ANÁLISE SOBRE A PRÁTICA DO INSIDER TRADING NO...

13
IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016. ANÁLISE SOBRE A PRÁTICA DO INSIDER TRADING NO BRASIL GT II: Direito ao Desenvolvimento Socioeconômico, Integração Econômica e Direito Empresarial. Talita Louise Silva Salvador 1 Vinicius Figueiredo Chaves 2 RESUMO Com base em pesquisa bibliográfica, documental e de levantamento de dados, o artigo aborda o tema do uso indevido de informações privilegiadas no mercado de capitais brasileiro, com foco no exame da responsabilidade administrativa decorrente da prática deste ilícito. A investigação foi orientada pela seguinte questão: Para a eventual caracterização da culpa administrativa e consequente aplicação de punição pela prática do uso indevido de informações privilegiadas, os julgamentos proferidos nos processos administrativos sancionadores devem se basear em provas de que natureza? Conclui-se pela necessidade em se punir o insider com respaldo em provas verdadeiramente contundentes de participação, as chamadas provas diretas, em detrimento das provas indiretas ou de indícios. Palavras-Chave: Insider Trading; informação privilegiada; mercado de capitais; processo administrativo. ABSTRACT Based on bibliographical, documentary and data collection research, the article addresses the topic of misuse of privileged information in the Brazilian capital market, with a focus on the examination of administrative responsibility arising from the practice of this illicit. The investigation was guided by the following question: For the eventual characterization of administrative fault and consequent application of punishment for the practice of misuse of privileged information, the judgments given in administrative sanctioning procedures should be based on evidence of what nature? It is concluded by the necessity to punish the insider with support in truly conclusive evidence of participation, the so-called direct evidence, to the detriment of indirect evidence or clues. 1 Autora: Talita Louise Silva Salvador ([email protected]). Vínculo Acadêmico: Universidade Federal Fluminense; Polo Universitário de Volta Redonda; Departamento de Direito (Graduanda do nono período). Endereço institucional: Rua Desembargador Ellis Hermídio Figueira nº 783, Aterrado, Volta Redonda ( Instituto de Ciências Humanas e Sociais). 2 Orientador: Vinicius Figueiredo Chaves ([email protected]). Titulação: Docente, mestre e especialista. Atividade acadêmica: Professor de graduação e pós-graduação. Doutorando. Vínculo acadêmico: Universidade do Estado do Rio de Janeiro/RJ (Doutorando em Direito, na linha de pesquisa Empresa e Atividades Econômicas). Universidade Federal Fluminense/RJ (Professor assistente). Universidade Estácio/RJ (Professor auxiliar). Endereço institucional: Rua Desembargador Ellis Hermídio Figueira nº 783, Aterrado, Volta Redonda ( Instituto de Ciências Humanas e Sociais).

Transcript of ANÁLISE SOBRE A PRÁTICA DO INSIDER TRADING NO...

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

ANÁLISE SOBRE A PRÁTICA DO INSIDER TRADING NO BRASIL

GT II: Direito ao Desenvolvimento Socioeconômico, Integração Econômica e Direito Empresarial.

Talita Louise Silva Salvador1

Vinicius Figueiredo Chaves 2

RESUMO

Com base em pesquisa bibliográfica, documental e de levantamento de dados, o artigo aborda o tema do uso indevido de informações privilegiadas no mercado de capitais brasileiro, com foco no exame da responsabilidade administrativa decorrente da prática deste ilícito. A investigação foi orientada pela seguinte questão: Para a eventual caracterização da culpa administrativa e consequente aplicação de punição pela prática do uso indevido de informações privilegiadas, os julgamentos proferidos nos processos administrativos sancionadores devem se basear em provas de que natureza? Conclui-se pela necessidade em se punir o insider com respaldo em provas verdadeiramente contundentes de participação, as chamadas provas diretas, em detrimento das provas indiretas ou de indícios.

Palavras-Chave: Insider Trading; informação privilegiada; mercado de capitais; processo administrativo.

ABSTRACT

Based on bibliographical, documentary and data collection research, the article addresses the topic of misuse of privileged information in the Brazilian capital market, with a focus on the examination of administrative responsibility arising from the practice of this illicit. The investigation was guided by the following question: For the eventual characterization of administrative fault and consequent application of punishment for the practice of misuse of privileged information, the judgments given in administrative sanctioning procedures should be based on evidence of what nature? It is concluded by the necessity to punish the insider with support in truly conclusive evidence of participation, the so-called direct evidence, to the detriment of indirect evidence or clues.

1 Autora: Talita Louise Silva Salvador ([email protected]). Vínculo Acadêmico: Universidade Federal

Fluminense; Polo Universitário de Volta Redonda; Departamento de Direito (Graduanda do nono período).

