Análise de Déficit de Trabalho Decente: Empresa MRV … · 2 Instituto Observatório Social...

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1 SÃO PAULO MARÇO 2012 SEDE NACIONAL Rua Dona Brígida 299 - Vila Mariana São Paulo/ SP Fone: (+ 55 11) 3105-0884 / Fax: (+ 55 11) 3107-0538 [email protected] www.os.org.br Análise de Déficit de Trabalho Decente: Empresa MRV (construção civil)

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1

SÃO PAULO

MARÇO 2012

SEDE NACIONAL

Rua Dona Brígida 299 - Vila Mariana – São Paulo/ SP

Fone: (+ 55 11) 3105-0884 / Fax: (+ 55 11) 3107-0538

[email protected]

www.os.org.br

Análise de Déficit de

Trabalho Decente:

Empresa MRV (construção civil)

ver

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Instituto Observatório Social

DIRETORIA EXECUTIVA – CUT

Aparecido Donizeti da Silva

Vagner Freitas de Moraes

João Antônio Felício

Valeir Ertle

DIRETORIA EXECUTIVA – CEDEC Maria Inês Barreto

DIRETORIA EXECUTIVA – UNITRABALHO Carlos Roberto Horta

DIRETORIA EXECUTIVA – DIEESE João Vicente Silva Cayres

CONSELHO DIRETOR – CUT Rosane da Silva

Aparecido Donizeti da Silva

Denise Motta Dau

Quintino Marques Severo

Vagner Freitas de Moraes

Jacy Afonso de Melo

João Antônio Felício

Valeir Ertle

CONSELHO DIRETOR – DIEESE

Maria Luzia Feltes

João Vicente Silva Cayres

CONSELHO DIRETOR – UNITRABALHO

Francisco José Carvalho Mazzeu

Silvia Araújo

CONSELHO DIRETOR - CEDEC TulloVigevani

Maria Inês Barreto

CONSELHO FISCAL EFETIVO Alci Matos Araújo

Manoel Messias Nascimento Melo

Antônio Sabóia Barros Junior

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CONSELHO FISCAL SUPLENCIA José Celestino Lourenço

Adeílson Ribeiro Telles

Eduardo Alves Pacheco

COORDENAÇÃO TÉCNICA

Coordenador institucional: Amarildo Dudu Bolito

Coordenadora de pesquisa: Lilian Arruda

COORDENAÇÃO DA PESQUISA

IOS: Hélio da Costa e Lilian Arruda

Coordenadora por ACTRAV-OIT: Carmen Benitez Gambirazio

EQUIPE TÉCNICA

Juliana Sousa

Lilian Arruda

Leandro Souza

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Sumário Introdução ..................................................................................................................................... 5

Metodologia de indicadores de Trabalho Decente ................................................................... 6

1. Oportunidades de emprego .............................................................................................. 7

2. Trabalho inaceitável .......................................................................................................... 7

3. Salários adequados e trabalho produtivo ......................................................................... 8

4. Jornada Decente ................................................................................................................ 8

5. Estabilidade e garantia no trabalho .................................................................................. 9

6. Equilíbrio entre trabalho e vida familiar ........................................................................... 9

7. Tratamento justo no emprego ........................................................................................ 10

8. Trabalho seguro ............................................................................................................... 11

9. Proteção social na empresa ............................................................................................ 11

10. Diálogo social................................................................................................................. 12

11. Trabalho doméstico ....................................................................................................... 13

1. Panorama da Indústria da Construção Civil no Brasil ............................................................. 14

1.1. Breve histórico do setor da construção civil .................................................................... 14

1.2. Conjuntura brasileira e da Construção Civil nos cenários recente e atual....................... 15

1.3. Trabalhadoras e Trabalhadores na Construção ............................................................... 19

2. Perfil da empresa MRV Engenharia e Participações: .............................................................. 29

2.1. Dados da empresa: ........................................................................................................... 29

2.2. Responsabilidade Social ................................................................................................... 29

3. Análise de déficit de Trabalho Decente .................................................................................. 31

3.1. Oportunidade de emprego............................................................................................... 32

3.2. Trabalho inaceitável ......................................................................................................... 34

3.3. Salários adequados e trabalho produtivo ........................................................................ 35

3.4. Jornada decente ............................................................................................................... 39

3.5. Estabilidade e garantia de trabalho ................................................................................. 40

3.6. Equilíbrio entre trabalho e vida familiar .......................................................................... 41

3.7. Tratamento digno no emprego ........................................................................................ 42

3.8. Trabalho seguro ............................................................................................................... 43

3.9. Proteção social na empresa ............................................................................................. 46

3.10. Diálogo social ................................................................................................................. 47

Considerações finais .................................................................................................................... 49

Referências .................................................................................................................................. 51

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Introdução

O Instituto Observatório Social (IOS) tem adotado a Declaração de Princípios e

Direitos Fundamentais no Trabalho (liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito

de negociação coletiva, eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório,

abolição efetiva de trabalho infantil, e a eliminação da discriminação em matéria de emprego

e ocupação) e as Convenções da OIT nelas incluídas como principais referências para a

construção de seus indicadores e metodologia. Mas a própria OIT fixou como seu objetivo

central a promoção de um trabalho decente para todos os homens e mulheres em qualquer

parte do mundo, combinando quatro pilares estratégicos: a promoção de emprego com

proteção social, respeito aos Direitos Fundamentais do Trabalho (DFTs) e com diálogo

social. Trabalho Decente é definido como "oportunidades a que mulheres e homens possam

obter um trabalho digno e produtivo em condições de liberdade, equidade, segurança e

dignidade humana"1.

O Observatório Social, neste trabalho, amplia o escopo de abordagem em suas

pesquisas, adotando o conceito de Trabalho Decente desenvolvido pela OIT. Neste sentido, o

desafio do IOS foi adaptar os indicadores para o nível da empresa e incluir dimensões até

então ausentes na referência de análise. Para isso, criou um conjunto de indicadores que

norteiam o trabalho de pesquisa, a confecção desses indicadores está assentada nas

convenções da OIT. O texto da proposta de indicadores foi apresentado ao Escritório de

Atividades para os Trabalhadores (ACTRAV) que faz parte da OIT. A ACTRAV

contribuiu fornecendo insumos técnicos: a seleção de convenções e proposta de indicadores.

A construção de indicadores tem o objetivo de monitorar o déficit de Trabalho

Decente mediante pesquisas, comparar realidades distintas no que se refere às condições de

trabalho, disponibilizar mais uma ferramenta para a ação sindical e, simultaneamente ao

processo de pesquisa, difundir o conceito de trabalho decente entre trabalhadores e

organizações sindicais.

1 ILO, Decent Work: Report of the Director General, International Labour Conference, 87

th Session.

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Os indicadores são divididos em 10 temas, de acordo com o conceito de Trabalho

Decente: oportunidades de emprego, trabalho inaceitável, salários adequados de trabalhos

produtivos, jornada decente, estabilidade e garantia de trabalho, equilíbrio entre trabalho e

vida familiar, tratamento digno no emprego, trabalho seguro, proteção social, diálogo social.

O tema, contexto socioeconômico, embora faça parte do conceito de Trabalho Decente, não

está entre os temas abordados pelos indicadores do IOS, uma vez que não é aplicável ao nível

da empresa, condiciona, contudo, os outros aspectos que compõem o conceito de Trabalho

Decente.

Este estudo faz parte de um projeto desenvolvido com a Central Única dos

Trabalhadores (CUT) que tem o objetivo, permeando formação sindical e pesquisa, de

estabelecer uma plataforma de negociação coletiva. Nesse sentido, a execução do projeto é

uma parceria entre as seguintes entidades da CUT: Secretaria Nacional de Formação (SNF),

Secretaria de Relações de Trabalho (SRT) e Instituto Observatório Social (IOS) com o apoio

da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

As empresas a serem estudados foram escolhidas juntamente com os ramos e

sindicatos dos setores a serem estudados: construção civil, hotelaria, têxtil e calçados, trabalho

doméstico. Este relatório especificamente vai analisar as condições de trabalho da MRV.

Metodologia de indicadores de Trabalho Decente

A construção de indicadores de Trabalho Decente foi um trabalho coletivo dos

pesquisadores do IOS, baseado em convenções da OIT. A partir dos indicadores foram

construídas as ferramentas da pesquisa, questionários para dirigentes sindicais e

trabalhadores, com a colaboração a SNF e SRT e, posteriormente, com a colaboração de

dirigentes sindicais presentes nos módulos de formação. As convenções da OIT foram

utilizadas de acordo com os temas abordados:

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

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7

1. Oportunidades de emprego

- Convenio 88 sobre el servicio de empleo

- Convenio 122 sobre la política del empleo, 1964

- Recomendación 122 sobre la política del empleo, 1964

- Recomendación 169 sobre la política del empleo (disposiciones

complementarias), 1984

- Convenio 181 sobre las agencias de empleo privadas, 1997

- Recomendación 188 sobre las agencias de empleo privadas, 1997

- Convenio 142 sobre desarrollo de los recursos humanos, 1975

- Recomendación 195 sobre el desarrollo de los recursos humanos, 2004

Os indicadores relativos à existência de oportunidades de emprego para todos que

procurem trabalho, referem-se às informações sobre emprego/participação entre mulheres,

jovens (15 a 24 anos) no emprego assalariado. Além disso, verifica a presença de

trabalhadores terceirizados e informais. As informações são comparadas com a média do setor

e, se necessário, da região.

2. Trabalho inaceitável

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio 29 sobre el trabajo forzoso, 1930

- Convenio 105 sobre la abolición del trabajo forzoso

- Convenio 138 sobre la edad mínima, 1973

- Recomendación 146 sobre la edad mínima, 1973

- Convenio 182 sobre las peores formas de trabajo infantil, 1999

- Recomendación 190 sobre las peores formas de trabajo infantil, 1999

A OIT identificou duas formas de trabalho inaceitáveis: trabalho escravo e trabalho

infantil. Estas sugestões não se aplicam ao nível da empresa, sendo necessário partir das

reflexões que o IOS já acumulou para construir os indicadores. É possível, porém, encontrar

tais formas de trabalho na cadeia produtiva e na cadeia de fornecedores. Pode haver também,

situações de trabalho de menores de idade em condições, penosas, periculosas e insalubres.

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3. Salários adequados e trabalho produtivo

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio 131 sobre la fijación de salarios mínimos, 1970

- Recomendación 135 sobre la fijación de salarios mínimos, 1970

- Convenio 140 sobre la licencia pagada de estudios, 1974

- Convenio 95 sobre la protección del salario, 1949

- Recomendación 85 sobre la protección del salario, 1949

Estes indicadores referem-se ao trabalho que garanta rendimentos e assegure o bem

estar do trabalhador e de seus familiares. O trabalho deve assegurar o aspecto dinâmico da

continuidade da garantia de remuneração, por exemplo, o da melhoria do trabalho futuro via

treinamento e escolarização.

4. Jornada Decente

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio 47, sobre las 40 horas, 1935

- Convenio 14 sobre el descanso semanal (industria), 1921

- Convenio 89 sobre el trabajo nocturno (mujeres) (revisado), 1948

- Protocolo de 1990 relativo al Convenio (revisado) sobre el trabajo nocturno

(mujeres), 1948

- Convenio 106 sobre el descanso semanal (comercio y oficinas), 1957

- Recomendación 103 sobre el descanso semanal (comercio y oficinas), 1957

- Convenio 132 y Convenio 52 sobre las vacaciones pagadas (revisado), 1970-

- Convenio 171 sobre el trabajo nocturno, 1990

- Recomendación 178 sobre el trabajo nocturno, 1990

- Convenio 175 sobre el trabajo a tiempo parcial, 1994

- Recomendación 182 sobre el trabajo a tiempo parcial, 1994

- Recomendación 116 sobre la reducción de la duración del trabajo, 1962

Três aspectos do TD estão relacionados à jornada decente: horas excessivas de

trabalho (jornada excessiva) e jornada atípica podem ser prejudiciais à saúde física e mental

e impedem o equilíbrio entre trabalho e vida familiar; jornada excessiva é um sinal de salário

inadequado; jornada de curta duração (jornada insuficiente) pode indicar oportunidades de

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emprego inadequadas.

5. Estabilidade e garantia no trabalho

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio N.° 44, sobre el desempleo; Recomendación N.° 44, sobre el desempleo y

- - Recomendación N.° 176, sobre el fomento del empleo y la protección contra el

desempleo.

- Convenio N.° 158, sobre la terminación de la relación de trabajo; Recomendación

N.° 166, sobre la terminación de la relación de trabajo.

- Recomendación 198 sobre la relación de trabajo, 2006

Aqui se trata de estabilidade e segurança do emprego, considerado um dos mais

importantes aspectos do TD. A perda do emprego afeta os custos econômicos, a acumulação

de capital humano, os sistemas e o acesso a benefícios e pensões, bem como a vida pessoal.

Podem ser analisados os seguintes aspectos: duração do emprego inferior a um

ano; emprego temporário, percepção da segurança no emprego no futuro.

