Análise da infografia jornalística

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LIMA, Ricardo Cunha. Análise da infografia jornalística. 2009. 143 f. Dissertação (Mestrado em Design) – ESDI/UERJ, Rio de Janeiro, 2009. Com a dinâmica da atualidade, cada vez mais o texto jornalístico tradicional se mostra insuficiente para atender à crescente necessidade de síntese de informação. Tal fato tem ocasionado o aprimoramento e a difusão dos infográficos jornalísticos, peças de design de informação que vêm cada vez mais se tornando ferramentas editoriais importantes. No presente trabalho, buscamos uma definição para o termo infografia jornalística e propomos alguns pontos a serem considerados em sua análise. A pesquisa foi voltada aos infográficos jornalísticos em revistas contemporâneas.

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Ricardo Oliveira da Cunha Lima

Anlise da Infografia Jornalstica

Dissertao de mestrado Orientador Prof. Doutor Andr Soares Monat Co-orientadora Profa. Doutora Carla Galvo Spinillo

Rio de Janeiro, 2009

Ricardo Oliveira da Cunha Lima

Anlise da Infografia Jornalstica

Dissertao apresentada ESDI / UERJ como requisito parcial para a obteno do grau de Mestre em Design.

Rio de Janeiro, 2009

CATALOGAO NA FONTE UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CTC/G

L732

Lima, Ricardo Oliveira da Cunha. Anlise da infografia jornalstica / Ricardo Oliveira da Cunha Lima. 2009. 143 f. Orientador: Andr Soares Monat. Co-orientador: Carla Galvo Spinillo.

Dissertao (Mestrado) Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Escola Superior de Desenho Industrial.Bibliografia. 1. Artes grficas - Teses. 2. Comunicao visual - Teses. 3. Projeto grfico (Tipografia) Teses. 4. Jornalismo - Teses. I. Monat, Andr Soares. II. Spinillo, Carla Galvo. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Escola Superior de Desenho Industrial. IV. Ttulo.

CDU 655.262

Ricardo Oliveira da Cunha Lima

Anlise da Infografia Jornalstica

Dissertao apresentada ESDI / UERJ como requisito parcial para a obteno do grau de Mestre em Design.

Orientador Prof. Doutor Andr Soares Monat Co-orientadora Profa. Doutora Carla Galvo Spinillo

Aprovada em 27 de agosto de 2009

Banca Examinadora

______________________________________________Prof. Doutor Andr Soares Monat (orientador)ESDI Universidade Estadual do Rio de Janeiro

______________________________________________Prof. Doutor Washington Dias LessaESDI Universidade Estadual do Rio de Janeiro

______________________________________________ Profa. Doutora Maria Cecilia Loschiavo dos SantosUSP Universidade de So Paulo

______________________________________________ Profa. Doutora Carla Galvo SpinilloUFPR Universidade Federal do Paran

Dedicatria

Aos meu pais.

Agradecimentos

Andr Monat, meu orientador e amigo, pelo seu apoio constante, sua pacincia e estmulo liberdade de reflexo. Carla Spinillo, minha co-orientadora e amiga, por todo o apoio e por me revelar o potencial do design de informao. Luciana Murad, que cuidou de mim com tanto carinho, me apoiando todos os dias e revisando cuidadosamente todo o texto da dissertao. Ary Moraes, mestre e amigo, quem me abriu o mundo da infografia e do design jornalstico, por sempre acreditar em mim. Leonardo Cunha Lima, meu irmo, e sua esposa Daniele, pelo seu carinho do outro lado do mundo. professora Maria Ceclia Losquiavo pela gentileza de vir de So Paulo s para comparecer banca. super Ftima Moreno que est sempre zelando pelo mestrado. Aos professores da ESDI: Washington Dias Lessa (pelo apoio e por dividir o seu conhecimento e entusiasmo pela linguagem Grfica); Lucy Niemeyer, Silvia Steinberg, Pedro Lus de Souza, Joo Leite e Rodolfo Capeto, diretor da ESDI, pelo a amizade e interesse pelo trabalho. Aos antigos colegas do Corrreio Braziliense, Ricardo Noblat, Francisco Amaral e Fabio Sales pela oportunidade de me envolver no design jornalstico. Ao professor e amigo Amador Perez quem admiro por estar sempre estimulando a criatividade grfica de seus alunos. Aos amigos: Romero Cavalcanti, Axel Sande, Almir Mirabeau, Adriano Renzi, Wallace Vianna, Felipe Chagas, Sandro Fetter, Elisa e Cassiano Vianna, Adriano Motta, Rubens Paiva e Marcello Rosauro. E aos professores, alunos, funcionrios e colegas da ESDI que de alguma maneira ajudaram para que esse trabalho se concretizasse.

ResumoLIMA, Ricardo Oliveira da Cunha. Anlise da infografia jornalstica. 2009. 143 f. Dissertao (Mestrado em Design) Escola Superior de Desenho Industrial, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009. Com a dinmica da atualidade, cada vez mais o texto jornalstico tradicional se mostra insuficiente para atender crescente necessidade de sntese de informao. Tal fato tem ocasionado o aprimoramento e a difuso dos infogrficos jornalsticos, peas de design de informao que vm cada vez mais se tornando ferramentas editoriais importantes. No presente trabalho, buscamos uma definio para o termo infografia jornalstica e propomos alguns pontos a serem considerados em sua anlise. A pesquisa foi voltada aos infogrficos jornalsticos em revistas contemporneas.

Palavras-chaveDesign grfico. Design de informao. Infografia. Jornalismo.

AbstractIncreasingly, the traditional use of texts for journalism has proven to be insufficient when faced with the growing need for synthesis of information. This fact has helped the development of information graphics for journalism, which is a form of information design that is becoming an important tool in editorial communication. In this dissertation, we offer a definition for the term information graphics for journalism, and propose some points to be considered in its analysis. In this study we analyzed information graphics in contemporary magazines.

KeywordsGraphic design. Information design. Information graphics. Journalism.

Lista de Ilustraes1-1 Infogrfico interativo da verso online do jornal Washington Post. ____________________________________________ 19 1-2 Pginas 78-79 e 90-91 do livro Human Body I (Britannica Illustrated Science Library). Estas duas pginas duplas so exemplos de infografia em livros didticos. (Encyclopdia Britannica) ______________________________ 20 2-1 Exemplo de ilustrao. (Revista Aventuras da Histria) ________________ 26 2-2 Exemplo de ilustrao mais integrada ao texto. (Revista Aventuras da Histria) ____________________________________________________ 26 2-3 Infogrfico onde percebemos uma integrao entre vrios elementos iconogrficos e o texto. (Revista Mundo Estranho) ________________________ 27 2-4 Infogrfico onde podemos ver que a informao direita pode ser lida independentemente do texto esquerda. (Revista Mundo Estranho) _________ 28 2-5 - Diagrama sem palavras de Nigel Holmes que descreve diferentes formas de se beijar em quatro pases (Wordless Diagramas, 2005:146-147) ______________________________________________________________ 29 2-6 Exemplo de diagrama, usado por Emanuel Arajo (ARAJO, 1986:462) ______________________________________________________ 30 2-7 Exemplo de grfico, usado por Emanuel Arajo (ARAJO, 1986:460) ______________________________________________________________ 30 3-1 Variveis grficas definidas por Jacques Bertin ________________________ 36 3-2 A linguagem abordada de maneiras diferentes: abordagem dos lingistas esquerda, e a dos designers grficos direita. (TWYMAN, 1982:145) ______________________________________________________ 38 3-3 Modelo criado para acomodar as abordagens de lingistas e designers diante da questo da linguagem (TWYMAN, 1985:145) _____________ 38 3-4 Gravura de James Gillray de 1791, transformando um mapa esquemtico da Gr-Bretanha em imagens figurativas ________________________________________ 40

3-5 Mapa esquemtico de 1833 da Bretanha Saxnica. _________________________________________ 41 3-6 O acidente com o avio da TAM em So Paulo em 2007 __________________________________________________ 42 3-7 Tentao atravs da impacincia. Ilustrao de um livro tabular holands de 1465, Ars moriendi (TWYMAN, 1985:254) ______________________ 43 3-8 Jockeys na chuva por Edgar Degas (1886). Essa imagem sinptica que pode ser comparadas a imagem composta de elementos distintos da fig. 39 ________________________________________ 43 3-9 Cavalo galopando fotografado por Edward Muybridge no final do sc. XIX. Uma srie de imagens discretas que podem ser comparadas a fig. 3-8 _______________________________________ 44 3-10 Infogrfico da Revista Mundo Estranho (2008): Bernardo Borges (design); Lorena de Oliveira (texto); Japs (ilustrao); Artur Louback (edio de texto) _________________________ 45 3-11 Ilustrao do manuscrito De Materia Medica de Dioscurides (cerca 625) ______________________________________ 46 3-12 Xilogravura de Albrecht Meyer, De historia stirpium (1542) _______________________________________________ 46 3-13 Ilustraes usadas por Hudson (1960) respondiam s representaes de profundidade em perspectiva (HUDSON apud TWYMAN, 1985) ________________________________________________ 47 3-14 Unidade sinttica. (GOLDSMITH, 1984:127) ________________________ 49 3-15 Unidade semntica. (GOLDSMITH, 1984:128) ______________________ 50 3-16 Unidade pragmtica. (GOLDSMITH, 1984:129) ______________________ 50 3-17 Locao sinttica. (GOLDSMITH, 1984:130) ________________________ 51 3-18 Locao semntica. (GOLDSMITH, 1984:131) ______________________ 51 3-19 Locao pragmtica. (GOLDSMITH, 1984:132) ______________________ 52 3-20 nfase sinttica. (GOLDSMITH, 1982:133) _________________________ 53

3-21 Cartum de Charles Addams sobre unicrnios, publicado originalmente na The New Yorker (1956) (charlesaddams.com) _______________ 55 3-22 Ilustrao de Michel Canetti (2000). Exemplo de desenho com um trao de consistncia homognea (michelcanetti.com) _____________________ 57 3-23 Detalhe do mapa (topogrfico) do metr de Londres de 1908 __________________________________________ 59 3-24 Detalhe da primeira edio do mapa (topolgico) do metr de Londres por Harry Beck, 1933 ___________________ 59 3-25 rvores esquemticas (Richards, 2000:95) ________________________ 60 3-26 Seleo de pictogramas ISOTYPE criados Gerd Arnz ______________________________________ 61 3-27 Modelo taxonmico para diagramas (Richards, 2000:97) _______________ 61 3-28 Objetos pictrico e no-pictricos (Vollmer, 2004) __________________ 63 3-29 Pictogramas exemplificando quatro variaes de objetos grficos compostos e elementares (Vollmer, 2004)_______________________________ 64 3-30 Gramtica bsica das placas de trnsito (Engelhardt, 2002) ____________ 64 3-31 Como camadas se comportam, segundo Engelhardt (Vollmer, 2004) _________________________________________________________ 65 3-32 Mapa (Vollmer, 2004) ________________________________________ 65 3-33 Adaptao dos atributos visuais de Bertin proposta por Engelhardt (Vollmer, 2004:1) _________________________________________________ 65 3-34 Infogrfico em que podemos ver exemplos dos elementos textuais. Jornal O DIA (MORAES,1998:141) ____________________________________ 69 3-35 Exemplo de flechas e bonecos. Jornal O DIA (MORAES,1998:146)________ 70 3-36 Exemplo de bales, perspectiva (prdio), bonecos e pictograma (bandeira do Brasil). Jornal O DIA (MORAES,1998:144) _____________________ 70 3-37 Exemplo de grfico de relaes de proporo. Jornal O DIA (MORAES,1998:147) ______________________________________________ 71