Endereço institucional: Rua Desembargador Ellis Hermídio Figueira nº 783, Aterrado, Volta Redonda ( Instituto

de Ciências Humanas e Sociais). 2

Orientador: Vinicius Figueiredo Chaves ([email protected]). Titulação: Docente, mestre e

especialista. Atividade acadêmica: Professor de graduação e pós-graduação. Doutorando. Vínculo acadêmico:

Universidade do Estado do Rio de Janeiro/RJ (Doutorando em Direito, na linha de pesquisa Empresa e

Atividades Econômicas). Universidade Federal Fluminense/RJ (Professor assistente). Universidade Estácio/RJ

(Professor auxiliar). Endereço institucional: Rua Desembargador Ellis Hermídio Figueira nº 783, Aterrado, Volta

Redonda ( Instituto de Ciências Humanas e Sociais).

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

Keywords: Insider Trading; privileged information; capital market; administrative process.

Introdução

O insider trading consiste na utilização de informações privilegiadas e ainda não divulgadas no mercado de capitais, visando a obtenção de vantagem indevida, decorrente da realização de operações envolvendo valores mobiliários.

Esta prática afeta a confiança dos investidores e do público em geral em relação à integridade dos mercados. Neste sentido, desafia permanentes ações dos órgãos legislativos e reguladores, com vistas não somente à proibição do uso de informações privilegiadas como também medidas de fiscalização e eventual punição daqueles agentes que realizarem o ilícito.

No Brasil, o uso indevido de informações privilegiadas constitui ilícito em três esferas distintas: administrativa, civil e penal. Sobre o tema, pairam ainda inúmeras questões em aberto. Por sua complexidade e importância, muitas destas questões demandam abordagens acuradas por parte da doutrina.

Esta abrangência do tema impõe uma maior delimitação, com intuito de se evitar a superficialidade. Por esta razão, o presente trabalho se deterá a analisar o insider trading na esfera administrativa, âmbito em que se opera com maior amplitude a atuação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)3, órgão regulador do mercado de capitais brasileiro.

Mais precisamente, o trabalho procura responder o seguinte problema: para a eventual caracterização da culpa administrativa e consequente aplicação de punição pela prática do uso indevido de informações privilegiadas, os julgamentos proferidos nos processos administrativos sancionadores devem se basear em provas de que natureza?

A fim de analisar esta questão, examinou-se inicialmente bibliografia específica sobre o tema do insider trading em geral, encontrada em livros, artigos científicos e dissertações. Na sequência, realizou-se levantamento e análise de dados secundários da CVM, provenientes de processos administrativos sancionadores (PAS), concernentes ao tema 4 , e também dados produzidos na pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos da faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas, de 2014.

3 Autarquia Federal vinculada ao Ministério da Fazenda do Brasil, responsável por regular o mercado

mobiliário nacional. 4 Historicamente, ficou conhecida a legislação norte-americana no trato ao insider trading, a partir do

New Deal do Presidente Roosevelt. De lá para cá, outros países acompanharam a ideia de se legislar

sobre a prática de maneira negativa, acabando com o pensamento que anteriormente prevalecia de

que a apropriação de informação privilegiada nada mais era do que uma “expressão de mercado”,

sendo uma forma legítima de remuneração dos dirigentes das sociedades anônimas. Editou-se à

época, uma legislação repressora. “Antes mesmo dessas normas federais, conforme já aludido, leis

estaduais surgidas décadas antes (a primeira em Kandas, em 1911) propunham-se, cada uma a seu

modo, coibir o uso indevido de informações confidenciais de sociedades, por seus acionistas e

diretores (eram as blue sky laws) [...]. (PROENÇA, 2005, P. 214).

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

1. A ocorrência do insider trading

A informação ocupa lugar de destaque nas transações realizadas em mercados de capitais: Ela é o fator-chave na tomada de decisões pelos investidores. Neste sentido, a proteção da informação é um princípio basilar dos regimes legal, regulatório, fiscalizatório e punitivo.

Um mercado, ambiente em que transacionam emissores, investidores e intermediários financeiros, somente será eficiente na medida em que as informações relevantes, referentes aos emissores de títulos negociáveis, sejam de conhecimento público simultâneo, ou seja, todos os investidores devem ter acesso ao mesmo tempo a essas informações, as quais precisam ser divulgadas de forma clara e precisa. O mercado somente irá inspirar a confiança dos investidores em geral se todos puderem basear as suas decisões de investimento em informações equânimes.

De acordo com esta visão, não se pode admitir o uso, por parte de alguns, de informações relevantes que ainda não sejam do conhecimento dos demais, pois que as mesmas poderão impactar nos valores dos títulos negociados. Tais informações, utilizadas de forma maliciosa, podem fundamentar a realização de operações que irão gerar lucro para alguns em detrimento do prejuízo de outros.

A utilização indevida de informações privilegiadas abala a confiança dos investidores em geral em relação à equidade no mercado. Portanto, os regimes legais e regulatórios têm se ocupado da criação de mecanismos de prevenção e repressão a esta conduta, conhecida internacionalmente como insider trading.

