Anatomia Flexível.pdf

download Anatomia Flexível.pdf

of 4

Transcript of Anatomia Flexível.pdf

  • 8/17/2019 Anatomia Flexível.pdf

    1/4

    74 n setembro De 2010 n PESQUISA FAPESP 175

    tecnologia

  • 8/17/2019 Anatomia Flexível.pdf

    2/4

    ANATOMIA FLEXÍVELD c ci nto á ido, o g nh nov o o no b i

    Leve, exível e ao mesmo tempo muito resistente, obambu começa a ganhar cada vez mais espaço comoum material que pode substituir em aplicações in-dustriais a madeira usada na construção de móveis,entrar na composição da argamassa de cimento nolugar da areia ou, ainda, como elemento estrutu-ral na construção civil. Além de ser um excelente

    sequestrador de dióxido de carbono (CO2) da atmosfera,que usa para a formação do seu tecido lenhoso, o bambu éum material renovável que, após a poda, continua a brotaranualmente sem necessidade de um novo plantio. Para cadahectare plantado, quase 10 toneladas de gás carbônico sãoabsorvidas por ano. Entre as cerca de 1.300 espécies debambu existentes no mundo, 19 são consideradas priori-tárias, ou seja, efetivamente úteis para empregos diversose com comprovado valor econômico.

    No Brasil foram identicadas até agora 232 espécies

    nativas, das quais cerca de 80 são endêmicas – existentesapenas no país. Cada uma delas possui características quí-micas e físicas como diâmetro, espessura de parede e alturadistintas, o que resulta em usos diferenciados. “De maneiraincrivelmente rápida, a planta passa do estágio de brotocomestível para alcançar, em poucos meses, até 30 metrosde altura”, diz o professor Marco Antônio dos Reis Pereira,da Faculdade de Engenharia Mecânica da UniversidadeEstadual Paulista (Unesp) de Bauru, no interior de SãoPaulo, que desde a década de 1990, no seu projeto de mes-trado, se dedica a estudar essa gramínea gigante.

    Pereira escolheu como tema de estudo a utilização dobambu em um sistema de irrigação para pequenas áreas.

    Dinorah E reno

    K r i s a r n o l D

    / w w w

    . f l i c K r

    . c o m

    / p h o t o s

    / w K a

    / 4 6 1 0 7 7 0 2 8 4

    / i n / s e t - 7 2 1 5 7 6 2 4 0 6 8 8 2 1 5 0 8

    [ EngEnharia florEstal ]

  • 8/17/2019 Anatomia Flexível.pdf

    3/4

    A partir daí começou a plantar a gra-mínea nocampus da Unesp e hoje pos-sui uma coleção de 25 espécies, dasquais 11 com valor econômico. “Todoano consigo retirar mais de 400 colmosde bambu para utilização nas pesqui-sas”, diz Pereira, autor do livroBambude corpo e alma , escrito em parceriacom o professor Antonio LudovicoBeraldo, da Faculdade de EngenhariaAgrícola da Universidade Estadual deCampinas (Unicamp), lançado em2007. O colmo é o caule cilíndrico ca-racterístico das gramíneas, com nós eentrenós bastante visíveis, como nobambu e na cana-de-açúcar. Além deusar a matéria-prima na forma naturalpara construção de galpões e outrasaplicações, as varas também são corta-das em pequenas ripas, coladas lateral-mente, destinadas à fabricação de cha-pas utilizadas na construção de móveis,objetos de decoração, placas e pisos.

    Anatomia da planta - “Nossos estu-dos são na área de design de produtose também na parte de característicasfísica e mecânica das espécies, comotração, compressão, exão, retração einchamento”, diz Pereira, que tambémdá aulas no curso dedesign na pós-gra-duação da universidade. Em parceriacom o professor Mário Tomazello Filho,da Escola Superior de Agricultura Luizde Queiroz da Universidade de SãoPaulo (USP) em Piracicaba, no interior

    paulista, Pereira desenvolve um dos 12projetos nanciados desde 2008 peloConselho Nacional de Pesquisa Cientícae Tecnológica (CNPq) que têm comofoco o estudo do bambu em suas maisdiversas facetas. Tomazello, coordena-dor do projeto, dedica-se a pesquisasrelacionadas à anatomia da planta.

