Análise Dos Editoriais Folha de S. Paulo

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE COMUNICAÇÃO TEORIAS DO JORNALISMO 2013.1

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAFACULDADE DE COMUNICAÇÃO

TEORIAS DO JORNALISMO

2013.1

Docente: Malu Fontes

Discente: Arcimar Sousa

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Introdução

Os protestos definitivamente começaram no país em junho de 2013 em São Paulo, Porto Alegre e Rio de Janeiro e teve como principal liderança o MPL (Movimento Passe Livre originado em Salvador no ano de 2003) e organizado via redes sociais. Em meados de maio e começo de junho, já havia indícios de distúrbios em Porto Alegre e em Natal, onde a prefeitura decretou um novo reajuste dos valores das passagens no transporte público após sucessivos aumentos desde 2012. Houve confronto com a polícia. Entretanto foi em São Paulo que aconteceu o clímax das manifestações, bem como a sua expansão a vários outros estados do Brasil.

Porém o objeto de estudo deste trabalho foi outro acontecimento peculiar, específico, dentre vários que viraram notícia: O episódio em que jornalistas da Folha de S. Paulo foram agredidos pela polícia na manifestação, fato que modificou a opinião expressa em dois dos três de seus editoriais (12, 15 e 20 de Junho) que serão analisados.

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No inicio dos protestos, quando as intenções e as lideranças ainda estavam sem uma visível definição do que eram e o que queriam, a mídia atacava, os grupos políticos atacavam, e grande parte da sociedade, também seguia a mesma linha de raciocínio. A Folha de S. Paulo não poupou palavras do tipo “Vandalismo”, “Depredação”, O Estado de S. Paulo, seguiu pela mesma forma, o jornal O Globo, por sua vez, publicou em seu editorial um texto denominado “A Marcha da Insensatez” e a Veja São Paulo chamou a manifestação de fazer muito barulho por nada.

Os manifestantes estavam descontentes não só com o aumento das passagens, mas também com a situação em que o país encontrava-se e a corrupção em geral. Entraram também em discussão a PEC (Projeto de Ementa Constitucional) 37 que, em suma, limitaria o poder de investigação criminal do Ministério Público; requerimentos estes que só começaram a delinear-se com o avançar dos dias e a organização das lideranças do movimento.

Até aí a manifestação não passava de “um grande grupo de desordeiros”. Mas muitos canais de televisão fizeram questão de, em muitas coberturas ao vivo, destacar somente a parte “boa”, da manifestação, deixando claro quem eram os baderneiros ou os “Vândalos Infiltrados” e quem protestava pacificamente. Claramente, percebia-se em transmissões ao vivo pela televisão, manifestantes mais exaltados e outros preferindo à manifestação pacífica. Inclusive vários dos manifestantes pacíficos policiavam as passeatas, fazendo verdadeiros cordões humanos frente a prédios públicos, repreendiam e denunciavam tais comportamentos agressivos nas discussões em redes sociais

Em meio a acusações e um possível “rotulamento” da massa de manifestantes, aumenta a repressão aos meios de comunicação acusados de ser tendenciosos por uma minoria mais agressiva dos manifestantes, denominando-os de “vândalos infiltrados”; um furgão da TV Record foi incendiado, jornalistas da Rede Globo eram hostilizados, inclusive muitos apareciam nas coberturas ao vivo ou reportagens sem o símbolo da mesma nos microfones ou camisas.

Talvez, por uma alguma estratégia e até mesmo por segurança, os jornalistas, que vão às ruas coletar as notícias diretamente em contato com as pessoas e os acontecimentos e tem a obrigação de fazer notícias para publicá-las, sob pressão do fator tempo, para fechar a edição ou levar o jornal ao ar na hora certa, tenha tomado atitudes pró-manifestantes. Ao invés de uma matéria inteira acusando os manifestantes, certos comentários de formadores de opinião ganharam repercussão, acusando a manifestação de ditatorial.