4-1 Disco de Faistos (cerca de 1.700 A.C.), exposto no Museu arqueolgico de Heraklion em Creta ______________ 76 4-2 Tapearia de Bayeux, representando a frota invasora do Duque Guilherme da Normandia ______________________ 77 4-3 Histria em quadrinhos de Winsor McCay (1871-1934), Little Nemo in Slumberland ______________________________ 77 4-4 Exemplos de tabelas que ilustram clula 12 pelo autor (TWYMAN, 1979:128) ______________________________________________________ 78 4-5 Coluna de Trajano (ano 112) (commons.wikimedia.org) ________________ 79 4-6 Infogrfico da Revista Mundo Estranho (Infogrfico: Ricardo Cunha Lima e Bianca Grassetti) ____________________________________________ 82 4-7 Infogrfico da Revista Mundo Estranho (Infogrfico: Luiz Iria; design: Renata Steffen; Texto: Dante Grecco) __________________________________ 83 4-8 Infogrfico sobre como se faz uma infografia atravs do fluxo de atividades no ambiente de trabalho de um Jornal _____________________________________ 84 4-9 Exemplo de descrio em ilustrao _______________________________ 87 4-10 Exemplo de narrao, em ilustrao ______________________________ 87 4-11 Infogrfico que mostra como funciona o sistema de abastecimento de gua e combate aos incndios atravs, entre outros recursos, do auxlio do avio Canadair _______________________ 89 4-12 Carte Figurative (1869) de Charles Joseph Minard da Campanha de 1812 de Napoleo Rssia _____________________ 90 4-13 Pgina de um infogrfico de seis pginas (e um detalhe da pgina seguinte, direita) criado no estilo-histrico das histrias em quadrinhos de super-heris norte-americanos (Revista Mundo Estranho) _________________ 92 4-14 Exemplo do estilo do quadrinista Jack Kirby: Hulk esquerda, e o Surfista Prateado direita ___________________________________________ 93 4-15 Exemplo do estilo do quadrinista Mike Mignola para as histrias Hellboy ________________________________________________________ 94

4-16 Exemplo do estilo do quadrinista Frank Miller para a histria em quadrinhos Sin City, mostrando a gradao de textura grfica que definiu o estilo de contraste de claro-escuro do quadrinista _________________________ 94 4-17 Duas pginas da International Picture Language (NEURATH, 1936) _______ 95 4-18 Diagrama do livro Desvendando os Quadrinhos de Scott McCloud, demonstrando a variedade na representao de um rosto, atravs de uma simplificao do tratamento do desenho (McCloud, 1995:29) _________________ 95 4-19 Diviso do repertrio de atuao de Nigel Holmes no sumrio de seu website ____________________________________ 97 4-20 Mapa alegrico de folhas de trevo de Heinrich Bnting, xilogravura (1581), homenageando a cidade de Hannover, cujo smbolo um trevo. Jerusalm representada no centro, com a Europa, sia e frica circundando, formando folhas de um trevo __________ 98 4-21 Detalhe de infogrfico (da fig. 3-5), com mapa ( esquerda) mostrando a localizao geral de So Paulo em relao ao Brasil, a fim de contextualizar geograficamente o aeroporto de Congonhas __________________________________________ 98 4-22 Infogrfico premiado no Malofiej de 2007 (criado por Eder Reder e Rubens Paiva para Revista Sade!) (ed. Abril) _____________________________ 99 4-23 Vrias abordagens de grficos estatsticos para a palestra do 1 LIDE de 2009 ________________________________________ 99 4-24 Relgio, grfico de tempo (Engelhardt, 2002) ______________________ 100 4-25 Diagramas de ligao (Engelhardt, 2002) __________________________ 100 4-26 Diagramas de agrupamento (Engelhardt, 2002) _____________________ 100 4-27 Tabela (e linha do tempo) mostrando a evoluo do design em diversas reas _____________________________________ 101 4-28 Exemplos de smbolos (Engelhardt, 2002) _________________________ 101 4-29 Mapa estatstico (Engelhardt, 2002) _____________________________ 102 4-30 Mapa de percurso. Detalhe da primeira edio do mapa do metr de Londres por Harry Beck, 1933 _______________ 102

4-31 Grfico estatstico de tempo de William Playfair, considerado o fundador das representaes grficas estatsticas. Grfico publicado originalmente em Commercial and Political Atlas, 1786 _________________________________________ 103 4-32 Nascimentos e mortes na Alemanha entre 1911 e 1926 um famoso grfico estatstico de tempo do ISOTYPE da dcada de 1920, que mostra a relao de mortalidade/natalidade durante a primeira guerra mundial. Retirado do International Picture Language (NEURATH, 1936) ________ 103 4-33 Grfico estatstico de tempo das maiores falncias na historia, utilizando barcos afundando como metforas ____________ 103 4-34 Diagramas cronolgicos de ligao (Engelhardt, 2002) ________________ 104 4-35 Diagrama estatstico de ligao (Engelhardt, 2002) __________________ 104 5-1 Algumas capas da revista Superinteressante, desde a primeira edio de 1987, no alto, esquerda_______________________________________________ 106 5-2 Infogrfico da revista Superinteressante (criado pelos Infografistas Lus Iria e Rodrigo Maroja, texto de Denis Burgierman) _______________________ 111 5-3 Estrutura em camadas do infogrfico guiando a narrativa. A funo das letras apenas evidenciar as diferentes camadas ______________________ 112 5-4 Narrativa do infogrfico dividida em comeo, meio e fim _______________ 113 5-5 Detalhe do Infogrfico da revista Superinteressante dando nfase a trs linhas do tempo _____________________________________________ 115 5-6 Detalhe __________________________________________________ 115 5-7 Detalhe __________________________________________________ 116 5-8 Detalhe __________________________________________________ 116 5-9 Ambas imagens do globo terrestre, um com suas linhas de coordenadas meridionais ( esquerda) e o outro ( direita) um smbolo genrico de globo, so representaes clssicas do mesmo _________________________________________ 116 5-10 Essa ilustrao uma pintura a guache de Milton Alves

(Superinteressante, maro de 1991) ___________________________________ 118 5-11 Detalhe _________________________________________________ 119 5-12 Seqncia clssica da evoluo humana ______ 120 5-13 Infogrfico da revista Superinteressante (criado pelo infografista Lus Iria, texto de Tereza Venturoli) _____________________________________ 122 5-14 Estrutura da configurao em matriz do infogrfico __________________ 123 5-15 Detalhe _________________________________________________ 124 5-16 Detalhe de uma pgina da histria em quadrinhos de Moebius e Jodorowsky (Aprs LIncal, Vol.1) (MOEBIUS, 2000:7) _____________________ 125 5-17 Terceira e quinta pginas da reportagem Doutores da Agonia ________ 128 5-18 Detalhe de uma legenda do infogrfico ___________________________ 129 5-19 Infogrfico da revista Superinteressante (criado pelos Infografistas Lus Iria e Rodrigo Maroja, texto de Denis Burgierman) ____________________ 129 5-20 Detalhes de elementos que contextualizam o tema da reportagem ______ 131 5-21 Capa da revista Raygun por David Carson ____________ 132 5-22 Caricatura de Bruce Springsteen e Barbara Streisand, ilustraes internas para revista intertainment Weekly (1995) por Hanock Piven _________________________________________________ 132

Sumrio

1.1.1.

IntroduoDescrio do trabalho

18 21

2.2.1. 2.2. 2.3. 2.4.

O que infografia jornalstica?Conceituando infografia Infografia jornalstica Infogrfico, grfico e diagrama Infografia e design da informao

23 23 24 29 31

3.3.1. 3.2.3.2.1. 3.2.2. 3.2.3. 3.2.4. 3.2.5. 3.2.6. 3.2.7. 3.2.8.

Linguagem grfica da infografiaJacques Bertin e a semiologia grfica Michael Twyman e a anlise da linguagem grficaLinguagem Pictrica Descrio e localizao espacial Narrao Persuaso Imagens sinpticas Imagens compostas de elementos distintos Credibilidade Contexto cultural e usurio

34 36 3839 41 42 42 43 44 45 47

3.3.3.3.1. 3.3.2. 3.3.3. 3.3.4. 3.3.5.

Evelyn Goldsmith e a anlise pictricaUnidade Locao nfase Texto paralelo Anlise do cartum de Charles Addams

4848 50 53 54 55

3.4. 3.5. 3.6.3.6.1.

Clive Ashwin e o estilo Clive Richards e os diagramas Yuri Engelhardt e a sintaxe grficaSintaxe grfica

56 58 6263

3.6.2. 3.6.3.

Atributos sintticos Estrutura sinttica

64 66

3.7. 3.8.3.8.1. 3.8.2.

Venkatesh Rajamanickam e a infografia Ary Moraes e a infografia jornalsticaElementos textuais Elementos no-textuais

67 6868 69

4.4.1.4.1.1. 4.1.2.

Variveis para anlise da infografia jornalsticaConfiguraoEsquema de linguagem grfica verbal (LGV) Estrutura de diagrama e estratgia de leitura

73 7475 80

4.2. 4.3.4.3.1. 4.3.2. 4.3.3.

Contedo informacional Tipo de informaoNarrao e descrio Informao temporal Informao espacial

83 8686 88 88

4.4.4.4.1. 4.4.2.

Estilo, generalizao e particularidade pictricaEstilo Generalidade ou particularidade?

9191 94

4.5.4.5.1. 4.5.2.

Elementos grficos do infogrficoTipos primrios Tipos hbridos

9697 102

5.5.1.5.1.1. 5.1.2.

Exemplos de anlise de infogrficos da revista SuperinteressanteA revista SuperinteressanteSuperinteressante e o jornalismo cientfico Corpus da anlise

106 106107 108

5.2. 5.3. 5.4.

Infogrfico: A histria da Terra Infogrfico: E se... existisse vida em todo o sistema solar? Infogrfico: O Mapa da Insensatez

111 122 128

6. 7.

Concluso Bibliografia

135

139

1.

Introduo

1.

