Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

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como foi contado a

ANGIE SAGE

Ilustrações

JIMMY PICKERING

Tradução

RITA SUSSEKIND

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SUMÁRIO

~ 1 ~ O CAPACETE DO CAVALEIRO

HORÁCIO

~ 2 ~ ESTA CASA ESTÁ A VENDA

~ 3 ~ HOTÉIS ENORMES

~ 4 ~ CAVALEIRO HORÁCIO

~5 ~ A PASSAGEM SECRETA

~6 ~ EDMUNDO

~7 ~ A VARANDA

~8 ~ CAVALEIRO HORÁCIO

~9 ~ KIT-EMBOSCADA

~10 ~ A TERRÍVEL EMBOSCADA DE

ARAMINTA

~11 ~ VÁO EMBORA!

~12 ~ O PLANO B

~13 ~ VANDA E ARAMINTA

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Tudo começou quando eu estava no

meu quarto de quinta-feira realizando meu

ensaio de fantasma. Eu sempre fiz ensaios

de fantasma regularmente, já que tinha a

certeza de que seria mais fácil encontrar

um fantasma se ele pensasse que eu

também era um. Sempre quis encontrar um

fantasma, mas sabe que, apesar de a nossa

casa se chamar Casa Fantasmim, eu nunca,

nunca vi um único fantasma, nem um

pequenininho. Imaginei que a tia Tatá os

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tivesse espantado — ela teria me espantado

se eu fosse um fantasma.

Então, eu estava ocupada ensaiando

com o meu lençol de fantasma sobre a

cabeça, por isso tropecei no pé esquerdo do

Cavaleiro Horácio. Coisa estúpida. E, em

seguida, seu pé esquerdo caiu, e o Cavaleiro

Horácio desmoronou em centenas de

pedaços. Estúpido Cavaleiro Horácio. Todas

as partes do estúpido Cavaleiro Horácio

rolaram pelo chão, e eu pisei em sua cabeça

e meu pé ficou preso nela. Não se preocupe,

não era uma cabeça de verdade. O

Cavaleiro Horácio era apenas uma velha

armadura malfeita que estava sempre pelo

caminho, se escondendo em diversos cantos

escuros.

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Eu gritava com ela para que saísse e

pulava sacudindo o pé como uma louca, mas

a cabeça estúpida do Cavaleiro Horácio

estava presa. Em seguida, no momento

perfeito, tia Tatá gritou: “Café da manhã!”

naquele tom de se-você-não-descer-agora-

mesmo-eu-vou-dar-seu-café-pa-ra-o-gato —

não que a gente tenha um gato, mas é o que

ela faria se tivéssemos, eu sei que faria.

Então dei a sacudida mais forte do

mundo com o pé — aliás, estou surpresa por

a perna toda não ter se soltado —, e o

capacete do Cavaleiro Horácio voou para

longe, saiu pela porta do quarto e caiu pelas

escadas do sótão. Fez um barulho

fantástico. Poderia ter ouvido lá do porão. O

som se propaga muito bem nesta casa, por

isso eu também pude ouvir o grito da tia

Tatá muito bem.

Achei melhor ir andando, então

escorreguei pelo corrimão e desci no

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patamar. Queria ver se o tio Drac já tinha

ido dormir — ele trabalha à noite —, pois, se

já tivesse, eu iria acordá-lo para que ele

descesse comigo, caso tia Tatá desse um

ataque. A porta do seu quarto é a vermelha

pequena, no fim do corredor de cima, o que

leva até a torre.

Fui muito cuidadosa ao abrir a porta,

já que ela dá numa queda quilométrica. Tio

Drac retirou todo o piso da torre para que

seus morcegos pudessem voar para onde

quisessem. Tio Drac adora seus morcegos;

faria qualquer coisa por eles. Eu também

adoro morcegos, eles são tão dóceis.

Empurrei o Morcegão do caminho, e

ele caiu lá para baixo da torre. Mas não tem

importância, já que o chão da torre tem

mais ou menos uns três metros de cocô de

morcego, então é bem macio.

Sem o Morcegão no meio da porta, eu

podia ver o saco de dormir do tio Drac com

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facilidade. Estava pendurado numa viga

como um grande morcego em forma de flor

— e estava vazio. Ótimo, pensei, ele ainda

está lá embaixo com a tia Tatá. Então, para

poupar tempo, escorreguei pelo corrimão da

escadaria principal e também pelo corrimão

da escada do porão — o que eu não deveria

fazer, já que ele se solta e cai

constantemente — e, num segundo, já

estava do lado de fora da segunda-cozi- nha-

à-esquerda-logo-depois-da-despensa. Estava

suspeitamente quieto lá. Oops, pensei,

problemas!

Empurrei a porta com muito cuidado, e

fiquei feliz por tê-lo feito, já que tia Tatá

estava sentada na ponta da longa mesa,

passando manteiga numa torrada de uma

maneira que parecia que a torrada tinha

dito alguma coisa muito pessoal e muito

grosseira. Não parecia um café da manhã

divertido, pensei. Os sinais não eram bons.

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Primeiro sinal não-bom: no meio da

mesa estava o capacete do Cavaleiro

Horácio. Ele tinha bem mais entalhes do

que quando o vi pela última vez, mas

obviamente não era minha culpa, já que ele

estava direitinho quando saiu do meu pé.

Segundo, terceiro, quarto e quinto

sinais não-bons: tia Tatá estava toda

coberta de fuligem — menos as duas

janelinhas em seus óculos, que ela tinha

limpado bem para que pudesse atacar a

torrada. Tia Tatá coberta de fuligem é o pior

dos sinais. Significa que ela lutou contra o

aquecedor de água, e ele venceu. Sentei na

minha cadeira de maneira atenciosa e

solidária. Tio Drac parecia muito aliviado

em me ver. Veja bem, eu moro com meus

tios, pois meus pais foram caçar vampiros

na Transilvânia quando eu era pequena e

nunca mais voltaram.

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Tio Drac estava ocupado comendo o

restinho de seu ovo cozido e tinha fuligem

na boca por causa da torrada cheia de

cinzas que tia Tatá preparou para ele.

— Olá, Pimentinha — disse ele.

— Olá, tio Drac — respondi. Tentei

pensar em algo gentil para dizer à tia Tatá,

mas era difícil pensar em qualquer coisa

com o capacete do Cavaleiro Horácio me

encarando com seus olhinhos redondos e

lustrosos. O capacete não tem olhos de

verdade, é claro, mas eu sempre achava que

estava me olhando, apesar de saber que não

passava de uma lata vazia.

Tia Tatá jogou minha tigela de mingau

de aveia na minha direção, então eu disse:

— Obrigada, tia Tatá. — E depois, já

que tia Tatá gosta de conversas educadas

durante o café, continuei: — Andou tendo

problemas com o aquecedor de água

novamente, tia Tatá?

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— Sim, querida, mas não por muito

tempo — disse ela, mal mexendo os lábios.

Antigamente, quando tia Tatá falava assim,

eu achava que ela estava treinando para ser

ventríloqua, mas agora sei que é porque ela

está decidida em relação a alguma coisa e

não se importa se você concorda ou não

com ela.

— Ah, por que, tia Tatá? — perguntei

de forma especialmente gentil enquanto

cobria meu mingau de aveia com açúcar

mascavo e misturava bem depressa,

deixando tudo com uma bela cor de lama.

Tia Tatá rangeu os dentes e disse:

— Não faça isso com o açúcar, querida.

Porque vamos nos mudar, por isso.

Pouca coisa faz com que eu pare de

cavar buracos de lama no meu mingau de

aveia — você sabe, aqueles em que você

abre um canal que se enche de açúcar

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mascavo, que eu acho que parece com lama

—, mas isso fez.

Mudar? O que ela estava dizendo? Não

podíamos nos mudar de jeito nenhum, não

antes que eu encontrasse pelo menos um

fantasma. E eu também queria encontrar

um vampiro e um lobisomem. Tinha certeza

de que deveria haver alguns na adega.

— Não fique de boca aberta quando ela

estiver cheia, querida — disse tia Tatá, o

que não me parecia justo, já que o tio Drac

estava com a sua boca aberta também, e

estava cheia de torrada com fuligem, o que

era nojento.

Em seguida, tia Tatá lançou ao tio Drac

seu olhar diabólico (que é quase tão bom

quanto o meu) e disse:

— Drac, esta casa é grande demais

para nós. É empoeirada e é suja, é muito

fria e cheia de aranhas. O aquecedor é uma

ameaça. Nós vamos nos mudar para um

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apartamento charmoso, pequeno, limpo e

moderno, que não tenha aquecedor.

— Mas... — tentei interromper, mas

não adiantou nada. Tia Tatá continuou

falando.

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— E quando tivermos nos mudado para

um apartamento, capacetes de velhas

armaduras enferrujadas não vão mais cair

nos meus dedos dos pés, porque não

teremos velhas armaduras enferrujadas, O

Cavaleiro Horácio pode ir para a

reciclagem. Você pode levá-lo, Drac.

— O quê? — disse tio Drac, com o rosto

parecido com o de um de meus peixinhos

quando a água do aquário ficava muito

baixa.

Finalmente consegui falar uma

palavra, apesar de ainda estar com a boca

cheia de mingau de aveia —, estava chocada

demais para engolir.

— Mas nós não podemos sair desta

casa — eu disse a tia Tatá. — Lugar nenhum

vai ser igual a esta casa!

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Exatamente — disse tia Tatá, como se eu

tivesse concordado com ela ou coisa do tipo.

— Lugar nenhum pode ser como esta casa.

Olhei para o tio Drac — eu precisava

de ajuda. Tio Drac entendeu a indireta.

— Calma, calma, Tatá, querida —

murmurou ele, com sua voz de acalme-se-

tia-Tatá —, você não está falando sério.

— Eu estou falando sério, Drac — disse

tia Tatá. Em seguida ela tentou me atrair

para o seu lado. — E, Araminta, querida,

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você sempre diz que se sente só aqui. Pense

um pouquinho, você teria muitos amigos

num bom condomínio.

Ela não foi bem-sucedida em sua

tentativa.

— Não me importo — eu disse a ela. —

Prefiro ficar aqui a ter um monte de amigos

idiotas.

— Bem, isso é o que veremos — disse

tia Tatá, com seu olhar de ventríloqua

maluca.

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Mais tarde naquela manhã, eu estava

olhando pela janela do meu quarto de

quinta-feira e pensando a respeito do que

tia Tatá dissera. Sempre acho mais fácil

pensar enquanto faço outra coisa, então

estava ocupada arrancando pedacinhos de

tinta preta dos contornos da janela e

arremessando-os nas estátuas monstruosas

do parapeito.

Foi sorte eu ter olhado lá para baixo e

percebido o homem parado na frente da

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entrada. Ele vestia um terno azul-brilhante

e estava encarando a casa enquanto fazia

anotações em seu bloco. Soube o que ele

era na hora — um corretor de imóveis. Dava

para perceber que tia Tatá estava falando

sério. Bem, eu também.

Então desci da janela e cantarolei uma

canção alegre para mim mesma: “La-di-da,

la-di-da, hora de limpar o meu aquário.”

