Anestesista e Suas Consequências

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JURISPRUDÊNCIA RESPONSABILIDADE CIVIL – Médico. Anestesista. A responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra (Savatier). Apesar de se inserir no capítulo dos atos ilícitos, a responsabilidade médica é contratual, conforme predomínio da doutrina e jurisprudência. Há obrigação de meios e de resultado. Anestesia é obrigação de resultado, concernente a antes, durante e após o ato anestésico, daí a profunda responsabilidade técnica do médico anestesista, que estatui até uma condição arbitrária para seu desempenho dentro da equipe médica. A determinação de sua responsabilidade dependerá do exame do caso concreto, onde se aplicou anestesia peridural-raquiana e, após algum tempo sem dor mas consciente, o paciente veio a ter concussão cerebral, com traumatismo crânio- encefálico, ficando com lesão cerebral, com dano permanente, em razão da P.C.R. (parada cardiorespiratória). Ocorre que não foi feito o exame de sensibilidade do paciente, e não sendo "intervenção cirúrgica urgente", tanto assim que a anestesia fora setorial, houve falta de cuidado objetivo e técnico do médico anestesista, que por negligência e também imperícia, tanto pelo aspecto omissivo e comissivo, não teve atitude correta, pronta, técnica e profissional condizente ao momento e ao paciente, havendo agido com culpa e respondendo pelo dano causado (arts. 159 e 1.145 e 1.056 do CC). Ainda mais, o acréscimo angustioso, visto não tirar a conscientização ao paciente, o temor de seu estado psicológico, ocasionando a ele, paciente, e consequentemente a terceiros inequívoco dano moral permanente, além do dano material físico. (TJGO – AC29.966-5/188 – 1ª C – Rel. p/o Ac. José Soares de Castro – j. 18.05.93 – RJ 191/68). DOUTRINA Deveres

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O anestesiologista deverá fazer a comunicação aos seus responsáveis, nos termos do art. 59 do Código de Ética Médica.No Brasil, o dever de informação está estabelecido legalmente nos artigos 6.º, III. da Lei Consumerista, no art. 59 do Código de Ética Médica.

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JURISPRUDNCIA

RESPONSABILIDADE CIVIL Mdico. Anestesista. A responsabilidade civil a obrigao que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuzo causado a outra (Savatier). Apesar de se inserir no captulo dos atos ilcitos, a responsabilidade mdica contratual, conforme predomnio da doutrina e jurisprudncia. H obrigao de meios e de resultado. Anestesia obrigao de resultado, concernente a antes, durante e aps o ato anestsico, da a profunda responsabilidade tcnica do mdico anestesista, que estatui at uma condio arbitrria para seu desempenho dentro da equipe mdica. A determinao de sua responsabilidade depender do exame do caso concreto, onde se aplicou anestesia peridural-raquiana e, aps algum tempo sem dor mas consciente, o paciente veio a ter concusso cerebral, com traumatismo crnio-enceflico, ficando com leso cerebral, com dano permanente, em razo da P.C.R. (parada cardiorespiratria). Ocorre que no foi feito o exame de sensibilidade do paciente, e no sendo "interveno cirrgica urgente", tanto assim que a anestesia fora setorial, houve falta de cuidado objetivo e tcnico do mdico anestesista, que por negligncia e tambm impercia, tanto pelo aspecto omissivo e comissivo, no teve atitude correta, pronta, tcnica e profissional condizente ao momento e ao paciente, havendo agido com culpa e respondendo pelo dano causado (arts. 159 e 1.145 e 1.056 do CC). Ainda mais, o acrscimo angustioso, visto no tirar a conscientizao ao paciente, o temor de seu estado psicolgico, ocasionando a ele, paciente, e consequentemente a terceiros inequvoco dano moral permanente, alm do dano material fsico. (TJGO AC29.966-5/188 1 C Rel. p/o Ac. Jos Soares de Castro j. 18.05.93 RJ 191/68).DOUTRINA

Deveres

Na etapa pr-anestsica, dever o facultativo obter informaes acerca da histria clnica do paciente a fim de elaborar a anamnese(histrico do paciente); requisitar exames que entenda pertinentes e, de posse deles, verificar se h necessidade de outros exames complementares; fazer testes de sensibilidade;[50]informar com clareza ao paciente sobre os procedimentos a serem realizados, isto , qual o tipo de anestesia e drogas que sero utilizados, bem como os seus riscos, pois "uma vez bem informado, pode o paciente dar a fiel expresso de seu consentimento, aperfeioando, assim, o contrato entre ambas as partes" (GIOSTRI, op. cit., p. 167).