6. Equilíbrio entre trabalho e vida familiar

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio 156 sobre los trabajadores con responsabilidades familiares,

1981

- Recomendación 156 sobre los trabajadores con responsabilidades familiares, 1981

Esta conciliação é uma preocupação das políticas públicas em muitos países, é

basicamente uma questão de gênero. O cuidado das crianças e de outros familiares é central

para se alcançar as Metas do Milênio da ONU.

O princípio da OIT (C. 156) é que as pessoas que tenham responsabilidades

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familiares possam obter emprego, sem serem discriminadas. As responsabilidades familiares

não devem ser motivo para demissão.

Questões gerais relativas às políticas de emprego neste sentido: proteção do

emprego para empregados que tenham que se ausentar do trabalho para atender contingências

familiares (maternidade e cuidado de filhos); políticas por parte das empresas para que

trabalhadores conciliem trabalho e vida familiar.

7. Tratamento justo no emprego

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio 111 sobre la discriminación (empleo y ocupación), 1958

- Recomendación 111 sobre la discriminación (empleo y ocupación), 1958

- Convenio 100 sobre la igualdad de remuneración, 1951

- Recomendación 90 sobre igualdad de remueneración, 1951

- Convenio 159 sobre la readaptación profesional y el empleo

(personas inválidas), 1983

- Recomendación 99 sobre la adaptación y la readaptación profesionales de los

inválidos, 1955

- Recomendación 168 sobre la readaptación profesional y el empleo (personas

inválidas), 1983

Este tópico refere-se principalmente às Convenções 100 e 111 da OIT. Além delas,

o significado de Tratamento Justo no Emprego compreenderia trabalho sem assédio ou

exposição à violência, autonomia no trabalho, existência de mecanismos justos de solução de

conflitos ou de tratamento de queixas (estes últimos relacionados à existência de diálogo

social).

Entre os indicadores sugeridos estão a 1) segregação ocupacional por sexo e 2) o

percentual de mulheres em cargos de gerência e administração. Entre outros indicadores já

mencionados em itens anteriores, os principais referem-se à participação das mulheres no

emprego, diferenciais salariais em ocupações selecionadas. Duas outras considerações para

futuro desenvolvimento: Segregação por outros motivos (religião, etnia, origem nacional

etc.) e Assédio.

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8. Trabalho seguro

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio núm. 121 y Recomendación núm. 121

- Convenio 81 sobre la inspección del trabajo, 1947

- Recomendación 81 sobre la inspección del trabajo, 1947

- Convenio 120 sobre la higiene (comercio y oficinas), 1964

- Recomendación 120 sobre la higiene (comercio y oficinas), 1964

- Convenio 155 sobre seguridad y salud de los trabajadores, 1981

- Protocolo de 2002 del Convenio sobre seguridad y salud de los trabajadores.

1981

- Recomendación 164 sobre seguridad y salud de los trabajadores, 1981

- Convenio 161 sobre los servicios de salud en el trabajo, 1985

- Recomendación 171 sobre los servicios de salud en el trabajo, 1985

- Convenio 167 sobre seguridad y salud en la construcción, 1988

- Recomendación 175 sobre seguridad y salud en la construcción, 1988

- Convenio 187 sobre el marco promocional para la seguridad y salud en el

trabajo, 2006

- Recomendación 194 sobre la lista de enfermedades profesionales, 2002

- Recomendación 197 sobre el marco promocional para la seguridad y salud en el trabajo, 2006

O tema “Segurança e Saúde no Trabalho” está relacionado com condições que

preservem e promovam a integridade física e psicológica do trabalhador. Algumas questões

devem ser abordadas: número de acidentes ocorridos em determinado período; incidência de

doenças ocupacionais; avaliação da atuação da CIPA.

9. Proteção social na empresa

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Convenio 103, sobre la protección de la maternidad

- Convenio 102 sobre la seguridad social (norma mínima), 1952

- Convenio núm. 102

- Convenio núm. 130 y Recomendación núm. 134

- Convenio núm. 168 y Recomendación núm. 176

- Convenio núm. 128 y Recomendación núm. 131

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Proteção contra as contingências da vida, tais como doenças, envelhecimento e

deficiência física e mental, bem como da pobreza.

Em estudos sobre empresas, o grau com que estas se preocupam com a seguridade

dos seus empregados poderia ser medido através de normas e sistemas como: fundos privados

de aposentadoria e pensão, plano de saúde, licença maternidade (e paternidade). Sobre a

licença maternidade, duas dimensões importantes são a duração da licença em relação ao

previsto em lei e a garantia do emprego após o retorno ao trabalho.

10. Diálogo social

As normas da OIT consultadas para compor os indicadores relacionados ao tema:

- Resolución N° 52 sobre los derechos sindicales y su relación con las libertades

civiles (adoptada el 25 de junio de 1970),

- Convenio 87 sobre la libertad sindical y la protección del derecho de

sindicación, 1948

- Convenio 98 sobre el derecho de sindicación y negociación colectiva, 1949

- Convenio 135 sobre los representantes de los trabajadores, 1971

- Recomendación 143 sobre los representantes de los trabajadores, 1971

- Convenio 151 sobre las relaciones de trabajo en la administración pública, 1978

- Recomendación 159 sobre las relaciones de trabajo en la administración

pública, 1978

- Convenio 154 sobre la negociación colectiva, 1981

- Recomendación 91 sobre los contratos colectivos, 1951

- Recomendación 163 sobre la negociación colectiva, 1981

- Convenio 144 sobre la consulta tripartita (normas internacionales del trabajo),

1976

- Recomendación 152 sobre la consulta tripartita (actividades de la Organización

Internacional del Trabajo), 1976

- Recomendación 113 sobre la consulta (ramas de actividad económica y ámbito

nacional), 1960

Considera-se neste tópico o quanto os trabalhadores podem se expressar no âmbito

da empresa em assuntos relativos ao seu trabalho e participar nas decisões sobre as condições

de trabalho. Distinguem formas de participação individual e coletiva, através de

representantes eleitos.

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Os indicadores estão relacionados com organização sindical e à negociação

coletiva, referem-se ao respeito aos acordos e convenções coletivas, livre exercício da ação

sindical e dos trabalhadores, presença da organização no local de trabalho, interlocução

constante com a empresa.

11. Trabalho doméstico

Por fim, para subsidiar a pesquisa sobre emprego doméstico foram utilizadas as

seguintes convenções da OIT:

- Convenção (No 189);

- Recomendação (No 201) sobre Trabalho Decente para as Trabalhadoras e os

Trabalhadores Domésticos de 2011.

Neste caso, os indicadores abordam as especificidades do trabalho doméstico:

jornada excessiva, acúmulo de atividades e desvio de funções, o domicílio da família é o local

de trabalho.

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1. Panorama da Indústria da Construção Civil no Brasil

1.1. Breve histórico do setor da construção civil

A indústria da construção civil registrou, a partir da segunda metade da década

de 1940, de acordo com dados do IBGE, ganho de participação no Produto Interno Bruto

(PIB) brasileiro2. Em análise que abrange o período histórico de 1947 a 1995, o IBGE aponta

que foi em 1980 que a participação do setor da construção3 no PIB do Brasil atingiu a maior

proporção na composição total, respondendo, excepcionalmente, por 31,29% de todo o PIB

brasileiro4, enquanto a agropecuária representou 10,11% e o setor de serviços, 48,95%

5.

Desde meados da década de 1970 a atividade da construção no Brasil tem sido

responsável, analisando as contas nacionais, pela proporção que varia entre 6,3% e 9,6% de

participação na economia. Em termos reais, a construção cresceu, na década de 1970, em

média 10,4% ao ano, tendo o PIB crescido 8,6%, como parâmetro. Nos anos 1970 o sistema

financeiro da habitação possibilitou o amplo financiamento das edificações residenciais, as

administrações públicas investiram significativamente na melhoria da infraestrutura de

transporte, saneamento, educação e saúde, com obras viárias, construção pesada e edificações,

e as empresas ampliaram substancialmente suas instalações produtivas. Em contrapartida, na

década de 1980, em virtude da recessão e superinflação observadas, a atividade da construção

cresceu à taxa de 0,95%, com o PIB expandindo-se à taxa de 3%. No período de 1990 a 1993,

o setor apresentou forte contração, voltando a recuperar-se nos anos seguintes6. De 1995 a

2000, aproximadamente 20 empresas da construção civil figuraram anualmente entre as 500

maiores sociedades anônimas atuantes no mercado brasileiro e, em 2000, os investimentos em

2 Do mesmo modo que a construção civil, atividades como a extrativa mineral, os serviços industriais de

utilidade pública, os setores de comunicação, instituições financeiras e administrações públicas incrementaram

acentuadamente sua participação no PIB nacional a partir da segunda metade do século XX, resultando numa

intensa transformação estrutural da economia brasileira, devido, sobretudo, à forte perda de participação da

agropecuária. Esse quadro de transformação estrutural é observado até a década de 1980, quando o peso do setor

da agropecuária na economia demonstra maior estabilidade (IBGE, 2006: p. 388). 3 De acordo com a Fundação Getúlio Vargas, as empresas da construção abrangem tanto os subsetores da

construção de edifícios e obras de engenharia civil assim como obras de infraestrutura para engenharia elétrica e

de telecomunicações (TEIXEIRA, 2002: p. 18). 4 Como medida da evolução do produto real para a construção civil adotou-se, no período de 1947-1969, o

consumo aparente de cimento. Depois dessa data foram utilizados indicadores a partir da produção física de

insumos típicos da construção, originados na Pesquisa Industrial Mensal de Produção Física, PIM-PF (IBGE,

2006: pp. 420-421). . 5 Idem, p. 389.

6 RAMOS et al., 2000: pp. 1-2.

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construção totalizaram R$ 142,4 bilhões, representando mais da metade dos investimentos

gerais realizados no país7.

Numa análise macroconjuntural, constatamos que, após a introdução do Real

como moeda nacional, a queda da inflação possibilitou a expansão de 5,85% do produto

nacional em 1994 (a maior taxa de crescimento da economia brasileira na década precedente)

e o setor da construção cresceu quase 7%. No entanto, as políticas monetária e fiscal

restritivas adotadas pelo Governo Federal a partir de 1995 – com elevações da taxa real de

juros e contração do consumo interno – impactaram negativamente no desempenho da

economia nacional, penalizando as atividades produtivas bem como o setor da construção.

Em 1997, com a redução dos juros internos anuais, houve elevação da

produção nacional, de 3,27%, e o setor da construção civil apresentou expansão de 7,62%, o

melhor desempenho desde a implantação do Real até aquele momento. Essa expansão foi

devida à ampliação dos mecanismos de crédito para os financiamentos imobiliários e à

valorização da renda das famílias, em virtude da manutenção do processo de estabilização. A

crise dos mercados do sudeste asiático no final de 1997, entretanto, repercutiu na

desaceleração do ritmo de expansão do setor, tendo o governo mais uma vez recorrido a

medidas de aperto fiscal e monetário como estratégia de enfrentamento da crise no cenário

internacional. Alterações na política econômica a partir de 1999, com redução da taxa básica

de juros, a Selic, que caiu de 43,25% em março de 1999 para 15,75% no final de 2000,

impactaram positivamente sobre o ritmo de crescimento do setor da construção e, no decorrer

dos anos 2000, o setor iniciou um processo de recuperação8, porém, com momentos de

oscilação negativa.

1.2. Conjuntura brasileira e da Construção Civil nos cenários recente e atual

Em 2010 a economia brasileira manteve-se engrenada, dando prosseguimento

ao processo de aquecimento reiniciado em 2009: em valores brutos, o PIB cresceu 7,5%,

movimentando, em valores correntes, R$ 3,675 trilhões, ou cerca de US$ 2,2 trilhões. Por sua

7 TEIXEIRA, 2002: pp. 4 e 7.

8 Fonte: TEIXEIRA, pp. 21-27.

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vez, a agropecuária cresceu 6,5%, a indústria registrou alta de 10,1% e os serviços, expansão

de 5,4%.

Vejamos no gráfico 1 a seguir o desempenho do setor da construção civil de

2000 a 2010, observando, como parâmetro de análise, a taxa de crescimento do PIB brasileiro

ao longo da década:

Fonte: IBGE. Banco de dados CBIC.

Elaboração: DIEESE (abril de 2011).

Entre 2001 e 2003 houve retração no desempenho da construção civil nacional,

que apresentou taxas de crescimento negativas, em decorrência da falta de incentivos fiscais,

da restrição do crédito e do inexpressivo financiamento imobiliário. A partir de 2004 o setor

demonstrou sinais de expansão, em função do aumento dos investimentos em obras de

infraestrutura e em unidades habitacionais. Em 2010 houve elevação significativa na taxa de

crescimento da construção civil, de 11,6%, configurando o melhor desempenho dos últimos

24 anos – esse índice expressivo deve levar em conta o crescimento negativo em 2009, de

0,6%, haja vista a crise financeira que teve início em 2008 nos países de economia central e

afetou, em alguma medida, os países periféricos e semiperiféricos.