Introduo

Na atualidade, o texto jornalstico tradicional cada vez mais se revela insuficiente para atender crescente oferta de informao nas mdias impressas e virtuais. A percepo da necessidade de utilizao de outros recursos alm do texto escrito e da fotografia no jornalismo, no entanto, no recente. Harold Evans (1978), ex-editor do Sunday Times ingls, j fazia uma defesa da infografia como uma importante forma de comunicao muito antes da introduo da tecnologia digital no jornalismo: Todo dia surgem notcias que no podem ser relatadas adequadamente apenas por palavras, particularmente as notcias essencialmente visuais e espaciais. Considere a manchete: equipe de resgate tenta desenterrar mineiros presos pela elevao do nvel da gua. A relao espacial a essncia desse drama, que algum de fora no conseguiria entender sem o auxlio de graphics 1 (...) Uma fotografia sozinha no d conta disso. O mesmo pode ser dito de um desenho isolado. (...) A representao grfico-pictrica no seu grau mais bsico a marcao do X em um mapa; ou a seta direcional que indica o artigo que continua na pgina seguinte, ou a fotografia com marcaes de identificao. Mas existem possibilidades mais sofisticadas para a infografia onde smbolos e desenhos juntos relatam um assunto complicado mais sucintamente do que possvel apenas atravs de palavras. (...) tais representaes factuais no so meramente imagens, so informao (EVANS, 1978:60). Evans, um pioneiro na anlise da infografia, nos oferece um panorama da infografia alguns anos antes da sua expanso na comunicao jornalstica. Contudo, embora ele percebesse o potencial da linguagem grfica alm do seu papel tradicional, em seu discurso Evans parece estar voltado exclusivamente a um jornalismo visual para notcias dirias. No entanto, atualmente, em contato com mdias mais dinmicas, os jornais vo perdendo a funo de informar em primeira mo e passando a ter um papel mais investigativo e reflexivo em suas matrias. Com isso, ampliam-se as necessidades de explicao, para o leitor leigo, de processos e fatos complexos, o que torna imperativo o uso de recursos que vo alm do texto, como peas grficas que unem ao texto toda uma gama de imagens. O jornalEvans a considera a tentativa de definir corretamente o termo graphics uma discusso esotrica (EVANS, 1978:60). No entanto, costuma ser usado em um sentido mais restrito que o termo grfico (no sentido, em portugus, de representao grfica em geral). Graphics, ento, um termo que se refere mais linguagem grfica esquemtica e pictrica, sem excluir o texto escrito (linguagem grfica verbal).1

18

contemporneo pode, ao dar uma notcia de guerra, por exemplo, ao invs de limitar-se a citar o pas, acrescentar o seu mapa, estatsticas sobre a tropa, baixas, tipos de armamento, principais batalhas, apresentando um panorama dos dois lados em conflito. Com isso, possibilita que o leitor entenda a situao e possa acompanhar a opinio expressa pelo jornalista. Esse fato tem levado os infogrficos jornalsticos a evolurem e se tornarem peas editoriais cada vez mais importantes. Pretende-se, com o presente trabalho, criar uma metodologia que seja capaz de avaliar o infogrfico jornalstico como uma pea de design de informao. Objetivamos obter melhor compreenso dos infogrficos jornalsticos impressos, e de seu papel no jornalismo contemporneo, contextualizando-a dentro do campo da linguagem grfica. Neste estudo foi enfatizando o papel da infografia em revistas impressas e, em alguns casos, em jornais impressos, apenas pela necessidade de restringir o escopo da pesquisa. A escolha no significa que infografia jornalstica se limite apenas a determinados meios impressos. No design editorial podemos encontrar muitos infogrficos em livros didticos, uns at compostos por infografia em quase todas as pginas, como possvel verificar nos exemplos de pginas duplas do livro Human Body I (Britannica Illustrated Science Library) da fig. 1-2. Sem deixar de mencionar o crescimento da infografia jornalstica na internet, com recursos digitais como animao em flash. Podemos ver o exemplo de um infogrfico interativo da verso online do jornal Washington Post (fig. 1-1), que mostra a localizao de cinco dos principais campos de prisioneiros da Coria.

1-1 Infogrfico interativo da verso online do jornal Washington Post(www.washingtonpost.com)

19

1-2 Pginas 78-79 e 90-91 do livro Human Body I (Britannica Illustrated Science Library). Estas duas pginas duplas so exemplos de infografia em livros didticos. (Encyclopdia Britannica)

20

1.1.

Descrio do trabalho

Essa dissertao compreende cinco captulos, cujo contedo resumimos a seguir: No captulo 2 (o que infografia jornalstica?), trataremos especificamente do conceito de infografia jornalstica, ampliando e adequando o conceito de infografia a esse meio, tratando-a como um meio de comunicao independente de outro texto ou contexto. Nesse captulo estabeleceremos, ainda, a diferenciao entre os conceitos de infogrfico e o de diagrama como iconografia. A seguir, no captulo 3 (linguagem grfica da infografia), abordaremos algumas das teorias mais relevantes para o estudo em questo, expondo o pensamento de alguns autores que trataram da representao grfica como uma forma de linguagem e que formularam estudos especficos que tm aplicao direta infografia jornalstica. Para essa pesquisa os autores que se mostraram mais significativos foram Michael Twyman, com seu esquema para anlise de linguagem grfica, e sua abordagem geral sobre a linguagem pictrica, e Evelyn Goldsmith, com sua teoria para anlise de ilustraes. No captulo 4, propomos algumas variveis para a anlise da infografia jornalstica, como a configurao grfica, o tipo de informao do infogrfico e o estilo de representao grfica. No captulo 5, aplicamos essas variveis na anlise de quatro infogrficos da revista Superinteresssante. Finalmente, no captulo 6, temos a concluso.

21

2.

O que infografia jornalstica?

22

2.

O que infografia jornalstica?

Para entendermos o que o objeto de estudo abordado, torna-se necessrio avanarmos no emaranhado de tradies terminolgicas advindas de tradues e conceitos, o que demonstra a entrada recente do assunto no campo acadmico.

2.1.

Conceituando infografia

Infografia um neologismo que foi incorporado recentemente lngua portuguesa. Ribas (2005:2) afirma que informational graphics, termo do qual deriva infographics, traduzido para o portugus e para o espanhol como infogrfico ou infografia, com o sentido de grfico informativo. No entanto, no possvel identificar, entre vrios autores, um uso consensual do termo infografia. Para Wilbur (1998), information graphics um termo genrico para vrias formas de representao grfica: de diagramas e interfaces digitais at a sinalizao. Porm, se optarmos por uma classificao muito abrangente, o termo infografia poderia eventualmente ser confundido como sinnimo de representao grfica como um todo. No podemos negar que o termo tem sido usado para sugerir um tipo de representao grfica diferenciada das demais. Um infogrfico, ento, no seria qualquer tipo de representao grfica, ou apenas um grfico cartesiano. Geralmente, quando se procura definir a infografia, salientado o fato da grande maioria dos infogrficos tratarem de divulgao cientfica ou de uma explicao de um fato complexo como, por exemplo, um acidente areo. Ento, de forma geral, costuma-se usar o termo infografia como: Uma pea grfica que utiliza simultaneamente a linguagem verbal grfica, esquemtica e pictrica, voltada prioritariamente explicao de algum fenmeno. Alguns designers e autores optam por ignorar o termo infografia, ou information graphics. Clive Richards (2000:99), quando trata do famoso infogrfico de Charles Minard de 1869 sobre a campanha de Napoleo na Rssia em 1812 (fig. 4-11), fala de um mapa diagramtico ou diagrama de forma genrica. Nigel Holmes (2001:1), profissional com uma longa carreira na rea de infografia para publicaes jornalsticas, tem uma proposta interessante para tratar o problema conceitual da infografia. Este autor prefere usar o termo explanation graphics (explicao grfica), pois, para ele, se trata menos de uma representao genrica de informao do que uma forma sofisticada de explicao visual. Atualmente, a infografia considerada uma rea que pertence principalmente ao design da informao. Sue Walker (2007:1) afirma que o design da informao uma atividade que tem se desenvolvido bastante nos ltimos anos, sendo eventualmente conhecida como design da comunicao. Trata-se de uma rea voltada para a o design grfico, mas que se relaciona com

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a lingstica e a psicologia aplicada, como a cincia da informao, entre outras reas. O design da informao est voltado aos sistemas de comunicao, com o objetivo de otimizar o processo de aquisio de informao (SBDI, 2008). A incluso de infogrficos nestes sistemas de informao ocorre quando explicaes grficas tornam mais eficiente a aquisio de contedos informacionais.

2.2.

Infografia jornalstica

Diferentes autores tentaram determinar os limites do que vem a ser um infogrfico, oferecendo diferentes terminologias, descrevendo seus elementos e quais os contextos em que usado (RIBAS, 2005 e QUADROS, 2005). Essa uma tarefa importante, mas o infogrfico jornalstico, alm de ser um conjunto de elementos identificveis, tambm uma forma de comunicao jornalstica. Para compreendermos melhor a infografia, nesse contexto, devemos observar alguns elementos bsicos da comunicao jornalstica: a iconografia e o texto. Iconografia representao esquemtica e pictrica, que pode incorporar textos curtos. Emanuel Arajo (1986) a define como algo que constitui-se de imagens de natureza vria que acompanha o texto de livros, revistas, jornais, etc., com o fim de orn-lo, complement-lo ou elucid-lo (ARAJO, 1986:460). Arajo continua explicando que a iconografia compreende ilustraes, grficos, diagramas, desenhos e fotografias, cada um com suas caractersticas prprias. Texto a forma mais usual de comunicao jornalstica, e definido claramente por Frederico Porta (1958), no Dicionrio de Artes Grficas, como a parte principal de um livro ou peridico, despida de seus ttulos e subttulos, epgrafes, gravuras, notas, quadros, etc. (PORTA, 1958:388). Em uma publicao semelhante e mais recente, Rossi (2001), em Graphos: glossrio de termos tcnicos de comunicao grfica, define texto, relacionando-o s ilustraes, como matria escrita de uma obra, em oposio s ilustraes (ROSSI, 2001: 595). A partir dessas definies, podemos concluir que uma ilustrao considerada um elemento que no pertence a um texto, mas apenas complementa o mesmo. Entretanto, essa complementao se d de forma integrativa, de maneira que, ao se retirar os elementos iconogrficos do texto, pode ocorrer uma grande perda de sentido no produto final. No contexto jornalstico, a insero de elementos iconogrficos costuma valorizar o texto escrito como fonte principal de informao.

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Michael Twyman (1983:245-248) menciona que h uma tendncia em se considerar linguagem e texto como elementos relacionados apenas s palavras, o que Twyman chama de linguagem verbal (oral) ou linguagem verbal grfica (tipogrfica ou escrita). Muitos lingistas no aceitariam a palavra linguagem relacionada a imagens pictricas, o termo linguagem verbal seria, para eles, uma tautologia: No tenho qualquer desejo de promover a causa da linguagem pictrica, embora a minha experincia em vrios contextos (especialmente em educao universitria) me leve a crer que a nfase neste assunto pode ser facilmente interpretada como uma ameaa a autoridade da linguagem verbal (TWYMAN, 1983:248). O argumento de Twyman refora a idia de que, mesmo no meio acadmico, h uma tendncia em se considerar o texto como a fonte de autoridade da informao, e a iconografia como fonte secundria. Embora no concordemos inteiramente com esse discurso da academia, necessrio reconhecer a sua influncia para que possamos compreender o papel dessas formas de linguagem no cotidiano. Para tornar mais claras estas distines, podemos observar, no exemplo da figura 2-1, que a matria sobre a histria do lpis apresenta texto e ilustrao que criam um dilogo entre si, sem necessariamente se integrarem como um nico objeto grfico. Trata-se de um caso em que o texto pode ser compreendido mesmo sem o auxlio da ilustrao. No segundo exemplo, da figura 2-2, percebe-se que h uma integrao maior entre o texto da matria sobre a espi Mata Hari e a ilustrao fotogrfica. Sem a ilustrao, haveria uma perda de significado, embora continuasse a ser possvel a compreenso do texto.

