AMARAL, Ana Maria - Teatro de Animação

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Transcript of AMARAL, Ana Maria - Teatro de Animação

  • () n /II 1' 11.01 aqul a presenta dos por AnaM11 1' 1/1 "11 111.1'/1.1 I I' o sur preender o leitor habi-1,lI lI d ll . 1I1111 plos Ir-u o ou realizao doI" I/ I.i.r '() ounvonciona l. Entendendo-se por can-vr /I ( /0 /11/./ todos os modos e procedimentos, doIII1111 IIL I Oll da contemporaneidade, regidospnlua pr-ln cp os tcnicos e artsticos consagra-do:! p lo raconalsmo e seu sustentculo maispr-oornnente, o texto dramtico.

    I~ste trabalho pretende levantar reflexesnobre o Teatro de Animao, um gnero tea-Lral que inclui bonecos, mscaras, objetos,for-mas ou sombras, representando o homem,o a nimal ou idias abstratas. O que h de "in-fantil" no teatro de bonecos, de mscaras e deobje tos - as trs modalidades cncas que ali -mentam como razes o teatro de formas ani-mada s - solcita ser entendido como apluralidade de potencialidades que a crianarene em seus primeiros anos de vida antesde iniciar suas especializaes libidinais e que ,nesse processo, vo sendo inapelavelmenteador mecidas ou fechadas , tornando-se parce-las desativadas de sua psique . O palco da ani-mao pode fazer voltar, ento, com a energiaexacerbada pela concentrao, uma imensaquantidade de estmulos dirigidos ao desper-tar de nossa percepo e imaginao, indu-zindo exper incias sensrias que muitas ve-zes julgvamos esquecidas ou superadas.

    Nos ensaios que se seguem o leito r encon-trar frtil e diversificado material consagra-

  • ERRI\ '!'1\ - na quarta-capaonde se l III/IlI vida 11lI1//{//Wmais li oliticu. leia -se III/UIvida !1I /i 'JUI/ /(/ mais pot ica.

    do reflexo originada em tais experincias .Entrar em cantata com as dvidas , preocu-paes e snteses afortunadas de uma autoraque pode ensinar muito a respeito de ssedebruamento sobre um modo novo de produ-zir, executar e pensar o teatro, espraiandohor izontes dados como explorados ou incidindoinovadora ptica sobre questes tornadas ob-soletas pela mesmce e repetio.

    Histor icamente o teatro de formas anima-das pode ser cons iderado uma manifestaorecentssima dentro do universo cnico, ela-borado como conceito no incio dos anos 80,embora suas razes se alonguem at os pri -mrdios da civilizao . Foi esse teatr o que,com suas provocativas criaes, colocou emxeque as antigas convenes do teatro estabe-lecido. Saturado pelo psicologismo, mimetismo,verossimilhana e linearidade do antigo tea-tro, o pblico foi aderindo s inovaes, reco-nhecendo na nova sensibilidade expressivaalgo mais prximo de sua maneira de ver esent ir o mundo que o cerca, mar cado pela si-multaneidade, fragmentao , imag t ca esimbolizao cr escentes de uma cultura erigidaem gigantescos centros urbanos.

    Esle jrvro 101 ImpressO naUS GR FICA E EDIT ORA LTDARua Felicio Anlomo Allles. 370 - Jd. 'rnunto BonsucessoCE P 07 175-450 . Guarulhos . SP . Fone. (0 11) 6480 -4132com filmes lornecldos pelo editor Ana Ma r ia Amaral pr ofessora da Escola do

    Comunicaes e Artes da Universidade de S o Pauloe encenadora de formas animadas .

  • Ilustrao: Antonio Henr ique Amaral

    TEATRO DE ANIMAo

  • Direitos reservados e protegidos pela Lei 5.988de 14.12.93. proibida a rep rodu o total ou parcial sem autorizao,

    por escrito, da editora.

    ISBN 85-85851-25-2

    suMRIo

    EM TORNO DA NIMA - A ANIMAOEdelcio Mastao

    !NTR.ODUO

    I. REFLEXES

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    .. 19

    Edi tor: Plinio Martins Filho

    Direitos reservados ATELI~ EDITORIAL

    Alameda Cassaquera, 98209560-101 - So Caetano do Sul- SP - Brasil

    Telefax: (011) 442-38961997

    Teatro de Animao. . . .. . 21Entre o Real e o No Real: Consideraes sobre a

    Esttica do Boneco . . . . . . . . . . . . . . . . 25Comunicao, Arte e Tecnologia no Teatro de Ani-

    mao. . . . . . . . . . . . . . . 41Tradio e Teatro - Ritos e Mitos . . . . . . . .. 53A Mscara . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63O Boneco na Mira do Futuro: Consideraes sobre

    a Formao Profissional do Bonequeiro . . . .. 67

    II. EXPERIMENTAES POSTASEM CENA 77O Objeto: Do Sensorial ao Mstico 79

  • Uma Experincia com Formas: Processos para Con-cepo de um Roteiro 93

    O Incorpreo em Cena 111

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    A ~EM TORNO DA ANIMA - A ANlMAAO

    Os escritos aqui apresentados por Ana Maria Amaral -professora da ECA-USP e encenadora de formas animadas-iro surpreender o leitor habituado seja fruio seja reali-zao do teatro convencional. Entenda-se por convencionaltodos os modos e procedimentos, do passado ou da contem-poraneidade, regidos pelos princpios tcnicos e artsticosconsagrados pelo racionalismo e seu sustentculo mais proe-minente: o texto dramtico.

    De longa data Ana Maria dedica-se confeco e mani-pulao de bonecos, tendo iniciado suas atividades em bi-bliotecas infanto-juvenis de So Paulo para propiciar aosfreqentadores instigantes alternativas que os levassem lei-tura. Tendo-se radicado em Nova Iorque para uma longaestadia, trabalhou na Biblioteca das Naes Unidas e encon-trou no Bread and Puppet, poca um grupo inquieto erenovador dos padres da cena contempornea, incentivopara aprofundar e radicalizar sua atuao junto ao nascenteteatro de animao.

  • TEATRO DE ANIMAO

    Ao voltar ao Brasil, em meados da dcada de 70, elacriou o grupo experimental O Casulo, com o qual montoudois espetculos exemplares: Fantoches e Fantolixos, contem-plado com o trofu Mambembinho, e Palomares, que tam-bm levou os prmios Mambembe e Governador do Estado.Eram espetculos que exploravam variados tipos de bonecos,objetos, luzes e sonoridades, destinados a conformarem uminesperado universo potico.

    Integrante do Comit Executivo da Unio Internacionalde Marionetistas, a autora esteve presente nos primeirosanos 80 em diversos projetas que aliceraram e ampliaram ocampo de atuao do teatro de formas animadas em muitospases. Em Charleville-Mzieres, cidade do interior da Fran-a que sedia a mais importante organizao de marionetistasde todo o mundo, Ana Maria esteve por diversas vezes par-ticipando ativamente da difuso destas novas tendncias.

    J integrada ECA-USP, sua tese de doutoramento veioa transformar-se no mais completo levantamento realizadoem lngua portuguesa sobre a interconexo das formas ani-madas, suprindo uma lacuna intelectual h muito registrada.Dois espetculos nascidos de sua prtica pedaggica conden-sam e amplificam seu atual estgio de investigaes: A Coisa- Vibraes Luz do Objeto Imagem, surgido da colaboraocom artistas plsticos, realizado em 1990 e que terminou suacarreira de apresentaes em Teer, aps bem-sucedido cir-cuito nacional e internacional; e Babel - Formas e Transfor-maes, de 1992, onde a recorrncia ao tema mtico alicera-va uma decidida estruturao ps-modernista.

    Dentre os diversos objetos carregados numa cesta para oculto de Dioniso, poca em que os mistrios ainda no se

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    encontravam inteiramente assimilados pela polis, um curiosoboneco de engono se sobressaa: miniaturizado, articuladoe rusticamente entalhado em madeira esse arremedo da di-vindade permitia fosse externalizada sua mais notria parti-cularidade - ele saltava.

    T kat phusin pddn, sempre pronto a pular, a saltar,como registram as crnicas de ento, Dioniso materializavapara o grego arcaico a mais poderosa energia que habitatodos os seres vivos: a capacidade reprodutora, seminal, ca-paz de engendrar outra vida e responsvel pela continuidadedas espcies, Daquele primitivo authomata s mquinas ci-bernticas que infestam hoje em dia todas as mdias, a fun-o dissimulada de cada um deles parece ser a mesma: a demaravilhar, criando atravs da reverberao imaginria umaponte de interligao na zona de fronteira entre a alma e ocorpo.

    Assunto filosfico dos mais complexos, h um vitalismo,em suas diversas acepes, percorrendo esta confluncia, queveio a encontrar na psicanlise um ancoradouro abrangente,quando da elaborao do conceito de imagem corporal. Estanoo, apoiada que est no esquema corporal 'subjacente atodos os indivduos de um grupo humano homogneo, arepresentao inconsciente de seu desejo individualizado, ex-presso com vivacidade nas experincias desfrutadas, especial-mente marcantes junto senso-percepo. Sons, cores, plas-ticidades diversas, sombreamentos e iluminaes estimulama mente a uma sntese orgnica de reconhecimento - familiarou estranho - que se efetua pela mediao da linguagem,como metafrico labor da imagem corporal. O teatro deformas animadas, se percebido nesta perspectiva, vem sendoutilizado como um palco destinado a fazer confluir para seuinterior no apenas as expresses volitivas de seus cultores

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  • TEATRO DE ANIMAO

    como, numa mtica retomada do autmato dionisaco, ossecretos volteios de suas pulses, carregadas de viscosidadedesejante.

    por isso que o que h de "infantil" no teatro de bone-cos, de mscaras e de objetos - as trs modalidades cnicasque alimentam como razes o teatro de formas animadas -solicita ser entendido como a pluralidade de potencialidadesque a criana rene em seus primeiros anos de vida antes deiniciar suas especializaes libidinais e, neste processo, ir ina-pelavelmente adormecendo ou fechando parcelas desativadasde sua psique. O palco da animao pode fazer voltar, ento,com a energia exacerbada pela concentrao, uma imensaquantidade de estmulos dirigidos ao despertar de nossa per-cepo e imaginao; induzindo experincias sensrias quemuitas vezes julgvamos esquecidas ou superadas.

    Aquela disponibilidade para saltar, pular, subir e descerremete diretamente para a fonte da vitalidade, potenciali-dade pulsional emaranhada no corpo, manifestando-se napluralidade de atividades ldicas e sublimativas que vamosformando ao longo da vida. Aps o Homo laber, que multi -plicou os bens materiais e aprendeu a tcnica de suas mani-pulaes' sucede o Homo ludens, o irrequieto histrio quetrazemos dentro do peito que divertindo-se com tudo issopode projetar uma existncia mais livre, menos dependenteda subsistncia, mais aberta ao jogo que satisfaa sua nsiade desejos.

    Historicamente o teatro de animao pode ser conside-rado uma manifestao recentssima dentro do universo c-nico, elaborado como conceito nos primeiros anos 80; em-bora suas razes alonguem-se at os primrdios da civiliza-o. Foi esse teatro que, com suas provocativas criaes,colocou em xeque as antigas convenes do teatro estabele-

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    EM TORNO DA NIMA

    cido. Saturado pelo psicologismo, mimetismo, verossimi-lhana e linearidade do antigo teatro o pblico foi aderindos inovaes, reconhecendo nesta nova sensibilidade ~ressiva algo mais prximo de sua maneira de ver e sentir omundo que o cerca, marcado pela simultaneidade, fragmen-tao, imagtica e simbolizao crescentes de uma culturaerigida em gigantescos centros urbanos.