O insider trading, expressão de origem anglo-saxã, derivada de inside information, consiste no uso indevido de informações privilegiadas para fundamentar a realização de operações com títulos que podem, eventualmente, sofrer variações de valores quando da divulgação, ao público em geral, de determinadas informações.

2. Abrangência normativa e regulatória

No Brasil, o mercado de capitais, também conhecido como mercado de valores mobiliários, é um segmento do sistema financeiro em que são realizadas em sua maioria – operações (emissão, compra, venda etc) envolvendo valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias (normalmente sociedades anônimas de capital aberto, ou seja, aquelas companhias que têm os valores mobiliários de sua emissão admitidos à negociação no mercado).

O órgão regulador do mercado de capitais brasileiro é a Comissão de Valores Mobiliários, autarquia federal em regime especial, vinculada ao Ministério da Fazenda, que possui (entre outras) atribuições de construir o arcabouço regulatório aplicável às transações realizadas e aos agentes que atuam no mercado, assim como fiscalizar e punir as infrações aos marcos legal/regulatório, ou as práticas não equitativas.

Atualmente, as companhias abertas brasileiras devem divulgar suas informações seguindo os procedimentos determinados pela Instrução CVM 358/02,

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

que, em seu art. 3º, dispõe que cabe a companhia interessada encaminhar para a Comissão de Valores Mobiliários “qualquer ato ou fato relevante ocorrido ou relacionado aos seus negócios, bem como zelar por sua ampla e imediata disseminação, simultaneamente em todos os mercados em que tais valores mobiliários sejam admitidos à negociação”. Ou seja, para que haja uma simetria de informações e um tratamento igualitário entre os investidores, necessário se faz que todas as informações sejam divulgadas igualmente, em todos os mercados, para todos os interessados.

Tal determinação abarca uma exceção, nas situações em que houver algum vazamento ou oscilação não prevista; contexto em que caberá a companhia divulgar de maneira imediata a informação, objetivando diminuir o benefício do agente que a tiver fora de hora. Esta exceção encontra-se prevista na mesma Instrução, agora em seu art. 6º, parágrafo único.5

O art. 2º, também em seu parágrafo único, traz uma lista de exemplos de informações que possuem potencial de serem relevantes no mercado de capitais.6

Deste modo, a prática do insider trading ocorre quando determinadas informações relevantes, capazes de impactar na cotação dos valores mobiliários de emissão de determinada companhia, são utilizadas antes da divulgação planejada ao público em geral, fundamentando operações com a finalidade de obtenção de lucro.

A Comissão de Valores Mobiliários, ao conceituar informação privilegiada, define-a como sendo uma informação que não é pública e que é material ( CVM, 2016, p. 9). Confidencial, toda informação até que se torne pública. Material, a informação verificada como relevante, entendendo-se como qualquer ato ou acontecimento ocorrido ou relacionado aos negócios de uma companhia, que possa influir e determinar de modo significativo na cotação dos valores mobiliários, na decisão dos investidores em sua compra, venda e afins.

A instrução CVM 358/02, em seu art. 13, conceituou de maneira semelhante a prática de insider trading, tal como disposta na Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), no art. 1557. Os três primeiros parágrafos dispõem sobre o Dever de Lealdade do administrador8 para com a companhia a qual é empregado;

5 Art. 6º Ressalvado o disposto no parágrafo único, os atos ou fatos relevantes podem,

excepcionalmente, deixar de ser divulgados se os acionistas controladores ou os administradores

entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia. Parágrafo único. As pessoas mencionadas no caput ficam obrigadas a, diretamente ou através do

Diretor de Relações com Investidores, divulgar imediatamente o ato ou fato relevante, na hipótese da

informação escapar ao controle ou se ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade

negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados. 6 Entre os quais, podemos citar: a) assinatura de acordo ou contrato de transferência do

controle acionário da companhia; b) ingresso ou saída de sócio que mantenha, com a companhia,

contrato ou colaboração operacional, financeira, tecnológica ou administrativa; c) incorporação, fusão

ou cisão envolvendo a companhia ou empresas ligadas; d) lucro ou prejuízo da companhia; e)

aprovação, alteração ou desistência de projeto ou atraso em sua implantação; f) autorização para

negociação dos valores mobiliários de emissão da companhia em qualquer mercado, nacional ou

estrangeiro; g) alteração nos direitos e vantagens dos valores mobiliários emitidos pela companhia. 7 Art. 155. § 1º [...], guardar sigilo sobre qualquer informação que ainda não tenha sido

divulgada para conhecimento do mercado, obtida em razão do cargo e capaz de influir de modo

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

ponderável na cotação de valores mobiliários, sendo-lhe vedado valer-se da informação para obter,

para si ou para outrem, vantagem mediante compra ou venda de valores mobiliários. § 2º O administrador deve zelar para que a violação do disposto no § 1º não possa ocorrer através de

subordinados ou terceiros de sua confiança. § 3º A pessoa prejudicada em compra e venda de valores mobiliários, contratada com infração do

disposto nos §§ 1° e 2°, tem direito de haver do infrator indenização por perdas e danos, a menos que

ao contratar já conhecesse a informação. 8 “[...] tal dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o §4º do art. 157 da mesma lei, onde está

inserido o chamado Dever de Informar. Ali está estabelecido que os administradores da companhia

aberta são obrigados a comunicar imediatamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa

qualquer deliberação da assembleia geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou fato

relevante ocorrido nos seus negócios que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos

investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia.”

