Álvares Machado, que daí em diante passou a ser também o da localidade de São Luiz.

A Lei Estadual 2.242, de 26 de dezembro de 1927, criou o Distrito de Paz de Álvares Machado, que foi promovido a município pelo Decreto-Lei 14.334, de 30 de novembro de 1944, tendo como distritos, Alfredo Marcondes e Coronel Goulart, separando-se de Presidente Prudente.

Há uns grandes pássaros chamados de emas e que correndo não os apanha

um cavalo, por mais veloz que corra, porque na carreira levantam esses ditos pássaros uma de suas asas que de longe parece uma embarcação à vela que corre com bom vento. Seus ovos são do tamanho de um punho. - Antônio José Juzart.

ÁLVARES MACHADO DE OUTRORA

Tropeiros despontam no povoado ao amanhecer

Registros históricos esclarecem que já em 1916, o ano da vinda de Manoel Francisco de Oliveira, para o Brejão, chegaram também outras famílias, incluindo algumas de imigrantes japoneses, que estavam no Brasil desde 1908. O precursor Itiro Hoshino foi o puxador desse êxodo e logo se entusiasmou com a qualidade das terras. Comprou tam-bém da viúva Militânia Cândida Marques, 3.000 alqueires, posteriormente, mais 2.000 alqueires, ocupando o solo com agricultura, sobressaindo-se os cafezais. Nos passos de Hoshino vieram ainda em 1916, Issotaro Ide, Saoko Aoki, Tomozo Aoki, Sanzo Hirata. Eles iniciariam a formação da Colônia Japonesa de Álvares Machado, que se desponta como uma das mais influentes do País. Daí em diante mais levas de imigrantes do Japão e outros países foram desembarcando no Brejão. O êxodo cresceu, depois de aportar, em Santos, dia 10 de junho de 1918, o célebre navio Kassato-Maru, transportando 752 pessoas. Na seqüência dessa jornada, Issotaro Ide comprou 50 alqueires, mais tarde aumentou o tamanho da gleba e foi buscar 15 famílias de conterrâneos nas fazendas de café do Interior de São Paulo. As fontes mostram que em 1925, existiam 30 famílias no Brejão, se deparando com sérias dificuldades. Uma, estava na necessidade de vencer a flo-resta até a povoação de Indiana, para comprar alimentos não produzidos nas terras e equipamentos de trabalho. A viagem demorava de dois a três dias, sob o olhar dos índios. As famílias levavam os mortos para serem enterrados no cemitério de Presidente Prudente, que ficava onde está atualmente a estação rodoviária, na Avenida Brasil. Uma grande proeza. Os corpos eram transportados em lombo de eqüinos, carro-de-boi e a pé. Aí desenvolveu-se o plano de abrir um cemitério próprio, obtendo-se autorização do Município de Conceição de Monte Alegre, distante cerca de 200 quilômetros do Brejão. Surgiu, então, em 1918, o Sho-Kon-Sai, fechado pelo presidente Getúlio Vargas em 1935.

Templo budista: símbolo dos japoneses em Álvares Machado

Colônia japonesa recepciona o governador Adhemar de Barros em 9 de dezembro de 1950

Igreja de São José de Álvares Machado em 1942 As primeiras viagens dos japoneses ao Brasil e sua con-centração também no

Brejão, em Álvares Machado, se deu por meio de um acordo assinado entre o Governo do Estado de São Paulo e a Kôkoku. Companhia de Imigração Japonesa, de Tókio. O segundo embarque oficial, em 1918, no Kassato-Maru, foi no Porto de Kobe, capital da Prefeitura de Hyogo, na época a quinta cidade mais populosa daquele país.

De Santos os imigrantes foram trabalhar nas fazendas de café, e mais tarde, decidiram mudar de atividade. Uma das escolhas consistiu de formar as colônias.

Integrados aos brasileiros e outras raças, ajudaram a impulsionar a econo-mia da região. Logo estavam lançando na terra as sementes trazidas do Japão, melhorando a qualidade da agricultura regional. Isso aumentava, paralelamente, o entusiasmo de Manoel Francisco de Oliveira, que ia divulgando a fertilida-de do solo recém-desbravado e vendendo glebas.

O BAIRRO DO BREJÃO, CERNE DE ÁLVARES MACHADO, recebeu a primeira escola, de nível particular, criada pelo professor Ferraz, em 1921. A um quilômetro, em 1923, foi fundada uma escola pública, mista, e nela matriculados 30 alunos, dirigidos pelo professor Merissani Mello Camargo. Tudo começaria a se consolidar, com a instituição do muni- cípio, conforme está em parte anterior, pelo Decreto-Lei 14.434, de 30 de novembro de 1944.

Essa separação de território, se conferindo a Machado autonomia político-administrativa, veio da fixação do novo quadro da Divisão Territorial, Administrativa e Judiciária do Estado de São Paulo. O então administrador do Distrito de Álvares Machado, Oscar Figueiredo e Silva passou a acu-mular a função de dirigir o município, como seu prefeito, por nomeação do Interventor no Estado, Fernando Costa. Ficou no cargo até março de 1947.

Naquela data o novo Interventor Estadual, Adhemar de Barros substituiu Silva, na missão de prefeito, por Onofre Pereira de Mendonça. O entusiasmo no lugar trouxe mais uma campanha, dessa vez para escolha do prefeito por voto popular. Isto se deu em 9 de novembro de 1947, e o eleito foi Milton Pinto de Almeida Castro, sucedido no fim do mandato por Antônio Miro Mazzaro.

Desenvolvia-se uma jornada colossal de pós-desbrava-mento e seqüência da colonização, nesse trecho do Sertão do Vale do Paranapanema. A infra-estrutura melhorava e dela fazia parte a construção de novos estabelecimentos de ensino. A educação tinha primazia no governo. Em 1957 havia no município 3 grupos escolares, 1 com 22 salas de aula, outro com 8 e o terceiro com 5 salas, e uma escola no Distrito de Coronel Goulart.

Eram, no geral, 16 escolas estaduais, 14 municipais, 3 cursos de alfabetização de adultos e 1 curso popular do Sesi (Serviço Social da Indústria). Também em 1957 o criou-se o Ginásio Estadual de Álvares Machado.

REFORÇANDO A HISTÓRIA : a iniciativa de alterar o nome de Brejão, veio de uma herma ao extraordinário vulto nacio-nal, Francisco de Álvares Machado e Vasconcelos, dada ao povo local pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. O busto de bronzo, apresentando ombros, costas e peito do homenageado, foi colocado na Praça Getúlio Var-gas, dia 4 de julho de 1946, com a inscrição:

Nasceu a 21/X1/1791. Morreu a 4/VII/1846. O Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo rememora o insigne paulista e entrega este bronze ao povo de Álvares Macha-do – 4/VII/1946.

Foi igualmente numa reverência a francisco de Álvares Machado e Vasconcelos que o presidente do Estado de São Paulo, Washington Luiz batizou com seu nome a estação da Estrada de Ferro Sorocabana, construída no Patrimônio de São Luiz, fundado pelo migrante de Alfenas, Minas Gerais, Manoel Francisco de Oliveira.

Caboclinha da roça: um tipo comum no ciclo do povoamento

CARACTERÍSTICAS DA CIDADE

Álvares Machado é uma cidade de porte pequeno, mas dotada de características extraordinárias. Fica na margem de uma rodovia que compõe o mapa das mais influentes do País, Raposo Tavares-SP-270, de ligação fácil também com todo o Estado do Paraná, os países Argentina, Paraguai, Uruguai e que associados ao Brasil e Venezuela, formam o pacto econômico Mercosul (Mercado Comum do Sul).

No seu itinerário a Raposo Tavares se articula em Santa Cruz do Rio Pardo Prudente com a Castello Branco, leva a Grande São Paulo. Em sentido contrário, conduz à margem do rio Paraná e pela Ponte Maurício Joppert sobre aquelas águas chega ao Mato Grosso do Sul, no lado oposto.

Além disso, a cidade fica no trajeto da Hidrovia Tietê-Paraná, uma imensidão navegável de 2.400 quilômetros, com uma área de influência de 70 milhões de hectares, nos Estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Goiás.

Uma situação especial, que a maioria das cidades não possui. Esta distinção singular sugere que investir em Álvares Machado posiciona o empreendedor num vasto horizonte, o que seu eixo rodoviário já é suficiente para assegurar. As terras locais são de desbravamento recente. Estão numa das últimas fronteiras de colonização do Estado de São Paulo, o antigo Sertão do Vale do Paranapanema, área que primitivamente media 109.000 quilômetros quadrados, 27.400, no território paulista.

Da mesma forma a história da cidade tem um acervo bastante rico, vinculando-se a ele, a célebre jornada dos bandeirantes e dos padres jesuítas, membros da Companhia de Jesus, nos tempos de doutrinação dos índios selvagens.

Um braço da Rodovia Raposo Tavares, desde Presidente Pru-dente, dá acesso ao rio Paranapanema e transpondo-o, chega-se ao Norte-Noroeste do Estado do Paraná. Esse rio e seu vizinho rio Paraná, ostentam quatro usinas hidrelétricas: Taquaruçu, Capivara, Porto Primavera e Rosana. O rio Paraná, em outro sentido ostenta também a Hidrovia Tietê-Paraná, de 2.400 quilômetros iniciais.

A cidade é todo um mundo. Através dela e seu eixo rodoviário, chega-se facilmente ao restante do País. Afora a malha oficial, há e uma rede de estradas

vicinais, que cortam a região, se entrelaçando com a Noroeste, Alta Paulista, Alta Sorocabana e Pontal do Parana-panema. Em nível de Estado de São Paulo, Álvares Machado compõe o Sudoeste, no plano regional a Alta Sorocabana, Zona Fisiográfica Pioneira e possui dois vizinhos deveras especiais: um, é o Marcado Comum do Sul (Mercosul), o outro, a Hidrovia Tietê-Paraná, já em fase adiantada de elaboração. Situa-se também na abrangência da 10ª Região Administrativa, grupo formado por 51 municípios.

EM NÍVEL DE BRASIL A CIDADE FICA NO SUDESTE , região que ocupa somente 11% do território brasileiro, com menos de 1 milhão de quilômetros quadrados de área total, compreendendo os Estados de São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas.

Região brasileira mais populosa – Com uma população fixa de 55 milhões de habitantes, o Sudeste absorve 44 em cada cem brasileiros e reúne os três primeiros estados do país em número de moradores. A densidade demográfica brasileira é pequena, já que não chega a 16 habitantes por quilômetro quadrado, no entanto, a Região Sudeste alcança a marca de 59 habitantes por quilômetro quadrado. O equivalente a duas vezes a densidade de um país desenvolvido, como os Estados Unidos da América.

Região mais industrializada – Além de região brasileira onde fica a

agricultura mais desenvolvida, o Sudeste se destaca pela sua notável expansão industrial. Cerca de 80% dos capitais aplicados nas indústrias de transformação e três quartos dos operários em atividade estão nesta região. Com um parque concentrado nas três cidades mais populosas, que são Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro a industrialização assemelha-se à dos países desenvolvidos do Hemisfério Norte.

Região economicamente desenvolvida – Como nenhuma outra região

brasileira, o Sudeste exerce uma forte atração sobre as populações de áreas de progresso inferior. Isto vem provocando a superpopulação dos grandes complexos industriais do Sudeste, e, em conseqüência existe disseminação das favelas, reunindo todos os problemas sociais que as caracterizam.

Necessário mencionar também, um aspecto problemático local: o padrão de desenvolvimento não é uniforme em todas as partes da região, havendo desigualdades entre estados e porções internas.

Mas, o Sudeste é a região brasileira que possui maior índice de escolas, de melhor atendimento médico-hospitalar e com melhores condições para a pesquisa tecnológica. E possui a maior frota de meios de transporte e sistema de comunicações mais aperfeiçoado.

Como a industrialização o segmento econômico oferece maior número de vagas de emprego e 84% dos habitantes vivem nas cidades. É uma circunstância que facilita o seu atendimento físico e cultural.

