Ano XXVIII • Nº 263 • Outubro 2018 • R$ 15,00 • ... · processo que se iniciou em...

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Ano XXVIII • Nº 263 • Outubro 2018 • R$ 15,00 • www.eco21.com.br facebook.com/revista.eco21 ECO 21 Philip Fearnside • Mario Molina • José Graziano • Tim Radford Claudio Angelo • James Lovelock • Clóvis Borges • André Vilhena ISSN 0104-0030

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Ano XXVIII • Nº 263 • Outubro 2018 • R$ 15,00 • www.eco21.com.br • facebook.com/revista.eco21

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A n o 2 8 • O u t u b r o 2 018 • N º 2 6 3

ECO•21

Capa: Manifestantes na Conferência sobre aquecimento global do IPCC na Coreia do Sul Foto: Sean Wu - IISD

Gaia viverá! Lúcia Chayb e René Capriles

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Para limitar o aquecimento global a 1,5°C é necessário implementar mudanças sem precedentes em todos os campos da sociedade, afirma o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) na sua nova avaliação. “Limitar o aquecimento a 1,5°C em lugar de 2°C trará benefícios significativos para as pessoas e os ecossistemas naturais além de consolidar uma sociedade sustentável e equitativa”, declarou Hoesung Lee, Presidente do IPCC, no lançamento do “Informe Especial sobre os Impactos do Aquecimento Global de 1,5°C”, no dia 8 deste mês (Outubro) na cidade de Incheon, Coréia do Sul. Com mais de 6.000 referências e a contribuição de centenas de cientistas, consultores independentes e governamentais de todo o mundo, este importante Informe revela a amplitude e a pertinência normativa do IPCC. 91 autores, editores e revisores de 40 países prepararam o Informe em resposta a uma solicitação da Convenção sobre Mudanças Climáticas quando foi aprovado o Acordo de Paris em 2015. Limitar o aquecimento global a 1,5°C reduzirá os graves impactos na saúde humana e facilitará a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. As decisões que tomaremos hoje serão decisivas para garantir um mundo seguro e sustentável para todos, tanto agora quanto no futuro. O Informe proporciona aos responsáveis das políticas nacionais a informação necessária para tomar decisões e enfrentar a mudança climática levando em consideração o contexto local e as necessidades das pessoas. Os próximos anos serão, provavelmente, os mais importantes da nossa história. André Ferreti e Carlos Rittl, do Observatório do Clima fizeram uma grave advertência: “O presidente eleito, independente da sua bandeira partidária, não poderá tratar com descaso a mudança climática que vive o nosso Planeta, o maior desafio da humanidade neste século. Contrariando o que muitos pensam, não é apenas de uma preocupação ambiental. Trabalhar pelo equilíbrio climático – seja em hábitos individuais, atitudes organizacionais ou políticas públicas – é determinante para questões como qualidade de vida, segurança alimentar, desenvolvimento econômico, investimentos, infraestrutura, defesa civil e muitas outras. Precisamos correr contra o tempo. O clima está mudando e desafia o Brasil e todas as nações a se adaptarem. Contudo, o tema vem sendo praticamente ignorado na corrida presidencial e medidas extremas aventadas ao longo da campanha – como a possibilidade de sairmos do Acordo de Paris e a desestruturação de órgãos e mecanismos ambientais de extrema relevância para a conservação de nosso patrimônio natural – podem colocar abaixo conquistas ambientais históricas”. Em Dezembro próximo, cientistas e diplomatas de todo o mundo se reunirão no antigo centro mineiro de carvão de Katowice, Polônia, para a COP-24, que é considerada a última chance de tornar o Acordo de Paris uma realidade. No Brasil, os eventos extremos do clima político gerado pelas eleições revelam que a COP-25 (pleiteada pelo nosso País para sediá-la) farão do desastre ambiental da barragem de Mariana uma pálida amostra do futuro que se prenuncia. Uma verdadeira tempestade para Caliban nenhum botar defeito, nem tampouco para Furacão, o deus dos ventos, das tempestades e do fogo descrito no Popol Vuh, que provocou o diluvio para destruir os homens. Os maias ainda lembram desta divindade nos momentos que mais temem a fúria da natureza. No Brasil, o furacão político atual, tal como Caliban, a criatura shakespeariana, faz tremer até os mais céticos.

O aquecimento gera eventos extremos no Brasil e no mundo

4 Ex-Ministros do MMA - Não podemos desembarcar do mundo 6 Carta Aberta do IBAP - Carta em Defesa da Democracia e do Meio Ambiente 7 Philip Fearnside - Amazônia e os retrocessos do momento político 8 Mario Molina - Relatório do IPCC - 1,5°C subestima as ameaças10 Débora Brito - Brasil alerta sobre o desafio da meta de 1,5°C do IPCC12 Claudio Angelo - Frear aquecimento em 1,5°C demanda corte de 45% nos GEE13 Rita Silva - ONU quer urgência na ação climática em Bangkok14 Maria Jose Pacha - O Relatório do IPCC - 1,5°C e a América Latina16 Marsha Saxton - As mudanças climáticas e os danos à saúde18 Ferzina Banaji - Nova economia climática prevê US$ 26 trilhões até 203020 Elisa Homem de Mello - Os 10 anos do Programa Brasileiro GHG Protocol22 Till Kellerhoff - 50 anos do Clube de Roma: a Agenda para o Século 2124 Fabrício Marques - O peso da inovação e do clima na sustentabilidade25 Clóvis Borges - Nobel: a fragilidade da economia frente às variáveis ambientais28 André Julião - O papel de corais na captura de carbono da atmosfera30 Waleska Barbosa - Países debatem proteção de corais e manguezais32 Maria F. Ziegler - Pesquisa ambiental na Amazônia é também socioeconômica34 Bruno Taitson - Sociedade civil contribui à Lei do Pantanal36 Rodrigo de O. Andrade - Comércio de barbatanas põe em risco tubarões do Brasil40 André Vilhena - Pirlimpimpim?41 Mauro Arbex - Ambientalistas enviam à PGR um Manifesto por Ar Limpo44 Owen Gaffney - Alimentar 10 bilhões de pessoas até 2050 é possível46 José Graziano da Silva - Dia Mundial da Alimentação: nossas ações são o futuro48 Cristina Amorim - Solo da Amazônia acumula nitrogênio dos fertilizantes50 Tim Radford - Repensar a Teoria de Gaia de James Lovelock

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José Goldemberg Rubens Ricupero

Gustavo Krause José Sarney Filho

José Carlos Carvalho Marina Silva

Carlos Minc Izabella Teixeira

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| política ambiental |

Ex-Ministros do Meio Ambiente do Brasil | Carta Aberta

Um dos grandes desaf ios do Século 21 está na implementação do desenvolvimento sustentável, conforme decidido, em 2015, com a aprovação da Agenda 2030, na Assembleia-Geral da ONU, com o apoio de 195 países. Esta decisão é resultado de um longo processo que se iniciou em Estocolmo, em 1972, e que, de lá para cá, teve o Brasil como um dos protagonistas, tornando-nos, reconhecidamente, um dos grandes atores dessa matéria na agenda internacional.

Ainda na década de 70, o Brasil deu importantes passos na institucio-nalização da questão ambiental com a criação da Secretaria Especial de Meio Ambiente (Sema), em 1973, e com a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981, ainda no regime militar. No âmbito dos governos estaduais, houve processo similar, com a criação de agências estaduais de meio ambiente, revelando-se, assim, a incorporação da temática ambiental no poder público e a consolidação do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).

Com a promulgação da Constitui-ção Federal de 1988, o Brasil tornou-se um dos primeiros países a tratar com destaque a questão ambiental em vários dispositivos constitucionais, o que só foi possível pela articulação de uma frente suprapartidária na Assembleia Nacional Constituinte, sob a coordenação do ex-Deputado Fabio Feldmann. Nos direitos dos povos indígenas, a Cons-tituição trouxe um avanço incontestável com o Artigo 231, que teve no Senador Jarbas Passarinho (1920-2016) um dos seus principais apoiadores.

Expurgando-se o calor inerente às campanhas eleitorais, espera-se que o futuro presidente compreenda a importância estratégica para o país da manutenção e valorização das insti-tuições públicas de meio ambiente essenciais ao cumprimento da Constituição de 1988, em especial o Ibama e o ICMBio. Com isso, continuaremos a garantir um caminho claro na direção do desenvolvimento sustentável que, inexoravelmente, atende às aspirações da sociedade, independentemente das escolhas do eleitorado no próximo dia 28.

É inegável a necessidade de dar continuidade ao aperfei-çoamento da gestão ambiental no Brasil, que vai além dos temas relacionados ao uso da terra.