(CASTELLAR, 2008, p. 99).

versando que o agende deve manter reserva; ou seja, deve agir com ética e não se utilizar de sua posição para negociar informações que, se não fosse o cargo exercido, não teria obtido; agindo de maneira a proteger também a função social da empresa5. Dispõe ainda, que ao mesmo compete zelar para que seus subordinados não descumpram este dever de lealdade, bem como terceiros de sua confiança. Por fim, permite aos prejudicados (investidores) que responsabilizem civilmente os envolvidos pela má conduta, por via judicial. O quarto parágrafo deste mesmo artigo, incluído pela Lei nº 10.303/2001, trouxe ainda uma vedação relacionada ao terceiro que possui acesso a informação sigilosa e privilegiada, ampliando assim, o rol dos que podem figurar como agentes causadores do ilícito6.

Em uma leitura atenta dos demais artigos da Lei de S.A., é possível determinar quais são os agentes que podem configurar como insider. São eles:

(i) Administradores em geral, como conselheiros e diretores da companhia (art. 145 da supramencionada Lei);

(ii) Membros de quaisquer órgãos, criados pelo

estatuto da

companhia, com funções técnicas ou destinadas a aconselhar os administradores (art. 160);

(iii) Membros do Conselho Fiscal (art. 165) ;

(iv) Subordinados das pessoas acima referidas (§ 2º do art. 155); (v) Terceiros de confiança dessas pessoas (§ 2º do art. 155); (vi) Acionistas controladores (art. 22, inciso V). (PARENTE, 1978, p. 3).

Ao ter acesso à informação privilegiada, o insider pode almejar atuar de duas maneiras, a depender do conteúdo da informação: i) sendo um conteúdo positivo, comprar as ações antes que as mesmas se valorizem pela informação sigilosa; para posteriormente vendê-las, obtendo assim os lucros; ii) em caso de um conteúdo

5 “Após o aperfeiçoamento de tais mandamentos éticos, entretanto, a conduta dos administradores

ganhou feição mais complexa, o que ocasionou o avanço dos institutos jurídicos reguladores,

chegando-se ao dever de informar (disclosure).” (PROENÇA, 2005, p. 123). 6 “§ 4o É vedada a utilização de informação relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a

ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de

valores mobiliários. Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001”.

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

negativo, vender as ações antes que se contaminem, diminuindo assim seus prejuízos decorrentes da futura desvalorização.

Admite-se ainda, em esfera administrativa, a instauração do processo administrativo sancionador (PAS), com fulcro na Lei nº 6.385/1976. Tal processo é permitido para se analisar e julgar atos contrários aos arcabouços legal e regulatório, assim como práticas não equitativas, aplicando-se como consequência as punições dispostas na Lei, em seu art. 11, sem prejuízo das responsabilidades cível e penal7.

Com a probabilidade expressa de se culpar administrativamente os responsáveis sem, entretanto, impedir apurações de responsabilidade nas esferas civil e penal12. Outras leis asseguram mecanismos para o ressarcimento dos prejuízos sofridos em sede de responsabilidade civil13, além da conduta se encontrar tipificada na esfera penal8159.

Diversos são os prejudicados pela prática do uso indevido de informações privilegiadas: o próprio Estado, decorrente da falha ao proporcionar a confiabilidade

inabilitação temporária, até o máximo de vinte anos, para o exercício dos cargos referidos no inciso anterior; V - suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades de que trata esta Lei; VI -

7 “Art. 11. A Comissão de Valores Mobiliários poderá impor aos infratores das normas desta Lei, da lei de

sociedades por ações, das suas resoluções, bem como de outras normas legais cujo cumprimento lhe incumba

fiscalizar, as seguintes penalidades: I – advertência; II - multa; III - suspensão do exercício do cargo de

administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição ou de

outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários; IV 8 A efetividade nesta seara do direito é respaldada pelo entendimento de que o crime de insider trading é