ÁLVARES MACHADO DE OUTRORA – ÁLVARES MACHADO DE HOJE

O município fica numa região de grandes hidrelétricas EM NÍVEL DE REGIÃO LOCAL Álvares Machado apresenta quatro

tipos mais importantes de solos, descritos assim pelo Serviço Nacional de Pesquisas Agronômicas:

LR – Latosol roxo (terra roxa). Solos bastante profundos, com até 20 metros, argilosos, bem drenados, com porosidade da ordem de 65% a 70%, constituídos a partir de rochas eruptivas básicas, contando com grande quantidade de metais pesados. No Oeste Paulista, ocupam uma larga faixa junto ao rio Paranapanema.

Esses solos têm relevo ondulado, declives longos e altitudes de 450 e 900 metros acima do nível do mar. Pouco resta da vegetação original, a mata latifoliada tropical que se compunha do cerradão e cerrado. Ela foi substituída por lavouras, incluindo o café, algodão, arroz e milho, e grandes extensões de pastagens e criação de gado.

LEa – Latosol vermelho escuro (fase arenosa). Solos originados do arenito de Bauru, profundos, arenosos, permeáveis, possuindo fraca resistência à erosão. Ocorrem no planalto ocidental em três manchas separadas, na parte noroeste, norte e central do Estado, com uma área de 47.800 quilômetros quadrados, 20% do território paulista.

PMI e PIN – Este é um grupamento formado de solos arenosos, desenvolvidos a partir de arenitos, cimento calcário e podzolização acentuada com alta saturação de bases.

PIN – Solos podzolizados de Lins e Marília, variação Lins. São bem drenados e arenosos com profundidades variáveis de dois a três metros, ocupando uma área de 26.300 quilômetros quadrados. Revelam manchas contínuas,

associadas com a variação Marília e o LEa, ocorrendo em 151 municípios, em áreas de 300 a 600 metros de altitude.

Como predominantes, contém culturas de algodão e amendoim. Em tais solos verifica-se a transformação de zonas de cultivo de pastagens, pelo seu empobrecimento gradativo e pouca renovação da fertilidade. Eram solos originalmente cobertos pela floresta do tipo latifoliada tropical semi-decídua, agora praticamente inexistente como reservas.

PMI – Solos podzolizados de Lins e Marília, variação Marília, que são pouco mais rasos que a variação Lins. Registram-se em 141 municípios, em manchas contínuas entre a variação Lins e o Latosol. Cobrem área de 21.000 quilômetros quadrados. Originam-se de arenitos de formação Bauru, com cimento calcário, constituído em relevo ondulado, com altitudes variando de 300 a 900 metros.

Solo do município ocupado por cafezal, no auge dessa cultura, na década de 20

DOIS VIZINHOS ESPECIAIS MERCADO COMUM DO SUL , um notável pacto econômico formado por

Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. HIDROVIA TIETÊ-PARANÁ , um traçado navegável de 2.400

quilômetros, com área de influência de 70 milhões de hectares, nos Estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Goiás e Minas Gerais. Complexo enorme que integra também ao Sul, as províncias de Buenos Aires, Neuquem, Córdoba, Mendonza e Bahia Blanca e as imensas regiões do Brasil Central, uma soma de 80 milhões de habitantes.

A relação direta da região, com a Hidrovia decorre da presença na área de ação do rio Paraná. Estudos oficiais indicam que, em breve, aquele rio estará para a América do Sul, como o Reno e o Danúbio, recém-ligados pelo Canal do Meno, estão para a Europa.

A INFLUÊNCIA DA HIDROVIA NA REGIÃO

A Hidrovia Tietê-Paraná é todo um mundo, gigante de 2.400 quilômetros, que quando concluída, vai ligar o Estado de São Paulo com as regiões Centro

Oeste e o Sul do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Será uma rota privilegiada de integração do Estado com o Mercosul.

A nova e moderna definição geo-política-econômica jurisdiciona uma população de 200 milhões de habitantes e um PIB (Produto Interno Bruto) próximo de US$ 1 trilhão. Criado pelo Tratado de Assunção, em 26 de março de 1991, o Mercosul é considerado das mais importantes uniões do mundo contemporâneo.

A partir de 1º de janeiro de 1995, o Mercosul (Mercado Comum do Sul) começou a funcionar como zona de livre comércio e união aduaneira, visando a globalização das economias. O primeiro ponto positivo está diretamente relacionado ao crescimento comercial, pois o bloco troca entre si cerca de 10 bilhões de dólares.

A conclusão da eclusa de Três Irmãos interligando os rios Tietê e Paraná, possibilita a sua navegabilidade desde Conchas até o lago de Itaipu,e na direção de Minas Gerais pelo Rio Grande do Sul e Goiás, através do rio Parnaíba, chegando a São Simão - Água Vermelha, respectivamente, com uma malha de 2.400 quilômetros.

É um sistema de navegação, formado a partir de conjunto de eclusas, unindo rios e reservatórios, estes estabelecidos nos rios Tietê, Paraná e trechos do Parnaíba, Grande e do Paranapanema, também afluentes do Paraná e Tietê.

Será efetuada a conexão com outros modos de transporte, o que vai possibilitar ainda a ligação com São Paulo, o Porto de Santos e no outro extremo, com a Hidrovia Paraná-Paraguai onde, à curto prazo, estarão navegáveis mais de 5.500 quilômetros. Já são transportados cerca de 5 milhões de toneladas anuais, destas, 1,2 milhão de toneladas de cargas de longo curso, incluindo farelo, soja, outros grãos em geral, os fertilizantes e calcário agrícola, usando-se uma frota de 30 empurradores, 120 chatas com 85 toneladas de capacidade, através de 190 terminais hidroviários instalados.

A região que compõe o Mercosul é servida pelo sistema de navegação fluvial dos rios Paraná e Paraguai. Ao Sul, compreende, as províncias de Buenos Aires, Neuquem, Bahia Blanca, Mendonza, Rosário, Córdoba, na Argentina, além de todo o Uruguai, e ao norte, as vastas regiões do Brasil Central, Triângulo Mineiro, Mato Grosso do Sul, Goiás, Mato Grosso, e os Estados do Paraná e São Paulo.

A área de influência do Mercosul ultrapassa a soma de 500 milhões de hectares, com mais de 60% dos solos agricultáveis. Nessa região deve ser fomentado o chamado “agrobusiness”, o que elevará substancialmente o valor agregado da produção. Breve o rio Paraná estará para a América do Sul, como o Reno e o Danúbio, recém-ligados pelo Canal do Meno, estão para a Europa. E é aí na presença do rio Paraná servindo a região que Álvares Machado e sua área de influência aparecem nesse enorme com- plexo de navegação e perspectivas de amplo desenvolvimento econômico e social. Há outro vizinho nobre, o rio Paranapanema e nos dois, como se explicou estão as hidrelétricas Porto Primavera, Rosana, Taquaruçu e Capivara, parte do sistema hidroviário Tietê-Paraná.

Ao lado de tudo isso existe um macro-zoneamento indicativo elaborado recentemente pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Administração Municipal (Cepam), da Fundação Prefeito Faria Lima, por solicitação do Consórcio Intermunicipal Tietê-Paraná, para os municípios lindeiros da Hidrovia.

No estudo “Pontal do Paranapanema – Zoneamento Ecológico-Econômico” está escrito que o referido macro-zoneamento sugeriu áreas específicas a agropecuária, ao manejo controlado, e áreas especiais de preservação. Segundo a mesma fonte, com relação aos municípios da área de estudo as propostas são as seguintes:

-Incremento e reequipamento dos assentamentos existentes. (Os núcleos da reforma agrária).

-Incentivo ao turismo ecológico pelas atividades monitoradas e implantação de áreas de lazer.

-Instalação de um terminal intermodal, incentivos à instalação de indústrias e agroindústrias e criação de cooperativas agrícolas.

-Um centro de tecnologia de apoio a pequenos proprietários, assentados, melhora de estradas vicinais e infra-estrutura turística.

Sobre os benefícios para a Área de Estudo, o trabalho cita que dentro do Estado de São Paulo serão beneficiados diretamente 108 municípios afastados até 150 quilômetros da Hidrovia Tietê-Paraná, e a facilidade de acesso através de vários meios de transporte.

A Companhia Energética de São Paulo (Cesp) elaborou um Plano de Fomento integrador do sistema de navegação dirigido às regiões em que esses municípios estão. São principais objetivos:

-Estimular a criação de pólos industriais e turísticos, com ênfase maior nos aeroportos.

-Facilitar a inserção do Interior na rota do Mercosul.

Hidrovia: uma característica da região -Proporcionar aumento da produtividade agrícola por meio da melhoria do

acesso aos insumos agrícolas e a irrigação. -Incentivar produção de pescado e o reflorestamento. O plano menciona atividades e oportunidades de investimentos relacionados

à Hidrovia nos setores de transportes, de apoio, de infra-estrutura de indústrias mais diretamente relacionadas aos tipos de cargas transportadas e ao turismo. E

prevê a instalação de 27 pólos industriais, 21 pólos de insumos agrícolas e 6 regiões de irrigação. A Área de Estudo está contemplada com pólos industriais, turísticos e de insumo agrícola.

Tem uma característica física marcante, que é o arenito-caiuá, cujas formas de relevo se assemelham às procedentes do arenito-bauru. O geógrafo José Ferrari Leite explica que a monotonia só é quebrada pelo Morro do Diabo, 415 metros de altitude e o Morro Santa Ida, 360 metros, os dois no município de Teodoro Sampaio.

ESTRADAS DE FERRO

A região polarizada de Álvares Machado é servida por quatro ferrovias que a partir de um traçado aproximadamente paralelo, convergem para a região da Grande São Paulo. Existem, então, quatro estradas ocupando faixas paralelas de cerca de 90 quilô- metros e dirigidas também para o Estado do Mato Grosso do Sul.

Corre entre o rio do Peixe e o rio Paranapanema, a Estrada de Ferro Sorocabana, seguindo desde a fronteira do rio Paraná até São Paulo. Em Ourinhos, início da chamada Alta Sorocabana, um ramal penetra no Norte do Paraná e outro se liga com a Rede de Viação Paraná-Santa Catarina.

Acima da Estrada de Ferro Sorocabana, entre os rios Peixe e Aguapeí, existe um ramal da Estrada de Ferro Paulista, que partindo de Bauru, atinge a barranca do rio Paraná, servindo as cidades de Adamantina, Marília, Tupã e Dracena. Entre os rios Aguapeí e Tietê, passa a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que nascendo em Bauru, serve as cidades de Lins, Birigui, Araçatuba e Andradina, para depois cruzar o rio Paraná, cortar o Estado do Mato Grosso do Sul e terminar em Corumbá, onde se interliga com a Brasil-Bolívia que segue até Santa Cruz de La Sierra. Na zona setentrional do Oeste de São Paulo, que é a sede de Machado aparece finalmente a Estrada de Ferro Araraquarense se interligando à Estrada de Ferro Paulista, na região de Araraquara, servindo Catanduva, São José do Rio Preto e Votuporanga.

ESTRADAS DE RODAGEM

As rodovias dessa região seguem paralelamente às estradas de ferro. A Washington Luiz caminha paralelamente a Estrada de Ferro Araraquarense. A Marechal Rondon, marcha ao lado da Estrada de Ferro Noroeste, a Raposo Tavares acompanha o trajeto da Estrada de Ferro Sorocabana.

As transversais mais influentes são as de ligação com o Norte do Paraná, através de Presidente Prudente, estendendo-se a São José do Rio Preto. A ligação Assis-Marília e a do Paraná ao centro do Estado de São Paulo, pela transversal Ourinhos-Bauru, seguindo depois para Jaú e Araraquara.

Extrapolando o âmbito estadual existem mais duas importantes ligações. De um lado, aquela pelo interior do país, de Porto Alegre a Brasília e a Belém, que no trecho paulista, passa por Presidente Prudente e São José do Rio Preto e, de outro lado, a que leva ao Mato Grosso do Sul.

A densa rede ferroviária do Sudeste, desenvolvida sobretudo pela expansão do café, representa mais da metade de todas as estradas de ferro do Brasil. O Sudeste conta ainda com cerca de 40% das rodovias do país. Exemplos: Rodovia dos Imigrantes e Rodovia Castelo Branco, entre outras, são compatíveis com as melhores e mais seguras da América. O seu incremento industrial, associado a uma política francamente exportadora do instituída pelo governo federal, vem operando como alavanca da grande expansão portuária. Outras rodovias de acesso a Álvares Machado: Comandante João Ribeiro de Barros (SP-294) – Liga entre si os municípios da Alta Paulista, cidades de Tupã, Bauru e Marília, conseqüentemente, a capital de São Paulo. Assis Chateaubriand (SP-425) - Liga vários municípios a Álva-res Machado. Exemplos: Iepê, Rancharia, Indiana, Martinópolis, Caiabu, Osvaldo Cruz, Araçatuba, indiretamente São José do Rio Preto e Minas Gerais. E,mais, as cidades da coligação Pontal do Paranapanema.