O dever de informao atenua-se, no entanto, nas hipteses em que o paciente no est em condies psicolgicas para tomar cincia do prognstico, bem assim quando o risco anestsico for grande. Nesses casos, o anestesiologista dever fazer a comunicao aos seus responsveis, nos termos do art. 59 do Cdigo de tica Mdica.

No Brasil, o dever de informao est estabelecido legalmente nos artigos 6., III. da Lei Consumerista, no art. 59 do Cdigo de tica Mdica (contrario sensu) e no art. 422 do Cdigo Civil, que estatui o princpio da boa-f, dentro do qual se insere o dever de informao, de esclarecimento, de lealdade, etc.

Inclui-se ainda na etapa pr-anestsica, o dever de obter o consentimento do paciente, conseqente lgico do dever anterior, pois

Uma vez estando o paciente bem informado o momento oportuno para obter a autorizao prvia e por escrito, com base no principio de que a autodeterminao forma a base jurdica da doutrina do consentimento informado moderno (GIOSTRI, op. cit., p. 167).

Nesse contexto, abordam os autores Urrutia interessante questo, acerca da obteno do consentimento do paciente independentemente da autorizao dada para o ato cirrgico, podendo ocorrer, nessa situao, dois possveis desmembramentos:

a) o consentimento necessrio para a administrao da anestesia, tendo a sua essncia, na prtica, dado margem denncia por m prtica mdica, com pertinente ao reparatria; b) sendo que todo paciente que vai ser operado tem como certa a necessidade de uma anestesia (local ou geral), possvel supor que no consentimento para ser operado j est, obviamente, includa sua acordncia para ser anestesiado (apud, GIOSTRI, p. 168).

Os aludidos autores ressalvam, entretanto, "[...] que se deve pedir autorizao expressa para a anestesia geral, quando o paciente em razo do tipo de interveno poderia supor que s seria submetido a uma anestesia local" (Id. id., p.168).

Por outro lado, como bem recomendou Hildegard, necessrio que conste um item especfico no contrato informando o paciente sobre imprevistos que podem surgir durante a interveno, fazendo com que haja mudana da ttica anestsica anteriormente acordada (op. cit, p. 168).

Alm disso, por evidente, nos casos de urgncia onde devem ser tomadas providncias imediatas para resguardar a sade do paciente, fica o especialista dispensado de obter o consentimento do paciente.

Tomadas essas precaues, vem em seguida a fase de maior relevo da atividade anestsica, chamada por Rosana Leal de "etapa anestsica propriamente dita".

Como se pode observar pela prpria denominao, trata-se do momento em que ocorre a insensibilizao do paciente, a fim de prepar-lo para o ato subseqente, que a interveno cirrgica.

Assim, em virtude da periculosidade que envolve os frmacos utilizados no ato anestsico[51], assume destaque o dever do anestesiologista em acompanhar ininterruptamente o ato operatrio, monitorando atentamente as reaes vitais do paciente para saber exatamente o grau que a anestesia atingiu, verificando, dessa forma, as reaes nervosas, perturbaes cardacas ou respiratrias e a presso sangnea (KFOURI NETO, op. cit. p.140).

Nesse sentido o que estabelece a Resoluo n. 1363/93, do Conselho Federal de Medicina, que no art. 1., impe ao mdico anestesiologista o dever de "[...] manter a vigilncia permanente ao paciente anestesiado durante o ato operatrio [...]" alm de "[...] estar sempre junto a este paciente."

Essas obrigaes esto inseridas pelos doutrinadores Urrutia no chamado "dever de colaborar", censurando o profissional que se retira prematuramente da sala de cirurgia (apudGIOSTRI, op. cit., p.169).