A recuperação do setor da construção civil, particularmente nos três primeiros

trimestres de 2010, foi resultado do corte nas taxas de juros; da ampliação do crédito – com o

Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) financiando o setor produtivo durante a crise

4,3

1,3 2,7

1,1

5,7

3,2 4 6,1

5,2

-0,6

7,5

2,0

-2,1 -2,2 -3,3

6,6

1,8

4,7 4,9

7,9

-6,3

11,6

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Gráfico 1: Comparativo entre a taxa de crescimento do PIB total

(%) e o Valor Adicionado Bruto, VAB, (%)

na cadeia da Construção Civil

Brasil - PIB pm Construção Civil - VAB pb

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17

financeira de 2009 – e das obras públicas de infraestrutura, atendendo ao Programa de

Aceleração do Crescimento (PAC), e de habitação, previstas no Programa Minha Casa,

Minha Vida. Lançado em março de 2010, o Programa de Aceleração do Crescimento 2

(PAC-2) prevê investimentos no total de R$ 1,59 trilhão em obras, inicialmente entre 2011 e

20149. Já no que diz respeito ao Programa Minha Casa, Minha Vida, prevê-se que sejam

destinados R$ 278,2 bilhões.

As regiões onde se observa maior dinamismo do setor da construção são a

Norte e a Nordeste do país, especialmente impulsionadas pela instalação das obras das usinas

hidrelétricas de Santo Antônio (sob responsabilidade da Santo Antônio Energia) e de Jirau

(empreendimento da Construtora Camargo e Correa), em Rondônia, ambas financiadas pelo

BNDES, e da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Ainda em se tratando dessas obras,

no que se refere à utilização da força de trabalho, elas desencadearam expressivos

movimentos grevistas, motivados sobretudo pelas condições precárias de trabalho10

.

Na tabela abaixo visualizamos a produção bruta gerada por alguns setores

industriais anualmente, incluindo a produção de cimento, o insumo básico do setor da

construção, em período que abrange os anos compreendidos entre 2004 e 2010, e a variação

percentual de 2010 com relação a 2009:

Tabela 1: Produção de Alguns Setores Industriais

Setores 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Variação (%)

2010/2009

Cimento (Mil t.) 35.984 38.705 41.895 46.589 51.884 51.748 59.040 14,1

Fertilizantes (Mil t.) 9.734 8.534 8.772 9.816 8.878 8.373 9.340 11,6

Aço Bruto (Mil t.) 30.365 29.173 29.530 31.672 33.716 26.507 32.820 23,8

Alumínio (Mil t.) ¹ 1.458 1.498 1.605 1.655 1.661 1.535 1.536 0,1

Celulose (Mil t.) ² 9.620 10.352 11.180 11.997 12.697 13.315 14.064 5,6

Papel (Mil t.) 8.452 8.597 8.725 9.010 9.409 9.428 9.792 3,9

Autoveículos (Mil Unid) 2.317 2.531 2.612 2.980 3.216 3.183 3.638 14,3

Fonte: Siacesp, IBS, Abal, SNIC, Anfavea e Bracelpa.

Elaboração: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Anuário da Indústria, 2011:

p. 47).

¹ Produção Primária.

² Inclui pastas de alto rendimento

Em 2010, a produção de cimento no Brasil foi de quase 60 milhões de

toneladas. Tendo apresentado comportamento praticamente estável em 2009 com relação a

2008, a produção de cimento no país em 2010 expandiu-se consideravelmente, apresentando

9 Outros eixos envolvidos no PAC-2 são: PAC Cidade Melhor, PAC Comunidade Cristã, PAC Habitação, PAC

Água e Luz para Todos, PAC transportes e PAC Energia (DIEESE, 2011: p. 25). 10

Fonte: DIEESE, 2011: pp. 4-6.

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variação de 14,1% em relação ao ano precedente. Comparativamente, a produção de cimento,

em termos percentuais, teve crescimento abaixo da taxa de elevação da produção de aço

bruto, de 23,8% em 2010 com relação ao ano anterior, e ligeiramente inferior à expansão da

produção de autoveículos, de 14,3%, conforme indica a tabela 1. Superou, entretanto, o

aumento da produtividade de fertilizantes (11,6%), de alumínio (0,1%), de celulose (5,6%) e

de papel (3,9%).

A indústria de materiais para construção tem se expandido continuamente nos

últimos cinco anos. Entre 2005 e 2009, cresceu cerca de 10% anualmente, depois de uma

estagnação que perdurou por 20 anos. Em 2006 o governo brasileiro iniciou um conjunto de

incentivos orientados à desoneração da produção de materiais de construção, com a isenção

de tributos como o Imposto sobre Produtos Importados (IPI), ampliou a oferta de crédito e os

prazos de financiamento e avançou nos investimentos de infraestrutura. Em 2010, o volume

das vendas de materiais de construção obteve elevação de 15%, em virtude da política de

gestão da economia adotada pelo governo, recuperando, portanto, a queda acentuada que

durou de 2007 a 2009, quando apresentou crescimento negativo superior a 5,0% (retração). O

aporte de financiamentos imobiliários em 2010, com recursos do FGTS (Fundo de Garantia

por Tempo de Serviço) e da poupança, foi de R$ 83,9 bilhões, propiciando a contratação de

aproximadamente um milhão de unidades financiadas11

.

O consumo de cimento tem se elevado nas cinco regiões brasileiras nos últimos

dois anos, conforme observamos na tabela abaixo:

Tabela 2: Consumo Nacional de Cimento por Região Brasileira

em 2009 e 2010 (em toneladas)

Região 2009 2010 Variação

(%) Toneladas % Toneladas %

Norte 3.316.177 6,42 4.257.906 7,11 28,40

Nordeste 10.058.984 19,47 12.295.297 20,54 22,23

Centro-oeste 5.016.988 9,71 5.733.205 9,58 14,28

Sudeste 24.560.878 47,53 27.679.989 46,24 12,70

Sul 8.716.823 16,87 9.901.237 16,54 13,59

Total 51.669.850 100,0 59.867.634 100,0 15,87 Fonte: Sindicato Nacional da Indústria de Cimento – SNIC.

Elaboração: DIEESE, 2011: p. 8.

11

DIEESE, 2011: pp. 6-8.

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19

O consumo nacional de cimento em 2010 apresentou alta de 15,87%, subindo

de 51.669.850 toneladas em 2009 para 59.867.634 toneladas em 2010. De acordo com a

tabela 2, verificamos que a região sudeste consumiu quase a metade de todo o cimento

consumido no Brasil em 2009 e em 2010. No entanto, foram as regiões Norte e Nordeste que

ampliaram sua participação no total de cimento consumido pelo país em 2010, registrando

variação de 28,40% e 22,23%, respectivamente, em relação ao ano anterior. O movimento de

expansão no consumo de cimento nessas regiões explica-se predominantemente pela

instalação de novas plantas industriais. Ademais, em escala nacional, a expansão observada

no setor de construção sinaliza o aquecimento da indústria brasileira de construção pesada,

com investimentos previstos para a consecução das obras de infraestrutura de transportes e

logística, exploração do pré-sal, Copa do Mundo de 2014 e Jogos Olímpicos de 2016 – com

investimentos nas áreas de energia, mobilidade urbana, readequação viária e saneamento, bem

como na construção de aeroportos, estádios e arenas esportivas12

.

Outra característica do setor da construção é seu reduzido coeficiente de

importação, quando comparado a outros segmentos econômicos, utilizando capital, tecnologia

e insumos predominantemente nacionais, sendo sua produção também fundamentalmente

orientada para o mercado doméstico. Como a indústria da construção basicamente não

depende de financiamentos externos, o crescimento do setor não pressiona a balança

comercial e, portanto, o balanço de pagamentos do país. Por outro lado, é um setor

substancialmente impactado pelo nível de juros e dependente de créditos de longo prazo13

.

1.3. Trabalhadoras e Trabalhadores na Construção

O desempenho deste setor proporciona geração e distribuição de renda

ampliadas, com incremento da massa salarial e da cadeia de relações intersetoriais que

mobiliza, em função de sua diversificada demanda industrial. Quanto ao elevado potencial de

criação de empregos do setor, boa parte, contudo, se dá sob a forma de terceirização (também

denominada subempreitada). Em termos médios, a construção responde por 6% do total dos

salários pagos na economia e por 12,47% dos rendimentos dos trabalhadores autônomos14

. A

tabela abaixo (tabela 3) informa acerca da posição ocupada pelos trabalhadores empregados

na construção civil no Brasil em 2008 e 2009:

12

Fonte: DIEESE, 2011: p. 8. 13

TEIXEIRA, 2002: pp. 6-8, 20 e 28. 14

TEIXEIRA, 2002: pp.7 e 20.

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20

Tabela 3: Número de Ocupados na Construção Civil no Brasil

por posição na ocupação – 2008 e 2009

Posição na ocupação 2008 2009 Variação

(%)

Participação

(%)

Empregado com carteira 1.944.908 1.976.408 1,62 28,67

Empregado sem carteira 1.701.648 1.593.440 -6,36 23,11

Funcionário público estatuário 19.755 18.513 -6,29 0,27

Conta própria 2.709.138 2.753.852 1,65 39,94

Empregador 359.537 394.160 9,63 5,72

Trabalhador na construção para o

próprio uso

107.060 102.956 -3,83 1,49

Não remunerado 63.892 55.372 -13,34 0,80

Total 6.905.938 6.894.701 -0,16 100,00

Fonte: IBGE, PNAD.

Elaboração: DIEESE, 2011: p. 9.

Em 2009 havia quase 6,9 milhões de trabalhadoras e trabalhadores empregados

na construção civil no país, o que representa 7,44% dos 92,7 milhões de trabalhadores(as) que

compreendem toda a população ocupada brasileira, de acordo com a Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílio (PNAD-IBGE). Com relação a 2008, observamos que houve ligeira

redução, -0,16%, no número de trabalhadores empregados em 2009 na construção civil no

Brasil. Possuíam carteira assinada, em 2009, 28,67% dos trabalhadores do setor, o que

significa variação positiva de 1,62% em relação ao ano anterior. Já em se tratando dos

empregados sem registro em carteira, portanto trabalhando na informalidade, houve redução

de 6,36% em 2009, representando cerca de 23,11% dos ocupados, o que no entanto ainda é

uma participação bastante elevada. Chama-nos atenção que havia mais de 4,3 milhões de

trabalhadores que não possuíam qualquer tipo de vínculo empregatício – desassistidos da

Seguridade Social e que não puderam contar com benefícios tais como auxílio acidente de

trabalho ou auxílio-doença –, dentre os quais estiveram os empregados sem carteira e os

trabalhadores por conta própria, o que totaliza 63,05% dos ocupados no setor, ou pelo menos

6 em cada 10 trabalhadores empregados na construção civil no país em 2009.

As tabelas a seguir apresentam dados a respeito do total de admitidos, de

desligados e o saldo de trabalhadoras e trabalhadores na construção civil, segundo a faixa

etária (tabela 4) e o grau de instrução (tabela 5), em 2009 e 2010:

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21

Tabela 4: Admitidos, desligados e saldo no setor da construção civil, por faixa etária

Brasil – 2009 e 2010

Faixa etária 2009 2010

Admitidos Desligados Saldo Admitidos Desligados Saldo

Até 24 anos 485.495 400.569 84.926 639.973 521.298 118.675 25 a 29 anos 372.663 338.142 34.521 473.368 428.612 44.456 30 a 39 anos 554.660 515.614 39.046 695.644 644.170 51.474 40 a 49 anos 348.418 328.083 20.335 423.269 393.572 29.697 50 a 64 anos 183.721 183.139 582 225.060 213.634 11.426 65 anos ou mais 5.118 7.334 -2.216 6.683 8.532 -1.849 Total 1.950.078 1.772.893 177.185 2.463.997 2.209.818 254.179 Fonte: CAGED. Lei 4.923/65.

Elaboração: DIEESE, 2011: p. 15.

Obs. O valor dos ignorados consta do total.

Tabela 5: Admitidos, desligados e saldo no setor da construção civil,

por grau de instrução

Brasil – 2009 e 2010

Grau de

Instrução

2009 2010

Admitidos Desligados Saldo Admitidos Desligados Saldo

Analfabeto 21.539 19.462 2.077 25.797 23.598 2.199 Fund. Incompleto 814.681 767.100 47.581 956.011 900.856 55.155 Fund. Completo 436.179 407.226 28.953 539.661 489.611 50.050 Médio Incompleto 169.680 149.917 19.763 227.658 199.197 28.461 Médio Completo 452.707 384.457 68.250 643.128 540.849 102.279 Superior Incompleto 19.985 15.976 4.009 25.417 20.501 4.916 Superior Completo 35.307 28.755 6.552 46.325 35.207 11.118 Total 1.950.078 1.772.893 177.185 2.463.997 2.209.819 254.178 Fonte: CAGED. Lei 4.923/65.

Elaboração: NPI/DIEESE, 2011: p. 15.

