ANÁLISE DA RESPOSTA ACÚSTICA EM SEDIMENTOS...

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA AMBIENTAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA AMBIENTAL PEDRO SMITH MENANDRO ANÁLISE DA RESPOSTA ACÚSTICA EM SEDIMENTOS MARINHOS ARACRUZ 2014

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA AMBIENTAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA AMBIENTAL

PEDRO SMITH MENANDRO

ANÁLISE DA RESPOSTA ACÚSTICA EM SEDIMENTOS

MARINHOS

ARACRUZ

2014

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PEDRO SMITH MENANDRO

ANÁLISE DA RESPOSTA ACÚSTICA EM SEDIMENTOS

MARINHOS

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Oceanografia Ambiental

da Universidade Federal do Espírito Santo,

como requisito parcial para obtenção do

título de Mestre em Oceanografia Ambiental.

Orientador: Prof. Dr. Alex Cardoso Bastos.

ARACRUZ

2014

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PEDRO SMITH MENANDRO

ANÁLISE DA RESPOSTA ACÚSTICA EM SEDIMENTOS

MARINHOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Oceanografia Ambiental da

Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do título de

Mestre em Oceanografia Ambiental.

COMISÃO EXAMINADORA

______________________________________________

Prof. Dr. Alex Cardoso Bastos – Orientador

Universidade Federal do Espírito Santo / UFES

______________________________________________

Prof. Dr. Renato David Ghisolfi – Examinador Interno

Universidade Federal do Espírito Santo/ UFES

______________________________________________

Prof. Dr. Arthur Ayres Neto – Examinador Externo

Universidade Federal Fluminense - UFF

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Dedico este trabalho à minha família,

em especial aos meus pais, Paulo e Cristina.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

(CAPES) pela bolsa de mestrado.

Ao Programa de Pós-Graduação em Oceanografia Ambiental da Universidade

Federal do Espírito Santo (UFES) pela oportunidade de cursar o mestrado.

Ao meu orientador Alex Bastos, pelas orientações e ensinamentos sempre

interessantes, pelas oportunidades, e pela confiança durante o desenvolvimento do

trabalho.

À Valéria, pelas orientações no trabalho e por estar sempre pronta para passar seus

conhecimentos, tanto profissionais como pessoais.

À professora Susana Vinzón, pela oportunidade de participar da coleta de dados do

projeto Navigation aids for the North Channel of Amazon Rio: Geo-Acoustic

Characterization of the sediment dynamics (CANALNORTE/GEOACUSTICA), financiado

pela Capes. À equipe do Laboratório de Dinâmica de Sedimentos Coesivos (LDSC -

UFRJ) pela organização da campanha de levantamento de dados, e tratamento dos

dados sedimentológicos.

Aos professores participantes da banca, Renato Ghisolfi e Arthur Ayres, pela

disponibilidade e pelo aceite em fazer parte da banca.

A todos os integrantes do Labogeo, sempre companheiros, ajudando uns aos outros

e enriquecendo o cotidiano acadêmico do grupo.

Aos funcionários da Base Oceanográfica, sempre solícitos e agradáveis de conviver

e trabalhar.

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A todos os meus amigos, que não me ajudaram em nada, mas de alguma forma

tornam a vida mais fácil.

À minha família que sempre me incentiva cada passo que sigo. Minhas irmãs,

Helena e Luísa, que exigiram seus nomes aqui presentes. E a meus pais, exemplos de

vida para mim, e possibilitarem tudo o que acontece comigo.

À Tarcila, pela perfeita companhia, amor e todo incentivo de sempre.

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“O rio não quer chegar, mas ficar largo e profundo.”

Guimarães Rosa

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RESUMO

A geoacústica submarina auxilia no entendimento do comportamento da propagação

e atenuação do som no sedimento, dando uma base de informações que dá suporte às

principais abordagens para interpretação de dados. A detecção de depósito lamoso em

registros acústicos de alta resolução é, geralmente, de fácil distinção, aparecendo

normalmente como pacotes sedimentares de baixa reflexão. No entanto, essa resposta

acústica depende da frequência utilizada e de outras características do depósito, até

mesmo da coluna d’água. A dinâmica desses pacotes lamosos pode ter desdobramentos

em várias esferas, desde engenharia, como a questão de monitoramento de portos, até a

biologia, com estudos de impacto na biota bentônica. A partir daí é necessário um

desenvolvimento de um método rápido e eficiente para mapeamento desses pacotes e

para o conhecimento dos processos envolvidos no transporte, deposição e ressuspensão.

Assim, esse trabalho tem dois enfoques principais divididos em dois estudos

independentes: investigar como a resposta do sinal acústico de diferentes fontes muda de

acordo com a frequência e as características do sedimento superficial (granulometria e

densidade), e associar variações observadas nos registros acústicos com a mobilidade

sedimentar ao longo de um ciclo de maré. A base de dados analisada é composta por

registros geofísicos de alta frequência (3.5, 33, 210 kHz), propriedades físicas do

sedimento superficial, densimetria in situ, correntometria e distribuição de material

particulado em suspensão, os quais foram coletados na Plataforma Interna do Canal

Norte do Rio Amazonas.

A primeira parte dos resultados apontou que metodologias distintas sondando a

mesma área podem fornecer resultados completamente diferentes. Nas análises feitas, a

frequência e a densidade foram importantes propriedades para entender as relações entre

sedimento superficial e atributos acústicos.

Já o segundo capítulo, com enfoque que avaliou dinâmica sedimentar através de

sistemas acústicos, mostrou que as alterações nos processos de transporte de sedimento

foram reconhecidas pelo ADCP e pelo OBS, permitindo distinguir os registros acústicos

do ecobatímetro e interpretar processos de dinâmica sedimentar.

.

Palavras-chaves: geoacústica; lama fluida; dinâmica sedimentar; Rio Amazonas.

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ABSTRACT

Submarine geoacoustics helps in understanding the behavior of propagation and

attenuation of sound in sediment, providing an information set which assists the major data

interpretation approaches. The detection of muddy deposit through high resolution

acoustic records is generally easy, usually appearing as free reflection layers. However,

this acoustic response depends on the frequency used and other characteristics of the

deposit, even of the water column. The dynamics of these muddy layers may have

influence in many areas, from engineering and harbor maintenance, to biology and studies

of impact on benthic biota. The development of a rapid and efficient mapping method for

these deposits seems to be a demand for knowledge advance of the processes involved in

the transport, deposition and suspension.

Thus, this study has two main approaches divided into two independent studies: i)

investigate how the acoustic signal response from different sources changes with the

frequency and sediment physical properties (grain size and density), and ii) associate

variations observed in the acoustic records with sediment mobility over a tidal cycle. The

dataset consists of high-frequency geophysical records ( 3.5, 33 and 210 kHz ) , sediment

physical properties, in situ density , hydrodynamics and distribution of suspended

particulate matter, which were collected at the North Channel of Amazon River .

The first chapter showed that different survey methods at the same area can provide

different results. Furthermore, the frequency and density were important properties to

understand the relationship between surface sediment and acoustic features.

The second chapter was an attempt to evaluate sediment dynamics through acoustic

system, and showed that the changes in the processes of sediment transport were

recognized by the ADCP and OBS allowing to distinguish the acoustic echo sounder

records and to interpret sedimentary dynamic processes.

Key-words: geoacoustic; fluid mud; sedimentary dynamics; Amazon River.

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LISTA DE TABELA

Tabela 1: Análise física das amostras de sedimento superficial....................................... 46

Tabela 2: Apresentação dos dados geofísicos (ecogramas e registros do perfilador de

subfundo) por estação.....................................................................................................51

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LISTA DE FIGURA

Figura 1: Mapa da área de estudo com as estações de coleta de dados. (Carta

Náutica 200, Marinha do Brasil). ........................................... Erro! Indicador não definido.