Claro: sem notícia, sem anúncios, sem capital, a imprensa vai à falência! Os jornais têm que vender seu produto. Especificamente o jornal impresso precisa chamar a atenção do leitor que está interessado em comprá-lo, e atrair outros que estão em busca de informação. A principal intenção que uma pessoa tem ao comprar um jornal é a obtenção de informação, saber o que está acontecendo em seu meio social e fazer uma síntese com seus valores sociais de certo-errado, que formará sua opinião sobre um fato. Talvez, um ou outro compre um jornal com ideias escancaradamente expressas contra ou a favor de algo. Ideologias e preferências políticas à parte, o jornal constrói uma opinião, uma noção de realidade a muitas pessoas por que o jornalismo não é somente um mero informativo, mas também um inegável instrumento que ajuda na conscientização do indivíduo.

A Folha de S. Paulo, antes da agressão dos jornalistas, usava de uma linha editorial como forma de denegrir o protesto, não só na capa, mas também no seu editorial, claramente tendencioso, como verá nas análises de três editoriais a seguir. O primeiro editorial não era, claramente, contra ou a favor de partido político e sim contra a manifestação. Mas para um leitor com pouca base intelectual e facilmente influenciável, que, por exemplo, tem a Folha como referência na construção de sua

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opinião, a manifestação não passou de uma reunião de vagabundos revoltados que estavam destruindo a cidade e a polícia não tomava nenhuma atitude para suprimi-los.

Queira ou não, de uma forma ou outra, os jornais influem sim, na percepção e construção da realidade das pessoas.

Três notáveis Editoriais da Folha de S. Paulo

Três editoriais da Folha mostram claramente a mudança de sua opinião, inicialmente a favor de uma intervenção enérgica da polícia de São Paulo, ela muda sua opinião quando seus jornalistas são agredidos e presos.

No primeiro, publicado no site em 13/06/2013, intitulado “Retomar a Paulista”, o texto começa com saldos negativos do terceiro protesto na Avenida Paulista: “Oito policiais militares e um número desconhecido de manifestantes feridos, 87 ônibus danificados, R$ 100 mil de prejuízos em estações de metrô e milhões de paulistanos reféns do trânsito.”

Expressões depreciativas ao movimento tais como “grupelho”, “jovens predispostos à violência”, e todos estavam cientes à sua “condição marginal e sectária” surgiam no texto. Claramente expressando a sua posição contrária ao movimento, o editorial ainda afirmou que o movimento seria uma ação de jovens que seguiam uma “ideologia pseudo-revolucionária” que os tornava violentos e que buscavam apenas a descompromissadamente o transporte de graça, a tarifa zero. Os manifestantes seriam uma espécie de massa de manobra, altamente influenciável por algum partido de esquerda, provavelmente, depredadora de símbolos do capitalismo, como os bancos. Para a Folha, a ação de fechar a Avenida Paulista não passava de uma manobra para chamar a atenção da opinião pública, o que seria óbvio, pois as manifestações têm que ser visíveis para existir!

O editorial exigia uma punição maior dos poderes públicos e também uma reação mais enérgica da polícia aos manifestantes: “É hora de pôr um ponto final nisso. Prefeitura e Polícia Militar precisam fazer valer as restrições já existentes para protestos na avenida Paulista, em cujas imediações estão sete grandes hospitais.”

