Análise de carteira

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“carteiras” — 2006/6/5 — 10:42 — page 1 — #21 Capítulo 1 Análise de Carteiras por Média-Variância Em administração financeira existe a percepção intrínseca de que investimen- tos mais arriscados podem gerar maiores lucros, ou seja, quanto maior o risco maior pode ser a rentabilidade e vice-versa. Para tornar este conceito mensu- rável, é preciso de alguma forma quantificar o que seria a rentabilidade e o risco de um determinado ativo. Existem várias maneiras de proceder, por exemplo, por projeção de cenários econômicos, ou por análise de séries históricas de preços. A metodologia mais utilizada, e que será adotada ao longo deste livro, consiste em considerar o retorno de um determinado ativo como uma variável aleatória, associar a medida de risco ao desvio-padrão dessa variável aleatória, e a rentabilidade ao seu valor esperado. Existem críticas a essa teoria, uma vez que a distribuição estatística de uma dada série histórica de retornos muda com o tempo, dependendo do momento econômico do mercado no qual o ativo está inserido. No entanto, de acordo com as circunstâncias econômicas e com a maneira como esses parâmetros são estimados, essa medida de risco e retorno pode ser apropriada. Utilizando o conceito de rentabilidade e risco descritos anteriormente, serão apresentados e exemplificados neste capítulo alguns dos principais pontos que permeiam a abordagem por média-variância para a seleção ótima de ativos na composição de uma carteira. Nas Seções 1.1 e 1.2, definem-se formalmente os conceitos de risco e retorno para ativos financeiros e carteiras. A relação entre risco e retorno para as carteiras compostas por 2 ativos de risco é apresentada na Seção 1.3. O caso de carteiras compostas por um ativo de risco e um ativo livre de risco é considerado na Seção 1.4.

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Capítulo 1

Análise de Carteiras porMédia-Variância

Em administração financeira existe a percepção intrínseca de que investimen-tos mais arriscados podem gerar maiores lucros, ou seja, quanto maior o riscomaior pode ser a rentabilidade e vice-versa. Para tornar este conceito mensu-rável, é preciso de alguma forma quantificar o que seria a rentabilidade e o riscode um determinado ativo. Existem várias maneiras de proceder, por exemplo,por projeção de cenários econômicos, ou por análise de séries históricas depreços. A metodologia mais utilizada, e que será adotada ao longo deste livro,consiste em considerar o retorno de um determinado ativo como uma variávelaleatória, associar a medida de risco ao desvio-padrão dessa variável aleatória,e a rentabilidade ao seu valor esperado. Existem críticas a essa teoria, umavez que a distribuição estatística de uma dada série histórica de retornos mudacom o tempo, dependendo do momento econômico do mercado no qual o ativoestá inserido. No entanto, de acordo com as circunstâncias econômicas e com amaneira como esses parâmetros são estimados, essa medida de risco e retornopode ser apropriada.

Utilizando o conceito de rentabilidade e risco descritos anteriormente, serãoapresentados e exemplificados neste capítulo alguns dos principais pontos quepermeiam a abordagem por média-variância para a seleção ótima de ativos nacomposição de uma carteira. Nas Seções 1.1 e 1.2, definem-se formalmente osconceitos de risco e retorno para ativos financeiros e carteiras. A relação entrerisco e retorno para as carteiras compostas por 2 ativos de risco é apresentadana Seção 1.3. O caso de carteiras compostas por um ativo de risco e um ativolivre de risco é considerado na Seção 1.4.

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2 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

1.1 Risco e RetornoNesta seção, definem-se risco e retorno de ativos. Seja Si(0) o valor de umativo financeiro i no instante 0 e Si(1) o valor desse ativo uma unidade detempo depois. A taxa de retorno Ri desse ativo, que é uma variável aleatória,é dada por1

Ri =Si(1)− Si(0)

Si(0). (1.1)

O retorno esperado (ou rentabilidade esperada) do ativo financeiro Ri serádenotado por ri, ou seja,

ri = E(Ri), (1.2)

e o risco do ativo financeiro Ri será representado pelo desvio-padrão σi de Ri

σi =√

E((Ri − ri)2). (1.3)

A covariância cov(Ri, Rj), i 6= j, entre os ativos financeiros Ri e Rj , é dadapor

cov(Ri, Rj) = E((Ri − ri)(Rj − rj)). (1.4)