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2-1 Exemplo de ilustrao. (Revista Aventurasda Histria)

2-2 Exemplo de ilustrao mais integrada ao texto.(Revista Aventuras da Histria)

Nesses exemplos, e na forma tradicional de se fazer jornalismo, a matria jornalstica caracterizada pelo texto composto por palavras, a informao verbal grfica. Um dos elementos fundamentais do jornalismo a matria jornalstica, definida por Rossi (2001) como texto jornalstico que constitui uma unidade temtica, destinados publicao (ROSSI, 391:2001). Esse mesmo autor no inclui iconografia em seu conceito de texto. Segundo as definies apresentadas, na prtica cotidiana do jornalismo, a iconografia descartada como fonte principal de informao. Por outro lado, ao tratar do livro, vemos que a definio de iconografia de Arajo (1986) tambm sugere uma clara separao entre a ilustrao e o texto, reservando quela um papel secundrio. Na infografia, no entanto, est-se diante de uma situao diferente, uma vez que aqui ocorre unificao do texto com os elementos iconogrficos, todos situados dentro de uma nica matria jornalstica. Definimos ento que, do ponto de vista do design jornalstico, a infografia jornalstica : Um tipo de matria jornalstica onde o texto e iconografia so interdependentes e a estratgia de leitura pode se desenvolver de forma no-linear, que se diferencia da iconografia tradicional pela possibilidade de se comportar como a fonte principal de informao na pgina. Portanto, os infogrficos diferem da ilustrao tradicional na sua forma de se relacionarem

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com o texto, e no sendo necessariamente subordinados a uma matria. Esses infogrficos so projetados, muitas vezes, para servirem como fonte autnoma de informao.

2-3 Percebe-se no infogrfico uma integrao entre vrios elementos iconogrficos e o texto. (Revista MundoEstranho)

No infogrfico de pgina dupla da figura 2-3, sobre como feito chiclete, percebemos uma integrao entre vrios elementos iconogrficos e o texto, um exemplo tpico de infografia jornalstica. J na figura 2-4, sobre a dor mais insuportvel que existe, a matria jornalstica dividida em duas colunas, sendo que a coluna direita, que representa um infogrfico, pode ser compreendida sem o auxlio do texto esquerda. Nesse infogrfico, a coluna direita um elemento to contundente, e o texto, esquerda, to sucinto, que poderamos considerar os dois elementos como parte de um nico infogrfico maior, composto por uma coluna de texto, que responde a pergunta do ttulo, e um infogrfico complementar de duas colunas, mostrando o caminho da dor.

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2-4 Neste infogrfico podemos ver que a informao direita pode ser lida independentemente do texto esquerda. (Revista Mundo Estranho)

claro que uma classificao como essa no cobre todo tipo de infogrfico. Muitos casos so hbridos e se torna difcil distinguir claramente se o objeto grfico um infogrfico ou um tipo mais comum de iconografia como uma ilustrao, grfico ou diagrama. Nigel Holmes (2005), em Wordless Diagrams, por exemplo, apresenta diversos diagramas sem palavras (figura 2-5). No exemplo de Holmes, podemos observar uma seqncia de diagramas, formando uma narrativa, descrevendo diferentes formas de se beijar em quadro pases. Ele usa apenas de elementos pictricos e esquemticos, os nicos elementos verbais (grficos) que utilizados so numerais pontuando as sequncias de beijos.

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2-5 - Diagrama sem palavras de Nigel Holmes que descreve diferentes formas de se beijar em quatro pases.(Wordless Diagramas, 2005:146-147)

Dependendo do contexto em que esse trabalho apresentado numa publicao jornalstica, ele poderia ser classificado como um infogrfico. Este exemplo (figura 2-5) talvez seja uma exceo entre a maioria dos infogrficos. Contudo, um infogrfico uma matria jornalstica que costuma ser estruturada usando a linguagem dos diagramas, mesmo de uma forma simples ou at sem o uso de palavras. importante salientarmos que essa proposta de definio para infografia pretende apenas enfatizar a sua potencialidade como matria jornalstica, no apenas como iconografia.

2.3.

Infogrfico, grfico e diagrama

Na lngua inglesa, vrios so os termos usados para descrever infografia, utilizando-se infographics assim como graphics ou diagrams, o que, inevitavelmente, intensifica a confuso em volta do termo. Para Ribas (2005) o principal problema est na m traduo do ingls para grfico. Em ingls, graphics pode ser o mesmo que diagram, mas diagram, mas no o mesmo que chart ou graph, que so tradues corretas para grfico na lngua portuguesa (RIBAS, 2005:4). O termo ingls graphics seria o equivalente, em portugus, representao grfica, um conceito bastante genrico.

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2-6 Exemplo de diagrama, usado por Emanuel Arajo.(ARAJO, 1986:462)

2-7 Exemplo de grfico, usado por Emanuel Arajo.(ARAJO, 1986:460)

Grfico e diagrama so assim descritos por Emanuel Arajo: Os grficos e diagramas constituem uma forma de representao cujo objetivo demonstrar, sem utilizao do discurso escrito, todas as relaes que existem entre elementos rigorosamente definidos e conhecidos. (ARAJO, 1986:461) Grficos e diagramas servem, no entanto, a diferentes funes. Para Arajo (1986:461), o grfico pe em imagem a demonstrao esquemtica de um fato (fig 2-7), enquanto que o diagrama representa a demonstrao esquemtica de um objeto (fig 2-6). Essas diferenas ilustram o problema de se ignorar o fato de que graphics no deve ser compreendido literalmente como grfico. Por outro lado, diagrama um termo mais especfico que sugere uma descrio, ou, como podemos encontrar no Dicionrio de artes grficas, a representao grfica de um fenmeno (PORTA, 1954). Se diagrama um termo mais adequado, a traduo literal mais correta de infographics seria algo como diagrama informativo. Nesse sentido, Ary Moraes (1998:113) considera o ingls diagrammatics mais adequado do que graphics. Essa preferncia pelo termo diagram tambm pode ser identificada em alguns autores ingleses como Clive Richards (2000:1).

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O conceito de diagrama, do ponto de vista formal, pode variar de autor para autor. Para Richards (2000), por exemplo, mapas, tabelas e grficos, entre outras representaes grficas, seriam tipos de diagramas. J o cartgrafo Bertin (1983), considera que grficos e tabelas poderiam ser includos no mbito dos diagramas, enquanto que um mapa seria algo distinto (Engelhardt, 2002:146). Para tentar definir o que viria a ser um diagrama, decidimos nos basearmos na idia de linguagem grfica dada por Twyman (1979) (ver cap. 3.2), e tambm na teoria sobre estrutura diagramtica de Rob Waller (1985) (ver cap. 4.1.2). Um diagrama, ento, pode ser assim definido: Tipo de iconografia capaz de misturar tanto linguagem grfica pictrica quanto esquemtica, alm do texto escrito (linguagem grfica verbal), e que permite a leitura do contedo informacional de modo no-linear pelo leitor. Neste estudo, consideramos que a melhor opo seja aceitar as possveis incongruncias dos termos infogrfico, grfico e diagrama, e no optar por desenvolver ou adotar novos termos. Para evitar possveis confuses com as tradues de termos de lngua inglesa, iremos considerar: 1. 2. 3. Infographics ou information graphics como equivalentes a infografia; A forma genrica de graphics como representao grfica em geral; Grfico como equivalente a graph.

Os termos diagrammatics, diagrams ou graphics tm sido usados para descrever infographics. Nesses casos, daremos preferncia ao conceito e usaremos apenas infografia.

2.4.

Infografia e design da informao

Designers de informao tambm podem ser considerados transformadores da informao. O conceito do transformador, proposto nos anos de 1920 por Otto Neurath, o principal criador do ISOTYPE (International System of Typographical Picture Education), o de um tipo de profissional que reinterpreta a informao, ou transforma a mesma, para adequ-la a contextos sociais diferentes (ver cap. 3.4). Como afirma Wilbur (1998:7), para Neurath, designers eram intermedirios entre historiadores, economistas, matemticos e seu pblico alvo. Em se tratando da infografia, essa analogia especialmente importante, j que o infografista jornalstico um misto de designer e jornalista que transforma a informao de um contexto que privilegia o conhecimento especializado para outro diferente. No caso da divulgao cientfica, o infogrfico funciona como uma reinterpretao visual da informao cientfica para um contexto leigo.

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O infografista Nigel Homes (2006) declara: Na maioria dos casos, eu acredito em adaptar o que eu fao para um pblico especfico. Eu preciso, pelo menos, conhecer quem o pblico para que ele faa parte da minha forma de pensar o trabalho. Um exemplo simples disso quando um editor de uma publicao acadmica ou cientifica v algo que fiz e pede que eu faa uma anlise dos diagramas da sua publicao. Eles so, em geral, secos e incompreensveis para o leitor comum, mas so totalmente adequados para os leitores daquela publicao. Mas porque eles no podem ser mais parecidos com os de uma revista como a TIME? Talvez o editor indague. Ele est confundindo quem l o que e por qu. (...) S porque a revista TIME utilizou um certo estilo, isso no significa que todo infogrfico deva se parecer com os dela (HOLMES, 2006:15). No devemos concluir que a infografia seja necessariamente uma simplificao de uma informao complexa, embora ela tambm possa ser. Sua funo contextualizar a informao para o leitor, trazendo, para primeiro plano, questes de compreenso visual e verbal muitas vezes ignoradas na tradio da linguagem verbal.

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3.

Linguagem grfica da infografia

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3.

Linguagem grfica da infografia

Vivemos em um mundo que depende consideravelmente da linguagem visual. Como existem diversas formas de linguagem visual, importante salientarmos que at o presente momento na nossa histria tecnolgica, o foco do design grfico (ou design visual, de interao, de informao, etc.) tem sido principalmente a linguagem visual grfica. Trata-se de um tipo de linguagem que representada de forma essencialmente bi-dimensional em seu suporte, seja ele o papel ou a tela de computador. At hoje foram feitas poucas tentativas de estudo desse tipo de comunicao. Uma das reas que tm se voltado para o estudo do assunto a lingstica, utilizando-se do instrumental terico desenvolvido para o entendimento da linguagem verbal. A abordagem lingstica, no entanto, tem se mostrado problemtica aos olhos dos designers que tm se dedicado a estudar o tema, implicando em escolhas diferenciadas dos conceitos lingsticos, para adequ-los aos estudos do visual grfico. Um destes pesquisadores, Robert Horn (1999), formula essa crtica no texto que segue: Eu sustento que a linguagem visual uma linguagem, porque no possvel entender sua sintaxe, semntica e pragmtica usando apenas os conceitos lingsticos desenvolvidos para analisar a linguagem falada. Nem as ferramentas de anlise usadas pelas artes visuais ou a lingstica so suficientes para analisar o que est acontecendo na linguagem visual. Para criar uma verdadeira lingstica da linguagem visual necessrio se criar novos conceitos voltados para como palavras e imagens interagem juntas (Horn, 1999:28). Ellen Lupton (1999) v a origem da subservincia linguagem verbal no que Jacques Derrida (2004) considerava uma forma de logocentrismo, em que a palavra falada considerada superior s outras formas de representao, inclusive a escrita (LUPTON, 1999:4-5). Na lingstica, a origem deste pensamento pode ser identificada na obra de Ferdinand de Saussure (1916/1997), para quem a idia de uma linguagem verbal seria uma tautologia, pois acreditava que a escrita era meramente uma representao da fala. Todas as representaes grficas/visuais, assim como a escrita, eram tidas como inferiores fala, raciocnio que revela um apego idia da existncia de um significado transcendente que habitaria a fala ou, ainda, a