Encontrei o velho aquário num canto

escuro, onde o guardei depois que o Brian,

meu último peixinho, fugiu. Não sei para

onde ele foi, mas nunca mais voltou. Por

motivos sentimentais, conservei o aquário

do jeito que o Brian deixou, então estava

cheio de lodo, algas velhas e uma água

verde e fedorenta.

O corretor de imóveis estava de pé

logo abaixo da minha janela. Equilibrei o

aquário no peitoril e o derrubei. Caiu bem

em cima dele. Na mosca!

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O corretor de imóveis ficou coberto de

meleca verde na cabeça e em seu terno

azul-brilhante. Ele ficou

parado por alguns

instantes — como se

estivesse muito surpreso

— e cuspiu uns pedaços

de algas escorregadias.

Em seguida olhou para

cima, e direcionei meu

olhar diabólico a ele. Ele

emitiu um barulho

estranho, explosivo, co-

mo um ganido, e saiu

correndo pela trilha.

Bons ventos o levem.

Na hora do almoço

na terceira-cozinha-à-

direi- ta-logo-depois-da-

sala-do-aquece-dor, não

me surpreendi ao ver tia

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Tatá com uma cara tão enfezada quanto a

do café da manhã.

— Estes corretores de imóveis não são

nada confiáveis — disse ela, enquanto

espetava uma batata indefesa e a colocava

no meu prato. — Passei a manhã inteira

esperando um, mas ele nem se incomodou

em aparecer.

Eu não disse nada. Tia Tatá olhou para

mim por um instante e, em seguida, disse:

— Vou colocar minha própria placa

esta tarde. Você vai adorar me ajudar a

pintá-la, Araminta.

— Não vou — eu disse a ela.

Tentei evitar tia Tatá durante a tarde,

mas ela me encontrou na adega procurando

por vampiros e me arrastou até o jardim.

— O dia está lindo, Araminta — disse,

animada. — Um pouco de sol lhe fará muito

bem. Você está muito pálida.

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Bem, é claro que eu estava pálida. Era

por causa da poeira de giz no meu rosto.

Caçar vampiros é como caçar fantasmas —

você tem que parecer um deles para ter

chance de encontrar algum. Acho que fico

muito bem de vampira e gostaria que meus

dentes crescessem também (mas, quando

eu perguntei á dentista como poderia fazer

isso, ela não ajudou nem um pouco).

Tia Tatá havia limpado um terreno de

urtiga — urtiga é o que melhor cresce em

nosso jardim — e posto uma tábua e umas

tintas em seu lugar. Minha tia pensa que é

artista, mas eu tenho minhas dúvidas.

—Venha, querida — disse ela, dando

tapinhas no chão ao seu lado como se

fôssemos fazer um piquenique ou coisa

parecida —, você sabe que adora pintar.

— Não — eu disse a ela.

Então, sentei nos degraus e os chutei,

o que é bem divertido, já que eles são muito

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deformados, e você freqüentemente

consegue arrancar grandes pedaços de

pedra. Observei enquanto tia Tatá se

concentrava na pintura, até que ela estava

tão coberta de tinta quanto a tábua. Quando

a tinta acabou, ela prendeu a tábua num

pequeno poste e o fixou na cerca viva. A

placa dizia:

Tia Tatá parecia satisfeita. Esfregou

suas mãos sujas de tinta na parte da frente

do vestido e disse:

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— Nada mal. Não perdi o jeito. O que

você achou, Araminta?

Eu não disse o que se passava pela

minha cabeça, já que não teria sido educado

de minha parte. Além disso, estava ocupada

pensando. Precisava desesperadamente de

um plano — tia Tatá não conseguiria assim

tão facilmente. Então, quando ela entrou em

casa para brigar com o aquecedor, pensei a

respeito do meu plano. Não demorou muito

para que eu elaborasse um. Logo a placa

dizia:

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Simples.

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Na manhã seguinte, acordei cedo.

Sabia que tia Tatá não desistiria facilmente

e eu queria vigiá-la, então depois do café da

manhã fiquei pelo vestíbulo, fingindo que

estava contando as aranhas. Tudo (inclusive

a tia Tatá) estava suspeitamente quieto —

até que bateram à porta.

Corri para abrir, mas tia Tatá, que

estava de tocaia atrás do relógio, chegou

primeiro. Tirou-me do caminho com o

cotovelo (tia Tatá tem cotovelos muito

afiados) e abriu a porta.

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Em pé na entrada havia uma mulher

muito estilosa carregando uma pasta. Não

gostei nem um pouquinho dela, então lancei

meu melhor olhar diabólico. Percebi que

funcionou — ela logo ficou pálida e engoliu

em seco, um pouco como Brian fazia. Abriu

e fechou a boca como se tivesse esquecido

como se falava e, em seguida, disse com a

voz trêmula e aguda:

— Eu... eu vim ver a casa. Em nome da

Corporação Hotéis Enormes.

Tia Tatá parecia felicíssima.

Que droga, pensei. Que falta de sorte

que essa tal sra. Corporação Hotéis

Enormes não soubesse ler. Fui lá fora

verificar a placa, mas agora dizia:

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Hummm... Tia Tatá estava se

mostrando mais esperta do que eu

esperava.

Ela estava ocupada mostrando o

vestíbulo para a Hotéis Enormes quando

voltei para dentro da casa.

— Foi muito estranho, querida — disse

tia Tatá, com um sorriso engraçado. —

Alguém alterou a placa ontem à noite.

Percebi quando o tio Drac saiu para

trabalhar. Não me surpreenderia se

descobrisse que foi um desses corretores de

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imóveis. Seja como for, já consertei, não

acha?

Não respondi — não havia tempo a

perder. Corri para o andar de cima, para

meu quarto de sexta-feira, e peguei meu kit

de fantasma. Abri a caixa depressa, tirei

meu lençol de fantasma branco e esvaziei

um saco de farinha sobre ele. Logo depois,

enchi um balão enorme e peguei uma

buzina do tipo surpreenda-seus-ami- gos-

com-um-fantasma-sufocado.

Segurei a ponta do balão para que o ar

não escapasse, em seguida pus o lençol

cheio de farinha sobre minha cabeça para

que cobrisse a mim e ao balão. Eu estava

pronta.

Logo ouvi tia Tatá subindo as escadas

com suas enormes botas, seguida pelo som

assustado dos sapatos da Hotéis Enormes.

Estava na hora.

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Abri a porta do meu quarto e, no velho

espelho do fim da escada, pude ver o reflexo

de um fantasma empoeirado aparecendo.

Não estava tão assustadora quanto queria,

mas estava bom. Era muito difícil descer

pelas escadas do sótão, mas consegui

chegar lá embaixo.

Então, subi no baú perto da janela e

me escondi atrás da cortina.

Isso! A emboscada estava pronta.

Eu podia ouvir tia Tatá e a Hotéis

Enormes logo no corredor. Tia Tatá falava

sobre como adorava as pias gotejantes do

banheiro, e a Hotéis Enormes falava consigo

mesma:

— Grande potencial... Charme antigo...

Hotel temático...

Isso é o que veremos, pensei. Pulei do

baú e buzinei.

Aiiieeeeeeeeeeeeee!

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Foi maravilhoso. A Hotéis Enormes

ficou completamente pálida. Dava para

perceber que ela sabia que tinha cometido

um grave erro. Ela girou e gritou. Gritou

mesmo. Enquanto ela gritava, segurei a

cortina e sacudi bastante meus braços para

que a farinha voasse por todos os lados

criando uma névoa branca. A buzina do

fantasma sufocado foi ótima continuou

tocando e tocando — mas só para garantir

fiz uns barulhos horríveis também.

A Hotéis Enormes não estava

desistindo com facilidade. Seus gritos eram

incríveis — realmente lancinantes —, e ela

não parava nem para respirar. Tia Tatá

agarrou a Hotéis Enormes para tentar

acalmá-la, mas ela não queria se acalmar.

De jeito nenhum.

Foi então que um pouco de farinha

ficou preso na minha garganta e me fez

engasgar um pouco — bem, muito, na

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verdade — e foi quando a Hotéis Enormes

parou de gritar e ficou me encarando,

apesar de ainda estar com a boca aberta

como se quisesse gritar.

Devagarzinho ela começou a caminhar

para trás pelo corredor e passou direto por

uma das teias de aranha mais antigas, na

qual a maior e mais peluda aranha morava

— e eu vi a maior e mais peluda aranha de

todas cair na sua frente. A Hotéis Enormes

soltou um grito agudo que fez com que

meus ouvidos apitassem. Ela correu escada

abaixo em dois segundos.

Fiquei impressionada.

— Foi rápido — eu disse, retirando

meu lençol e respirando um pouco de ar

puro sem farinha.

Tia Tatá me olhou furiosa.

— Sério, Araminta, o que você está

fazendo? — perguntou ela. — Não sei o que

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deu em você. É a minha melhor farinha que

você está usando?

— É — eu disse. — Mas não funcionou.

Meus pés não saíram do chão nem uma vez.

Tia Tatá reclamou e catou as aranhas

que caíram de suas teias e ficaram cobertas

de farinha. Em seguida carregou-as para

baixo e limpou-as.

Sentei perto das cortinas mofadas em

meio a uma pilha de farinha e desembrulhei

meu lençol de fantasma. As coisas estavam

dando certo, pensei, mas eu sabia que tia

Tatá não desistiria com tanta facilidade.

Page 38: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Naquela noite, depois que tia Tatá me

contou uma história do Livro cor-de-rosa de

histórias para dormir de espíritos e

fantasmas e desceu para encher o

aquecedor de água, me levantei. Desci

sorrateiramente pelas escadas do sótão e

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esperei nas sombras do lado de fora da

torre do tio Drac.

Quando a lua se levantou, a porta

vermelha se abriu, e o tio Drac saiu. Eu o

observei andando devagar pelas escadas até

o vestíbulo, onde tia Tatá esperava por ele

com sua garrafa térmica e seus sanduíches.

Ela deu-lhe um beijinho de despedida e um

tchau enquanto ele saía para trabalhar. A

porta da frente se fechou silenciosamente

atrás dele, e tia Tatá desapareceu de volta

para o porão.

Fui escondida lá para fora e alterei a

placa mais uma vez. Agora dizia:

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Isso daria certo. Quem compraria uma

casa mal-assombrada?

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Amanhã de sábado não foi uma boa

manhã. Tia Tatá estava limpando o

aquecedor — outra vez. Sempre fico longe

quando tia Tatá se aproxima do aquecedor,

mas hoje foi diferente. Queria reabastecer

de farinha a minha caixa de fantasma, já

que achava que, em breve, fosse precisar, e

tia Tatá guarda toda sua farinha na terceira-

dispensa à-esquerda-logo-depois-da-sala-do-

aquecedor.

Já tinha quase passado em segurança

pela sala do aquecedor quando tia Tatá

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olhou para cima e me viu. Droga. Dava para

perceber que ia arrumar problemas. Ela

estava com uma escova enorme nas mãos e

tinha acabado de chutar um balde d’água.

Eu tinha razão; ela arrumou

problemas.

— Araminta, querida — disse ela —

Você pode, por favor, remontar o Cavaleiro

Horácio? Ele passou dois dias inteiros aos

pedaços.

Cavaleiro Horácio? Desde quando tia

Tatá se importava com o Cavaleiro Horácio?

— Eu preciso? — perguntei, irritada.