supraindividual, perpassando o alcance da proteção meramente individual, atingindo tão logo, direitos e deveres econômicos, culturais, sociais e consequentemente, fundamentais. Por alcançar um grupo maior de pessoas que não àquelas diretamente prejudicadas, é que se compreende a necessidade de se utilizar a ultima ratio do Estado. Fazendo-se necessário, a depender do caso e da extensão da gravidade, a presença do parquet como guardião dos interesses coletivos. Desta forma, o art. 27-D da Lei nº 6.385/ 1976, estabelece a tipificação penal à prática, com pena de reclusão de 1 (um) a 8 (oito) anos, além de multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita, obtida em decorrência do crime. A penalização da prática se justifica devido ao seu potencial lesivo. 9 O insider trading, por ser configurado como verdadeiro crime de colarinho branco (white collar crime), faz

ainda mais jus à repressão por parte do Estado; uma vez que se desliga, por completo, da questão social, adentrando mesmo na ambição excessiva e inescrupulosa do criminoso, impulsionada pela oportunidade do exercício da própria função (OLIVEIRA, 2012, p. 19). Ou seja, não há fatores que justifiquem tal conduta, muito menos questões relacionadas à desigualdade social, visto que esta prática é englobada aos crimes em que predominam um alto grau de inteligência, praticadas por pessoas de elevada formação intelectual e profissional. Na realidade, como já explicitado, é o princípio da intervenção mínima ou da necessidade que ampara a citada tipificação penal, já que o insider trading não é suficientemente sancionado por outros ramos do direito. Justifica-se a intervenção penal por ser conduta potencialmente lesiva a uma gama indecifrável de vítimas, que não mais se restringem à figura do grande investidor, podendo causar, inclusive, a quebra total de um mercado, como ocorreu na Alemanha, nos anos de 2000 a 2003, quando do estouro da bolha de ações no Neuer Mearkt. As constantes fraudes neste mercado acabaram por levá-lo ao total descrédito, ruindo com dois dos principais princípios informadores dessa atividade: a confiabilidade e a boa fé (OLIVEIRA, 2012, p. 18).

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

cassação de autorização ou registro, para o exercício das atividades de que trata esta Lei; VII - proibição temporária, até o máximo de vinte anos, de praticar determinadas atividades ou operações, para os integrantes do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários; VIII - proibição temporária, até o máximo de dez anos, de atuar, direta ou indiretamente, em uma ou mais modalidades de operação no mercado de valores mobiliários [...]”. 12

Lei nº 6.385/1976. Art. 9º. A Comissão de Valores Mobiliários, observado o disposto no § 2o do art. 15, poderá: [...] V - apurar, mediante processo administrativo, atos ilegais e práticas não eqüitativas de administradores, membros do conselho fiscal e acionistas de companhias abertas, dos intermediários e dos demais participantes do mercado; VI - aplicar aos autores das infrações indicadas no inciso anterior as penalidades previstas no Art. 11, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal.” 13

Importante instrumento garantidor na esfera cível é a Ação Civil Pública, regulada na Lei nº

7.347/1985, ao ser cabível em danos patrimoniais envolvendo interesses difusos e coletivos bem como nas

infrações da ordem econômica . A Lei 7.913/89 complementa a possibilidade de se ingressar com a mencionada

ação civil, eis que atribui ao Ministério Público, de ofício ou por solicitação da Comissão de Valores Mobiliários,

adotar as medidas judiciais necessários ao efetivo ressarcimento dos prejudicados, como investidores e

titulares de valores imobiliários, nas hipóteses especialmente abrangidas nos incisos II e III do art. 1º.

do mercado; o investidor e, em última análise, a própria companhia, visto que perde a confiança em decorrência da quebra do sigilo.

3. Casos emblemáticos

Alguns casos emblemáticos envolvendo o insider trading no Brasil merecem destaque.

O primeiro deles, caso Sadia-Perdigão, tornou-se reconhecido por envolver a primeira responsabilização penal 10 além de terem sido imputadas aos responsáveis, pela CVM 11 punições administrativas, com o indiciado sendo condenado a pagar o valor de R$ 238.000,00 (duzentos e trinta e oito mil reais), por utilizar informação relevante ainda não divulgada, com a finalidade de auferir vantagem, ao realizar operações de compra de ações da Perdigão no dia 20 de junho de 2006, em infração ao disposto no art. 155, §4º da Lei nº 6.404/76.

O Caso Fator, por sua vez, representou um dos primeiros precedentes relevantes da CVM, em um processo administrativo, resultante de inquérito administrativo que culminou no indiciamento de diversas pessoas, bem como na acusação pela infração à Instrução CVM nº 31/1984, art. 11, parágrafo único, a Fator Projetos e Assessoria S/C Ltda., seu diretor e profissionais a ele subordinados e outros19. Em um breve relatório do caso, a informação privilegiada relacionada a fato relevante foi divulgada pela Companhia Paraense de Energia (COPEL), onde se indicou que, em meio aos procedimentos que seriam tomados para privatizar a companhia, era possível a realização de oferta pública de aquisição das suas ações ordinárias. Tal oferta representaria uma valorização e ganhos expressivos aos também titulares de ações ordinárias da companhia, o que ocasionou um impacto positivo para a COPEL no mercado. Devido a expressiva mudança nas negociações

10

Processo nº 5123-26.2009.403.6181. 6º Vara Federal Especializada em Crimes contra o Sistema Financeiro

Nacional e Lavagem de Valores. 11

Processo Administrativo Sancionador CVM Nº SP2007/0119 19

Processo Administrativo Sancionador CVM nº18/01.