Figura 2: Gráfico situando os momentos de coleta de dados na curva de maré. ...... 22

Figura 3: Gráfico indicando os valores do coeficiente de reflexão e de amplitude para

cada estação. .................................................................................................................... 26

Figura 4: Análise de componentes principais.. .......................................................... 31

Figura 5: À esquerda, análise de cluster considerando os dados de densidade

calculada; à direita, considerando os dados de densidade in situ.. ..................................32

Figura 6: Gráfico apresentando as penetrações dos pulsos de 3.5 kHz, 33 kHz

(considerando o fundo como sendo o detectado pela frequência de 210 kHz) e a

espessura da camada de lama fluida aferida pelo densímetro. ......................................... 34

Figura 7: Diferentes profundidades medidas por diferentes métodos nas estações

onde foi identificada a presença de lama fluida: profundidades acústicas (3.5 kHz e 210

kHz), profundidade do topo da camada de lama fluida que o densímetro identificou, e

profundidade na qual a concentração máxima de material em suspensão foi detectada

(sendo 6,5 g/L o limite máximo do equipamento utilizado). ............................................... 35

Figura 8: Registro do ecobatímetro que indicou a presença de haloclina na coluna

d’água acompanhado com o perfil de salinidade. .............................................................. 36

Figura 9: Na parte superior, o registro do ecobatímetro exemplificando nitidamente o

descolamento do eco. Na parte inferior esquerda o registro do Densitune; à direita, em

destaque as variações de densidade já no sedimento, indicando a presença de lama

fluida. ................................................................................................................................. 37

Figura 10: Estação fixa indicada pelo ponto preto na Plataforma Interna do Rio

Amazonas.. ........................................................................................................................ 43

Figura 11: Gráfico com os resultados hidrodinâmicos durante o ciclo de maré.. ...... 46

Figura 12: Gráfico da distribuição de material particulado em suspensão na coluna

d’água (unidades nefelométricas de turbidez –

NTU)...................................................................................................................................46

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Figura 13: Gráfico com as concentrações de material particulado em suspensão a

diferentes profundidades, juntamente com a curva de maré (m) e as tensões de

cisalhamento (N/m²)........................................................................................................... 47

Figura 14: Gráficos de backscatter do ADCP. A imagem superior indica o momento

de maior energia, próximo a 14h, enquanto a inferior indica momentos menos energéticos,

próximo a 18h (no canto esquerdo). ................................................................................. 48

Figura 15: Registros das medições do densímetro a esquerda; a direita registros

com destaque para a porção final do perfil em dois momentos (14h e 18h), mostrando a

ausência de um pacote espesso de lama fluida.. .............................................................. 49

Figura 16: Registros do perfilador de subfundo. O registro superior foi coletado às

14h, e o inferior às 18h.......................................................................................................50

Figura 17: Registros do ecobatímetro para dois momentos: a) às 14 horas, com

ruídos entre os horizontes detectados pelas diferentes frequências; b) às 18 horas, com

descolamento do eco mais nítido. ..................................................................................... 50

Figura 18: Esquema ilustrativo representando a interpretação da dinâmica

sedimentar a partir de ferramentas acústicas e

óticas...................................................................................................................................53

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SUMÁRIO

CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO .................................................................................................... 14

1.1 APRESENTAÇÃO ....................................................................................................... 15

1.2 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 16

CAPÍTULO 2 - RESPOSTA ACÚSTICA DE DIFERENTES FREQUÊNCIAS EM

DEPÓSITOS LAMOSOS – ESTUDO DE CASO NA PLATAFORMA ADJACENTE AO

CANAL NORTE DO RIO AMAZONAS ............................................................................................. 18

2.1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 18

2.2 METODOLOGIA .......................................................................................................... 20

2.3 RESULTADOS ............................................................................................................ 25

2.4 DISCUSSÃO ................................................................................................................ 33

2.5 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 37

2.6 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 38

CAPÍTULO 3 - INVESTIGAÇÃO DA DINÂMICA SEDIMENTAR EM FUNDOS

LAMOSOS A PARTIR DE FERRAMENTAS ACÚSTICAS ........................................................ 42

3.1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 42

3.2 METODOLOGIA .......................................................................................................... 43

3.3 RESULTADOS ............................................................................................................ 45

3.4 DISCUSSÃO ................................................................................................................ 51

3.5 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 53

3.6 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 54

CAPÍTULO 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 56

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Dissertação de Mestrado Introdução

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CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO

Embora a busca por hidrocarbonetos represente a maior aplicação do método

sísmico, o uso para estudos de alta resolução de geologia rasa vem apresentando

avanços técnicos nos últimos anos (Kearey et al, 2009), que contribuem para atividades

humanas tais como o planejamento obras civis, o manejo de recursos pesqueiros e a

definição e manutenção rotas de navegação. Além disso, a investigação indireta por

métodos geofísicos produz mais informação e em áreas maiores quando comparada a

métodos diretos como testemunhagens e amostragens. Souza (2006) fez uma revisão da

aplicabilidade dos métodos geofísicos em áreas rasas, mostrando diversas outras

aplicações, vantagens e desvantagens.

A geoacústica submarina auxilia no entendimento do comportamento da propagação

e atenuação do som no sedimento, dando uma base de informações que dá suporte as

principais abordagens para interpretação de dados. Nos métodos sísmicos convencionais,

por exemplo, parte-se do princípio que a fração da energia refletida do pulso é

determinada pelo contraste de impedância acústica entre duas camadas.

O estudo de ecocaráteres, por exemplo, inicialmente apareceu em investigações em

áreas profundas (Damuth, 1975); contudo, muitos estudos em regiões rasas utilizam

como método de caracterização a definição de ecocaráteres associada à distribuição

granulométrica do local (Quaresma et al, 2001; Belo et al, 2003; García-García et al,

2004; Catanzaro et al, 2004; Palomino et al., 2009), e em várias situações o caráter do

eco não responde satisfatoriamente à granulometria do sedimento superficial, estando

muitas vezes relacionado com a densidade do material e seu grau de compactação.

Com isso, o mapeamento de fundos marinhos em áreas de grande aporte e

acumulação de sedimentos finos, cria uma questão científica importante no que tange a

aplicabilidade de diferentes fontes acústicas. A segurança na navegabilidade em canais

portuários devido a presença de lama fluida, por exemplo, é um dos focos que vêm sendo

discutidos em trabalhos de identificação de lama fluida (Wurpts, 2005; Fontein, 2007).

Essa questão pode ser explicada pelo fato de que levantamentos batimétricos são

realizados operando com frequências em torno de 210 kHz, o que identifica profundidades

que eventualmente não representam a profundidade náutica, quando, por exemplo, parte

da lama fluida é contabilizada como fundo marinho, perdendo espessura de coluna d’água

para calado de embarcações (Mehta, 2013).

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Dissertação de Mestrado Introdução

15

Mehta (2013) destaca que as propriedades da lama fluida dependem de fatores

físico-químicos, biológicos e hidrodinâmicos, e os limites de delimitação variam também

devido a composição do sedimento, composição da água e o critério para reconhecimento

(densidade e concentração da suspensão). Já no campo de transporte sedimentar a lama

fluida representa uma importante contribuinte, pois mesmo que apareça em pequenas

espessuras, a concentração de sedimento suspenso é muito alta, o que acaba formando

significativa carga sedimentar (Mehta, 2013).

Assim, esse trabalho tem como proposta analisar como a resposta do sinal acústico

de diferentes fontes muda de acordo com a frequência e as características do sedimento

superficial (granulometria e densidade), buscando contribuir para o entendimento e

desenvolvimento da geoacústica submarina. O trabalho tem como metas: i) Analisar a

influência da granulometria e da densidade como variáveis determinantes na resposta

acústica; ii) Avaliar a penetração e a reflexão do sinal acústico de acordo com o tipo

sedimentar e a frequência do pulso; iii) Identificar e avaliar o transporte sedimentar a partir

de ferramentas geofísicas de alta resolução.

1.1 APRESENTAÇÃO

O trabalho tem como tema central de pesquisa a resposta acústica de fontes de alta

resolução em fundos lamosos. A área de estudo está na Plataforma Interna onde

desemboca o Canal Norte do Rio Amazonas, que vem sendo estudada sob diferentes

enfoques a partir do levantamento de dados que envolveu geofísica, hidrodinâmica e

sedimentologia no âmbito do Projeto “Navigation aids for the North Channel of Amazon

Rio: Geo-Acoustic Characterization of the sediment dynamics

(CANALNORTE/GEOACUSTICA)”.

A dissertação está dividida em quatro capítulos. Esse primeiro capítulo, além de

apresentar a dissertação, aborda o estado da arte da temática principal. O capítulo 2

aparece na forma de um artigo independente, analisando o sinal acústico conforme

algumas características do sedimento superficial. O capítulo 3 também está na forma de

um artigo independente, tentando avaliar como um sistema acústico pode ser usado para

estudos de mobilidade sedimentar. O capítulo quatro é composto pelas considerações

finais do trabalho.

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Dissertação de Mestrado Introdução

16

1.2 REFERÊNCIAS

Belo, W.C.; Dias, G.T.M. ; Dias, M.S. 2003. O fundo marinho da baía da Ilha Grande,

RJ: o relevo submarino e a sedimentação no canal central. Revista Brasileira de

Geofísica, v. 20, p. 5-15,

Catanzaro, L. F. ; Baptista Neto, J. A. ; Guimaraes, M. S. D. ; Silva, C.G. 2004.

Distinctive sedimentary processes in Guanabara Bay - SE/Brazil, based on the analysis of

echo-character (7.0 kHz). Revista Brasileira de Geofísica, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p.

69-83.

Damuth, J.E. 1975. Echo character of western equatorial Atlantic floor and its

relationship to the dispersal and the distribution of the terrigeneous sediments. Mar. Geol.

18:17–45.

Fontein, W.F; Byrd, R.W. 2007. The nautical depth approach, a review for

implementation. Wodcon XVIII Annual Dredging Seminar.

García-García, A.; García-Gil, S.; Vilas, F. 2004. Echo Characters and recent

sedimentary processes as indicated by high-resolution sub-bottom profiling in Ría de Vigo

(NW Spain). Geo-Mar Lett, v. 24, p. 32-45.

