Ampla Visão Da Velhice

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7. Da ampla visão da velhice às rugas Esses "sinais normais da velhice" estão tão difundidos que mal vemos algo de doente neles. Com a presbiopia, o organismo mostra que se está deixando de ver o que está próximo. O olhar passa por cima disso e vagueia na distância. A tarefa é: obter uma visão de conjunto e enxergar longe em sentido figurado. O horizonte da vida permanece nítido e é até mesmo acentuado pela confusão do que está próximo. É importante vaguear na distância e ter claro para si o que o futuro reserva. Aquilo que está próximo deve ir para trás da visão ampla. Quando se encontra a perspectiva da vida, é possível voltar a alcançar aquilo que está perto. A perda da memória recente deve ser entendida de forma totalmente análoga. Enquanto os acontecimentos da última guerra são lembrados e surgem claros diante da visão interna, o passado imediato se esfuma na névoa do esquecimento, por exemplo aquilo justamente que se queria comprar. Aqui também a tarefa é nítida, libertar-se das ninharias do cotidiano e descobrir de preferência o grande arco da vida. A monotonia diária deve se tornar monótona, é preciso lembrar-se dos temas importantes da vida e interiorizá-los. Caso se faça esse trabalho espiritual, volta a surgir espaço para aquilo que está próximo, isso para não falar que a atividade espiritual conserva a mobilidade e uma memória treinada permanece intacta. A surdez da velhice mostra aos afetados que eles não podem mais ouvir determinadas coisas. É natural suspeitar que eles já as ouviram demasiadas

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7. Da ampla visão da velhice às rugasEsses "sinais normais da velhice" estão tão difundidos que mal vemosalgo de doente neles. Com a presbiopia, o organismo mostra que se estádeixando de ver o que está próximo. O olhar passa por cima disso e vagueiana distância. A tarefa é: obter uma visão de conjunto e enxergar longe emsentido figurado. O horizonte da vida permanece nítido e é até mesmoacentuado pela confusão do que está próximo. É importante vaguear nadistância e ter claro para si o que o futuro reserva. Aquilo que está próximodeve ir para trás da visão ampla. Quando se encontra a perspectiva da vida,é possível voltar a alcançar aquilo que está perto.A perda da memória recente deve ser entendida de forma totalmenteanáloga. Enquanto os acontecimentos da última guerra são lembrados esurgem claros diante da visão interna, o passado imediato se esfuma nanévoa do esquecimento, por exemplo aquilo justamente que se queriacomprar. Aqui também a tarefa é nítida, libertar-se das ninharias do cotidianoe descobrir de preferência o grande arco da vida. A monotonia diária deve setornar monótona, é preciso lembrar-se dos temas importantes da vida einteriorizá-los. Caso se faça esse trabalho espiritual, volta a surgir espaçopara aquilo que está próximo, isso para não falar que a atividade espiritualconserva a mobilidade e uma memória treinada permanece intacta.A surdez da velhice mostra aos afetados que eles não podem mais ouvirdeterminadas coisas. É natural suspeitar que eles já as ouviram demasiadasvezes e agora desligaram. Chama a atenção nesse contexto o fato de que amaior parte das dificuldades de audição da velhice mostra uma discrepânciacaracterística: há muita coisa que eles absolutamente não ouvem mais, masoutras, contra as expectativas, são ouvidas, e bem. Quem conhece pessoasvelhas que ouvem mal, às vezes não pode evitar a sensação de que há nissouma certa dose de trapaça. Enquanto o companheiro que está no mesmoquarto pode arrancar a alma do corpo a gritos, as conversas das crianças noquarto ao lado, mais interessantes, são boas de ouvir. Esse sintoma,portanto, é também uma forma não-redimida de retirada para o mundo372próprio, onde os outros não o podem seguir nem mesmo aos gritos. Osintoma isola e distancia do mundo e torna a pessoa solitária e fechada.O fato de que tantos velhos lutem contra isso atesta que a orientação parao exterior, equivalente como