Não podemos desembarcar do mundo

Especial atenção deve ser dada aos instrumentos de avaliação de impacto ambiental e ao licenciamento ambien-tal, sem ignorar a sua importância para a tomada de decisão dos processos de desenvolvimento e a envergadura da jurisprudência consolidada em nosso país e na esfera internacional.

O aquecimento global, por sua vez, é reconhecido pela comunidade científica e por toda a comunidade internacional como o maior desafio da humanidade nas próximas décadas.

O Brasil, com liderança inequívoca nesta matéria, quer pela competência da sua diplomacia, quer por determinações da Política Nacional de Mudança do Clima, só tem a ganhar mantendo os esforços a favor de uma economia de baixo carbono, no combate ao desma-tamento ilegal, no desenvolvimento da indústria florestal e na consecução dos objetivos do Acordo de Paris.

Já estamos sofrendo os impactos negativos do aquecimento global com o aumento de desastres naturais, seca prolongada no semiárido e alteração dramática do nosso regime hidrológico, com riscos evidentes nas atividades das hidrelétricas e vulnerabilidades na produção agrícola e no abastecimento

de água nos centros urbanos.A megabiodiversidade brasileira representa enorme

potencial para o desenvolvimento de novas economias nos campos farmacêutico, químico, cosmético e de alimentos. As Unidades de Conservação, por sua vez, são ativos importantes de desenvolvimento regional, podendo gerar ganhos sociais e econômicos, além de importante instrumento de defesa do território nacional.

Nós, que participamos ativamente da construção das insti-tuições ambientais do Brasil nos últimos 30 anos, entendemos que o próximo presidente da República terá a oportunidade de compreender a importância da manutenção do Ministério do Meio Ambiente e da permanência do Brasil no Acordo de Paris para a liderança brasileira na agenda nacional e global do desenvolvimento sustentável.

Não podemos correr o risco de isolamento político inter-nacional ou do fechamento de mercados consumidores para as nossas exportações. Não podemos desembarcar do mundo em pleno Século 21.

AssinAm A CArtA os Ex-ministros do mEio AmbiEntE

José Goldemberg Ministro em 1992

Rubens Ricupero Ministro de 1993 a 1994

Gustavo Krause Ministro de 1995 a 1998

José Sarney Filho Ministro de 1999 a 2002 e

de 2016 a 2018

José Carlos Carvalho Ministro em 2002

Marina Silva Ministra de 2003 a 2008

Carlos Minc Ministro de 2008 a 2010

Izabella Teixeira Ministra de 2010 a 2016

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| política ambiental |

Numa iniciativa conjunta de associações de advogados públicos e de defesa dos povos indígenas e do meio ambiente, à qual aderiram escritores, músicos, atores e professores de Direito Ambiental e de Letras de todo o país, está sendo divulgada no dia 15 de Outubro de 2018, Dia dos Professores, uma “Carta em Defesa da Democracia e do Meio Ambiente”.

A iniciativa partiu do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública, contando com a imediata adesão do Instituto Socio-ambiental. A Carta é subscrita por artistas, sociólogos e juristas como Ignácio de Loyola Brandão, Bernardo Kucinski, João Silvério Trevisan, Márcio Souza, Milton Hatoum, Ednardo, Fausto Nilo, Mariana Ximenes, Jonas Bloch, Jessé Souza e Flávia Piovesan, além de dezenas de professores membros da APRODAB e do IDPV.

José Nuzzi Neto, presidente do IBAP, explica a importân-cia da iniciativa: “Os advogados públicos brasileiros devem obediência à Constituição Federal, que assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por isso, dentre outras e relevantes atribuições, promovem a regu-larização fundiária de Parques e Unidades de Conservação, executam multas ambientais, ajuízam ações civis públicas em defesa do meio ambiente e prestam consultoria jurídica para a Administração”.

Vem daí a preocupação do IBAP e das demais entidades de Advocacia Pública – APEP, APEPA, APESP e SINDIPROESP, com a defesa do meio ambiente. “Essa defesa constitucional só é possível se forem integralmente preservados os fundamen-tos da própria democracia, ameaçados nas últimas semanas por grupos uniformizados que vêm impondo o medo e a violência no país”.

Guilherme José Purvin de Figueiredo, Secretário-Geral do IBAP, esclarece: “Proteger o meio ambiente e a democracia são tarefas indissociáveis para quem quer ver um país livre, com uma cultura rica e diversificada, num ambiente sadio e democrático.

Os escritores que subscrevem a Carta têm uma profunda identidade com valores como a ecologia – caso de Milton Hatoum e Márcio Souza; a justiça social – caso de Roniwalter Jatobá e Manuel Herzog; ou o direito de opção sexual – caso de João Silvério Trevisan. Mariana Ximenes, por sua vez, tem lutado em defesa dos povos ribeirinhos ao Rio Doce e das vítimas do desastre da Samarco, sendo natural sua par-ticipação na Carta. O mesmo se diga de Ednardo e Fausto Nilo, cantores e compositores populares com uma vertente lírica intensamente ecológica e social”.

Instituto Brasileiro de Advocacia Pública | Carta Aberta

Carta em Defesa da Democracia e do Meio Ambiente

Carta em defesa da democracia e do meio ambiente

O Instituto Brasileiro de Advocacia Pública – IBAP, o Instituto Socioambiental – ISA, o Conselho Indigenista Missionário – CIMI, o Observatório Nacional de Justiça Socioambiental – OLMA, as Associações de Procuradores dos Estados de São Paulo, Pará e Paraná – APESP, APEPA e APEP – e o Sindicato dos Procuradores do Estado, das Autarquias, Fundações e Universidades Públicas do Estado de São Paulo – SINDIPROESP, reafirmando seu compromisso com a observância do devido processo legal, dentro de um Estado Democrático de Direito, e exortando o Brasil a res-peitar os princípios e normas estabelecidos consensualmente pelos Estados Membros da Organização das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos, vêm a público manifestar coletivamente seu compromisso inarredável para com os valores insculpidos na Constituição de 1988 e nos Tratados Internacionais, nomeadamente:

– a garantia fundamental de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado;

– o repúdio ao autoritarismo em todos os planos;– o respeito aos princípios de legalidade, impessoalidade,

moralidade, publicidade e eficiência, nos moldes do art. 37, da Constituição Federal;

– a defesa intransigente dos direitos humanos e do Direito Ambiental;

– a igualdade de gênero;– a observância dos princípios contidos no art. 170, da

Constituição Federal, em especial no seu inc.VI;– o respeito aos pactos internacionais sobre combate às

mudanças climáticas;– as garantias fundamentais voltadas à proteção de

povos indígenas, comunidades quilombolas e demais povos comunidades tradicionais.

Exortam ainda a que sejam rigorosamente apurados e punidos todos os casos de:

a) feminicídios e agressões físicas, verbais e psicológicas contra mulheres, demonstrações de homofobia e intolerância em razão de gênero e orientação sexual, atentados contra a vida e a cultura de povos indígenas, quilombolas e afrodescendentes e crimes praticados contra lideranças ambientalistas;

b) crimes perpetrados por agentes estatais;c) improbidade administrativa e lesão aos cofres

públicos;d) abuso de autoridade e apologia ao crime;e) políticas que impliquem em destruição da biodiver-

sidade e agravamento do aquecimento global.

Brasília, 15 de Outubro de 2018

Assinaram: Instituto Brasileiro de Advocacia Pública (IBAP); Instituto Socioambiental (ISA); Conselho Indigenista Missionário (CIMI); Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida (OLMA); Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP); Associação dos Procuradores do Estado do Pará (APEPA); Associação dos Procuradores do Estado do Paraná – (APEP); Sindicato dos Procuradores do Estado, das Autarquias, Fundações e Universidades Públicas do Estado de São Paulo (SINDIPROESP).

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| política ambiental |

O momento político no Brasil está repleto de ameaças de diversos retrocessos; algu-mas são administrativas, tais como promessas para abolir o Ministério do Meio Ambiente, expulsar ONGs internacionais como Greenpeace e WWF e tirar qualquer verba governa-mental que beneficie “ativistas”. Também há ameaças de grandes cortes orçamentários para Ciên-cia e Tecnologia.

Outras propostas incluem “vender” as terras Indígenas e “relaxar” o licenciamento ambiental para obras como rodo-vias e barragens, além de outros para acabar, de fato, com licenciamento. Os impactos sociais de muitas dessas obras não podem ser desfeitos depois, por exemplo, da destruição de comunidades ribeirinhas ou indígenas, junto com os seus meios de sustento. O mesmo se aplica aos impactos ambientais.

A proposta para o Brasil abandonar o Acordo de Paris sobre o controle de aquecimento global é uma das ameaças com consequências mais irreversíveis. A Floresta Amazônica enfrenta um processo assustador de degradação por meio de exploração madeireira, grandes secas, enchentes e vendavais, incêndios florestais, invasões biológicas de lianas e bambu, e fragmentação.