Kearey, P.; Brooks, M.; Hill, I. Geofísica de Exploração. Tradução: Maria Cristina

Moreira Coelho. São Paulo: Oficina de Textos. 2009

Mehta, A.J. 2013. An introduction to hydraulics of fine sediment transport

(Advanced series on ocean engineering) v. 38. World Scientific

Palomino, D.; Vazquez, J.T.; Del Río, V.D.; Fernández-Salas, L.M. 2009. Estudio de

los procesos sedimentários recientes de la Bahía de Palma a partir del análisis de la

morfología y la respuesta acústica (Islas Baleares, Mediterráneo Occidental). Revista de

la Sociedad Geológica de España. 22 (1-2)

Quaresma, V.S.; Dias, G.T.M.; Baptista Neto, J.A. 2001. Caracterização da

ocorrência de padrões de sonar de varredura lateral e sísmica de alta frequência (3,5 e

7,0 kHz) na porção sul da Baía de Guanabara – RJ. Revista Brasileira de Geofísica, 18(2):

201–214.

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Dissertação de Mestrado Introdução

17

Souza, L. A. P. 2006. Revisão crítica da aplicabilidade dos métodos geofísicos na

investigação de áreas submersas rasas. Tese (Doutorado em Oceanografia Química e

Geológica) – Programa de Pós-Graduação em Oceanografia Química e Geológica,

Instituto Oceanográfico, Universidade de São Paulo, São Paulo.

Wurpts, R. 2005. 15 Years Experience with Fluid Mud: Definition of the Nautical

Bottom with Rheological Parameters. Terra et Aqua. 99: 22-32.

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Dissertação de Mestrado Resposta Acústica

18

CAPÍTULO 2 - RESPOSTA ACÚSTICA DE DIFERENTES

FREQUÊNCIAS EM DEPÓSITOS LAMOSOS – ESTUDO DE

CASO NA PLATAFORMA ADJACENTE AO CANAL NORTE DO

RIO AMAZONAS

2.1 INTRODUÇÃO

O estudo detalhado do comportamento do sinal acústico nos sedimentos

marinhos é complexo, pois além de envolver várias propriedades físicas dos

sedimentos, pode também envolver diferentes fases como sedimento

inconsolidado, água e gases. Tentativas de desenvolver modelos matemáticos

para descrever o comportamento de ondas acústicas nos sedimentos vêm

sendo realizadas há décadas (Stoll, 1980), no entanto, sabe-se que a eficácia

para descrever de maneira unificada esse processo é difícil de ser alcançada,

haja vista as combinações quase ilimitadas de variáveis nos diferentes tipos

sedimentares. Assim, vários trabalhos vêm sendo realizados a fim de investigar

a inversão de parâmetros acústicos dos sedimentos em propriedades físicas e

interpretações geológicas (Hamilton & Bachman, 1982; Lambert, 1993;

Stevenson, 2002; Macedo et al., 2009; Ayres Neto et al., 2013), permitindo o

aprimoramento do mapeamento acústico do fundo marinho (Davis et al., 2002;

Kim et al, 2004).

À medida que as propriedades físicas e geotécnicas variam, varia

também a velocidade de propagação das ondas acústicas, definindo diferentes

impedâncias acústicas, permitindo assim a interpretação de um registro

geológico e o estudo das variáveis envolvidas na resposta do sinal acústico. A

interpretação de características observadas em registros acústicos de alta

resolução (como penetração, reflexão superficial e descolamento do eco) deve

considerar fundamentalmente a frequência do sinal acústico e as

características superficiais e subsuperficiais do depósito ou da suspensão (no

caso da lama fluida), mas também pode envolver a sensibilidade do sistema

utilizado, a atenuação do sinal proporcionada pelo depósito lamoso, entre

outros aspectos que dependerão do nível de detalhamento da investigação.

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Dissertação de Mestrado Resposta Acústica

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A detecção de depósito lamoso em registros acústicos de alta resolução

é, geralmente, de fácil distinção, aparecendo normalmente como pacotes

sedimentares de baixa reflexão (Souza, 2006; Quaresma et al, 2011; Godinho,

2012). No entanto, essa resposta acústica depende da frequência utilizada e de

outras características do depósito, até mesmo da coluna d’água. Já a lama

fluida, classificada por McAnally et al (2007) como uma suspensão aquosa de

sedimento fino altamente concentrada com densidade entre 1080 e 1200

kg/m³, geralmente não é detectada de forma evidente por métodos

convencionais da geofísica de alta resolução.

O estudo do comportamento desses depósitos lamosos e a determinação

de formas efetivas de detecção e monitoramento são muito importantes para

contribuir com o entendimento da dinâmica sedimentar. Na Plataforma

Amazônica, alguns trabalhos desenvolvidos como o Projeto AmasSeds (A

Multi-disciplinary Amazon Shelf SEDiment Study) concluíram que a

ressuspensão desses sedimentos é a principal fonte sedimentar para regiões

próximas à costa ao norte da desembocadura do Rio Amazonas, e ainda

oferece eventualmente fonte sedimentar para fluxos gravitacionais que levam

sedimentos para regiões mais profundas (Kuehl et al, 1996). Além disso, foi

feita uma estimativa de que 60% a 90% do aporte sedimentar em suspensão

proveniente do Rio Amazonas fica concentrado na camada de lama fluida

(Kineke et al, 1996), o que corrobora a importância da sua investigação.

A Plataforma Amazônica, área escolhida para esta investigação, é

considerada crítica para a navegação (Fernandes, 2010). Isso se dá, em parte,

pela amplitude de maré, pela presença de espessas camadas de lama fluida e

pela mobilidade de bancos de areia na Plataforma Interna. McAnally et al.

(2007) sugerem que a gestão dos problemas na navegação causados em

decorrência da deposição ou suspensão dos sedimentos finos está baseada

em três alternativas: i) controle da fonte desses sedimentos; ii) controle da

formação dos depósitos lamosos; e iii) remoção desses sedimentos. O controle

da formação dos depósitos é complicado, pois envolve uma série de fatores de

difícil domínio, como por exemplo reduzir o aporte sedimentar e controlar os

fatores que favorecem a floculação dos sedimentos finos (sal, materiais

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Dissertação de Mestrado Resposta Acústica

20

orgânicos e esgoto, entre outros). Já a remoção desses depósitos representa a

alternativa mais utilizada, embora muitas vezes não seja realizada de maneira

eficaz, gerando custos para manutenção de portos, além de ser uma alternativa

de alto impacto ambiental. Assim, a investigação do comportamento do sinal

acústico neste tipo de fundo e de suspensão é muito importante tanto para

questões em torno da determinação da profundidade náutica quanto no

aspecto científico, pois vem contribuir para as discussões em torno da

navegabilidade (Wurpts, 2005; Fontein & Byrd, 2007) e de formas eficazes de

detecção da lama fluida.

A partir do que foi apresentado, o objetivo desse capítulo é investigar as

diferentes respostas acústicas em função da frequência utilizada e dos

parâmetros físicos sedimentares (granulometria e densidade), utilizando dados

sedimentológicos, de batimetria de dupla frequência e de perfilador de

subfundo obtidos na Plataforma interna do Rio Amazonas.

2.2 METODOLOGIA

O estudo foi desenvolvido a partir de uma base de dados coletados na

Plataforma do Rio Amazonas, que reúne registros geofísicos de alta resolução

(ecobatimetria de dupla frequência – 33 e 210 kHz - e perfilagem de subfundo –

3.5 kHz), análise sedimentológica de amostras de sedimento superficial e

medidas de densidade in situ.

Os dados foram coletados no canal principal de navegação, entre 11 e 15

metros de profundidade, seguindo um transecto perpendicular a costa. A figura

1 mostra a distribuição das 12 estações, espaçadas a cada 10 km, próximas a

desembocadura do Canal Norte do Rio Amazonas (Fig. 1), totalizando 12

estações.

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21

Figura 1: Mapa da área de estudo com as estações de coleta de dados. (Carta Náutica

200, Marinha do Brasil)

A campanha de levantamento de dados foi realizada em junho de 2012

durante um período de maré de quadratura. A figura 2 mostra a curva de maré

com os momentos de coleta de dados em cada estação.

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22

Figura 2: Gráfico situando os momentos de coleta de dados na curva de maré.

Dados Geofísicos

Dados acústicos foram coletados usando três frequências distintas: 3.5

kHz, 33 kHz e 210 kHz. A primeira é de uma fonte sísmica de alta resolução

(perfilador de subfundo modelo Stratabox), e as outras duas foram operadas

com um ecobatímetro de dupla frequência (Syquest Bathy-500 DF). Os dados

foram adquiridos continuamente, contudo os registros que serão apresentados

representam um padrão de cada estação.

Os registros sísmicos foram visualizados digitalmente no software Kogeo,

o qual permitiu a extração de valores de amplitude do sinal refletido, enquanto

os dados da ecobatimetria de dupla frequência foram interpretados na forma

impressa.