Com o desenrolar dos acontecimentos no dia 13/06 daquela mesma semana, no 4° ato das manifestações, jornalistas e manifestantes e transeuntes, pessoas que estavam fora dos protestos foram agredidos e presos (como o casal sendo agredido por um policial na foto de capa do jornal do dia 14/06), incêndios, depredações, muitos excessos de uma parte: bombas de gás lacrimogêneo, gás de pimenta, tiros de bala de borracha disparados pelo poder policial e paus, pedras e coquetéis molotov por parte dos manifestantes mais exaltados, assim como foi publicado na Folha de S. Paulo do mesmo dia. E um acontecimento inusitado: um policial flagrado em vídeo quebrando o vidro de uma viatura. Em meio a todo o caos instalado na capital paulista, sete jornalistas da Folha de S. Paulo foram feridos enquanto trabalhavam entre eles, Giuliana Vallone, que foi ferida gravemente no olho por uma bala de borracha; no segundo e talvez mais notável editorial da Folha, “Agentes do Caos” publicado em 15/06, há aí, segundo o Observatório da Imprensa uma virada na cobertura: “A Polícia Militar do Estado de São Paulo protagonizou, na noite de anteontem, um espetáculo de despreparo, truculência e falta de controle ainda mais grave que o vandalismo e a violência dos manifestantes, que tinha por missão coibir. Cabe à PM impor a ordem, e não contribuir para a desordem.” O fato da agressão à jornalista, inclusive, mobilizou artistas famosos, que pintavam o olho de roxo e posavam em fotos, que foram largamente expostas e compartilhadas nas redes sociais.

Um parágrafo notável, que mostra talvez a tentativa da folha, uma certa justificativa para a mudança de opinião: “Não é só por solidariedade profissional que se mencionam, neste espaço, as agressões

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sofridas por repórteres desta Folha --e de outros órgãos de imprensa. Antes de mais nada, como qualquer cidadão, eles não poderiam ser atacados por policiais cuja ação não parecia obedecer a qualquer plano ou estratégia”.

Opinião contrária à ação da polícia é expressa, mas também continua a crítica aos manifestantes: “O Movimento Passe Livre preconiza a paralisação de São Paulo em nome da irreal reivindicação de tarifa zero para os transportes públicos”. No jornal que foi às ruas no dia 15 de junho com o mesmo editorial, a notícia com mais destaque na primeira página era: “Alckmin defende PM e diz que protesto tem viés político”. Vale ressaltar a própria opinião do jornal sobre o ataque aos jornalistas, denominando a polícia de “despreparada e covarde”, que talvez contribuiu mais que suprimiu o caos que o próprio protesto. Para o Observatório da Imprensa, a Folha caiu na real quando seus repórteres sofreram agressão, que foi necessária para que dessem conta que nem tudo é o que parece.

Por fim, na edição do dia 20/06, talvez percebendo o poder da manifestação, a delineação das lideranças e “separando o joio do trigo”, ou seja, diferenciando os manifestantes dos vândalos. Com a notícia em primeira página: “PROTESTOS DE RUA DERRUBAM TARIFAS” e uma foto que mostrava o verdadeiro caráter da manifestação: centenas de pessoas com cartazes repletos de dizeres de reivindicações, a Folha publica um editorial ao que parece “pró-manifestação”; afirmando totalmente a sua mudança de opinião e reconhecendo o movimento que “adquiriu tamanha repercussão no tecido social”. Dando espaço a uma crítica mais sobre as atitudes e partidos políticos que as manifestações.

Primeiras Páginas

Cronologia das primeiras páginas do impresso Folha de S. Paulo dos dias 12, 14, 15 e 20 de Junho de 2013, respectivamente:

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Conclusão

Partindo da premissa de construção de realidade/opinião que os jornais oferecem à sociedade, a Folha de S. Paulo vinha, digamos que, “induzindo”, claramente ou não, a sociedade a construir uma opinião contra a manifestação, porém o fato crucial que causou a virada na cobertura da Folha seria, supostamente, a agressão aos jornalistas da empresa e o tiro de bala de borracha que Giuliana Vallone levou. Certamente por uma escolha da direção do jornal, dos superiores. A editoria do jornal não poderia ficar omissa a tal agressão aos seus funcionários, independentemente de estar ligada a algum partido político, ou não.

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Referências Bibliográficas

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Editorial: Agentes do Caos, Folha de S. Paulo. 15/06/2013. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/06/1295534-editorial-agentes-do-caos.shtml> Acesso em: 09 ago. 2013.

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Acesso em: 09 ago. 2013.

TRAQUINA, Nelson. Teorias do Jornalismo, por que as notícias são como são. Florianópolis: Insular, 2005.