Além dessas consequências tem as perdas pelo desma-tamento, cuja taxa anual aumentou em 52% de 4.571 para 6.947 km2 entre 2012 e 2017.

Philip Martin Fearnside | Doutor em Ecologia e Biologia Evolucionária. Pesquisador titular do INPA

Amazônia e os retrocessos do momento político

Pontos de desequilíbrio (“tipping points”) para a floresta amazônica já estão muito próximos, tanto pelo avanço do desmatamento como pelo aumento da temperatura global.

Os enormes estoques de carbono na vegetação e no solo na Amazônia colocam a região no centro de preocupações sobre um “Efeito Estufa em Fuga” (“runaway greenhouse”), quando qualquer liberação substancial deste carbono para a atmosfera dificultaria o controle do aquecimento global. O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Cli-máticas (IPCC) liberado em 8 deste mês (Outubro) ampliou a divulgação sobre a existência e a proximidade deste perigo planetário.

Infelizmente, a negação da existência de aquecimento global antropogênico, que representa um corrente influente no Brasil, já chegou na esfera de debates presidenciais. Esta é uma fórmula para provocar degradação irreversível na Amazônia, além de impactos trágicos no mundo inteiro.

O momento político no Brasil já está, em grande parte, dominado por outros assuntos: petismo versus antipetismo e a exaltação geral contra corrupção e violência. Questões socioambientais estão sendo colocadas de lado frente à polarização sobre esses outros assuntos. Há diversos relatos sobre brigas entre familiares devido a divergências políticas. No entanto, são as questões socioambientais da Amazônia que irão perdurar.

Estas questões são de suma importância para o País e estarão presentes muito além de um mandato presidencial. Reconhecer e enfrentar as ameaças ao ambiente amazônico deve ser algo que unifica o País, mesmo no meio das rixas do atual momento político.

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Philip Martin Fearnside

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| política ambiental |

O Relatório Especial do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU sobre o Aquecimento Global, de 1,5 grau Celsius, divulgado no dia 8/10/2018, é um grande avanço em relação aos esforços anteriores para alertar os líderes mundiais e os cidadãos sobre o crescente risco climático. Mas o Relatório, por mais medonho que seja, perde um ponto-chave: os feedbacks e pontos de inflexão auto-reforçadores – os curingas do sistema climático – podem fazer com que o clima se desestabilize ainda mais. O Relató-rio também não discute o risco de 5% que, mesmo os níveis existentes de poluição climática, se não forem controlados, poderiam levar a um aquecimento descontrolado – o chamado risco de “cauda gorda”. Essas omissões podem levar os líderes mundiais a pensar que têm mais tempo para enfrentar a crise climática, quando, na verdade, são necessárias ações imedia-tas. Para ser franco, existe um risco significativo de ciclos de realimentação climática que se auto-reforçam, empurrando o Planeta para um caos além do controle humano.

O Relatório descreve como os impactos climáticos serão mais sérios se o mundo permitir que o aquecimento alcance 2°C acima dos níveis pré-industriais. Limitar o aquecimento a 1,5°C pode, por exemplo, reduzir muitos impactos pela metade, incluindo escassez de água doce, perdas de muitas espécies e captura de peixes oceânicos. O relatório é relativamente otimista ao considerar que pode ser feito, mas apenas com o comprometimento e a cooperação de governos, líderes indus-triais, religiosos e seculares, e cidadãos em todo o mundo.

Até agora, as temperaturas médias subiram um grau Celsius. Adicionar 50% a mais de aquecimento para atingir 1,5 grau não aumentará simplesmente os impactos pela mesma porcentagem - ruim como seria. Em vez disso, corre o risco de criar feedbacks que poderiam cair como dominós perigosos, desestabilizando fundamentalmente o Planeta. Isso é analisado em um estudo recente mostrando que a janela para evitar a mudança climática descontrolada e um planeta superaquecido “hot house” está fechando muito mais rápido do que se entendia anteriormente.

Mario Molina | Prêmio Nobel de Química em 1995 por seu trabalho sobre o esgotamento da camada de ozônio. Professor na Universidade da Califórnia em San Diego e na Universidade Nacional Autônoma do México*

Relatório do IPCC - 1,5°C subestima as ameaças

Esses feedbacks em cascata incluem a perda do gelo marinho do Ártico, que pode desaparecer inteiramente no verão nos próximos 15 anos. O gelo serve como um escudo, refletindo o calor de volta para a atmosfera, mas está sendo cada vez mais fundido em água que absorve o calor. Perder o gelo aumentaria tremendamente o aquecimento do Ártico, que já é pelo menos o dobro da taxa média global. Isso, por sua vez, aceleraria o colapso do permafrost, liberando seus antigos depósitos de metano, um super poluente climático 30 vezes mais potente que causa o aquecimento do que o dióxido de carbono.

Ignorando amplamente tais feedbacks, o Relatório do IPCC não avisa adequadamente os líderes sobre o agrupamento de seis pontos de inflexão climáticos semelhantes que poderiam ser cruzados entre a temperatura atual e um aumento de 1,5 graus – quanto mais quase outra dúzia entre 1,5 e 2 graus . Esses curingas poderiam muito provavelmente empurrar o sistema climático além da capacidade humana de controlar.

É bom lembrar que o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, António Guterres, alertou aos líderes mundiais no mês passado (Setembro): “Enfrentamos uma ameaça existencial. A mudança climática está se movendo mais rápido do que nós. Se não mudarmos o curso até 2020, corremos o risco de perder o ponto em que podemos evitar a mudança climática descontrolada, com consequências desastrosas”.

O Relatório do IPCC deixa claro, pela primeira vez, que limitar o aquecimento a 1,5 graus centígrados requer o corte de super emissões climáticas de curta duração – carbono negro, metano e hidrofluorcarbonos – junto com o dióxido de carbono, além de aprender a extrair CO2 da atmosfera em escala.

O Relatório observa que existem precedentes históricos para a velocidade que precisamos, embora não para a escala de mitigação necessária. Mas a mobilização industrial dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial fornece um precedente encorajador: apenas três anos e meio se passaram entre Pearl Harbor e o Dia D. Nossas economias têm uma capacidade notável de se adaptar rapidamente com as políticas certas. Assim, nem o fatalismo nem o desespero são garan-tidos, mas sim um senso de otimismo urgente, ou mesmo com medo de fugir.

A Cúpula Global de Ação Climática do Governador do Estado da Califórnia, Jerry Brown, realizada em São Fran-cisco, no mês passado, juntou-se a inovadores de tecnologias sustentáveis, produtores de energia com zero carbono, empre-endedores verdes e outros grupos otimistas para aproveitar a ocasião desse desafio.

*Co-autores: Veerabhadran Ramanathan, vencedor de 2018 TANG, Campeão da Terra em 2013 e professor de ciências climáticas na Universidade da Califórnia, em San Diego; Durwood J. Zaelke fundador e Presidente do Institute for Governance & Sustainable Development em Washington, DC e Paris, e co-diretor de um programa relacionado na Universidade da Califórnia, em Santa Barbara

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Mario Molina

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O One Planet Summit do Presidente Macron foi seguido em Nova York durante a Climate Week, reunindo líderes de finanças que estavam otimistas de que gerenciar o risco cli-mático não é apenas possível, mas um desafio estimulante que também seria lucrativo à medida que novas indústrias surjam para fazer o trabalho mais importante que o mundo já exigiu. Uma estimativa do custo da remoção de CO2 é ao redor de US$ 535 trilhões neste século, um mercado considerável.

É fundamental que os líderes mundiais entendam o Relatório do IPCC e o utilizem como um modelo para ação imediata. Embora suas abordagens tenham sido identificadas anteriormente – incluindo o estudo Well Under 2°C do ano passado que co-presidimos com mais de 30 especialistas – o Relatório do IPCC deve ser um ponto de convergência para as nações implementarem as políticas necessárias para limitar o aquecimento global a não mais de 1,5 graus Celsius.

A mudança climática não deve ser uma questão política divisível. É uma questão de ciência fundamental, orientada por dados, uma questão de tragédia humana e uma questão de ecossistemas planetários em perigo. Mas acima de tudo, é uma questão sobre a qual ainda podemos fazer alguma coisa.

Mudar de rumo tomará liderança, como vimos nos Estados Unidos do Governador Brown e das cidades e Estados em sua coalizão, e de Chefes de Estado como o Presidente da China Xi e o Primeiro-Ministro da Índia, Modi, e também o Presidente da França, Macron. Esses três líderes têm o potencial de prover a liderança de Churchill para estabilizar o clima do mundo, começando por reunir os países do G20 responsáveis por 80% do problema. Eles precisarão acelerar, aumentar de escala e ter sucesso.