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

destas ações, a Gerencia de Acompanhamento de Mercado 2 (GMA-2) propôs a instauração de inquérito administrativo para que fosse investigada eventual ocorrência de insider trading12. 13

A Comissão de Inquérito identificou uma rede de disseminação da informação acerca da possível realização da oferta pública por parte da COPEL. Detectou que através do Grupo Fator, atuaram clientes, operadores de mesa e fundos de investimentos. Dentre as penalizações, podem-se mencionar as multas pecuniárias de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), além de pena de suspensão de autorização para o exercício da função de administrador de carteiras pelo prazo de 1 (um) ano.

4. Dados estatísticos e o perfil do insider.

Em pesquisa sobre a prática do insider trading no Brasil, é possível conhecer o modo como a CVM julga e pune o ilícito no mercado, através dos processos administrativos sancionadores impetrados pela autarquia. Um exemplo é demonstrado pela tabela abaixo, que indica que o tema é objeto de sanção em média duas vezes ao ano, com exceção do ano de 2003, que ficou abaixo da médica

É importante observar também que a quantidade de envolvidos pelo ilícito nos processos julgados pela CVM nos anos de 2002 até 2013 formaram o total de 171 indiciados; sendo certo que apenas no ano de 2004, 51 envolvidos foram investigados, decorrentes de apenas um processo administrativo (Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. FGV. 2014. P.9).

Mas afinal, quem são estes 171 indiciados analisados? Estes são divididos em três categorias de agentes:

12

Usou-se informação privilegiada relacionada a fato relevante divulgado pela COPEL - Companhia Paranaense

de Energia em 25/07/01, no qual se dava conta de que, em meio a determinadas providências com o objetivo

de privatizar a Companhia, era possível que fosse realizada oferta pública de compra das ações ordinárias em

circulação de sua emissão, com vistas a proporcionar aos titulares de tais ações as mesmas condições de

negociação que viessem a ser praticadas pelo Estado do Paraná com o BNDESPAR (fls. 6.600/6.661).

No dia da divulgação do fato relevante a cotação do papel subiu cerca de 14,01%, passando a ser negociado a R$ 13

,51 enquanto o volume médio de negociação, apurado nos 60 dias anteriores, aumentou 246%, de R$ 1.566

mil para R$ 5.428 mil. (CVM nº18/01)

3 0

4 1 1 3 3 2

6 4 4 3

2 0 02 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Fonte: Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos ( - Direito GV. FGV. 2014. P.8).

e do ano de 2010 , que permaneceu acima da média :

Número de processos de Insider Trading* Julgados pela CVM ( por ano) - 2002/2013

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

a) Internos: abrange todos os indiciados que possuem vínculo direto e permanente com a companhia que negociou suas ações com o uso de informação privilegiada: Exemplo: acionistas, administradores e funcionários;

b) Externos: abrange aqueles sem vinculo direto com a companhia, mas que prestam serviços que se relacionam de alguma maneira com a informação privilegiada. Exemplo: advogado que auxilia na compra e venda de uma companhia ou consultores;

c) Mercado: abrange um grupo residual, de agentes que de alguma forma obtém e utilizam a informação privilegiada. Exemplo: investidores de bolsa ou corretores de valores.

Denota-se abaixo que 2/3 dos indiciados não tinham vínculo direto com a companhia, muito menos contato com as informações privilegiadas.

Das Informações privilegiadas utilizadas pelos indiciados por insider trading na

Ou seja, a maior parte das informações investigadas pelo regulador envolve a modificação na estrutura de capital da companhia. As informações sobre o negócio ou sobre a situação financeira aparecem, por sua vez, em número muito reduzido.

Consoante o perfil do insider e a quem se devem punir, doutrinariamente, aqueles que estão “por dentro”, são divididos em dois perfis distintos: um primário englobando pessoas que possuem acesso direto aos fatos relevantes e restritos - e outro secundário (outsider) - pessoas que adquirem a informação restrita e

Externos, 12

Interno, 45

Mercado, 114

Fonte: ( Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. FGV. 2014. P.12) .