Com relação à faixa etária, observamos que o saldo entre admitidos e

desligados indica que a principal faixa etária contemplada com as contratações no setor da

construção civil foi a de jovens de até 24 anos, com quase 85 mil novas contratações em 2009

e em torno de 120 mil em 2010, equivalente a 47% do saldo total para os dois anos. Na

análise do saldo segundo o grau de instrução, constata-se que as vagas geradas foram

ocupadas sobretudo por trabalhadoras e trabalhadores que possuem o ensino médio completo

em 2009 e 2010, aproximadamente 40%. Em seguida, está a proporção de trabalhadoras e

trabalhadores com até o ensino fundamental incompleto, em proporção equivalente a

aproximadamente 28% do saldo total, em 2009 e 22,5% em 2010.

Quanto aos reajustes salariais obtidos em 2010 a partir das negociações

coletivas, assinadas formalmente entre representantes dos trabalhadores e do patronato,

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22

verificamos que houve aumentos reais nos salários em todas as unidades de negociação

acompanhadas, conforme analisamos na tabela a seguir:

Tabela 6: Distribuição dos Reajustes Salariais de Negociações da

Construção e Mobiliário, em comparação com o INPC-IBGE

Brasil – 2008 a 2010

Variação 2008 2009 2010

Nº % Nº % Nº %

Acima do INPC-IBGE 57 100,0 53 93,0 57 100,0 Mais de 5% acima - - - - 5 8,8

De 4,01% a 5% acima 2 3,5 - - 9 15,8 De 3,01% a 4% acima 5 8,8 3 5,3 5 8,8 De 2,01% a 3% acima 13 22,8 17 29,8 15 26,3 De 1,01% a 2% acima 22 38,6 10 17,5 16 28,1 De 0,51% a 1% acima 5 8,8 14 24,6 3 5,3

De 0,01% a 0,5% acima 10 17,5 9 15,8 4 7,0 Igual ao INPC-IBGE - - 2 3,5 - - De 0,01% a 0,5% abaixo - - 2 3,5 - -

Abaixo do INPC-IBGE - - 2 3,5 - -

Total 57 100,0 57 100,0 57 100,0 Fonte: Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS-DIEESE).

Elaboração: DIEESE, 2011: p. 19.

A tabela 6 demonstra que em 2010 os reajustes salariais em 8,8% das 57

unidades pesquisadas, a despeito do que ocorreu nos dois anos precedentes, obtiveram ganhos

acima de 5% da inflação medida pelo INPC-IBGE15

. Outras 9 unidades, o que representa mais

de 15% das negociações estudadas, conquistaram em 2010 reajuste na faixa de 4,01% a 5%

acima da inflação calculada pelo INPC-IBGE. Boa parte das unidades, 31 delas ou 54,4% do

total, observaram ganhos reais de 1,01% a até 3% acima da inflação apurada pelo INPC-

IBGE. No acumulado do último triênio, as faixas de ganho com maior índice de reajustes

foram a de 2,01% a 3% de aumento real, verificada em cerca de 19% dos reajustes

acompanhados, e a faixa que indica aumento real acima de 10% do INPC-IBGE, que

envolveu aproximadamente 16% dos reajustes16

.

No que se refere aos pisos salariais negociados em 2010, os trabalhadores do

setor da construção e mobiliário também perceberam reajustes: dentre os 57 pisos salariais

analisados pelo Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS-DIEESE), somente um foi

reajustado em valor igual à variação do INPC-IBGE desde a última data-base, enquanto as

15

INPC: Índice Nacional de Preços ao Consumidor. 16

Fonte: DIEESE, 2011: p. 20.

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23

demais obtiveram reajustes superiores à inflação, incorporando ganhos reais ao piso salarial17

.

Observamos na tabela a seguir o menor, o maior e o piso salarial médio em unidades de

negociação da construção e do mobiliário pesquisadas, por região geográfica e unidade da

federação brasileira em 2010:

Tabela 7: Piso Salarial (menor, maior e média) um Unidades de Negociação da

Construção e Mobiliário, por Região Geográfica e Unidade da

Federação Brasileira em 2010

Região / UF Menor Piso Maior Piso Valor Médio Nº de pisos

NORTE R$ 570,00 R$ 670,00 R$ 608,77 5

Amazonas R$ 618,13 R$ 618,13 R$ 618,13 1

Pará R$ 570,00 R$ 615,70 R$ 585,23 3

Rondônia R$ 670,00 R$ 670,00 R$ 670,00 1

NORDESTE R$ 510,00 R$ 607,20 R$ 543,33 9

Bahia R$ 520,67 R$ 573,27 R$ 542,56 5

Ceará R$ 525,00 R$ 525,00 R$ 525,00 1

Paraíba R$ 535,00 R$ 535,00 R$ 535,00 1

Pernambuco R$ 607,20 R$ 607,20 R$ 607,20 1

Sergipe R$ 510,00 R$ 510,00 R$ 510,00 1

CENTRO-OESTE R$ 515,00 R$ 550,00 R$ 529,03 5

Distrito Federal R$ 541,73 R$ 541,73 R$ 541,73 1

Goiás R$ 519,20 R$ 550,00 R$ 529,47 3

Mato Grosso do Sul R$ 515,00 R$ 541,73 R$ 541,73 1

SUDESTE R$ 522,50 R$ 886,00 R$ 686,88 27

Espírito Santo R$ 550,40 R$ 564,40 R$ 557,40 2

Minas Gerais R$ 522,50 R$ 605,00 R$ 567,12 9

Rio de Janeiro R$ 581,88 R$ 792,00 R$ 667,70 5

São Paulo R$ 708,07 R$ 886,00 R$ 817,12 11

SUL R$ 511,50 R$ 719,40 R$ 637,57 11

Paraná R$ 605,00 R$ 719,40 R$ 689,70 4

Rio Grande do Sul R$ 511,50 R$ 665,00 R$ 599,38 4

Santa Catarina R$ 587,00 R$ 650,00 R$ 619,00 3

TOTAL R$ 510,00 R$ 886,00 R$ 634,00 57 Nota: Unidades da Federação com apenas um piso salarial registrado em 2010.

Obs.: Para cada unidade de negociação considerou-se somente um piso salarial, correspondente ao

menor valor fixado para o desempenho das atividades-fim das empresas.

Fonte: Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS-DIEESE).

Elaboração: DIEESE, 2011: p. 23.

De acordo com a tabela 7, constatamos que o menor piso salarial garantido aos

trabalhadores da construção civil em 2010 foi negociado em Sergipe, estabelecido em

R$ 510,00, a rigor o valor do salário-mínimo brasileiro naquele ano. O piso salarial mais

17

Nesta análise foi considerado, pelo SAS-DIEESE, em todas as 57 negociações, o menor piso definido para os

trabalhadores alocados nas atividades fins das empresas.

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24

elevado do setor da construção e de mobiliário observado pela pesquisa foi registrado em São

Paulo, a R$ 886,00. O piso salarial médio negociado no país esteve em R$ 634,00 e somente

as regiões Sul e Sudeste ofereceram pisos salariais acima do valor médio calculado para o

Brasil, R$ 719,40 e R$ 886,00, respectivamente. Esses valores mais elevados do piso salarial,

comparativamente a outras regiões brasileiras, contudo, estão bastante aquém do rendimento

médio real auferido em 2010 pelos trabalhadores assalariados em diversos setores da

economia, empregados nas regiões metropolitanas do Brasil e no Distrito Federal, cujo valor

monetário calculado foi da ordem de R$ 1.384,0018

. Isso significa que, na região Sul, o maior

piso salarial do setor da construção e mobiliário verificado correspondia a apenas 51,97%

desse rendimento médio apurado para os assalariados nas regiões metropolitanas em âmbito

nacional e, na região Sudeste, foi correspondente a somente 64,02%.

Em se tratando das mulheres trabalhadoras na construção civil, dados do

Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) apontam que em dez anos, de 1998 a 2008, o

número de trabalhadoras subiu de pouco mais de 83 mil – entre 1,094 milhão de pessoas

empregadas no setor – para 137.969 trabalhadoras – num contingente de aproximadamente 2

milhões de trabalhadores. No período, a ampliação do número de mulheres trabalhadoras na

construção civil foi equivalente a 65%. Explicando essa progressão, o presidente do Sindicato

dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de Manaus (SINTRACOMEC-AM),

Roberto Bernardes, afirmou que as mulheres estão atuando em todas as atividades do

segmento:

“Elas começaram atuando no setor como engenheiras e técnicas de

segurança em canteiros de obras. Agora o trabalho se estendeu para

atividades de pedreiro, ajudantes, azulejistas, ceramistas, eletricistas e

encanadores. Elas são mais dedicadas, muitas delas são qualificadas,

pois fazem cursos e acabam superando os homens” (Roberto

Bernardes, Presidente do SINTRACOMEC-AM)19

.

Também no intuito de explicar a participação crescente das mulheres em todas

as atividades da construção civil, normalmente empresários, dirigentes sindicais e mesmo as

trabalhadoras recorrem a argumentos tais como: “as mulheres são mais detalhistas”, “mais

dedicadas”, “mais cuidadosas” do que os homens, o que configuraria um diferencial positivo

18

Fonte: Pesquisa Emprego e Desemprego (PED). Mercado de Trabalho Metropolitano em 2010. Divulgado em

Janeiro de 2011. 19

Fonte: “Número de mulheres na construção civil cresceu 65% em 10 anos” (26/10/2010). Disponível em:

<http://sintracomec-am.blogspot.com>. Acesso em 14/02/2012.

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25

do ponto de vista das empresas. Entretanto, temos de salientar que essa percepção está

alinhada às representações do imaginário social que, ao associar as habilidades das

trabalhadoras a dons supostamente inerentes ao que se denominaria uma “natureza feminina”

– e não a habilidades culturalmente construídas e desenvolvidas ao longo da vida das

mulheres nas relações sociais – desqualifica e desvaloriza o trabalho das mulheres,

justificando salários inferiores mesmo no desempenho das mesmas funções que os homens,

além de fortalecer a divisão sexual do trabalho e a múltipla jornada de trabalho enfrentada

pelas mulheres em seu cotidiano.

Com relação à sindicalização, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de

Domicílios, do IBGE, apontam que as mulheres constituíram 7,0% do total de trabalhadores

sindicalizados na construção civil em 2009, conforme visualizamos na tabela 8. Como

parâmetro de análise, de acordo com o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da

Construção Civil de Manaus (SINTRACOMEC-AM), no primeiro bimestre de 2009 as

mulheres ocuparam 1.629 vagas dentre mais de 14 mil oportunidades geradas no setor,

equivalente a 11,49%. Já no primeiro bimestre de 2010, 5.258 mulheres foram empregadas na

construção civil, ocupando 5,9% das vagas geradas no período20

.

20

Fonte: “Número de mulheres na construção civil cresceu 65% em 10 anos” (26/10/2010). Disponível em:

<http://sintracomec-am.blogspot.com>. Acesso em 14/02/2012.

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26

Tabela 8: Trabalhadoras e trabalhadores sindicalizados por setor da economia e sexo

no Brasil em 2009

Setor

Homens Mulheres Total

Nos

absolutos %

Nos

absolutos %

Nos

absolutos %

Agrícola 2.543.451 61,7 1.580.778 38,3 4.124.229 100

Indústria 2.224.062 73,7 794.294 26,3 3.018.356 100 Indústria de transformação 1.971.816 72,4 753.501 27,6 2.725.317 100 Construção 552.967 93,0 41.405 7,0 594.372 100 Comércio e reparação 1.130.634 57,7 829.670 42,3 1.960.304 100 Alojamento e alimentação 169.137 48,1 182.580 51,9 351.717 100 Transporte, armazenagem e comunicação 958.840 86,9 144.011 13,1 1.102.851 100 Administração pública 771.801 59,7 520.414 40,3 1.292.215 100 Educação, saúde e serviços sociais 602.128 23,8 1.932.740 76,2 2.534.868 100 Serviços domésticos 21.276 12,0 155.412 88,0 176.688 100 Outros serviços coletivos, sociais e pessoais 217.937 54,8 179.662 45,2 397.599 100 Outras atividades 1.008.174 63,6 576.144 36,4 1.584.318 100 Atividades mal definidas 2.083 47,8 2.277 52,2 4.360 100 Total 10.202.490 59,5 6.939.387 40,5 17.141.877 100

Fonte: IBGE. PNAD.

Elaboração: DIEESE, 2010/2011: p. 193.

Obs. Pessoas de 18 anos ou mais de idade, no período de referência de 365 dias.

Perspectivas para o setor da construção civil

Além das obras de infraestrutura, a fim de preparar o Brasil para sediar os

jogos da Copa do Mundo de 2014 – com a construção e reforma de estádios, ginásios de

esporte, aeroportos, hospedagens, malhas rodoviárias e ferroviárias, assim como dos portos e

do sistema de transporte urbano coletivo –, há expressivas possibilidades de expansão do setor

da construção civil nos próximos anos, em função dos programas socioeconômicos

empreendidos pelo Governo Federal – com investimentos na expansão do setor de energia,

exploração e produção de petróleo e gás, pesquisa mineral e em combustíveis renováveis, na

construção de moradias, em obras de saneamento, mobilidade urbana e pavimentação, bem

como em obras de pronto-atendimento e unidades básicas de saúde, creches e pré-escolas,

quadras esportivas nas escolas, praças e acesso à água potável, dentre outras.