IISD

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Especialistas alertam que o Relatório do Painel Inter-governamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) prevê grande dificuldade para o Planeta cumprir a meta de manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C até o fim deste século, como estabelece o Acordo de Paris, assinado por quase 200 países, durante a COP-21 da Convenção sobre Mudanças Climáticas, em 2015. Brasileiros que tiveram acesso a versões prévias do Relatório estão preocupados.

Em nível global, o Relatório do IPCC, divulgado no dia 8 deste mês (Outubro), mostra que há uma tendência de aumento das temperaturas e as consequências serão extremas se os países não acelerarem as medidas para cumprir os acordos internacionais de redução das emissões de dióxido de carbono e de adaptação aos efeitos das mudanças climáticas.

“Uma das coisas que é colocada no Relatório é que, para se chegar a 1,5°C, o nível de emissões negativas é extrema-mente elevado, como reflorestar uma extensão territorial do tamanho dos Estados Unidos. Evidentemente, o desafio de não ultrapassar 1,5°C é muito difícil de ser alcançado no estágio atual da tecnologia e da forma como está o desenvolvimento econômico no âmbito internacional; mas, é um horizonte que tem que ser levado em conta”, comenta Alfredo Sirkis, Coordenador Executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas.

O pesquisador Carlos Rittl, Secretário-Executivo do Observatório do Clima, acrescenta que com os resultados prévios do Relatório já é possível afirmar que o ganho que alguns setores têm, como a indústria do petróleo, do carvão, não compensará os prejuízos que a humanidade terá que arcar com os efeitos do aquecimento global. “O que está no Relatório é um alerta enorme, se não acelerarmos a ação climática, os impactos para todas as regiões do mundo vão ser extremamente severos para as pessoas, os ecossistemas e para a economia de países, cidades e regiões. Em nível global, a mensagem é essa: ou a gente acelera a ação climática ou o preço de fazer menos que o necessário ou não fazer nada vai ser altíssimo”, destaca Rittl.

Comparado a outras medidas de mitigação do aumento da temperatura, o reflorestamento é apontado como o mais eficaz para produzir emissões negativas em grande escala, segundo Alfredo Sirkis. No caso do Brasil, ele avalia que o país é privilegiado por ter grandes áreas com potencial para desenvolver diferentes iniciativas de redução das emissões, como a agricultura de carbono, que recupera pastagens e promove plantio direto com desenvolvimento econômico.

“Eu acho que são coisas que o Brasil tem uma condição favorável, por outro lado eu acho que, de fato, nós devemos obrigatoriamente melhorar a eficiência energética dos nossos veículos, utilizar mais os biocombustíveis e começar a eletrificar a nossa frota de transporte”, acrescenta Sirkis.

O Fórum entregou à Presidência da República sugestões de medidas para que o Brasil cumpra as metas assumidas no Acordo de Paris. O próximo passo é uma reunião com repre-sentantes de sete ministérios para levantar o que pode ser feito no âmbito de cada pasta. Além disso, o Governo encomendou estudo ao Fórum com medidas a serem tomadas para que o País consiga zerar as emissões líquidas de gases até 2060.

Os ambientalistas acreditam que o relatório do IPCC pode dar um norte científico para os países ajustarem suas metas e impulsione a adoção de medidas mais estratégicas e urgentes. Há expectativa de alinhamento também em torno da COP-24. “A COP da Polônia vai ser importante para definir alguns critérios e o mapa do caminho para o cumprimento do Acordo de Paris. A expectativa em torno dessa reunião é que fique mais claro para os países o que eles têm de fazer, qual vai ser a contabilidade, as regras para monitoramento das diversas metas que foram apresentadas e tentar unificá-las para um acompanhamento global”, afirmou André Guimarães, Diretor-Executivo do IPAM.

Brasil alerta sobre o desafio da meta de 1.5°C do IPCC

Débora Brito | Jornalista da Agência Brasil

IISD

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Os efeitos do aquecimento global já podem ser vistos e sentidos em diferentes aspectos em todas as regiões do país. Um dos aspectos mais marcantes é o aumento do calor em períodos do ano que costumavam ter temperaturas mais amenas, como foi percebido na chegada da primavera em setembro. Na capital do país, por exemplo, os diagnósticos e projeções de meteorologistas sobre a variabilidade climática na região Centro-Oeste apontam que a temperatura segue em uma tendência crescente desde a década de 60.

Estudo do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) sobre os índices de monitoramento e detecção da mudança climática para o Distrito Federal e entorno, mostra que a temperatura mínima média entre os anos de 1961 e 2012 apresentou aumento de 1,85 graus centígrados ao longo da série histórica. Por sua vez, a variação da temperatura máxima registrada foi 0,85% no período estudado até 2012. O estudo estima ainda que no período de 2011-2040, os aumentos de temperatura variam desde 1°C a cerca de 3°C. Para o final do Século 21, o aumento de emissão de gás carbônico equi-valente pode levar o aquecimento do clima variar de 2°C a cerca de 6°C na região.

Segundo Morgana Almeida, Chefe de Previsão do INMET, e uma das autoras do estudo, vários fatores influem na mudança do clima, mas no caso do Distrito Federal, o maior impacto decorre da mudança no uso da terra. “Sem sombra de dúvida, o uso e ocupação desordenado do solo impactaram na mudança do padrão térmico da temperatura no DF”, explicou a meteorologista.

A pesquisa ainda aponta que, em todos os períodos futuros, a região do entorno do Distrito Federal apresenta tendência de redução nas chuvas, principalmente no período do verão, estação chuvosa na região. “Se não tivermos a memória da meteorologia, da climatologia, não temos como saber como foi o tempo no passado, nem como fazer projeções futuras. Então, é importante o governo ter isso como prioridade e política pública”, alerta a pesquisadora.

Projeção nacional

A temperatura média anual do Brasil registrada por pes-quisadores estrangeiros entre 1980 e 2010 foi de 21°C. Se os níveis atuais de emissão de carbono não forem reduzidos, a projeção é que a temperatura média suba para 22 graus a partir de 2020, podendo chegar a 24 graus no fim do século, a partir de 2080.

A estimativa é do Climate Impact Lab, formado por um grupo de cientistas, economistas e analistas de dados de uma consultoria de pesquisa e políticas públicas, em parceira com as universidades de Chicago, Rutgers e da Califórnia. As projeções encontradas pelo grupo variam de acordo com a região, mas, de uma forma geral, apontam para elevação em quase todos os países acima das metas do Acordo de Paris. “Temos que parar com essa perspectiva de que as mudanças climáticas são algo do futuro. O impacto sobre o nosso dia a dia já é muito grande nas gerações presentes, e as gerações futuras vão pagar um preço altíssimo, com um clima muito mais hostil”, comentou Carlos Rittl.

Para impulsionar os países e acelerar a adoção de medidas que reduzam as emissões de carbono, o Estado da Califórnia e a Fundação das Nações Unidas promoveram, em Setembro último, um encontro global: o Global Climate Action Summit (GCAS) realizado na cidade de São Francisco.

Na ocasião, diferentes atores como especialistas, empresá-rios, gestores locais, investidores e ativistas da sociedade civil de vários países mostraram diversas iniciativas positivas de enfrentamento às mudanças climáticas.

“O objetivo do GCAS é reunir de volta as energias, compromissos, esforços e lideranças para além do Acordo de Paris e construir uma oportunidade para apoiar as ações que precisamos adotar. Estamos começando a ver novas for-mas de engajamento e de ação coletiva que serão vitais para solucionar o desafio climático”, avaliou Elizabeth Cousens, da UN Foundation.

Durante a Conferência, foi criada uma plataforma sobre a terra e o clima com a participação de mais de 100 organi-zações não governamentais, empresas, governos estaduais, prefeituras e comunidades tradicionais. Também foi ampliado o apoio ao chamado “Manifesto Cerrado”, que agora reúne mais de 100 empresas de alimentos e financeiras apoiadoras da conservação do Cerrado brasileiro.

Foram assinados ainda novos compromissos e anun-ciado o aporte significativo de investimentos em diferentes iniciativas, fundos e plataformas de incentivo de medidas que reduzem a emissão de Gases Efeito Estufa. Na mesma linha do encontro de São Francisco, outros programas do mesmo teor também foram lançados na segunda edição do One Planet Summit, realizada em 26 de Setembro passado, em Nova Iorque (a primeira aconteceu em Paris promovida pelo Governo francês por iniciativa do Presidente Emmanuel Macron em Dezembro de 2017). A edição deste ano reuniu Chefes de Estado e representantes de vários setores políticos, acadêmicos, científicos, empresariais, e ambientalistas para impulsionar o Acordo de Paris.