Fonte: ( Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. FGV. . 2014 P. 36)

Modificação do controle

acionário, 102

Recompra de ações, 3

informações financeiras conhecidas antes fato

m r e o l e d v i a f i n c a t e ç , ã 1 o 3 da estrutura de

capital, 2

r e orga n izaçã o , 25

fechamento de capital, 13

CVM ( indiciados) - 2002/2013 , tem - se que:

r ees tr u t u ração de dívida, 23

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

privilegiada por meio de outras pessoas, como os insiders primários14. Tal distinção é importante ao se fazer um paralelo com o que foi mostrado na pesquisa supra: os insiders primários, em verdade, pertencem aos grupos Interno e Externo, demonstrados no segundo gráfico; sendo certo que administradores da companhia emissora bem como acionistas estão entre os que mais foram responsabilizados em processos administrativos sancionadores, totalizando 40 culpados. Os insiders secundários, por sua vez, são aqueles que pertencem ao grupo de Mercado, tendo como maiores responsabilizados investidores e corretores de valores, que no total formam 78 culpados. Além disso, entre os anos de 2002 até 2013, o grupo de Mercado compôs 2/3 de todos os culpados, significando dizer que, curiosamente, são os insiders secundários os mais responsabilizados administrativamente pela Comissão de Valores Mobiliários.

Os agentes primários, ao contrário do que se comumente imagina, não necessitam exercer um cargo dentro de uma instituição, muito menos possuir uma posição de comando; bastando que tenham acesso direto à informação privilegiada, em virtude de suas obrigações. Ou seja, tanto um funcionário público como um consultor autônomo qualquer, podem ser englobados como insiders primários. Os agentes secundários, por sua vez, não possuem uma determinação específica, bastando que tenham acesso à informação mediante outras pessoas. Podendo, inclusive, desconhecer do caráter privilegiado da informação, não estando obrigados ao dever de sigilo15. Neste caso, embora seja possível imaginar possíveis sujeitos para compor este grupo, a verdade é que a lei foi abrangente, deixando claro que “qualquer pessoa” pode ser englobada, conforme salienta o já mencionado §4º do art 155 da Lei das Sociedades por Ações. Não há uma restrição para a aplicação da norma, o que abre margem para que muitos defendam a verificação de um nexo causal no acesso à informação privilegiada, negando-se totalmente a hipótese da prática quando do acesso fortuito à informação. “A opção legislativa pela ausência de qualquer qualificação limitadora dos potenciais sujeitos ativos do delito indica a efetiva intenção de abranger o maior número de pessoas possíveis” ( MÜSSNICH, 2015, p. 32).

Não basta apenas o acesso à informação privilegiada, é necessário que a negociação tenha sido motivada exclusivamente por ela. Não havendo tal prova fundamentada, inexiste por consequência qualquer relação causal que caracterize o ilícito. Necessário salientar também que a materialização do dano, apesar de ser elemento essencial para configurar uma futura ação de ressarcimento ao prejudicado, não possui o condão de materializar o ilícito, eis que a mera realização da operação com o intuito de gerar dano é fato suficientemente grave para que se incitem as sanções preliminares administrativas.

14

Enquanto para aqueles recai a presunção de efetiva prática ilícita de uso indevido de informação privilegiada,

para estes é vedada tal presunção, cabendo à parte que acusa o ônus da prova. 15

“importante esclarecer que o especulador é figura totalmente distinta do insider, isso porque, ao contrário

deste, o especulador utiliza as informações amplamente divulgadas aos investidores, para utilizando seus

conhecimentos acerca do comportamento do mercado, realizar investimentos de risco, através dos quais

poderá obter lucros elevados [...]. Infere-se, pois, que o especulador se vale exclusivamente de sua capacidade

de análise do mercado para realizar investimentos de risco e buscar a obtenção de uma boa margem de lucros,

não utilizando informações ainda não divulgadas ao público, pelo que não pode ser confundido com o insider.”

(LAGE, 2011, P. 36).

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

No processo de apuração da responsabilidade do investidor, a CVM analisa critérios distintos. No insider primário, é necessário provar se houve negociação e se esta foi feita com base exclusivamente na informação privilegiada. No insider secundário, por sua vez, é essencial que se identifique a fonte pela qual o agente teve acesso à informação.

É cediço que atores do mercado bem informados são menos propensos de serem levados a erro, desta forma é que a Comissão de Valores Mobiliários defende a educação como medida de prevenção, entendendo que além dos investidores, o público em geral deve compreender a dimensão da questão envolvendo o tema do insider trading16.

5. A prova de culpa

A relevância da análise das provas de culpa é perceptível, visto que para que se apliquem as normas repressivas, necessário que exista processo administrativo ou judicial, em que se assegure ao acusado o exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa, referido direito que decorre da previsão do art. 5º, LV, da CF/88. Embora seja possível punir o insider mediante indícios, não é recomendado este caminho. Embora no insider trading não se exija requisitos formais, a punição baseada apenas em indícios só pode ocorrer, se não existirem outros meios que demonstrem a inexistência da infração.

Diante de todo o exposto, é perceptível a necessidade em se buscar critérios não-normativos para se fundamentar a punição de uma pessoa no esquema de insider trading. Mais do que a tipificação na lei, deve-se comprovar quais fundamentos éticos e econômicos foram violados, bem como o desrespeito ao princípio da isonomia. Isto é, deve estar o mais claro possível que o agente agiu sem ética ao negociar informações privilegiadas visando um benefício para si ou para outrem, tendo consciência de que sua prática foi condenável; que agiu em dissonância com preceitos econômicos, ao antever o comportamento futuro do mercado, obtendo assim a vantagem indevida; que violou o princípio da isonomia ao celebrar negócio jurídico em completa disparidade de condições.