De qualquer sorte, registra Fabrcio Zamprogna Matielo que mesmo incorrendo nessas infraes nem sempre haver a responsabilizao do facultativo, eis que a mera conduta temerria do especialista sem a ocorrncia de danos, no suficiente caracterizao da responsabilidade civil. Convm, pois, transcrever a literalidade de sua lio:

A simples ausncia da sala de cirurgia, sem relao de causa e efeito entre a conduta e o dano, no d ensejo responsabilizao civil do anestesiologista, embora constitua atitude temerria que, fosse hiptese de verificao do nexo causal, agravaria a responsabilidade do infrator (1998, p. 127).

Ademais, considera-se ato atentatrio tica Mdica, o facultativo que realiza anestesia de forma simultnea em dois ou mais pacientes, ainda que seja no mesmo ambiente cirrgico. (art. 1., IV, da Resoluo n. 1.363/93).

Demais disso, cumpre ao especialista permanecer ao lado paciente at que o mesmo se recupere de todos os efeitos da anestesia ministrada, evitando dessa maneira acidentes, como a obstruo das vias respiratrias e as manifestaes de choque bem como para ministrar-lhe lquidos fisiolgicos.[53]Com base nesses cuidados adicionais, possuir o anestesiologista condies de avaliar o momento oportuno para dar alta ao paciente, como determina do art. 2., VIII, da Resoluo n. 1.363/93.Ademais, a fim de complementar e sintetizar as informaes delineadas acima, vale mencionar a conhecida lista de deveres do anestesiologista elaborada pelos professores Osvaldo Loudet e Jean Marquez Miranda, da Sociedade de Psiquiatria e Medicina Legal de La Plata, e atualizada pela paranaense Hildegard:1) o risco representado pela anestesia no deve ser maior que o risco da cirurgia em si[54]; 2) o ato anestsico a no ser em certas ocasies precisas e especialssimas deve ter o consentimento de seus representantes legais; 3) a anestesia deve sempre ser precedida de exames prvios e deentrevista pessoalcom o paciente, da advindo a possibilidade de uma melhor avaliao fsica e de uma confiana maior por parte do doente em relao ao profissional e ao prprio ato cirrgico; 4) conferir os frascos de todos os medicamentos a serem utilizados antes do ato anestsico, bem assim as sadas dos condutores de gs; 5) instrumentos e aparelhos pertinentes ao ato anestsico devem ser testados pelo anestesiologista antes que aquele inicie; 6) proceder o ato anestsico em presena de membros da equipe cirrgica; 7) no se afastar, jamais, e sob o pretexto algum, da cabeceira do paciente anestesiado[55]; 8) no deixar subalterno, alheio especialidade, responsvel pelo ato anestsico, seja no seu incio, meio ou fim[56](op. cit., p. 55-56).

Portanto, dessume-se de tudo isso que em todas as etapas das atividades laborais do anestesiologista, h que prevalecer aquilo que for de melhor interesse ao paciente de sorte que, na medida do possvel, seja a ele assegurada a legtima expectativa do resultado final esperado.

2 PESQUISAOutro ponto importante a questo da relao mdico-paciente, originada por uma cirurgia eletiva ou de emergncia/urgncia. No primeiro caso, o anestesiologista tem o dever de proceder a uma avaliao pr-anestsica, recomendando-se, na medida do possvel, uma consulta especfica antes da data da cirurgia, tendo-se condies melhores de avaliar qual conduta mais indicada a ser executada no paciente. Nessa oportunidade, o paciente tem a obrigao de informar todas as drogas de que faz uso, todas as caractersticas relevantes de seu organismo e seus problemas j conhecidos, bem como deliberar sobre honorrios profissionais, se for o casoiv. Isso por vezes no possvel em situaes de urgncia/emergncia, com o mdico anestesiologista espera do paciente j no centro cirrgico.

As demais etapas comuns no divergem se a cirurgia classificada como eletiva ou de emergncia/urgncia, sendo dever do anestesiologista estar presente durante todo o ato cirrgico; verificar variaes de presso e condies orgnicas monitoradas. Mesmo monitoradas essas condies podem mudar em questo minutos, podendo provocar paradas crdio-respiratrias, e a demora nas manobras dos quadros graves podem levar o paciente a bito ou seqelas irreversveis por falta de oxigenao cerebral. Assim, estar na cabeceira do paciente fundamental para monitorar e proceder imediatamente diante das intercorrncias que possam surgir.