    Nos ensaios que se seguem o leitor encontrar frtil ediversificado material consagrado reflexooriginada por taisexperincias. Entrar em contato com as dvidas, preocupa-es e snteses afortunadas de uma autora que pode ensinarmuito sobre este debruamento sobre um modo novo de pro-duzir, executar e pensar o teatro, espraiando horizontes dadoscomo explorados ou incidindo inovadora ptica em questestomadas obsoletas pela mesmice e repetio.

    Com seu jeito de menina inquieta, Ana Maria Amaralnos transmite a sensao de laborar uma eterna busca no bade brinquedos guardado no sto; que, no fo~tame~te, o arqutipo da caixa de Pandora. Um manancial quase ines-gotvel de cores, odores, transparncias, sonoridad~, angu-Iaes, plasticidades, luzes e sombras que se volatizam aocontato com o ar, efmeros acontecimentos destinados aossentidos e memria primeva de cada um, cujo centro emis-sor a velha e to imorredoura esperana; esperana de umavida humana menos rude, mais potica, mais ldica.

    Este livro um convite imaginao de fazer teatro.EDELCIO MOSTAO

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  • INTRODUO

    Este trabalho pretende levantar reflexes sobre o Teatrode Animao - um gnero teatral que inclui bonecos, msca-ras, objetos, formas ou sombras, representando o homem, oanimal ou idias abstratas,

    A representao icnica do homem, e o uso de objetossimblicos, fizeram sempre parte de rituais sagrados. Rituaisesses que, com o tempo, se dessacralizaram e foram se trans-formando em espetculos mais ligados msica e dana,acompanhados por recitativos. Mscaras e bonecos eram ele-mentos fundamentais dessas manifestaes.

    No Ocidente, o teatro teve sempre como modelo o teatrogrego, que, por sua vez, sofreu influncias da civilizao egp-cia. E no Egito, antes do palco, a cena acontecia no altar,onde imagens inanimadas de deuses contracenavam com ossacerdotes. Aos poucos essas imagens foram sendo substitu-das por oficiantes, mesclando-se a o papel de intermedirio,deus e personagem. O ator-sacerdote assumia ento a impas-sibilidade escultural das imagens e os seus movimentos eramlimitados e controlados.

  • TEATRO DE ANIMAO

    No Oriente, antes do ator se colocar, ao vivo, na cena,eram usadas figuras inanimadas - a princpio projeradas emsombra, depois em terceira dimenso, manipuladas por fiose varas. Durante sculos, em todas as manifestaes teatraisda Europa, os atores usavam mscaras, sendo muito difundi-do tambm o teatro de bonecos. Mas, medida que o teatrose toma mais literrio e racional, os bonecos e a mscarapraticamente desaparecem. Por mais de trezentos anos, otexto predomina. No final do sculo XIX porm, por in-fluncia do movimento simbolista, e mais tarde do surrealis-mo, a expresso artstica cada vez mais se toma visual eabstrata, "Teatro no literatura", disse Edward GordonCraig, enfatizando a ao, o smbolo e o gesto como ele-mentos essenciais do teatro. Nessa corrente esto Iarry,Mae-terlinck, Artaud; e, mais recentemente, Tadeusz Kantor,Bob Wilson, Peter Schumann, Peter Brook, e o Thtre duSoleil. O conceito de ator tambm tem sofrido transforma-es. O prprio Grotowski que, em sua fase inicial, coloca oator como parte essencial do drama, em sua fase atual, essemesmo "ator" aparece como que "rnarionetizado",

    Marionete, boneco, figura , objeto ou forma . Qualquerque seja sua nomenclatura, estamos falando de um teatroonde o inanimado personagem central . Assim, Teatro deBonecos um termo insuficiente para abranger todas asmanifestaes que se pretende expressar, isto , no apenas arepresentao do quotidiano humano, mas tambm idiassimbolicamente colocadas atravs de objetos e formas abstra -tas. Da o nome: Teatro de Animao. Teatro esseque, ultima-mente, tem se desenvolvido extraordinariamente. Sente-seporm que existe uma grande defasagem terica a esse res-peito. E, seja no intuito do fazer teatral, seja no intuito dofalar sobre, fundamental ter-se conhecimentos bsicos so-

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    INTRODUO

    bre sua histria e sobre a sua situao dentro do panoramateatral contemporneo. Portanto, importante que se come-ce a levantar certas consideraes estticas; que se reflita ouse procure analisar o porqu e o como de algumas propostasmais experimentais. Sem isso, no s os grupos atuantesficam sem referncias e sem possibilidades de uma auto-ava-liao, como tambm os crticos no tm possibilidades dediscernir e julgar as to variadas propostas que esse tipo deteatro apresenta. Em geral esses espetculos - pela falta deparmetros - ou so ignorados pela crtica especializada ouso por ela apresentados sempre como inusitados .

    O livro aqui proposto est dividido em duas partes.Na primeira parte so apresentados diferentes conceitos

    desse gnero teatral, mais conhecido como um teatro onde ocmico e o grotesco predominam, sendo ainda poucas asmanifestaes mais ligadas ao potico e ao suril.

    So levantadas tambm consideraes sobre o bonecono teatro e na mdia, ou o boneco e suas relaes com atecnologia.

    Em outro captulo busca-se traar um paralelo entre tea-tro e tradio, mitos e ritos. O homem ao buscar suas ori-gens defronta-se com o sagrado, uma emoo possvel de serexpressa apenas atravs de conceitos abstratos. Da a necessi-dade de uma comunicao atravs de objeto-smbolos, Oteatro abstrato um tipo de teatro onde predominam ima-gens no claramente decifrveis, mas que satisfazem plena-mente os nossos mais secretos desejos metafsicos.

    So tambm abordados aqui alguns aspectos do traba-lho do ator no teatro de bonecos e no teatro de mscaras.Ou seja, enquanto o ator em mscara est ligado ao seu

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  • TEATRO DE ANIMAO

    prprio corpo, O ator-manipulador distancia-se do persona-gemjboneco que interpreta. O gestual de um e outro tam-bm distinto. O boneco com seus movimentos rpidos eleves apresenta quase sempre um gestual distorcido e solto,j os movimentos da mscara so mais lentos e comedidos.

    Na segunda parte, temos relatos de experincia e refle-xes tericas a partir de processos de trabalho. As montagensescolhidas so montagens experimentais onde os protagonis-tas so objetos, formas ou simples sombras incorpreas.

    Numa arte em que o dilogo e a crtica esto ausentes,este livro uma tentativa de comunicao.

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    IREFLEXES

  • TEATRO DE ANIMAO

    Teatro de Animao trata do inanimado, por isso pode-ria ser tambm chamado de teatro do inanimado.

    O que o Teatro do Inanimado?Teatro do Inanimado um teatro onde o foco de aten-

    o dirigido para um objeto inanimado e no para o servivo/ator.

    Objeto toda e qualquer matria inerte. Em cena repre-senta o homem, idias abstratas, conceitos.

    Inanimado tudo aquilo que convive com o homem,mas destitudo de volio e de movimento racional. Aoreceber energia do ator, atravs de movimentos, cria-se namatria a iluso de vida, e, aparentemente, passa-se a ter aimpresso de ter ela adquirido vontade pr6pria, raciocnio.

    Todo ser vivo tem um centro pensante e um centro deequilbrio. A qualquer objeto pode-se transferir vida, desdeque num ponto qualquer de sua estrutura material, se locali-ze um seu suposto centro pensante. O objeto assim simulapensar, sentir, querer, deduzir.

  • TEATRO DE ANIMAO

    Todo corpo tem um ponto de equilbrio. O corpo hu-mano tem um eixo mental e fsico (crebro e espinha dorsal)e tem membros (pernas, mos, braos) atravs dos quais agee inter-age. Ao receber energia do ator, o objeto materialtambm recebe um eixo central e membros, ou extenses,com os quais atua e se comunica.

    Animar um objeto deixar-se refletir nele, disse Mssi-mo Schuster. Boneco/objero animado no seno energia re-fletida do ator-manipulador. O que confere vida emotiva eracional ao objeto animado, durante o ato teatral, a presen-a direta e atuante do ator sobre esse objeto.

    Existe uma distino entre o personagem apresentadopelo ator-vivo e o personagem-boneco.

    O ator confunde a sua prpria imagem com a imagemdo personagem. O ator encarna o personagem. O ator visto. J enquanto ator-manipulador, a sua imagem no vista. Ou, quando vista, quando na cena o ator-manipula-dor est visvel, sua imagem deve ser uma imagem neutra,nunca a imagem do personagem propriamente. No Teatrode Animao a imagem do personagem sempre diferenteda imagem do ator-manipulador. Todo objeto animado,quando bem manipulado, neutraliza a presena do ator.

    Como disse mile Copferman, o ator . O ator existe,tem vida. Em cena, representa ser outro, mas conserva sem-pre a memria de si, e quase sempre trai o personagem, poisele no opersonagem. J o boneco no , isto , no existe,no tem vida prpria, mas opersonagem, o tempo todo'.

    Para Otakar Zich existem duas maneiras de se perceberum personagem animado. Ou melhor, existem dois tipos de

    L mile Copferman, "Une Singuliere Ethnie", Thdtre Public, set,1980.

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    TEATRO DE ANIMAO

    Teatro de Animao: um teatro em que os personagens sovistos apenas como objetos, isto , sem vida; e um teatro emque os personagens so vistos como dotados de vida", Noprimeiro caso, predominando a percepo de sua materiali-dade' no os levamos a srio. Ao tentarem imitar a realidadetornam-se grotescos. Despertam o riso. J no segundo caso,a percepo de vida mais importante do que a percepodas caractersticas materiais do objeto ou do boneco anima-do. Tornam-se assim enigmticos, so mistrio, estranheza.Vo alm da realidade. Despertam o potico.

    Tambm Meyerhold via dois tipos de teatro de bonecos:um teatro em que o diretor pretende que os seus bonecos seassemelhem o mais possvel ao homem, e um teatro em queo diretor no pretende reproduzir a realidade. Na tentativade copiar o humano, os bonecos ficam apenas cmicos.Meyerhold observa ainda que, se o que se pretende repro-duzir a realidade, por que usar bonecos e no atores vivos deuma vez? Deve-se usar bonecos apenas quando o que sepretende apresentar peculiaridades do boneco enquantoboneco mesmo, salientando seus movimentos, sua forma,explorando suas metforas, sem distorcer sua natureza.

    Nestas consideraes sobre o teatro de bonecos, Meyer-hold faz um paralelo com o teatro de ator. Assim como nose deve fazer do boneco uma simples rplica do homem, e,sim, fazer com que o boneco expresse plenamente suas ca-ractersticas de no-realidade ou fantasia, assim tambm oator no deve copiar a realidade como tal, mas deve criar,dentro da linguagem teatral, algo alm dessa realidade usan-

    2. Otakar Zich, ''The Puppet Theatre", artigo publicado em 1923 ecomentado por H. Jurkowski em artigo intitulado, ''Transcodification ofthe Sign Systemsof'Puppetry", Semiotica]oumaJ, 1983.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    do para isso uma linguagem no naturalista. Teatro no vida. E quanto menos real mais pr6ximo da essncia que sepretende representar.

    Existem portanto dois tipos de Teatro de Animao.Um teatro cmico, caricato; e um teatro potico, mais naesfera de idias simb6licas.

    O importante, ao se tentar dar vida ao inanimado, ressaltar as peculiaridades intrnsecas da materialidade comque todo objeto feito.

    Teatro esse encontro entre realidade e irrealidade. Ir-realidade se intui. Realidade o que se v em cena, tudoque ali est, e o que se v e est em cena so elementosmateriais. A matria em si, em toda a sua realidade, ao mesmotempo que toca o nosso consciente racional, provoca apelosao nosso inconsciente e desperta em ns outros nveis, an-micos. Em cena, magia.

    Animar o inanimado transpor um limiar.

    BibliografiaAsCH, Leslee. "The Theatrical lnanimate. Theatrical Inanimate: a

    Conference on Changing Perceptions of Puppetry", New York,Jim Henson Foundation, Septo 1992.