A análise geoacústica foi baseada nos cálculos de coeficiente de reflexão

e de valores de atenuação do sinal acústico. Com a impedância acústica de

diferentes meios é possível calcular o coeficiente de reflexão de determinado

estrato sedimentar, que representará a quantidade de energia refletida em

função de vários parâmetros do sedimento.

(Equação 1)

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23

Onde: R é o coeficiente reflexão e Z é a impedância acústica dos

diferentes meios, que depende da velocidade de propagação do som no meio e

da densidade do meio. Os valores de velocidade do som utilizados para cada

tipo de sedimento característico seguiram os valores encontrados por Falcão e

Ayres (2010), e foram utilizados para o cálculo da impedância acústica.

Para o cálculo de atenuação do sinal foi utilizado como base o estudo de

Hamilton (1972), que propôs uma equação que relaciona a atenuação à

frequência:

= fn (Equação 2)

Onde “k” é uma constante que depende do tipo sedimentar e “n” é um

expoente da frequência.

Medidas in situ de densidade

As medidas de densidade in situ foram realizadas em cada estação com

um densímetro (Densitune Silt Density Probe, fabricante Stema Systems), que

possui um sensor metálico de diapasão que vibra a uma frequência pré-

determinada cuja alteração ocorre de acordo com a densidade do sedimento

em que ele é inserido. Os valores de frequência em milivolts são convertidos

em g/L.

A calibração dos dados de densimetria foi realizada a partir das amostras

de sedimento de fundo coletadas durante a campanha. Para elaboração do

arquivo de calibração, as amostras foram homogeneizadas em um recipiente

com cerca de 50 L, de forma que o sensor (probe) do densímetro pudesse ser

inserido sem contato direto com o recipiente. Depois disso, 2L da amostra

foram retirados e pesados, bem como 2L de água em um recipiente similar. Por

regra de três foi estabelecida a densidade do sedimento.

amostra = águaP(amostra) P(água) (Equação 3)

Onde é a densidade e P é o peso. Foi obtido um grupo de dados acima

de 1300 g/L, entre 1300 e 1070 g/L e abaixo de 1070 g/L, com diluição

gradativa do sedimento em água doce. A cada etapa de diluição, uma nova

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24

amostra de sedimento era retirada e pesada e sua densidade calculada, bem

como um novo registro de densidade através do sensor.

Medidas de concentração de material particulado em suspensão

Foram realizadas em cada estação com o equipamento óptico OBS 3A,

da Campbell Scientific. O princípio de medição do equipamento consiste em

considerar que o retroespalhamento da luz medido é diretamente proporcional

à quantidade e tamanho das partículas em suspensão na amostra; outros

fatores além do material particulado em suspensão podem influenciar a

medição do sinal de retroespalhamento. O sensor de turbidez do equipamento

OBS 3A fornece valores de turbidez na escala NTU (Unidades Nefelométricas

de Turbidez). Desta maneira, para a correta correlação entre o sinal do OBS e

a concentração de materiais particulados em suspensão (MPS) é necessário

realizar procedimentos de calibração do equipamento.

Coleta de sedimento superficial

Em cada estação foi coletada uma amostra de sedimento superficial com

um amostrador de arrasto. As amostras foram processadas em laboratório,

passando por análise granulométrica a laser (Mastersize 2000, Malvern

Instruments) e cálculo de densidade do sedimento em laboratório a partir dos

pesos seco e úmido da amostra em um volume conhecido (Amos & Sutherland,

1994).

Análise estatística

Foi realizada uma abordagem estatística utilizando-se o software MVSP

(Multi-Variate Statistical Package) para identificar as relações entre as

propriedades analisadas e os registros geofísicos.

As variáveis envolvidas na análise de componentes principais foram as

seguintes: penetração máxima alcançada pelo sinal de 3.5 kHz, granulometria

média (obtida após processar os dados de granulometria a laser no pacote

estatístico Gradistat – Blott and Pye, 2001), densidade do sedimento calculada

em laboratório, teor de lama e coeficiente de reflexão do sedimento superficial.

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25

A outra aplicação estatística foi a análise de cluster pelo método UPGMA

utilizando distância euclidiana, na qual o mesmo conjunto de dados foi

analisado por estação. Contudo, essa análise foi feita de duas maneiras:

utilizando, além do conjunto anteriormente citado, os dados de densidade

calculada em laboratório, e considerando as medições de densidade in situ.

2.3 RESULTADOS

Características físicas do sedimento superficial

A análise granulométrica das amostras de sedimento superficial mostrou

uma transição do fundo arenoso para lamoso entre as estações 2 e 3, assim

como a densidade do sedimento superficial determinada em laboratório (Tabela

1). Já a lama fluida só apareceu nas sondagens densimétricas a partir da

estação 6.

Tabela 1: Análise física das amostras de sedimento superficial.

Estação Granulometria

Média (Φ)

Teor de lama

(%)

Densidade

(kg/m³)

1 5,24 75,5 1847,67

2 3,47 34,5 1692,43

3 6,51 95,7 1526,73

4 7,12 99,2 1523,00

5 6,90 97,4 1483,26

6 6,98 98,7 1477,88

7 6,61 97,6 1553,27

8 6,02 92,3 1352,57

9 6,81 97,5 1358,25

10 6,64 98,5 1349,19

11 6,03 94,7 1525,30

12 6,20 95,6 1483,61

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26

Sinal Acústico

Os resultados geofísicos indicam que uma transição do fundo arenoso

para lamoso ocorre entre as estações 2 e 3, tanto nos registros acústicos

(Tabela 2) como nos cálculos do coeficiente de reflexão e valores de amplitude

do sinal (gráfico da Fig. 3). A tendência observada nos resultados foi de

maiores coeficientes de reflexão para maiores densidades e maiores

granulometrias, conforme esperado.

Figura 3: Gráfico indicando os valores do coeficiente de reflexão e de amplitude para

cada estação.

Descrevendo brevemente um panorama geral no que se refere à reflexão,

pode-se dizer que, com base na intensidade de reflexão do refletor superficial,

as duas primeiras estações se distinguem das demais: registros sísmicos

mostram uma reflexão superficial relativamente mais forte (com traço mais

escuro), e as duas frequências da ecobatimetria não detectaram refletores de

fundo diferentes, isto é, não houve descolamento do sinal e nem observa-se

um sinal superficial muito alargado (como visto na estação 10 – Tabela 2). Já

no restante das estações, a reflexão da superfície foi mais fraca (com camadas

sedimentares superficiais transparentes), conforme indicam os valores de

coeficiente de reflexão, permitindo maior penetração do sinal sísmico e

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27

descolamento do sinal nas frequências do ecograma. Assim, a detecção do

fundo nem sempre foi unânime por todas as frequências, indicando que, além

das características sedimentológicas/geotécnicas do fundo, outras variáveis

(comprimento de onda do pulso, resolução vertical do sistema utilizado) devem

ser consideradas na interpretação dos registros acústicos.

Os dados mostraram coerência entre os registros do perfilador de

subfundo e de ecobatimetria, e, em geral, onde a reflexão sísmica foi mais forte

e a penetração do sinal sísmico menor, não houve descolamento entre os

horizontes correspondentes às duas frequências do ecobatímetro. A

penetração do sinal acústico foi maior com a diminuição da frequência

(comprimento de onda do pulso com menos resolução), estando também

associada a menores densidades do sedimento e consequente menor

atenuação do sinal acústico.

A resolução e a sensibilidade dos sinais de diferentes frequências para

detectar variações de impedância acústica ajudam na explicação do

descolamento do eco, ou eco duplo; a frequência mais alta (210 kHz) detecta

um fundo mais raso, e a frequência de 33 kHz penetra e registra outro refletor,

como é possível observar bem nas estações 3, 4, 5, 6, 7 e 8 (Tabela 2). A

explicação para o fato de alguns registros do ecobatímetro apresentarem um

descolamento das frequências e outros registrarem mais ruído entre as

frequências é complexa e provavelmente passa pelas características

geotécnicas do depósito sedimentar. Um fator a ser considerado é a

consolidação do pacote lamoso, o que poderia estar relacionado com dinâmica

sedimentar. O gráfico da figura 2 não mostra tendência clara entre momento de

coleta (de acordo com a curva da maré) e registros com descolamento do eco

mais nítido. As estações 3, 4, 7 e 8 (Tabela 2) foram as que registraram melhor

o descolamento do eco e são locais em que os dados foram coletados em

momentos próximos a estofa de maré, ou seja, momento no qual a dinâmica

sedimentar é menos intensa e ocorre a decantação de partículas, tornando a

suspensão mais densa, mas sem tempo para o processo de consolidação do

sedimento.