sintoma, é tipicamente social. Novamente, sãoas chamadas culturas primitivas que, renunciando em grande escala a essesimpedimentos típicos da velhice, mostram que aquilo que é normal para nósnão é na verdade normal e nem mesmo natural.Apesar da abundância de próteses que vão se tornando cada vez maisrefinadas, a surdez contínua sendo um sintoma que transforma muitaspessoas em outsiders. Enquanto sempre podemos fazer alguma coisa com avisão ativa, continuamos impotentes em relação à passiva audição, apesarde toda a técnica. Devido a seu grande número os velhos surdos, em seuisolamento, transformam-se em sombras da sociedade e, como todo oâmbito das sombras, são vistos de mau grado. Dominar e o domínio vêm emprimeiro lugar entre nós. Ouvir, escutar e obedecer levam uma existência desombra na maioria das pessoas modernas. Os velhos nos mostram paraonde leva essa política de repressão.A otoesclerose, a calcificação dos ossículos do ouvido, expressafisicamente a temática do não-ser-mais-fiexivel no âmbito da audição e daobediência. A pessoa já está cheia (de ouvir e de obedecer), enrijece-se emrelação às vibrações exteriores e se recolhe para dentro de si mesma comoum caramujo. Os surdos, no sentido mais profundo, já não vibram mais em

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conjunto. Até mesmo os cegos estão menos isolados e enrijecidos.A tarefa é realmente concentrar-se em si mesmo, reduzir os contatos como exterior e, em vez de estar sempre ouvindo os outros, escutar para dentro eaprender a obedecer à própria voz interna. A tendência caricaturada na vidadiária de somente ouvir ainda o que interessa mostra o caminho: deve-seouvir o que é importante, substancial. Assim como as vozes externas setornam mais baixas, as internas tornam-se agora mais nítidas. Assumir ovoltar-se para dentro seria a chance oculta no sintoma.A mobilidade que diminui na velhice pode chegar à rigidez dasarticulações. O organismo demonstra como está enferrujado e que falta óleoao mecanismo. Ele quer mostrar como o movimento é difícil, que não vaimuito mais para a frente na vida e praticamente nada para cima. Então, atarefa também é descansar exteriormente e conscientizar-se do pólo internoque descansa. Desse descanso do centro pode então voltar a crescer amobilidade interna e, em conseqüência, também a externa.373O "teatro da velhice" na pele é uma variante tão difundida como poucoquerida, à parte o fato de ser medicamente inofensiva. Na velhice, qualquerum reconhece a pele como sendo o espelho da vida interior. E quem gostade ver a própria história escrita tão nitidamente na pele e no rosto? Torna-secompreensível aqui o mito de Dorian Gray, que vendeu sua alma parapermanecer externamente jovem. Ao enxame de manchas que se colecionouao longo da vida somam-se mudanças de cor características que recebem otraiçoeiro nome de manchas da idade, isso para não falar das dobras erugas que mostram o ressecamento interno. Pés de galinha marcam osvestígios especialmente persistentes dos acontecimentos, as dobras do risose transformam em profundos sulcos, testemunhas de um passado que,como o riso, há muito já passou. A tensão e a elasticidade desapareceram,em vez disso estranhas excrescências emergem das profundezasinsondáveis, cuja obscura temática já encontramos nas verrugas. Está-semarcado como um tapete de remendos e, além disso, qualquer coisa menoscolorido, predominando os tons atrozes do cinza. Ziegler fala de paisagemárida, envelhecimento precoce84 e "transformar-se em tralha".A tarefa que surge em primeiro plano faz com que o afetado bata com onariz nas próprias esquisitices e abusos, as manchas escuras da alma e oconhecimento indubitável de que já não se pode falar de um traje branco. Aolongo da viagem da vida, que é sobretudo uma viagem da alma, o corpoprecisou deitar muita água, ou seja, líquido anímico. Assim como a flor quevai murchando preocupa-se ainda com a transmissão de sua semente, quecontêm sua essência e seu legado, deixando pendente todo o demais, para apessoa idosa trata-se agora também de ocupar-se