    BA1Y, G. & CHAVANCE, R. Histoire des Marionettes. Paris, PressesUniversitaires de France, 1972.

    BoGA1YREV, Petr. "The Interconnection of Two Similar SemioticSysterns: the Puppet Theater and the Theater of Living Actors ".Semtotica fournal. VaI. 47, 1983.

    COPFERMAN, mile. "Une Sngulire Ethnie", Tbtre Public. Set.1980.

    JAPELLE, Hubert. "L'interpretatlon du Mouvement", Tbtre PublicoSet. 1980.

    JURKOWSKl, Henryk. "Transcod ification of the Signs Systerns ofPuppetry". Semtotica fournal. VaI. 47, 1983.

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    ENTRE O REAL E O NO-REAL:CONSIDERAES SOBRE A ESTTICA

    DO BONECO

    L O BONECO NO TEATRO

    Sobre a Abrangncia da PalaPra Boneco e sua Especificidade

    O que se subentende pela palavra boneco?Ao procurarmos responder a esta questo, reportamo-

    nos ao que Frank Proschan chama de perfimning objects, in-cluindo no s6 bonecos, como tambm mscaras, objetos,formas ou toda e qualquer figura icnica'. Usando suas pr6-prias palavras, performing objects "so imagens concretas dohomem, do animal ou de espritos criados, apresentados oumanipulados em narrativas ou espetculos dramticos'",

    1. Performing objects no so objetos cnicos, nem objetos animados,seu significado mais abrangente. Incluifiguras antropomrficas e zoomr-ficas, objetos, imagens, apresentados no Teatro de Animao e/ou Teatro deFormas Animadas.

    2. Frank Proschan, "The Semiotic Study of Puppets, Masks and Per-forming Objects", SemWtica, voI. 47, 1983.

  • TEATRO DE ANIMAO

    FrankProschan ainda vai alm com esta sua abrangente defi-nio, ao explicar que, nestas representaes, no se pretendeser realista, ou no se buscam, um mnimo que seja, seme-lhanas concretas entre o ser vivo/animado que se quer re-presentar e a imagem cnica apresentada. .

    E qual seria a especificidade do boneco?A especificidade do boneco est no seu no-realismo.

    Sobre o teatro

    Ainda que se constitua um gnero parte, o teatro debonecos tem muita relao com o teatro de ateres. Existemaproximaes .

    A origem do teatro est ligada a manifestaes rituaisem que o foco de ateno no era o ator, mas figuras tot-micas, mscaras e objetos vrios, estes quase sempre sagra-dos. Somente aos poucos a figura humana foi romando par-te da cena, mas nem por isso excluram-se dela os perJormingobjects, os objetos e bonecos. Disse John Bell:

    A tcnica teatral de usar objetos em cena sempre foi uma carac-terstica 'dos assim chamados espetculos das culturas inferiores da Eu-ropa , e a posio hierrquica das tradies consideradas superiores noscegou, no nos deixando ver claro que esse fenmeno de teatro comobjetos e/ou bonecos , e sempre foi, um fenmeno global - alinguagem original do teatro multicultural ou intercultural3.

    o drama racional com dilogos e atares realistas, talcomo o conhecemos hoje em dia, um fenmeno recente na

    3. J. Bell, "Theater of the 20th Century, as Thearer of PerformingObjects", The Theatrical Inanimate: a Conftrence on Changing Perteptions.Ncw York,Septo1112, 1992.

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    ,ENTRE O REAL E O No-REAL ...

    hist ria do teatro, "no tem mais do que trezentos anos".Disse J. Bell: "O teatro nem sempre foi realista".

    O perodo racionalista do teatro inicia-se com o palcoitaliano, ou seja, com o uso da perspectiva. Coincide com aconstruo de salas especiais para espetculos. o perododos palcos organizados com tetos que possibilitavam a colo-cao de cenrios super-realistas. Os espetculos ento as-sombravam com nuvens e troves, chuvas que caam e anjosque voavam. Esse super-realismo cnico particularmenteocorria em grandes produes, como por exemplo a 6pera,onde era menor a concentrao no drama e no desempenhodo ator,

    Ocidente e Oriente

    O perodo racionalista, realista ou ilusionista do teatro uma caracterstica do Ocidente. Comeou a decair no finaldo sculo XIX. As inovaes colocadas por Alfred Iarry ape-nas proporcionaram a organizao de uma srie de idiasque ento se configuravam, principalmente por influnciasdo teatro oriental e da .arte africana, que comeavam a sersentidas. Surgem os simbolistas. A mscara retoma. O mo-vimento futurista provoca uma srie de reformulaes queacabam determinando, entre outras, a recolocao do objetoem cena. A Escola da Bauhaus organiza a cena centrada noespao e na forma. O Teatro do Absurdo e o construtivismousam bonecos ou, literalmente, objetos como smbolos cni-coso No teatro de Kantor, eles so fundamentais e se equipa-ram aos atores. E, para Brecht, era importante que o pblicose mantivesse sempre consciente entre o real e o no-real;Brecht explora a no-iluso. O seu teatro pretende tambm

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  • TEATRO DE ANIMAO

    despertar o racional, mas no atravs do realismo, ou dasensibilidade emotiva ou hipntica da iluso total.

    Com o teatro moderno, o teatro italiano revisto emodificado. A separao do pblico eliminada, pois o pal-co distante um fator de mistificao. Comea a se desen-volver um movimento antiilusionista no teatro. Sente-se umanecessidade maior de ligao com o pblico, tentando-semuitas vezes integr-lo ao espetculo.

    o real e o no-real

    Muitas dessas tentativas de aproximao, porm, noforam - ou no so - ainda bem aceitas. H um embaraoquando se sente a aproximao do personagem. Sem prepa-rao nenhuma, o pblico est em desvantagem com relaoao ator, que tem algo j planejado, ensaiado, e est diante deuma situao previamente preparada. O que uma pessoasente na platia o equivalente a um choque. o confrontodo real com o no-real. O ator, figura de fico, est distan-ciado da situao real da platia. Ele investe com uma coura-a que esconde e defende o homem real que .

    O palco uma linha divisria entre o pblico e os ato-res, pessoas fictcias. Como disse Richard Southem, ao setentar romper essa barreira desperta-se no pblico um emba-rao, pois difcil, na ausncia de uma preparao prvia,sair .de uma confortvel passividade, defendida no escuro eno anonimato da platia. O ator, em seu personagem, umamscara",

    4. R. Southern, The Sel>en A,gt:l' of the Theatre, New York, Hill &Wang,1961.

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    ENTRE o REAL E o No-REAL ...

    E mscara total o boneco que, no sendo real (e aplatia sabe que de madeira, pano ou papel), mais bemaceito nesse jogo do real com o no-real. Ainda mais quandoos seus manipuladores esto ocultos, ou, se visveis, quandosabem ser suficientemente neutros.

    Interessante observar a evoluo do espao cnico. Nes-sa sua trajetria, vemos semelhanas entre o palco do ator eo do boneco.

    Assim como o teatro se afastou do proscnio e avanouem direo ao pblico, movimento semelhante aconteceuquando o teatro de bonecos se liberou dos biombos. Osmanipuladores abandonaram seus redutos fechados, os pal-quinhos, para atuarem tambm em cena aberta.

    O teatro de bonecos mostra, hoje, tendncia de fugir doilusionismo exagerado em que por muito tempo se encerra-ra, ao querer copiar o teatro de ator.

    No teatro de luva, "os biombos no tm a funo decriar uma iluso total, mas apenas parcal'". O palco fechadodo teatro de bonecos tem como funo esconder os mecanis-mos que criam a iluso. Nada mais. Onde talvez persistaainda uma preocupao ilusria maior no teatro de mario-netes (bonecos controlados por fios). No por seus manipu-ladores, visveis ou invisveis, mas pelo realismo das figurasou das situaes dramticas, por demais imitativas.

    Mas, de uma maneira geral, o teatro de bonecos, poressncia, anti-realista. A ilusoda realidade que nele se busca muito mais em relao aos mecanismos de manipulao doque em relao s situaes que se colocam. como umjogo com presenas visveis e invisveis; ou seja, ateres, ora

    5. R. Paska, "Notes on Puppet Primitivcs and the Furure of an Illu-sion", TheLanguRlJe ufthePuppet, s. 1.,Pacific Puppetty Center, s. d,

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  • TEATRO DE ANIMAO

    visveis, ora invisveis, apresentam personagens humanosconcretos e personagens representando esprtos".

    No bunraku os dramas humanos so mostrados em ilu-so teatral, mantendo sempre um certo distanciamento. Omanipulador to visvel quanto os personagens que apre-senta, mas sua presena neutra, como se estivesse ausente.E os seus personagens, ainda que aparentemente realistas,no se inserem em contextos realistas.

    Neste tipo de teatro cada elemento mostrado separa-damente: a msica, ou seja, os msicos; a literatura, ou seja,o texto e o seu narrador; o personagem e os seus manipula-dores, o rosto do boneco e o rosto do seu manipulador-mes-tre.

    ainda no Oriente que vemos existir, ao mesmo tempo,um pblico visvel e no-visvel. Em Java, um dalang noconsidera que est se apresentando apenas para o pblicoque se v, de carne e osso, que respira, aplaude, chora, masele atua para os espritos, que cr estarem tambm ali pre-sentes.

    No Oriente, tanto o teatro como o teatro de bonecossempre mantiveram clara uma linha anti-realista.

    No Ocidente, durante algum tempo, o teatro tambm seexpressou nesse nvel, entremeando seus atores com bone-cos, mscaras, objetos e formas simblicas, at o momentoem que enveredou por um exagerado realismo. Nessa onda,o teatro de bonecos, deslumbrado, seguiu as pegadas dos

    6. ~o.bunraku o ator/manipulador deve, antes de mais nada, apren-der a ser invisvel, Ele tem que aprender a andar de acordo com a msicaecom o ritmo das palavras recitadas e, ao mesmo tempo, no deixar que sepercebasua presena. Totalmente presente,devesaber fazer-se ausente.

    7. H. Jurkowski, "Transcodificarion of the Sign Systems of Puppe-try",Semioti&a, vol.47, 1983. Nmero especial.

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    ENTRE o REAL E o No-REAL ...

    atores, buscando tcnicas e temas realistas. Vemos a o prin-cipal fator de seu declnio. Esse pretenso teatro miniaturiza-do, cultivado pela elite e por literatos e intelectuais, ao seafastar de suas caractersticas essenciais, por mais srio quetenha sido, foi sendo esquecido e, aos poucos, relegado amero divertimento de crianas. Enquanto lazer infantil, elese afirma, porque a suas caractersticasde fantasia e no-rea-lismo se mantm.

    o teatro de bonecos: dois enfiques

    Novamente gostaria de lembrar Frank Proschan, queinsiste em analisar o teatro de bonecos em si isto em seu, ,prprio sistema. Segundo F. Proschan, um adulto v umboneco como crnico, enquanto as crianas, mais ingnuasou desprovidas de conceitos, o percebem em seu significadoreal.

    Tambm Bogatyrev destaca dois tipos de teatro de bo-necos:

    1. o que busca copiar o realismo, seja atravs da ima-gem, do movimento ou da voz, e assim substituir o homempelo boneco, resultando da figuras grotescas, caricatas, c6-micas;

    2. o que no busca formas realistas e, ao enfatizar oaspecto material da forma, mais se aproxima da essnciadaquilo que pretende representar, pois quanto menos pecu-liar, mais abrangente, despertando maior curiosidade.

    No primeiro caso, busca-se criar fielmente a realidade ea conseqncia uma grotesca caricatura.

    No segundo caso, como no se pretende copiar total-mente a realidade e o que se coloca em cena um no-real

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  • TEATRO DE ANIMAO

    (ou O real abstratamente interpretado), cria-se imediatamen-te um impacto e tem-se a impresso de se ter um ser vivo nopalco.