De posse de uma série histórica de valores, preços de uma ação, por exem-plo, podem-se extrair estimativas para essas variáveis (1.2), (1.3) e (1.4), comdiferentes períodos, sendo o diário o mais utilizado. Realmente, supondo quese tenha a série histórica do retorno de 2 ativos financeiros R1(t) e R2(t),t = 1, . . . , T , o retorno esperado ri, o desvio-padrão σi, i = 1, 2 desses ativose a covariância cov(R1, R2) entre esses dois ativos podem ser estimados pormeio das seguintes fórmulas:

ri =1T

T∑t=1

Ri(t)

σi =

√√√√ 1T − 1

T∑t=1

(Ri(t)− ri)2

cov(R1, R2) =1

T − 1

T∑t=1

(R1(t)− r1)(R2(t)− r2).

1Note que para valores pequenos de x− x0, tem-se pela expansão de 1a ordem de Taylorque

ln(x) ≈ ln(x0) +1

x0(x− x0) ⇒ ln

„x

x0

«≈ 1

x0(x− x0)

e, portanto, a taxa de retorno Ri pode ser aproximadamente calculada como

Ri = ln

„Si(1)

Si(0)

«.

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Análise de Carteiras por Média-Variância 3

TABELA 1.1: Preços e retornos observados de Bradesco PN

t Data Si(t) Ri(t)0 14/11/97 6,47 −1 17/11/97 7,22 0,11592 18/11/97 7,68 0,06373 19/11/97 7,97 0,03784 20/11/97 7,68 −0,03645 21/11/97 7,97 0,03786 24/11/97 7,59 −0,04777 25/11/97 7,68 0,01198 26/11/97 7,87 0,02479 27/11/97 7,78 −0,0114

10 28/11/97 7,59 −0,024411 01/12/97 7,65 0,007912 02/12/97 7,98 0,043113 03/12/97 8,02 0,005014 04/12/97 8,35 0,041115 05/12/97 8,44 0,010816 08/12/97 8,45 0,001217 09/12/97 8,48 0,003618 10/12/97 8,53 0,005919 11/12/97 8,04 −0,057420 12/12/97 8,53 0,0609

Exemplo 1.1 Segue um exemplo que trata do ativo Bradesco PN. O períodode tempo considerado é o diário, e os preços correspondem às cotações defechamento, ou seja, ao último negócio do dia. A Tabela 1.1 mostra os preçose os retornos observados para cada dia.

Considerando a janela de 20 dias indicada na Tabela 1.1, o retorno ri éestimado como a média das taxas de retorno Ri:

ri =120

20∑t=1

Ri(t) = 0,014697.

O risco σi associado a esse retorno é dado pela raiz quadrada da variância, ouseja, o desvio-padrão da taxa de retorno Ri:

σ2i =

119

20∑t=1

(Ri(t)− ri)2 = 0,001596 ⇒ σi = 0,03995.

Interpretando os resultados obtidos, o ativo Bradesco PN tem um retorno espe-rado de 1,4697% ao dia, com um risco associado de 3,995%. Esses resultados

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4 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

estão estreitamente relacionados com a janela considerada. Se em vez de 20fossem considerados 10 ou 50 dias, os resultados seriam outros. Uma janelapequena fornece resultados mais sensíveis ao retorno e ao risco a curto prazo.Por sua vez, uma janela maior absorve grandes variações isoladas e fornece in-formações para prazos mais longos. Portanto, a escolha do tamanho da janelaé muito importante e está relacionada com o horizonte das aplicações.

A título apenas de ilustração, existem outros modelos para se calcular orisco de um ativo. Um modelo muito utilizado é o EWMA — ExponentiallyWeighted Moving Average, encontrado no RiskMetrics [Ris, 1996], cuja fórmulaé

σ2i =

∑Tt=1 λT−t(R(t)− ri)2∑T

t=1 λT−t

para 0 < λ < 1. Percebe-se que, por meio de uma ponderação da amostra, oEWMA, ao priorizar as observações mais recentes pela utilização de um fatorde desconto λ entre 0 e 1, consegue captar as mudanças no comportamento domercado mais rápido que o cálculo do desvio-padrão tradicional.