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Um objetivo de cortes de emissões de Gases de Efeito Estufa com ambição o suficiente para que a Terra se aqueça no máximo 1,5°C é um esforço que vale a pena, quando comparado com um limite de 2,0°C. Essa é a conclusão do novo Relatório Especial do Painel Intergovernamental sobre Mudançsa Climáticas (IPCC). Para que isso seja possível, porém, uma ação drástica de mitigação precisa ser tomada “muito antes de 2030”, afirmam os cientistas.

O novo documento do painel do clima da ONU foi projetado especifica-mente para tratar dessa questão, já que a linha de “perigo climático” considerada dentro do âmbito do Acordo de Paris para combate à mudança climática é de 2,0°C acima dos níveis medidos antes da Revolução Industrial. Três anos atrás, porém, a ciência já dava muitos indícios de que esse limite talvez fosse otimista demais, e o Relatório que o IPCC divulga agora compara os desafios e benefícios de mudar a meta para 1,5°C.

Não chegou a ser uma surpresa para os cientistas que tanto os desafios quanto os benefícios são muito maiores. Agora, porém, existe uma medida bem quantificada sobre essa diferença. Essencialmente, impedir um aquecimento maior que 1,5°C requer que um corte global de emissões de 45% em 2030, em relação às emissões medidas em 2010 (linha de base do Acordo de Paris) e chegue a zero em 2050. O objetivo menos ambicioso, de 2,0°C, requer um corte de 20% em 2030, e emissões zero em 2075.

Considerando-se que temos 12 anos até 2030, não se trata de um desafio trivial, sobretudo levando em conta que o Planeta já é hoje 1,0°C mais quente do que na era Pré-Industrial. Mas os benefícios de frear essa subida em 1,5°C compensariam o esforço. Em outras palavras: meio grau faz diferença, sim, e muita.

Para atingir um grande nível de robustez em suas con-clusões, o IPCC reuniu 91 cientistas na produção do novo relatório, que cita mais de 6.000 estudos, vários deles enco-mendados especialmente para o painel climático da Orga-nização das Nações Unidas. O grupo bateu o martelo sobre a versão final do Relatório na sexta-feira 5/10, em Incheon, na Coréia do Sul.

A média de aumento do nível do mar, por exemplo, tenderia a ficar 10 cm menor no cenário de 1,5°C (numa projeção até 2100). Parece pouco, mas como se trata de uma média, faria uma diferença drástica para áreas costeiras de baixa elevação, as mais ameaçadas pela mudança climática.

Frear aquecimento em 1,5°C demanda corte de 45% nos GEE

Claudio Angelo | Jornalista do Observatório do Clima - OC

Áreas terrestres vulneráveis a crises hídricas também poderiam se reduzir em 50% com a mudança de objetivo apreciada agora pelo IPCC. A alteração também reduziria os riscos do aque-cimento global para a biodiversidade marinha, os recursos pesqueiros, os ecossistemas e os serviços prestados pela natureza aos humanos.

Os benefícios socioeconômicos mais diretos também seriam grandes. Puxar o objetivo de 2,0°C para 1,5°C também teria reduziria em níveis apreciáveis os riscos climáticos para a saúde, produ-ção de alimentos, modos de sustento, recursos hídricos e segurança humana. Um ponto crucial é que essa mudança também significaria um maior impulso

ao crescimento econômico global, compensando investimentos feitos em mitigação.

Os cenários mais viáveis traçados pelos cientistas do IPCC para que isso seja possível, porém, requerem ação praticamente imediata. Segundo o Relatório, quanto mais cedo os cortes de emissão começarem, menos o Planeta vai depender de ações maciças de remoção de carbono, como plantio de vastas áreas de floresta. As trajetórias simuladas com menor pressa para mitigação de emissões requerem que, no futuro, o Planeta atinja “emissões líquidas negativas”, com iniciativas de remoção superando em volume a emissão de GEE.

A necessidade de remover e estocar carbono coloca a questão do desmatamento – principal fonte de emissões no Brasil – como um elemento crítico para atingir esse objetivo. Cada hectare de floresta fará diferença quando o Planeta tiver que zerar suas emissões líquidas, e é muito mais barato manter uma área florestada do que plantar outra do mesmo tamanho. Quanto maior a demora em se tomar ações, porém, menos realista parecem os cenários traçados pelo IPCC. Uma lentidão maior para chegar a 50% no corte de emissões iria implicar na adoção extensa de estratégias de eficácia ainda desconhecida em escala operacional, como o que os cientistas chamam de BECCS – bioenergia com captura e armazena-mento de carbono.

Considerando-se que a trajetória atual de emissões no Planeta aponta para um aquecimento de 3,4°C, porém, sabe-se que nem a meta de 2,0°C é algo dado por certo que o Planeta vá atingir, como almeja o Acordo de Paris. O cenário de 1,5°C delineado agora pelo IPCC torna mais palpável a discussão sobre aumento da ambição entre os países signatários, do Acordo. As ações tomadas diante dos fatos dependem agora de o que vai ocorrer no plano político.

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A Secretaria-Executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, Patricia Espinosa, exigiu que os países aumentem seu ritmo de trabalho na abertura da nova rodada de negociações sobre o corte das emissões globais de carbono, realizada em Bangkok, na Tailândia.

“A assinatura do Acordo de Paris foi um enorme sucesso, mas conseguir assiná-lo foi apenas o começo de uma nova fase muito importante que nos coloca diante de grandes desafios”, declarou Espinosa aos delegados de quase 200 países envolvi-dos nas negociações. “Agora devemos completar o trabalho e devemos fazê-lo rapidamente. Vamos trabalhar com um senso de urgência que a situação atual exige”.

O principal objetivo das negociações desta semana é desenvolver opções para um “livro de regras” que regerá como o Acordo de Paris das Nações Unidas funcionará na prática. Isso inclui definir quais promessas nacionais de redução de carbono devem ser incluídas, com que frequência os países devem revisar e aumentar sua ambição climática e quais métricas serão usadas.

Michal Kurtyka, que será o Presidente da Cúpula do Clima da ONU no final deste ano em Katowice, na Polônia, pediu aos delegados que concordem com a base de um acordo que possa ser firmado ainda este ano. “Aqui em Bangkok, chegou a hora de provarmos que podemos acompanhar o ritmo da sociedade. Estamos realizando esta sessão porque não estamos nos movendo tão rapidamente quanto poderíamos. Eu estou aqui hoje, em Bangkok, para pedir que vocês deem um passo importante antes da COP-24 e que levem clareza e foco para o texto que vocês negociarão em Katowice. Um texto claro e simplificado é o meu desejo para esta sessão”. As negociações acontecem num ano marcado por eventos climáticos extremos, como ondas de calor intensas no Hemisfério Norte, seca na África e calor recorde nos oceanos do Planeta.

Surasak Kanchanarat, Ministro de Recursos Naturais e Meio Ambiente da Tailândia, disse que os países em desen-volvimento e vulneráveis ao clima estão contando com o Acordo de Paris para proteger seus cidadãos.

ONU quer urgência na ação climática em Bangkok

Rita Silva | Jornalista

“Faltando menos de quatro meses, todos vocês negociadores têm uma enorme missão para entender os detalhes mais com-plicados deste Acordo histórico”, disse ele. “Espero que nesta sessão em Bangkok vocês possam fazer progressos substanciais em direção a um texto de negociação equilibrado, a fim de preparar o caminho para o sucesso da COP-24”.

Gebru Jember Endalew, Presidente do Grupo dos Países Menos Desenvolvidos (LDC), disse num comunicado: “Ao negociar esses resultados, os países não devem perder de vista o quadro geral. Nos últimos meses, houve mudanças nos padrões de chuvas na África e ondas de calor em grande parte do Hemisfério Norte. A ciência nos diz que estes são os impactos da mudança climática e eles só continuarão se intensificando se ações imediatas não forem adotadas”.

Os investidores globais estão observando de perto e formulando suas expectativas para a rodada de negociações. Dr. Steve Waygood, Diretor de Investimentos Responsáveis da Aviva Investors, disse: “Depois de um verão de eventos climáticos extremos em todo o mundo, o risco que a mudança climática incontrolada representa nunca foi tão claro. É hora de os delegados dos países nas negociações climáticas da Organização das Nações Unidas chegarem a um acordo sobre regras ambiciosas e robustas para a implementação do Acordo de Paris. Como instituição seguradora e investidor global, confiamos num regime transparente e consistente para entregar a transição global essencial para uma economia de baixo carbono”.