    So infinitas as nuances, mas existe um limite que deveser respeitado. Em lugar de tentar ultrapassar esse limite, melhor substituir o boneco por um ator, da mesma formaque no se deve insistir em se fazer do ator um boneco ouum objeto.

    Real e no-real - sinais da nossa contemporaneidade

    Entre o real e o no-real defronta-se a modernidade.Vivemos hoje muito mais de imagens e de representaesno-corpreas do que de presenas reais.

    O teatro de bonecos, como o teatro de ator, est passan-do por transformaes diretamente ligadas nossa vivnciaindividual e social. Elas tm, no nosso subconsciente, umsentido profundo, que talvez s a nossa intuio nos permitaperceber.

    A mdia e a tecnologia possuem armas poderosas capa-zes de nos fazer levitar, de nos ajudar a romper as barreirasdo real, desde que no se insista em delas se utilizar parasimplesmente copiar o cotidiano . O importante que, atra-vs do teatro e dos bonecos, consiga-se transcender a realida-de temporal.

    As transformaes que hoje acontecem no teatro de bo-necos acontecem no apenas por influncias do Oriente,conforme j colocado, mas tambm, e principalmente, pelosconstantes avanos da tecnologia. Um processo ao qual esta-mos sujeitos diariamente.

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    ENTRE o REAL E o No-REAL ..

    II. O BONECO NA MDIA

    A tecnologia

    O boneco atua no apenas no teatro, mas tambm nocinema, na TV, no vdeo. E qual seria a diferena dessas suasaparies, ao vivo e na mdia?

    No teatro existe a presena fsica do ator. E no teatro debonecos, alm da presena fsica do ator-manipulador, existetambm o boneco, com sua estrutura material". E na mdiao que temos so apenas imagens, tanto do ator como doboneco.

    A tecnologia nos abriu muitas possibilidades, com isso,provocou muitas mudanas. Mas so mudanas mais a nveltcnico e formal, porque a essncia das coisas, essa a tecno-logia no muda. E seja no teatro, ou na mdia, a especfici-dade do boneco continua sendo a mesma.

    De uma forma geral, a tecnologia trouxe para a arteincrveis vantagens, acompanhadas de iguais desvantagens. Aluz eltrica, por exemplo, nos proporcionou uma nova ma-neira de ver as coisas, nos deu uma perspectiva diferente dosobjetos : profundidade, sombras, imagens novas e bizarras.Nos tornou mais sensveis s coisas em si. E quanto aos

    8. O atar, por ser vivo, tem em si mesmo forte energia. A matriatambm tem energia, ainda que diferentemente, isto , no tem um movi-mento aparente, mas existe um movimento contnuo em suas molculas,que no se vem, mas se percebem: vibraes emitidas pela cor, forma, tex-tura, sons etc. Para captarmos o que os objetos tm a nos dizer, precisamosmanter um contato fisico com eles. E para transmitirmos suas energias pre-cisamos de um tempo diferente do ritmo e do tempo usado na TV ou novdeo. Um tempo mais lento, o tempo natural, prximo da respirao.Maispropcio reflexo.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    objetos, graas aos avanos da indstria, esses proliferaram einvadiram-nos de tal forma que so, hoje, parte fundamentalde nossa existncia, comparsas dos nossos dramas ou com-dias dirias. A tecnologia industrial invadiu e modificou nos-so cotidiano. Impossvel no perceber o que as coisas e obje-tos, diariamente, nos gritam em termos de formas, cores,funes.

    A luz, ao mesmo tempo que amplia a cena, ressaltadetalhes antes no perceptveis. Mas ao mesmo tempo que aluz aproxima ela tambm coloca uma distncia entre o palcoe o pblico.

    O som faz calar muitas vozes, substituindo textos, antesmuito longos, para fazer da msica parte integrante da dra-maturgia. E os microfones, aproximando os personagens,mudou muitas das caractersticas dos espetculos tradicio-nais. O som gravado e a facilidade de se transportar os cadavez mais miniaturizados aparelhos afastaram a msica aovivo dos espetculos populares.

    A tecnologia trouxe vantagens e provocou impactos.Deu-nos o cinema, a TV, o vdeo" .

    Com as inovaes tecnolgicas, o teatro se modifica. Orealismo que nele se pretendia encontrou sua expressomaior na TV e no cinema, que oferecem muito mais recur-sos tcnicos. Aos poucos, o teatro foi enveredando por ou-tros caminhos. Atualmente, teatro e cinema so duas artesbem distintas.

    9. Indumos o vdeo com a TV, independentemente de ser ele vincu-lado TV comercial ou s produes institucionais, promocionais etc., por-que, pelos aspectos aqui focalizados, suas caractersticas no se diferenciamdo expostOsobre a TV. Fazemos exceo, porm, vdeo-arte.

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    ENTRE o REAL E o No-REAL ...

    o boneco na mdia - vantagens e desvantagens

    Assim como o realismo do teatro se transferiu para ocinema, o realismo do teatro de bonecos tambm pareceestar se transferindo para as suas atuaes na mdia. Mas atambin, pelas mesmas dificuldades, no teatro como na rn-dia, o boneco tem problemas. A princpio, deslumbra pelailusria semelhana com o atar e as possibilidades de seocultar o manipulador ou os mecanismos de controle doboneco. Mas, depois nota-se que ele apenas uma entreoutras figuras animadas: robs, mquinas-simulacros, ms-caras e brinquedos.

    O boneco na TV, no vdeo10 e no cinema, na maiorparte das vezes, surge em representaes antropomrficas,bem realistas. A tecnologia favorece um desvario ilusrio.

    Como vantagem, a mdia deu ao boneco um melhorstatus e lhe trouxe uma grande popularidade. A TV atingeum pblico maior. Mas os seus contedos se achataram. Oque nela se produz de discutvel qualidade, justamente poresse alargamento de audincia. Sendo o pblico de TV umpblico indiscriminado, tudo se nivela pelo geral.

    Na tela, a imagem do boneco se amplia. A TV e ocinema favorecem uma intimidade maior com a imagem,mas ao mesmo tempo destri a intimidade com o pblico. Atcnica nos d uma imagem melhor, mas essa imagem, nosendo real (por mais realista que aparente ser), faz com queo boneco se distancie e perca o contato com a platia.

    No teatro, assiste-se a um processo de criao; cadaapresentao diferente, criando-se assim uma expectativa,como o andar de um trapezista sobre a corda bamba. Na

    10. Ver nota anterior.

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  • TEATRO DE ANIMAOmdia, assiste-se a um produto final, que no muda e notransmite a mesma emoo.

    o bonequeiro e a mdia

    No af de se chegar a um mximo de iluso, constante-mente esto se buscando novas tcnicas. Entre estas, a mani-pulao por controle remoto. Porm, pela vertiginosa evolu-o da tecnologia, essa tcnica j est quase ultrapassada.

    Tm-se notcias, agora, de um tipo de boneco, usado noprocesso de realidade virtual. Com essa tcnica, possvel acontracena de imagens, mesmo que no compartilhem omesmo espao.

    Tambm rplicas de vida (humana ou animal) esto sen-do construdas, com possibilidades de se reproduzirem por simesmas. "Sexo" no inanimado? Vida artficialt!'

    H urna srie de avanos ocorrendo na mdia e, emmeio a eles, os bonequeiros no parecem estar participando

    11. Sobre a "vida artificial", foi publicado recentemente o livro deSteven Levy, TheQJlestfor a NewCreation, em que ele nos fala de mdquinasquepensam ou alguma coisa alm de uma simples animao de vdeo. Socomputadores capazes dese reproduzirem por si mesmos, criando vida arti-ficial. Mquinas que fazem no apenas o que para elas se programou, mastambm o inesperado. Algo prximo ao boneco, mas alm do que estamosacostumados a controlar.

    A origem dos bonecos est nesse fascnio, que sempre dominou o ho-mem, de se ver representado, ainda que no necessariamente de maneirarealista. Algo que lhe d a sensao de se ver refletido, seja na gua, seja emsua prpria sombra, em figuras esculpidas, em bonecos ou em autrnatos,na fotografia, em filme ou vdeo. J se disse que os autmatos de ontem soos computadores dehoje. E, entre todos esses simulacros, o boneco anima-do do teatro de bonecos o que mais exerce fascnio, porque, alm da ima-gem, leva voz e movimento.

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    ENTRE o REAL E o No-REAL...

    nem na confeco, nem na manipulao. O que se busca,antes de tudo, so os tcnicos. E os bonequeiros, exmios naarte de dar vida ao inanimado, so substitudos por especia-listas em operao de mquinas. Alguma coisa nos escapa?Corre adiante dos nossos olhos? Ou amplia-se por todos oslados?

    A mdia e o teatro de bonecos contemporneo

    Os avanos da tecnologia, sempre em contnuo proces-so, por sua vez redundam numa srie de transformaes parao teatro e para o teatro de bonecos, o que nos leva a refletirsobre as caractersticas de wn e de outro, suas especificida-des, suas essncias.

    Assim como o teatro hoje tende por caminhos maisabstratos, imagticos e simblicos, tambm o teatro de bo-necos vem sofrendo profundas transformaes.

    Estas transformaes, porm, no parecem estar sendopercebidas ou aceitas por grande parte dos grupos brasilei-ros. Pelo menos essa a impresso que se tem, ao assistir aosnossos festivais, onde a maioria dos espetculos permanecemno mesmo teor que os apresentados h dez ou trinta anos.Continua-se nostalgicamente na mesma linha, com muitopouca pesquisa. E, com pesquisa, no quero me referir atcnicas de construo de bonecos, que muitas vezes pode atter um sentido retrgrado. Fica-se facilmente deslumbradocom qualquer descoberta tcnica, talvez pela possibilidade deaproximao com a mdia, que exige caractersticas muitorealistas. Mas o que se consegue de novo em termos delinguagem? Ou em termos da arte e da esttica do boneco?

    Poder-se-ia, talvez, dizer que existem duas tendncias: ados que persistem em seguir o caminho ilusionista e realista

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  • TEATRO DE ANIMAO

    de um teatro decadente ou o caminho do realismo vigentena TV e no cinema; e a dos que enveredam para pesquisas ebuscas de uma linguagem nova, que, intuitivamente, estsendo criada.

    Nesta segunda tendncia, ou neste ltimo grupo, ocorreo que Roman Paska chama de liberao do "mimetismo".De acordo com Paska, o teatro de objetos e de formas ummovimento que expressa a vontade de liberar o boneco dessemimetismo.

    "O teatro de objetos a mais importante reao ao exage-rado realismo que alguns insistem em preservar." No teatrode objetos, a figura humana totalmente desmistificada.

    Louvo a tecnologia pelas possibilidades que levanta so-bre a materialidade das coisas, em particular, e da nossa vida,em geral. A mdia nos faz ver detalhes que antes no perce-bamos. E a comunicao, que atravs dela se veicula, colo-ca-nos numa frentica intimidade com os acontecimentos domundo. fascinante! Faz-nos ver melhor o mundo e aspessoas que nos rodeiam. Um mundo que vemos e nopercebemos. Um mundo real e no-real. A tecnologia pa-radoxal e conflitiva. A mdia pode ser tima mas ruim o mauuso que se faz dela. Precisamos ficar atentos para no utili-zarmos o novo de maneira velha.

    Em resumo, preocupante a insistncia de um ranosorealismo, tanto no teatro de bonecos como nos bonecosapresentados na mdia.

    ArejlexiJ

    Importante repensar sobre a essncia desta nossa arte eno desperdiarmos as oportunidades que se nos abrem. preciso nos achegarmos ao novo com perspectivas novas,

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    ENTRE O REAL E O N o-REAL .. .

    sabendo distinguir entre o pragmtico e os nossos compro-missos enquanto artistas. verdade que ainda estamos numapoca em que imperam as grandes corporaes controlado-ras do mercado da imagem. Mas, a cada dia que passa, aimagem torna-se cada vez mais domnio pblico e, logo,muitos tero acesso a ela. Por isso, tempo de se comear apensar de maneira mais independente, considerando antes detudo a esttica desta expresso que escolhemos ser a nossa: aarte do boneco.