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prpria mente. 2 Lupton parece sugerir que a tradio logocntrica do estudo da linguagem tem afetado consideravelmente a forma como se encara o design como conhecimento. No design, as questes de forma grfica no podem ser preteridas ao suposto contedo verbal. Podemos concluir, pelo argumento de Lupton, que, ao menos no campo do design, a forma grfica deve ser encarada como parte do contedo informacional. Um dos pioneiros no estudo da linguagem grfica foi o cartgrafo francs, especializado em design cartogrfico, Jacques Bertin (1983), que, em seu clssico Semiologie Graphique, editado pela primeira em 1967, aplica a teoria semitica a representaes grficas de dados (grficos e mapas). Depois de Bertin, outros seguiram seus passos, desenvolvendo sistemas de anlise linguagem grfica. Um autor que tratou o tema de uma forma abrangente foi Michael Twyman (1982), ao estudar as relaes entre linguagem verbal, esquemtica e pictrica, e oferecer um modelo lingstico direcionado especificamente linguagem grfica. Esse autor tambm se aventurou no estudo da negligenciada linguagem pictrica. Mas na pesquisa de ilustraes de Evelyn Goldsmith (1982) que encontramos um sistema de anlise pictrica revolucionrio. Criado com base nos trs nveis semiticos de Charles Morris, teoria originalmente direcionada linguagem verbal, o trabalho de Goldsmith tem se mostrado surpreendentemente til quando aplicado. No campo do estilo, Clive Ashwin (1979) prope uma anlise sinttico-semntica que considera aspectos conotativos da linguagem pictrica, que complementam uma certa objetividade formalista de Bertin. Autores mais recentes desenvolveram trabalhos direcionados mais especificamente para diagramas, grficos e infografia. Clive Richard (2000) tem um artigo essencial sobre a natureza dos diagramas, em que prope um modelo para a compreenso da variao metafrica entre a linguagem esquemtica e a pictrica. Nesse sentido, podemos perceber uma continuidade desse projeto no estudo recente do holands Yuri Engelhardt (2002). O campo da infografia tem recebido a ateno de autores, que tm proposto anlises mais especficas do tema. Venkatesh Rajamanickam (2005) prope uma interessante tipologia de infogrficos, valorizando-os como contedo informacional, assim como o infografista brasileiro Ary Morares (1998), que classifica os elementos textuais e no-textuais de um infogrfico.

Esta supremacia da fala sugere a idia de que o verdadeiro contedo de um texto grfico, a sua substncia conceitual por assim dizer, seria o pensamento por trs das palavras. J que o mais prximo que poderamos chegar do pensamento seria a fala, ela seria o equivalente ao contedo conceitual do texto escrito. Segundo Derrida, essa tradio ocidental logocntrica, manifesta em Saussure, teria suas origens nas teorias metafsicas de Plato sobre as diferenas entre o sensvel e o ideal. Lupton parece sugerir que a tradio logocntrica do estudo da linguagem tem afetado consideravelmente a forma como se encara o design como conhecimento.

2

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3.1.

Jacques Bertin e a semiologia grfica

Jacques Bertin, em seu texto seminal, Semiologie Graphique (1983), classificou sistematicamente o uso de elementos visuais grficos na representao de dados e suas relaes, aplicados a grficos e mapas. Bertin inicia o trabalho propondo um sistema de anlise de dados para direcionar a representao visual. Em seguida, ele se refere s dimenses espaciais bsicas, como ponto, linha e rea em um plano cartesiano (X e Y). A questo mais difundida do sistema de Bertin diz respeito s sete variveis grficas fundamentais, que propem caractersticas que fazem parte de qualquer representao grfica (diagrama da figura 3-1). As variveis so: Forma: variao formal dentro de uma determinada rea. Tamanho: variao de dimenso da rea ou do elemento grfico. Valor: variao de claridade da rea ou do elemento grfico. Textura: variao na espessura dos elementos que constituem uma rea grfica. Cor: variao de tonalidade de cor dentro de um mesmo valor (claridade). Orientao: variao de orientao, horizontal a vertical, de linhas ou padres. Posio: variao de posio em um determinado espao grfico.

3-1 - Variveis grficas definidas por Jacques Bertin (apud TWYMAN, 1983:294)

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Twyman (1983:294) enfatiza a importncia das sete variveis de Bertin, considerando-as uma lista essencial de caractersticas grficas, sejam elas pictricas, esquemticas ou verbais, mas reconhece a limitao desse sistema diante da riqueza formal da linguagem pictrica. Alm dos sistemas de classificao e normatizao projetual, Bertin (1983:2-3) props uma definio de linguagem grfica onde fez uma distino entre sistemas monossmicos, polissmicos e pansmicos, conforme o que se segue: Monossmico: o significado de cada signo definido a priori da observao de um conjunto de signos, ou seja, as imagens monossmicas seriam aquelas que no oferecem mais de uma interpretao correta. Bertin, ao valorizar a monossemia, procura definir um conceito de objetividade grfica, para que os designers percebam a importncia da representao inequvoca de informao. Para Bertin, os smbolos matemticos e a linguagem esquemtica so exemplos ideais de signos monossmicos. Polissmico: as imagens polissmicas seriam aquelas que oferecem mais de uma interpretao correta. So as imagens mais denotativas, as ilustraes narrativas ou simblicas. Pansmico: so imagens com possibilidades infinitas de interpretao, como uma pintura abstrata que contm uma infinitude de interpretaes possveis. Clive Ashwin (1979), discutindo o papel da denotao grfica, critica a valorizao excessiva da monossemia em Bertin. Para Ashwin, Bertin, ao confinar sua ateno imagstica monossmica e descartar imagens polissmicas, tem pouco ou nada a dizer sobre as imagens pictricas, que so uma parcela considervel da linguagem grfica. Para aquele autor, ambas as linguagens, polissmica e pansmica so desqualificadas por Bertin, por proporem significados imprecisos, ou, como ele coloca, discutveis. Ashwin complementa ento que, no mbito da ilustrao, que um tipo de linguagem grfica que faz parte do design grfico, apenas uma pequena parcela das representaes pictricas pode ser considerada monossmica, pelo menos em sua inteno (como no caso da ilustrao cientfica/tcnica e boa parte da infografia), mas quase nenhuma seria verdadeiramente pansmica (1979:52). Tal fato no impede, no entanto, que, mesmo diante de um sistema monossmico, o leitor venha a desenvolver sua prpria interpretao do significado sobre a informao grfica.

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3.2.

Michael Twyman e a anlise da linguagem grfica

Michael Twyman um historiador de design que se props a tentar resolver algumas das questes da linguagem grfica direcionadas ao design grfico. Twyman constata que a lingstica praticamente desconsidera a linguagem grfica ao propor a diviso da linguagem apenas entre a falada e a escrita (ver fig. 3-2). Twyman contrape que os designers tm uma percepo diferente das sutilezas da linguagem grfica. Para eles, o foco no est na fala, e sim na variedade da linguagem grfica, diferenciando linguagem grfica verbal da linguagem pictrica (ver fig. 3-2). Twyman prope, ento, um modelo capaz de conciliar a viso tradicional da lingstica com a viso dos designers (ver fig. 3-3). Neste modelo, a distino principal feita pelo canal de comunicao. Essa comunicao transmitida atravs da audio ou da viso. Twyman admite que existam outros meios como o tato, para deficientes visuais, mas opta pelas situaes mais comuns em comunicao (TWYMAN, 1985:247).

3-2 A linguagem abordada de maneiras diferentes: abordagem dos lingistas esquerda, e a dos designers grficos direita. (TWYMAN, 1982:145)

3-3 - Modelo criado para acomodar as abordagens de lingistas e designers diante da questo da linguagem (TWYMAN, 1985:145)

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Em seguida, ele oferece um esquema (schema) taxonmico para se analisar a linguagem grfica, a linguagem grfica verbal, esquemtica e pictrica (TWYMAN, 1979). A linguagem verbal a representao grfica da linguagem falada (seja ela tipogrfica ou escrita mo). A linguagem esquemtica formada por formas grficas que no incluem palavras, nmeros ou imagens pictricas (como por exemplo, tabelas, representaes abstratas de estrutura, etc.). Finalmente, a linguagem pictrica comporta imagens produzidas artificialmente que remetem por mais remota que seja aparncia ou estrutura de algo real ou imaginado (TWYMAN, 1985:249). No captulo 4.1 abordaremos o esquema de Twyman detalhadamente, uma vez que ele tem sido bastante difundido por se mostrar muito adequado anlise de peas de design grfico, possibilitando um estudo mais direcionado. Kostelnick & Hassett (2003) apontam que a abordagem taxonmica pode, eventualmente, ter suas limitaes. Estes tericos optam por uma abordagem da retrica da linguagem visual, argumentando que taxonomias como o esquema de Twyman nos permitem reconhecer padres na linguagem visual (e variaes dos mesmos), mas tendem a separar o design do seu significado. Por si s, modelos como esses no conseguiriam revelar a estrutura latente da linguagem visual, porque o significado de qualquer variao visual pode mudar dependendo do contexto e do seu observador (KOSTELNICK & HASSETT, 2003:2). Ou seja, dependendo objetivo da anlise, sem uma contextualizao aprofundada, os resultados do esquema podem ser insuficientes.

3.2.1. Linguagem PictricaEm seu artigo Usando linguagem pictrica (1985), posterior ao schema (1979), Twyman prope uma viso talvez mais abrangente, discutindo ainda mais a forma grfica como contedo informacional e a questo da linguagem pictrica, comumente negligenciada por designers. Para entender o contexto da produo de imagens pictricas, devemos considerar outros fatores, boa parte deles no grficos. Twyman (1985:248-249) sugere variveis para compreender a questo operacional de linguagem grfica: a) propsito: se, por exemplo, h a inteno de oferecer informao ou persuadir; b) contedo informacional: a essncia da informao ou mensagem a ser transmitida; c) configurao: diferentes formas de organizar elementos grficos espacialmente; d) modo: seja verbal, pictrico, esquemtico ou a combinao de dois ou mais;

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e) meio de produo: seja produzido mo ou por computador; f) recursos: habilidades, facilidades, fundos e tempos disponveis;

g) usurios: considerando fatores como idade, habilidade, formao, interesses e experincia; h) circunstncias de uso: se o usurio se encontra em uma biblioteca bem equipada, ou est sob condies de estresse, como em um veculo em movimento. O fato de tais variveis refletirem a atividade dos designers e o contexto no qual o usurio se insere muito importante para a teoria do design. O estudo tradicional de linguagem costuma valorizar o olhar do intrprete sobre o objeto de estudo, mas nem tanto as circunstancias de criao e uso do mesmo. As variveis sugeridas por Twyman evidenciam fatores determinantes em projetos de design grfico, podendo ser usadas como guia em uma anlise grfica. Twyman aborda tambm questes conceituais da sua classificao de linguagem grfica. Definir os precisos limites do que vem a ser pictrico ou esquemtico no to simples, j que muitas vezes um elemento grfico pode transitar entre o esquemtico e pictrico. Um exemplo disso pode ser constatado na figura 3-4, em que o cartunista James Gillray (1791) aproveita a ambigidade das formas esquemticas do mapa da Gr-Bretanha para transformla em um cartum, com uma velha senhora sentada nas costas de uma criatura marinha monstruosa.3-4 Gravura de James Gillray de 1791, transformando um mapa esquemtico da GrBretanha em imagens figurativas(bibliodyssey.blogspot.com)

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3-5 Mapa esquemtico de 1833 da Bretanha Saxnica. (commons.wikimedia.org)

Veremos mais adiante que a discusso sobre as variaes entre pictrico e esquemtico aprofundada por Clive Richards, com seu conceito de metforas grficas. A identificao do tipo linguagem grfica no depende apenas das caractersticas formais da imagem, devendo ser avaliado o contexto do usurio e as circunstncias particulares de uso. Talvez seja mais esclarecedor questionar-se a funo das imagens pictricas. Twyman sugere livremente algumas funes, que podem vir a ocorrer simultaneamente.