Raposo Tavares (SP-270) – É a rodovia principal, unindo entre si os municípios da Alta Sorocabana, nos sentidos capital do Estado e Mato Grosso do Sul.

Integração (SP-563) – Vai de Teodoro Sampaio a Andradina e no seu percurso, passa nas cidades de Marabá Paulista, Presidente Venceslau e Tupi Paulista.

Homero Severo Lins (SP-284) – Liga a Assis Chateaubriand (SP-425) aos municípios Rancharia, Paraguaçu Paulista, Quatá e João Ramalho. Termina na Raposo Tavares (SP-270), em Assis.

Júlio Budisk (SP-501 – Une a Assis Chateaubriand (SP-425) à Comandante João Ribeiro de Barros (SP-294), na região da Alta Paulista). Passa em Álvares Machado, Alfredo Marcondes, Santo Expedito, Flora Rica e Irapuru.

Outro complemento interessante está nas rodovias SP-272 e SP-613. A última corta a Reserva Florestal do Morro do Diabo e termina em Rosana, na margem do rio Paranapanema, divisa com o Estado do Paraná.

ESTUDO ESPECIAL DA COMISSÃO INTERESTADUAL DA BACIA

PARANÁ-URUGUAI (CIBPU) descreve o Oeste do Estado, como um território que embora já sendo desenvolvido, apresenta características de região de desbravamento recente, possuindo toda a vitalidade das zonas onde nem todos os fatores naturais foram explorados.

Para a CIBPU, a colonização relativamente recente, imprime taxas de crescimento do produto considerável, entretanto, já houve modificações no setor agrícola, com a introdução de técnicas e culturas que empregam menos mão-de-obra. E deu-se um êxodo de população que ultrapassou as fronteiras estaduais em busca de novas frentes agrícolas, no Norte do Paraná e Mato Grosso do Sul.

A ação do governo introduzindo incentivos capazes de atrair indústrias para a região, não só contribuirá para estabelecer um maior equilíbrio na ocupação territorial, como poderá manter ou elevar a taxa de crescimento regional com efeitos diretamente sobre toda a economia.

Segundo aquela fonte, a região constitui importante mercado consumidor. É rica em matéria-prima de origem agrícola e que tem uma infra-estrutura necessária

para o sucesso de um ou de muitos programas que visem a industrialização regional. A agricultura é desenvolvida com uma elevada produção em importantes matérias-primas para a indústria. A pecuária é o esteio da economia local. Frigoríficos localizados na área industrializam esta matéria-prima, que é consumida em todo o Estado, e parte dela, exportada.

A CIBPU refere-se ainda a uma infra-estrutura consolidada em ferrovias que demandam ao grande centro consumidor da capital de São Paulo.Rodovias possibilitam a ligação dos principais centros urbanos, facilitando o contato de alguns Estados com a capital e o Porto de Santos, ampliando sobremaneira a área de influência de toda a região.

Nesta região polarizada de Machado, centros influentes como Presidente Prudente, Bauru, Araçatuba, Marília, São José do Rio Preto, atingiram alto nível de evolução, com atividades próprias de localidades em estágio superior na hierarquia de cidades.

Hidrelétrica de Porto Primavera: uma das quatro da região polarizada de Álvares Machado

Um programa de industrialização orientada encontrará amplas possibilidades

de sucesso, não só em relação ao aproveitamento das economias externas existentes, que surgiram para atender a expansão urbana, como devido a existência de fatores de produção em abundância (capital, mão-de-obra e matérias-primas), e também pelas facilidades de colocação do produto no amplo mercado local.

O mesmo estudo informa que na análise comparativa, realizada entre diferentes áreas que compõem o Oeste Paulista, foi adotado o critério de evolução dinâmica, no qual a região administrativa de Presidente Prudente (Rancharia é um elo) destacou-se claramente.

Os setores produtivos têm crescido rapidamente e existe uma clara liderança nos segmentos mercantil e bancário, com referência às demais regiões. Centro de um vasto território que ultrapassa as fronteiras paulistas irradia influência sobre áreas de colonização ainda recente e de rápido crescimento como o Norte do Paraná e Sul de Mato Grosso.

Acrescente-se também, o fato de estar próxima das passagens sobre os rios Paraná e Paranapanema, para as quais convergem as comunicações com o Mato Grosso do Sul.

OUTROS HORIZONTES VIA BR-369 Álvares Machado é mesmo bem servida de comunicações fáceis com o

restante do Brasil. Um acesso está na Rodovia BR-369, que corta uma vasta região do Estado do Paraná e chega-se a ela, por vários caminhos, um, como foi explicado, a Rodovia Raposo Tavares que passa ao lado da cidade e leva à beira do rio Paraná e à Rodovia Castello Branco.

No lado oposto está o Norte do Paraná e, adiante, aparece a BR-369, uma linha direta com a região de Foz do Iguaçu. No seu percurso vão surgindo cidades de muita expressão, como Londrina, Maringá, Campo Mourão, Cascavel, e outras de portes menores, porém, de grande influência como Ubiratã, Medianeira, Apucarana, Cornélio Procópio e Cambará.

A estrada se liga com a Raposo Tavares (SP-270), dentro do território paulista, a partir de Ourinhos, alcançando, à frente, Piraju, Itapetininga, Sorocaba, Grande São Paulo e o Oceano Atlântico. De Foz do Iguaçu a Assunção, no Paraguai, o trajeto é pequeno, e no caminho está Ciudade Del Este, um complexo de mercadorias estrangeiras, reduto de compra dos célebres sacoleiros de São Paulo. Também pela BR-369, chega-se a Porto Iguaçu, as cataratas e a Hidrelétrica de Itaipu, no rio Paraná, notáveis pólos turísticos.

Viajando de Campo Mourão até a cidade de Apucarana, um percurso de 140 quilômetros, usando a BR-369, se atinge a Rodovia do Café, que leva a Ponta Grossa, no complexo turístico de Vila Velha e depois vem Curitiba, seguindo pela BR-376. Um enorme corredor agrícola, com grande parte das safras exportadas via Porto de Paranaguá, margem do Atlântico, em direção a Matinhos, Caiobá e Guaratuba.Do lado de lá está o Balneário de Camboriú.

Um ramal da BR-369 é a centenária Estrada Boiadeira, ainda sem asfalto, mas através dela, pode-se ir facilmente às cidades de Tuneiras do Oeste, Cruzeiro do Oeste, Icaraíma, Porto Camargo e transpondo o rio Paraná, se chega a Naviraí, beira do rio Amambaí e Dourados, no Estado do Mato Grosso do Sul. Nesse território está um imenso celeiro de grãos.

É uma região marcada por grandes latifúndios, produtores de cereais e gado se destacando fazendas como Pato Bonito, Cabureí, Brasília do Sul,Corcovado, Caarapozinho, Santa Tereza do Boicará. Outra vantagem da BR-369: em Maringá ela se junta à PR-323, que serve as cidades de Cianorte, Umuarama e Guaíra, a última, na fronteira com Salto Del Guairá, em território do Paraguai.

E ainda em Ourinhos, no Estado de São Paulo, tomando-se o lado esquerdo da Raposo Tavares, se alcança o entroncamento de acesso a Machado. A 10 quilômetros dali está Presidente Prudente, e com mais 90, chega-se a Presidente Epitácio, na margem do rio Paraná, cuja travessia, que conduz ao Mato Grosso do

Sul, é feita pela Ponte Maurício Joppert. Na sua cabeceira paulista termina a Raposo Tavares e começa o lago da Usina de Porto Primavera.

Na outra cabeceira daquela ponte, em terras mato-grossenses, surge a Rodovia Manoel da Costa Lima, de acesso a Dourados, e no percurso, a diversas cidades menores. Por ela, depois a Raposo Tavares, indústrias de transformação paulistas recebem produções daquele celeiro agrícola, que já na década de 50, interessou ao ex-presidente Jânio Quadros. Disposto a aumentar o intercâmbio com as produções, ele planejou buscá-las usando a ferrovia, mas houve uma frustração.

Um ramal que partindo de Presidente Prudente deveria transpor o rio Paraná e chegar a Dourados, no Mato Grosso do Sul, em outra etapa, a Ponta-Porã, fronteira do Paraguai, teve suas obras paradas no antigo Porto Euclides da Cunha, atual cidade de Euclides da Cunha Paulista, depois de percorrer 147 quilômetros.

Em 1978 a circulação de trens pelo ramal foi suspensa, com o Governo do Estado alegando queda de arrecadação, por causa da concorrência das rodovias.

Já a Estrada de Ferro Sorocabana, que também suspendeu os trens, no trajeto Presidente Prudente a São Paulo, vem retomando o percurso da primeira cidade até Presidente Epitácio, na margem do rio Paraná. As composições de carga voltaram a circular e existe plano de reinstalar o transporte de passageiros. A medida significa a afinidade das relações dessa região com a grande Hidrovia Tietê-Paraná,um trajeto navegável, que quando concluído, medirá 2.400 quilômetros de extensão. Segundo o engenheiro Joaquim Carlos Teixeira Riva a hidrovia lembra enormes projetos desbravadores, como as rodovias Dutra e Belém-Brasília. Paralelamente ao empreendimento, existem outros, pequenos e médios, ao longo do trajeto navegável. Uma viabilidade é a construção de três ou quatro termoelétricas, utilizando o gás a circular pelo gasoduto Bolívia-Brasil.

Paranapanema, rio de influência nacional, um vizinho nobre

A Hidrovia Tietê-Paraná está nas regiões Centro e Sudeste do Brasil. Ela

Influencia diretamente os Estados de São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás. Mas, sua área de ação chega à República do Paraguai, sobre

quem a hidrovia representa forte estímulo à expansão econômica, por favorecer o acesso aos mercados do hemisfério norte em condições bastante propícias. Há um papel de veículo de integração continental reservado ao sistema hidroviário, que segundo Teixeira Riva, será alcançado ple- namente com futuras obras de transposição de níveis da Usina de Itaipu. Todo o trecho abaixo da barragem já é navegável, assim, começando a transformar a hidrovia num caminho natural entre São Paulo, de um lado, Buenos Aires e Montevidéu, Argentina, de outro.

É sempre importante reiterar que a hidrovia representa uma perfeita integração física, econômica, política e cultural do Mercosul, de quem a região de Rancharia é rota direta, passando por cidades argentinas, por regiões do Oeste Paulista e a Grande São Paulo. Os técnicos a situam em uma das áreas mais importantes do Brasil, influindo em aproximadamente 70 milhões de hectares.

PERÍODOS ECONÔMICOS

Os cafezais exerceram um papel básico na colonização e na expansão da

economia regional. No período 1920-1930 a lavoura se estendeu no sentido dos rios Paranapanema e Peixe, chegou a Assis e se infiltrou por toda região da Alta Sorocabana. E tudo isso de maneira bastante apressada.

A construção da Estrada de Ferro Sorocabana valorizou as terras, aumentando, em conseqüência, a disputa por sua posse, até com utilização da violência. Entre 1931 e 1932, as colônias formadas por imigrantes da Itália, Portugal, Espanha e do Japão, outros em menor número ocupavam 99.839 hectares, dos 163.924 que primitivamente (na época da fundação, em 1921), formavam o município de Presidente Prudente, de quem foram desmembrados vários distritos de paz. A lavoura de café superava todas as outras atividades agrícolas regionais. Na medida em que entrou em decadência a partir de 1929 vieram outras alternativas de utilização das terras, sendo as principais, o amendoim, o algodão, a cana-de-açúcar e o cultivo de forrageiras para o gado. Cereais como o milho, o feijão e o arroz que se cultivava no meio das ruas dos cafezais, também tiveram plantios reduzidos, acompanhando a diminuição dessa cultura. Entre 1936 e 1938, foram erradicadas somente na Alta Sorocabana 1,9 milhão de pés de café. O arroz caiu 76%, o feijão 84% e o milho 25%, em relação aos anos de 1931 e 1932.