de sua essência, de seulegado. O essencial dela permanecerá, mas o invólucro precisa ir. A pele quevai murchando pode explicitá-lo quando, conservada como couro curtido,estira-se sobre os ossos e dirige o olhar para o elemento conservador, já quese trata da conservação do que é essencial. Nesse sentido, não é de admirarque a maioria das pessoas se torne conservadora na velhice. Caso isso nãose relacionasse somente à política, mas também à alma, e não fosse malentendidocomo rigidez e medo do novo, tudo iria melhor para as pessoas epara o mundo.3748. A cor cinzaA temática do envelhecimento também pode ser tratada a partir dosconceitos do tornar-se grisalho e do horror [Ergrauen = encanecer / Grauen =alvorada, mas também medo, horror]. As modificações da pele devem ser

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classificadas aqui, assim como o envelhecimento das percepções sensoriaisque podem chegar à catarata, que estende uma cortina cinzenta diante domundo colorido. De fato, a percepção das cores diminui à medida que oselementos da retina responsáveis pela percepção da luz retrocedem. Dirigeseum olhar turvo em direção a perspectivas sombrias. O véu cinzentotampouco se detém diante do ouvido, cuja capacidade auditiva para sonsagudos diminui, e o paladar e o olfato passam a ignorar as notas maispicantes dos odores e dos sabores. Até mesmo a alma parece encanecer deforma múltipla, parecendo cansada e vazia, sem vontade e sem cor.A retirada das cores da vida torna-se especialmente nítida nos cabelos epode ser interpretada como sinal de resignação85. Quando eles, como sinaltípico do envelhecimento, encanecem antes de cair, trata-se para muitos deum horror. Sendo que o cinza nas têmporas goza de certa preferência entreos homens. Neste caso, ele estaria documentando a experiência do mundo eda vida que pode acompanhar a velhice. Ziegler é de opinião que oencanecimento na velhice tem a ver com o horror, que esta fase da vidatransforma-se em tarefa. Ele vê as possibilidades e a loucura dessa época deforma positiva, já que se trataria de aprender o próprio horror e tambémensiná-lo aos jovens. Esta relação destaca-se especialmente noencanecimento prematuro e particularmente no encanecimento instantâneodurante a noite. Por trás disso há situações de pavor que os afetados nãopuderam digerir conscientemente. O corpo precisa entrar como substituto econferir expressão ao horror na cor dos cabelos.A tarefa é sair de casa, aprender a temer e desembarcar no pólo escuro,ir de livre e espontânea vontade até lá, onde a vida perde todo o colorido: atéo mundo das sombras, o lado noturno da vida. Aqui se está agora em seupróprio elemento, à noite todos os gatos são pardos. As vivas cores domundo superior não fazem parte dos fantasmas da noite, trata-se dasprofundezas da alma. O grande arco, a abstração, está no ponto central dotrabalho de elaboração das experiências da vida, pois todas as teorias375também são cinzentas. A confrontação com a sombra, desde que esta sejaaceita e integrada, pode amadurecer e, em um sentido mais profundo,transformar-se em sabedoria. Quando a luz e a sombra se unem surge ocinza, e o colorido do mundo parece uma ilusão. Sábio [= Weis] e branco [=Weiss] não estão assim tão distantes. Todas as cores estão contidas nobranco, assim como todo o conhecimento na sabedoria. E uma questão daconsciência saber se, ao tornar-se velho e grisalho, o cinza indica umacarência de cor ou o branco onde se encontra tudo. Não é possível decidir defora se a cor dos cabelos reflete o estado interno ou o compensa, cadapessoa deve esclarecê-lo por si mesma. Um aspecto substancial da velhiceestá no horror que, derivando da cor cinza, descreve um estado de alma. Namedida em que a cor esmaece, sobra o cinza. Nesse contexto, chama aatenção como essa cor está próxima dos fantasmas que vivem, ou melhor,animam e enchem de horror as regiões junto à fronteira da vida. Osfantasmas aparecem sem as cores da vida, já que mais propriamente sãotambém enviados do reino dos mortos. Sua horrível paleta de cores consistede nuanças de cinza e vai do cinza quase negro até o cinza esbranquiçado.Assim como a pele de pessoas muito velhas, suas vestes que lembramfarrapos pendem deles e, com a ausência de qualquer estrutura ou cor,transmitem a conhecida impressão medonha. Assim como o fantasmagórico,a velhice se refere à morte; mais além do horror que inspira, o fantasma davelhice tem uma relação intima com o além. Mas a velhice não compartilhasomente a forma e a cor com o fantasmagórico, mas também as localidades