A construção de moradias figura dentre as prioridades às quais há a

necessidade de orientar projetos e desenvolver programas sociais, haja vista o déficit

habitacional que afeta famílias de baixa renda em todo o país. Em 2008, o déficit habitacional

estimado correspondia a 5,546 milhões de domicílios, dos quais 4,628 milhões, ou 83,5%,

estavam localizados nas áreas urbanas do Brasil. Do total do déficit habitacional no país,

36,9% encontravam-se na região Sudeste, o que corresponde a 2,046 milhões de unidades, das

quais 1,969 milhão concentravam-se nas áreas urbanas e 76 mil, na área rural. Logo em

seguida esteve o Nordeste, cujo déficit habitacional somou, ainda em 2008, 1,946 milhão de

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27

moradias estimadas, das quais 1,305 milhão estavam abrangidas nas áreas urbanas e 641 mil,

nas áreas rurais.

O estado de São Paulo respondia pela necessidade de 1,060 milhão de novas

unidades habitacionais em 2008, o que equivalia a 8,2% dos domicílios particulares

permanentes abrangidos naquele ano no estado; deste total, 510 mil domicílios necessários

deveriam estar na Região Metropolitana de São Paulo. O segundo estado classificado por

necessidade de novos domicílios foi a Bahia, com cerca de 485 mil moradias em déficit

habitacional. Em contrapartida, em todo o país, em 2008, havia 7,542 milhões de imóveis

vagos, dentre os quais 72% localizavam-se em áreas urbanas. Desses imóveis vagos, 6,307

milhões estavam em condições de servirem de moradia21

, o que evidencia a preponderância

dos interesses vinculados à especulação imobiliária, que mantém imóveis desocupados na

expectativa de que estes sejam supervalorizados e de que seja possível auferir maiores

rendimentos no médio e longo prazos.

Não obstante o déficit habitacional que afeta sobretudo as famílias de baixa

renda em todo o país, especialmente nas grandes cidades, há os atrasos que vêm sendo

observados na construção e entrega de moradias para a classe média – que utiliza recursos da

caderneta de poupança – bem como as previstas no programa Minha Casa, Minha Vida e em

linhas de financiamentos atrelados ao FGTS. É crescente, nos últimos anos, o número de

consumidores que têm apresentado reclamações ao PROCON contra construtoras e

incorporadoras por atrasos superiores a um ou até dois anos na entrega dos imóveis. Apenas o

PROCON de São Paulo registrou aumento de 1.572 para 1.981 reclamações contra

construtoras e incorporadoras entre o primeiro semestre de 2010 e o primeiro semestre de

2011, das quais um terço queixam-se de descumprimento do contrato. As construtoras, por

sua vez, têm alegado dificuldades para a contratação de mão de obra ou atrasos na entrega de

materiais de construção e na obtenção das cartas expedidas pelas prefeituras, exigidas para a

entrega das chaves.

Diante deste cenário, o Ministério Público Estadual (MPE) e o Sindicato da

Habitação (SECOVI) assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), pelo qual as

construtoras deverão indenizar os compradores em casos de atrasos superiores a seis meses

em relação ao prazo estabelecido em contrato assinado a partir de 26 de novembro: as

construtoras estarão sujeitas a terem de devolver no mínimo 2% do valor já pago do imóvel

por atraso superior a seis meses, mais 0,5% a cada mês de espera. A devolução será feita

21

Estatísticas: Ministério das Cidades, 2008: pp. 29-30 e 43.

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28

mediante desconto no valor devido pelo comprador, em até 90 dias após a entrega das chaves

ou a assinatura da escritura definitiva de compra e venda. Entretanto, o acordo previsto pelo

TAC não é obrigatório, mas sujeito à adesão voluntária da empresa da construção civil22

.

22

Fonte: Estadão. “Atrasos na construção civil” (27/10/2011). Acesso em 17/11/2011.

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29

2. Perfil da empresa MRV Engenharia e Participações

Com sede em Belo Horizonte, Minas Gerais, a MRV Engenharia foi fundada

no dia 1º de outubro de 1979. Desde então atua no segmento imobiliário, definindo-se como

umas das principais construtoras e incorporadoras do país no atendimento à classe média,

ofertando casas e apartamentos em 18 estados e mais de 100 cidades.

A empresa afirma ter desenvolvido, ao longo do tempo, a especialização

necessária no ramo da construção da civil, que “é uma construtora que investe,

permanentemente, no aprimoramento e gestão da qualidade de seus imóveis”, conseguindo

assim efetuar, relata, a comercialização de 135 imóveis por dia23

.

2.1. Dados da empresa:

A MRV, em 2008, empregava 10.493 trabalhadores e, em setembro de 2011,

28.422 trabalhadores. É uma empresa com status jurídico de Sociedade Anônima (S/A) –

portanto, com capital aberto – tendo ações negociadas na Bolsa de Valores, cuja

administração ocorre principalmente mediante deliberação de um Conselho de Administração,

escolhido em Assembleia pelos acionistas, em cumprimento à Lei de Sociedade Anônima.

Em 2010, a MRV Engenharia e Participações obteve uma Receita Líquida de

R$ 881,10 milhões, um aumento de 95,82% se comparado ao ano anterior, posto que, em

2009, atingiu a cifra de R$ 449,93 milhões em Receita Líquida24

.

Ainda no que tange aos números da empresa obtidos em site na internet, até

setembro de 2011 seu lucro líquido foi de R$ 551 milhões ante R$ 482 milhões, considerando

o mesmo período de 2010. No ano de 2011, as vendas contratadas chegaram ao patamar de

R$ 4,3 bilhões, tendo sido lançados 41.825 novos empreendimentos no mesmo ano. Até o

momento, diz a empresa, estão sob sua gerência 340 canteiros de obra.

2.2. Responsabilidade Social

23

Fonte: http://www.facebook.com/mrvengenharia?sk=info. Acesso em 23/02/2013 24

Fonte: http://www.securities.com/Public/company-profile/BR/Mrv_Engenharia_pt_2385476.html. Acesso em

24/02/2012.

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30

Em seus informes, na rede social Facebook, a MRV procura dar ênfase a

diversos reconhecimentos obtidos, notadamente, por seus pares da construção civil. Entre tais

prêmios, constam: o “Top of Mind 2009 – Liderança do Segmento Construtora” e o “Prêmio

Top Imobiliário (2010)”, no qual “ficou entre as 4 maiores empresas ligadas ao setor de

construção das Américas em valor das Américas” etc.

Em continuação, alega que com o propósito de produzir de forma adequada e

atendendo às exigências do mercado, procura obter certificações. A empresa destaca que

conquistou, em 2001, a certificação nível “A” do Programa Brasileiro de Qualidade e

Produtividade na Habitação (PBQP-H), que entre vários aspectos, exige de quem o possui a

constante qualificação de trabalhadores, redução nos índices de desperdício, padronização e

verificação constante e preventiva dos processos, eliminação dos desperdícios e do retrabalho;

assim, priorizando, diz a empresa, a tão propalada “melhoria de qualidade e produtividade do

setor da construção civil”. Sobre esse campo de certificação, a MRV também enfatiza possuir

a ISO 9001, cujas intenções são a criação de parâmetros ao negócio, atendendo às

expectativas dos seus clientes, implementado ações de cunho gerencial qualificando sua

hierarquia e racionalizando recursos humanos e materiais para as operações dos negócios25

.

Em outras palavras, respeitando os termos da Norma 14001,

internacionalmente reconhecida, ao materializar parâmetros do Sistema de Gestão Ambiental,

compatibilizando a rentabilidade almejada pela empresa e a redução dos impactos

ambientais26

.

Por definição, a “missão” das organizações empresariais refere-se a um

instrumento de gestão empresarial que visar conceber, com base nos pressupostos das Teorias

de Administração, o papel a ser desempenhado por estas em relação aos seus negócios.

Procura-se, além do aspecto informativo, demonstrar ao conjunto da sociedade, bem como a

seus trabalhadores, diretrizes, compromissos e clareza nas estratégias dos rumos que nortearão

o empreendimento27

. Na esteira de tais pressupostos, demonstra-se ser essencial que

conheçamos as intencionalidades das organizações e, no caso concreto da MRV Engenharia,

sua “missão” prevê:

Diminuir o déficit habitacional oferecendo imóveis com a melhor

relação custo/benefício do mercado. Gerar resultados crescentes e

sólidos para os acionistas. Promover o desenvolvimento constante dos

25

Fonte: http://www.facebook.com/mrvengenharia?sk=info. Acesso em 24/02/2012. 26

Fonte: http://www.bsibrasil.com.br/certificacao/sistemas_gestao/normas/iso14001/. Acesso em 24/02/2012. 27

Fonte: http://www.strategia.com.br/Estrategia/estrategia_corpo_capitulos_missao.htm. Acesso em 1º/03/2012.

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31

colaboradores e das comunidades, contribuindo para a preservação do

meio ambiente.28

A empresa relata que, no momento, é “a maior operadora atuante no

[programa] Minha Casa, Minha Vida, na faixa de 3 a 10 salários mínimos, a MRV oferece

qualidade a preços baixos”.29

Vale esclarecer que o Minha Casa, Minha Vida é um programa

habitacional do Governo Federal destinado prioritariamente às famílias cuja renda bruta é de

até R$ 1.600,00, mas pode contemplar famílias que tenham renda de até R$ 5.000,00. Trata-se

também, conforme cartilha disponível em sítio na internet, de um programa habitacional que é

realizado, em conjunto, entre a União e outros entes federados (estados e municípios), além de

movimentos sociais e demais parceiros, tendo por meta a construção de 2 milhões de

habitações nos próximos anos.30

3. Análise de Déficit de Trabalho Decente

A análise de déficit de Trabalho Decente foi feita mediante pesquisa que

incluiu oficina sindical31

, pesquisa de campo com trabalhadores e análise de documentos.

A oficina sindical foi realizada com quatro dirigentes do Sindicato dos

Trabalhadores na Indústria da Construção Civil e Montagem do Espírito Santo (Sintracosnt),

filiado à CUT, no dia 27 de fevereiro de 2012, na cidade de Vitória (ES).

A pesquisa de campo foi realizada em uma obra da MRV localizada no

município de Serra, Região Metropolitana de Vitória. Esta obra foi escolhida por indicação do

sindicato, que facilitou o acesso através de representante sindical que atua na obra; ao todo

foram entrevistados nove trabalhadores. Em virtude do tempo escasso e do difícil acesso ao

local da pesquisa e aos trabalhadores para serem entrevistados, optou-se por fazer um estudo

qualitativo, no qual a análise da informação é mais aprofundada.

28

Disponível em: http://www.facebook.com/#!/mrvengenharia?sk=info. Acesso em 1º/03/2012. 29

Disponível em http://www.mrv.com.br/minhacasaminhavida/sobre.aspx. Acesso em 1º/03/2012. 30

Disponível em http://downloads.caixa.gov.br/_arquivos/habita/mcmv/CARTILHACOMPLETA.PDF.

Disponível em 1º/03/2012. 31

Oficina sindical é uma técnica de pesquisa utilizada pelo Observatório Social na qual os dirigentes sindicais

são reunidos e instigados a abordar temas de condições de trabalho de determinada empresa.

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32

3.1. Oportunidade de emprego

De acordo com os dirigentes sindicais, a base do sindicato é composta por

cerca de 5% a 10% de mulheres, que estão concentradas na área administrativa e, nas obras,

no acabamento e rejunte. Na obra pesquisada há apenas uma mulher. Nenhuma mulher foi

entrevistada para esta pesquisa.

Segundo dirigentes sindicais a idade dos trabalhadores é diversificada, não há

predominância de uma faixa etária: “Os novos estão estudando e não querem saber de

obra”32

. Com efeito, os trabalhadores entrevistados no canteiro de obra correspondem a

faixas etárias diversificadas: 4 estão na faixa de 18 a 24 anos, 3 na faixa de 25 a 29 anos e 2

na faixa dos 40 aos 49 anos.

No quesito cor/raça, apenas um trabalhador se autodeclara branco, dois se

autodeclaram pretos e seis se autodeclaram pardos.

Entre os trabalhadores entrevistados, quatro têm ensino fundamental

incompleto, quatro ensino médio incompleto e um ensino médio completo.

De acordo com representantes sindicais, na MRV há muitas empresas

terceirizadas: Plabo Henrique Empreendimentos e Instalações, JJ, ABN, APM, Ferrobras. As

empresas terceirizadas são também chamadas de empreiteiras, “gato” e “gata” – geralmente são

empresas pesquenas que fazem todo tipo de serviço na obra. De acordo com dirigentes sindicais, a

MRV trabalha com mão de obra barata, muitos trabalhadores são oriundos de outros estados,

trabalham de quatro a até seis meses para enviar dinheiro para a família e, muitas vezes, o salário

combinado com o trabalhador não é assegurado. Segundo dirigente sindical:

As empreiteiras deixam o trabalhador na mão, a [empreiteira Pablo] não

pagou os trabalhadores. Gente do Piauí reclamou que, na APM, o

trabalho acordado não foi cumprido (foi acordado alvenaria, chegou aqui

era para colocar bloco), não pagou passagem, retém documentação. A

empresa Morá foi embora, levou carteira de trabalho, deixou trabalhador

sem carteira, deixou trabalhador no alojamento sem refeição, sem água

potável e sem salário. O Sintraconst está forçando empresa a pagar

direitos para trabalhadores irem embora. Empreiteiro vai ao Piauí,

contrata os trabalhadores, eles chegam aqui é outra realidade. O sindicato

tem que pressionar para resolver questões de terceiros.33

32

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 33

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES.