    BibliografiaBsu, J. "Theater of the 20th Century, as Theater of the Perfor-

    ming Objects". Tbe Tbeatrical tnanimate. A Conference onChanging Perceptions. Conference Papers. New York, J. Hen-son Foundation, Sept o11-12, 1992.

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    POUNDSTONE, William. "Artificial Life: The Quest for a New Crea-tion. New York Times. Book Review, Sept 6, 1992.

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    SEM/77CA: Internatonal Association for Semiotic Studies, vol. 47,1983. (Nmero Especial)

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  • TEATRO DE ANIMAAo

    SOtmiERN, N. R. Tbe Seoen Ages ofthe Tbeatre: New York, Hill &Wang,l%1.

    "T HE THEATIUCAL lnanimate Conference: A Conference on Chan-ging Perceptions, 1992". Conference Papers. New York, JimHenson Foundation, 1992.

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    COMUNICAO, ARTE E TECNOLOGIANO TEATRO DE ANIMAO

    Comunicao e TecnoJgiaComunicao o ato de se emitir idias atravs de m-

    todos convencionados. Ela pode ser verbal e no verbal.Signos e smbolos so emitidos atravs de palavras (escritasou faladas), atravs de objetos, imagens ou aparelhagens tc-nicas. E, numa poca caracterizada por possuir uma culturapreponderantemente visual, ressalta-se a importncia doTeatro de Animao, como linguagem apropriadamentecontempornea.

    A comunicao se processa tanto no plano social e pes-soal (teatro, literatura, arte em geral), como num plano maisamplo, atravs da comunicao em massa (jornal, rdio, ci-nema, TV). Em ambos os nveis, o processo de comunicaodepende de tcnicas, seja a tcnica de que toda arte feita,seja de outros instrumentais, mais complicados. Em nossosdias, impossvel dissociar comunicao e tecnologia, pois,atualmente, a comunicao o resultado de um processoaltamente tcnico.

  • TEATRO DE ANIMAO

    Arte e Tcnica

    A palavra tcnica vem do termo grego techne, e se referea toda e qualquer atividade produtiva, inclusive arte. NaGrcia no se fazia nenhuma distino entre arte e tcnica.Esse conceito perdurou muito tempo, pelo menos at a Re-nascena. Para Leonardo da Vinci, diz-nos Arlindo Macha-do, pintar um quadro ou estudar geometria era uma mesmaatividade intelectual; e para o filsofo Francis Bacon, e seuscontemporneos, "a figura do inventor se sobrepe dosbio iluminado, e a mquina o modelo conceitual paraexplicar e representar o universo fsico natural'". A arte,segundo o mesmo autor, reflete sempre o nvel de avano datecnologia do seu tempo. Existe uma linguagem comumentre a linguagem do cientista e a do artista, e sempre houveuma fone influncia da cincia sobre a cultura'.

    A separao entre arte e tecnologia posterior Renas-cena. O conceito de que a tcnica objetiva e reflete aordem, e de que a arte subjetiva e reflete o caos, nocoincide com o que pensam sobre a arte outros pensadores eartistas . Se a arte, em sua nascena, acaso e desordem, aose expressar, ao se objetivar, necessariamente, ela se ordena."Arte anttese do pandemonium", dizia Craig ao preten-der substituir o ator, de temperamento instvel e egocntri-co, por figuras inanimadas, mais previsveis e despersonali-zadas" ,

    Ser objetivo, ordenado e previsvel no atributo s6 dacincia. Arte tambm tem suas leis e suas regras. Um escul-

    1. Arlindo Machado, Mquina eImagindrio, So Paulo, Edusp , 1993.2. Idem.3. Edward Gordon Craig, On theArtofthe Theatre, New York, Thea-

    tre Arts Books, 1956.

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    COMUNICAO, AR TE E TECNOLOGIA ..

    tor, ao esculpir suas peas, depende das leis e das regras impos-tas pelo material que tem em suas mos, como o encenadordepende das leis do espao e dos avanos tecnolgicos dasmaquinarias teatrais, da iluminao e da sonoplastia.

    Se s vezes a tcnica aparenta permanecer mais no planooperacional, nem por isso se pode reduzi-la a mero instru-mento, mas deve-se lembrar que ela tambm nos remete acontedos. A luz, por exemplo, refora e at cria um perso-nagem. E muitas vezes, em certas produes cnicas, a tcni -ca que confere emoo ao texto . Por exemplo, numa mon-tagem de A Metamorfose, de Kafka, a tecnologia tem tudo aacrescentar",

    A tcnica tambm pertence ao plano esttico e potico.

    Bonecos, Autmatos, Imagens e Mquinas

    Em todos os tempos e culturas, o homem sempre bus-cou reproduzir sua imagem, seja atravs de simulacros est-ticos (em barro, madeira, metal, pintura ou fotografia) sejaatravs de simulacros em movimento (figuras bidimensio-nais do teatro de sombras, bonecos tridimensionais, autma-tos robots ou atravs de imagens criadas atravs das tcnicas, ,cinematogrficas, TV, vdeo, ou computador).

    O boneco sntese do homem tanto quanto a mquina a exteriorizao das faculdades humanas. Uma marionetemovida por fios ou um boneco mecnico, ambos pretendemexteriorizar atributos do homem.

    4. Franco Brambilla, "Tecnologa y Potica", Puck, n. 2 (Rev. doInst, Int, da Marionete). Artigo em que o autor comenta o espetcuJoDopoii copo de scopa, baseado na Metamorfose de Kafka.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    No incio do sculo XIX, Heinrik von KIeist colocou emdiscusso a idia de que a marionete reflete as mais elemen-tares leis cinticas do universo. O teatro de bonecos desper-tou seu interesse justamente por seu mecanismo, mais doque por seus aspectos esttico-visuais, sociais ou psicol6gi-cos".

    Essa mecanicidade do boneco foi o que atraiu diretorese pensadores romnticos. Ainda que alguns vissem na preci-so de movimentos dos bonecos e dos autmatos apenas umestmulo dirigido aos sentidos, no ao esprito, outros viamnessa mecanicidade um paralelismo da mecanicidade doator, que, segundo alguns, condio ideal para induzi-lo auma maior interioridade.

    Para os romnticos, os autmatos e as marionetes ti-nham a mesma significao que a de uma mquina. E con-vm lembrar que a mquina, para eles, pertencia ao universopotico, e tanto a mquina como os bonecos foram, poreles, extensamente usados como metforas da existncia hu-mana. O automatismo estava tambm relacionado ao auto-matismo da nossa inconscincia.

    A Mquina, os Futuristas e Ns

    Tambm entre os futuristas, o conceito de boneco emquina se confundia. Para os futuristas a mquina tinhaum sentido positivo de fora e lan vital. Segundo eles, opersonagem-homem/atar, no teatro, deveria ser substitudopela matria, pois nada melhor do que o concreto para re-

    5. H. von Kleist, "Sobre o Teatro de Marionetes", Cumunica;4es eAr-ta, n, 2. Trad. de Ianchelli Ghinzberg, 1970, ECA/USP.

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    "

    COMUNICAO, ARTE E TECNOLOGIA .. .

    presentar o abstrato. Para isso os futuristas utilizaram-se,largamente, de imagens, bonecos, mscaras e objetos. OTeatro Sinttico Futurista apresenta uma esttica mecnica.No foi toa que muitos dos seus artistas se aproximaramdo Teatro Piccoli di Podrecca, pois viam no boneco a sntesede suas idias".

    A Escola da Bauhaus, com sua geometria espacial e seusmanequins em volio, vai influenciar uma srie de artistascuja obra se torna mais notria a partir dos anos 50 ou 60.Entre esses, o polons Tadeusz Kantor, um dos mais impor-tantes diretores de nosso tempo. As figuras mecnicas deKantor so peas fundamentais de sua potica.

    Na dcada de 50, mais ligado ao movimento e artecintica, encontramos Harry Kramer e o seu teatro mecni-co' onde ele mostra "estados sucessivos de movimento".Kramer, em seu teatro, no nos conta propriamente umahist6ria, mas ele nos apresenta a poesia da preciso. Assiste-se a ao movimento.

    Mais recentemente, Dennis Pondruel, engenheiro e ma-rionetista francs, criou as mquinas teatrais.

    O teatro, para Pondruel, antes de tudo transformao.As suas histrias so analogias que ele apresenta a partir deobjetos e mquinas que ele mesmo cria. Os seus persona-gens-mquinas so de diferentes tipos: h os personagens-mquinas tipo rel6gio, onde no se v a mquina, a engrena-gem no mostrada, apenas os ponteiros testemunham atransformao do tempo. H tambm o personagem-mqui-

    6. G. Baila apresentou, em 1914, o espetculo .Mdquina Tipogrdfia,uma pea cujos personagens eram bailarinos com gestos rgidos, exatamentecomo bonecos geomtricos; e, em 1919, apresentou O PelJuenD Teatro tBonecos Dindmkos,com Cendrios Mpeis.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    na tipo bomba, cuja transformao redunda em sua auto-destruio, e nesse personagem o processo de sua transfor-mao explcito. Um exemplo de personagem-mquinabomba pode ser um giz. Pondruel tem uma cena em que umgiz apaixonado por uma lousa, ao toc-la, se destri, e assimse transforma em signo. Para o seu espetculo El Cid, ele usaas suas mquinas-lingsticas, um sistema mecnico cujosmovimentos provocam um dilogo, criando uma relao en-tre as diferentes peas da mesma mquina. O dilogo con-seqncia de uma programao onde cada pea tem sua evo-luo. Quando o movimento de uma termina provoca omovimento seguinte. Pondruel fala por metforas. Ainda emEl Cid, na cena em que Rodrigo, representado por um enor-me gancho, vai s Cruzadas, depois que se despede da ama-da Chimenes, o gancho colocado em trilhos por enormeguindaste (o destino), e assim ele sai de cena.

    Seja a mquina um personagem, ou seja a mquina umsistema para se operar e manipular personagens, hoje em dia,no sentimos - nem pela mquina, nem por seus mecanis-mos - qualquer deslumbramento. A nossa atitude diante damquina muito mais a de entrosamento.

    Sistemas de Controle e a Fuso da Tcnicacom a Arte

    As fronteiras entre cincia e arte esto cada vez maisdesaparecendo. As artes cinticas, a vdeo-arte, a msica ele-trnica so exemplos.

    No teatro de bonecos busca-sealiar a tecnologia ao cor-po vivo do ator-manipulador. o que acontece em anima-tronics; uma nova tcnica na qual os manipuladores usam um

    46

    ,~ .

    COMUNICAO, ARTE E TECNOLOGIA .. .

    sistema de controle remoto com captadores eletrnicos aco-pIados s imagens ou aos bonecos.

    A tecnologia no teatro de bonecos acontece enquantotcnica de construo e enquanto tcnica de manipulao.Na verdade as duas coisas vm sempre juntas. Como disseGeorge Speaight, "Construir um boneco colocar nele dis-positivos com os quais ele ser depois animado". Esses dis-positivos podem ser muito simples, como uma vareta oucomo um pescoo bem ajustado; como podem ser mecanis-mos de controle mais complexos, que vo desde o ancestralcontrole por fios, aos controles feitos atravs de clculosmatemticos de computadores.

    Mas, ao invs de tentar adentrar em tecnologias contem-porneas, com as quais no temos nenhuma familiaridade,vamos regredir no tempo e verificar que afinal as coisas nomudaram tanto.

    Muitos sculos antes desta nossa era, a tcnica de mani-pulao era segredo de poucos.