Tinha coisas melhores para fazer do que

remontar um lixo enferrujado. Por que a tia

Tatá sempre aparece quando você menos

quer vê-la?

— Sim, você precisa. — Tia Tatá

chutou a lataria. — Algumas pessoas

interessadas em comprar a casa estão

vindo, e eu acho que uma bela armadura no

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vestíbulo causará uma boa impressão. As

pessoas gostam de armaduras. E,

Araminta...

— O quê? — eu disse.

— Quero tudo arrumado e bonito, por

favor! As pessoas vêm esta tarde.

— Esta tarde? — engasguei. — Mas

isso não me deixa tempo para... Oops!

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— Para quê? — perguntou tia Tatá,

desconfiada, me olhando através dos óculos

fuliginosos.

— Para... bem... arrumar meu quarto —

eu disse, com minha voz mais gentil.

— Bem, é melhor você se apressar, não

é querida? disse tia Tatá. — E leve este

capacete horroroso com você.

Peguei o capacete do Cavaleiro

Horácio e saí do caminho da tia Tatá. Não

podia haver mais pessoas querendo ver a

casa, pensei. Será que eles não conseguiam

ler a placa lá fora?

Fui para o jardim ver se tia Tatá tinha

mudado mais uma vez, mas não. Ainda

dizia:

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Eu não conseguia entender. Por que

alguém compraria uma casa mal-

assombrada? Mas, só para me certificar,

acrescentei um pouco mais à placa:

Joguei o capacete do Cavaleiro Horácio

no chão do meu quarto de sábado — que é o

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meu preferido, já que você só consegue

chegar até ele subindo por uma escada de

corda e depois passando espremido por uma

pequena porta, o que mantém tia Tatá

longe. O problema era que o resto do

Cavaleiro Horácio ainda estava pelo chão do

meu quarto de quinta-feira, então demorei

horas para trazer os pedaços pelo corredor

e jogá-los pela porta. Tenho ótima mira, mas

devo admitir que nem todos os pedaços

passaram pela porta de primeira.

Comecei a remontar o Cavaleiro

Horácio e, enquanto descobria qual braço

ficava onde, tentava decidir qual seria o

meu plano para a tarde. Pensei em tentar o

Plano do Melaço na Maçaneta com o Arame

Invisível para Tropeço, apesar de também

precisar do balde de Lodo Surpresa, só para

garantir. Mas, fosse o que fosse que eu

fizesse, tinha que acabar de remontar o

Cavaleiro Horácio depressa, pois tia Tatá

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com certeza apareceria para verificar o

trabalho.

Era muito difícil montar o Cavaleiro

Horário. Havia ainda mais pinos nele agora,

e muitos pedaços não se encaixavam onde

deveriam, não importava o quanto eu

forçasse. Era muito irritante.

Já era quase hora do almoço quando

consegui acabar de remontar o Cavaleiro

Horácio — todinho, quer dizer, exceto pelo

seu pé esquerdo. Seu pé esquerdo é o pé

esquerdo mais idiota que já vi.

Eu estava muito irritada, então disse

ao Cavaleiro Horácio exatamente o que

deveria acontecer.

— Está tudo bem para você, Cavaleiro

Horácio, sua velha lata enferrujada — eu

disse —, mas tenho coisas mais importantes

a fazer. Se eu não preparar meus planos,

pessoas muito idiotas que sequer sabem ler

uma placa perfeitamente óbvia vão comprar

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esta casa, e nós teremos que nos mudar. E,

quando nos mudarmos, tia Tatá vai te jogar

na lata de lixo reciclável. E, em seguida,

você vai ser amassado como uma panqueca

e derretido, e vai se transformar em

centenas de latas... que provavelmente vão

ser preenchidas por comida de gato. Rá-rá!

Page 50: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Neste momento eu já estava

extremamente irritada com seu pé

esquerdo. Bati com ele de cabeça para

baixo no chão e ouvi um barulho. Sacudi

novamente, e então algo muito legal

aconteceu — uma pequena chave de bronze

caiu.

Dava para perceber que era uma chave

muito velha, já que estava bem gasta, como

se tivesse ficado no bolso de alguém por

centenas de anos. Mas a melhor parte era

que havia uma velha etiqueta marrom presa

a ela, e, na etiqueta, uma inscrição meio

apagada em letras muito antigas. Dava para

ler o que dizia:

Esta é a chave da Varanda

(Abre todas as portas)

Page 51: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

“Varanda” era uma palavra engraçada,

e eu imaginei o que poderia significar.

Parecia o nome de uma terra distante ou de

alguma antiga cidade: subterrânea. Talvez,

pensei, esta chave pertencesse a um baú do

tesouro de uma ilha deserta chamada

Varanda — Repeti a palavra em voz dita

para mim mesma, imaginando as palmeiras

balançando e a água batendo nos meus pés,

e então percebi o que Varanda significava.

Era só a velha varanda chata que ficava em

cima do vestíbulo. E quem iria querer ir lá?

Eu! Eu iria querer ir lá. De repente

soube que era o lugar perfeito. Poderia

preparar minha Terrível Emboscada lá. E eu

sempre quis preparar uma Terrível

Emboscada. Nela tem de tudo, e faria o

balde de lodo parecer um piquenique de

domingo. Qualquer um que viesse comprar

a casa não duraria nem cinco segundos.

Page 52: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Dei uma última batida no pé esquerdo

do Cavaleiro Horácio e — isso! — se

encaixou novamente na ponta de sua perna

— E daí que estava virado ao contrário? Não

parecia incomodar o Cavaleiro Horácio, e,

certamente, não incomodava a mim. Eu

tinha coisas mais importantes para pensar.

Como de que forma chegar até a varanda. É

claro, eu sabia que só havia uma resposta

para isso — por uma passagem secreta.

Page 53: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Eu tenho um kit-passagem secreta,

igual ao meu kit-fantasma. Sempre quis

encontrar uma passagem secreta e agora

sabia que finalmente tinha a chave para

uma.

Primeiro, abri a caixa do meu kit-

passagem secreta e retirei uma lanterna,

um rolo de barbante e uns suprimentos

emergenciais de salgadinhos de queijo e

cebola.

Você precisa de uma lanterna, pois

passagens secretas são sempre escuras, e

também de um rolo de barbante para

Page 54: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

conseguir achar o caminho de volta — eu

conto como isso funciona daqui a pouco.

Você precisa de suprimentos emergenciais

de comida, já que nunca sabe quanto tempo

vai ficar em uma passagem secreta, sabe?

Page 55: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada
Page 56: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Quer dizer, pode ser que demore

muito, e você tenha que ficar lá durante

dias. Semanas até.

Eu estava pronta para procurar a porta

secreta.

Achei que o lugar mais provável era no

painel de madeira debaixo da escada. Ele

parece oco quando você chuta. Mas

encontrar a porta não estava sendo tão fácil

quanto eu imaginei que seria, já que tudo

estava coberto pela tinta grossa marrom

preferida de tia Tatá. Quando olhei com

mais atenção, tive certeza de ter visto uma

depressão era forma de fechadura. Raspei a

tinta com a ponta da chave, e, lá estava —

uma pequena fechadura de bronze do

tamanho exato da pequena chave de bronze.

Encaixou perfeitamente. Girei a chave, e a

melhor coisa do mundo aconteceu uma

porta secreta se abriu.

Page 57: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Acendi minha lanterna e iluminei o

espaço através da entrada. Era exatamente

como uma passagem secreta deveria ser —

escura, empoeirada e muito, muito secreta.

Dava para perceber que ninguém tinha

estado lá em anos. Estranho, pensei, porque

agora eu estava entrando. Sozinha. Não

estou dizendo que queria que tia Tatá

estivesse lá comigo agora, já que ela era a

última pessoa que eu gostaria de ver, mas

não me importaria de ter um amigo ou

alguém assim. Não quero que você pense

que eu estava com medo de entrar sozinha,

pois já estou muito acostumada a fazer

coisas sozinha e é ótimo.Não tem problema

nenhum.

Agora me deixe explicar a história do

barbante. Quando você entra em uma

passagem secreta, tem que amarrar a ponta

do rolo em alguma coisa e ir desenrolando

Page 58: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

enquanto anda, para que você possa achar o

caminho de volta.

Havia um prego atrás da porta secreta,

então foi nele que amarrei o barbante.

Perfeito.

Depois fechei a porta para que a tia

Tatá não percebesse nada de estranho,

acendi minha lanterna e fui andando pela

passagem, desenrolando o barbante

enquanto andava.

A passagem secreta era muito

estranha. Muito estreita, e cheia de teias de

aranha, e tinha um cheiro esquisito, meio

úmido e mofado. Acho que ficava atrás do

painel de madeira da casa, já que tinha

paredes de madeira bem arranhadas.

Apesar de ser estreita, era bem alta e fácil

de andar, apesar de eu ter que continuar

tirando teias muito grossas do caminho.

Ainda bem que não me incomodo com

Page 59: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

aranhas, já que havia dúzias delas. Algumas

bem gordas.

Eu não estava com medo. Não de

verdade. Afinal de contas, ainda estava na

minha casa, não estava? Mas foi um pouco

estranho quando a passagem acabou

repentinamente numa plataforma de

madeira. Eu não tinha certeza se subia ou

não na plataforma. Qualquer um que saiba

sobre passagens secretas já ouviu falar em

armadilhas e coisas do tipo, então parei e

pensei sobre o que deveria fazer. Iluminei o

ambiente com minha lanterna, mas não

ajudou muito. Quando olhei mais de perto,

vi que a plataforma tinha lados, como caixas

de madeira, e havia cordas em ambos os

lados. Parecia com alguma coisa, mas eu

não sabia o quê. E depois me lembrei!

Era um minielevador.

Não, não estou brincando, eles de fato

existem. Sabia disso, pois nós tínhamos um

Page 60: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

igualzinho na primeira-cozinha-à-direita-

depois-da-lavanderia, e era assim que tia

Tatá o chamava. Eu me lembro de um dia

chuvoso em que estava tão entediada que

entrei no elevador e fui direto para a sala de

jantar. Foi a coisa mais divertida do mundo,

e passei a tarde inteira subindo e descendo

até que tia Tatá me pegou no flagra. Depois

disso ela pregou várias tábuas na por tinha,

e não pude mais entrar, o que achei muita

maldade.

Então pisei na plataforma e puxei a

corda. A plataforma rangeu um pouquinho,

mas nada aconteceu. Coloquei minha

lanterna no chão e usei as duas mãos para

puxar a corda com muita força — e a

plataforma se moveu! Acho que essa parte

foi um pouco assustadora, já que a

plataforma começou a descer pelo que

parecia uma chaminé escura, e eu não sabia

para onde estava indo. Fiquei muito feliz

Page 61: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

quando vi que o topo de uma velha porta

apareceu.

Parei a plataforma do lado de fora da

porta. Dava para perceber que era uma

porta bem velha, já que tinha dobradiças de

ferro e parecia fazer parte de um castelo ou

coisa parecida. Mas eu não vi nenhuma

maçaneta; quando empurrei, ela não se

mexeu. Porta idiota. Dei um empurrão bem

forte, até chutei, mas nada aconteceu.

Ela nem se mexia.

Então me lembrei do que

dizia a etiqueta da chave de

bronze: “Abre todas as portas”.