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28

Um dos efeitos que afeta a penetração do sinal é a atenuação. Pela

relação proposta por Hamilton (1972), a atenuação é uma taxa representada

pela unidade dB/m. Dessa forma, a energia do pulso inicial é importante para

compreender as diferentes penetrações. As fontes utilizadas no levantamento

dos dados emitem pulsos com as seguintes especificações: a) 160 dB para a

frequência de 210 kHz; b) 175 dB para as frequências de 33 e 3.5 kHz. Ao

calcular a taxa de atenuação utilizando os valores propostos por Hamilton

(1972) para sedimentos finos (silte argiloso) referentes às constantes presentes

na fórmula, chega-se aos seguintes valores: i) 0,61 dB/m para a frequência de

3.5 kHz; ii) 5,08 dB/m para a frequência de 33 kHz; iii) 28,94 db/m para a

frequência de 210 kHz.

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29

Tabela 2: Apresentação dos dados geofísicos (ecogramas e registros do perfilador de subfundo) por estação.

Estações Registros Geofísicos Estações Registros Geofísicos

33/210 kHz 3.5 kHz 33/210 kHz 3.5 kHz

1

4

2

5

3

6

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Estações Registros Geofísicos Estações Registros Geofísicos

33/210 kHz 3.5 kHz 33/210 kHz 3.5 kHz

7

10

8

11

9

12

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31

Análise estatística

Primeiramente uma análise de componentes principais (PCA) foi feita com as

seguintes variáveis: penetração máxima alcançada pela frequência de 3.5 kHz,

granulometria média, densidade calculada em laboratório, teor de lama e coeficiente de

reflexão do sedimento superficial.

A figura 4 mostra o resultado da análise. Observa-se que a densidade e o

coeficiente de reflexão estão bem correlacionados; o teor de lama e a granulometria

média também aparecem correlacionados, sendo este último par menos correlacionado

provavelmente devido ao uso de uma média granulométrica, que pode distanciar essa

correlação no caso de amostras de sedimento que resultaram em distribuições

granulométricas bimodais. A penetração do sinal sísmico aparece em oposição ao

coeficiente de reflexão, já que quanto maior o coeficiente de reflexão, mais energia será

refletida na superfície, e menos energia terá o pulso para continuar sua propagação para

o interior do depósito sedimentar. O teor de lama poderia estar mais próximo da

densidade, mas como variou pouco e de maneira mais similar com a granulometria média,

acabou sendo distanciado, corroborando a ideia de que nem sempre há uma correlação

direta entre conteúdo lamoso e densidade, isto é, a lama pode se apresentar com

densidades variadas.

Figura 4: Análise de componentes principais.

A outra parte da abordagem estatística foi a análise de cluster, na qual o mesmo

conjunto de dados foi analisado para cada estação. Além disso, a análise foi feita de duas

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32

maneiras: uma utilizando os dados de densidade calculada em laboratório, e a outra

considerando as medições de densidade in situ.

Figura 5: À esquerda, análise de cluster considerando os dados de densidade calculada; à direita,

considerando os dados de densidade in situ.

O nível de corte foi escolhido de acordo com o ponto onde ocorre uma alteração

evidente na distância entre os “grupos” e com o nível de detalhamento que condiz com a

análise realizada (Wilks, 2006), sendo o gráfico da esquerda com corte em 150, e o da

direita em 70. O primeiro gráfico mostra, fundamentalmente, 3 agrupamentos. O primeiro

grupo parece determinado pelos menores teores de lama (estações 1 e 2), granulometrias

mais grossas, além da baixa penetração do sinal sísmico e altos coeficientes de reflexão;

o segundo grupo possui valores de densidade intermediários, e é subdividido entre dois

intervalos de densidade: 1477-1483 kg/m³ para as estações 6,12 e 5, e 1523-1553 kg/m³

para as estações 3, 4, 7 e 11; e o terceiro grupo (estações 8, 9 e 10) apresentou valores

ainda mais baixos de densidade (variando entre 1349 e 1358 kg/m³) e de coeficiente de

reflexão, com pouca variação no teor de lama. Há alguma separação ainda entre as duas

primeiras estações (grupo 1) das demais, corroborando as interpretações feitas

inicialmente pelos registros geofísicos e pela análise granulométrica.

Já o segundo gráfico (à direita), ao utilizar os dados de densidade in situ, separou

basicamente dois grupos. O grupo A (1, 3, 4, 5, 9 e 2) parece representar aquelas

estações onde não há lama fluida, com exceção do ponto 9, que apesar de mostrar lama

fluida no registro do densitune, apresentou grandes similaridades com as propriedades da

estação 5. O outro grupo (B), representado pelas estações 6, 7, 8, 10, 11 e 12, reúne o

grupo a partir da estação onde começa a observação de lama fluida (estação 6), com

pouca variação das outras propriedades.

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33

2.4 DISCUSSÃO

Os resultados das características físicas do sedimento e dos padrões acústicos

registrados que foram apresentados estão em concordância com um importante trabalho

de Akal (1970), que observou as propriedades físicas que afetavam a reflexão de ondas

sonoras de vários locais, e encontrou uma correlação entre porosidade e coeficiente de

reflexão, destacando que as menores densidades estão associadas a maiores

porosidades, proporcionando uma reflexão mais fraca. Baldwin (1985) encontraram

maiores correlações entre impedância acústica e densidade do que entre impedância

acústica e granulometria, resultados que são similares ao conjunto de dados aqui

apresentados, inclusive nas análises estatísticas.

De acordo com a Equação 2 descrita anteriormente, os valores de atenuação devem

aumentar conforme aumenta a frequência, o que é coerente com os dados acústicos

apresentados e com outros estudos (Robb et al, 2006; Macedo et al, 2009), isto é, quanto

maior a frequência, maior a atenuação e menor a penetração. Uma das conclusões do

estudo de Hamilton (1972) foi que, em sedimentos marinhos, a atenuação é maior em

areias finas do que em areias grossas e em silte/argila devido ao arranjo do depósito

(angularidade e esfericidade dos grãos, e porosidade). No entanto, outras características

do arcabouço estratigráfico devem ser consideradas.

O gráfico da figura 6 apresenta as diferentes penetrações das frequências.

Considerou-se para a construção deste gráfico que o fundo era o refletor detectado pela

frequência de 210 kHz, já que esta é a metodologia usada nas sondagens hidrográficas

(PIANC, 1997). A partir disso, foi plotada a penetração alcançada pelo sinal de 33 kHz e a

penetração até o primeiro refletor sísmico interno identificado pelo sinal de 3.5 kHz, além

da espessura da camada de lama fluida (até 1200 kg/m³) detectada pelo densitune. Os

dados corroboram a ideia de que as frequências mais altas atenuam mais rapidamente.

Além disso, no caso da primeira estação, o coeficiente de reflexão do fundo é

relativamente alto e nenhuma frequência registrou penetração do sinal; já na sexta

estação, que é o ponto onde começa a aparecer lama fluida mais significativamente, a

frequência de 3.5 kHz sequer identifica o primeiro refletor como fundo.

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34

Figura 6: Gráfico apresentando as penetrações dos pulsos de 3.5 kHz, 33 kHz (considerando o

fundo como sendo o detectado pela frequência de 210 kHz) e a espessura da camada de lama

fluida aferida pelo densímetro.

Macedo et al (2009) encontraram, em uma série de análises de diferentes tipos

granulométricos de sedimento, valores baixos de atenuação na lama fluida quando

comparados com outros tipos. As maiores penetrações encontradas nas estações onde

há lama fluida no conjunto de dados aqui analisados estão de acordo com resultados de

outros trabalhos (Kim et al, 2004; Macedo et al, 2009), bem como a teoria de Biot-Stoll,

descrita em Stoll (1980) e revisada em Akal (2001): a alta concentração de água nos

sedimentos proporciona um movimento quase em fase caso ocorra uma estimulação por

onda, quase não existindo dissipação viscosa da velocidade, proporcionando baixa

atenuação

Os registros acústicos convencionais para investigação do fundo geralmente não

conseguem detectar variações muito pequenas, a menos que passem por uma série de

processamentos. A comparação entre os resultados apresentados no gráfico da figura 6

com o gráfico seguinte da figura 7 permite observar que o limite superior da lutoclina não

é detectado por nenhuma das frequências dos métodos acústicos utilizados e nem pelo

densímetro.

0

0,5

1

1,5

2

2,5

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Thic

kne

ss (

m)

Stations

3.5 kHz

33 kHz

Densitune

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35

Figura 7: Diferentes profundidades medidas por diferentes métodos nas estações onde foi

identificada a presença de lama fluida: profundidades acústicas (3.5 kHz e 210 kHz), profundidade

do topo da camada de lama fluida que o densímetro identificou, e profundidade na qual a

concentração máxima de material em suspensão foi detectada (sendo 6,5 g/L o limite máximo do

equipamento utilizado)

Esses resultados mostram que a detecção do início da lutoclina ocorreu somente

utilizando a metodologia óptica (dados provenientes do OBS-3A), e sugere que a

detecção do fundo pelos métodos acústicos aqui utilizados eventualmente representa a

camada de lama fluida móvel ou, dependendo da frequência utilizada, já estaria aferindo o

topo da lama fluida estacionária, ou até mesmo fundo coesivo, cuja consolidação é maior

conforme termos utilizados por Ross e Metha (1989).