    No Antigo Egito s aos sacerdotes era dado o poder demanipular imagens, um artifcio feito atravs de fios ocultos,vedados aos olhos do pblico. Na China, conta a tradio,existiu, no sculo X a.C., um certo mestre Yan, capaz defazer figuras to perfeitas que uma vez ao se apresentar dian-te do sulto, despertou sua ira porque um de seus persona-gens piscou para uma de suas concubinas. Enciumado osulto mandou mat-lo. Diante dessa ameaa, mestre Yanrevelou o segredo do mecanismo que havia inventado para

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  • TEATRO DE ANIMAO

    dar vida aos seus bonecos: um sistema mecnico, em queutilizava fios internos, invisveis.

    No Japo, j no sculo V a.C,, tem-se notcias debonecos que desfilavam nas ruas sobre carros", Eram ver-dadeiros robots, que atraam o espanto e a admirao dopovo que no podia perceber que debaixo dessas figuras,sob o carro, existiam manipuladores trabalhando, secreta-mente.

    O sistemade controlede manipulao atravs de fios invi-sveis foi desenvolvido tambm na Europa, sculos mais tar-de. Charles Magnin, historiador francs, nos conta que ha-via um grupo de artistas italianos capaz de mover figurashumanas de 4 a 5 ps de altura, sem que, aparentemente,existisse ao seu redor ningum que as controlasse. Essas figu-ras falavam, andavam e atuavarn to perfeitamente que pare-ciam criaturas vivas. tambm conhecida a histria da fam-lia Briocch (Briocci, na Itlia) que certa vez teve um de seusmembros perseguido pela Inquisio, acusado de magia e deligao com o diabo, tal o domnio que mantinha sobre assuas figuras.

    Como se v, a habilidade tcnica de controle no umatributo de nossa poca, sempre existiu, ao longo da his-tria do teatro . Os movimentos que bonecos ou imagenshoje conseguem executar, por controle remoto, ou porprocedimentos algortmicos de computadores, antes, comoutros meios mais simples, tambm conseguiam deslum-brar.

    7. Informao dada por G. Speaight em sua palestra Hidden Contrrlfs.Varsvia, 1991. "Present Trends", R.esearch ofthe World ofPuppetryConfi-rena.

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    COMUNICAO, ARTE E TECNOLOGIA ...

    O que devemos deixar claro que a magia que os simu-lacros do ser humano despertam, por mais perfeitos quesejam, se no vierem acompanhados de um forte contedoemocional, toda a tcnica, neles colocada, cai no vazio.Mesmo que os movimentos sejam perfeitos, a c6pia s6 convincente se por trs dela existir um sentido humano.Existe uma diferena entre movimento mecnico e movi-mento intencional. Um bom ator-manipulador aqueleque imprime s figuras algo mais do que o simples movi-mento mecnico.

    Importante distinguir mecanismo, artesania e virtuo-sismo. O artista virtuoso aquele capaz de criar situaesnovas e imprevisveis, aquele capaz de extrair do rnecanis-mo algo mais do que ele pode dar. Quando isso acontece,acontece a fuso entre arte e tecnologia",

    Claro que para isso o artista precisa lutar contra muitasdificuldades, mas so essas dificuldades que fazem o frissonde um espetculo e fazem do tcnico, um artista. Depois devencido o como, o artista deve colocar o qu. Algo mais doque a simples aparncia.

    A mquina em si boa", A mquina em si positivaporque ela sempre a materializao de uma idia. Mas preciso acrescentar-lhe algo mais, para que no se torne ne-gativa ou mon6tona. E esse algo mais seria o humano, aemoo que perturba quando a fuso da mquina (a engre-nagem, ou parte material do boneco) se funde com a vidailus6ria do personagem.

    8. Por exemplo, as interferncias que [une Nam Paik cria nos aparelhos de TV, deformando imagens e criando outras, inesperadas; isto , in-terpretando dentro de um sistema fixo dado.

    9. E quando dizemos mdquina queremos nos referir tanto a um bo-neco bem construdo como a qualquer mecanismo tcnico usado.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    Concluso

    A comunicao em nossos dias - independente da lin-guagem que se utilize, das tcnicas ou das maquinarias -parece ter perdido a fora. Na enxurrada de notcias e infor-maes que se sucedem e nos atropelam, tornamo-nos insen-sveis. No processo de globalizao em que estamos submer-sos, tudo se dilui. Num mundo de perptuas e repentinasmudanas as transformaes sociais perderam impacto dra-mtico pois j fazem parte do cenrio cotidiano. Nossa rela-o com o tempo e com o espao mudou. Estamos carentesde proximidades, confidncias e mistrios, comunicaesmais intimistas e silenciosas. No teatro fascinam as cenassutis, s cabveis em pequenos auditrios, com objetos esimulacros falando atravs da incgnita dos smbolos, sint-tica e condensadamente.

    BibliografiaBOlE, B. L 'Homme et ses Symulacres. Paris, Corti, 1979.BRAMBllLA, F. "Tecnologia y Potica". Puck, n. 2 (Rev. Inst. Int. de

    la Marionnette).CRAIG, Edward Gordon. On the Art of the Tbeatre . New York,

    Theatre Arts Books, 1956.K1.EIST, H. von. "Sobre o Teatro de Marionetes", Comunicaes e

    Artes, n. 2, ECAJUSP, 1970.LISTA. G. "EI Espacio Marionetisado o el Teatro-Mquina dei Fu-

    turismo". Puck, n. 1 (Rev. Inst. Int. de la Marionnette).MACHADO, Arlindo. Mquina e Imaginrio. So Paulo, Edusp,

    1993.METKEN, G. "Entre la Marioneta y la Mquina". Pude, n. 2 (Rev.

    Inst. Int. Marionnette).50

    COMUNICAO, ARTE E TECNOLOGIA .

    NORMA, S. J. "Du Virtuel I'Hybride, le Montreur et son Ombrelectronique". Pude, n. 4 (Rev. Inst. Int. Marionnette).

    PONDRUEl, D. "La Bomba y el Reloj". Puck, n , 2 (Inst. Int , Marion-nette).

    SllVESTRI, F. "Retomo ai Teatro Mecanico de Muecos". Puck, n.2 (Rev. Inst. Int. Marionnette).

    SPEAIGHT, George. Hidden Contrais. "Present Trends" in Researchof the World of the World of Puppetry. Varsovie, UNIMA-Po-land, 1992.

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  • TRADIO E TEATRO - RITOS E MITOS

    Teatro e tradio se interligam como os ritos aos mitos.Ritos so cerimnias que o homem, desde os seus pri-

    mrdios, realiza para captar e reverenciar deuses, espritos danatureza ou de antepassados.

    O mito a busca do passado e a tradio o registrodesse passado. Buscar as origens buscar explicaes da vidae do universo. Os mitos, ao contar a histria de uma comu-nidade, mantm vivas as suas memrias, as trajetrias dasgeraes anteriores: histrias de heris e bandidos, deuses edem nios. Provocam a volta ao passado . E, "o simples atode narr-las j, em si, um retorno", disse Mircea Eliade.Segundo ele, nesse processo de volta, alguma coisa, em nsadormecida, ressurge. como se no comeo existisse umelemento estranho, diferente de ns mesmos, que o homemenigmaticamente percebe. No incio, diz Eliade, acontece oencontro com o Sagrado'. Voltar ao passado intuir a exis-

    1. Mircea Eliade, Imagens eSimboIos, So Paulo, Martins Fontes, 1991.

  • TEATRO DE ANIMAO

    tncia de alguma coisa anterior a ns, que, imponderavel-mente, nos atrai. Segundo Eliade, estamos diante de doismitos muito fortes: o mito da origem e o mito do retorno.Os mitos so conceitos que o homem inconscientementeadquire e expressa atravs de palavras, como tambm atravsde imagens. No se comunicam apenas atravs das narrati-vas, mas tambm atravs de figuras, atravs de "qualquerunidade ou sntese signficativa'". Expressam idias e concei-tos n;aterializados em palavras, sons ou imagens. Smbolos.

    A medida que a sociedade foi se transformando, as ceri-mnias rituais tambm sofreram modificaes. Assim sur-gem os grandes festivais religiosos. o incio do teatro. Osespetculos podem ter tomado caractersticas diferentes dascerimnias religiosas mas os temas mticos, esses persistemno teatro pico, depois nas tragdias, nas lendas e no imagi-nrio do povo.

    Na histria do teatro de bonecos - tanto no teatro desombras, como no teatro com bonecos de vara ou luva - ostemas esto sempre ligados tradio, ao passado, aos deu-ses, ao sagrado. Durante muitos sculos o boneco apareceligado ao teatro pico, um teatro simblico, visual, potico-narrativo.

    O teatro pico trata do passado. Passado o que foi.Podemos rememor-lo, reproduzi-lo, mas em nada podemosmodific-lo. rgido como um objeto, como os prpriossmbolos que a tradio se utiliza. E o homem, colocando-seno passado, tambm assim se v, rgido. O boneco, comoobjeto que , usado no tempo pretrito, mais que perfeito,

    2. M. Eliadc,idem.3. Banhes, 1975. Apud J. Julian Morente, Malic, n. 3, Barcelona,

    1995.

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    TRADIO E TEATRO

    e ideal para re-apresentar aes j realizadas, hoje imveis.Anatol Rosenfeld, ao falar das qualidades ilustrativas do bo-neco, apropriadas para o teatro pico, assim se expressou:

    o sujeito, projetando-se no passado, v-se como um objeto e opassado reveste esse objeto de uma rigidez semelhante rigidez doboneco, j que nessa dimenso temporal nada pode ser modificado4.

    Falar do passado trazer sua memria, represent-lo imit-lo, e, para isso, nada melhor do que o boneco: imita-o da imitao.

    Como os rituais, o teatro pico, ao tratar dos heris edas sagas de um determinado grupo, perpetua seu passado erefora a sua unidade e o sentimento grupal. Da a impor-tncia que toda comunidade ou pas atribui s suas tradies.

    Mas, manter as tradies, em outros tempos, era muitomais fcil. As comunidades viviam mais fechadas em si, iso-ladas umas das outras, no havendo entre elas a comunica-o que existe hoje.

    Hoje a situao outra. O contato com outras culturase outras realidades constante, tanto sob o ponto de vistacultural como econmico e tnico. E quanto mais afluentesos grupos, regies ou pases, maior o intercmbio entre eles. medida que o poder econmico aumenta, as culturas fi-cam mais susceptveis umas s outras. medida que umasociedade enriquece sucede o enfraquecimento de suas tradi-es. Influencia e influenciada.

    Nas Amricas em geral, o passado importa pouco. E noBrasil em particular, ao contrrio dos outros pases da Am-rica espanhola (onde foi encontrada uma forte civilizao - a

    4. Anatol Rosenfcld, O Teatro pico, So Paulo, Perspectiva, 1985,p.112.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    dos maias e dos astecas), quase no temos tradies". Nossatradio hoje uma mistura da cultura ponuguesa, africana,e de outros colonizadores, franceses, holandeses; somando-se, mais recentemente, a imigrao italiana, alem, japonesa,com rabes e judeus; sem falar nas influncias culturais ame-ricanas. Nessa mistura tnica, em meio a grandes diferenassociais, galicismos da linguagem, a prepotncia da TV, anossa nica fora o presente. Num presente em ebulio,nosso tempo o futuro. O novo o que importa. O passa-do, entre ns, ignorado. Por vivermos sob um processocontnuo e dinmico de constantes influncias e mudanas,somos, como diz o dito popular, "um povo sem memria".

    Excees existem apenas em certas regies econornica-mente menos favorecidas, onde as comunidades ainda per-manecem isoladas, mais fechadas em si mesmas e portantofiis a algumas tradies. No Norte e Nordeste do Brasilexiste uma cultura mais genuinamente brasileira, e que aindaassim se mantm.

    nessas regies que percebemos a existncia de umteatro de bonecos tradicional, com uma temtica prpria eum diversificado elenco de tipos humanos", A os bonequei-ros so quase sempre pessoas humildes de uma faixa muitocarente da populao.