Eu não acreditava real-

mente que a chave fosse caber,

já que era tão pequena em rela-

ção à porta, mas quando olhei com

cautela vi uma pequena fechadura

de bronze, igual à que havia na porta

que levava á passagem secreta.

Page 62: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

A chave girou com muita facilidade, e a

porta abriu.

Iluminei o caminho com minha

lanterna, que clareou uma pequena sali-

nha. Havia uma pequena lareira, alguns

quadros muito escuros e empoeirados e

enormes velas em castiçais de bronze

presos

á parede. No canto estava uma velha cadei-

ra quebrada com alguns livros carcomidos

empilhados sobre ela, e no chão em frente à

lareira havia uma velha colcha. Sim-

plesmente fiquei ali parada por um

momento, quase prendendo a respiração.

Era tão quieto que eu mal ousei entrar.

Mas eu entrei.

Fui na ponta dos pés e passei a

lanterna pelas paredes, procurando por

uma porta que levasse à varanda. E é claro

que não havia janelas, mas você não pode

esperar que uma sala secreta tenha janelas

Page 63: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

com vista para o meio da casa, pode? Mas,

como certamente haveria, achei uma porta.

Ótimo, pensei. Só precisei de três passos

para atravessar a sala. Pus a chave na

fechadura da porta, e ela se abriu. Quase

passei direto, já que a essa altura eu estava

louca para chegar à varanda, pois o tempo

estava passando, mas eu sabia que você

sempre tem que olhar para onde está indo

numa passagem secreta. Ainda bem que

olhei, porque a porta abria e levava a nada.

Aliás, a um grande e profundo buraco.

Assustador.

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Page 65: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Um sopro de vento morno e mofado

veio do buraco. Tinha um cheiro fuliginoso e

pegajoso ao mesmo tempo. Apontei minha

lanterna e vi que havia uma velha escada de

madeira levando a... onde?

Mas eu não queria descer as escadas;

queria encontrar uma varanda. Então voltei

à sala e fiz tudo o que você deve fazer para

que uma porta secreta apareça. Tentei girar

os castiçais, mas eles não se mexiam. Olhei

atrás de todos os quadros, mas não havia

nada. Até dei um chute na velha lareira,

mas era dura como uma pedra. Não havia

nenhum caminho que levasse á varanda —

isso era certo.

Então decidi descer a escada.

Descê-la foi um pouco assustador, ela

sacudia e fazia muitos barulhos, mas isso é

coisa que devemos esperar numa passagem

secreta. Em seguida a porta bateu, e eu

quase caí. Foi aterrorizante.

Page 66: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Desci pelas escadas, o que foi bastante

difícil, já que eu só podia me segurar com

uma das mãos, pois a outra estava com a

lanterna — o rolo de barbante eu segurei

com os dentes.

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Page 68: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Não gosto do sabor de barbante. Outra

coisa de que não estava gostando muito era

que o ar estava ficando cada vez mais

quente. Eu me lembrei de como o calor

aumenta à medida que você se aproxima do

centro da Terra, e quanto mais eu descia as

escadas, mais eu imaginava se estava me

aproximando daquela parte do centro da

Terra em que pedras derretem. Mas,

enquanto imaginava se deveria voltar para

cima ou não, o fim da escada surgiu.

Parecia sólido o suficiente, então concluí

que ainda não tinha chegado às pedras

derretidas.

Estava num verdadeiro túnel agora,

com lados de tijolos e um chão arenoso.

Decidi seguir o túnel um pouco, caso a

varanda estivesse na próxima esquina. O

túnel ziguezagueava em todas as direções, e

o ar ficou ainda mais quente, o que não

Page 69: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

fazia o menor sentido para mim, já que não

estava descendo mais.

E então eu ouvi — um barulho metálico

horrível, de fazer ranger os dentes e dar

calafrios nos dedos dos pés. O exato tipo de

barulho que você ouve quando um fantasma

arrasta uma bola com uma corrente. Ouvi

dizer que estes fantasmas que carregam

bolas e correntes não são fantasmas legais

de se encontrar. Imagino que eles sejam

rabugentos por terem que arrastar todas

aquelas coisas para todo lugar que vão.

Parei onde estava e desliguei minha

lanterna para que o fantasma das correntes

não me visse, mas ficar no escuro não me

fez sentir nem um pouco melhor. Aliás, me

fez sentir muito pior, então acendi a

lanterna novamente.

Foi então que a gritaria começou.

Gritos horríveis, de provocar frio na

espinha. Eles preencheram a passagem

Page 70: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

secreta e ecoaram através de mim. Foi o

som mais assustador que já ouvi na vida.

E o pior de tudo, eu sabia exatamente

o que significava — que o fantasma das

correntes estava vindo me pegar.

Page 71: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Tia Tatá pode pensar que é muito

engraçado sair por aí assustando pessoas

que estão explorando passagens secretas,

mas eu não acho. Aliás, eu acho que é de

muito mau gosto, como diria o tio Drac.

Não demorei muito para perceber que

fantasmas de correntes não gritam

“PORCARIA DE AQUECEDOR!”. Aliás, não

acho que fantasmas de correntes tenham

qualquer interesse em aquecedores.

PORCARIA DE AQUECEDOR! EU

ODEIO ESTA DROGA! — Eu podia ouvir tia

Page 72: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Tatá gritando através da parede da

passagem secreta com tanta clareza quanto

se estivesse ao lado dela. Ainda bem que

não estava, já que também dava para ouvi-la

chutar o compartimento de carvão e jogar a

pá contra a parede.

Mas o tempo estava se esgotando.

Logo um monte de pessoas que gostava de

lugares mal-assombrados estaria andando

pela minha casa, resolvendo que eles vão

morar nela em vez de mim. E, se eu não

tomasse cuidado, ficaria presa numa

passagem secreta e não poderia fazer nada

a respeito. Decidi que tinha que desistir da

idéia da varanda e voltar para planejar uma

surpresa com o balde de lodo. Era melhor

que nada.

Já que tia Tatá tinha me dado um

tremendo susto, queria dar um nela antes

de ir. Procurei algum buraquinho na parede

por onde apontar minha lanterna para que

Page 73: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

ela pensasse que havia um fantasma na sala

do aquecedor — e foi quando o vi.

Eu vi um fantasma.

Ele estava sentado num canto escuro,

um pouco abaixo da passagem secreta.

Primeiro fiquei tão surpresa que pensei que

ele fosse apenas um menino comum; então

eu disse:

— Ei! O que você está fazendo aqui?

Mas, quando ele olhou para mim, havia

algo em seu rosto que me deu calafrios, e

eu soube que ele era um fantasma. Ele tinha

olhos molhados e fantasmagóricos, e seu

rosto era meio transparente e brilhava com

uma luz clara. Imaginei que ele fosse um

fantasma de tempos antigos, já que tinha

um corte de cabelo de cuia e vestia uma

túnica com um grande capuz. Ele também

tinha uma adaga presa em seu cinto, o que

achei muito legal — tia Tatá não me deixa

ter uma adaga, não importa o quanto eu

Page 74: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

peça. Aliás, achei que já o tinha visto antes

— ele parecia com as ilustrações medievais

do meu livro de história dos tempos dos

cavaleiros.

Fiquei satisfeita por ele não ser um

fantasma de correntes rabugento. Fui até

ele e perguntei, só para ter certeza:

— Você é um fantasma de verdade?

Ele não respondeu — aliás, parecia um

pouco assustado, como se ele tivesse visto

um fantasma. Era um pouco decepcionante,

na verdade, já que estava tudo às avessas.

Eu é que deveria me assustar com ele.

— Então, qual é o seu nome? —

perguntei.

Page 75: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Ele continuou sem

responder, o que eu achei uma

grosseria. Tia Tatá também teria

dito que era rude da parte dele.

O menino desviou o olhar e ficou

encarando o chão, e dava para

perceber que ele estava torcendo para

que eu fosse embora. Mas eu não ia aban-

donar o primeiro fantasma que encontrei de

jeito

nenhum, principalmente porque já fazia

muito tempo que eu procurava por um.

— Você deve ter um nome — eu disse.

Sempre imaginei que um fantasma fosse ser

mais divertido do que este demonstrava ser.

Mas em seguida ouvi um barulho que fez

com que os cabelos da minha nuca se

arrepiassem. Um sussurro estranho, oco,

preencheu o ar a minha volta.

Page 76: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Edmundo... — dizia o sussurro. Era

ele, o menino-fantasma, falando. E era

assustador.

Edmundo flutuou do chão e veio em

minha direção. Dei um passo para trás, já

que de repente não tinha mais tanta certeza

de que queria conversar com um fantasma.

E então Edmundo disse algo muito estranho

— ele disse:

— Você é a Tábita?

Ele falou com um sotaque estranho

que lembrava uns franceses que

apareceram em casa uma vez, achando que

era uma pousada. Eles não ficaram muito

tempo.

— Não — eu disse a ele. — Eu sou... Eu

sou Araminta.

— Ótimo — disse Edmundo, e meio que

subiu pelas paredes novamente e começou a

andar de cabeça para baixo no teto. — Eu

Page 77: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

não gosto da Tábita — disse ele, com seu

sotaque estranho. — A Tábita é barulhenta.

Ele tinha razão, pensei. Havia

momentos em que eu também não gostava

da Tábita, e Tábita era definitivamente

barulhenta. Aliás, na hora em que Edmundo

disse isso, eu podia ouvir tia Tatá jogando

carvão no aquecedor furiosamente e

batendo a porta com um barulhão. Percebi

que Edmundo devia ter ouvido muitos dos

ataques de raiva de tia Tatá ao longo dos

anos.

Então, quando eu estava começando a

gostar de Edmundo, ele disse:

— Você precisa ir agora.

— O quê? — perguntei a ele.

— Você precisa ir. Não pode se

aproximar mais.

— Por quê?

Ele não respondeu. Simplesmente

flutuou para cima e para baixo na minha

Page 78: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

frente, com os braços esticados, como se ele

pudesse me impedir de passar por ele. Ele

nem precisava ter se incomodado, já que eu

não passaria por um fantasma de jeito

nenhum. Brrr. De jeito nenhum.

— Bem, eu não quero me aproximar

mais, mesmo — disse a ele. — Eu só vim

para procurar o caminho para a varanda.

— A varanda não fica aqui embaixo —

disse

Edmundo, que tinha começado a girar

lentamente por alguma razão estranha, não

me pergunte por quê. — Então você deve ir.

Adeus.

Pareceu que Edmundo sabia onde a

varanda ficava, então perguntei se ele me

levaria até lá.

— Se eu te levar até a varanda, você

vai embora? — perguntou ele.

Page 79: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Não fico onde não me querem.

Tenho coisas melhores para fazer.

— Bem, não quero ficar aqui embaixo

— disse a ele.

— Você não quer? — disse Edmundo.

— Ótimo. Siga-me.

Então o segui.

Page 80: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Edmundo brilhava muito, então

desliguei minha lanterna para economizar

as pilhas. Essa é uma preocupação que você

sempre deve ter numa passagem secreta, já

que nunca se sabe quanto tempo vai ficar

nela, e o pior desastre que pode acontecer é

estar numa passagem secreta sem nenhuma

luz. Seguia Edmundo enquanto ele flutuava

pela passagem, e pensei na tia Tatá do

outro lado da parede e no ataque que ela

daria se soubesse o que eu estava fazendo

Page 81: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

naquele momento — mas não seria um

ataque tão forte quanto o que daria quando

eu completasse minha Terrível Emboscada

na varanda.