Lambert et al (2002) estudaram a variação na resposta acústica de sinais de 30 e 50

kHz, e observaram que a frequência mais alta varia mais, isto é, o menor comprimento de

onda detecta menores variações no depósito sedimentar. Uma situação que ilustrou bem

essa questão foi a identificação da haloclina pela frequência de 210 kHz nos registros da

ecobatimetria (Figura 8) das quatro últimas estações do transecto. Embora a lutoclina não

tenha sido detectada, essa detecção da haloclina apareceu na forma de um ruído

registrado na coluna d’água (entre 2 e 3 metros) e parece ser resultado da alteração da

salinidade na coluna d’água, o que sugere uma influência maior dessa propriedade sobre

a impedância acústica do que do sedimento em suspensão. Esse tipo de resultado já vem

sendo estudado, e atualmente existe um campo de pesquisa chamado “oceanografia

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36

sísmica” que estuda estruturas termohalinas na coluna d’água através de processamento

de dados sísmicos, como mostra o trabalho pioneiro nessa área de Holbrook et al (2003).

Ruddick et al (2009) também utilizaram dados sísmicos para identificar características da

água e até mesmo processos oceânicos e sugerem que futuramente seja possível a

inversão das amplitudes de sinal sísmico de modo a estimar a temperatura do oceano.

Figura 8: Registro do ecobatímetro que indicou a presença de haloclina na coluna d’água

acompanhado com o perfil de salinidade.

Outra observação que deve ser destacada é que o descolamento do eco entre as

frequências de 210 kHz e 33 kHz nem sempre representa presença de lama fluida. A

interpretação do descolamento das frequências representar lama fluida pode gerar erros

associados à navegação, como a definição de profundidade náutica, e a projetos de

engenharia costeira, como por exemplo, a aferição de volumes para projetos de

dragagens utilizando somente o ecobatímetro, uma vez que não há necessidade de

dragagem da lama fluida, pois não oferece riscos à navegação. Fontein & Byrd (2007)

discutem a questão da manutenção de portos e destaca que parâmetros reológicos

devem ser considerados para delimitação da profundidade náutica, visto que materiais de

mesma densidade provenientes de diferentes locais apresentam resistências ao

cisalhamento distintas.

No ponto 8, exemplificando a situação acima mencionada, houve uma penetração

do sinal de 33 kHz de cerca de um metro, enquanto a camada de lama fluida registrada

pela medição de densidade in situ não passou de 70 cm. A figura 9 mostra em detalhe

essa diferença entre o descolamento no registro do ecobatímetro e dados do Densitune.

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37

Figura 9: Na parte superior, o registro do ecobatímetro exemplificando nitidamente o

descolamento do eco. Na parte inferior esquerda o registro do Densitune; à direita, em destaque

as variações de densidade já no sedimento, indicando a presença de lama fluida.

Nessa situação exposta pelos dados, o volume do pacote lamoso apontado pela

ecobatimetria de dupla frequência é aproximadamente 128% maior do que o pacote de

lama fluida identificado pelo densitune. Schettini et al (2010) também encontraram

diferenças na espessura de pacotes lamosos investigada por esses métodos

(ecobatimetria e densimetria), salientando que as espessuras de lama mapeadas pelo

ecobatímetro foram mais significativas. Quaresma et al (2011) também conseguiram

mapear espessuras de pacotes lamosos em uma área portuária através de metodologias

indiretas e diretas. Os autores também conseguiram visualizar diferença entre as

densidades medidas e os resultados fornecidos pelo método acústico.

2.5 CONCLUSÃO

Foi possível observar que metodologias distintas sondando a mesma área podem

fornecer resultados completamente diferentes. Nas análises feitas, a frequência e

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Dissertação de Mestrado Resposta Acústica

38

algumas propriedades físicas foram importantes para entender as relações entre

sedimento superficial e atributos acústicos, como reflexão e penetração do sinal.

Nas estações onde foi encontrada lama fluida (menores densidades superficiais) as

reflexões foram mais fracas em função do menor contraste de impedância acústica, e as

penetrações foram maiores, possibilitadas, em parte, pela menor atenuação o sinal. Fica

evidente também que para uma melhor compreensão da relação entre essas

propriedades (penetração x densidade) seria necessário um estudo estratigráfico mais

detalhado da seção sondada.

A densidade foi determinante na análise de agrupamentos, bem como apareceu, nas

interpretações e na análise de componentes principais, como a variável mais importante

na análise de reflexão superficial e penetração do que outras variáveis como a

granulometria, indicando a eficácia do mapeamento de densidade junto com

levantamentos geofísicos para fins de navegabilidade.

O reconhecimento do limite superior da camada de lama fluida só foi possível

utilizando metodologia ótica, indicando que os métodos acústicos utilizados não possuem

resolução para esse tipo de objetivo. Em contrapartida, é importante destacar a

observação do registro da haloclina nos dados de ecobatimetria, uma vez que a diferença

de impedância acústica criada entre as diferentes salinidades é bem pequena.

Estudos mais detalhados envolvendo outras propriedades reológicas dentro da

coluna estratigráfica, como por exemplo, limites de plasticidade, podem ser interessantes

para aprimorar a compreensão do comportamento do sinal acústico.

2.6 REFERÊNCIAS

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Dissertação de Mestrado Investigação da dinâmica sedimentar

42

CAPÍTULO 3 - INVESTIGAÇÃO DA DINÂMICA SEDIMENTAR EM

FUNDOS LAMOSOS A PARTIR DE FERRAMENTAS ACÚSTICAS

3.1 INTRODUÇÃO

Na interpretação de registros acústicos normalmente são consideradas a frequência

utilizada e as características do depósito sedimentar sondado. Contudo, outras questões

podem ser abordadas para aprimorar o processamento e interpretação dos dados

acústicos. A hidrodinâmica, por exemplo, pode alterar as características do depósito e da

dinâmica de sedimentos, processos de floculação e de transporte de sedimento, bem

como as condições físico-químicas da coluna d’água (MPS e salinidade). Todos esses

processos podem de alguma forma interferir na resposta e consequentemente nos

registros dos levantamentos de campo com métodos acústicos (Wall et al, 2011). Dessa

forma, técnicas de mapeamento sedimentar do fundo marinho podem ser aprimoradas

(Davis et al, 2002; Kim et al, 2004), com uma classificação das respostas acústicas mais

detalhadas.

A lama fluida, classificada por McAnally et al (2007) como uma suspensão aquosa

de sedimento fino altamente concentrada com densidade entre 1080 e 1200 kg/m³,

oferece grande dificuldade em termos de detecção por métodos acústicos convencionais

de alta resolução (Schrottke et al, 2006; Veronez Júnior et al, 2009; Godinho, 2012).

Na Plataforma Interna do Rio Amazonas foram mapeadas grandes áreas que

mostraram a presença de lama fluida (Kineke & Sternberg, 1995), sendo a movimentação

dessas suspensões também objeto de estudos. Sternberg et al (1996), por exemplo,

concluíram que a movimentação da lama fluida na plataforma funcionaria como um

mecanismo fonte de sedimentos para regiões do prodelta, contribuindo para o

crescimento do delta submarino do Amazonas.

A dinâmica desses pacotes lamosos pode ter desdobramentos em várias esferas,

desde engenharia, como a questão de monitoramento de portos, até a biologia, com

estudos de impacto na biota bentônica. A partir daí é necessário um desenvolvimento de

um método rápido e eficiente para mapeamento desses pacotes e para o conhecimento

dos processos envolvidos no transporte, deposição e ressuspensão.

Este capítulo tem por objetivo investigar e associar as variações observadas nos

registros acústicos com a mobilidade sedimentar ao longo de um ciclo de maré , em uma

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Dissertação de Mestrado Investigação da dinâmica sedimentar

43

estação fixa na Plataforma próximo a desembocadura do Canal Norte do Rio Amazonas.

Esta análise foi feita com base na integração de dados de magnitude de corrente, material

particulado em suspensão, densimetria do fundo, perfilagem de subfundo (3.5 kHz) e

ecobatimetria de dupla frequência (210 e 33 kHz).

3.2 METODOLOGIA

Os dados foram adquiridos próximo à desembocadura do Canal Norte do Rio Amazonas

(Fig 10), no âmbito do projeto “Navigation aids for the North Channel of Amazon Rio: Geo-

Acoustic Characterization of the sediment dynamics (CANALNORTE/GEOACUSTICA)”. A

coleta durou aproximadamente 12 horas em uma estação fixa a uma profundidade de

aproximadamente 11,5 metros, no intuito de observar variações em um ciclo de maré de

quadratura. Os dados foram coletados a cada hora concomitantemente, com exceção do

ADCP que operou todo o tempo. Os equipamentos geofísicos estavam acoplados ao

barco e o OBS, juntamente com o densímetro, perfilaram a coluna d’água.

Figura 10: Estação fixa indicada pelo ponto preto na Plataforma Interna do Rio Amazonas.