3.2.2. Descrio e localizao espacialMuitas ilustraes tm por escopo descrever objetos ou fenmenos. Nesse caso, Twyman se refere aos infogrficos jornalsticos como mapas pictricos, e cita infogrficos onde a relao espacial determinada pela linguagem pictrica e esquemtica, como podemos ver no exemplo da fig. 3-5. Em uma representao tridimensional monocromtica, a descrio da direo de movimento do avio determinada por uma seta laranja, que se destaca pela cor, guiando a narrativa pelo olhar. importante frisarmos que descries espaciais em infogrficos costumam ser narrativas tambm. Para Twyman, infogrficos jornalsticos so bons exemplos de uma forma rica de se utilizar a linguagem pictrica.

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3-6 O acidente com o avio da TAM em So Paulo em 2007 (infografia24horas.blogspot.com)

3.2.3. NarraoO ditado toda imagem conta uma histria no totalmente correto, mas Twyman lembra que na histria das representaes visuais, ao menos no ocidente, percebemos uma difuso de imagens narrativas. As idias de Twyman sobre esse tpico so descritas mais detalhadamente no captulo 4.2.

3.2.4. PersuasoO autor afirma que as imagens utilizadas em publicidade so exemplos de imagens que tm a persuaso como objetivo principal, e traz uma ilustrao do sc. XV que tenta persuadir o leitor a morrer dignamente (fig. 3-6). O estudo da persuaso no design publicitrio foi marcado pelo trabalho de outro terico, Gui Bonsiepe (1999), que aborda a questo pela retrica visual. Bonsiepe, criticando a idia de neutralidade de informao, afirma que a informao sem retrica uma iluso (BONSIEPE, 1999:167-172). Logo, se toda a comunicao retrica, a persuaso parte inevitvel da transmisso de informao. Twyman parece concordar com essa afirmativa, mas sem deixar de valorizar constantemente a inteno do designer. No caso da publicidade, mesmo oferecendo informao, a inteno principal persuadir. J em se tratando da infografia (mesmo que no use esse termo) e da ilustrao cientfica, a inteno principal informar, mas nem por isso deixar de persuadir. Twyman lembra que as imagens pictricas tm uma variedade de funes secundrias, como proporcionar prazer e humor para os leitores, solucionar problemas, alm de oferecer uma

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oportunidade de expresso pessoal para os criadores (seja artista, designer ou ilustrador).

3-7 Tentao atravs da impacincia. Ilustrao de um livro tabular holands de 1465, Ars moriendi (TWYMAN, 1985:254)

O referido autor tambm dedica bastante ateno s escolhas de representao e estilo, e em como elas afetam o contedo informacional, tema que ser abordado no cap. 4.4. Twyman oferece, ainda, classificaes das imagens pictricas, das quais citaremos algumas relevantes:

3.2.5. Imagens sinpticasImagens sinpticas so aquelas que oferecem uma representao unificada do mundo ou de parte dele. So imagens que propem uma informao visual de um s golpe de vista, como no exemplo da fig. 3-7.

3-8 Jockeys na chuva por Edgar Degas (1886). Essa imagem sinptica que pode ser comparada a imagem composta de elementos distintos da fig. 3-8(commons.wikimedia.org)

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3.2.6. Imagens compostas de elementos distintos:So imagens que no se comunicam de forma contnua e unificada, mas so pontuadas por elementos, ou grupos de elementos distintos. o que se verifica na fig. 3-8, que mostra as experincias com fotografias sequenciais de Eward Muybridge, composta por diversas imagens discretas. Rapidamente fica evidenciado que essa a mesma estratgia da linguagem seqencial das histrias em quadrinhos. Twyman considera que a escolha de elementos distintos exige mais do leitor, por mostrar uma variedade sutil de estilo de representao e escala de elementos, sem ter necessariamente uma seqncia clara de leitura.

3-9 Cavalo galopando fotografado por Edward Muybridge no final do sc. XIX. Uma srie de imagens discretas que podem ser comparadas a fig. 3-7 (commons.wikimedia.org)

Mais uma vez, Twyman cita infogrficos jornalsticos como exemplos ideais de utilizao da linguagem pictrica, mostrando que infogrficos costumam ser compostos por imagens discretas que podem guiar a estratgia de olhar do leitor, ou deix-lo livre para fazer sua prpria seqncia de leitura. Isso j introduz as questes essenciais, na tese de Twyman, sobre estratgia de leitura e configurao de elementos distintos, que abordaremos com mais detalhes no cap. 4.3. Um infogrfico que exemplarmente composto por imagens discretas pode ser visto na fig. 3-9.

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3-10- Infogrfico da Revista Mundo Estranho (2008) (infograthinking.blogspot.com)

Para Twyman, imagens compostas por elementos distintos tendem a ser mais eficientes, como argumento visual, do que imagens sinpticas. No de se estranhar que praticamente todos os infogrficos apresentados nessa dissertao so compostos por diversas imagens discretas. No exemplo da fig. 3-9, vemos que o infogrfico composto por diversos elementos distintos, com grande variao de estilos grficos, misturando objetos tridimensionais fotografados com representaes esquemticas bidimensionais, seguindo uma estrutura de leitura no-linear. Alm disso, para diferenciar os tipos de informao, o infografista se utilizou de variao de cores e opes tipogrficas.

3.2.7. CredibilidadeTwyman parece demonstrar preocupao em identificar quais os recursos que ajudariam a dar mais preciso e credibilidade aos argumentos pictricos e esquemticos. Podemos concluir, pelos argumentos de Twyman, que a infografia faz um detalhamento do argumento visual, atravs de vrios elementos distintos, oferecendo uma variedade de nveis de informao (pictrica, esquemtica e verbal). Isso oferece infografia maior possibilidade de preciso e esclarecimento em comparao a uma ilustrao tradicional, que uma imagem sinptica composta por menos elementos, e que oferece menor possibilidade de integrao com a linguagem escrita e variao de informao. Twyman reconhece em sua obra que a potencializao da linguagem grfica depende, ainda, de

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fatores tecnolgicos. Para ilustrar isso, o autor cita Ivins (1969), que argumenta que a ausncia de recursos tecnolgicos para a reproduo de imagens pictricas, na Antiguidade, pode ter sido uma importante causa do lento desenvolvimento cientfico da poca. Isso se justificaria pelo fato de que a produo de diagramas e ilustraes pictricas essencial para o desenvolvimento e transmisso do conhecimento cientfico. Parte-se do pressuposto de que muito desse conhecimento pictrico ou esquemtico por natureza, e no se satisfaz apenas com a representao falada ou escrita. Assim, sem a reproduo adequada desses argumentos cientficos pictricos, no seria possvel se transmitir e, conseqentemente, se preservar certos tipos de conhecimento cientfico. Ivins utiliza como uma prova de sua tese uma citao de Plnio, o velho (23-79 A.C.), o naturalista mais importante da Antiguidade, que afirma que as ilustraes so propensas ao engano, pois a diversidade de copistas, com graus diferenciados de habilidade para o desenho, aumenta consideravelmente o risco de se perder a semelhana com os originais, levando Plnio a concluir que os autores deveriam se limitar a uma descrio verbal escrita da natureza.

3-11 - Ilustrao do manuscrito De Materia Medica de Dioscurides (cerca de 625) (commons.wikimedia.org)

3-12 - Xilogravura de Albrecht Meyer, De Historia stirpium (1542) (http://sciweb.nybg.org/)

Na fig. 3-10 podemos ver um exemplo do tipo de problema mencionado por Plnio, sobre a

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impreciso na representao pictrica atravs de copistas. J na xilogravura da fig. 3-11, podemos constatar que, com advento da imprensa, o ilustrador botnico pde oferecer uma identificao mais precisa das plantas atravs da riqueza e preciso de detalhes na representao. Como se pode verificar, nem toda informao pode ser traduzida de forma adequada verbalmente.

3.2.8. Contexto cultural e usurioTwyman lembra que o contexto cultural o fator determinante na compreenso visual. A concepo popular de que imagens pictricas so mais eficientes por serem supostamente compreendidas universalmente facilmente refutada quando observamos as convenes pictricas atravs de diferentes culturas. Em uma experincia com grupos de estudo do Sul da frica, Hudson (1960) constatou que certas convenes pictricas, comuns a ocidentais, no eram reconhecidas pelo grupo africano. Sugestes retricas visuais de profundidade, atravs de convenes de perspectiva, como mudanas de escala e linhas convergentes em uma rua (fig. 3-12), no faziam parte do repertrio de cultura visual dos grupos testados. Apenas a proximidade dos elementos no plano pictrico ajudava na interpretao das imagens para eles (TWYMAN, 1985:300). Segundo Twyman, em se tratando de contexto cultural, deve-se considerar variveis relacionadas aos usurios, contedo informacional e configurao. Veremos a seguir, na pesquisa de Goldsmith (1980), como o contexto cultural uma chave essencial para compreender a linguagem visual.

3-13 As ilustraes usadas por Hudson respondiam s representaes de profundidade em perspectiva (HUDSON apud TWYMAN,1985-301)

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Questes como a citada por Hudson ainda surpreendem, pois problemas de educao visual so negligenciados na educao em geral e na academia. Adultos s costumam se envolver na criao de imagens pictricas (excluindo a fotografia) quando se dedicam a reas especializadas onde essa habilidade necessria, como design, engenharia, botnica, geografia, etc. Alm disso, Twyman critica o fato de se considerar as habilidades de se criar e de ler imagens pictricas, como atividades anlogas. Como vimos, a forma como se interpreta imagens grficas depende do seu contexto cultural. Essa falta de envolvimento com a mecnica do mundo imagtico muito problemtica, seja pela falta de desenvolvimento de percepo cultural ou pelo descaso pela habilidade e conhecimento prtico de criao imagtica. Para Twyman, juntamente tradio de desvalorizao lingstica do pictrico, os fatores citados contribuem para a dificuldade em se admitir que linguagem grfica como um todo possa ser uma forma vlida de conhecimento.

3.3.