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33

Na MRV os terceiros desempenham todas as funções, como pedreiro, carpinteiro,

eletricista. De acordo com dirigentes sindicais, a mão de obra da MRV é 95% terceirizada ou

quarteirizada. Representantes sindicias relatam que muitas vezes o trabalhador sabe trabalhar bem

e tem liderança, por exemplo o Plabo era eletricista da MRV, mas não tem estrutura

administrativa, então a MRV dá estrutura para trabalhar como empreiteiro, até uniforme é

oferecido pela MRV. Segundo dirigene sindicais, a empreiteira “ acaba colocando um monte de

pião sem carteira... obra para os lados da Tubarão, Porto Canoa, tinha pessoal sem carteira

assinada e até um menor e aposentado por invalidez”.

Na obra pesquisada há 155 trabalhadores, destes 26 são funcionários diretos da

MRV e o restante são terceirizados. Dos 26 diretos da MRV, 16 trabalham no administrativo e

apenas 10 trabalham no canteiro de obra. Entre os trabalhadores entrevistados a situação é a

seguinte:

Tabela 7: Função dos trabalhadores entrevistados

FUNÇÃO DIRETO TERCEIRIZADO

Ajudante de limpeza 1

Pedreiro 1 1

Auxiliar de obra 1

Ajudante geral 2

Betoneiro 1 1

Operador de bobcat 1

Fonte: Pesquisa IOS.

Em relação ao ajudante de limpeza, sua função é limpar banheiros e tirar

entulhos da obra.

A função do betoneiro é a produção de massa, juntar cimento, água e areia;

cada componente é jogado na sua hora e a betoneira é colocada para funcionar. Depois a

massa é transferida para um recipiente. Segundo um terceirizado, para esta função não há

diferenças entre as condições de trabalho entre diretos e terceirizados. Um trabalhador direto

entrevistado tem outra visão: para a função é necessário usar luvas, óculos, botina e avental,

mas, segundo o entrevistado, os terceirizados não fazem o uso do material – caso das

empresas terceirizadas Balbino e FMC, que prestam os serviços de betoneiro.

Os outros entrevistados trabalham na área de alvenaria: dois ajudantes, um

auxiliar de obra e dois pedreiros.

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34

Os ajudantes são terceirizados (empreiteiras JJ e ABM) e sua função é encher

balde com massa e passar para o pedreiro, entregar bloco e limpar área. Um ajudante

terceirizado considera que as suas condições de trabalho são iguais às condições dos diretos,

uma vez que usa os mesmos equipamentos de proteção; o outro terceirizado afirma que “os

empreiteiros algumas vezes não são bem tratados”34

.

Entre os pedreiros, um é direto e o outro é terceirizado, sua função é levantar

paredes, deixar vãos prontos para receber portas e janelas, deixar no ponto para receber a laje,

assentar o bloco, conferir alinhamento, conferir medidas. Na área onde o pedreiro terceirizado

trabalha só há trabalhadores terceirizados.

Quanto ao auxiliar de obra, sua função é distribuir material. Segundo o

entrevistado, há terceirizados na área em que trabalha e para ele não há diferenças nas

condições de trabalho entre eles.

Outro entrevistado é operador de bobcat, sua função é limpeza de entulho,

deslocamento de materiais. Na área em que ele trabalha há terceirizados e ele considera que as

condições dos terceirizados são piores, uma vez que as cobranças sobre eles são maiores, os

salários são mais baixos e há mais problemas de saúde e segurança do trabalho.

3.2. Trabalho inaceitável

No dia 22 de novembro de 2011, o portal de notícias R7, informou que a MRV

responde a dois processos judiciais por força de ações civis públicas impetradas pelo

Ministério Público do Trabalho (MPT). O motivo do ajuizamento das ações adveio da prática

de trabalho escravo em canteiros de obras de responsabilidade da MRV nos municípios de

Americana e São Carlos, no estado de São Paulo.

Em Americana, o MPT pede à companhia indenização no montante de R$ 10

milhões, referente aos possíveis danos causados a trabalhadores submetidos à condição

análoga à escravidão no empreendimento denominado “Beach Park”, ocorrida supostamente

em fevereiro de 2011. No município de São Carlos, a ação pleiteia indenização em razão do

mesmo motivo no valor de R$ 1 milhão, por conta da obra do condomínio “Spazio Monte

Vernon”35

.

34

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 35

Disponível em: http://noticias.r7.com/economia/noticias/construtora-mrv-nega-pratica-de-trabalho-escravo-

20111122.html. Acesso em 1º/03/2012.

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35

De acordo com a reportagem36

, o MPT relata que, em Americana, a construtora

se valia da utilização de empreiteiras na intermediação de mão de obra, isentando-se das

responsabilidades de cunho trabalhista. Na obra, diz a reportagem, o MPT constatou diversos

problemas: 60 trabalhadores não tinham recebido seus salários, bem como estavam em

alojamentos e moradias em desacordo com os padrões legais, sem as mínimas condições de

habitação. Constatou-se, ainda, aliciamento de trabalhadores. Especificamente, no que se

refere às condições a que estavam submetidos os trabalhadores em São Carlos, pela

reportagem foi relatado que se verificou um canteiro de obras que descumpriam as normas

legais de segurança e saúde no trabalho e que detritos acumulados faziam parte da paisagem

do canteiro de obras. A obra, em Americana, ainda de acordo com a reportagem da Agência

Brasil, informa que o empreendimento construído fazia parte do Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC), incluso no programa “Minha Casa, Minha Vida”, ambos do Governo

Federal. Em São Carlos, registrou-se também a inexistência de conservação e higiene de

colchões, não fornecimento de armários, roupas de cama e travesseiros. Foram encontrados

em tais precariedades em torno de 10 a 12 trabalhadores.

De acordo com dirigentes sindicais escutados para esta pesquisa, em obra da MRV

em Porto Canoa (ES) houve caso de menor trabalhando: havia três menores trabalhando, a obra

era da MRV, mas os menores trabalhavam para uma empresa terceirizada. A denúncia chegou ao

sindicato em março de 2011 e, segundo dirigentes sindicais, “era menor trabalhando como

adulto. Denúncias de trabalho de menores é recorrente no setor, menor é auxiliar de obras, é faz

tudo, trabalho de pedreiro, opera máquina. Está sujeito aos mesmos riscos do trabalho”.37

Na obra pesquisada, um trabalhador terceirizado entrevistado confirmou ter

presenciado menor trabalhando na obra de Porto Canoa.

3.3. Salários adequados e trabalho produtivo

Na MRV o salário da maioria dos trabalhadores é o piso, previsto na

Convenção Coletiva de Trabalho 2010/2012:

36

Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2011-11-21/ministerio-do-trabalho-flagra-trabalho-

escravo-em-obras-da-construtora-mrv-no-interior-de-sao-paulo. Acesso em 1º/03/2012 37

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES.

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36

Tabela 8: Tabela de salários CCT-2010-2012/

CARGO SALÁRIO/HORA SALÁRIO/MÊS

Auxiliar de obras R$ 2,50 R$ 550,00

Mensageiro R$ 2,50 R$ 550,00

Auxiliar de escritório R$ 2,50 R$ 550,00

Vigia R$ 2,50 R$ 550,00

Ajudante prático R$ 2,88 R$ 634,52

Oficial (almoxarifado, apontador operador de equipamentos

e demais funções já enquadradas)

R$ 3,41 R$ 749,89

Oficial pleno R$ 4,01 R$ 882,08

Oficial polivalente R$ 4,42 R$ 973,42

Encarregado R$ 4,74 RS 1043,12

Fonte: Convenção Coletiva de Trabalho 2010-2012 (Sintraconst – ES).

A tabela corresponde aos salários executados no ano de 2010, ano em que o

salário mínimo nacional equivalia a R$ 510,00.

O salário do trabalhador terceirizado é condicionado à produtividade (ou

produção). A tendência é ganhar mais, mas, se por algum problema o trabalhador não tiver

condições de trabalhar (más condições de tempo, por exemplo), ele não recebe. Segundo

dirigentes sindicais, todos os terceirizados trabalham por produção e o trabalho é dobrado.

Entre os trabalhadores diretos entrevistados, um afirmou receber salário bruto

de até um 1 salário mínimo (R$ 605,00 bruto e R$ 505,00 líquido) e 4 recebem de 1,01 a 2

salários mínimos (R$ 623,00 a R$ 1.244,00).

Entre os terceirizados, dois trabalhadores afirmaram receber até R$ 622,00 (até

1 salário mínimo) e os dois outros afirmaram receber entre R$ 623,00 e R$ 1.244,00 (entre

1,01 e 2 salários mínimos). Os terceirizados, contudo, informam que “recebem por produção”,

e não o que está registrado na carteira de trabalho: a lógica é “quanto mais se produz mais se

ganha”38

.

Em relação à PLR (Participação nos Lucros e Resultados), dirigentes sindicais

explicaram como esta funciona:

38

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES).

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37

A PLR aqui é PR e usa um sistema de assiduidade, as empresas

querem produtividade. Aqui se fala PR porque no ponto de vista do

sindicato se o trabalhador trabalha, ele tem direito ao resultado, se a

empresa tem prejuízo é por causa da administração, a culpa não é do

trabalhador. A construção civil cresceu muito no ES, é difícil

fiscalizar a PR.39

Dos diretos entrevistados, nenhum recebeu a PR e um entrevistado relatou que

não sabia se tinha “direito a receber PR”40

. Entre os terceirizados, nenhum deles afirmou

conhecer ou receber a PR.

De acordo com um dirigente, as empresas não garantem todos os benefícios a

que os trabalhadores têm direito:

Tem gato que não dá vale transporte, ou você pode escolher o vale

transporte ou o almoço na obra, ou vale transporte ou a cesta básica,

você vai querer o quê? Ele tem direito aos dois, pelo menos o vale

transporte e a cesta básica é garantida na convenção. 41

Na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT 2010-2012) os benefícios em

relação à alimentação são os seguintes: a) Alimentação pronta para o consumo; ou b) Ticket,

cartão-refeição ou cartão-alimentação no valor mensal de R$ 110,00; ou c) cesta alimentação

mensal composta dos seguintes itens: 15 kg de arroz tipo um, 4 kg de feijão tipo um, 1kg de

fubá, 2 kg de farinha de mandioca, 3 latas de óleo de soja, 2 latas ou sacos de elite em pó

integral, 6 kg de açúcar cristal, 1 kg de farinha de trigo, 1 kg de charque dianteiro, 2 kg de

macarrão, 400 g de biscoito tipo maisena, 1 kg de café em pó, 2 tubos de creme dental (com

90 g cada), 1 kg de sabão em barra, 3 sabonetes de 90 g cada, 400 g de biscoito cream-

cracker.42

Os entrevistados relataram benefícios diferenciados: entre os diretos, um

trabalhador relatou que recebe cesta básica e vale transporte, já outro relata que tem apenas o

vale transporte e não tem cesta básica porque almoça no refeitório do canteiro. Segundo o

entrevistado, quem traz almoço de casa recebe a cesta básica e quem almoça no refeitório não

recebe a cesta. O restante dos trabalhadores diretos entrevistados afirmou que não recebe

benefícios.

39

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 40

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 41

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 42

CCT 2012-2012. Cláusula 8- Da alimentação, p. 16.

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38

Entre os terceirizados, um entrevistado afirmou que recebe cesta básica em

forma de mantimento e não recebe vale transporte, pois mora em alojamento da empresa (casa

alugada pela empreiteira e é transportado por uma van para chegar ao trabalho). Outro

acredita que os benefícios recebidos pela empresa são FGTS e Seguro Desemprego. O

restante dos trabalhadores terceirizados afirmou que não recebe nenhum benefício.

Em relação à qualificação na MRV, os dirigentes sindicais afirmaram que já

reivindicaram cursos, “mas a empresa não quer. Terceirizado e empreiteiro não têm cultura

de formação; operador trabalha sem formação, situação que aumenta os riscos; trabalhador

vai operar, ganha um pouco mais, mas não sabe dos riscos”43

. Se o ajudante está operando

na obra, o sindicato obriga a empresa a colocá-lo como profissional e oferecer curso referente

à função. O sindicato exige que quem esteja operando máquinas tem que ter o certificado no

local de trabalho, assim, operadores diretos ou terceirizados tem que ter formação para operar

aparelhos.