Afetado pelo flagelo econômico de 1929, o café não sumiu totalmente, continuou sendo plantado, mas em pequenas glebas. Encerrado o ápice do seu ciclo, apareceram os da policultura e da pecuária, com predomínio do algodão semeado nos solos de onde saíram os cafezais e naqueles ainda não explorados, de derruba-das recentes.

O café foi derrotado pelas pressões da crise mundial de 1929

O algodão foi ganhando projeção, substituindo o café

Os cultivos de cereais, cresceram, ficando com o milho, o feijão e o arroz o destaque maior. Ao lado dessas lavouras apareciam as primeiras semeaduras de gramíneas forrageiras, inicialmente para engorda do gado de corte. Interessante lembrar que havia muitos anos, se desenvolvia a extração da madeira, seguindo o roteiro dos desmatamentos, provocando a instalação de muitas serrarias. Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, depois de 1940, a região foi estimulada a plantar produtos para atender o consumo pelo conflito. Os principais foram a hortelã-menta, Mamona, rami, amoreira, mandioca, a laranja. Essas opções deram novo golpe na cafeicultura, cujas áreas de plantação sofreram novas reduções, para a liberação do solo.

Como está explicado quando terminou a guerra, também se extinguiram as lavouras de menta, amoreira e rami, e no lugar delas, vieram as primeiras semeaduras de amendoim. A partir de 1950 instalaram-se na região os primeiros frigoríficos, incentivando daí em diante, a expansão das pastagens. Findou o estoque de madeira e apareceu o cancro cítrico, ocorrendo a erradicação dos laranjais.

Ao mesmo tempo o amendoim superava o algodão em espaço cultivado, começando uma fase econômica de longa duração na Alta Sorocabana.

Nos sucessivos períodos econômicos a extração da madeira esteve presente, sem interrupção. Cada árvore caída significava uma tora a mais para transporte às

serrarias e ser industrializada. Entre os produtos extintos nenhum deixou marca tão profunda nas paisagens urbana e rural, como a da madeira.

José Ferrari Leite diz: Efetivamente, no estabelecimento do café, foi a extração madeireira um ponto relevante da economia regional, como acontece com demais frentes pioneiras nas áreas florestais, se existia a possibilidade de seu transporte aos centros consumidores. A Estrada de Ferro Sorocabana ajudou de maneira especial na vazão da madeira à São Paulo. Eram raras as composições de carga que não transportavam troncos naturais ou madeiras apare- lhadas.

Em muitas glebas, o capital gerado pela venda das toras brutas era suficiente para pagar os trabalhadores então ocupados nas derrubadas e limpeza do solo. Por vezes ainda sobrava dinheiro. As tábuas de peroba era matéria-prima inicial para construir as primeiras casas urbanas e rurais. O aproveitamento da madeira bruta trouxe como conseqüência a abertura de diversas estradas, o acesso às toras nas florestas. Essas estradas eram ligadas diretamente às serrarias e estações ferroviárias, onde proprietários das terras deixavam as toras para transporte.

Por serem um material de peso elevado, os proprietários as conduziam aos locais de depósito em carretas dotadas de 4 rodas, puxadas por quatro pares de bois. Eram madeireiras instaladas nas bocas de sertão, transformando os troncos de ipê, peroba, marfim, jatobá, mognos e outras espécies em vigas levadas pela estrada de ferro aos centros consumidores.

Sobre essas indústrias, José Ferrari Leite escreve que em sua maioria, as serrarias eram movidas por caldeiras que consumiam as sobras dos vegetais já trabalhados. A energia produzida fazia girar o dínamo criador da eletricidade que movimentava as serras, além de ser usada nas casas da administração, nas dos operários e ao patrimônio, que nascia ao lado da serraria.

Os prédios do povoado eram construídos com madeira: a padaria, a farmácia, a pensão, a igreja, o cruzeiro da frente da igreja, as casas de moradia. Da mesma forma surgiam da madeira as sedes das fazendas, sítios e casas dos colonos. As construções de material apareceram só depois da sedimentação definitiva do núcleo urbano. Faz pouco tempo que o território hoje ocupado por Rancharia perdeu esse comportamento. Os testemunhos a respeito falam do controle da vida dos habitantes exercido pelas serrarias. Seu apito característico às 6 horas, era o anúncio do início do trabalho. Às 11 horas indicava o período do almoço. Às 18 horas o sinal do término do expediente. Às 21 ou 22 horas, um pouco mais, um pouco menos, era retirado o combustível da caldeira e o gerador de energia parava de operar, apagando-se as luzes. O fim do ciclo das madeireiras foi apressado pela derrubada indiscriminada da floresta. Também os indígenas, antecessores da civilização perderam os espaços no território. Com a força que a princípio parecia indomável, resistiram à presença avassaladora dos homens brancos, porém, foram derrotados.

Grandes complexos madeireiros foram instalados no território

A MADEIRA ABRIU AS FASES DA ECONOMIA LOCAL. Isto começou ainda na década de 20, quando o povoado apenas emergia. A mata, derrubada indiscriminadamente, para limpar o solo e nele surgir a cidade e as grandes produções rurais fornecia toras brutas em alta escala, para beneficiamento nas serrarias do povoa-do, desde sua fase embrionária. Além dos grandes complexos madeireiros, outros pequenos e médios entraram na disputa das toras, que na década de 50, ainda mantinha um forte acervo, porém,

numa conseqüência natural do avanço das derrubadas, a oferta foi diminuindo. A ascensão da co- tonicultura seduziu vários tipos de empreendedores. Afetadas pela ausência de fomento governamental ao setor e as quebras na produção de algodão, decorrente da exaustão do solo, as fiações foram sendo fechadas.

Rancharia manteve sua vocação industrial. O maior daqueles complexos, a Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, também encerrou os trabalhos na cidade. No seu lugar veio outro complexo expressivo, a Máquina Steves, a princípio industrializando algodão e hoje produzindo derivados da soja, para consumo interno e ex-portação. Uma tradição é mantida: a Algodoeira Paranaense S.A., (APSA) instalada na década de 50, continua operando, entretanto, em ritmo inferior ao do passado, justamente pela insuficiência de matéria-prima. As duas atuam no Distrito Industrial de Rancharia, ao lado de um aglomerado de outras empresas.

Cargas de algodão chegam à cidade para beneficiamento A RELIGIÃO EM ÁLVARES MACHADO começou nos passos da fundação do Povoado de São Luiz. A História mostra que já em meado de 1917, o fundador Manoel Francisco de Oliveira ergueu uma grande cruz, no local escolhido para construir a igreja. Os poucos habitantes rezavam ao re-dor da cruz e, mais tarde, no acanhado espaço do primeiro templo, também edificado por Oliveira. Em 1929 a segunda igreja foi edificada no Bairro Guaiçara, conforme a repro-dução, abaixo, pintada pelo artista plástico Jocame.

A igreja do Guaiçara, de 1929, segundo a reprodução de Jocame

Em 1937 a comunidade iniciou a edificação da Igreja de São José, o Padroeiro de Álvares Machado. A madeira usa-da nos templos anteriores foi substituída pelo tijolo. Era um mutirão liderado pelo padre Vicente Fontanet, que foi para servir na cidade, dia 8 de agosto de 1937, pelo bispo da Diocese de Assis, Dom Antônio José dos Santos. Às 10 horas daquele dia o bispo rezou uma missa ainda na antiga capelinha, na presença de uma grande multidão. Anterior a isto, em 1923, o que se estenderia até 1940, o padre japonês, Domingos Chohati Nakamura ministrava o cristianismo aos imigrantes de seu país e seus descenden-tes. Sua área polarizada era o Bairro Guaiçara, na zona rural onde foi construído um templo budista. Padre Vicen-te Fontanet trabalhou na Paróquia de Machado até 1955, um período de 18 anos e junto com o bispo Dom Antônio José dos Santos inaugurou com missa solene, a Igreja de São José dia 19 de março de 1943. Posteriormente foram designados para a cidade os sa-cerdotes Luiz Othao Washlevigan, Orlando Luiz Gazola, Isidro Caldeira Vale e Antônio Otero Soares. Todos eles defendiam a instalação de um relógio especial na Igreja Matriz de São José. E, finalmente, isto ocorreu no dia 28 de outubro de 1959. Em 1960 a paróquia trocou novamente de padre. O eleito foi Francisco Wittner, seguido de Ladislau Obora, Jaime Altomar, José Holanda do Vale, Pedro Paulo Mifsude, Jorge Bornemann, Maurício Grotto de Camargo e Sérgio Antônio Bonini. O número de igrejas cresceu. Hoje estão nos bairros Ouro Verde, Floresta, Santa Luzia, Limoeiro, Cruzeiro, Quilômetro 4, Córrego do Macaco, Santa Luzia, Bela Vista, Quilômetro 17, Quilômetro 27,Guaiçara, Coronel Goulart, Parque dos Pinheiros e Jardim Panorama. A capela do Guaiçara é servida pelo padre Miki Hasegawa, da Pastoral Nipo-Brasileira, demais, pelo padre Sérgio Antônio Bonini. Outros templos da cidade: Assembléia de Deus, Amor e Caridade, Metodista; Fé, Amor e Caridade, Ambaju-ko Bo Gi, Congregação Cristã do Brasil, Igreja Batista, Evangélica Avivamento Bíblico, Independente, Casa de Oração para Todos os Povos.

Monsenhor Nakamura (segundo da esquerda) e auxiliares do Guaiçara em 1938

Igreja de São José na fase de construção em 1942

Igreja de São José em 2006

A Segunda guerra Mundial, foi, está claro, catástrofe para o mundo. Mas, em Álvares Machado, o conflito trouxe um benefício: a produção de hortelã menta. De repente, as terras então ocupadas com algodão e amendoim, depois do cume formidável do café, que perdeu seu reinado, a horte-lã entrou, com força, transformada no próprio município em óleo combustível. Era exportado aos países em guerra e sua ênfase maior foi de 1941 a 1945. Os registros apontam os Estados Unidos como principal comprador do óleo, que contribuiu decisivamente para a ascensão da economia machadense. Em nível de produção o município só perdia para a China. A guerra acabou e as aqui-sições foram suspensas. O algodão e o amendoim voltaram a reinar e a cidade recebeu grandes complexos industriais: Brasco, Sanbra (Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasi- leiro S.A.), Anderson Clayton, e ao lado delas a oriental Yokana, celebrizada como uma das maiores exportadoras de amendoim do mundo. Ainda conforme as fontes, também a mamona, o rami e a amoreira, geradora do bicho-da-seda, ganharam expressivo destaque no município, decorrente do alto consumo pela Segunda Guerra. Os alambiques de menta despontavam em várias propriedades rurais. O cheiro da hortelã beneficia-da era muito forte, chegando a fazer arder os olhos das pessoas. O produto formou levas de milionários. Seguia de trem ao Porto de Santos e continuava a viagem em navios até as regiões estrangeiras de consumo.

Um dos setores da Sanbra e seu grupo de operários

HOJE NO MUNICÍPIO SE PRATICA UMA AGRICULTURA DIVERSIFICADA . Uma ênfase é a uva de mesa, cultivada por pequenos lavradores. No ramo sobressaem-se imigrantes japoneses e seus descendentes, que elegeram as qualida- des Rubi, Itália, Bentaca e Niagara. Os latifúndios ali são poucos. Os minifúndios ainda imperam, mesmo que cercados de uma série de problemas comuns nos campos brasileiros.

Já no princípio da formação da cidade, a zona rural se apresentou como sustento maior da atividade comercial. No começo, umas poucas lojas. Takashima, Adib Sian, Casas Karazawa, Alfredo Nahas Tecidos, Gabriel Maluly, Súniga, Cerealista Kimura Kotaro, Os Matsuda, com seu armazém de secos e molhados.

No ramo da indústria, os grandes complexos fecharam, apontando como causa essencial, a falta de matéria-prima, no caso, algodão, amendoim, mamona, principalmente. Hoje este tipo de coligação não existe na cidade. Mas, há outros, de menor expressão e um de sucesso nacional, a Sementes Matsuda. Foi fundada há mais de 50 anos, por Shichiro Matsuda e Skio Sammi, atualmente com sua indústria pau-lista na margem da Rodovia Raposo Tavares (SP-270).