Logo eu estava subindo novamente a

velha escada, com Edmundo levitando à

minha frente. Pensei no quanto era mais

fácil para um fantasma do que para uma

pessoa subir escadas. De alguma forma não

parecia justo, principalmente porque eu

tinha que carregar minha lanterna e

desenrolar meu rolo de barbante enquanto

ia.

Quando chegamos ao topo, Edmundo

parou do lado de fora da porta.

— Vá em frente — disse a ele. Eu não

sabia por que ele havia parado, já que todo

mundo sabe que fantasmas podem

atravessar portas.

— Esta porta é difícil — disse ele. — Eu

não devo vir aqui. Não é meu quarto.

Page 82: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Tudo bem — eu disse. — Tenho a

chave.

Edmundo pareceu surpreso.

— Você tem a chave? — ele disse,

numa espécie de murmúrio, e em seguida

começou a perder brilho e estremecer.

Então de repente ele se foi, direto pela

porta. E fiquei ali, no topo da terrível

escada velha no escuro. Ótimo. Depois de

ficar horas procurando a chave, destranquei

a porta e caí dentro da sala. Edmundo

estava flutuando por lá, apenas me olhando

de uma maneira que não ajudava em nada.

— Então, onde exatamente fica a

varanda? — perguntei enquanto me

levantava.

Edmundo apontou para a lareira.

— É por ali.

Page 83: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Bem, isso é uma burrice — eu lhe

disse. — Como é que eu vou passar por uma

lareira? É tudo muito fácil para você. Você é

um fantasma, mas eu não posso

simplesmente atravessar uma velha lareira

cheia de fuligem...

Page 84: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Você fala igual à Tábita — disse

Edmundo. — Você faz meus ouvidos

doerem. Onde está a chave?

— Que chave? — perguntei confusa.

Page 85: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— A chave da varanda — respondeu

ele, como se eu fosse muito burra ou coisa

do tipo. — A que você carrega com sua

pessoa.

— Com minha o quê? — eu disse, e em

seguida percebi o que ele queria dizer e

peguei a chave do meu bolso. — Aqui está

— disse e entreguei a ele. É claro que ela

atravessou diretamente sua mão e caiu no

chão. Dããã. Por um momento esqueci que

ele era um fantasma — Edmundo podia ser

tão irritante quanto um menino de verdade.

— Ponha a chave na fechadura — disse

ele, e mostrou uma pequena fechadura no

meio da lareira que eu não tinha notado

antes. — Ela abre o caminho para a

varanda. Adeus. — Então ele partiu como

uma bala através da porta e desapareceu.

Pus a chave na fechadura e girei.

Funcionou! A lareira deslizou de lado e um

brilhante raio de luz cortou a escuridão da

Page 86: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

sala. Passei espremida pela abertura e

finalmente cheguei... à varanda.

Era estranho estar a metros do

vestíbulo. Tudo parecia tão pequeno e

distante. Deve ser assim que os pássaros se

sentem o tempo todo quando estão nas

enormes e velhas árvores do jardim. Eu me

sentia tão feliz por finalmente estar na

varanda que quase gritei para que tia Tatá

viesse ver onde eu estava — por sorte, se-

gurei-me a tempo.

Page 87: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Mas a melhor coisa de todas foi

quando olhei para baixo e percebi que a

varanda era bem acima do chão em frente à

porta principal, onde as pessoas que nunca

vieram a casa sempre param e ficam

olhando. Elas também quase sempre ficam

de boca aberta, apesar de não parecerem

falar muito — e eu sei que elas ficam desse

jeito por um bom tempo.

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Era perfeito. A Terrível Emboscada de

Araminta ia ser fantástica.

Voltei pelo minielevador e pela

passagem secreta, mas, quando abri a

pequena porta debaixo das escadas, alguém

me esperava.

Page 89: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Adivinha quem era? Não, não era a tia

Tatá. Não, também não era o tio Drac. Era o

Cavaleiro Horácio.

— Bom-dia! — disse ele com uma

estranha voz explosiva, que vinha de algum

lugar dentro da sua armadura. Era tão

fantasmagórica que fiquei toda arrepiada e

meus joelhos ficaram esquisitos.

— B-bom-dia, Cavaleiro Horácio —

engasguei. Pensei em fugir pela passagem

secreta, mas não achei que minhas pernas

fossem funcionar bem.

Page 90: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

O Cavaleiro Horácio se aproximou e

pareceu cambaleante. Eu me afastei; não

apostava em suas chances de permanecer

montado por muito tempo — já que eu é que

o tinha remontado — e adoraria que um

pedaço de lata enferrujada não caísse em

cima de mim naquele momento.

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Achei que talvez devesse explicar as

coisas. Sei que explicações nem sempre

ajudam, principalmente se a pessoa para

quem você for explicar for a tia Tatá, mas

eu imaginei que o Cavaleiro Horácio

pudesse ser diferente. Então, disse com

minha melhor voz educada:

— E... eu sinto muito, Cavaleiro

Horácio. Mas eu... ãã... pensei que você

fosse apenas... hum...

— Uma lata velha, mofada e

enferrujada. — O Cavaleiro Horácio

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completou a frase para mim, o que tia Tatá

diz que é grosseiro.

— Ah... — resmunguei enquanto

tentava me lembrar do que mais eu

chamara o Cavaleiro Horácio enquanto o

remontava. Aliás, para mim, ele era uma

lata velha mofada e enferrujada, mas não

esperava que fosse uma lata enferrujada

falante.

Achei melhor verificar a situação do

fantasma com o Cavaleiro Horácio, então

perguntei:

— Você também é um fantasma?

— Também por quê? — protestou ele.

— Ah, além de ser um Cavaleiro Real, você

quer dizer. Sim, Senhorita Fantasmim, de

fato sou um fantasma. O fantasma do

Cavaleiro Horácio Harbinger de Hérnia

Vestíbulo, a seu dispor. — E fez uma

reverência. Três pinos pularam de seu

pescoço e rolaram pela escada.

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Uau. Isso significava que ele era meu

segundo fantasma da manhã — qual a

probabilidade de isso acontecer?

Obviamente, era típico, pensei. Passei anos

procurando por um fantasma e aparecerem

dois de uma vez, e logo quando tia Tatá

estava prestes a tirar a mim e ao tio Drac da

casa.

Mas tudo fazia sentido agora. O

Cavaleiro Horácio nunca ficou muito tempo

no mesmo lugar, e eu sempre pensei que tia

Tatá o movesse durante a noite só por farra.

Era o tipo de brincadeira boba que tia Tatá

gostava. Mas agora eu entendia — o

Cavaleiro Horácio andava sozinho.

— Sinto muito pelo seu capacete...

bem... quero dizer, pela sua cabeça — disse

eu, tentando não lembrar de que a havia

chutado escada abaixo. Esperava que ele

também não se lembrasse.

Page 95: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Deu-me uma dor de cabeça horrível

— disse o Cavaleiro Horácio.

— Oh! Bem, eu imagino que sim —

respondi em apoio.

— Andar também não tem sido fácil —

disse ele. Nós dois olhamos para o seu pé

esquerdo, que ainda estava ao contrário.

— É... Vejo que não — disse com minha

melhor voz de solidariedade.

— Mas — disse ele, de forma súbita e,

ao mesmo tempo, tagarela — não é ISSO

que me interessa. O que está me

preocupando é essa história de vender a

casa.

— Ah, que bom — disse a ele —,

porque isso também está me deixando

aflita.

O Cavaleiro Horácio balançou um

pouco, e me desviei de uma mola que voou

de seu pescoço e foi parar no chão.

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— E esta história de... bicicletagem —

disse ele.

Por um momento fiquei confusa, já que

eu tinha certeza de que jamais havia visto o

Cavaleiro Horácio numa bicicleta. E então

entendi o que ele queria dizer.

— Você quer dizer reciclagem — disse

a ele.

— Quero? — disse ele. — Bem, eu não

gosto nada desse assunto, seja qual for o

nome. Jamais gostei de latas. Impossíveis de

abrir. Não suporto comida de gato.

E então, com um barulho horroroso,

o Cavaleiro Horácio se levantou o mais reto

que podia, o que não era tão reto assim, — e

respirou fundo.

— Algo — disse tão alto que tive medo

de que a

tia Tatá escutasse — algo deve ser feito.

Esta casa não pode ser vendida!

Page 97: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Exatamente! — concordei. — E eu

tenho uma ótima idéia. Vou preparar minha

Terrível Emboscada da varanda e...

— Da minha varanda? — interrompeu

ele. — No meu quarto?

Opa — então era o quarto do Cavaleiro

Horácio. E, pelo jeito, ele não gostava que

ninguém entrasse lá. Eu entendia como ele

se sentia, já que também não gosto que tia

Tatá entre nos meus quartos. Ela sempre dá

um jeito de bagunçar alguma coisa.

Achei que devesse explicar.

— Perdão, Cavaleiro Horácio, mas eu

encontrei a chave no seu pé, e...

Mas ele interrompeu novamente.

— Eu Sei — disse ele, sacudindo seu pé

esquerdo como se houvesse pinos e agulhas

nele, o que eu sabia que não tinha, pois eu

já tinha esvaziado aquele pé; só encontrara

a chave. — Eu me lembro muito bem. Já

estava com minha cabeça a essa altura.

Page 98: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Eu sinto muito — eu disse. — Você

quer sua chave de volta?

O Cavaleiro Horácio balançou a cabeça

lentamente e fez um barulho horrível, como

um moedor de pimenta.

— Por favor, fique com a chave, srta.

Fantasmim — disse ele. — Eu ficaria muito

satisfeito se você utilizasse minha varanda

para a sua Terrível Emboscada. Eu mesmo

já realizei terríveis emboscadas lá ao longo

dos anos. Elas podem ser muito eficientes.

Vou pedir que meu fiel escudeiro, Edmundo,

ajude-a.

A-há. Então era isso que Edmundo era,

pensei.

— Muito obrigada, Cavaleiro Horácio

— disse.

— De nada, srta. Fantasmim —

respondeu ele e se curvou.

— Cuidado! — gritei, mas era tarde

demais. A cabeça do Cavaleiro Horácio caiu

Page 99: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

e rolou pelo corredor. Consegui pegar logo

que começou a descer pela escada, mas

infelizmente tia Tatá me viu enquanto

atacava algumas teias de aranha logo ao pé

da escada.

— Você ainda não acabou de montar o

Cavaleiro Horácio, Araminta? — gritou ela

ao mesmo tempo em que deixava centenas

de aranhas sem ter onde morar. Tia Tatá

gosta de deixar aranhas e pessoas sem ter

onde morar.

Page 100: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Estou quase acabando, tia Tatá —

respondi, e me apressei para encontrar o

Cavaleiro Horácio. Ele estava sentado no

degrau debaixo, parecendo surpreso. Bem,

eu acho que era como ele estava parecendo,

apesar de ser difícil dizer. Botei sua cabeça

no lugar. Fui mais cuidadosa desta vez e

deu para saber que tinha encaixado

direitinho quando ouvi um pequeno clique

ao pôr a cabeça sobre seus ombros.