1.2 Média e Variância de CarteirasSerão consideradas na análise adiante posições a descoberto (ou vendidas), querepresentariam a seguinte situação. No instante inicial, toma-se emprestadode um agente financeiro um ativo cujo valor é Si(0). Vende-se esse ativo parapossível investimento em outros ativos. No instante seguinte, compra-se essemesmo ativo pelo valor de mercado Si(1), devolvendo-o ao agente financeiroque fez o empréstimo inicial. Logo, o investidor lucra com a queda do preço eperde com a alta.

Suponha agora que haja n ativos com valor inicial S1(0), . . . , Sn(0), e quese disponha de um valor V (0) para investir nesses ativos. Seja H1, . . . ,Hn

uma estratégia de investimento para cada ativo financeiro (valores negativosrepresentam posições a descoberto), isto é, Hi representa a quantidade do ativoi que se tem na carteira. Deve-se ter

V (0) = H1S1(0) + . . . + HnSn(0). (1.5)

Pode-se definirωi =

HiSi(0)V (0)

(1.6)

que representa a proporção do total investido no ativo i. Valores negativosrepresentam uma posição a descoberto naquele ativo. Logicamente, tem-se de(1.5) e (1.6) que

n∑

i=1

ωi = 1.

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Análise de Carteiras por Média-Variância 5

Seja P a taxa de retorno da carteira ao final de um período, e Ri, comoem (1.1), o retorno do ativo i. Como o valor da carteira no período seguinte,denotado por V (1), vale

V (1) = H1S1(1) + . . . + HnSn(1), (1.7)

tem-se de (1.5), (1.6) e (1.7) que

P =V (1)− V (0)

V (0)=

H1S1(1) + . . . + HnSn(1)− (H1S1(0) + . . . + HnSn(0))V (0)

=H1(S1(1)− S(0)) + . . . + Hn(Sn(1)− Sn(0))

V (0)

=H1R1S1(0) + . . . + HnRnSn(0)

V (0)

=H1S1(0)

V (0)R1 + . . . +

HnSn(0)V (0)

Rn

= ω1R1 + . . . + ωnRn = ω′R,

em que

ω =

ω1

...ωn

, R =

R1

...Rn

.

Define-se

r =

r1

...rn

= E(R) =

E(R1)...

E(Rn)

,

Σ = cov(R) = E((R− r)(R− r)′)

e

e =

1...1

.

A média do retorno P da carteira, denotada por µ, é dada por

µ = E(P ) = E(ω′R) = ω′E(R) = ω′r = ω1r1 + . . . + ωnrn (1.8)

e a variância de P , denotada por σ2, é dada por

σ2 = ω′Σω, (1.9)

lembrando-se também que

ω′e = ω1 + . . . + ωn = 1. (1.10)

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6 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

Resumindo, tem-se a partir de (1.8), (1.9) e (1.10)

P = ω′Rµ = ω′rσ2 = ω′Σω

1 = ω′e

.

Exemplo 1.2 Considere 2 ativos com retornos R1e R2, retornos esperadosr1 = 0,12 e r2 = 0,15, e matriz de covariância

Σ = cov(R) =(

0,04 0,010,01 0,0324

).

Considere uma carteira formada pelos pesos

ω1 = 0,25, ω2 = 0,75.

Calculam-se o retorno esperado e a variância da carteira, que seriam

µ = 0,25× 0,12 + 0,75× 0,15 = 0,1425

σ2 =(0,25 0,75

) (0,04 0,010,01 0,0324

)(0,250,75

)= 0,0245,

portanto σ =√

0,0245 = 0,1564 <√

0,0324 = 0,1800, ou seja, a variância éinferior à menor das 2 variâncias dos ativos.

Em geral, a variância de uma carteira pode ser reduzida incluindo maisativos, processo conhecido como diversificação.

Considere o caso de um conjunto de n ativos cujos retornos R1, . . . , Rn

sejam variáveis aleatórias descorrelacionadas, todas com valor esperado iguala r1 e variância σ2

1 . Considere uma carteira com retorno P composta porproporções iguais, isto é, 1

n , de cada um dos ativos i. O retorno esperado dacarteira é:

µ = ω′r =n∑

i=1

1n

r1 = r1

e a variância,

σ2 =(

1n . . . 1

n

)(σ2

1I)

1n...1n

= n(

1n

)2σ21 =

1n

σ21 .

Portanto, a variância diminui à medida que aumenta o número de ativos (n)na carteira.