Foi um início nos alicerces do comércio de cereais, que se consolidaria no ramo, inclusive com a exportação de seus produtos, para semeadura de pastagens e, aliados, a eles, os suplementos minerais. A década de 80 registrou um ciclo notável de expressão do grupo, que saiu com sucesso em busca do controle de qualidade. Nesses passos, veio o setor de nutrição animal. Quando a década de 90 chegou, a Matsuda entrou na competição incisiva dos mercados do Brasil e do Exterior, abrindo novos trajetos.

Hoje os frutos desse empreendimento se estendem às regiões Nordeste e centro-Oeste. Isto foi possível devido, também, a instalação de fábricas em Cuiabá, Mato Grosso e São Sebastião do Paraíso, em Minas Gerais. Sua presença é vista, mais, em países da América do Sul e América Central. A formidável ascensão nascida da saga extraordinária de Shichiro Matsuda e Skio Sammi, confere ao grupo Matsuda, mais uma insígnia: líder mundial na produção de sementes forrajeiras tropicais. E não pára aí. Há um investimento imutável em pesquisas, em convênios com instituições de expressão internacional. Na lista estão o Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), Universidade de Viçosa (Minas Gerais), Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), Instituto de Zoo-tecnia (IZ) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), de Jaboticabal; Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Uni-versidade Federal de Uberlândia (Minas Gerais), Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT) da Universi-dade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu.

Um Guru do mercado brasileiro com ramificação no exterior

Shichiro Matsuda: o iniciador da grande jornada, deixou as melhores lições

PATRIMÔNIO SÃO LUIZ FLAGRANTES DA VIDA REAL

ÁLVARES MACHADO COMEÇAVA A NASCER

Pela leitura de registros históricos, como jornais das décadas de 20 e 30, publicados em Presidente Prudente (veja em fontes con-sultadas) é possível

delinear a silhueta do Patrimônio São Luiz, que o migrante de Minas, Manoel Francisco de Oliveira fundou a partir de sua chegada a este canto do antigo sertão paulista, em 1916. As fotos dizem tudo. Como avaliamos em jornalismo, uma boa ilustração vale por mil palavras. Nesse desenho formado do velho povoado, se deduz que este não era diferente da maioria dos luga-rejos nascidos no sertão. Era um pequeno centro de coronelismo, de empreendedorismo nato, de gatas bravas, as mulheres que até pagavam para encarar uma briga no punhal ou no tabefe. A jagunçada também tinha a sua marca aguerrida, fato comum naquele passado já muito longínquo da região. Questões de terras compunham os flagrantes da vida real no lugar, onde quase tudo se resolvia na bala. Mas, havia, igualmente, a parcela de cidadãos e cidadãs pacatos, carregando o hábito de se reunir para um dedo de prosa, nos botecos, nas calçadas, na casa de um ou de outro. Os anos se foram passando, inexoráveis, tudo ali foi mudando, Patrimônio São Luiz virou Álvares Machado, virou cidade, raramen-te, agora, dava-se uma briga, ou um tiro, mesmo para caçar animais selvagens. Findava-se o tempo de se levar a arma para onde se ia, de exibir como um troféu a jaguatirica capturada. Veio então a nova fase, a contemporânea, a da civilização plena, a vida como se lê no começo deste documentário, a cidade nos seus primeiros passos. As fotos inseridas a seguir ajudam a contar essa história anômala, ilustrações que ainda não havia sido publicadas. Veja que acervo extraordinário, nos foi possível reunir, juntando para isso, paciência, perseverança e algum talento. Veja, leia, medi-te, você é nosso convidado.

Um povo simples como era bucólico o patrimônio

O cruzeiro, símbolo da fé cristã no lugarejo

Bairro Guaiçara em 1929: inauguração da capela

OS ÍNDIOS DO EXTINÇÃO DE UMA RAÇA

TERRITÓRIO

Os Coroado, também com a denominação Caingangue, a partir do século XVIII,

se disseminavam por todo o Planalto de São Paulo. Em 1890, o expedicionário Theodoro Sampaio já se referia aos seus primeiros sinais de enfraquecimento, duramente afetados pelas frentes de desbravamento do sertão. Tanto assim, que no fim do século XIX, se tinha notícia da presença de somente cinco pequenos grupos deles, na região dos rios Peixe e Aguapey.

A fama dessa tribo alastrou-se no sertão, a ponto de serem abandonados os acampamentos pelos derrubadores da floresta, na fuga aos ataques, pois estariam em desvantagem. Era comum os pioneiros encontrar, na floresta, pedaços de animais e peixes, deixados pelos índios, ao se mudarem de um a outro extrato da vegetação, que aprenderam a queimar para a limpeza do terreno.

As tribos dos Caiuá, Xavante, Tupiniquim e Caiapó comple- tavam a feroz adversidade aos homens civilizados, que para continuar avançando no território,

respondiam às suas investidas com igual brutalidade, recorrendo à formação de expedições, as dadas ou bugreiros. Eram os grupos especializados na caça e morte dos índios, circulando de um outro desbravamento, ofere- cendo seus serviços.

Os silvícolas cediam, mas heroicamente à força dos brancos, invasores do território primitivo. Enquanto o número deles diminuía em decorrência do extermínio indiscriminado, a superioridade da marcha pioneira aumentava com a vinda de novos conquistadores do sertão. As frentes contemporâneas de exploração, já os encontraram em estado de decadência, e encerraram a operação de destruí-los ou expulsá-los da região.

A História reafirma a supremacia dos Coroado. Em segundo lugar, na escala de poderio estavam os Caiuá e os Xavante, esta, a primeira a colocar-se em retirada, mudando-se para as regiões de caça e pesca das margens mato-grossenses do rio Paraná. A tribo dos Caiuá foi a seguinte a abandonar o habitat primitivo. Dispersos, sem meios para sobreviver, os últimos indivíduos foram recolhidos pela Fundação Nacional do Índio (Funai), num posto da cidade de Dourados, no Mato Grosso do Sul.

A fome foi o pior drama dos remanescentes, agora andando errantes pelo território intensamente desmatado, para dar lugar às cidades e campos de produção. O derradeiro grupo foi encontrado vagando sem destino certo, na beira do rio do Peixe. Os que se salvaram, a Funai refugiou-os numa reserva, em Tupã, na região da Alta Paulista. Embora considerados por historiadores do nível de Pierre Monbeig, como sendo os verdadeiros pioneiros do sertão, quase nada ficou de sua cultura na região, tão rápido e avassalador foi o domínio do homem civilizado sobre eles.

Num velho escrito, lê-se que premido pela fome, pois a área de caça diminuía a cada ano, e sem meios de competir com as armas dos brancos, o índio tornava-se cada vez mais arredio e em fuga constante para o sertão do Mato Grosso. Não obstante, os ataques que opôs aos desbravadores, ao findar-se o século XX, já eram assaltos sem preparo, acanhados, sem os inteligentes ardis traiçoeiros dos antepassados.

Índio primitivo: habitante nato do antigo sertão local

A história social do Brasil começa com o contato do homem civilizado com o

silvícola, o habitante primitivo da terra recém-descoberta. Foi um contato marcado por lutas violentas, episódios de muita crueldade, como se lê em capítulo à frente.

Esses nativos que os portugueses encontraram aqui, eram de origem discutida e viviam na idade da pedra polida. Mas, eles não usavam a pedra como material de construção, por exemplo. Os primeiros povoadores os chamaram de índio, e os consideravam divididos em dois grupos: tupis, que habitavam o litoral e tapuias, residentes no interior.

Entre eles percebia-se uma grande diferença de cultura, com a presença de tribos mais atrasadas que outras, entretanto, em todas elas, existiam traços comuns:

ignorância da escrita e dos metais e a falta de animais domésticos. Muitas tribos se iniciaram na agricultura da mandioca, do milho e do tabaco, atividade realizada pelas mulheres, reservando-se aos homens, a tarefa da caça, de caráter mais violento. Andavam nus, porém, existiam grupos já estreando na tecelagem e vestindo tanga de algodão. Pintavam o corpo e o rosto, muitos furavam as orelhas, o nariz e no lábio inferior penduravam botoques de osso ou pedra.

Possuíam canoas feitas com troncos de árvores escavados ou de cascas de árvores, tinham sentidos muito apurados e memória notável. A religião era fetichista, (veneração excessiva por objetos materiais, a que se atribui poderes sobrenaturais) tementes de um deus bom, Tupã, e um espírito maligno, tenebroso e vingativo, o Anhang. Praticavam a antropofagia ritual.

Muitas tribos incineravam os seus mortos, outras os comiam. Várias, entretanto, costumavam enterrá-los em covas redondas, e sepulturas alongadas. Levavam vida livre, moral completamente diferente da nossa. Agiam naturalmente, mesmo nos costumes chocantes para nós. Em algumas tribos o adultério era livre, mas outras aplicavam penas severas ao culpado.

Como em todas as sociedades primitivas, a família era em muitas casas de base patriarcal. Em diversos grupos, o parentesco só se transmitia do lado paterno. A mulher era simples instrumento de procriação. Ligação de tio paterno com uma sobrinha consistia um tabu. Porém, nessas tribos, muitas vezes, ocorriam ligações mais íntimas entre mãe e filho e entre irmãos. O chefe supremo da tribo era o tuxaua, morubixaba, existindo também a figura do pajé, que curava os doentes, dava ou tirava a saúde, roubava e escondia a alma de quem o ofendesse,

Os membros da tribo uniam-se por laços bastante estreitos. Quem ofendia um, ofendia a todos. Essa política de clã, fechada e intransigente, passou para o homem branco, no seu contato com os nativos.

É verdade que outros fatores contribuíam para o aparecimento dessa política de clã entre os homens brancos, um deles a própria organização patriarcal. Dispensavam pouca atenção à casa, talvez pelo fato de serem nômades, mudando de lugar nas florestas e campos sempre que faltavam meios de subsistência. Adotavam o hábito de cuidar com muito capricho, da ornamentação do corpo.

Além de cocares de plumas, de tangas de penas em cores variadas, usavam no corpo muitas pinturas, sendo as mulheres que faziam tal decoração. Para isto, empregavam tintas de urucum e suco de jenipapo. A cerâmica, muito desenvolvida, era repre- sentada por vasilhames de argila cozida, quase sempre pintada e com desenhos lineares em vermelho e preto. E havia, mais, a representação da figura humana.

É nos índios, que encontramos as origens da arte brasileira. Foi o elemento que se cruzou inicialmente com o português. Tenta-se ainda identificar até que ponto eles se sobrepuseram ao homem branco, lhe influenciando a cultura. Na língua, música, na própria vida familiar, o símbolo indígena chegou até nós e permanece. Só que quase nada existe dessa cultura nesta região, formada pela Alta Sorocabana e o Pontal do Paranapanema, o que torna difícil o trabalho de coleta e pesquisa, até pelas escolas de níveis mais adiantados.

Lembrando: ao chegar, os sertanistas depararam-se logo com os indígenas, precursores natos do território, encontrando reação imediata. Decidiram que os tratariam como inimigos e os captura- dos transformariam em escravos. Não agiriam como os jesuítas fizeram, tentando catequizá-los. Na previsão de Amador Cobra, se os sertanistas tivessem agindo assim, talvez encontrassem nos índios bons ajudantes no povoamento do sertão.

Enquanto iam conquistando suas terras à força, os brancos usavam contra eles todas as armas que possuíam: espingardas, carabinas, trabucos, e até venenos, também incendiando as áreas da floresta onde moravam. Sozinhas, as tribos dominavam toda a extensão da bacia dos rios Peixe, Capivara e outros. Exerceram tal predomínio até o fim do século XIX e começo do século XX, depois sumiram, milhares deles exterminados pelo avanço inexorável dos colonos.

Outros povoadores que vieram nos passos de José Theodoro de Souza, primeiro sertanista do território, adotaram com as tribos um sistema de defesa, mais que ofensiva. Os que vieram depois, usaram sistema diferente, travando com eles intensos combates, para expulsá-los da região.

A fase mais aguda das lutas, foi quando os desbravadores entenderam que se não atuassem com violência, eles teriam de ir embora, abandonando os lugares onde só os bárbaros poderiam viver. Muitos desanimaram, ensaiando voltar para as localidades de origem. No meio deles surgiu um homem, especialista na caça às tribos, o Coronel Francisco Sanches de Figueiredo, que se pôs à frente da campanha para o extermínio.