    5. Os poucos ndios que aqui viviam foram rapidamente dizimadospelo barbarismo da colonizao europia .

    6. Peter Brook levanta o problema do enfraquecimento dos tradicio-nais tipos humanos, que nas condies amais da vida urbana j no se mani-festam to claramente. Os grandes centros urbanos so um fator de unifor-mizao dos "tipos", antes to peculiares nos lugarejos, e representados de-pois no teatro. P. Brook, Ponto de Mudana, Rio de Janeiro, CivilizaoBrasileira, 1994.

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    TRADIO E TEATRO

    Isso no acontece s no Brasil, de uma maneira geral, oteatro de bonecos tradicional parece estar ligado s regieseconomicamente mais pobres, onde a oportunidade de em-pregos quase inexistente e as influncias do mundo con-temporneo so raramente notadas. E se ocorre desses artis-tas adquirirem um melhor status, as suas apresentaes voaos poucos perdendo as suas caractersticas tradicionaismais puras. O som ao vivo, por exemplo, imediatamentesubstitudo por gravadores; bonecos de plstico industriali-zados so usados em lugar dos bonecos rudimentarmenteesculpidos em madeira; novos materiais, como espuma, soadotados na cpia de bonecos vistos na TV. Os bonequeirospopulares so pessoas de profisses indefinidas (lavradores,marceneiros, pedreiros), quase sempre sem empregos fixos-mas, se adquirem alguma estabilidade profissional, as suasatividades artsticas so relegadas, pois o teatro, definitiva-mente, no lhes garante a sobrevivncia. O teatro tradicionalde bonecos desperta um interesse relativo, restringe-se a umapequena poro da populao. Na maior parte de nosso pas, desconhecido. Mantm-se principalmente pela curiosidadee incentivos que recebe de alguns pesquisadores.

    Em outras regies mais desenvolvidas do pas, no Sul enos grandes centros urbanos, as influncias de outras cultu-ras e outros pases so sentidas mais fortemente. Preponderauma cultura muito heterognea. As experincias que maisatraem a juventude so as que partem do zero, do novo, donunca antes experimentado. Nosso verdadeiro teatro de bo-necos muito diversificado, apresenta um aglomerado detendncias contemporneas.

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  • TEATRO DE ANIMAAo

    Como ligar ento essa nossa realidade e a necessidadefundamental do homem de retornar ao passado, s suas ori-gens mticas?

    preciso ressaltar que, em nossos dias, ao tratarmos deteatro, de uma maneira genrica, impossvel separ-lo dovdeo, e da TV. Ainda que diferentes e com diferentes lin-guagens so artes da representao. Na verdade, o vdeo e aTV esto muito mais prximos do povo.

    O boneco tradicional representa algo real, um tipo queexiste. J os personagens, as figuras criadas para as telas, noexistem, no so reais, so apenas virtuais, simulam existir.O boneco artesanal, de madeira, barro ou papelo, atrai me-nos que as figuras que simplesmente simulam ser, que narealidade no so, no existem ou so apenas resultado declculos matemticos. Esses seres, ou figuras, exercem sobreos jovens um fascnio mtico ou um fascnio inconscientemen-te metafisico.

    Roberto wua' observou que o boneco tradicional ocu-pa um espao fsico determinado. Para ser visto precisa deum palco e de luz incindindo sobre ele. J as figuras de vdeono precisam nem de espao determinado e nem de luz. Oseu espao qualquer espao. Basta acionar um controle e asimagens aparecem por ondas energticas invisveis. Ao con-trrio do boneco, para serem vistas no precisam de luzincidindo sobre elas, pois as imagens, elas mesmas, so cons-titudas de luz", As figuras criadas por computador no sore-apresentaes de nada, surgem pela primeira vez na tela.Mas a sua temtica, essa continua baseada nos velhos mitos,

    7. Roberto Wild, Teatro I Bonecos na Era fJ Virtual. Trabalho apre-sentado no curso de ps-graduao da ECA/USP: Estruturas Dramdticas fJTeatro deBonecos, ministrado pela autora do artigo.

    8. R. Wild, op. cito

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    TRADIAo E TEATRO

    diferente apenas na aparncia ou nos artifcios de sua tcnica.Movidas a fio, luva, por controle remoto ou por clculosmatemticos, sua essncia a mesma. Se o contedo defiguras artificialmente criadas o mesmo, a forma atravs daqual esse contedo se expressa diferente, vai alm. Aocontrrio do naturalismo da TV, e ao contrrio do teatrorealista, uma reao j se fez sentir tanto no teatro de van-guarda como no cinema/arte e na vdeo-arte. Cada vez maisse usa uma linguagem fantstica e abstrata. O teatro contem-porneo cada vez mais coloca suas idias sinteticamente,usando para isso formas ou smbolos.

    A arte abstrata, por sua capacidade de sntese, detona eacusa um outro tipo de existncia, pois no fala da realidadecotidiana mas de uma realidade que nos antecede e ultrapas-sa", Os happenings e as performances apresentam aes enig-mticas, so imagens alucinatrias que nada tm a ver com onaturalismo realista do dia-a-dia.

    Quando nos defrontamos com a perspectiva de outrotipo de existncia, a sensao que temos a de estarmosdiante de algo estranho, numinoso, impondervel como aintuio do Sagrado, que, de acordo com Eliade, est pre-sente na origem de tudo. Portanto, como se estivssemospercorrendo hoje, por outros meios, o mesmo caminho. Ocaminho do retorno e do passado, perceptvel nos conceitosda arte abstrata. Na verdade o que o homem procura naarte, na religio, ou em suas explicaes sobre a vida a suaorigem. Conscientemente, ou no, essa uma busca metaf-sica. O que os mitos nos tentam dizer, o que durante muitos

    9. Sobre esse assunto existe um artigo de E. T. Kirby, "The Mask:Abstract Theatre, Primitive and Modem", Theatre Drama Rniew, Septo1972.

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  • TEATRO DE ANIMAAo

    sculos o homem procurou no perder, atravs da memriacoletiva, no seno esse desejo de retorno ao Absoluto. Ocaminho pode ser a preservao do passado, pode ser a lin-guagem dos smbolos ou narrativas mticas, como pode sersimples apresentao deformas geomtricas, imagens artesa-nalmente criadas pelo homem ou inventadas por artifciosmatemticos.

    Vemos desenvolver-se, cada vez mais, um teatro experi-mental falando atravs de formas e objetos, concepes cni-cas s possveis com personagens no-humanos, ou protago-nistas que no pretendem copiar o natural do homem. For-mas e objetos, quando colocados fora de seu contexto enuma situao dramtica, provocam estranhos insights. Umobjeto qualquer de uso funcional, em cena, adquire um valorestranho e absoluto. Pode no se referir diretamente a deusesou foras csmicas, mas existe uma energia que exala daprpria matria. Sensaes de estranheza nos tomam ao ver-mos algo do cotidiano (um bule, uma pea de motor, umaforma qualquer) desde que apresentado diferentemente e emsituao cnica. o visvel/concreto tocando o invisvel, des-conhecido. Essas experincias nos transformam e algumacoisa, aparentemente encoberta, ressurge. Ser a essnciadascoisas? A parte do Divino?

    O Sagrado. O Absoluto. O que significam? So, comcerteza, realidades que no se identificam com a nossa natu-reza mais imediata, nem com o nosso cotidiano, mas quefazem parte da nossa essncia. E como no dispomos depalavras apropriadas para expressar essas realidades, s atra-vs de conceitos abstraros chegamos a perceb-las. A arteabstrata - e coloco a o teatro abstrato de formas, objetos,smbolos ou bonecos - expressa conceitos que, como diria

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    TRADIAo E TEATRO

    C. G. Jung, esto implcitos nos arqutipos do inconscientecoletivo da humanidade.

    A tradio que importa a tradio do homem. Tradi-o que volta e repete sempre o mesmo e velho tema daRessurreio e Morte. Retorno ao Incio.

    BibliografiaBROOK, Peter. Ponto de Mudana. Rio Janeiro, Civilizao Brasi-

    leira , 1994.EUADE, Mircea . Imagens e Smbolos. So Paulo, Martins Fontes,

    1991.KIRBY, E. T. "Th e Mask, Abstract Theatre, Primitive and Modem".

    Tbeatre Drama Revtew, Sept., 1972.MORENrE, Jos Julian. "La Marioneta, el Lenguage dei Mite". Ma-

    ttc, n, 3, Inst. dei Teatre de la Diputaci de Barcelona.ROSENFELD, Anatol. O Teatro pico. So Paulo, Perspectiva, 1985.

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  • A MSCARA

    Mscara o que transforma. Se bonecos, imagens emarionetes representam o homem, a mscara a sua meta-morfose. A mscara sempre um disfarce, oculta e revela,simula.

    Mscara e Magia

    Porque a mscara est sempre associada ao teatro, aosritos, magia?

    Teatro alguma coisa que acontece num determinadomomento e espao, onde alguma coisa se move, se diz e setransforma, e, ao se transformar, modifica o ambiente e aspessoas nele envolvidas. Um ato teatral acontece quando oindivduo que o executa se modifica e coloca uma outrapersonalidade em lugar da prpria. outro o seu tom devoz, outra sua aparncia. Trata e representa outra coisa queno a sua simples rotina. o personagem. quando o ho-

  • TEATRO DE ANIMAO

    mem deixa de ser simplesmente o que para aparentar ousimbolizar algo alm de si prprio.

    Teatro existe desde que o homem passou a sentir neces-sidade de sair de si, de se despersonalizar, de se disfarar, deescapar do seu dia-a-dia para expressar uma realidade alm.Essas experincias sempre ocorreram desde os primrdios dahistria, Nos rituais o homem se transformava em deus, emanimal, em foras csmicas, e com isso transformava seuambiente. Para isso se utilizava, e se utiliza ainda, de msca-ras. A mscara mostra alguma coisa mais do que simples-mente aquilo que aparenta. A mscara ritual encarna espri-tos, por isso encerra em si foras. uma transferncia deenergias. Tem o sentido de mutao.

    magia porque em sendo um objeto material, repre-senta alguma coisa alm da matria mesma de que feita.Liga uma realidade outra, por isso sagrada.

    Mas, medida que os rituais decaem, a mscara se des-sacraliza. Continua porm a representar conceitos, idiasabstratas, pois trs em si a essncia das coisas, a essncia dopersonagem ou de uma situao. Nunca perde seu carter demistrio. Sempre intriga.

    No Oriente, a mscara aparece ligada dana que, porsua vez, era ligada ao teatro ritual.

    No Ocidente est presente na origem do teatro grego .Durante toda a Idade Mdia surge nas manifestaes deteatro popular. J com o pensamento racionalista, a mscara afastada do teatro europeu, e, nos ltimos trs sculos,torna-se simples adorno . Mas retorna, no incio deste nossosculo, por influncia da arte africana e pela descoberta doteatro oriental- principalmente do teatro N - por artistas eintelectuais europeus. Torna-se parte da cena simbolista e

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    A MASCARA

    das experimentaes futuristas. Toma fora com os expres-sionistas.

    Nas ltimas dcadas passou a ser usada tambm comoinstrumento de treinamento do ator.

    A Mscara e o Ator

    A mscara um instrumento fundamental para o treina-mento de qualquer ator. Principalmente para o ator quepretende se expressar atravs de personagens inanimados.

    Para isso existem etapas a serem seguidas. A primeiraetapa o treinamento com a mscara neutra. Mscara neutra uma mscara sem expresso, branca, ou de cor indefinida.Atravs dela o ator comea a se perceber.

    A mscara neutra o oposto da individualidade. E parao ator importante aprender a abandonar sua prpria indi-vidualidade. Despojado de si, o ator permite deixar-se pene-trar pelo personagem. O estado neutro portanto um est-gio anterior ao indivduo. o ser antes de qualquer defini-o. Ponto zero que antecede a ao.