Em relação ao plano de cargos e salários (PCS), nenhum entrevistado tem

alguma informação sobre plano de cargos e salário. Um entrevistado afirmou que só sabe que

se tiver Carteira Nacional de Habilitação (CNH) pode passar para a função de operador de

bobcat. Outro trabalhador relatou que não há política de qualificação, pois “a empresa não

tem interesse”. Entre os terceirizados, dois entrevistados acreditam que há um PCS “porque

conforme vai aprendendo vai mudando de função” ou “pois quanto mais aprende vai sendo

promovido, ganha classificação”.44

Em relação à avaliação, apenas dois trabalhadores diretos afirmaram ser

avaliados – um foi avaliado pelo engenheiro, mas não soube precisar os critérios. Outro

trabalhador afirmou que o encarregado “cobra se o serviço está sendo feito

adequadamente”45

. Entre os terceirizados, um entrevistado relata que é avaliado pelo chefe da

empreiteira que atua na obra e, às vezes, é chamado para falar sobre o trabalho. Outro

terceirizado entrevistado relata que o encarregado faz avaliação, mediante conversa com o

trabalhador; outro ainda acredita que a avaliação é feita pelo controle de qualidade.

No que diz respeito a treinamento, um entrevistado afirmou ter recebido

treinamento sobre prevenção de acidentes. Outro entrevistado afirmou que foi o próprio

encarregado que ensinou a operar a máquina bobcat. O restante dos trabalhadores diretos

43

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 44

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 45

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES).

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39

entrevistados não tem qualquer informação sobre treinamento. Entre os terceirizados, um

passou por treinamento que durou meio dia.

3.4. Jornada decente

De acordo com representantes dos trabalhadores, a jornada de trabalho é de

segunda-feira a quinta-feira das 7h às 17h e às sextas-feiras das 7h às 16h. Consta na CCT

“44 horas semanais, sendo nove diárias de segunda a quinta-feira e de 8 horas na sexta-

feira, sendo o sábado compensado pelas horas excedentes trabalhadas nos primeiros quatro

dias da semana”46

. Os dirigentes não têm informação da quantidade de horas extras. Pelo que

se saiba, não há trabalho noturno.

De forma geral, a jornada de trabalho no canteiro pesquisado é de 44 horas

semanais e o que varia são os horários de entrada e saída: pode ser de segunda-feira a quinta-

feira das 7h às 17h e às sextas-feiras das 7h às 16h ou das 7h às 12h e das 13h às 17h de

segunda-feira a sexta-feira, dependendo da empresa que presta o serviço. Um terceirizado

relatou que sua jornada é de 48 horas semanais porque trabalha por produção, “quanto mais

trabalhamos vamos ganhar mais”.47

Dois entrevistados afirmaram que a jornada é de 40

horas semanais.

No acordo com os dirigentes, a hora extra de segunda-feira a sexta-feira tem o

acréscimo de 75% a 100%, aos sábados 100% e aos domingos 150%. Ainda segundo os

dirigentes, “a empresa não avisa com antecedência; sexta-feira avisa que vai haver hora

extra no sábado e retalha quem não quer fazer hora extra”48

. De forma geral, os

trabalhadores são escalados de um dia para o outro para fazer hora extra, ou no final da

jornada.

Nem todos entrevistados realizam horas extras. Segundo um trabalhador direto

entrevistado, elas são realizadas de acordo com a necessidade da obra – cerca de 3 horas

semanais. O trabalhador direto afirmou ter sido avisado com um dia de antecedência sobre a

necessidade de hora extra. Um trabalhador terceirizado afirmou que é avisado no mesmo dia

sobre a necessidade de horas extras que ocorrem no final do dia e, às vezes, trabalha aos

sábados, mas nunca trabalhou aos domingos. Dois trabalhadores diretos afirmaram trabalhar

46

CCT 2010-2012. Cláusula 12 – Da jornada de trabalho, p.20. 47

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES) 48

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES.

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40

aos sábados e um deles afirmou ter trabalhado no domingo apenas uma vez. Todos que

desempenham hora extra afirmam que esta é remunerada, não há banco de horas.

Todos afirmaram que é possível recusar a realização de horas extras. Porém,

um terceirizado afirmou que “a chefia não gosta” que recuse e os demais não apontaram

problemas na recusa de horas extras. Outro direto afirmou que a empresa “já informou na

contratação de que haveria horas extras. Caso sejam recusadas, seria ruim para o

trabalhador”.49

Para um terceirizado, que trabalha por produção, a noção de hora extra não é

utilizada, afirma que não faz hora extra, que não recebe e nem há banco de horas, uma vez

que trabalha por produção. Ele costuma trabalhar aos sábados.

3.5. Estabilidade e garantia de trabalho

Os representantes sindicais relatam que na MRV não há rotatividade, mas nas

empreiteiras sim. A MRV mantém um quadro de funcionários que é pequeno. Dados da

composição de trabalhadores no canteiro pesquisado confirmam a afirmação do dirigente (p.

31). No estado do Espírito Santo o contrato de experiência é de 30 dias, conforme a CCT. A

MRV atua no estado há cerca de cinco anos. Os dirigentes sindicais não têm informações

sobre temporários e/ou reestruturações na empresa nos últimos três anos.

Os trabalhadores entrevistados estão há pouco tempo contratados, tanto diretos

como terceirizados: apenas um trabalhador está na faixa de 1 a 2 anos trabalhando na empresa

e o restante está há menos de um ano na empresa.

Dos entrevistados, apenas dois têm expectativa de estar na empresa

transcorrido um ano após a data da entrevista. Um trabalhador relata “nem todo mundo se

sente seguro”, deu o exemplo de uma obra em Camburi que foi interrompida pela empresa e

todos trabalhadores foram transferidos50

. O entrevistado relatou que no contrato individual de

trabalho há uma cláusula que prevê o deslocamento do local de trabalho. Outro trabalhador

afirmou que se manteria na MRV em uma função melhor, mas não na função que estava

desempenhando no momento.

49

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 50

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES).

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41

Já o trabalhador terceirizado não pretende estar na empresa um ano após a

entrevista, pois o salário é muito baixo na área em que trabalha (alvenaria): “Nesse mês foi um

pessoal embora da JJ porque ganha muito pouco”.51

No que se refere à reestruturação, além da citação de Camburi, outro

trabalhador relatou que veio transferido da obra de Porto Canoa.

3.6. Equilíbrio entre trabalho e vida familiar

Os dirigentes sindicais chamam atenção para o extenso período durante o qual

o trabalhador fica fora de cada em função do trabalho: “Trabalhador sai de casa 5 horas,

chega 20h, pode haver problema familiar, conjugal, se não tem final de semana desgasta a

convivência familiar”. 52

No CCT há tabela para folga de campo, que prevê dias de folga além do fim de

semana, com pagamento de passagem e lanche, ou passagem de avião sem lanche. De acordo

com CCT os trabalhadores têm direito às folgas periódicas “no período máximo de cinco dias

úteis incluindo o tempo de viagem, a cada 90 dias, que serão compensados em horário além

da jornada normal de trabalho”. 53

Os empregadores têm que obedecer ao quadro de folgas abaixo, conforme a

distância da cidade de origem do trabalhador.

Tabela 9 – Tabela de folga de campo

DISTÂNCIA QUANTIDADE DE FOLGAS

De 200 a 300 km 1 dia

De 301 a 600 km 2 dias

De 601 a 1000 km 3 dias

De 1001 a 1500 km 4 dias

Acima de 1500 km 5 dias

FONTE: Convenção Coletiva de Trabalho 2010-2012 (Sintraconst – ES).

51

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 52

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 53

CCT 2010-2012. Cláusula 20 – Das folgas periódicas, p. 26.

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42

Mas, de acordo com os dirigentes sindicais, as empresas não respeitam o

quadro. Em obra da MRV, ainda segundo os dirigentes, “tem gente que está aqui há oito

meses e nunca foi pra casa.”54

Entre os trabalhadores entrevistados, os que moram em Vitória veem a família

todos os dias e, entre os terceiros, há trabalhadores de outros estados que relataram:

trabalhador terceirizado oriundo de estado do Nordeste brasileiro vê a família apenas de seis

em seis meses. Segundo ele “é difícil ficar indo e vindo”55

, outros dois trabalhadores

terceirizados afirmaram que as empreiteiras em que eles trabalham não dão direito à folga de

campo. Apenas um trabalhador terceirizado, que também é de um estado do Nordeste, relatou

que tem direito à folga de campo e que vê a família com frequência.

3.7. Tratamento digno no emprego

Para os dirigentes sindicais, o tipo de discriminação mais frequente é refere-se

à participação sindical: “o dirigente sindical é marcado na MRV, engenheiro falou que quer

dirigente no sindicato e não na obra”.56

Mas não há discriminação por raça ou com

trabalhadores de outro estado ou de estado do Nordeste; “o Espírito Santo é um estado

receptivo”. Às vezes há discriminação por orientação sexual. Entre os trabalhadores

entrevistados na obra não há relatos de discriminação (por ter sofrido ou presenciado).

Sobre assédio moral, de acordo com dirigentes sindicais, os encarregados da

APM ameaçavam e batiam em operários e a humilhação é de preferência na presença de

outros colegas de trabalho. De acordo com o relato de um dirigente, a humilhação está

relacionada ao esquema de produção:

Ele é humilhado por causa da produção, eles ficam querendo tanto a

produção e são humilhados pela produção: “vocês têm quem fazer”. A

empresa coloca trabalhador contra sindicato “colaboradores, o

sindicato não está deixando você ganhar dinheiro”, mas trabalhador

passa por humilhação porque não quer perder a [remuneração pela]

produção.57

54

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 55

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 56

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 57

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES.

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43

Entre os trabalhadores entrevistados da MRV, nenhum relatou ter sofrido

assédio moral. Um trabalhador da MRV, contudo, presenciou um trabalhador de empreiteira

sendo humilhado pelo encarregado. O trabalhador terceiro relatou ter presenciado perseguição

de encarregado sobre trabalhador, “o encarregado dizia que trabalhador não fazia trabalho

corretamente e [o trabalhador] foi retirado da área”.58

Outro terceirizado fala de um ex-

mestre que não respeitava os trabalhadores, “queria mostrar quem manda”.59

Em relação à cota de Pessoas com Deficiência (PCDs), de acordo com os

dirigentes sindicais, a MRV contrata por obra e cada obra tem uns 20 trabalhadores. No

registro em carteira não está a MRV, mas o nome de um condomínio, com CNPJ diferente, e

não há vínculo trabalhista com a MRV – o vínculo é com o condomínio e, com um número

pequeno de trabalhadores, não é possível reservar cota.

3.8. Trabalho seguro

Na visão dos dirigentes sindicais, os equipamentos de proteção coletiva (EPC)

são prioridade e a empresa é obrigada a tê-los (por exemplo, tela metálica, guarda corpo). O

sindicato fiscaliza e se a empresa não estiver de acordo, é estabelecido um prazo de 10 dias

para a regularização. Na MRV a segurança é de acordo com a obra: umas são avaliadas como

regulares, outras como péssimas: a prioridade é o uso de bota, uniforme, capacete, óculos e

luva. É necessário verificar se a empresa está disponibilizando área de vivência, chuveiros,

banheiros, etc. O alojamento tem que ter norma da NR 18. Quem se aloja são os terceirizados

originários de outras regiões do Brasil. O trabalhador terceirizado entrevistado reclamou do

alojamento “uma casa de cinco cômodos para 12 pessoas, os colchões são finos, não vai

pessoa limpar e é quente”. 60

Os trabalhadores avaliaram o local de trabalho de acordo com o

desenvolvimento de suas funções. Muitos dos itens não estão relacionados com a área em que

o operário trabalha:

58

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 59

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 60

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES).

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44

Tabela 10: Avaliação do local de trabalho

AVALIAÇÃO BOA REGULAR RUIM

a. Andaimes e escadas de mão. 3 4

b. Elevadores e acessórios de levantamento: 3 2

c. Veículos de transporte e maquinaria de movimento

de terras e manipulação de materiais

6 1 1

d. Ferramentas manuais 5 3

e. Trabalhos em altura 4 2

f. Escavações, poços, terraplanagem, obras

subterrâneas e túneis

6

g.Trabalhos em superfície da água 1

h. Demolição, 2

i. Iluminação e eletricidade, 5 1

j. Explosivos, 1

k. Incêndios 3

l. Banheiros 4 2 3

m. Refeitórios 5 3 1

o. Dormitórios 2 1 1

p. Outros

FONTE: Pesquisa IOS.

Segundo os dirigentes, em caso de acidente a empresa deixa o trabalhador em

casa e dá remédio:

Quando volta, o trabalhador não está bom. Trabalhador não abre

CAT61

porque, segundo a empresa, CAT é invenção do sindicato. Na

MRV um trabalhador que ia ao trabalho de bicicleta foi atropelado e

quebrou o pé. É acidente de percurso, a MRV não quis emitir CAT,

61

Comunicação de Acidente de Trabalho

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alegando que paga vale transporte e que o trabalhador não poderia vir

de bicicleta. O que ela fez? Fechou o quartinho de guardar bicicleta. A

MRV não queria que mais ninguém [fosse] de bicicleta.