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que prefere habitar. Afastada da vida pulsante, nas margens e nichos dasociedade, ela circula por lugares sinistros e faz das suas, já que inspirahorror aos vivos. Os cemitérios jamais foram campos de paz para os vivoscomo o foram para os que estão do lado de lá. De qualquer forma, eles logose desenvolveram e se transformaram em ante-salas do horror, em portos demedo do outro mundo. Pode-se observar, especialmente no campo, comoeles atraem os velhos e ao mesmo tempo os colocam sob seu encantomágico.Nossa época esclarecida limpou a paisagem (tanto a concreta como aespiritual) de fantasmas e assombrações, mas não pensou que nada sedeixa eliminar definitivamente do mundo. Assim, as aparições tiveram deescolher o caminho que passa pelas sombras, que de qualquer maneiracorresponde a seu ser. Elas se instalaram nas unidades de terapia intensiva,bem dissimuladas entre moderníssimos aparelhos reluzentes mas sem vida,376assim como em asilos de velhos, nos departamentos geriátricos dasinstalações da psiquiatria e nas alas de internação de nossas clinicasmodernas, onde a média de idade sobe cada vez mais, ilustrando de forma"horrível" os triunfos da medicina e também seu lado sombrio.Todo o amplo campo da velhice e da idade transformou-se para nós emuma assombração. Mal temos tempo de comprar antes que as coisas jáestejam velhas. Não se admite usar roupas envelhecidas, opiniões velhas,conhecimentos velhos, embora tudo isso ateste que já se está gasto, epoucas coisas são piores que isso. Em nosso esforço de sempre manter tudono estado mais novo possível, pura e simplesmente lançamos umaimpressionante magia de defesa contra a velhice. O papel dos castelos malassombradose das ruínas antigas86 foi transferido para os asilos de velhos,clínicas e outras instalações geriátricas. Por bonitos que sejamexternamente, nós os evitamos como se eles pudessem nos influenciar. Nósnão queremos nos infectar com o vírus da velhice. Poderíamos ser tomadospelos (maus) espíritos que lá padecem. A proximidade imediata do pólooposto torna-se aqui especialmente nítida, pois estamos totalmentepossuídos pelo espírito do novo. E uma maldição ser velho em umasociedade tão possuída pela juventude e sedenta de renovação, e assim omau costume de amaldiçoar, tão difundido antigamente, também conquistouseu lugar em nosso meio.Tanto hoje em dia como antigamente, pagamos um preço para serpoupados pelo horrível fantasma da velhice. Assim como antigamente setentava amenizar a disposição das assombrações com oferendas materiais,para que nos deixassem em paz, hoje praticamente toda a sociedadecontribui com altas somas para o cuidado dos velhos na esperançaequivocada de, por esse meio, retirar da velhice algo de seu horror. Aprevidência da velhice leva na verdade a que a pessoa, bem providamaterialmente, experimente o medo e o horror da velhice de formaespecialmente clara. Nada desvia mais do tema dessa etapa propriamentedito.A tarefa da velhice cinzenta é o horror. Na sociedade, são os velhos queensinam os jovens a ter medo, que se tornam os estraga-prazeres de seuculto à juventude, enegrecendo unilateralmente os pensamentos claros esuperficiais. Assim como consigo mesmos, eles também podem fazer comque os outros fiquem preocupados e oportunamente escapar para o escurodo segundo plano. A luz do Sol não é mais coisa sua, ela danifica sua pele377fatigada e cega seus olhos cada vez mais fracos. Assombrar desde oesconderijo e tecer fios invisíveis, cuspir na sopa dos que estão no primeiro