    “O Brasil não tem mais madeirade lei para fazer mobiliário, porque jáavançamos sobre todos os biomas ondeela existia em grandes quantidades”, dizPereira. A madeira de reorestamento,proveniente de plantações de pinus eeucalipto, é a mais utilizada atualmentepara essa nalidade. “Tudo o que se fazcom a madeira é possível fazer com obambu, porque os dois são parecidosquimicamente.” O que diferencia asduas matérias-primas é a anatomia –porque o bambu é oco. “Embora sejausado há milênios, o bambu é conside-rado o material do futuro, porque é umaplanta de crescimento rápido e sequestramuito CO2 da atmosfera”, ressalta. Paratransformar o eucalipto em produtos eestruturas é preciso esperar entre 20 e30 anos, ante quatro anos necessáriospara o colmo da gramínea gigante serconsiderado adulto – ou maduro –, comadequada resistência mecânica. Para oestabelecimento da cultura, uma moitade bambu leva de oito a 10 anos para setornar adulta, conforme as condições declima e solo. Nos países orientais, comoChina, Índia e Japão, a planta tem maisde 5 mil usos catalogados, que vão dobroto comestível, produção de vinagree cestos, até pontes, templos e prédiosde cinco andares. A estrutura da cúpu-la do monumento indiano Taj Mahal,

    por exemplo, construído há quase 400anos, foi feita de bambu. Uma das par-ticularidades dessa planta é o fato de jánascer com o diâmetro que apresentaráquando adulta.

    Na Universidade Federal de SantaCatarina (UFSC), o grupo de pesquisaliderado pelo professor Carlos Alber-to Szücs, do Departamento de Enge-nharia Civil, também desenvolve umprojeto com bambu laminado coladoe tem como parceiros a empresa cata-rinense Oré Brasil, de Campo Alegre,e a Associação Catarinense do Bambu(BambuSC). A empresa, antes mesmode o projeto ter início, fabricava mó-veis feitos com esse material, mas sentianecessidade de conhecer em detalhes ocomportamento físico e mecânico dobambu gigante (Dendrocalamus gigan-teus ) e do bambu-mossô (Phyllostachys pubescens ) usado nas mesas e cadeirasque produzia. “Nós fazemos a parte decaracterização do bambu sob o pontode vista do seu comportamento me-cânico, ou seja, quanto o conjunto de

    lâminas coladas resiste em função dosdiversos esforços a que a peça nal pos-sa ser submetida”, diz Szücs.

    A empresa trabalha com nas lâmi-nas, que passam por um processo detransformação até estarem prontas parauso. Depois de serem fatiadas e aplai-nadas longitudinalmente, são tratadascom ácido pirolenhoso – obtido pelacondensação da fumaça provenienteda carbonização da madeira durante aprodução de carvão vegetal – e, poste-riormente, secas em uma estufa espe-

    Planta tem mais

    de 5 mil usos

    catalogados nos

    países orientais,

    que vão do broto

    comestível até

    pontes e prédios

    76 n setembro De 2010 n PESQUISA FAPESP 175

    s t u D i o 2 5

    MesaDemoiselleda Oré Brasil:estrutura levee resistente

  • 8/17/2019 Anatomia Flexível.pdf

    4/4

    PESQUISA FAPESP 175 n setembro De 2010 n 77

    cial, de alto rendimento. “As lâminas sãocoladas umas às outras para produçãodo mobiliário”, diz Szücs. Esse processopermite a criação de peças leves e del-gadas, bem diferentes dos móveis rús-ticos fabricados com as varas de bambucortadas e amarradas. Em novembro doano passado, três peças assinadas peloarquiteto e diretor de design da em-presa, Paulo Foggiato, conquistaram oprimeiro lugar na categoria mobiliáriono 23o Prêmio Design Museu da CasaBrasileira, em São Paulo. Entre elas amesa Demoiselle, inspirada nas estru-turas dos primeiros aviões criados porSantos-Dumont, um dos precursoresno uso estrutural do bambu.