Entre os entrevistados do canteiro de obras, um trabalhador sofreu acidente de

moto no percurso para o trabalho e, neste caso, a empresa emitiu a CAT. Outro trabalhador

relatou que em alguns casos a MRV não emite CAT e citou o exemplo do colega que caiu do

andaime e a empresa não emitiu a CAT. Um trabalhador terceirizado cortou o dedo e, no caso

dele, a empresa não emitiu CAT. Os outros trabalhadores não sofreram acidente, tampouco

sabem se as empresas emitem CAT.

De acordo com os dirigentes sindicais, os principais problemas de saúde

vividos pelos trabalhadores da construção civil são de coluna, “de trabalhar abaixado e torto,

a empresa não treina adequadamente”, de vista, de respiração devido à poeira, de surdez

devido ao barulho, “muitas vezes em virtude do ritmo de trabalho, o trabalhador acaba não

usando protetor”, e mental – é muita correria no esquema de produção, então há problemas

de alcoolismo e consumo de drogas. Além disso, em virtude do esquema de produção, o

operário “tem que trabalhar muito”, o que afeta a saúde.62

O ritmo extenuante de trabalho é citado pelos trabalhadores: o trabalhador

terceirizado considera o ritmo de trabalho muito cansativo e outros dois entrevistados

afirmaram que afeta a saúde física. Um dos entrevistados disse que gera estresse, mas o

restante não considera o ritmo de trabalho prejudicial à saúde.

Os problemas de saúde relatados pelos trabalhadores depois que começaram a

trabalhar na empresa são: problemas de coluna, doença de pele, doenças respiratórias, dores

musculares, cansaço nos braços e pernas, estresse (4 relatos) e dependência química ao

cigarro.

Um trabalhador terceirizado deixou de revelar que estava doente no trabalho –

estava com dor de cabeça e garganta, mas não falou para o chefe –; outro teve problema de

dor no estômago, mas também não revelou.

Entre os entrevistados, apenas um trabalhador se afastou do trabalho por seis

meses, em virtude de um acidente de percurso com moto.

Todos, diretos e terceirizados, afirmaram utilizar EPIs (equipamentos de

proteção individual) e consideraram-nos adequados: luvas, óculos, capacete, máscara, cinto de

62

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES.

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segurança, botina, abafador de concha, máscara de proteção e avental. Segundo um

entrevistado, o técnico de segurança solicitou o uso do avental.

Quanto aos EPCs (equipamentos de proteção coletiva), apenas dois

entrevistados sabem o que é e consideram adequados. Outro entrevistado da MRV afirmou

que “às vezes” a empresa usa EPCs.

De acordo com os dirigentes sindicais a CIPA (Comissão Interna de Prevenção

de Acidentes) no segmento de edificação “não funciona direito”. A empresa que tenha a

partir de 20 trabalhadores tem que ter CIPA. Se há 50 empresas trabalhando no canteiro, tem

que ter CIPA e um técnico de segurança também para as 50 empresas. As opiniões sobre a

CIPA são discrepantes: dois entrevistados afirmaram que não há CIPA no canteiro, “a CIPA

nunca chegou aqui”63

, três entrevistados afirmaram que a atuação da CIPA é regular e

eficiente e o restante não soube avaliar ou informar se há CIPA.

3.9. Proteção social na empresa

Segundo representantes sindicais, muitas vezes o trabalhador não tem

conhecimento sobre se possui estabilidade quando a empresa o demite. O sindicato verifica,

quando vai homologar, se o trabalhador possui estabilidade. Na MRV não há casos de

demissão de trabalhador com estabilidade mas às vezes há casos desse tipo nas empreiteiras.

O sindicato não negocia estabilidade de 45 dias de doença. Há casos de trabalhadores que

querem ser demitidos no período e o sindicato explica que não pode haver demissão. Na visão

do sindicato, o cipeiro também não pode abrir mão da estabilidade, pois esta estabilidade foi

concedida pelos trabalhadores.

Entre os trabalhadores entrevistados nenhum necessitou tirar licença.

Três trabalhadores entrevistados não sabem avaliar se a empresa respeita ou

não os direitos dos licenciados. Outro entrevistado, terceirizado, disse que a empresa adota as

licenças paternidade e maternidade (não sabe quanto tempo), não sabe se há garantia de

emprego no retorno e “acha” que a empresa respeita o direito dos trabalhadores licenciados.

Um trabalhador afirmou que a empresa não adota licença maternidade ou paternidade e que

não há garantia de retorno após essas licenças. Os demais dos entrevistados afirmaram que a

empresa cumpre o direito à licença.

63

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES).

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3.10. Diálogo social

De acordo com dirigentes sindicais, a empresa não aceita que representantes

sindicais entrem na obra. Na MRV, o sindicato impôs resolver questões dentro da obra e se o

problema chega ao sindicato é encaminhado para o Ministério do Trabalho. Dirigentes

sindicais entram na obra da MRV, o pessoal administrativo aceita porque ele está dentro da

lei, “mas não é de boa vontade”.64

Toda segunda-feira há reunião no sindicato com trabalhadores para discutir as

condições de trabalho. Esta reunião não é chamada (divulgada), mesmo assim tem presença

garantida de trabalhadores toda segunda-feira. A dificuldade de organização reside na

pluralidade de empreiteiras atuando, que trazem trabalhadores de outros estados (trechero) e

que permanecem por pouco tempo no estado. Além disso, a diversidade de relações de

trabalho dificulta a ação sindical.

As informações sobre filiação sindical revelam falta de informação entre os

trabalhadores sobre o que é estar sindicalizado. Entre trabalhadores diretos um trabalhador

afirmou que é filiado ao sindicato, pois pagou imposto sindical, e não se recordou do nome do

sindicato; outro trabalhador disse que não é filiado ao sindicato. Outro informou que não sabe

se é sindicalizado. O trabalhador terceirizado, por sua vez, afirmou que é filiado a um

sindicato no Ceará, mas não se recorda qual é. O restante dos trabalhadores afirmou que não

são filiados ao sindicato.

Entre os diretos, nenhum deles participou das atividades sindicais no sindicato

local. Um terceirizado afirmou que já participou de uma reunião sindical, mas no Ceará. Não

recebe informações e não tem conhecimento em relação ao sindicato local.

Os trabalhadores afirmaram receber informações lendo boletins, panfletos ou

jornais do sindicato; conversando com colegas de trabalho; conversando com diretores do

sindicato; conversando com chefes ou gerentes; pelo carro de som. Um trabalhador afirmou

que também se informa pela televisão. O restante afirmou que não recebe informação sobre

atividades sindicais.

Todos os trabalhadores afirmaram não ter conhecimento sobre OLT

(organização no local de trabalho). Dois trabalhadores diretos reconheceram, contudo, o

representante sindical que atua na obra (“um de bigodão”, “o Bigode”)65

. Um entrevistado

64

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES. 65

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES).

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afirmou que tem um grupo que discute a organização do trabalho, “o dono da empresa

esclarece dúvidas”.66

De acordo com dirigentes sindicais, ainda não houve greve na MRV, mas foi

mandado um aviso de greve em dezembro de 2011 e os representantes da empresa ficaram

“desesperados” para falar com o representante do sindicato que atua na MRV. A empresa

chegou a um acordo antes que a greve se iniciasse. O motivo do aviso é que “havia peão sem

carteira assinada”67

. A maior parte dos trabalhadores entrevistados não tem informação sobre

greve ou conflitos – um trabalhador relatou que houve um problema com um dos

empreiteiros, a MRV ficou de arcar com as despesas mas não pagou os valores, apenas

registrou os trabalhadores.

De acordo com os dirigentes sindicais a negociação coletiva segue o seguinte

roteiro: o sindicato patronal passa a proposta, é levada para os trabalhadores em assembleia,

na assembleia são tirados representantes dos trabalhadores que vão acompanhar o processo. É

possível negociar diretamente com a empresa: temas simples são negociados sem presença de

trabalhadores que não são dirigentes sindicais, temas mais complexos são negociados com a

presença de trabalhadores que não são dirigentes sindicais. Em primeiro lugar é negociada a

estabilidade do trabalhador por 3 ou 4 meses e é colocada a cláusula em acordo – isto é para

manter a transparência para os demais trabalhadores. E há denúncias que já são tratadas

diretamente com a empresa

Desde que começaram a trabalhar na empresa, nenhum dos trabalhadores

entrevistados relatou casos de demissões de dirigentes sindicais ou cipeiros, conflitos ou

greves, ou ouviu informação de descumprimento de cláusulas da CCT ou do ACT.

Todos os trabalhadores entrevistados afirmaram que os sindicalistas têm acesso

ao local de trabalho e os dirigentes afirmaram que são liberados para entregar jornal.

66

Entrevista realizada em 28/02/2012. Obra da MRV, Serra (ES). 67

Oficina sindical realizada em 27/02/2012. Sintraconst-ES.

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Considerações finais

A terceirização do trabalho na construção civil mediante as chamadas

empreiteiras é o fator mais impactante na análise de déficit de trabalho decente no setor.

No quesito oportunidades de emprego verifica-se ainda a pequena presença

de mulheres, em âmbito sindical e no canteiro de obras, refletindo o contexto do setor (tabela

8, p. 26). A presença de empresas e trabalhadores terceirizados é excessivamente alta, na obra

pesquisada cerca de 83% dos trabalhadores são terceirizados, contratados por várias empresas

(número não precisado de empresas) e atuando em todas funções, inclusive relativas à atividade-

fim da construção civil.

Na obra pesquisada não foram relatados casos de trabalho inaceitável. Em outras

obras da empresa foram relatados casos de trabalho de menor nas mesmas condições de adulto

(Porto Canoa), além de denúncia de trabalho escravo (São Carlos-SP e Americana-SP). Todos os

casos estão relacionados à ação de empresas empreiteiras.

Em relação ao tema salários adequados e trabalho produtivo, uma questão a

ser resolvida é o trabalho por produção, em que a remuneração do trabalhador, em geral

terceirizado, está atrelada à produção. Com isso, o salário registrado em carteira de trabalho é

apenas uma formalidade, uma vez que o trabalhador pode ganhar mais ou menos, dependendo da

sua produtividade.

Em relação ao PCS, treinamento e benefícios, os trabalhadores, tanto diretos como

terceirizados, demonstraram pouco conhecimento, inclusive em relação à PR. Há casos também

de opção de benefícios, se o trabalhador escolhe um (cesta básica) não tem direito a outro

(refeição no local de trabalho).

O trabalho por produção também impacta na jornada decente: a jornada máxima

legal, que é de 44 horas, no entanto não faz sentido para quem trabalha por produção, tampouco a

contabilização de horas extras.

Em relação à estabilidade e garantia de trabalho, os trabalhadores entrevistados

revelaram que estão há pouco tempo trabalhando na empresa e as perspectivas de continuar

trabalhando depois de um ano após a entrevista são pequenas por vários motivos: salários baixos e

insegurança em relação às transferências e mobilidade que ocorrem entreas obras.

Sobre o equilíbrio entre trabalho e vida familiar, dentre os trabalhadores

terceirizados, boa parte oriundos de estados do Noredeste, de forma geral, não têm direito a folga

de campo e, portanto, podem ficar até seis meses sem ver a família, segundo relatos.

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Quanto ao tratamento digno no emprego, neste quesito, os casos de humilhação

podem estar relacionados à cobrança de produtividade no esquema de trabalho por produção.

No que se refere a trabalho seguro, a emissão de CATs e a atuação da CIPA são

duas questões que merecem destaque, uma vez que a atuação de várias empresas dificulta o

monitoramento e os trabalhadores entrevistados mostraram desconhecimento sobre se as

empresas emitem CAT ou sobre atuação da CIPA.

E, por fim, sobre o diálogo social, a contratação de terceirizados, oriundos de

vários estados, impacta também na ação sindical, tendo em vista que as relações de trabalho são

sazonais. Neste sentido, o envolvimento de trabalhadores terceirizados nas atividades e a

circulação das informações sindicais são dificultados. Mesmo assim , os represetantes sindicais

têm acesso livre à obra.

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Referências

Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE. Anuário dos

Trabalhadores 2010/2011. 11ª edição. São Paulo, 2011.

Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE. Estudo

Setorial da Construção – 2011. Estudos e Pesquisas, Nº 56 – abril de 2011.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Estatísticas do Século XX. Rio de

Janeiro, 2006.

Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Habitação. Déficit Habitacional no Brasil

2008. Brasília, Abril de 2011.

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Secretaria do

Desenvolvimento da Produção. Anuário da Indústria. 2011

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Secretaria do

Desenvolvimento da Produção. Anuário Estatístico. 2011.

Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED). Mercado de Trabalho Metropolitano em 2010.

Divulgação: Janeiro de 2010.

RAMOS, Roberto Luís Olinto; CONSIDERA, Cláudio Monteiro; MAGALHÃES, Kepler

Mauro Mendonça; FILGUEIRAS, Heloísa Valverde; SOBRAL, Carlos Bittencourt. O

Macrossetor da Construção. Junho de 2000. Disponível em: http://www.cbicdados.com.br.

Acesso em 10/11/2011.

TEIXEIRA, Luciene Pires. Análise do Desempenho Econômico-Financeiro do Setor da

Construção Civil no Período Pós-Real. Monografia. UFMG, Belo Horizonte, 2002.