Amador Nogueira Cobra refere-se a Figueiredo no seu livro Em um recanto do sertão paulista:

Coronel Francisco Sanches de Figueiredo, homem famoso pela campanha sistemática que administrou contra os indígenas, por longo período de anos, conseguindo varrê-los das florestas da margem direita do Paranapanema e de grande parte da bacia do Peixe.

Ele teve ao seu lado, bons auxiliares, entre os quais os seus próprios parentes e João José Martins, Domiciano Luiz Rosa, João Hypólito Alves de Barros, Francisco Lourenço da Silva, Manoel Costa, Manoel Ferreira de Paula, João Ferreira de Paula, Vicente Lourenço Ferreira, Leonel Joaquim Teixeira, Modesto Pedro Claro, Manoel Monjolo, Frutuoso Moraes Dutra e o filho Jocelyn Sanches de Figueiredo.

O coronel não tinha a menor consideração com os selvagens. Amador Cobra relata: Muita gente dedicou-se no terrível serviço de matar índios e muitos indivíduos se vangloriavam das façanhas praticadas e dos montes de cadáveres que fizeram. Na jornada de eliminar os bugres, mais do que quaisquer outros, se distinguiam os falsos proprietários de terras, indivíduos impiedosos. Nas margens do rio Capivara foram travados os mais renhidos combates. À medida que a ambição pela posse das terras aumentava no sertanejo, crescia também o desafio de empurrar para mais longe os silvícolas, daí nasceu a guerra, e dela, a morte de numerosos combatentes dos dois lados.

O chefe da expedição, Francisco Sanches de Figueiredo mandava abater várias reses, após retalhá-las, salgar e assar os pedaços levava-os ao moinho (monjolo) transformando a carne numa paçoca muito nutritiva.

O alimento era distribuído aos grupos de caça aos nativos. Abastecidos para um período geralmente de 15 a 20 dias, eles pegavam as carabinas e munição, partindo em seguida para a mata fechada. A disciplina na marcha era terrível. Assim que entravam na zona perigosa, sabendo que os índios estavam próximos, ninguém podia mais fumar, tossir, espirrar, falar ou fazer qualquer ruído. Por viver de espreita, ora aos inimigos, ora à caça de animais para alimento, os índios tinham um sentido bastante apurado, nisto levando vantagem sobre os agressores que viviam fora da mata, à luz do sol.

Caminhando em direção às choças dos índios, se no percurso vinha a noite, o grupo armava as barracas para dormir - a do chefe Figueiredo ficava no centro das outras. Os sentinelas ficavam acordados. Umas no chão, ocultas atrás das árvores, outras nos galhos mais altos, denunciando o menor movimento suspeito. Ao amanhecer, a empreitada prosseguia ao encontro dos indígenas. A certa distância, depois de uma longa e difícil caminhada, em silêncio, o chefe fazia um sinal de parada. Ouviam-se assobios. Os cães enraiveciam. Não havia dúvida. Os índios estavam próximos e chegara o momento do ataque, investindo pesadamente contra eles.

As contendas eram quase sempre desiguais. Homens brancos usavam armas de fogo, superiores as que os selvagens possuíam. As balas dizimavam os que vinham de arco e flecha para a luta. Cada índio que caía, era socorrido por outro, tentando retirá-lo do local vivo ou morto. Este acabava morrendo também, e assim dois da tribo saiam da linha de combate.

Os sertanistas sabiam da exímia pontaria dos inimigos que raramente erravam uma flechada, então Adotaram a tática de dar saltos para os lados, da direita para a esquerda, e vice-versa, a fim de desviar o alvo e atrapalhar a pontaria. Ao mesmo tempo eles disparavam suas armas, enfraquecendo os adversários.

Adotavam ainda o sistema de atacar as aldeias, preferindo fazer isso, quando

os indígenas realizavam suas danças de guerra e religiosas. Nessas ocasiões tomavam a bebida que fabricavam. Depois de ingeri-la e dançar por várias horas, se cansavam, ou se embriagavam e se entregavam ao sono profundo.

Nesse estado, alta madrugada, eles dormiam nas choças e os homens das

dadas, sempre a serviço das franjas desbravadoras eram distribuídos ao redor, preparavam as armas e esperavam até a luz do dia. O comandante dava a ordem de ataque. O barulho acordava os índios e sonolentos, tontos, saiam e à medida que se expunham, caiam feridos mortalmente a tiros.

Os índios viviam livres e isto mudou com a chegada do desbravador

Os vencedores entravam nas choças, e deparando-se com as índias, as matavam, em outras vezes as aprisionavam, junto com as crianças. Depois envenenavam os alimentos. Se os índios que estavam fora durante o combate os comessem morreriam. Notando a extensão indiscriminada do extermínio, a partir de 1904, cidadãos de destaque na cidade de São Paulo e outras cidades criaram uma sociedade de proteção e civilização dos índios, recebendo o auxílio dos padres capuchinhos, estes com a missão também de tentar convencer os desbravadores a parar com a matança dos primitivos. Essas medidas quase nada valeram. O ódio entre as duas partes, os colonos e os índios cresceu. Era impossível conter tanto um como outro lado. Os nativos levaram a pior, debandando, ou eliminados. O Coronel Francisco Sanches de Figueiredo se tornou famoso em todo o sertão. Homem valente, destemido, ninguém se atrevia levantar a voz contra ele. A rodeá-lo havia um efetivo de homens fiéis a defendê-lo, mesmo com a própria vida. Figueiredo criou táticas especiais de combate às tribos, no tempo em que nenhuma lei os protegia. Uma das ações constituía de contaminá-los com o vírus da malária, doença que remédios silvestres não curavam. Segundo o mapa do desbravamento, a região foi uma das últimas a perder sua característica de sertão no Estado de São Paulo.

A RESISTÊNCIA DAS TRIBOS Com arcos e flechas de ponta envenenada, os índios fizeram de tudo para se

livrar da presença dos pioneiros que não se dei- xaram abater. Resistiam aos ataques e contra-atacavam. Assim, foram tornando as terras habitáveis pela civilização. Característica geológica própria do território em referência é o Morro do Diabo, elevação da beira da Rodovia SP-613, que leva ao rio Paranapanema. A mata que circunda o morro foi habitada por algumas tribos. A dos Coroado era a mais arredia, e no alto, ficava um cemitério desses nativos. Eram os piores inimigos da franja pioneira, que teve muitos de seus trabalhadores mortos nos confrontos em que acampamentos inteiros viravam cinza. Nasceu o ódio e veio a vingança entre os índios e brancos. Amador Nogueira Cobra fala dos pioneiros como um punhado de valentes.

Não sabiam, nem lhes convinha recuar, e por isso resolveram enfrentar corajosamente os inimigos. Por bem julgaram impossível conduzi-los, salvo por meio de catequese organizada, para cujo fim eles não estavam ali, e para o qual não dispunham de gente nem de meios adequados. Sua finalidade era se tornar realmente senhores do que o registro (das terras) lhes atribuiu, consentissem ou não os primitivos.

Os desbravadores tinham diante de si a entrada da mata de onde a cada instante podiam desembocar os Coroado, os mais terríveis, ou outras tribos, que, embora menos violentas, também causavam estragos enormes nos invasores brancos durante os combates. Os pioneiros precisavam vigiar noite e dia os arredores de suas casas, atentos ao menor ruído vindo de fora. É de Amador Nogueira Cobra a explicação:

O índio dissimula perfeitamente sua aproximação, desta só se apercebendo a outra gente, no momento do ataque. Corre pela mata com celeridade incrível e passa diante da sentinela inimiga, como relâmpago, desaparecendo na espessura da floresta. Aquele que supuser que ele vai longe dali, não está livre de vê-lo, para logo, a dois passos, carrancudo, horrendo, com a flecha no arco retesado, prestes a partir.

Nos campos ele esconde-se tão bem atrás de uma moita de gabiroba, assim como atrás de um cupim, não se deixa perceber, salvo quando se ergue. Trepado numa árvore, ele dissimula por entre a folhagem, ficando invisível aos inimigos aos quais, entre- tanto, observa, à vontade, nos seus mínimos movimentos. Imita, admiravelmente, o pio das aves, servindo o pio fingido ao mesmo tempo, para iludir os contrários e dar o sinal aos companheiros que aguardam perto o momento de investir.

Se ao invés do índio, é o homem branco que coloca no alto das árvores alguma sentinela, ele a pressente, e quando esta, com a boca, com qualquer meio perceptível – até com os olhos – dá algum sinal aos seus, recebe uma flechada, sem saber de onde partiu e cai morta. Em seguida vem o ataque.

O escritor Cobra repete a palavra “bravo” para qualificar os pioneiros. E, de fato, eles eram assim. Para reduzir o poderio de investida das tribos, trabalhavam nos capões de mato, evitando a floresta. Na área aberta podiam notar a aproximação dos índios, e se defenderem. Enquanto uns faziam o serviço no campo, outros vigiavam nos ângulos das suas roçadas. À noite, tinham o sono sobressaltado, dormiam vestidos e ao menor ruído estranho ou sinal de um deles, levantavam-se portando suas armas.

Os vestígios são de que no território regional ocorreram as mais sangrentas batalhas, extensivas aos rios Paranapanema e Paraná. Quando os desbravadores saiam para o trabalho nas roças, levavam a mulher, filhos e os animais domésticos. Sem os homens na moradia os índios os dizimariam.

O animal mais precioso para as famílias era o cachorro que ajudavam a identificar a proximidade dos índios. O cheiro dos inimigos excitava os cães, que pelo faro, os percebiam de longa distância.

Atribui-se ao forte odor, o consumo excessivo da carne de anta e capivara. Ao sentir a catinga, o cão eriçava o pelo e latia, chamando a atenção dos donos e evitando o ataque de surpresa. Da mesma maneira o cavalo reagia, sempre que os índios estavam por perto conforme Amador Nogueira Cobra descreve.

O cavalo, igualmente, dá um sinal. Levanta a crina e a cauda, abre desmedidamente as ventas, assopra com violência e dispara, como se tivesse, trepado pela anca, ou montado no pescoço, o sacy, que a crendice popular criou para espantar animais e praticar outras diabruras.

ESCRAVIZAÇÃO E EXTERMÍNIO

Está claro que a região de Regente Feijó tem raízes fincadas numa sucessão de vultos e de fatos extraordinários do passado remoto. Nasceu com esta marca esplêndida da História do Brasil. O seu maior patrocinador foi Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus que no século XVI, enviou missionários para doutrinar os índios do Brasil.

O território foi um pólo de ações catequistas dos padres e aldeamentos (reduções) erguidos por eles. As ruínas permanecem no subsolo. Outra parte exposta na margem do rio Paranapanema, desapareceu sob as águas do reservatório da Usina Hidroelétrica de Taquaruçu, construída pela Companhia Energética de São Paulo (Cesp). Antecedendo a trajetória das reduções, tema deste capítulo, abaixo descrevemos ligeira biografia de Santo Inácio de Loyola.

O fundador da Companhia de Jesus foi canonizado pelo Papa Gregório XII, em 1622. No famoso cerco de Pamplona, em 1521, ele foi gravemente ferido e na convalescença, lendo a Vida de Cristo resolveu dedicar-se ao seu serviço. No ano seguinte Loyola consagrou-se em Montserrat. Para reflexão de sua vida religiosa, ficou em penitência nas cavernas próximas de Manresa, onde escreveu Os Exercícios Espirituais que exerceu grande influência nos seus seguidores.

Por causa do desgosto da peregrinação à Terra Santa, em 1523 ele resolveu dedicar-se à vida intelectual, para melhor desen-volver os projetos. Em Barcelona, na Espanha, freqüentou o curso de Latim e estudou Filosofia em Acalá, Salamanca e, em Paris. Nesta cidade se aliou a mais seis companheiros que, concebendo o projeto de nova ordem religiosa, se reuniram em irmandade, da qual surgiria a Companhia de Jesus.

Em 1537, ano de sua ordenação, Inácio de Loyola e seus companheiros foram incumbidos pelo Papa Paulo III de realizar prédicas em igrejas de Roma. Finalmente, em 1540, conseguiu a aprovação pontifícia das regras da ordem que foi reconhecida, oficialmente, como Companhia de Jesus.