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Análise de Carteiras por Média-Variância 7

Exemplo 1.3 Considere agora o caso em que todos os ativos são correla-cionados e cov(Ri, Rj) = 0,3σ2

1 para i 6= j. Note que

|cov(Ri, Rj)| = 0,3σ21 <

√V ar(Ri)V ar(Rj) = σ2

1 .

Tem-se, nesse caso, que

σ2 =(

1n . . . 1

n

)σ2

1

1 0,3 . . . 0,30,3 1 . . . 0,3...

......

...0,3 . . . . . . 1

1n...1n

=

0,7n

σ21 + 0,3σ2

1 .

Portanto, é impossível reduzir a variância abaixo de 0,3σ21.

Percebe-se que, se os retornos são descorrelacionados, é possível, por meioda diversificação, levar a variância da carteira para zero. No entanto, o Exem-plo 1.3 mostra que, se os retornos são todos positivamente correlacionados, émais difícil reduzir a variância, existindo um limite inferior que não é ultra-passado, como será apresentado adiante.

1.3 Carteiras com 2 Ativos de RiscoSejam R1 e R2 os retornos de 2 ativos com retornos esperados r1 e r2, vari-âncias σ2

1 e σ22 e coeficiente de correlação ρ. Seja uma carteira com retorno

P composta pelos ativos com retornos R1 e R2 nas proporções ω1 e (1− ω1),respectivamente. Segue

P = ω1R1 + (1− ω1)R2, (1.11)µ = ω1r1 + (1− ω1)r2

= ω1(r1 − r2) + r2, (1.12)

σ2 =(ω1 1− ω1

)(σ2

1 ρσ1σ2

ρσ1σ2 σ22

)(ω1

1− ω1

)

= ω21σ2

1 + 2ω1(1− ω1)ρσ1σ2 + (1− ω1)2σ22 . (1.13)

Obtêm-se os seguintes casos:

a) ρ = 1 (correlação positiva perfeita).

Nesse caso, tem-se com base em (1.13) que

σ2 = (ω1σ1 + (1− ω1)σ2)2 ⇒ σ = | ω1σ1 + (1− ω1)σ2 | = |σ2 + ω1(σ1 − σ2) |.Considerando σ1 6= σ2, pode-se escrever

ω1 =σ − σ2

(σ1 − σ2)

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8 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

TABELA 1.2: Retornos e riscos de Bradesco PN e Itaú PN

Ativo ri (%) σi (%)Bradesco PN (R1) 1,39 3,90Itaú PN (R2) 0,15 2,67

e, portanto, a partir de (1.12),

µ =(r1 − r2)(σ1 − σ2)

σ +(σ1r2 − σ2r1)

(σ1 − σ2).

Logo, apresenta-se uma relação linear entre o risco (σ) e o retorno (µ). Aconclusão que se tira a partir dessa relação é que, com uma carteira compostapor ativos com correlação positiva perfeita, não se consegue melhorar a relaçãorisco-retorno (ou seja, risco e retorno serão sempre linearmente proporcionais).

Exemplo 1.4 Tomando como exemplo dois ativos com coeficiente de corre-lação igual a 1 e seus respectivos riscos e retornos, em porcentagens, dadospela Tabela 1.2, e variando o valor de ω1 de 0 a 1, tem-se a seguinte relação,mostrada no gráfico da Figura 1.1:

µ = 1,0081σ − 2,5417%

s

0,15%

1,39%

m

2,67% 3,90%

1w = 0

1w =1

FIGURA 1.1: Correlação positiva perfeita

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Análise de Carteiras por Média-Variância 9

b) ρ = −1 (correlação negativa perfeita).

Nesse caso, de (1.13),

σ2 = (ω1σ1 − (1− ω1)σ2)2 ⇒σ = |ω1σ1 − (1− ω1)σ2|

= |−σ2 + ω1(σ1 + σ2) |.

Tem-se que

σ =

{−σ2 + ω1(σ1 + σ2) se ω1 ≥ σ2

σ1+σ2

σ2 − ω1(σ1 + σ2) se ω1 ≤ σ2σ1+σ2

.

O risco nulo corresponde à situação

σ = 0 = σ2 − ω1(σ1 + σ2) ⇒ ω1 =σ2

σ1 + σ2.

A partir de (1.12) tem-se então 2 possibilidades:

1. ω1 ≤ σ2σ1+σ2

ω1 =σ2 − σ

σ1 + σ2⇒ µ =

r2 − r1

σ1 + σ2σ +

σ2r1 + σ1r2

σ1 + σ2.