Page 101: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Ah, assim é melhor — disse ele. —

Meu torcicolo sumiu completamente. — Ele

mexeu a cabeça de um lado para o outro, e

dessa vez não fez nenhum barulho de

moedor de pimenta. Fiquei satisfeita.

Depois ele se apoiou no corrimão, se

levantou, de uma forma quase ereta, e

disse:

— Bem, tudo certo, então, srta.

Fantasmim. Prepare sua emboscada e deixe

o resto comigo.

— Ótimo — respondi.

— Perfeitamente. E diga ao jovem

Edmundo que mandei que lhe desse toda

assistência necessária. Até nos

encontrarmos novamente, Srta. Fantasmim.

— Ele começou a se curvar, mas depois

mudou de ideia. Afastou-se, meio sorra-

teiramente, andando de um lado para outro

até chegar a um canto escuro ao pé da

escada, onde ficou.

Page 102: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Aquele estava se tornando um ótimo

dia, no fim das contas — uma passagem

secreta, dois fantasmas e uma Terrível

Emboscada a caminho. O que poderia ser

melhor?

Page 103: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Uma pessoa precisa de muitas coisas

para uma Terrível Emboscada. E a maioria

das coisas de que eu precisava era —

morcegos. Muitos e muitos morcegos.

Então fui até a torre do tio Drac para

pegar o máximo que conseguisse. Sou muito

boa em capturar morcegos, já que sempre

ajudo tio Drac com eles quando escapam.

Tia Tatá detesta morcegos; acha que eles

vão querer fazer ninhos no seu cabelo, mas

nenhum morcego que se dê ao respeito

jamais iria querer sequer chegar perto do

Page 104: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

cabelo da tia Tatá: ele é cheio de grampos.

Eles iam virar espetinhos de morcegos em

cinco segundos.

Enfim, encontrei meu saco de

morcegos e logo estava me arrastando

cuidadosamente por uma viga no alto da

torre. Tio Drac dormia profundamente,

roncando em seu saco de dormir, que ficava

pendurado e balançava a cada ronco. Havia

uma multidão de morcegos em volta dele,

mas eu não acho que os morcegos estavam

roncando. Ou talvez eu apenas não pudesse

escutá-los. Talvez o ronco dos morcegos

seja grave demais para que os humanos

escutem.

Aqui, morcegos sussurrei c botei o má-

ximo possível no saco. Os morcegos não se

importavam; eles gostavam do meu saco de

morcegos. Bom, menos o Morcegão, que

não gosta de nada, já que é um morcego

velho e rabugento. Mas eu queria muito ter

Page 105: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

o Morcegão na emboscada — imagino que

ele poderia ser bastante assustador. Peguei-

o quando ele não estava olhando, mas ele

gritou muito alto.

Tio Drac parou de roncar e se mexeu

um pouco em seu saco de dormir; congelei.

Não queria que ele acordasse de jeito

nenhum, pois sabia que ele não deixaria eu

pegar nenhum de seus preciosos morcegos,

ainda que eles fossem salvar a casa de um

bando de pessoas idiotas que queriam tirá-

la de nós. Os morcegos do tio Drac são mais

importantes para ele do que qualquer coisa

no mundo.

Page 106: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Quando havia morcegos o suficiente,

levei todos para o quarto do Cavaleiro

Horácio e os deixei dependurados no

escuro. Eles pareciam muito felizes.

Page 107: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

A próxima coisa que precisava para

minha Terrível Emboscada era... gelatina de

morango. Isso era mais difícil, porque teria

que cruzar o território da tia Tatá para

chegar à quarta-cozinha-à-direita-depois-da-

sala-do-aque- cedor. Passei pela sala do

aquecedor a toda velocidade e não vi a tia

Tatá em lugar nenhum — apesar de que

havia um enorme monte de fuligem no

canto, então eu sabia que ela apareceria

logo para varrer.

Em poucos segundos, eu estava na

quarta — cozinha-à-direita-depois-da-sala-

do-aquecedor e encontrei o que estava

procurando: uma caixa enorme de mistura

para gelatina de morango extragrudenta.

Enchi dois baldes e voltava devagarzinho

pelo corredor do porão com eles quando,

obviamente, ouvi tia Tatá.

— É você, querida? — gritou ela.

Detesto quando a tia Tatá diz “querida”

Page 108: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

desse jeito, através de dentes cerrados.

Sempre significa problema. Acelerei o

máximo possível, mas era tarde demais. É

impossível escapar da tia Tatá, não importa

o quanto você tente. Enquanto eu patinava

através da porta aberta da sala do

aquecedor, a montanha de fuligem falou

comigo.

Page 109: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Muito bem, querida — disse o monte

de cinzas. — É muito bonito de sua parte

limpar seus quartos. Faz muita diferença se

as pessoas virem uma casa bonita e limpa.

Só espero que eles também vejam um

aquecedor limpo.

O monte de fuligem se sacudiu e deu

para ver que, na verdade, era tia Tatá com

uma vassoura.

— Sabe, estou sentindo que essas

pessoas serão perfeitas para a casa — disse

ela.

Escapuli com meus baldes.

— Sentindo... — murmurei. — Vou

fazer eles sentirem uma coisa.

Logo, tinha tudo que precisaria para a

Terrível Emboscada. Eu tinha:

uma bolsa grande de aranhas variadas

uma pilha enorme de fronhas

Page 110: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

um barril enorme de buzinas de

fantasmas sufocados

uma caixa enorme de balões um saco

gigante de farinha

Levei o material para o quarto do

Cavaleiro Horácio e despejei tudo no chão,

formando uma enorme pilha. Ufa. E em

seguida alguém tossiu. Dei um salto de uns

três metros no ar e quase caí dentro de um

balde de gelatina de morango

extragrudenta.

— Olá — disse Edmundo.

— Não se deve andar por aí assustando

as pessoas desse jeito — eu disse a ele —,

principalmente, se você for um fantasma.

Alguém pode acabar se machucando.

— Mas o Cavaleiro Horácio mandou

que eu a ajudasse — disse Edmundo. — Ele

Page 111: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

disse que algumas pessoas estavam vindo, e

que iam colocá-lo em uma lata de lixo com

algumas bicicletas e transformá-lo em

comida de gato. Mas eu não entendo por

que alguém faria isso.

— É por causa da Tábita — eu disse a

ele.

— Ah — disse Edmundo —, entendi.

Depois disso Edmundo ajudou

bastante. Primeiro preparamos os

“fantasmas” — Edmundo encheu os balões,

e eu coloquei as buzinas. Amarrei um nó

corrediço nas pontas para ativá-los mais

depressa. Botei os balões nas fronhas e

joguei farinha em cima deles; em seguida,

abri a lareira, e Edmundo transportou os

“fantasmas” até a varanda. Era perfeito —

eles oscilavam logo acima do

local onde as pessoas sempre

pa-

Page 112: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

ravam de boca aberta. Por último,

carreguei

os baldes de gelatina de morango

extragru-

denta e os alinhei no limite da

varanda. Dei-

xamos os morcegos dormindo no

quarto do Cavaleiro Horácio até

que

eles se tornassem necessários. Em

seguida, Ed-

mundo e eu sentamos atrás dos

baldes e espe-

ramos. Estávamos prontos para qualquer

coisa.

Page 113: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Não precisamos esperar muito — logo

alguém estava batendo à porta da frente

com tanta força que fiquei surpresa por a

porta não ter caído, como aconteceu na

semana passada.

Em poucos segundos, tia Tatá já estava

no topo da escada do porão. Ela ainda

estava coberta de fuligem e olhava em volta

para ver se eu ia tentar apostar corrida com

ela até a porta primeiro, como eu sempre

faço. Ela pareceu muito satisfeita quando

percebeu que eu não estava lá; partiu em

Page 114: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

disparada pelo vestíbulo como se fosse a

maior aranha que já se viu e abriu a porta

da frente com um golpe violento,

espalhando fuligem por todo lugar.

Esperando na entrada estavam as

pessoas mais estranhas. Edmundo olhou

para elas como se jamais tivesse visto coisa

igual na vida — o que eu imagino que não

tenha visto mesmo, já que a última vez que

ele tinha vivido tinha sido há uns

quinhentos anos.

A primeira pessoa na entrada era uma

mulher baixa e redonda, de óculos escuros e

com um vestido rosa brilhante. Ela segurava

um gato preto extremamente gordo. Quem

leva o gato para ver uma casa? Estranho.

Depois, havia um homem magro e

muito alto. Ele vestia um casaco verde

brilhante e longas botas amarelas e

pontudas. Na cabeça, tinha um chapéu-coco

azul com um pequeno sapo verde em cima.

Page 115: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Achei que fosse um sapo empalhado até que

ele pulou da cabeça do homem e caiu na

menor pessoa na entrada. A menina parecia

muito chata, na verdade. Tinha cabelo

castanho curto e vestia uma camisa azul de

uniforme de escola e uma saia cinza. A

única coisa minimamente interessante a seu

respeito era que, agora, o sapo estava em

cima da sua cabeça. Mas ele também logo

se encheu e pulou de volta para o chapéu

azul.

Tia Tatá olhou para as pessoas

estranhas como se fossem as melhores

coisas que ela tinha visto o dia todo.

— Que bom vê-los! — disse ela, com

sua melhor voz educada. — Entrem.

— Obrigada — disse a mulher de

óculos escuros. — É um prazer conhecê-la,

senhora... ah?

— Fantasmim — disse tia Tatá. —

Tábita Fantasmim.

Page 116: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Eu sou Brenda Magórica — disse a

mulher de óculos escuros. — Este é o meu

marido, Barry, e minha filha, Vanda. Nós

vimos seu belo sinal e adoraríamos comprar

sua casa.

— Ótimo — disse tia Tatá. — Entrem.

As pessoas estranhas que queriam

roubar minha casa entraram pelo vestíbulo

e pararam bem onde eu esperava que

parassem — logo abaixo da varanda.

Perfeito. E então fizeram exatamente o que

eu esperava que fizessem — olharam em

volta impressionados, com as bocas abertas.

Fantástico!

Page 117: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada
Page 118: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Preparado? — pergun-

tei a Edmundo. Ele fez que sim com a

cabeça.

Então soltei os “fantasmas”.

UHEEEEEEEEEEEEEE!

EEEEEEEIIIIIIIIIIIIII!

IOOOOOOOOOEEEEEE!

EEEEEEEEEEE!

Foi perfeito! Um enxame de fronhas

brancas

berrantes voou e rodou. Nuvens espessas de

farinha

caíram em cima das pessoas estranhas,

seguidas pelas

fronhas. Uma delas caiu bem em cima da

pe-

Page 119: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

quena chata de um jeito que ela também

ficou

parecendo um fantasma. Só dava para ver

suas perninhas magricelas.

Em seguida, empurrei os baldes de

gelatina de morango extragrudenta.

SPLATTTTTTTT!

Foi perfeito. A gelatina estava no

ponto. Pedaços horríveis e grudentos de

meleca vermelha caíram bem em cima

deles. Deslizaram por seus pescoços e

entraram em suas roupas.