Os princípios da nova ordem, revistos por Santo Inácio de Loyola foram extraídos das Constituições. Os jesuítas enviados aos lugares mais distantes, realizaram uma obra catequética de alto relevo e sua teoria de difundir a fé cristã para combater a reforma foi um valioso instrumento da Igreja no movimento da contra-reforma.

Seguindo bem de perto a missão religiosa, Inácio de Loyola não se descuidou da obra social, velando pelos desprotegidos, com atenção maior às mulheres e às crianças. Rapidamente, a nova ordem difundiu-se no mundo todo, possuindo na ocasião da morte de Santo Inácio, em 1556, 101 casas no Brasil, Espanha, Índia, Itália, Portugal, Alemanha e no Japão.

Suas obras buscaram aperfeiçoar a vida espiritual através de meditações e reflexões a respeito dos problemas religiosos.

Escreveu: Exercícios Espirituais, O Livro das Constituições da Companhia de Jesus, O Canto da Perfeição, Acta P. Ignatio. Ele Nasceu na Espanha, em 1491, morreu em Roma, em 1556.

Percorrendo os documentos históricos, eles nos revelam que a região, começou sua expansão só em 1853, a partir do espaço entre os rios Itararé e Tibagi. Inicialmente vieram para explorar o território grupos de sertanistas mineiros, paulistas e fluminenses.

Registros indicam que no começo do século XX, a ascensão deu-se através da bacia da margem esquerda do Paranapanema e direita do Tibagi.

Apressada, a frente desbravadora atravessou os rios das Cinzas, Laranjinhas e Antas e décadas depois, houve um rápido progresso da chamada

mesopotâmia do Tibagi, Paranapanema e Paraná, a quem se juntam os rios Pirapó, Ivaí, Corumbataí, além de muitos córregos e ribeirões.

Até o ano 1632 a história se compunha de dois capítulos do domínio espanhol no sul do Continente. Para conhecer melhor os fatos é necessário rememorar o avanço da Província Del Guairá, que se estendia do Iguaçu ao Paranapanema e do rio Paraná ao Tibagi. Se pretendia chegar ao Atlântico e construir um porto em Cananéia, Santa Catarina ou Paranaguá.

Raposo Tavares no comando de uma expedição de caça ao índio

Autores descrevem como um “grande viveiro” o número de índios da região

paulista e a do lado oposto do Paranapanema, hoje ocupada pelo Norte do Paraná. Eles continuavam dominando-a inteiramente, embora as terras já pertencessem aos espanhóis por direito de conquista, lhes assegurava o Tratado de Tordesilhas.

A divisa entre as terras do Paraguai e Espanha era fixada pela denominação Linha Alexandrina, ou o Meridiano de Tordesilhas. A divergência criada entre portugueses e espanhóis existia apenas sobre a fiel demarcação daquela linha. Ambos, porém, aceitavam que aquele território pertencia à Espanha, por estar situado a ocidente da linha demarcatória.

Os paulistas da antiga Capitania de São Vicente discordavam. Isto os levou a organizar bandeiras que, partindo dali, ou de São Paulo de Piratininga, fossem disputar todo o enorme território que deveria ser integrado à comunhão nacional. As primeiras entradas saíram da costa vicentina no século XVI. Taunay cita as bandeiras de Aleixo Garcia, em 1526, e de Cabeza de Vacca, em 1541, que mostraram a vitalidade da Costa do Atlântico com o Paraguai.

O historiador Romário Martins se refere a Cabeza de Vacca, Nuflo de Chaves, Martinez de Irala, Rodrigo de Vergara e Ruy Melgarejo. São mencionadas também as expedições que viajaram no sentido oposto, levando a missão de conter as incursões dos paulistas, colonizar Guairá e edificar o porto no Atlântico.

Entre as bandeiras do século XVII, são citadas a de Nicolau Barreto, em 1602, que realizou ações no ocidente, pelo rio Piquiri e voltou em 1604. A de

Manuel Preto, em 1607. A de Pero Vaz de Barros, 1611. Sebastião Preto, 1612, todas elas seguindo no rumo do sertão de Guairá.

Em 1554 os espanhóis tentaram firmar-se no lado esquerdo do rio Paraná, e Irala, governador do Paraguai, mandou Nuflo de Chaves percorrer as regiões ao longo do rio Paranapanema e rio Tibagi. Apossando-se do território, este fundou, naquele ano, o núcleo pueblo de Ontiveros, descrito como uma efêmera povoação situada junto à foz do rio Piquiri e a uma légua do Salto de Sete Quedas. Dois anos depois, a povoação foi transferida para a confluência do Piqueri, no rio Paraná e três léguas e meia a montante do Salto de Ciudad Real Del Guairá (1556).

Vinte anos depois, em 1576, na margem esquerda do rio Paraná, foi fundado o núcleo de Vila Rica Del Spírutu Santu, uma cidade espanhola mais tarde transferida para a foz do Corumbataí, no Ivaí, onde ela prosperou, e durante mais de meio século, 1576 a 1632 dominou o sertão. Transformou-se na sentinela avançada da região, até que a bandeira paulista de Antônio Raposo Tavares e Manuel Preto a dizimou.

Em 1532 o Rei Felipe III nomeou Hernando Arias de Saavedra para governador das províncias platinas. Estava certo de que a medida seria útil para ativar a colonização espanhola do território. Reconhecendo os graves erros dos colonizadores espanhóis e o fracasso da colonização de Guairá, Saavedra sugeriu ao Rei que apressasse a consolidação da fortificação da Nova Província, e se concedesse assistência aos jesuítas que evangelizavam os índios nativos.

No decorrer dos anos, os jesuítas instituiriam 13 reduções, sendo as primeiras, as de Nossa Senhora de Loreto e Santo Inácio Menor (ou Mini), reunindo 4.000 índios em fase de doutrinação. (As duas mais próximas de Regente Feijó). Todavia, as incursões paulistas prosseguiam. E, em 1611, anunciava-se que a bandeira de Pedro Vaz de Barros havia aprisionado 500 índios assistidos pelos jesuítas.

As tropelias dos irmãos Manuel e Sebastião Preto continua- vam com todo o tipo de violências. O próprio Saavedra, em maio de 1616 prestou informações sobre as renovadas agressões dos bandeirantes paulistas contra os padres e os indígenas. Em 4 de setembro de 1627 o Provincial Nicolau Duran denunciava o perigo iminente, depois de ouvir os relatos dos jesuítas, da Companhia de Jesus, temerosos de um assalto maciço aos aldeamentos.

Na seqüência da história, voltemos a 1625 quando, ao ser nomeado governador do Paraguai, D. Luís de Céspedes Chefia fez uma viagem, chegando à Bahia em maio desse ano. Continuando a incursão, em fevereiro de 1628, ele esteve no Rio de Janeiro, onde se casou com Dona Vitória de Sá. Esta o convenceu a seguir para São Paulo. De lá ele escreveu ao Rei Felipe IV, falando dos horrores das crueldades, e traições dos bandeirantes paulistas.

Dia 16 D. Luís partiu de São Paulo para chegar a um porto no rio Anhembi, percorrendo as águas durante 16 dias. Prosseguiu a sua rota de navegação pelo Paranapanema e o Paraná, atingiu a redução de Nossa Senhora de Loreto em 8 de setembro, e logo se empossou no comando de Ciudad Real.

Num documento com data de 8 de novembro de 1628, D. Luís de Céspedes Xeria denunciou o que chamou de lástimas sobre Guairá acrescentando

considerações a respeito de uma propalada expedição de 900 homens brancos e 3 mil indígenas escravizados para destruir Guairá.

Em História das Bandeiras Paulistas, Taunay se refere a essa expedição, como dos mais notáveis episódios do bandeirantismo paulista. Esta começou sua violenta ação em agosto de 1628, usando uma coluna chefiada por Manuel Preto e Antônio Raposo Tavares, este, o lugar-tenente do primeiro, e a alma da expedição. Os padres jesuítas Simão Mazetta e Justo Mansilla van Surck fazem referência àquela tropa, calculando que toda população de São Paulo participou dela.

Dispostos a conseguir fortuna comercializando índios feitos escravos, Manuel Preto e Raposo Tavares não perderam tempo. Em 28 de setembro de 1928, ao transpor o Tibagi, aprisionaram todos os índios da redução Encarnación e os sacerdotes jesuítas protestaram.

Um entendimento entre as duas partes, levou os bandeirantes a devolver os silvícolas, prometeram não atacar os aldeamentos e capturar somente os de outras tribos e paragens, deixando ilesas as reduções. Mas não cumpririam isso.

Em 30 de janeiro de 1629 Raposo Tavares ordenou o ataque à redução de Santo Antônio, aprisionando centenas de índios, ignorando o protesto veemente do padre jesuíta Pedro de Moia. Continuando a guerra contra os aldeamentos, em 23 de março, Antônio Bicudo Mendonça comandou a invasão do núcleo São Miguel, e Manoel Mourato administrou a ocupação do núcleo de Jesus Maria.

Num amplo trabalho jornalístico produzido em 1992, este editor escreveu sobre as ruínas da antiga cidade espanhola de Vila Ricca Del Spíritu Santu, para o jornal “O Estado de S. Paulo”. Nele traduziu o massacre contra ela e outras reduções pelos algozes bandeirantes de São Paulo.

Transcrição: -As ruínas de Villa Ricca Del Spíritu Santu, cidade fundada pelos

espanhóis em 1576, resistem ao tempo sob a terra, em Fênix e Nova Cantú. É um dos mais importantes acervos do país, que ajuda a contar a história do século XVI. Em Fênix, as ruínas são protegidas por ima lei estadual e em Nova Cantú a área de propriedade de particular foi ocupada por lavouras e pastagens.

Estudiosos do Brasil e Exterior sonham realizar escavações no local mas eles se deparam com obstáculos intransponíveis. Os destroços dentro do município de Fênix, estão encravados numa região de floresta e é proibido danificá-la. Já os donos do terreno de Cantú dificultam o ingresso mesmo de estudiosos na área. Caçadores de tesouro vasculharam aquele subsolo, se ignorando a extensão de suas ações.

A presença de pequenos animais e o restante da antiga floresta, a que mais atraiu o povoamento, fazem da reserva uma área de grande interesse também de depredadores. Há alguns anos, um guarda foi morto por tentar impedir a caça no lugar. A última grande pesquisa em Villa Ricca Del Espíritu Santu foi reali- zada pela geóloga Cláudia Parellado, do Museu Paranaense, que resgatou a história.

A cidade foi traçada obedecendo a primeira lei urbanística da Idade Moderna, assinada pelo Rei da Espanha, Felipe II, em 1573. O projeto era integrado por um porto construído no rio Ivaí, que possuía entre suas finalidades, embarque da erva-mate extraída da região, para os centros consumidores.

Mas a influência do remanescente de Villa Rica Del Spíritu Santu, na História do Brasil, ainda não foi suficiente para conferir-lhe a proteção necessária. Medida defendida e nunca empregada, foi anunciada em 1865, quando os engenheiros civis e irmãos Keller decidiram estudar aquelas ruínas. Sugeriram a instalação de vigilância e a reconstrução da cidade, possível ainda na época. Os órgãos a quem se dirigiram nunca deram importância aos apelos.

No final do século XVI a Espanha compunha o cume da lista dos conquistadores de terras habitadas apenas pelos índios. Dividiam-se entre aventureiros e homens de ação. Tanto uns como outros, utilizavam filosofia ambiciosa: os índios eram obrigados a lhes prestar serviços, o que mais tarde chamaria a atenção dos jesuítas da Companhia de Jesus.

Conquistadores usavam a colheita da erva-mate (congonha) silvestre como sua principal fonte econômica. A colheita somente seria possível, com exploração da mão-de-obra indígena. Para fortalecer as ações, fundaram 13 colônias abaixo e acima dos saltos Sete Quedas, segundo o historiador Temístocles Linhares, organizadas sob forma de mitas, além de três maiores, batizadas com a denominação de Ontiveros.

Localizada perto da confluência do Iguaçu, com o rio Paraná, ao surgir em 1554, Ontiveros foi a primeira povoação efetiva dos europeus no território onde nasceria o Paraná. Em 1557 foi construída Ciudad Real Del Guairá, nas proximidades da foz do rio Piquiri. Villa Ricca Del Spíritu Santu foi edificada em 1576 e na povoação os espanhóis estabeleceram 150 mil índios guaranis e gualachos.