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plano como eminência parda, este é seu ofício. "O traste velho deve darsolavancos e fazer barulho, no ático e no porão. Ele deve rumorejar eassombrar. Sua hora propicia é a hora dos espíritos.. "87.O que é válido para a sociedade, naturalmente afeta também o indivíduoidoso. A época grisalha é sua chance de confrontar-se com o escuro, ohorrível de sua vida, fazer a arrumação dos fantasmas que foram seacumulando.Juntamente com isso, há também uma participação substancial doelemento "doidice". O que o velho louco faz é totalmente incompreensívelpara os contemporâneos de orientação mundana, porque ele já vê as coisasde uma outra perspectiva. No tarô, o louco é o grau mais elevado. O fato deque justamente ele seja classificado por algumas escolas de tarô comosendo o primeiro símbolo, inferior, mostra a grande confusão que noentretempo se formou em relação a esse arquétipo. O papel clássico dolouco e da oportunidade contida nessa fase pode ser visto na imagem dobobo da corte. O bobo da corte era o único que podia dizer a verdade semdisfarces ao governante sem ter de responder por isso. Estando fora dajurisdição normal, ele já não podia mais ser culpado. Seu maior crime era serchato.Mostra-se aqui como esse arquétipo está desamparado hoje em dia.Temos uma profusão de políticos envelhecidos que se aferram ao poder eque chegam até mesmo a levá-lo para a tumba. Os aduladores da corte deépocas anteriores foram substituídos por hordas envelhecidas defuncionários públicos que, cinzentos e mesquinhos, deficientementerepresentam as belas e frescas cortesãs de outros tempos e somenteconservam florescente o padrão do lacaio. Os velhos loucos, que podem sepermitir dizer simplesmente a verdade e isso, ainda por cima, de formairônica, nos fazem falta. O que não daríamos por um velho político que, comobobo da corte e admoestador que não tem mais nada a perder e, por issomesmo, tem tudo a ganhar, escreve a verdade nua e crua no livro de visitasda solícita camarilha de provocadores.O velho louco, que finalmente pode dizer o que sempre quis serdeclarado, seria em conseqüência uma solução do tema da velhice. De umamaneira mais direta, mais irônica e até mesmo mais obscena, ele poderiaobter ar para si mesmo. Caso até então ele guardasse no coração algum378rancor assassino, agora seria a hora de, sob a proteção da velhice, trazer àluz do dia todas as formas escuras e indecentes. Talvez escandalizar osoutros trouxesse alívio para si mesmo. Suas advertências poderiam esmagara desgraça contra a parede. Livre da carga do próprio sustento e docansativo jogo da sociedade, ele poderia recuperar a alegria infantilprovocada por todos os segredos e surpresas da vida. É raro que sepresencie ainda um desses velhos loucos nas poucas grandes famíliasunidas que ainda restam, que são tratados pelas crianças como um igualporque consideram as regras de seus jogos tão importantes como os jogosdos adultos. Eles nem menosprezam o jogo infantil nem o revestem com aseriedade dos adultos. Eles voltaram a ser semelhantes às crianças (nosentido bíblico) e por essa razão freqüentemente são mais queridos por elasque os próprios pais. O parentesco entre as épocas da infância e da velhice éexpresso também em algumas imagens de remédios homeopáticos quedescrevem esse arquétipo do velho louco eternamente jovem. Viver amaluquice dessa maneira é a melhor profilaxia em relação à loucurapsiquiátrica não-redimida, que de resto castiga a velhice com freqüência.O arquétipo da velhice citado quase sempre é o do velho sábio. Ele já

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não pode desempenhar qualquer papel em nossa sociedade, porque avelhice se agarra tão convulsivamente à vida que perde aquela solturaimprescindível ao velho sábio. Ele é sábio porque, como Sócrates, sabe quenão sabe nada e que a vida é muito mais que saber e fazer. Velhos sábiosseriam extremamente desagradáveis para uma sociedade de provocadores,pois estes teriam de questionar permanentemente o rufar dos tamboresproduzido com tanto esforço.