Stephanie Pfeifer, CEO do Institutional Investors Group on Climate Change (organização que representa 160 investi-dores europeus com mais de 21 trilhões de euros em ativos) destacou: “O Acordo de Paris é fundamental para impulsionar investimentos de trilhões de dólares na economia global de baixo carbono. Um conjunto de regras de implementação ambicioso e transparente, responsabilizando os países pela prestação e ampliação de seus compromissos em relação às mudanças climáticas, trará segurança às políticas e fortalecerá a confiança dos investidores”.

IHG

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O Relatório Especial do IPCC sobre o Aquecimento Global de 1,5°C, lançado esta semana, captura a compreensão científica recente e cada vez mais avançada do aquecimento global. Isso não apenas confirma que a Terra está se tornando mais quente; mas também que a terra está aquecendo mais rapidamente do que os oceanos, e que o aquecimento é expe-rimentado de forma desigual entre as regiões e as estações do ano. De forma alarmante, confirma que, se as emissões continuarem no ritmo atual, o aquecimento induzido pelo homem ultrapassará os 1,5°C cerca de 2040.

Ao olhar para a América Latina, o IPCC já relatou mudan-ças no clima da região, incluindo mudanças significativas na temperatura e na precipitação: o aquecimento de 0,7-1°C foi detectado em toda a região desde a década de 1970 e a preci-pitação anual se afastou de sua norma histórica: o aumento das chuvas no Sudeste da América do Sul contrasta com a diminuição das tendências de chuvas na América Central e no Centro-Sul do Chile. Precipitação extrema mais frequente no Sudeste da América do Sul levou a deslizamentos de terra e inundações repentinas.

O Relatório do IPCC - 1.5°C e a América Latina

Um exemplo disso é a tríplice fronteira onde o Rio Paraná é compartilhado entre Paraguai, Brasil e Argentina: chuvas intensas e inundações causaram perdas que atingiram US$ 40 milhões durante o período 2013-2017 nas três cidades de Puerto Iguazú, Ciudad del Este e Foz do Iguaçu. Nas cidades do Delta do Amazonas, o aumento das chuvas resulta em surtos repentinos de água que afetam a saúde humana por meio de infecções virais, casos de dengue e infecções transmitidas por ratos.

Somando-se a esses problemas, a urbanização também deve aumentar nas próximas décadas na América Latina, trazendo pressão extra para as cidades de porte médio. A migração das regiões Andes-Amazônia1 afetará a dinâmica de uso dos recursos locais; a maior parte desse crescimento ocorrerá em cidades pequenas e médias, muitas das quais localizadas na Amazônia2.

María Jose Pacha | Coordenadora da Climate and Development Knowledge Network (CDKN) para América Latina

1 - No Departamento de San Martín, 65 por cento da população é urbana e a migração dos Andes é uma tendência contínua.2 - A maior parte do crescimento da população urbana projetada até 2050 na América Latina ocorrerá em cidades pequenas e médias.

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Essas pressões de composição em várias regiões da América Latina aumentam a credibilidade das descobertas científicas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e a necessidade urgente de mitigar as mudanças cli-máticas assim como de se adaptar efetivamente aos impactos das mudanças climáticas já agora. Nesse sentido, a questão da situação atual e das tendências futuras é como poderemos limitar o aquecimento a 1,5 grau centígrado e criar um futuro mais resiliente.

Políticas abrangentes e bem integradas são necessárias na região

Concordo plenamente com a conclusão do IPCC de que as transições terrestres ocorrerão de grande magnitude nos próximos anos, o que “apresenta desafios profundos para o manejo sustentável das diversas demandas de assentamentos humanos, alimentos, alimentação animal, fibra, bioenergia, armazenamento de carbono, biodiversidade e outros serviços ecossistêmicos.

A implementação de opções de mitigação baseadas na terra exigiria a superação das barreiras socioeconômicas, institu-cionais, tecnológicas, financeiras e ambientais que diferem entre as regiões”. Políticas integrativas são necessárias para lidar com essas várias demandas de uso da terra.

Considero que o conceito de um nexo entre a Água, a Energia e a Alimentação (WEF - Water, Energy and Food) é um bom exemplo dessa abordagem integrada. É um bom caminho para prosseguir em nosso mundo hiperconectado, no qual a água, a energia e a comida são cada vez mais inter-dependentes.

Na América Latina, a água está no coração desse nexo e sustenta a geração de energia hidrelétrica, a produção agrícola e a indústria. Como a região está sob crescente pressão da mudança climática e da demanda nacional e internacional de populações em crescimento, a compreensão e a contabili-dade dessas interdependências é vital para alcançar objetivos econômicos, ambientais e sociais de longo prazo. Aperfeiço-ando nossa compreensão de como os fatores socioecológicos subjacentes afetam Água, energia e segurança alimentar serão essenciais para fortalecer a resiliência climática.

A CDKN (Climate and Development Knowledge Network) trabalhou na compreensão de como o nexo WEF pode ser aplicado na América Latina. No nexo água-energia-alimentos na América Latina e no Caribe, os principais desa-fios e oportunidades para alcançar água, energia e segurança alimentar na região foram identificados na Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, México e Peru. Trabalhamos com nosso parceiro, o Global Canopy Program, na identificação de como uma abordagem WEF pode ser aplicada à região da Amazônia e desenvolvemos uma Agenda de Segurança da Amazônia em conjunto com o Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT).

Uma limitação encontrada nessa abordagem é a necessi-dade de uma base de evidências (mais) sólida sobre o papel da Amazônia e suas sub-bacias na sustentação da segurança do WEF, que pode informar avaliações específicas da paisa-gem para permitir que diferentes atores formulem políticas adequadas. Analisar a distribuição de riscos, custos e opor-tunidades entre as várias partes interessadas é fundamental no desenvolvimento de incentivos para incentivar a ação alinhada em torno dos objetivos do WEF.

Exemplo importante de como buscar a segurança alimentar da água-energia em um clima em mudança

Com a Climate Resilient Cities Initiative, respondemos a essas perguntas e nos concentramos na bacia do Rio Cumbaza, no Peru, e em sua principal cidade, Tarapoto, para entender como a abordagem do WEF pode funcionar no terreno. No projeto Cumbaza Resiliente ao Clima foram quantificados os sistemas atuais de água, energia e recursos alimentares, levando em conta indicadores de demanda, oferta e acesso à segurança do WEF. Estes indicadores foram desenvolvidos com uma série de partes interessadas da bacia do Rio Cumbaza. As interações do WEF foram visualizadas e podem ser usadas para projetar e implementar ações e medidas que possam melhorar a governança dos recursos naturais e promover trajetórias para mudanças no desenvolvimento resiliente ao clima. Existem resultados interessantes sobre como o conceito do WEF pode fortalecer a resiliência climática na Amazônia urbana, como a resiliência da água pode ser alcançada nas paisagens urbanas da Amazônia e um manual para realizar esse tipo de análise em outras bacias hidrográficas similares.

Este estudo de caso gerou importantes percepções e cons-cientização sobre a interdependência entre a água, a energia e a segurança alimentar em ambientes urbanos e rurais, e elementos locais-regionais de risco e resiliência. Os resulta-dos também destacam o papel dos serviços ecossistêmicos florestais na sustentação dos sistemas água-energia-alimentos para populações urbanas e rurais, em particular em torno da segurança hídrica.

A abordagem do nexo WEF pode ajudar a impulsionar a mitigação da mudança climática e a ambição de manter o aquecimento médio bem abaixo de 2 graus. As ações sugeridas no projeto incluíram a expansão de projetos de infraestrutura verde para manter importantes serviços ecossistêmicos, como a restauração pelo reflorestamento de 1.500 ha nas sub-bacias do Rio Ahuashiyacu e Shilcayo, e um total de 3.000 ha para a bacia hidrográfica mais ampla de Cumbaza através de sistemas agroflorestais. até 2050. Essas ações criarão uma maior resiliência e contribuirão para a mitigação, ajudando a armazenar e sequestrar carbono.

Exemplos como a iniciativa da Bacia de Cumbaza, com sua análise de dados, mapeamento de partes interessadas e intensas fases de consulta e negociação, demonstram como a perseverança e a engenhosidade humana podem enfrentar alguns dos complexos desafios da mudança climática e do desenvolvimento. É importante ressaltar que a iniciativa teve financiamento do Canadá e do Reino Unido para tornar alguns dos trabalhos possíveis. Mas também explorou pro-fundamente o capital humano da região para extrair soluções sustentáveis.

A iniciativa também colocou uma forte ênfase no apren-der fazendo, e no compartilhamento de conhecimento entre os parceiros, para permitir que os participantes aprendam rapidamente uns com os outros. Documentar e distribuir os resultados poderia catalisar a ação em outras partes da região amazônica e além dela. Esses fatores de sucesso de um projeto em andamento no Peru sugerem que o grande desafio do IPCC para limitar o aquecimento global e viver de forma mais sustentável com os impactos das mudanças climáticas é difícil, mas não impossível.