Evelyn Goldsmith e a anlise pictrica

Evelyn Goldsmith (1980) formulou um importante modelo de anlise de ilustrao em uma poca em que, segundo ela, muitos consideravam que a proposta de uma anlise pictrica no era sequer possvel ou desejvel (GOLDSMITH, 1980:1). Em sua pesquisa, procura demonstrar como a linguagem pictrica pode deixar de comunicar a mensagem intencionada. Seu modelo adota a terminologia da teoria de Charles Morris (1938), que analisa a linguagem em trs nveis semiticos: o sinttico, semntico e pragmtico. O sinttico seria o nvel em que no h identificao da imagem. Os outros dois nveis tratam do contedo e significado de um signo, no caso, um signo pictrico. O semntico trata da identificao literal do signo e o pragmtico implica na interpretao do observador, sendo considerados os aspectos culturais, entre outros similares (GOLDSMITH, 1982:124). O modelo de anlise pictrica de Goldsmith formado a partir de quatro fatores, que se desdobram nos trs nveis semiticos:

3.3.1. UnidadePara Goldsmith, coeso um fator essencial na compreenso de uma imagem. A coeso, ento, seria o fato de que qualquer rea de uma imagem poder ser percebida como tendo uma identidade particular, mesmo que essa identidade no seja compreensvel pelo observador. Podemos dizer que, atravs da coeso visual, somos capazes de identificar e diferenciar elementos da realidade.

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Quadro do fator unidade do modelo analtico de Evelyn Goldsmith (1984)

Nveis Fator Sinttico O reconhecimento de uma imagem determinado pelas prprias marcas pictricas, ou seja, pela escolha de tratamento da imagem. Semntico O reconhecimento de uma imagem determinado pela clareza das suas caractersticas principais. Pragmtico O contexto cultural essencial para o reconhecimento de uma imagem.

Unidade

No exemplo de unidade sinttica (fig.3-14), podemos perceber que a imagem esquerda uma fotografia sem meio-tom, que a torna quase abstrata, enquanto que a imagem direita preserva as retculas da fotografia, oferecendo informao figurativa mais reconhecvel. Embora as duas imagens sejam sintaticamente diferentes, apenas quatro dos trinta e oito entrevistados por Goldsmith no foram capazes de identificar que a primeira imagem era um rosto humano (GOLDSMITH, 1980:207). Podemos concluir que, embora a imagem da esquerda seja mais indefinida, pela escolha do tratamento grfico, ela sintaticamente coesa o suficiente para ser reconhecvel pela maioria das pessoas.

3-14- Unidade sinttica. (GOLDSMITH, 1984:127)

Na fig. 3-15, a unidade semntica no se d pela representao detalhada de uma determinada imagem pictrica, pois as fotografias dos dois elementos possuem pouca definio. Apenas a imagem da banana, cuja caracterizao geral coesa, claramente identificvel. A primeira imagem (uma maa) sugere apenas uma forma circular, podendo tambm ser um pssego ou laranja, embora uma pessoa entrevistada por Goldsmith chegasse a sugerir que seria uma ervilha (GOLDSMITH, 1980:207).

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3-15 - Unidade semntica. (GOLDSMITH, 1984:128)

No caso da unidade pragmtica da fig. 3-16, percebemos que a compreenso da cena descrita se d pelo conhecimento prvio da histria do jardim do den. Logo, a compreenso dessa imagem no se limita identificao semntica das figuras representadas, requerendo compreenso do contexto cultural implcito.

3-16 - Unidade pragmtica. (GOLDSMITH, 1984:129)

3.3.2. LocaoTrata-se de fator que aborda a relao espacial entre os elementos, envolvendo profundidade, sobreposio, distncias relativas e diferentes formas de gradientes de tamanho, clareza, textura, etc.Quadro do fator locao do modelo analtico de Evelyn Goldsmith (1984)

Nveis Fator Sinttico No nvel sinttico, o observador percebe a locao do objeto independentemente do reconhecimento do objeto. Semntico A compreenso de tamanho, posio e profundidade pode ser determinada pelo reconhecimento do objeto. Pragmtico A compreenso do contexto cultural pode determinar a compreenso de tamanho, posio e profundidade de um objeto.

Locao

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No exemplo acima, de locao sinttica (fig. 3-17), a percepo de profundidade dos objetos determinada pela sintaxe, ou seja, pelo tratamento formal da imagem. Ao remover a textura de fundo, bolas de natal deixam de parecer estarem todas no mesmo plano.

3-17 - Locao sinttica. (GOLDSMITH, 1984:130)

No caso fig. 3-18, um exemplo de locao semntica, podemos perceber que, quando cada um dos elementos facilmente reconhecvel pelo observador, e todos esto no mesmo plano, a proporo de escala entre eles pode ser relativizada. O fato de o gato parecer quase to grande quanto o elefante no afeta a compreenso da imagem. Contudo, pode ocorrer confuso se um dos elementos no representado de forma que no ocorra uma compreenso imediata. No topo da fig. 3-18, todos foram alinhados (esto no mesmo plano) e seus tamanhos so claramente reconhecveis. No entanto, o primeiro elemento no foi claramente representado, podendo ser confundido com uma caixa grande, j que est proporcionalmente alinhado um animal grande, o elefante. Na parte inferior da fig. 3-18, um selo adicionado ao primeiro elemento da fileira inferior, e essa pista visual modifica a informao semntica da imagem, sendo possvel reconhec-la como uma carta. Uma vez que a carta reconhecida corretamente, sua relao de escala relativizada em relao ao elefante.

3-18 - Locao semntica. (GOLDSMITH, 1984:131)

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Na fig. 3-19, a locao pragmtica se d atravs de uma justaposio problemtica. Ambos os quadros possuem a mesma locao sinttica e semntica, ou seja, o mesmo tratamento grfico e todos os elementos esto presentes em ambos os quadros, basicamente nos mesmos lugares.

3-19 - Locao pragmtica. (GOLDSMITH, 1984:132)

No entanto, a primeira imagem sugere uma justaposio da xcara na mo da figura principal com os pincis ao fundo, possibilitando a interpretao problemtica de que os pincis estariam dentro da xcara, quando na realidade esto atrs da figura. O mesmo no ocorre na segunda imagem. A extenso em que uma justaposio indesejada interfere no valor informacional da imagem pictrica depende de dois fatores: a experincia de leitura de imagens do observador e a aceitao da situao retratada (GOLDSMITH, 1980:209). Curiosamente, podemos notar mais um exemplo das possibilidades variadas nas interpretaes pragmticas na fig. 3-19. No segundo quadro, a figura principal se abaixa, no 52

havendo mudana significativa na ao, mas a justaposio da cabea da figura principal com os pincis, ao fundo, cria uma nova leitura, possivelmente cmica, para a imagem.

3.3.3. nfaseFator que se refere s relaes entre as imagens, em um sentido hierrquico, mais do que espacial. Trata-se, basicamente, de atrair e direcionar a ateno do observador, o que pode ser feito de forma sensorial ou intelectual (pelo significado do objeto retratado). Para se compreender a nfase sobre os elementos, importante se considerar o contexto da imagem.Quadro do fator nfase do modelo analtico de Evelyn Goldsmith (1984)

Nveis Fator Sinttico Semntico Pragmtico nfase que depende de hbitos culturais, como direo de leitura, significado de certas cores, etc.

nfase

nfase atravs de fatores que nfase atravs de elementos sugerem contraste como de atrao universal, como os forma, cor, tamanho, etc. olhos, direo do olhar, seres humanos, etc.

Como exemplo, na fig. 3-20, a nfase sinttica se d atravs do contraste entre os elementos representados. A imagem da esquerda no recebe qualquer ateno, enquanto que a figura da direita quebra o equilbrio de organizao sinttica em um dos elementos. Essa pequena variao no tem um sentido semntico definido, mas ela provoca um contraste que chama a ateno do olhar.

3-20 - nfase sinttica. (GOLDSMITH, 1982:133)

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3.3.4. Texto paraleloEsse fator se refere relao entre o texto e a imagem pictrica. Avalia-se quais elementos textuais podem ser representados pictoricamente de forma direta ou de forma indireta, e quais no podem ser representados.Quadro do fator de texto paralelo do modelo analtico de Evelyn Goldsmith (1984)

Nveis Fator Sinttico Fator determinado pela posio do texto e a imagem, guiando o olhar. Semntico Fator determinado por caractersticas significativas de um objeto e problemas de identificao. Pragmtico Uma contextualizao adequada pode ajudar nos casos dos conceitos difceis de serem ilustrados.

Texto Paralelo

No caso do nvel sinttico, um dos problemas principais no a identificao incorreta da imagem, mas a variedade de possveis palavras para identific-la. Em uma experincia com ingleses, se uma imagem de maa fosse apresentada, os observadores faziam a correlao com a palavra apple facilmente. Mas, no caso de uma imagem de um suter, os observadores sugeriam diferentes nomes: jumper, jersy, pullover, woolly e sweater (GOLDSMITH, 1980:212). Referente ao nvel pragmtico, Goldsmith sugere que alguns conceitos so muito difceis de serem ilustrados como, por exemplo, o conceito de esperana. Alega a autora, no entanto, que, se fornecido o contexto adequado, algumas dessas dificuldades podem ser superadas. Segundo Goldsmith, o conceito de resfriado no facilmente representado literalmente, mas se tentarmos representar graficamente o fenmeno pelo seu contexto, ou seja, os sintomas e o comportamento das pessoas resfriadas, existem chances de se encontrar uma soluo pictrica. No entanto, nesses casos, a linguagem denotativa (literal) no abarca as sutilezas do contexto cultural, sendo necessria uma abordagem mais conotativa, o que exige do ilustrador a capacidade de perceber pistas contextuais nos textos que vem a ilustrar. Outra forma de solucionar o problema acrescentar um texto escrito contextualizando a imagem, o que pode tornar o conceito original menos ambguo. Para Goldsmith, a ateno a esses fatores pragmticos o que torna a correlao entre texto e imagem pictrica possvel. Embora o modelo de Goldsmith tenha sido criado especificamente para ilustraes editoriais, ele se mostra muito til na anlise de aspectos pictricos de infogrficos jornalsticos, oferecendo um vocabulrio de anlise semitica simples e perspicaz, que pode ainda ser ampliado pelas variveis sintticas de Clive Ashwin, que veremos em seguida. No entanto, curioso que o sistema de Goldsmith, construdo em cima da teoria semitica 54

de Morris, que foi criada visando a linguagem verbal, se revele to perceptivo s questes de design grfico. Sem dvida, a experincia de Goldsmith no estudo da ilustrao e sua compreenso de linguagem visual so a razo principal disso. Mas talvez o fato dela ter desenvolvido sua teoria sobe uma viso semitica menos taxonmica, tambm seja um fator decisivo. Ou seja, os trs nveis semiticos de Morris so simples em sua aplicao, e ao mesmo tempo se revelam ferramentas teis na compreenso da comunicao visual.

3.3.5. Anlise do cartum de Charles AddamsO uso dos nveis semiticos pode ser exemplificado brevemente em um exemplo, oferecido por Goldsmith, a partir de um cartum de Charles Addams, famoso cartunista criador da Famlia Addams, ver figura 3-21.