Então veio a melhor parte. Edmundo

acordou os morcegos e os expulsou do

quarto do Cavaleiro Horácio. Eles saíram de

lá como uma enorme nuvem preta e foram

para todo lugar. Todo o vestíbulo virou uma

tempestade de morcegos voando. Foi

fantástico. Tia Tatá gritou quase tão alto

quanto a Hotéis Enormes tinha gritado. E,

Page 120: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

enquanto ela gritava, cortei as teias de

aranha.

Choveram aranhas. Aranhas bem

gordas. Centenas delas cobriram as pessoas

estranhas. Elas ficaram presas nos cabelos,

desceram pelos pescoços e ficaram cobertas

de gelatina de morango extragrudenta.

Entraram pelas mangas das blusas e pelas

bainhas das calças, tentando encontrar um

lugar seguro para se esconder. Uma família

de quinze aranhas particularmente peludas

dependurou-se nos óculos da mulher. Acho

que ela não gostava muito de aranhas. Ela

também gritou, e o gato voou do seu colo e

foi parar na cabeça da tia Tatá. Foi a melhor

coisa que vi o dia todo.

Mas as coisas ficaram ainda melhores

porque, veja bem, tia Tatá é alérgica a

gatos. Muito alérgica. Eles a fazem espirrar

os maiores espirros que já ouvi e provocam

Page 121: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

coceiras enormes e muito vermelhas. Não é

nada bonito.

Então tia Tatá espirrou — e quando tia

Tatá espirra, ela vai com tudo.

— A-a-a-aaaaaaaaaaaa...

TCHIIIMMMMMM!

Ela perdeu o equilíbrio, escorregou

num montinho de gelatina e se chocou com

a mulher de óculos escuros a toda

velocidade. A mulher de óculos escuros se

inclinou como uma árvore prestes a cair e

grudou na tia Tatá enquanto caía. Em

seguida, as duas deslizaram juntas pelo

vestíbulo e com o gato, que ainda estava na

cabeça da tia Tatá, completando o trio.

Tia Tatá espirrou novamente.

— A-a-a-aaaaaaaaaaaa...

TCHIIIMMMMMM!

O gato soltou uma espécie de uivo e

pulou no ar. Foi incrível; ainda posso ver

agora, em câmera lenta. Aquele gato gordo,

Page 122: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

voando pelo ar com seu pelo arrepiado, suas

garras para fora, caindo graciosamente

numa enorme poça de gelatina de morango

extragrudenta. Ele caiu no chão lindamente,

depois passou como um raio pelo vestíbulo,

rodando como um patinador de gelo — e

colidiu com o Cavaleiro Horácio.

Edmundo me contou mais tarde que o

Cavaleiro Horácio havia preparado um

discurso e planejava pronunciá-lo á tia Tatá,

para que ela percebesse o erro que estava

cometendo. Ele vinha tilintando

cautelosamente pelas escadas desde que

havia escutado os estranhos chegarem, mas

Page 123: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

ninguém notou sua presença com tantas

coisas acontecendo.

Mas todos o notaram naquele

momento.

O gato bateu como uma bala de canhão

em seu pé esquerdo, que voou e deslizou

pelo chão. Depois, lentamente e provocando

um barulho horroroso, peça por peça —

como uma torre de latinhas de comida de

gato num supermercado — o Cavaleiro

Horácio desmoronou, formando uma pilha

enferrujada.

Dei uma olhadinha da varanda para

ver como as pessoas estranhas estavam

reagindo a isso tudo. Parecia promissor. A

menor ainda estava lutando para se livrar

da fronha. O homem do sapo estava coberto

por morcegos, e a mulher dos óculos

escuros continuava caída de costas como

um besouro encalhado, olhando para o teto.

Page 124: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Tia Tatá parecia muito, muito irritada.

Ela levantou-se, limpou-se um pouco e, em

seguida, olhou direto para a varanda e

disse:

— Sério, Araminta. Você foi longe

demais desta vez.

Não respondi; estava muito ocupada

olhando a mulher de óculos escuros

tentando se levantar. Ela fez exatamente o

que besouros encalhados fazem — sacudiu

as pernas sem direção, rolou e se levantou.

Depois remexeu os restos do Cavaleiro

Horácio e pescou seu gato, que pulou e

grudou nela como um pedaço de velcro.

Cutuquei Edmundo, mas meu cotovelo

passou diretamente através dele e bateu na

mureta da varanda. Ai.

— Espera só — eu disse a ele. — Ela

vai sair pela porta da frente em cinco

segundos.

Page 125: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Mas ela não saiu. Simplesmente ficou

em pé no meio do vestíbulo, olhando em

volta.

— Maravilhoso — disse ela. — Esta é a

casa dos nossos sonhos!

Page 126: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Eu não podia acreditar. Lá estava a

mulher de óculos escuros olhando para o

espaço como se seu maior sonho tivesse

acabado de se realizar.

Depois o homem do sapo se levantou,

espantou alguns dos morcegos e então ele

disse: — Perfeito! É ainda melhor do que

esperávamos, não é, querida?

— É sim — concordou a mulher de

óculos escuros. Ela virou para tia Tatá e

apertou sua mão. — Que recepção

maravilhosa — disse ela. — Muito obrigada.

Page 127: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

E então a pequena chata se libertou da

fronha e disse com uma voz esganiçada e

idiota:

— Eu adoraria morar aqui; é tão

empolgante! — Ela puxou a manga

grudenta da mulher e ficou atormentando.

— Podemos morar aqui, mamãe? Por favor,

por favor, por favor, podemos, mamãe?

— É claro, querida — sorriu a mulher

de óculos escuros.

Humpf. Eu não acho que seja bom

ceder a crianças que importunam,

principalmente se elas forem irritantes e

tiverem vozes esganiçadas.

Mas a mulher de óculos escuros foi

logo dizendo para a tia Tatá:

— Esta casa é perfeita. Nós vamos

comprar. Podemos nos mudar amanhã!

Page 128: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

O quê? Agora eu realmente não podia

acreditar. Tinha sido a melhor Terrível

Emboscada que eu poderia ter feito. Tudo

tinha funcionado perfeitamente — até o

Cavaleiro Horácio apareceu.

Mas não só as pessoas estra-

nhas gostaram dela como

queriam comprar a casa.

O que mais eu poderia

fazer? Então berrei com eles.

— Vão embora! — gritei o mais alto

que podia. Era ótimo gritar tão alto; minha

voz ecoou pelo vestíbulo, e todo mundo

olhou para cima. Três pessoas pareciam

impressionadas e uma, irritada. — Vocês

não podem morar aqui — gritei a plenos

pulmões. — Esta é a minha casa e eu moro

aqui. VÃO EMBORA!

A irritada abriu a boca para dizer

alguma coisa, mas falei primeiro:

Page 129: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— É tudo culpa sua, tia Tatá! — eu

disse a ela. — Você nunca me perguntou se

eu queria que vendesse a casa, e você

também nunca perguntou ao tio Drac. Você

simplesmente nos avisou o que decidiu. E

não é justo. Todos nós moramos aqui, não é

só você. E eu quero continuar morando aqui

e não vou sair, NÃO vou!

Tia Tatá tirou a fuligem, a farinha, a

gelatina de morango e as aranhas da cara.

— Bem — disse ela —, fazer uma

bagunça nojenta destas não faz exatamente

com que eu queira ficar aqui, Araminta.

Este lugar já é difícil o suficiente de limpar.

Sugiro que nós todos tomemos um chá e

conversemos sobre o assunto. Tenho

certeza de que você se sentirá melhor

depois que conversar com o sr. e a sra.

Magórica.

As pessoas estranhas seguiram tia Tatá

pelas escadas em direção às cozinhas. Logo

Page 130: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

antes de desaparecerem, a pequena idiota

olhou para a varanda. Dei a língua para ela

e lancei meu melhor olhar diabólico.

— Que bobalhona — eu disse a

Edmundo.

E você pode adivinhar o que Edmundo

disse? Foi completamente idiota. Ele disse:

— Ela me parece legal.

Ela me parece legal! Eu não podia

acreditar no que estava ouvindo. Lancei

meu olhar diabólico a Edmundo também, e

ele partiu em disparada para o quarto do

Cavaleiro Horácio. Fui atrás dele. Eu tinha

um Plano B e precisava da ajuda de

Edmundo.

— Você tem que vir até a cozinha

comigo — disse a ele, que tinha se

encolhido num canto. — Se eles vissem um

fantasma de verdade, não durariam nem

cinco segundos.

Page 131: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Foi o que você disse antes — disse

Edmundo, de um jeito irritante —, e eles

continuam aqui. De qualquer jeito, acho que

eles são legais. Eu gostaria que eles

ficassem.

— Edmundo, veja bem — expliquei, já

que obviamente ele não tinha entendido —,

se eles ficarem, eu vou ter que ir. Você não

gostaria que isso acontecesse, gostaria?

Bem, isso o colocou em seu lugar. Ele

não disse nada; apenas flutuou e foi para a

velha escada. Mas eu não ia deixá-lo

escapar de jeito nenhum.

— Edmundo! — gritei.

— O quê? — disse ele, com a voz

zangada.

— Você é escudeiro do Cavaleiro

Horácio, não é? — perguntei.

— Sou... — respondeu ele.

— Então... você deve fazer o que

ele manda, certo?

Page 132: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— S-sim.

— E o Cavaleiro Horácio mandou que

você me ajudasse, não foi?

— Foi... — Ele suspirou exatamente

como a tia Tatá quando o aquecedor faz

alguma coisa muito irritante.

— Bem, preciso que você me ajude a

me livrar dessas pessoas horríveis. Agora.

Quero que você venha comigo e os espante.

— Tudo bem — disse Edmundo, com a

voz irritada.

Mas eu não estava nem aí para a

irritação dele. Este era meu Plano B e tinha

que dar certo.

Page 133: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Tio Drac também faria parte do Plano

B. Dava para perceber que Edmundo pro-

vavelmente não daria conta do recado. Ele

flutuaria na hora errada ou não seria

assustador o suficiente. Então eu também

precisava do tio Drac, pois sabia que ele

estava do meu lado.

Estava prestes a abrir a portinhola

para a torre do morcego quando o tio Drac

caiu no chão.

— Ah, Pimentinha, Pimentinha —

lamentou ele —, algo terrível aconteceu.

Todos os meus morcegos se foram.

Page 134: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Não, eles não se foram — eu disse a

ele.

— Sim, eles se foram. Eles...

— Tio Drac — eu disse severamente —,

enquanto você estava pendurado, dormindo,

sem fazer nada além de roncar, tia Tatá

vendeu nossa casa!

Tio Drac parecia confuso. Ele não

gosta de ser acordado durante o dia.

— O quê? — resmungou ele.

— Tem três pessoas esquisitas aqui, tio

Drac, e uma delas é muito chata, você não

acreditaria, ela é tão idiota... e a tia Tatá

está vendendo nossa casa para eles!

— Ahn? — Tio Drac é muito lento às

vezes. Apenas o agarrei e o puxei junto

comigo.

Page 135: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Você pode sair agora! — gritei para

Edmundo, que estava emburrado na

passagem secreta. Ele flutuou para fora.

— Quem é esse, Pimentinha? — tio

Drac perguntou quando viu Edmundo.

— Esse é Edmundo, tio Drac. E se você

não conseguir convencer tia Tatá a mudar

de idéia quanto a vender a nossa casa, ele

vai espantar aquelas pessoas.