    Norma técnica - Após os ensaios feitosna UFSC, os móveis são testados emum laboratório do Serviço Nacional daAprendizagem Industrial (Senai) combase em normas internacionais, porqueno Brasil ainda não há uma norma téc-nica para mobiliários feitos com bambu.Esse é um tema que esteve na pauta dediscussão do 2º Seminário da Rede Na-cional de Pesquisa do Bambu, realizadoem agosto em Rio Branco, no Acre, quereuniu pesquisadores envolvidos com os12 projetos de diferentes instituições e

    universidades nanciados pelo CNPq. Oprograma é coordenado pelo professorJaime Almeida, do Centro de Pesquisa eAplicações de Bambu e Fibras Naturaisda Universidade de Brasília. “Queremosestabelecer uma norma técnica especícapara o bambu, da mesma forma queexiste uma para a madeira”, diz Szücs,que há 27 anos trabalha com madeirasde orestas plantadas.

    No encontro, Beraldo apresentouos resultados do seu projeto, focadona utilização de resíduos da planta emcompósitos destinados à construção ci-vil. Todo processamento de bambu gerapequenos pedaços que podem substi-tuir a brita ou a areia na produção deargamassas e concretos alternativos.Com esse agregado de origem renová-vel é possível fazer um concreto maisleve, que funciona como isolante térmi-co, indicado para uso em pisos, blocosvazados e telhas onduladas. “Comoqualquer material vegetal, os resíduosdo bambu contêm substâncias, comotaninos e açúcares, que interferem nas

    reações de hidratação do cimento”, dizBeraldo, que desde meados da décadade 1980, quando descobriu as váriaspossibilidades de aplicação do bambu,começou a se interessar pelo tema. Paraneutralizar essas substâncias, que dãocor e odor às plantas, basta ferver osresíduos do bambu em água quente ouem solução diluída de cal. Em seguidaeles são secos e estão prontos para ouso. O mesmo material pode ser usa-do na composição do gesso, após tra-tamento das partículas.

    “O bambu tem também grandepotencial de uso na geração de ener-gia, com poder caloríco similar ao doeucalipto”, diz Beraldo. Em apenas qua-tro anos de plantio pode ser usado parafazer carvão, diante de 10 anos do euca-lipto e de 30 de árvores nativas. “Todasas aplicações dessa gramínea gigante, noentanto, vão esbarrar na produção empequena escala para pequenos usos quese faz no Brasil há séculos”, diz Beraldo“É preciso um suporte para a produçãode mudas de forma cientíca.” A produ-ção de mudas de forma sistematizada éum dos grandes entraves para o cultivoem larga escala da planta.

    Pesquisadores do Laboratório deBiologia Celular e Molecular do Centrode Energia Nuclear na Agricultura (Ce-na), no campus da USP em Piracicaba,têm se dedicado a superar esse obstácu-lo. “Embora cresçam naturalmente nocampo, é bastante complicado fazer amultiplicação de mudas das espécies deinteresse, como a do bambu-gigante”,diz a pesquisadora Siu Mui Tsai, coor-

    denadora de um dos projetos apoia-dos pelo CNPq. Após conseguir bonsresultados com a primeira e segundageração, o rendimento começa a decaire, ao chegar à quinta geração, as mu-das morrem. “Isso ocorre porque existenaturalmente uma interação grande daplanta com microrganismos benécosdenominados endofíticos, que são eli-minados no cultivo in vitro ”, diz. Ospesquisadores querem entender melhorcomo funciona essa relação para avan-çar na produção em larga escala. n

    1. Pr j B mbu: m j db mbu- ( D nd ocgig nt ) u v d U sp/ c d B uru d rm çãd s r rís s fís s dr s s ê m â d b mbu

    m d d – º 2003/04323-7 2. tr m quím d m sd b mbu p mé d B u h rm d f d – º 2001/12700-0

    modAlIdAdE

    1 2. a xí io r g p oj tod p q i

    Co or dE NA dorES

    1. m co antonio do r i p i –un2. antonio l dovico b do –unic

    INvEStImENto

    1. r$ 45.989,40 (fapesp)2. r$ 12.065,00 (fapesp)

    Os PrOjetOs

    Lâminas debambu apóstratamento

    c a r l o s s z

    ü c s

    / u f s c