Um boletim especial do CRC (www.crclatam.net) dedicado ao projeto com recursos está disponível on-line.

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Compreendendo de 10% a 15% da população global, as pessoas com deficiências são afetadas exclusivamente pela mudança climática. Esta população inclui uma ampla gama de problemas de mobilidade, sensoriais (visuais, auditivos), de desenvolvimento, intelectuais e emocionais, bem como condições crônicas de saúde.

Muitas pessoas têm deficiências múltiplas e podem sofrer fatores sociais ou médicos de maneira diferente, dependendo de sua raça, sexo, cultura, idioma (incluindo a língua de sinais para surdos), nacionalidade, geografia e outros fatores. Cada uma dessas subpopulações é afetada de forma complexa com relação à saúde e às necessidades de assistência para a sobrevivência. Com maior vulnerabilidade durante tempes-tades, inundações e calor extremo; susceptibilidade a doença invasiva; e os complexos desafios relacionados à deficiência da realocação e migração forçada (ou seja, encontrar novas redes de moradia ou de apoio); As perturbações climáticas são mais difíceis para essas populações em praticamente todos os níveis, em comparação com aquelas sem deficiências.

As evidências claras de desastres naturais passados e atuais e situações de refugiados mostram que as pessoas com deficiência têm uma taxa de sobrevivência menor do que aquelas sem deficiências, e podem até ser negligenciadas ou deixadas para morrer. O jornalismo fotográfico que mostra o impacto do furacão Katrina no sudeste dos EUA em 2005 documentou isso com trágicas fotos de pessoas mortas em cadeiras de rodas, enquanto multidões de outras pessoas deslocadas passavam. Histórias de pessoas presas em casas de repouso inundadas revelaram uma falta de planejamento para as pessoas que os líderes de preparação para desastres não conseguiram considerar. Isso foi especialmente trazido à mentalidade da comunidade de portadores de deficiência em 2015, através do pequeno documentário Right of Rescued, da Rooted in Rights .

O impacto das mudanças climáticas é mais complexo e duradouro do que os desastres naturais – e afeta as pessoas com deficiência de maneiras dinâmicas. Exemplos de fatores de saúde e sobrevivência incluem calor extremo que prejudica as pessoas com lesões na medula espinhal que são incapazes de transpirar e precisarão de centros de resfriamento.

Tecnologias de comunicação eficazes são necessárias para alertar as pessoas com deficiência auditiva sobre o planejamento de evacuação. Rampas em abrigos, banheiros acessíveis e transporte viável de evacuação são essenciais para pessoas com mobilidade reduzida, incluindo aquelas que usam respiradores e, na verdade, para qualquer pessoa que não consiga utilizar com segurança ônibus padrão.

Outro impacto significativo sobre as pessoas com defici-ência como consequência da mudança climática é a migração forçada, que ocorre agora em todo o mundo.

Cada uma dessas muitas consequências deve ser abordada em relação ao impacto específico da mudança climática em indivíduos e categorias específicos de pessoas com deficiência. Naturalmente, todos são vulneráveis em qualquer tipo de desastre ou degradação ambiental.

Sabemos que o impacto das mudanças climáticas está acontecendo agora em todo o mundo. A adaptação, o pla-nejamento antecipado e a construção de infraestrutura em antecipação ao impacto são particularmente cruciais para pessoas com deficiências.

A inclusão total da comunidade das pessoas com defici-ência emergiu como um poderoso movimento mundial de direitos civis e humanos, promulgado nas últimas seis a sete décadas através de educação pública e leis, como a Lei dos Americanos Portadores de Deficiência (ADA) e os Estados Unidos. Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CRPD).

A criação de inclusão de pessoas com deficiência, por meio de medidas específicas de acesso e acomodações, remove essas barreiras à participação na comunidade dominante. Este movimento é liderado por pessoas com deficiência e apoiado pelos nossos aliados: famílias, prestadores de serviços, advo-gados e decisores políticos.

Nosso slogan, “Nada sobre nós sem nós!” afirma nossa insistência na plena participação em todo o planejamento e atividades que nos afetam.

A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência encorajou e encorajou muito as pessoas com deficiência em todo o mundo a se verem como merecedoras da proteção dos direitos humanos. A inclusão total na resiliência climática será uma tarefa complexa devido às circunstâncias pessoais, sociais, econômicas e políticas dessa comunidade. As respostas exigirão iniciativas de grande escala e fortes colaborações entre as partes interessadas em todo o espectro de justiça climática e deficiência.

É uma sorte que as pessoas que lidam atualmente com as mudanças climáticas e a deficiência, respectivamente, estejam bem engajadas com uma estrutura de justiça social. Ambos os grupos devem entender o escopo e as complexidades entre a mudança climática e a deficiência. A chave é, portanto, educar e ativar essas partes interessadas para desenvolver estratégias para salvaguardar as populações amplas e intersetoriais de pessoas com deficiência à medida que a mudança climática se desdobra.

O Instituto Mundial sobre Deficiência conectou-se com as Nações Unidas, a Organização Internacional para a Migração e grupos de ação local, estadual e nacional sobre mudanças climáticas, para alistar todos como aliados significativos. Participamos de ações sobre mudanças climáticas em geral e pretendemos explorar um amplo impacto.

Marsha Saxton | Diretora de pesquisa e treinamento no World Institute on Disability

As mudanças climáticas e os danos à saúde

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| mudanças climáticas |

Um importante relatório divulgado pela Comissão Global sobre Economia e Clima revela que estamos subestimando significativamente os benefícios de um crescimento mais limpo e inteligente em termos de clima. Uma ação climática arrojada poderia gerar pelo menos US$ 26 trilhões em bene-fícios econômicos até 2030, em comparação com a economia convencional. O relatório conclui que, ao longo da última década, houve um enorme progresso tecnológico e de mercado conduzindo a mudança para uma nova economia climática. Há benefícios reais em termos de novos empregos, redução de gastos, competitividade e oportunidades de mercado, além de melhorar o bem-estar das pessoas. O momentum está sendo construído por trás dessa mudança por uma ampla gama de cidades, governos, empresas, investidores e outros ao redor do mundo, mas ainda não rápido o suficiente.

“Estamos num momento único, do tipo ‘use-o ou perca-o’”, sintetizou Ngozi Okonjo-Iweala, ex-Ministra da Economia da Nigéria e Co-Presidente da Comissão Global. “Os formuladores de políticas devem tirar o pé do freio e enviar um sinal claro de que a nova história de crescimento está aqui e que vem com oportunidades econômicas e de mercado estimulantes. Se agirmos de forma decisiva agora, podemos ganhar US$ 26 trilhões e um Planeta mais sustentável”.

O “Unlocking the Inclusive Growth Story of the 21st Cen-tury” foi apresentado ao Secretário-Geral da ONU, António Guterres, num lançamento global na ONU, uma semana antes do Global Climate Action Summit, realizado no mês passado em São Francisco. “Estamos vendo um momento notável de estados, regiões, cidades, empresas, investidores e cidadãos de todo o mundo, transformando compromissos e promessas do clima em ações. Aqueles que agem corajosamente estão vendo benefícios tangíveis no processo”, disse Paul Polman, Co-Presidente da Comissão Global e CEO da Unilever.

Nova economia climática prevê US$ 26 trilhões até 2030

Ferzina Banaji | Jornalista do New Climate Economy

“Mas, se quisermos aproveitar todos os benefícios dessa nova oportunidade de crescimento de baixo carbono e evitar uma mudança climática descontrolada, líderes econômicos e financeiros do governo e do setor privado precisam fazer ainda mais e com maior rapidez”, completou o Co-Presidente da Comissão Global.

O Relatório destaca as oportunidades em cinco sistemas econômicos principais – energia, cidades, alimentos, uso da terra, água e indústria. Demonstra que uma ação ambiciosa nesses sistemas poderia gerar ganhos econômicos líquidos em comparação com os negócios habituais e, além disso:

• gerar mais de 65 milhões de novos empregos de baixa emissão de carbono em 2030, o equivalente a todas as forças de trabalho atuais do Reino Unido e do Egito juntas.

• evitar mais de 700.000 mortes prematuras por poluição do ar em 2030.

• gerar, apenas reformando os subsídios e precificando o carbono, cerca de 2,8 trilhões de dólares em receitas governamentais por ano em 2030 – equivalente ao Produto Interno Bruto (PIB) total da Índia hoje – fundos que podem ser usados para investir em outras prioridades públicas ou reduzir impostos distorcidos.