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44

Levantamento de dados hidrodinâmicos e de material particulado em suspensão

Os dados hidrodinâmicos foram obtidos continuamente com um ADCP (Winriver II 1200

kHz, Teledyne RD Instruments) acoplado ao barco. Além dos resultados de velocidade de

corrente, foi possível extrair dos dados o backscatter acústico da coluna d’água com o

intuito de observar e avaliar a estabilidade da coluna d’água (Wang, 2010) e as condições

de transporte de MPS (Wall et al, 2011).

Já os dados de material particulado em suspensão foram obtidos com o equipamento

óptico OBS 3A, da Campbell Scientific. O princípio de medição do equipamento consiste

em considerar que o retroespalhamento da luz medido é diretamente proporcional à

quantidade e tamanho das partículas em suspensão na amostra; outros fatores além do

material particulado em suspensão podem influenciar a medição do sinal de

retroespalhamento. O sensor de turbidez do equipamento OBS 3A fornece valores de

turbidez na escala NTU (Unidades Nefelométricas de Turbidez).

Densimetria in situ

As medidas de densidade in situ foram realizadas utilizando um densímetro

(Densitune Silt Density Probe, fabricante Stema Systems), que possui um sensor metálico

em diapasão que vibra a uma frequência pré-determinada cuja alteração ocorre de acordo

com a densidade do sedimento em que ele é inserido. Os valores de frequência em

milivolts são convertidos em g/L.

A calibração dos dados de densimetria foi realizada a partir de amostras de

sedimento de fundo coletadas durante a campanha. Para elaboração do arquivo de

calibração, as amostras foram homogeneizadas em um recipiente com cerca de 50 L, de

forma que o sensor (probe) do densímetro pudesse ser inserido sem contato direto com o

recipiente. Depois disso, 2L da amostra foram retirados e pesados, bem como 2L de água

em um recipiente similar. Por regra de três foi estabelecida a densidade do sedimento.

amostra = águaP(amostra) P(água) (Equação 4)

Onde é a densidade e P é o peso. Foi obtido um grupo de dados acima de 1300 g/L,

entre 1300 e 1070 g/L e abaixo de 1070 g/L, com diluição gradativa do sedimento em

água doce. A cada etapa de diluição, uma nova amostra de sedimento era retirada e

pesada e sua densidade calculada, bem como um novo registro de densidade através do

sensor.

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45

Levantamento geofísico de alta resolução

A sondagem geofísica consistiu na perfilagem de subfundo (Stratabox 3.5 kHz) e

também utilizou um ecobatímetro operando em dupla frequência (33 e 210 kHz - Syquest

modelo Bathy 500DF). A frequência de 3.5 kHz é de uma fonte ressonante e possui o

sinal do tipo CW (continuous waveform), bem como o sinal do ecobatímetro utilizado.

Os registros do perfilador de subfundo foram analisados digitalmente no software

Kogeo para identificar padrões na assinatura sísmica, enquanto os dados da

ecobatimetria de dupla frequência foram interpretados na forma impressa.

Cálculos da tensão cisalhante

A tensão cisalhante foi calculada de acordo com a fórmula descrita por Whitehouse

(2000).

(Equação 5)

Onde é a densidade da água e é a velocidade de fricção, que pode ser obtida

usando-se o perfil logarítmico de velocidade:

(Equação 6)

Sendo k a constante de Von Karman (0,4) e 0 corresponde a rugosidade do fundo, aqui

considerado como lama (0,2). Os valores de Uz e z utilizados foram os medidos pelo

ADCP.

3.3 RESULTADOS

Hidrodinâmica, material particulado em suspensão, tensão de cisalhamento e

backscatter

O gráfico da figura 11 apresenta os resultados de velocidade de corrente durante o

ciclo de maré. As linhas pontilhadas representam dois momentos distintos de condições

hidrodinâmicas que foram tomados como exemplo para comparações posteriores com os

registros geofísicos de alta resolução.

As velocidades alcançam 1,3 m/s durante a vazante, enquanto as mais baixas (em

torno de 0,05 m/s) ocorrem com um pequeno atraso em relação à estofa de maré.

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46

Figura 11: Gráfico mostrando a variação temporal da magnitude das correntes durante o ciclo de

maré.

A distribuição de material particulado em suspensão é mostrada no gráfico da figura

12. É possível apontar dois picos de concentração de material em suspensão, próximo às

15 horas e próximo às 20 horas. No entanto, essa distribuição foi feita a partir de uma

gridagem (krigagem) e pode distorcer o resultado devido às medições terem sido a cada

hora.

Figura 12: Gráfico da distribuição de material particulado em suspensão na coluna d’água medido

através do OBS3A (unidades nefelométricas de turbidez – NTU).

No gráfico da figura 13, foi plotado a concentração do material particulado em

suspensão a diferentes profundidades juntamente com a tensão de cisalhamento

calculada. Os cálculos de tensão cisalhante foram realizados a fim de corroborar a

hipótese de que nos momentos mais energéticos há uma diferenciação da coluna d’água

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47

que é possível ser observada por ferramentas acústicas. Baseando-se na observação

desse gráfico, é possível apontar uma tendência da tensão de cisalhamento seguir a

curva de maré com um pequeno atraso. Além disso, é importante destacar 3 momentos:

a) às 13 horas a vazante começa a acelerar, a tensão de cisalhamento aumenta, a

concentração de material particulado em suspensão no fundo diminui, mas a 2 e a 4

metros do fundo ela aumenta; b) às 15 horas a tensão de cisalhamento continua alta,

embora a concentração de material particulado em suspensão próximo ao fundo não

tenha dado a mesma resposta que às 13 horas; c) entre 17 e 19 horas a tensão de

cisalhamento se mantém baixa, o que pode explicar a alta concentração de material

particulado em suspensão junto ao fundo. Esses processos serão discutidos adiante na

discussão.

Figura 13: Gráfico com as concentrações de material particulado em suspensão a diferentes

profundidades, juntamente com a curva de maré (m) e as tensões de cisalhamento (N/m²).

Os dados de backscatter acústico na coluna d’água foram obtidos a partir dos dados

do ADCP, e são apresentados na figura 14. É importante ressaltar que esses dados não

foram processados em relação a atenuação, e são apresentados para fins comparativos

dos diferentes padrões identificados. Nos momentos de maior energia observa-se uma

coluna d’água mais homogênea e misturada, enquanto nos momentos próximos à estofa

de maré (18h) aparece um gradiente dessa propriedade.

0

2

4

6

8

10

12

14

30000

32000

34000

36000

38000

40000

42000

44000

10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21

[MP

S] e

m N

TU

Horário

A 2 m do fundo

A 4 m do fundo

Fundo

Maré

Tensão de Cisalhamento

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48

Figura 14: Gráficos de backscatter do ADCP. A imagem superior indica o momento de maior

energia, próximo a 14h, enquanto a inferior indica momentos menos energéticos, próximo a 18h

(no canto esquerdo).

Densidade in situ

As medições do densímetro identificaram a presença de lama fluida, apesar das

espessuras serem menores do que 10 cm (considerando que a lama fluida tenha um

limite máximo de densidade equivalente a 1200 kg/m³), conforme visto na pouca

suavidade do limite entre água e sedimento. Não foi detectado variação da espessura da

camada de lama fluida ao longo das medições. O gráfico da figura 15 apresenta as

medições de densidade ao longo da coluna d’água até o fundo marinho durante as 13

horas de coleta.

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Figura 15: Registros das medições do densímetro a esquerda; a direita registros com

destaque para a porção final do perfil em dois momentos (14h e 18h), mostrando a ausência de

um pacote espesso de lama fluida.

Registros acústicos

Os registros acústicos de 3.5 kHz mostraram a camada superficial pouco reflexiva e

não apresentou mudanças de espessura ao longo do ciclo de maré (Fig. 16).

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50

Figura 16: Registros do perfilador de subfundo. O registro superior foi coletado às 14h, e o inferior

às 18h.

Nos registros da ecobatimetria foram reconhecidos fundos diferentes pelas duas

frequências – descolamento do eco - sugerindo a presença de uma camada de lama

pouco consolidada cuja detecção só foi realizada pela frequência de 210 kHz. Contudo,

em alguns momentos (próximos à estofa de maré) o descolamento do eco foi mais nítido,

enquanto em outros (altas velocidades de corrente) apareceram ruídos entre as

frequências (Figura 17). Dessa forma, como não foi possível identificar o processo de

formação de lama fluida (visto que não foram reconhecidas variações de espessura),

esses ruídos foram interpretados e associados com o transporte de sedimento lamoso na

coluna d’água, podendo ser caracterizada uma camada de lama fluida móvel.

Figura 17: Registros do ecobatímetro para dois momentos: a) às 14 horas, com ruídos entre os

horizontes detectados pelas diferentes frequências; b) às 18 horas, com descolamento do eco

mais nítido.