Villa Ricca teve duas fases. A primeira, na região cortada pelo rio Ivaí, onde atualmente está o município de Nova Cantú. A fase segunda aconteceu na foz do rio Corumbataí, no atual município de Fênix. Conforme Temístocles Linhares, na parte ocidental do rio Pirapó existiam outras mitas (encargo a que se prestavam os indígenas por ocasião das atividades de mão-de-obra, decorrentes da conquista da América por espanhóis).

Além da posse do território os conquistadores reuniram altos lucros, abastecendo de erva-mate áreas litorâneas dos maiores estuários. Segundo Linhares as operações chegaram às regiões meridionais do Rio da Prata, que foi transformado num entreposto de comércio de mate, estendido a Bolívia, Chile, Argentina e Peru.

O avanço dos espanhóis só foi contido com o aparecimento dos bandeirantes paulistas, que também capturavam índios e os tornavam escravos, vendendo-os às Capitanias do Norte. Os paulistas destruíram seus núcleos, incluindo Villa Ricca del Spíritu Santu. Depois da incursão dos Keller, que em 1865 sugeriram a restauração da cidade, só na década de 60 houve a reconstituição, porém superficial do lugar, pelos pesquisadores Igor Chamyz e Oldemar Blasi.

Os bandeirantes de São Paulo queriam os índios aldeados em Villa Ricca e tinham um trunfo: Antônio Raposo Tavares, figura máscula, irrequieta, de corpo peludo, montado em seu cavalo negro e comandando a tropa. Além de cobiçar a mão-de-obra dos nativos, queriam expulsar os espanhóis do território e aumentava a ameaça de ocorrer um genocídio.

O historiador Affonso de E. Taunay escreve no livro História das Bandeiras Paulistas: Esta la villa muy apretada y atrincheirada por teneria sercada los portugueses de San Pablo. Sitiados, os habitantes não podiam se abastecer, enfrentando a fome e falta de água. Os apelos de Frei Cristóvão foram desprezados. Raposo Tavares liderou novo ataque descrito como ensurdecedor.

Espanhóis e indígenas procuraram fugir rumo à margem direita do rio Paraná, mas segundo a História, 100 mil nativos foram aprisionados. O destino de Villa Ricca alertou os moradores restantes de Ciudad Real Del Guairá, que tentaram escapar. No entanto, numerosos deles morreram ao procurar fugir por águas, ou perdidos na floresta densa e atacados por animais ferozes.

Vazias as cidades espanholas foram destruídas pela tropa de Raposo Tavares, persistindo ainda ruínas e desolação na extensa área entremeada pelos rios Ivaí, Tibagi, Iguaçu, Paranapanema e Paraná. Os espanhóis salvos do maciço ataque debandaram para lugares diferentes e há registros sobre decisão de parte deles, de se juntar aos paulistas.

Nesse grupo estava o vigário de Villa Ricca Del Spíritu Santu, Juan d`Ocampo Y Medina, mais tarde assassinado. Taunay fala de terríveis calamidades ao se referir aos ataques a Villa Ricca e outras colônias jesuíticas. Descreve: Muita gente pereceu na terrível marcha, extraviada na floresta, morta por moléstias ou nas garras dos tigres. O notável historiador qualifica os bandeirantes, de salteadores, latrocidas, infames e indignos do Cristianismo.

Cerca de 200 espanhóis moravam em Villa Ricca Del Spíritu Santu. Segundo a pesquisadora do Museu Paranaense, Cláudia Parellada, eram exploradores, vestiam-se mal e tinham aspecto de desnutrição. No entanto, se orgulhavam de residir numa cidade de arquitetura avançada para a época, dotada de casas de cerâmica e argila, com quadras e muros altos. O traçado do lugar foi trans- formado numa maquete exposta no museu, na cidade de Fênix.

Com o cuidado de não maltratar o resto de mata, a equipe da pesquisadora Parellada identificou os vestígios de 40 moradias. O número exato delas ainda não foi descoberto. Outra constatação: no centro da cidade foram construídos alguns prédios públicos, uma igreja, edifícios reais e municipais. Tudo disposto de modo funcional, favorecendo a vida no núcleo.

Os conquistadores chegaram com orientação para obedecer todas as instruções da lei urbanística assinada pelo Rei Felipe II, em 1573. Eles as seguiram plenamente. Na área edificada, com 300 mil metros quadrados, havia muros altos, poços artesianos e um sistema de abastecimento de gêneros alimentícios, supondo-se ter sido uma obra edificada por técnicos.

Os espanhóis usavam roupa de algodão, dando preferência à cor preta. Num tempo em que o produto de cobertura dos prédios era a palha, se davam ao luxo de usar telhas de cerâmica, modernismo certamente chegado da Coroa de Espanha. Já cultivavam frutas especiais como a laranja e a uva, ao lado do milho e da mandioca que adicionavam à alimentação, porém sem torná-la completa de calorias.

Os cem homens brancos não conseguiram desenvolver o pro- jeto, em que a erva-mate se constituía na grande atração e razão do empreendimento. Por isto o plano de sujeitar os índios aos seus domínios era parte básica do projeto.

Testemunhos sugerem a presença de pelo menos 150 mil índios nativos em Villa Ricca, todos da nação guarani. Grande quantidade deles residia na cidade, na condição de escravos, o restante, em aldeia ao redor do núcleo dos padres jesuítas.

Não havia discriminação com relação à mistura genética. Era, por exemplo, permitido o casamento entre brancos e índios e o homem podia ter mais de uma mulher. Uma bigamia autorizada. O aspecto forte e saudável dos rapazes indígenas atraia senhoras viúvas que chegavam para morar em Villa Ricca e arranjar um casamento, com permissão da Coroa de Espanha.

A disciplina do rei não admitia a bigamia que se espalhou entre os brancos, acompanhando o costume dos guaranis. Esses índios instituíram a tradição de possuírem quantas mulheres quisessem, desde que pudessem atender as necessidades suas e delas. O homem branco gostou disso, mas sofria forte censura e tinha que acabar a relação se o rei soubesse.

Em datas geralmente não anunciadas o rei mandava fiscalizar a cidade e depois de receber os relatórios dos enviados, adotava medidas punitivas. Sabe-se ainda que as mulheres se deparavam com a insuficiência de homens capazes de se unirem a elas. Dos 200 espanhóis, pelo menos cem tinham 50 anos ou mais, eram casados e ficavam com a execução do trabalho menos pesado e os jovens com a exploração da terra bruta.

A Coroa supervisionava tudo, às vezes moderada em falhas identificadas no núcleo. Precisava da erva-mate e o aldeamento de Villa Ricca significava a certeza de grandes colheitas. O bispo D. Frei Cristóvão de Aresti tinha papel deveras importante, pregando o evangelho como forma de manter a disciplina.

Na obra Colonização e Desenvolvimento do Norte do Paraná, (Companhia Melhoramentos), lê-se:

O Norte do Paraná que depois de 1500 continuou dominado pelo indígena brasílico, embora, pelo Tratado de Tordesilhas, de 1494, pertencesse à Espanha, a partir de 1554 passou a ser colo- nizado pelos espanhóis, que fundaram as povoações de Ontiveros, depois transferida e denominada Ciudad Real Del Guairá e Villa Ricca Del Spíritu Santu.

No século XVII, por volta de 1610, a Companhia de Jesus foi encarregada de promover a catequese dos índios e a colonização, fundando essas 13 reduções: Nossa Senhora de Loreto e Santo Ignácio Menor, à margem esquerda do rio Paranapanema, ao norte da região. São José, São Francisco Xavier e Encarnación, à esquerda do Tibagi, e à direita deste, São Miguel. No rio Ivaí, a montante de Villa Ricca, São Thomaz, Los Angeles, São Paulo e Jesus Maria. No rio Iguaçu, quase na sua foz no Paraná, Santa Maria, e ao lado do rio Piquiri, Concepción e São Pedro.

A partir de 1632, no território que os bandeirantes acresceram, nessa região, ao imenso interior do Brasil, reinaria uma longa estagnação. Para os espanhóis impedirem novas incursões dos bandeirantes, os quais se sobrepunham aos próprios interesses de Portugal, seria indispensável a fixação dos limites ocidentais da nação, nesse território ao longo dos rios Paraná e Paranapanema.

Para que isso ocorresse foi assinado o Tratado de Madrid de 1750, anulado em 1761. Somente depois da Guerra dos Quinze Anos entre as nações ibéricas (1761-1777) e com a ascensão de D. Maria I, se conclui o Tratado de Santo

Idelfonso, que instituiu as divisas assentadas em 1750. Outrossim, é importante recordar que a fronteira pelo álveo do rio Paraná foi fixada pelo Tratado de 8 de janeiro de 1873, depois de encerrada a guerra Brasil e Paraguai.

ANTÔNIO RAPOSO TAVARES – Explorador e bandeirante português,

naturalizado brasileiro, veio para o Brasil em 1622 com seu pai. Tinha sido designado para o Governo da Capitania de São Paulo, com a função de capitão-mor. Em 1628, organizou uma bandeira composta por mais de 3 mil homens e partiu de São Paulo, seguindo por terra, alcançando numa primeira etapa, as nascentes do rio Paranapanema. Nessa região, Raposo Tavares capturou cerca de 3 mil índios e os enviou para serem vendidos nas capitanias do Norte, como escravos. Em 1647, organizou a bandeira das fronteiras, ou dos limites. Seguiu para o Oeste, subiu o rio Paraguai, lutou com os índios Guaicurus, embrenhou-se pelos rios Guaporé e Madeira. Depois seguiu o curso do Amazonas, se acreditando que ele tenha chegado ao Oceano Pacífico.

Voltou a São Paulo, em 1650. Com sua bandeira expulsou os espanhóis do Leste do Paraná e obteve para a Coroa de Portugal a posse das terras de Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso e Rio Grande do Sul. Antônio Raposo Tavares nasceu em São Miguel da Beja, Portugal, em 1498 e morreu em São Paulo, em 1568, com 70 anos de idade.

PREFEITURA E CÂMARA MUNICIPAL - 2006

ÁLVARES MACHADO DE OUTRORA MEMÓRIA FOTOGRÁFICA DA CIDADE

Editor: Valdery Santos Rua Perfeito Brasil Folino, 150 Presidente Prudente-SP 19 013 400 Fontes consultadas:

Jornal “O Momento” (Presidente Prudente, 1922) Jornal “A Ordem” (Presidente Prudente, 1923) Jornal “A Cidade” (Presidente Prudente, 1924) Jornal “O Libertador” (Presidente Prudente, 1924) Jornal “A Voz do Povo” (Presidente Prudente, 1926) Jornal “O Progressista” (Presidente Prudente, 1927) Jornal “O Amanhã do Brasil” (Presidente Prudente, 1930) Jornal “Gazeta Quermesse” (Presidente Prudente, 1931) Jornal “O Jequitibá” (presidente Prudente, 1936) Jornal “Folha da Sorocabana” (Presidente Prudente, 1939) Amador Nogueira Cobra Em um recanto do sertão paulista Bruno Giovannetti Esboço Histórico da Alta Sorocabana Afonso de E. Taunay História das Bandeiras Paulistas Airton Aparecido Anderson Santo Anastácio, Economia, População e Relacionamento Regional Afonso de E. Taunay Relatos Monçoeiros Valdery Santos Cabeza de Vacca e Os Grandes Roteiros Históricos Celso Jaloto Ávila Júnior Santo Anastácio, História de Uma Cidade Pierre Monbeig Pioneiros e Fazendeiros de São Paulo Célia de Carvalho Ferreira Penço A “Evaporação das Terras Devolutas” do Vale Paranapanema Teodoro Fernandes Sampaio São Paulo no Século XX Francisco de Paula Goulart Bandeirante do século XX João Carlos Fairbanks Os primórdios da região Alta Sorocabana Orlando Valverde Geografia Agrária do Brasil Lúcio Flávio Marim O Sistema Viário do Pontal do Paranapanema Dióres Santos Abreu O Desbravamento da Alta Sorocabana por um Bandeirante Moderno: Capitão Francisco Witaker José Ferrari Leite A Alta Sorocabana e a Região Polarizada de Presidente Prudente Fernando Henrique Cardoso Capitalismo e Escravidão José Ferrari Leite

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Julho de 2006