2. σ2σ1+σ2

≤ ω1 ⇒

ω1 =σ2 + σ

σ1 + σ2⇒ µ =

r1 − r2

σ1 + σ2σ +

σ2r1 + σ1r2

σ1 + σ2.

A conclusão a que se pode chegar é que, ao contrário do caso anterior, umacarteira composta por 2 ativos com correlação perfeitamente negativa diminuio risco relativo ao retorno, permitindo até mesmo a situação de risco nulo.Tem-se, nesse caso, sob o ponto de vista de redução do risco, uma vantagemem se montar a carteira.

Exemplo 1.5 Tomando o exemplo da Tabela 1.2 com ρ = −1, resultam asseguintes equações, representadas na Figura 1.2:

µ1 = 0,1887σ + 0,6539µ2 = −0,1887σ + 0,6539.

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10 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

s

0,15%

1,39%

0,6539%

m

2,67% 3,90%

w

w

w

1

1

1

= 0

= 0,4064

= 1

FIGURA 1.2: Correlação negativa perfeita

Observação 1.1 Note que seria possível escrever

R = r + vZ, R =(

R1

R2

), r =

(r1

r2

), v =

(σ1

−σ2

),

em que Z é uma variável aleatória com média nula e variância igual a 1, jáque, a partir de (1.11) tem-se

E(R) = r + vE(Z) = r,

cov(R) = E((R− r)(R− r)′) = vE(Z2)v′

=(

σ1

−σ2

) (σ1 −σ2

)

=(

σ21 −σ1σ2

−σ1σ2 σ22

).

Com a composição( σ2

σ1+σ2

1− σ2σ1+σ2

)=

( σ2σ1+σ2

σ1σ1+σ2

), obtêm-se

P =1

σ1 + σ2

(σ2 σ1

)R

=1

σ1 + σ2

((σ2 σ1

)r +

(σ2 σ1

)(σ1

−σ2

)Z

)

=1

σ1 + σ2(σ2r1 + σ1r2),

portanto o termo com risco (Z) foi eliminado.

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Análise de Carteiras por Média-Variância 11

Na prática, nenhuma das situações descritas (| ρ | = 1) ocorre. A seguir,apresenta-se o caso em que | ρ | < 1.

c) | ρ | < 1.

Nesse caso, é conveniente reescrever a equação da variância (1.13) daseguinte forma:

σ2 = (σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2)ω21 − 2(σ2

2 − ρσ1σ2)ω1 + σ22

e como de (1.12)

µ = ω1(r1 − r2) + r2 ⇒ ω1 =µ− r2

(r1 − r2)

(assume-se r1 6= r2), segue que

σ2 − (σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2)(µ− r2

r1 − r2)2 + 2(σ2

2 − ρσ1σ2)(µ− r2

r1 − r2)− σ2

2 = 0.

Denotando

c = σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2, d = σ22 − ρσ1σ2, e = r1 − r2,

segue queσ2 − c(

µ− r2

e)2 + 2 d (

µ− r2

e)− σ2

2 = 0

e após algumas manipulações, tem-se

1σ2

2 − d2

c

σ2 − 1(σ2

2 − d2

c )( e2

c )(µ− (r2 +

de

c))2 = 1. (1.14)

Note que c > 0, pois

0 ≤ (σ1 − σ2)2 = σ21 + σ2

2 − 2σ1σ2 < σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2 = c

e σ22 − d2

c > 0, tendo em vista que

σ22c− d2 = σ2

2(σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2)− (σ22 − ρσ1σ2)2 = σ2

1σ22(1− ρ2) > 0.

A equação reduzida de uma hipérbole com centro (x0, y0) é dada pelaequação

1a2

(x− x0)2 − 1b2

(y − y0)2 = 1 (1.15)

e as retas assíntotas, por

y =b

a(x− x0) + y0 (inclinação positiva)

y = − b

a(x− x0) + y0 (inclinação negativa).