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51

3.4 DISCUSSÃO

Além dos resultados terem mostrado que o densímetro não identificou uma camada

de lama fluida de mais de 10 cm, o gráfico em destaque da figura 15 (mostrando dois

momentos energéticos distintos) indica que a variação de profundidade detectada pelo

sensor de pressão do densímetro é a mesma variação da maré entre esses momentos

(80 cm), o que sugere que o densímetro não detectou alteração no sedimento do fundo e

nem processos de deposição ou de ressuspensão. Já a partir das medições da tensão de

cisalhamento observa-se que a magnitude da velocidade de corrente foi quem a

controlou, e propiciou alguns processos observados nos dados de material particulado em

suspensão. No gráfico da figura 13 foram descritos três momentos: às 13 horas a tensão

de cisalhamento está aumentando e a concentração de material particulado em

suspensão está diminuindo, sugerindo processo de ressuspensão; observa-se ainda que

a curva de medição do OBS-3A aumentou mais a 2 metros do fundo do que a 4 metros do

fundo, indicando que o limite da lutoclina nessas condições de maré parece estar mais

próximo de 2 metros do fundo. Outro momento apontado nos resultados foi próximo às 15

horas, quando a tensão de cisalhamento é alta mas a curva de concentração de

sedimento em suspensão próximo ao fundo não aumenta, o que nos indica que muito

sedimento pode ter sido remobilizado e o fundo exposto não consegue ser ressuspenso

pela tensão de cisalhamento atuante. Entre às 17 e 19 horas a tensão de cisalhamento se

mantém baixa e a concentração de material particulado próximo ao fundo aumenta,

indicando um processo de deposição. Os dados de backscatter acústico mostraram maior

gradiente nos momentos de menor energia, sugerindo condição favorável para o

fortalecimento de estratificação na coluna d’água, enquanto o menor gradiente próximo às

14h sugere um momento de maior energia, maior mistura, e maior capacidade de

transporte de sedimento, o que é coerente com o que foi apresentado e interpretado pelos

dados de concentração de material particulado em suspensão e da ecobatimetria de

dupla frequência. Wang et al (2010) também conseguiram observar a partir do backscatter

do ADCP que nos momentos mais próximos a estofa de maré, o gradiente de backscatter

era maior do que nos momentos de mais intensa hidrodinâmica.

Os registros da ecobatimetria indicaram uma espessura do descolamento de eco

maior do que a espessura de lama fluida medida pelo densímetro. Schettini et al (2010)

obtiveram resultados similares ao investigar pacotes lamosos na Baía de Tijuca,

identificando espessuras maiores de lama nos registros ecobatimétricos quando

comparados aos dados de densimetria in situ.

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52

Um dos efeitos que o MPS pode gerar é a reverberação do sinal acústico ainda na

coluna d’água, devido às reflexões aleatórias que essas partículas propiciam, o que acaba

atenuando uma pequena parte do pulso inicialmente emitido (informação do Manual

Syquest). O ruído entre as frequências do ecobatímetro, que foi observado nos momentos

de maiores velocidades e maiores tensões de cisalhamento, foi interpretado como

indicação de transporte de sedimento. Já o perfilador de subfundo (3.5 kHz) não detectou

essa pequena variação pois sua frequência é menor, o que restringe a resolução vertical.

Sottolichio et al (2011) identificaram a partir de medições de concentração de

material particulado em suspensão uma variação que tem similaridades com a encontrada

nesse trabalho, e propuseram duas hipóteses: i)liquefação do fundo; ii) advecção de lama

fluida. As duas hipóteses parecem auxiliar no entendimento desse ruído que apareceu

nos registros do ecobatímetro, ou seja, tanto a liquefação do fundo como a advecção da

lama fluida podem mudar o padrão de distribuição de material particulado em suspensão

e de transporte de sedimento, e isso se refletiu nos registros acústicos. Outro processo

que Sottolichio et al apontam (2011) é a destruição da lutoclina pela maré enchente, o que

também pode ter ocorrido, pelos dados apresentados, próximo às 21h, quando a tensão

de cisalhamento estava grande e a concentração de material particulado em suspensão

diminuiu no fundo e a coluna d’água ficou mais misturada.

Em outros estudos, como em Schrottke et al (2006), já foi identificado a formação de

lama fluida durante momentos próximos a estofa de maré com métodos acústicos.

Contudo, o que parece ocorrer nesse caso é o registro da movimentação de lama fluida,

que já foi estudado por Kineke & Sternberg (1995) na Plataforma Amazônica, e

corroborou o uso do termo mobile fluid mud, cunhado por Ross e Mehta em 1989.

Sottolichio et al (2011) destacam que apesar do potencial que métodos acústicos

representam para o estudo de dinâmica sedimentar, o aperfeiçoamento desse

conhecimento ainda é necessário, principalmente em ambientes com alta concentração

de sedimento em suspensão.

A figura 18 tenta sintetizar e relacionar as propriedades e os equipamentos que

foram determinantes para interpretação de que o ruído do ecobatímetro é reflexo da

dinâmica sedimentar. Assim, o ADCP mediu a hidrodinâmica, que foi quem controlou a

tensão de cisalhamento. Isso resultou em variações na distribuição de material particulado

em suspensão, que por sua vez era registrado pelo OBS3A e na estratificação do

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Dissertação de Mestrado Investigação da dinâmica sedimentar

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backscatter do ADCP. Tudo isso faz parte da dinâmica sedimentar local, e a interpretação

dos registros do ecobatímetro permitiu visualizar essa dinâmica.

Figura 18: Esquema ilustrativo representando a interpretação da dinâmica sedimentar a partir de

ferramentas acústicas e óticas.

3.5 CONCLUSÃO

A hidrodinâmica controlou a tensão de cisalhamento, que por sua vez determinou

diferentes concentrações de material particulado em suspensão de acordo com a

profundidade. Esses resultados corroboram os padrões vistos nos registros de

backscatter do ADCP.

Assim as alterações nos processos de transporte de sedimento reconhecidas pelo

ADCP e pelo OBS nessas condições de maré, bem como as condições dos meios de

propagação (estrutura vertical do depósito e da água) da onda acústica foram distintas a

ponto de os registros acústicos do ecobatímetro identificarem esse processo de dinâmica

sedimentar. A frequência acústica do perfilador de subfundo (3.5 kHz) não registrou essas

características diferentes do depósito superficial durante o ciclo de maré devido a sua

baixa resolução para esse nível de detalhamento, e a densimetria in situ também não

detectou variações de espessura da camada de lama fluida (considerando-se até 1200

kg/m³). A resposta acústica observada nos registros de ecobatimetria de dupla frequência

foi atribuída ao transporte de sedimento durante momentos de alta velocidade de

corrente.

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Dissertação de Mestrado Investigação da dinâmica sedimentar

54

3.6 REFERÊNCIAS

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Dissertação de Mestrado Investigação da dinâmica sedimentar

55

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Dissertação de Mestrado Considerações Finais

56

CAPÍTULO 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

As análises realizadas neste trabalho envolveram estudo geofísico de interpretação

e estudo geoacústico do comportamento do sinal, além de ter abordado no último capítulo

questões mais ligadas a dinâmica sedimentar. Com os métodos geofísicos utilizados em

conjunto com medições de material particulado em suspensão e de densidade in situ foi

possível identificar que a camada de lama fluida não é totalmente reconhecida pelas

frequências acústicas.

Outras constatações que devem ser apontadas envolvem os resultados estatísticos

que mostraram que a densidade é a propriedade do sedimento que melhor respondeu

para explicar a reflexão e a penetração do sinal acústico. O padrão observado foi que,

conforme menor a frequência e a densidade, maior é capacidade de penetração no

depósito, já que densidades baixas refletem menos energia e atenuam menos a onda

sonora, e frequências baixas também atenuam menos.

O capítulo dois mostrou um resultado que deve ser destacado e posteriormente

mais trabalhado em outros estudos geoacústicos, pois embora as frequências acústicas

não tenham identificado o topo da lutoclina, a haloclina foi reconhecida pela frequência de

210 kHz, apesar da diferença de impedância acústica ser bem pequena em relação a um

refletor entre duas camadas de sedimentos distintos.

Já o capítulo três tentou combinar duas áreas que geralmente não estão

associadas na mesma análise: transporte sedimentar e geofísica. Assim, a partir de um

ruído observado nos registros de ecobatimetria de dupla frequência, uma série de

análises com base em resultados hidrodinâmicos e de material particulado em suspensão

foi realizada para corroborar a interpretação de que o ruído registrado representou

transporte de sedimento. Então, essa parte do trabalho mostrou que sistemas acústicos

podem auxiliar no entendimento da dinâmica sedimentar dependendo da frequência

utilizada, pois a frequência do perfilador de subfundo (3.5 kHz) não conseguiu identificar

nada que remetesse a dinâmica sedimentar.

Sendo assim, o trabalho conseguiu consolidar que a densidade é uma variável

mais importante do que a granulometria para interpretação de registros acústicos, e que a

partir do desenvolvimento de ferramentas geoacústicas bem como o processamento de

dados geofísicos, será possível estudar com essas ferramentas características que

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Dissertação de Mestrado Considerações Finais

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exigem alta resolução, as quais convencionalmente não lidam com questões como

dinâmica sedimentar e estrutura da coluna d’água.