Para além, é essencial que a punição à prática deva ser respaldada em provas capazes de indicar com precisão que o agente foi responsável, principalmente depois de demonstrado que a maioria dos que detêm tal informação privilegiada e que fazem uso da mesma são secundários, mais difíceis de identificar e de se comprovar a má conduta. E por justamente serem agentes mais difíceis de punir, os riscos de se responsabilizar de maneira errônea ou ainda imoderada aumentam.

As provas diretas devem prevalecer sobre as indiretas, sendo assim, são necessários instrumentos que convençam o juiz ou o julgador de maneira objetiva sobre a conduta do agente suspeito e que estes instrumentos comprovem, sem

16

“De forma geral, quanto mais educados são os investidores e os demais agentes do mercado, menor é o risco

de se envolverem em alguma atividade ilícita, como o uso indevido de informação privilegiada. Isso porque eles

estarão cientes das punições a que estão sujeitos e dos danos que essa conduta causa à sociedade, de um

modo geral, e ao mercado de capitais, em particular, visto que reduz sua eficiência e credibilidade e aumenta o

custo de captação das empresas. (CVM, caderno 11. 2016).

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

margem para dúvidas substanciais, quem é o responsável. Provas indiretas ou provas de indícios, devem cair em desuso, sob pena de se estar julgando pessoas que nada violaram e estarem colocando em risco todos os direitos supraindividuais já suscitados sem um verdadeiro motivo.17

Conclusão

Através da pesquisa, percebeu-se que, na esfera administrativa, toda e qualquer pessoa que tenha acesso a uma informação relevante e ainda não divulgada ao mercado, vindo a realizar operações baseadas nesta informação, com a finalidade de obtenção de lucro indevido, decorrente da variação dos valores dos ativos, incorre na prática do ilícito, independentemente do motivo que a levou a ter acesso à informação. Tal entendimento é reforçado no §4º do art. 155 da LSA e na CVM 358/02.

Por outro lado, em resposta ao problema de pesquisa, acredita-se que a caracterização da culpa administrativa e consequente aplicação de punição pela prática do uso indevido de informações privilegiadas, deve se basear em provas diretas, e não em simples provas indiretas ou de meros indícios.

Referências

CASTELLAR, João Carlos. Insider Trading e os Novos Crimes Corporativos. 1. Ed. Rio de Janeiro: Lumen juris, 2008.

Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Caderno 11 - Uso Indevido de Informação Privilegiada - Insider Trading. Rio de Janeiro, 1ª edição, 2016.

LAGE, Telder Andrade Lage. O Insider Trading: O alcance da proibição do uso de informações privilegiadas no mercado de capitais e a responsabilidade do insider. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito) - Faculdade de Direito Milton Campos. Nova Lima.

MACIEL, Katina Teresa da Silva. Efetividade da Repressão ao Insider Trading. Revista de Direito Empresarial, v. 3/2014, p. 149. Revista dos Tribunais.

MÜSSNICH, Francisco Antunes Maciel. O Insider Trading no Direito Brasileiro. 2015. Dissertação (Mestrado em Direito da Regulação) - Fundação Getúlio Vargas – Direito Rio. Rio de Janeiro.

OLIVEIRA, Natália Silva Teixeira Rodrigues de. Insider Trading: uma realidade à luz do direito penal. Rev. Fac. Direito UFMG, 2012. Belo Horizonte.

PARENTE, Norma Jonssen. Aspectos Jurídicos do Insider Trading. In: CVM. 1978.

17

“Dessa forma, tem-se que, mesmo que se reconheça a importância da utilização de prova indiciária para

resolução de certos casos, não satisfaz o reconhecimento de meros indícios esparsos para justificar uma

condenação por. É necessário, para que se sustente uma condenação com base em indícios, uma reunião de

elementos, um conjunto de indícios sérios, consistentes e convergentes.” (MÜSSNICH, 2015, p. 84).

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO UBM Direito, Desenvolvimento e Cidadania. Barra Mansa RJ, Brasil. 24, 25 e 26 de agosto de 2016.

SCALA, Maíra Schweling; VILELA, Renato; RIBEIRO, Victor Bourroul Holloway; PRADO, Viviane Muller (Org.). Dados sobre a atividade punitiva da CVM (20022013). Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. FGV. 2014.

PRADO, Viviane Muller; VILELA, Renato. Radiografia do Insider Trading na CVM. Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. PROENÇA, José Marcelo Martins. Insider trading: Regime Jurídico do Uso de Informações Privilegiadas no mercado de capitais. Ed. São Paulo: Quartier Latin, 2005.