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12 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

Chamando de

a =

√σ2

2 −d2

c, b =

√(σ2

2 −d2

c)(

e2

c),

verifica-se que (1.14) pode ser colocada na forma

1a2

σ2 − 1b2

(µ− (r2 +de

c))2 = 1. (1.16)

Comparando (1.15) com (1.16), conclui-se que (1.16) representa uma hipérbolecom centro em

(σ0, µ0) = (0, r2 +(σ2

2 − ρσ1σ2)(r1 − r2)σ2

1 + σ22 − 2ρσ1σ2

)

e assíntotas

µ = ± |r1 − r2|√σ2

1 + σ22 − 2ρσ1σ2

σ + (r2 +(σ2

2 − ρσ1σ2)(r1 − r2)σ2

1 + σ22 − 2ρσ1σ2

).

Essa curva possui um ponto de mínimo risco, σmin, com retorno

r2 +(σ2

2 − ρσ1σ2)(r1 − r2)σ2

1 + σ22 − 2ρσ1σ2

.

Obtém-se

σmin = σ1σ2

√1− ρ2

σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2. (1.17)

A conclusão a que se chega nesse caso é que é possível reduzir o risco (comeventual perda de rentabilidade) ao montar uma carteira com dois ativos.

Exemplo 1.6 Tomando o exemplo da Tabela 1.2 com ρ = 0,5 tem-se a seguinteequação, representada na Figura 1.3,

σ2 − 7,7562µ2 + 5,4275µ− 7,7685 = 0.

A composição da carteira que fornece o menor risco, bem como o seu retornoe risco associados, são dados por

ω1 = 0,1612, σ = 2,6113%, µ = 0,3499%.

Deve-se notar que, à medida que ρ varia de 1 a −1, a curva risco-retorno,inicialmente uma reta (ρ = 1), aproxima-se dos dois segmentos de reta querepresentam o caso ρ = −1. Existe um valor de ρ a partir do qual não se con-segue reduzir o risco da carteira, quando comparado com os valores individuais

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Análise de Carteiras por Média-Variância 13

s

m

0,3499%

1,39%

0,15%

2,6113% 2,67% 3,9%

1= 1

w

w

w

1= 0

1= 0,1612

FIGURA 1.3: Gráfico risco-retorno para ρ = 0,5

σ1 e σ2. Para calcular esse valor, basta fazer, em (1.17), σmin = min{σ1, σ2}.Tem-se

min{σ1, σ2} = σ1σ2

√1− ρ2

σ21 + σ2

2 − 2ρσ1σ2⇒ ρ =

min{σ1, σ2}max{σ1, σ2} .

Logo, para valores de ρ ≥ min{σ1,σ2}max{σ1,σ2} , não é possível reduzir o risco para valores

menores que min{σ1, σ2}. Essas situações são ilustradas na Figura 1.4, em quemin{σ1, σ2} = σ2.

s

m

1

2

r

rr

R

R

= -1

= 1= 0,5

FIGURA 1.4: Gráfico risco-retorno para diferentes ρ

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14 Análise de Risco e Retorno em Investimentos Financeiros

1.4 Carteiras com 1 Ativo de Risco e 1 sem RiscoConsidere agora uma carteira composta por 2 ativos, mas, neste caso, um delessem risco. Utilizando a notação anterior e sendo o ativo sem risco com retornoR1 = rf (logo, σ1 = 0), o retorno da carteira é como em (1.11), isto é,

P = ω1rf + (1− ω1)R2,

portanto, o retorno esperado é dado por

µ = ω1rf + (1− ω1)r2 = r2 + (rf − r2)ω1.

Já a equação da variância fica na forma

σ2 = (1− ω1)2σ22 ,

assim,ω1 = 1− σ

σ2;

o que leva a

µ = r2 + (rf − r2)(1− σ

σ2)

= rf + (r2 − rf )σ

σ2. (1.18)

Portanto, a curva risco-retorno é uma reta com coeficiente angular

(r2 − rf )σ2

.

Exemplo 1.7 Tomando o exemplo da Tabela 1.2 com o ativo R1 substituídopor uma aplicação livre de risco cujo retorno diário é 0,05%, tem-se a seguinteequação, representada na Figura 1.5:

µ = 0,05% + 0,0374σ.

1.5 ExercíciosOs Exercícios 1, 2 e 3 seguintes são solucionados e utilizam a planilha Exer-cícios.xls, disponível no site www.manole.com.br/analisederisco. Um maiordetalhamento é apresentado no Apêndice D. As respostas desses exercíciosencontram-se no final do livro. O universo de ativos é definido pelas açõescujas séries históricas de preços e retornos encontram-se na pasta Dados.