3-21 - Cartum de Charles Addams sobre unicrnios, publicado originalmente na The New Yorker (1956) (charlesaddams.com)

Neste cartum, dois unicrnios esto debaixo de chuva, em uma pequena ilha, observando desamparadamente a arca navegando em direo ao horizonte. Goldsmith sugere que esse desenho facilmente interpretado no nvel sinttico, contudo, em um nvel semntico, uma criana poderia no ser capaz de identificar a arca, vendo-a apenas como um barco. Isso se deve ao nvel pragmtico, pois se o leitor no conhece o conto bblico da arca de No, e o fato de unicrnios serem criaturas mitolgicas (sua raridade est expressa no cartum), no ser capaz de reconhecer os personagens do cartum. O conhecimento prvio do contexto cultural (pragmtico) essencial no reconhecimento pictrico (semntico). importante percebemos que, enquanto muitos autores se voltam s questes de sinttica ou

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semntica da linguagem grfica, Goldsmith parece nos indicar que o princpio da compreenso visual est na relao com o leitor, ou seja, no seu contexto cultural. Portanto, parte essencial de um projeto de uma ilustrao (ou de qualquer projeto grfico) a capacidade de prever, ou melhor, compreender o seu leitor previamente. Essa breve anlise de um cartum parece sugerir que no apenas pela taxonomia tradicional de elementos grficos, mas atravs da anlise das relaes pragmticas, que se pode chegar a uma compreenso da linguagem grfica.

3.4.

Clive Ashwin e o estilo

Clive Ashwin (1982) considera que o conceito de estilo, especialmente na teoria das artes plsticas, relacionado apenas a caractersticas de determinados artistas e movimentos artsticos. Para Ashwin, essa abordagem no bastante para tratar da questo do estilo de forma satisfatria. Em se referindo famosa pintura de Jacques-Luis David (1794), Marat Assassin, Ashwin prope: Ns reconhecemos que essas formas contrastantes de se lidar com a figura humana so partes inerentes aos estilos Neoclssicos e Romnticos, mas, no entanto, so caractersticas essencialmente semnticas: pois no possvel se ler uma figura, em plano pictrico (...) sem antes l-la como uma figura (ASHWIN, 1979:56). Para reforar esse ponto, Ashwin cita Ivins (1969:61), que afirma que mudanas na sintaxe grfica, ou seja, no desenho, resultam em mudanas no significado de uma imagem, concluindo, ento, que uma anlise de estilo deve considerar a forma grfica tambm como um contedo semntico. Portanto, em sua abordagem mais ampla das caractersticas estilsticas de ilustraes, Ashwin (1979:51-67) sugere sete variveis: consistncia, gama, enquadramento, posicionamento, proximidade, cintica e naturalismo. Variveis de Ashwin: o Consistncia (homogeneidade/ heterogeneidade) Avalia-se se a sintaxe da representao sugere homogeneidade ou heterogeneidade. Um desenho de linha constante, por exemplo, pode ser considerado homogneo, enquanto que uma composio com uma variedade de tcnicas pode ser heterogneo. Muitos trabalhos podem no ser caracteristicamente homogneos ou heterogneos, nesses

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casos a consistncia no uma varivel relevante. importante salientar que em muitos infogrficos h uma tendncia heterogeneidade, uma vez que h uma mistura de texto e imagem pictrica. Alm disso, h casos em que diferentes tratamentos grficos so combinados, como fotografias juntamente com mapas, figuras descritivas desenhadas, etc.

3-22 Ilustrao de Michel Canetti (2000). Exemplo de um desenho com um trao de consistncia homognea(michelcanetti.com)

o Gama (contrada/expandida) Avalia-se se a sintaxe da representao sugere contrao ou expanso. Como explica Ashwin, o estilo de desenho do cubismo analtico pode ser considerado altamente contrado, pois manifesta uma gama restrita de variaes no desenho, representando um tipo de soluo pictrica que trabalha a sntese da forma. Por outro lado, uma ilustrao que procurar representar informao copiosa e detalhada pode precisar de um desenho sinteticamente detalhado, com bastante variao de luz e sombra. Uma sintaxe mais naturalista, como esta, uma opo por uma gama estendida. No caso dos infogrficos, a heterogeneidade pode levar a coexistncia de elementos com gama contrada e expandida. o Enquadramento (disjuntivo/conjuntivo) O enquadramento conjuntivo situa os elementos principais da ilustrao dentro de um ambiente, sugerindo um determinado contexto. Uma figura com um fundo branco, por exemplo, sugere uma disjuno entre a figura principal e um ambiente, focando na figura principal. Em alguns casos, a falta de ambiente no desenho (disjuno) pode ajudar ilustrao se integrar mais diagramao.

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o Posicionamento (simtrico/casual) O posicionamento, ou arrumao, dos elementos pictricos principais pode sugerir ordem simtrica ou casualidade. o Proximidade (perto/distante) Uma relao de escala dos elementos pictricos principais pode sugerir proximidade ou distncia. o Cintica (esttica/dinmica) Essa uma varivel que analisa a representao grfica dentro de um contexto de tempo-espao. Embora a representao grfica seja esttica, possvel sugerir movimento (dinmico) pictrico de diversas maneiras. o Naturalismo (naturalismo/no naturalismo) Varivel que situa os elementos pictricos dentro de uma concepo da relao fsica com o mundo em que vivemos. Questes de naturalismo consideram elementos figurativos como correo anatmica ou relaes espaciais de perspectiva. Certas ilustraes refletem a opo por uma representao no naturalista para conseguir efeitos retricos. As variveis propostas por Ashwin so teis na compreenso da questo de forma e contedo de uma imagem pictrica, e representam uma crtica necessria s anlises artsticas baseada essencialmente em movimentos artsticos. Alm disso, essas variveis so muito teis se integradas com o sistema de anlise de ilustraes proposto por Evelyn Goldsmith, como foi sugerido pela prpria autora (GOLDSMITH, 1980:213). Contudo, a questo pragmtica, ou seja, o contexto cultural e histrico, parece ser excessivamente desvalorizado na proposta de Ashwin. O conceito de estilo na viso tradicional da teoria das artes plsticas, no entanto, est diretamente relacionado a um contexto histrico. Por isso, como veremos no cap. 4.4, optamos por trabalhar o conceito de estilo tentando identificar tradies de estilo pictrico, mesmo que essa abordagem se utilize de mtodos que sejam de alguma forma semelhantes tradio terica das artes plsticas. A pesquisa sobre a linguagem infogrfica de Ashwin parece ter mais a oferecer como um aprofundamento da anlise sinttica da imagem pictrica, do que como uma anlise dentro de um rtulo de estilo, como o autor props.

3.5.

Clive Richards e os diagramas

Clive Richards prope uma abordagem terica para a anlise de diagramas em geral. Como definimos que a infografia seria praticamente um tipo de diagrama, a abordagem de Richards

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se mostra especialmente relevante. Alm disso, podemos perceber semelhanas conceituais entre as definies de infografia e diagrama, j que Richards (2000:93) considera que os diagramas esto no meio do caminho entre textos escritos e o puramente pictrico. O conceito mais interessante para o presente estudo, em sua abordagem, o da metfora grfica. Para Richards (2000:93), o diagrama est inserido dentro de um contexto maior, o da linguagem pictrica. Para o autor, o que distingue o diagrama de outras formas pictricas a capacidade de representar relaes. Essas relaes podem ser espaciais e no-espaciais. Nas relaes espaciais, os diagramas podem ser mais ou menos literais, enquanto que nas noespaciais os diagramas oferecem um espao metafrico. Richards tambm esclarece que o grau de correspondncia dos elementos do diagrama quilo que pretendem representar pode ser determinado dentro de uma gradao entre literal e no-literal.

3-23 - Detalhe do mapa (topogrfico) do metr de Londres de 1908 (commons.wikimedia.org)

3-24 Detalhe da primeira edio do mapa (topolgico) do metr de Londres por Harry Beck, 1933(commons.wikimedia.org)

Para exemplificar esses conceitos de variaes espaciais e literalidade, podemos ver que na figura 3-23, um mapa de metr de Londres de 1908, a representao procura fidelidade s relaes espaciais da topografia de Londres. Contudo, na figura 3-24, podemos ver a proposta radical de Harry Beck para o mapa de metr de Londres, onde as relaes so topolgicas, e no literais. Beck, que era engenheiro de formao, procurou uma soluo grfica semelhante aos diagramas esquemticos de circuitos eltricos, que no utilizam 59

relaes espaais literais. No mapa de Beck, as distncias entre as estaes no correspondem proporcionalmente s distncias topogrficas de Londres. Beck procurou uma representao das distncias de forma que a informao ficasse mais clara para o usurio do metr, mostrando uma seqncia clara entre estaes. Essa relao no-espacial um tipo de metfora grfica. Outra variao fundamental na representao grfica de um diagrama entre a descrio figurativa e a no-figurativa. O exemplo dado por Richards (2000:95) para demonstrar essa variao o da fig. 3-25, onde podemos observar que ambos os diagramas utilizam a metfora da ramificao para mostrar relaes lingsticas. A esquematizao das duas rvores , no entanto, diferente, pois a rvore a rica em detalhes figurativos, como folhas e galhos, enquanto que a rvore b menos figurativa.

3-25 rvores esquemticas (Richards, 2000:95)

Podemos sintetizar essa variao de descrio em trs categorias: Figurativo: imagem pictrica figurativa, que tende a um algum tipo de realismo. Semi-figurativo: imagem esquemtica. No-figurativo: forma abstrata. Podemos observar, tambm, que o sistema pictogrfico ISOTYPE, desenhando por Gerd Arnz para Otto Neurath, prope metforas grficas em que representaes de seres humanos so reduzidas a formas sintticas, objetivando serem as mais esquemticas (semi-figurativas) possveis e ainda preservar caractersticas figurativas.

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3-26 Seleo de pictogramas ISOTYPE criados Gerd Arnz. (gerdarntz.org/isotype/people)

Embora atualmente se disponha de diversos recursos grficos prticos, os pictogramas, inspirados no trabalho do ISOTYPE, continuam sendo mais eficientes do que fotografias ou renderizaes em 3D, quando aplicados sinalizao sanitria. Uma representao figurativa que prope fidelidade objetiva levanta o problema da especificidade de representao, ao contrrio da representao menos figurativa dos pictogramas que sugerem pessoas em geral (ver cap. 4.5.2). Richards salienta que, muitas vezes, uma elaborao visual excessiva pode empobrecer o contedo informacional ao invs de enriquec-lo (Richards, 2000:100).

3-27 Modelo taxonmico para diagramas (Richards, 2000:97)

A partir destas variveis de representao de diagramas, Richards props um modelo taxonmico. Observando a figura 3-27, verifica-se que o movimento vertical desse modelo

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mostra a extenso do uso de metfora grfica, ou seja, a variao do literal para o no-literal. O movimento horizontal, vindo do eixo central do modelo, representa o movimento do figurativo para o no-figurativo, indicando a extenso de esquematizao grfica. Finalmente, na periferia do modelo, Richards prope trs modos fundamentais de organizao grfica, mais evidentes em diagramas no-literais e no-figurativos, que so organizao em agrupamento, ligao ou variao: Agrupamento: ocorre quando elementos grficos parecem pertencer a um mesmo grupo. Ex. apresentao de elementos que possuem uma mesma cor, forma ou limitao grfica. Ligao: se verifica quando elementos grficos sugerem conectividade. Ex. atravs de linhas conectivas. Variao: verificvel quando os elementos sugerem gradao de valor. Ex. atravs de variaes de tamanho, distncia ou intensidades de cor. A partir do modelo proposto, possvel se fazer uma tipificao de diagramas em geral. Um diagrama de Venn, que um exemplo de esquematizao no-liter