H tambm a necessidade do acompanhamento do anestesiologista no ps-operatrio imediato, at o total recobrar de conscincia do paciente, em que os efeitos anestsicos esto minimizados, permanecendo disposio para esclarecimentos aos pacientes nessa etapa cirrgica, para informar dados e possveis complicaes, intercorrncias ocorridas durante o ato cirrgico e a recuperao ainda dentro do centro cirrgico.

A responsabilidade pelo paciente aps o ato cirrgico, enquanto este ainda estiver na recuperao dentro do centro cirrgico do mdico anestesiologista, a quem compete dar atendimento em caso de intercorrncias, proceder atos mdicos necessrios, tais como, encaminhar para os quartos ou at mesmo para a UTI, ou viabilizar transferncias se for necessrio.

O anestesiologista deve ainda manter:a)um registro minucioso (que pode ser sua melhor prova de conduta ou uma grande lacuna lanando dvidas sobre suas aes) de toda a consulta e ato cirrgico, com destaque para as avaliaes pr-anestsicas, com anamnesevdetalhada, avaliao e descrio para o ato cirrgico especfico;b)no centro cirrgico, relato no pronturio do paciente com a especificao de todas as drogas ministradas em suas doses pormenorizadas, tcnicas utilizadas, bem como de todas as intercorrncias havidas durante o ato cirrgico;c)na fase ps-cirrgica, na sala de recuperao, relato de toda a evoluo e recobrar de conscincia do paciente ou no. Sua responsabilidade, a princpio, termina nesse momento, salvo se comprovado algum efeito de sequelas decorrentes especificamente da anestesia.

Em sntese, para que a atuao do mdico seja a mais proveitosa possvel em favor de seu paciente, com o restabelecimento de sua sade na forma em que suas condies permitirem, o profissional deve possuir, essencialmente:a)conhecimento pleno de sua profisso, devendo o anestesiologista se atualizar com a evoluo da medicina, observando rigorosamente os procedimentos;b)uma linguagem acessvel no nvel de compreenso do seu paciente e de seu estado psicolgico. Em especial, ao anestesiologista podemos destacar ainda uma ltima recomendao: quanto menos sua atuao afetar o ato cirrgico tanto melhor, posto que ela um meio para o fim principal que a interveno cirrgica, na maior parte das vezes.

i Jurisprudncia/Julgados/2003/TAPR/ 98002767 - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ERRO MDICO. RESPONSABILIDADE CIVIL. AO. Magister Net.. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ERRO MDICO. RESPONSABILIDADE CIVIL. AO DE REPARAO DE DANOS ENDEREADA AO MDICO E AO HOSPITAL. INTERCORRNCIA PS-ANESTSICA AINDA NO CENTRO CIRRGICO COM EVOLUO PARA PARADA CRDIO-RESPIRATRIA. ALEGAO DE CULPA (NEGLIGNCIA) NA DEMORA DO ATENDIMENTO. (...) OPORTUNA INTERVENO DO ANESTESISTA COM REVERSO DA PARADA CRDIO-RESPIRATRIA E OBEDECIDOS OS PROCEDIMENTOS TCNICOS ADEQUADOS EMBORA COM AS GRAVES SEQELAS NEUROLGICAS RETRATADAS NO CADERNO PROCESSUAL. RECURSOS PROVIDOS PREJUDICADO O DOS AUTORES. (...) 5. Se da valorao da prova produzida na instruo do feito emerge que o mdico anestesista no se afastou do centro cirrgico no perodo de recuperao ps-anestsica do paciente, e que sobrevindo a intercorrncia agiu o mesmo prontamente com a utilizao da tcnica recomendada, no se configura nem a culpa, nem o nexo de causalidade, sem os quais no exsurge a responsabilidade civil do profissional e conseqentemente do hospital.(TAPR; AC 0232386-6; Ac. 18342; Maring; Primeira Cmara Cvel; Rel. Des. Ronald Schulman; Julg. 09/12/2003.