    O momento neutro, porm, um momento fugaz, as-sim que a mscara recebe algum estmulo exterior, imediata-mente sua neutralidade cessa. Ao emergir do estado neutro,a mscara reage sem pr-conceitos. Desprevenida, age comose percebesse o mundo pela primeira vez., O ponto zero, ou ponto neutro, a pausa antes do agir.E o momento de escuta, momento em que o ator se energiza.

    Trabalhar em mscara neutra leva o ator a perceber asnuances entre o seu estado-matria (estar) , o seu estado-orgnico (ser), seu estado-animal (sentir) e o estado-racional(analisar, deduzir).

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  • TEATRO DE ANIMAO

    A etapa seguinte o treinamento com mscaras expres-sivas.

    As mscaras expressivas representam tipos, personagenscom gestual prprio e em situaes determinadas. Comea aa percepo de outros personagens - a contracena.

    O treinamento com mscara leva conscientizao docorpo, tornando o ator mais sensvel aos estmulos fsicosque o cercam.

    Se a funo do teatro transformar - ligar um realidade outra - a mscara o instrumento ideal para isso.

    BibliografiaAsLAN, Odette (org.). "Du rite au jeu masqu", Le Masque. Du rites

    au Tbtre. Paris, CNRS, 1985.BABLET, Denis. "D'Edward Gordon Craig au Bauhaus", in ASLAN,

    Odette. Le Masque. Du Rite au Tbtre. Paris, CNRS, 1985.ELDREDGE, Sears A. & HUSTON, Hollis W. Actor training in tbe

    neutral mask. Theatre. Drama Review. T. 80. Dec. 1978.LECOQ, Jacques. "Rle du masque dans la formation de l'acteur",

    in ASLAN, Odette. Le Masque. Du rites au rbtre. Paris, CNRS,1985.

    ___'o "Le jeu du Masque", Le Tbtre du Geste. Paris, Bordas,1987.

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    o BONECO NA MIRA DO FUTURO:CONSIDERAES SOBRE A FORMAO

    PROFISSIONAL DO BONEQUEIRO

    o PassadoQuando se fala em futuro, a primeira imagem que nos

    vem mente a de um motorista que para seguir viagem naestrada precisa manter os olhos fixos no espelho retrovisor,atento a tudo que percebe existir atrs de si, mas atento tam-bm ao caminho que tem pela frente - sem deixar de perce-ber, ao mesmo tempo, o seu espao prprio, mais prximo.

    Fazer conjeturas sobre o futuro nos faz refletir sobre omomento presente, e comeamos ento a perceber a antigui-dade de tudo que se pretende novo.

    O que o boneco? Que conceitos temos dele? E sejamquais forem, de onde vm esses conceitos? Com essas pergun-tas nos voltamos para o perodo romntico.

    De acordo com os romnticos, o pensamento tem a capa-cidade de se concretizar atravs de palavras',

    1. B. Boie, em seu livro L'Hommeet ses Simuures cita Novalis poeta~omntico alemo, para que~ as imagens criadas pelas'palavras pod~m serImagens deformadas ou poticas. As imagens deformadas so aquelas que

  • TEATRO DE ANIMAO

    Pensar falar. E a passagem entre o pensamento e apalavra mnima, pois , para se concretizar o pensamento seutiliza da palavra. Podemos at dizer que a palavra o corpodo pensamento. E a palavra, por sua vez, cria, quase que instan-taneamente, imagens . Incorp6reas a princpio, mas que ten-dem a se corporificar rapidamente em formas visveis.

    Portanto a trajet6ria que temos esta: pensamento, pa-lavra, imagem, objeto. E surge a relao: pensamento e ob-jeto; ou, contedo e forma; esprito e matria.

    Acho importante colocar estas questes pois se o passa-do explica o momento presente, o presente prepara o futuro.

    Um marco importante entre o Romantismo e o Moder-nismo foi o espetculo Ubu Rei, de Alfred Iarry, apresentadoexatamente na virada do sculo XIX para o XX.

    Iarry achava que o teatro deveria atingir um outro nvelda existncia, um nvel de realidade que fosse alm do nossocotidiano. Para isso ele apresentava a realidade em estado dedesintegrao, e o homem, atravs de deformaes. E, entrecaricatura e poesia, Iarry abalou a ordem vigente.

    Edward Gordon Craig tambm buscava o teatro idealque, segundo ele, deveria ser um teatro abstrato, Para isso sedeveria colocar, em lugar do atar, "o homem em grandecerimnia", ou seja, o boneco.

    Craig anteviu o dia em que o ator seria "substitudo poruma sombra, um reflexo, uma projeo de formas simb6li-cas, um ser com a desenvoltura de um ser vivo, sem ser noentanto vivo'",

    refletem o nosso cotidiano racional e as imagens poticas so as que refle-tem a essncia, a verdade.

    2. E. G. Craig, M. MReterlimk. Menu propos. Apud Aslan, LeMas-que, p. 140.

    3. E. G. Craig, op. cito

    68

    o BONECO NA MIRA DO FUTURO ...

    Suas idias coincidem com as de Maeterlinck para quema obra de arte " um smbolo e como todo smbolo nosuporta a presena ativa do homem'".

    Essas conceituaes nos levam ao boneco. Mas qual ,afinal, o seu sentido? O que se pretende representar com ele?O homem liberado de suas condies fsicas?

    Enquanto objeto material o boneco se refere a nossarealidade, reproduz o nosso cotidiano. Mas, por sua rigidez,por sua imagem inerte ele nos remete a algo que vai alm donosso dia-a-dia, alm da vida. Ao encararmos um boneco (equanto mais realista ele for mais isso acontece) sentimosuma espcie de estranheza. Entre o grotesco e o potico, oboneco nos leva a reflexes sobre a nossa materialidade, nosfaz conscientes da precariedade do nosso corpo. Provocasentimentos estranhos.

    Seguindo a trajet6ria dos movimentos artsticos do nossosculo, vemos que o discurso da modernidade vai se tomandocada vez mais claro com o movimento futurista. O Futurismodefendia a idia de que s podemos perceber o universo quenos rodeia atravs das nossas sensaes corp6reas. E para issodeveramos ficar sempre muito mais atentos s nossas pr6priasexperincias pessoais do que ao nosso intelecto . Os "puros",para Marinetti, eram aqueles "lavados de qualquer sujeira dalgica'". E, em lugar da l6gica, Marinetti colocava a matria.A matria captada pela intuio. Mas, dizia ele, deveramos to-mar cuidado para no emprestarmos sentimentos humanos ela,mas "deveramos adivinhar os seus impulsos, sua fora decompresso, dilatao, coeso, desagregao'".

    4. M. Maeterlinck. Menu propos .Apud Aslan,LeMasque, p. 139.5. F. T. Marinetti, apudAnnateresa Fabris, Futurismo, p. 66.6. F. T. Marinetti , "Manifesto Tcnico da Literatura Futurista", em

    O Futurismo Italiano, organizado por Bcmardini, p. 84.

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  • TEATRO DE ANIMAO

    No pensamento moderno, a matria toma uma impor-tncia nunca antes percebida. Perde sua categoria de coisadesprezvel para adquirir um grau mais elevado.

    Artaud dizia que "o esprito s se libera depois de pas-sar por todos os canais da matria'", E, " s atravs dapele que a metafsica chega ao espfrito'".

    O Surrealismo foi entre todos os movimentos moder-nistas o que mais deu ao objeto uma posio nobre, dedestaque, conferindo-lhe a categoria de arte.

    O Expressionismo tambm se apia na forma, apresen-tando idias abstratas e situaes psicolgicas comunicadasatravs de imagens, mais do que atravs de conceitos intelec-mais.

    Na arte contempornea a presena fsica do artista importante. A body art considera o corpo como um reflexodo mundo interior e exterior do homem. E na performance,mais do que o corpo treinado de um ator, importa a suapresena espontnea.

    o Presente - Caractersticas da Contemporaneidade

    Essas so algwnas caractersticas que talvez nos ajudema entender o sentido de certas manifestaes artsticas emnossos dias, onde est inserido o teatro de animao.

    Analisando outros aspectos da nossa poca notamos queexiste uma avalanche de acontecimentos, uma multiplicidadede informaes, que provocam dentro de ns uma pluralida-de de pontos de vista. Esses acontecimentos nos chegamtodos os dias, em nossas prprias casas, pela TV, atravs de

    7. A. Artaud, O Teatro eseu Duplo, p. 126.8. Idem.

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    o BONECO NA MIRA DO FUTURO

    imagens, cada vez mais perfeitas, quase corpreas. Estamosacostumados a ver o mundo reduzido, sintetizado, em ima-gens cada vez mais rpidas. Mesmo vivendo em continentesdistantes, acabamos por nos sentir prximos uns dos outros.Por outro lado essa "proximidade" fictcia despert~ em ns anecessidade de nos tornarmos presenas reais. E como sevivssemos num constante confronto do corpreo e do in-corpreo. E quanto complexidade de acontecimentos e multiplicidade de elementos dspares que nos rodeiam, pro-curamos replicar com a sntese. Por isso a maneira de nosexpressarmos cada vez mais reduzida. Nas artes plsticas,como no teatro, as imagens so cada vez mais condensadas.

    O ser humano cada vez mais representado por figurasinanimadas, o que talvez expresse o anseio de poder estendero nosso corpo, um prolongamento obtido atravs de ele-mentos fsicos. E essa representao material, por sua vez,produz um outro tipo de fluxo energtico.

    Enfim, seja por herana do Romantismo, ou no, amodernidade est impregnada da esttica da matria. omundo dos simulacros: manequins, mscaras, bonecos, for-mas, objetos.

    E num mundo assim colocado podemos perceber a im-portncia de artistas que se expressam atravs de figuras eobjetos animados.

    Sobre a Formao Profissional do BonequeiroE que formao tm esses artistas, os bonequeiros, mis-

    to de ator, diretor, cengrafo, artista plstico e dramaturgo?J vai longe o tempo em que a formao de um mario-

    netista se dava de pai para filho, dentro de grupos muito

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  • TEATRO DE ANIMAO

    fechados; ou de mestre para seus eleitos, dentro das grandesescolas ou tradies, como em Java, Japo, ou entre os artis-tas populares.

    Entre ns, no Brasil como em outros pases com vivn-cias semelhantes, o aprendizado se d atravs de cursos queeventualmente surgem, quase sempre por iniciativas particu-lares, j que institutos ou centros especializados so, entrens, quase inexistentes.

    A formao de um bonequeiro brasileiro acontece, emsua maioria, de forma emprica. Muitas vezes a partir deestmulos que se criam no contato palco e platia, ou atravsde um trabalho autodidata com experimentaes pessoaisonde prevalece a lei da tentativa e erro. E mesmo que au-mentem as possibilidades de cursos e oficinas particularesainda assim vemos muitas vantagens nos cursos que possamser oferecidos atravs das universidades.

    Sobre as universidades do Brasil, em 1990, foi organiza-do um Encontro Nacional de Teatro de Animao Vincula-do Universidade. Nessa ocasio pudemos ter uma visogeral da nossa situao. Estiveram presentes dez universida-des, representando os mais distantes pontos do pas. E che-gou-se concluso que:

    No quadro geral da universidade brasileira, o Teatro de Anima-o ainda ocupa um lugar acanhado e pouco expressivo, constituindo-se, na maioria das vezes, um fato fortuito, quase sempre fruto deiniciativas isoladas, marcando sua presena de modo descontnuo einsatisfatrio9

    A maioria dos cursos de teatro de bonecos das universi-dades brasileiras est ligada Licenciatura, com exceo da

    9. I Encontro Nadonal de Teatro deAnimao Vinculado Universida-de, So Paulo, Ed. Part., 1992, p. 14.

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    o BONECO NA MIRA DO FUTURO ...

    Universidade de Minas Gerais onde o teatro