Tio Drac continuava olhando para trás

enquanto Edmundo nos seguia pelas

escadas.

Page 136: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Ele não parece muito bem,

Pimentinha. O que há de errado com ele? —

sussurrou tio Drac.

— Ele está morto, tio Drac.

— Morto? — Tio Drac de repente ficou

tão pálido quanto Edmundo.

Page 137: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Ele é um fantasma — eu disse a ele

pacientemente. — Agora venha depressa

antes que tia Tatá venda a casa e você

tenha que começar a empacotar todos os

morcegos.

— Meus morcegos. Onde você disse

que meus morcegos estavam, Pimentinha?

— Eu não disse nada, tio Drac. Andem

logo, por favor. Vocês dois.

Como levei o Edmundo e o tio Drac

para a terceira-cozinha-à-direita-logo-após-

a-esquina-depois-da-sa- la-do-aquecedor eu

não sei. Mas levei.

Todos estavam sentados em volta da

mesa, e tia Tatá servia chá.

— Ah, Drac — disse tia Tatá, desviando

o olhar da chaleira. — Que bom que você

está aqui. E Araminta. E, hum... quem é o

seu amigo, Araminta? Ele está muito pálido.

Será que ele gostaria de uma bebida

quente?

Page 138: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Este é Edmundo — eu disse a ela. —

E ele não gostaria de nada, obrigada. Ele é

um fantasma.

Olhei em volta para ver o efeito que

isso causaria nas pessoas estranhas, mas

elas apenas olharam para Edmundo e

pareceram ainda mais empolgadas.

— Mas que maravilhai — cacarejou a

mulher de óculos escuros. — Um menininho

fantasma. Ele é tão bonitinho. Olá,

Edmundo querido.

— Olá — sussurrou Edmundo.

— Ouça, Edmundo — sussurrei. —

“Olá” não é bom o suficiente. Será que você

pode soltar um uivo de gelar o sangue ou

coisa parecida?

Mas Edmundo não fez nada; apenas

ficou na porta de um jeito chato e nada

assustador, com um sorrisinho tolo no rosto.

Edmundo ser um fantasma era um

verdadeiro desperdício, pensei.

Page 139: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Se eu fosse um fantasma, estaria

uivando pela cozinha, gritando e jogando

tudo para fora da mesa — e isso seria só o

começo.

A pequena pessoa Magórica estava

sorrindo para Edmundo, então fiz minha

cara-de-sapo-com-boca- grande-larga para

ela. Mas ela só deu uma risadinha. E depois

uma coisa muito estranha aconteceu. Ela

pegou o copo de suco de laranja que tia

Tatá servira para ela e de repente o suco

começou a efervescer e ficou azul. Por um

instante tive esperanças de que, de repente,

tia Tatá tivesse mudado de idéia e estivesse

tentando envenená-la, mas o homem

Magórica disse:

— Pare de brincar com sua bebida,

Vanda.

Vanda estalou os dedos, e a bebida

voltou a ser suco de laranja laranja.

Exibicionismo. Depois ela pegou quatro

Page 140: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

ratos de estimação do bolso e os colocou em

cima da mesa, à sua frente. Os ratos

plantaram bananeira e deram saltos-mortais

em volta do copo. Duplo exibicionismo.

Tio Drac passou através de Edmundo,

e tia Tatá fez com que ele sentasse ao seu

lado.

— Drac, querido — disse tia Tatá —,

estes são Brenda, Barry e Vanda Magórica,

e eles vão comprar nossa casa. Não é

ótimo?

Tio Drac não disse nada. Ele estava

olhando para mim — aliás, todos estavam

olhando para mim — então minha cara-de-

sapo-com-boca-grande se transformou em

cara-de-sapo-com-boca-grande-larga-

confuso.

Page 141: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Tia Tatá suspirou.

— Mas como você pode perceber,

Drac, Araminta está sendo um pouco...

difícil.

— Espere um instante, Tatá —

resmungou tio Drac, piscando um pouco.

Tio Drac tem dificuldades para enxergar na

claridade, e às vezes acho que ele é um

grande morcego. — Nós realmente

Page 142: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

precisamos vender a casa? — disse ele. — A

Pimentinha está muito chateada, e meus

morcegos estão com um comportamento

muito estranho.

— Assim como o aquecedor — tia Tatá

lhe disse. — Como sempre. E eu não vou

mais aturar esse aquecedor, Drac, estou

falando sério.

— Ah, querida — resmungou tio Drac.

Dava para perceber que o tio Drac ia deixar

a tia Tatá ganhar — como sempre — então

eu disse:

— Tio Drac, você tem que fazer alguma

coisa. Por favor.

—Tenho? — disse ele, parecendo

preocupado.

— Sim — eu lhe disse. — Você tem! —

Sentei em frente a ele e o olhei. Eu nem fiz

cara-de-sa- po-com-boca-grande-larga e nem

lancei meu olhar diabólico. Apenas olhei

Page 143: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

para ele como se aquilo fosse muito

importante. O que de fato era.

Tio Drac tossiu um pouco e depois

disse:

— Tatá, querida, eu sinto muito pelo

aquecedor. Eu sei que deixei todo o

trabalho para você; sei que não foi justo e

prometo que, de hoje em diante, vou dividir

a tarefa de limpar o aquecedor...

Page 144: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— E cortar gravetos e buscar carvão —

acrescentou tia Tatá.

— Bem, sim, isso também.

— E esvaziar e acender...

— Sim, eu faço isso também.

— Promete?

Page 145: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Prometo — disse o bom e velho tio

Drac. Tia Tatá sentou-se repentinamente.

— Bem — disse ela —, sofri alguns

choques hoje, Drac, mas ouvir você oferecer

ajuda com o aquecedor foi o maior até

agora.

— Isso significa que você não vai

vender a casa? — perguntei à tia Tatá.

— Sim, tudo bem, Araminta — suspirou

tia Tatá. — Não vou vender a casa.

— Oba! — gritei.

— Puxa — resmungaram os Magórica.

— Sinto muito — tia Tatá disse a eles

—, mas a casa não está mais á venda. Vocês

gostariam de outra xícara de chá?

— Não, obrigada — disse a mulher

Magórica, suspirando. — Acho melhor

irmos.

Já não era sem tempo, também pensei

— mas ela não se levantou. Em vez disso ela

disse:

Page 146: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Bem, eu não pude deixar de

perceber que você tem um modelo três com

duplas latas de cinza e peneira invertida.

Aliás, este é um dos modelos mais raros da

série.

— O que é sério? — perguntou tia Tatá.

— Seu aquecedor. Será que eu poderia

dar uma olhada nele antes de ir? Eles são

muito incomuns hoje em dia. — Tia Tatá

olhou para a mulher Magórica como se ela

fosse louca, mas a levou para a sala do

aquecedor assim mesmo.

Quando elas saíram, tio Drac levantou-

se da cadeira.

— Preciso encontrar meus morcegos —

disse ele.

— Precisa de ajuda? — perguntou o

homem Magórica. — Pode ser complicado

capturá-los sozinho.

Page 147: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Obrigado — disse o tio Drac, e ele e

o homem Magórica saíram para procurar os

morcegos.

— Eu também preciso ir — disse

Edmundo, e flutuou através da parede da

cozinha.

— Tchau, Edmundo — disse a garota

Magórica exibida.

— Até logo, Vanda — disse a voz de

Edmundo de algum lugar dentro da parede.

Assim eu e a menina Vanda Magórica

ficamos juntas.

— Posso te mostrar como transformar

seu suco de laranja em azul se você quiser

— ofereceu ela.

Achei uma boa idéia. Afinal de contas,

você nunca sabe quando um truque desses

pode ser útil, sabe?

Então eu disse:

— Tudo bem.

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Page 149: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Vanda não era tão ruim quanto

parecia. Ela me ensinou a fazer a

efervescência azul do suco de laranja, e eu

logo transformei o chá e o café do tio Drac

em azul, e eles estavam efervescendo por

todo lugar. Mas depois Vanda disse que

deveria ir. Eu disse que ela podia ficar mais

um pouco e me mostrar seus ratos plantan-

do bananeira se ela quisesse, então ficamos

observando os ratos formarem a Incrível

Pirâmide de Ratos, que era muito boa.

Depois ouvimos um barulhão lá em cima e

Page 150: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

corremos para ver o que estava

acontecendo.

Foi muito engraçado. O pai da Vanda,

Barry, balançava na cortina tentando pegar

o Morcegão enquanto o tio Drac segurava

uma rede enorme. O melhor vaso da tia

Tatá estava em cacos pelo chão. Oops!

— Ei, Morcegão! — gritava o tio Drac.

— Venha cá, Morcegão, bom morcego!

Morcegão voou, e Barry caiu na rede.

Vanda e eu rimos tanto que até

desabamos no chão, mas Barry e tio Drac

pareciam muito contrariados, então levei

Vanda lá para cima para ver todos os meus

quartos. Vanda achou todos muito legais, já

que ela só tinha um quarto na sua casa, e

ele era muito, muito pequeno.

Depois disso, já que Barry ainda estava

ajudando o tio Drac a capturar o Morcegão,

e Brenda ainda estava olhando o aquecedor

com a tia Tatá, Vanda me ajudou a remontar

Page 151: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

o Cavaleiro Horácio novamente. Limpamos

toda a gelatina e farinha e o polimos com

um pouco do produto de polir o aquecedor

da tia Tatá. E pusemos seu pé esquerdo de

volta no lugar.

Assim que estava completamente

montado, o Cavaleiro Horácio se levantou e

se espreguiçou.

— Nossa, isso foi muito bom para a

minha coluna — disse ele, enquanto partia

barulhentamente e se colocava numa

esquina do vestíbulo.

— Seria bom se a gente passasse um

pouco de óleo nele — disse Vanda. — Tenho

algumas coisas para a minha bicicleta que

funcionariam muito bem.

— Você sabe andar de bicicleta? —

perguntei a ela. Sempre quis ter uma

bicicleta, mas tia Tatá diz que elas são

perigosas.

Page 152: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

— Claro que sei — disse Vanda. —

Posso te ensinar se você quiser.

Achei que Vanda estava se revelando

muito interessante, considerando tudo.

Por isso, quando a mãe dela anunciou:

— Vamos, querida, nós realmente

precisamos ir agora.

Eu disse:

— A Vanda pode dormir aqui, tia Tatá?

Pode? Por favor, por favor, por favor, por

favor, por favor?

Então Vanda dormiu lá em casa. Barry

e Brenda também. Brenda queria fazer o

aquecedor funcionar adequadamente, e

Barry ainda estava ajudando o tio Drac a

capturar o Morcegão.

Page 153: Angie Sage - Minha Casa Mal-Assombrada

Eles dormiram lá na noite seguinte

também. E na outra, e na outra, e na outra.

E então, hoje de manhã, tia Tatá disse a eles

que seria bobagem se eles voltassem para

casa, a não ser que eles quisessem, e

Brenda, Barry e Vanda disseram que não,

que não queriam ir embora.

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Eu não me importo que tia Tatá tenha

decidido vender a casa, porque é muito

mais divertido com a Vanda aqui, e

encontrei dois fantasmas, então agora sei

que realmente moro em uma casa mal-

assombrada, como eu sempre quis.

FIM

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