“Agora podemos ver que essa nova história de crescimento incorpora dinâmicas muito poderosas como: inovação, aprendendo pela prática e economias de escala. Fora isso, nos oferece a combinação muito atraente de cidades onde podemos nos mover, respirar e ser produtivos; infraestrutura sustentável que não apenas é limpa e eficiente, mas também suporta extremos climáticos cada vez mais frequentes e severos; e ecossistemas que são mais produtivos, robustos e resilientes”, disse Lord Nicholas Stern, professor de Economia e Governo na London School of Economics e Co-Presidente da Comissão Global.

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| ecoeconomia |

“Os modelos econômicos atuais não conseguem captar nem a poderosa dinâmica, nem as qualidades muito atraen-tes das novas tecnologias e estruturas. Assim, sabemos que estamos subestimando os benefícios dessa nova história de crescimento. Em razão disso, fica cada vez mais claro que os riscos dos danos causados pelas mudanças climáticas são imensos e os pontos de inflexão e irreversibilidades estão cada vez mais próximos”.

A Comissão Global pede que governos, empresas e líderes financeiros priorizem com urgência ações em quatro frentes nos próximos 2 a 3 anos, a saber:

• aumentar os esforços de precificação de carbono e passar a divulgar obrigatoriamente os riscos financeiros relacionados ao clima;

• acelerar o investimento em infraestrutura sustentável;• aproveitar o poder do setor privado e desencadear a

inovação; • construir uma abordagem centrada nas pessoas que

compartilhe os ganhos de forma equitativa e garanta que a transição seja justa.

“O objetivo desse Relatório é demonstrar como acelerar a mudança para esse novo caminho de crescimento”, disse Helen Mountford, Diretora de Programas da Nova Economia Climática e principal autora do Relatório. “Apresenta os bene-fícios de fazê-lo, os desafios futuros e os claros aceleradores ou ações, que podem ser acionados para colher plenamente as recompensas de um crescimento mais forte, mais limpo e mais equitativo”.

O ex-Presidente do México, Felipe Calderón, Presidente Honorário da Comissão, disse: “Isso é mais do que apenas um relatório. É um manifesto de como podemos transformar melhor crescimento e melhor clima em realidade. É hora de legislar, inovar, governar e investir de forma decisiva em um mundo mais justo, mais seguro e mais sustentável”.

Declarações de comissários globais

Sharan Burrow, Secretária-Geral da Confederação Sin-dical Internacional: “A ação climática decisiva pode criar 65 milhões de novos empregos até 2030. Essa transição de baixo carbono deve ser gerenciada para garantir que, para os trabalhadores afetados e suas comunidades, seja uma transição justa. Igualmente, as oportunidades da urbanização, junta-mente com um desenvolvimento mais limpo da indústria, infraestrutura, transporte e serviços, devem proporcionar bons empregos e prosperidade compartilhada. Será preciso diálogo, confiança e transparência”.

Carlos Lopes, professor da Universidade da Cidade do Cabo: “A África já está na vanguarda de muitas das inova-ções que impulsionam uma ação climática ousada. Apenas nos últimos anos, vimos uma revolução solar acontecer no continente, junto com inovações em seguros de transporte público e riscos climáticos. No futuro, as políticas certas e os incentivos de apoio podem garantir que, à medida que nos desenvolvemos, capturemos totalmente a economia climática do futuro: de baixo carbono e resilientes ao clima, que irão gerar empregos e ajudar a tirar as pessoas da pobreza”.

Kristalina Georgieva, CEO do Banco Mundial: “Este Relatório mostra não apenas quão significativa é a oportu-nidade econômica de uma ação climática ousada, mas tam-bém que pode gerar grandes desenvolvimentos e resultados saudáveis”.

“O World Bank Group fez um esforço consciente para incorporar as considerações de clima em nossas operações nos últimos anos. Vemos isso não apenas como uma boa política climática ou boa economia, mas como um elemento fundamental para garantir um futuro seguro e próspero para todos”, finalizou Kristalina Georgieva.

Sobre a Comissão Global sobre Economia e Clima:

A Comissão Global sobre Economia e Clima, e seu princi-pal projeto, a Nova Economia Climática, foram criados para ajudar governos, empresas e a sociedade a tomarem decisões mais bem informadas sobre como alcançar a prosperidade econômica e o desenvolvimento, além de abordar a mudança climática. Foi encomendada em 2013 pelos governos da Colômbia, Etiópia, Indonésia, Noruega, Coreia do Sul, Suécia e Reino Unido como uma iniciativa independente.

A Comissão Global sobre Economia e Clima é formada por 28 ex-Chefes de Governo e Ministros de Economia, além de líderes nas áreas de economia, negócios e finanças. Atu-almente é presidido por Ngozi Okonjo-Iweala, Paul Polman e Lord Nicholas Stern.

“Implementing Better Growth at Speed and Scale” é o quarto grande relatório da Comissão Global. Foi preparado por equipes das seguintes instituições: Systemiq, Comissão de Transição de Energia, Coalizão para Transições Urba-nas, Coalizão do Uso de Alimentos e da Terra, Instituto de Desenvolvimento Internacional, Instituição Brookings e o World Resources Institute.

O “Unlocking the Inclusive Growth Story of the 21st Century: Accelerating Climate Action in Urgent Times”, incluindo infográficos e outros materiais, está disponível em www.newclimateeconomy.report/2018

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O evento que marcou a primeira década do programa brasileiro para relatos e controle das emissões nacionais de carbono (CO2), ocorrido no dia 15 de Agosto passado, no Auditório da Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP), contou com um público de quase 100 pessoas, incluindo voluntários do PBGHGP e o setor empresarial, além de integrantes da Academia do FGVces, o Centro de Estudos em Susten-tabilidade da FGV. Primando pela organização, clareza e fundamentação de ideias, características próprias de uma das Escolas de Administração e Economia de maior excelência na América Latina, os coordenadores do programa e das empresas participantes relataram números tão expressivos, quanto promissores.

É preciso amadurecer para ser verde

A luz no fim do túnel para a tão necessária implantação das regulações para inventários e gestão das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) vem, de fato, do setor empresarial. Segundo o Coordenador Geral do GVces, Mario Monzoni, este setor já percebeu que, independente de uma possível regu-lação ou não, é importante que se mantenham os inventários, pois deles virá a mensagem fundamental da relevância desta ação, do ponto de vista ambiental e de gestão empresarial, fazendo com que as empresas se mantenham competitivas no mercado mundial. “Este enforcement virá por meio do comércio internacional, afirma Monzoni.”

Os 10 anos do Programa Brasileiro GHG Protocol

Elisa Homem de Mello | Jornalista

Com o objetivo maior de instituir uma cultura e treinar voluntários para realização de inventário de emissões no Brasil, o GHG Protocol traz para o big data mundial a nova conta-bilidade do Século 21 e se estabelece como padrão nacional para as inúmeras quantidades e possibilidades de dados do meio ambiente. A busca por baixas ou nulas emissões cresceu vertiginosamente e, no novo cenário, passou a ser uma demanda do cliente, que cada vez mais mostra apreço por empresas que apresentam menos intensidade em emissões de CO2.

Não menos importante é a correlação existente entre energia e os inventários de emissões de gases, compreendidos como indutores na demanda e produção de energia renovável no Brasil. “Atualmente, as empresas participantes do sistema representam mais de 142 milhões de tons CO2e, ou seja, cerca de 15% das emissões nacionais, sendo 40% provenientes do agronegócio, 24% da indústria, 20% do setor elétrico, 4% do setor energético e 12% do setor financeiro, segundo Mariana Nicolletti, Coordenadora de Projetos do GVces. Afirma ainda que esta diversidade contribui para boa parte dos aprendizados do Programa Brasileiro GHG Protocol.

Para Denise Hills, Superintendente de Sustentabilidade e Negócios Inclusivos do Itaú Unibanco, uma das empresas participantes, inventariar as emissões produzidas é uma visão que vai além. Hoje, preço interno de CO2 não é mais uma discussão de “se” e sim de “quando”, já que quase toda a indús-tria financeira toma como referência os números deste setor, provenientes do comércio existente no mercado mundial.

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George Magalhães, Coordenador do PBGHG PROTOCOL

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Para Hills, a compensação de emissões deve ser entendida como normal no processo estratégico empresarial, já que se trata de um exercício de traduzir e incorporá-las não só em inventários, mas também na gestão.

“A indústria financeira, que tem como parte de sua atividade atribuir preço e risco ao custo de capital, precisa entender como é que esta precificação, apesar de não estar incorporada do ponto de vista econômico, impacta na mesma proporção em que se torna um ativo de discussão, de variável e de entendimento da capacidade que uma empresa tem ou não de ser eficiente, no longo prazo”, afirma.

Na Braskem através da elaboração de inventários de GEE e do conhecimento gerado a partir deste processo, houve diminuição de 21% de emissões totais, entre os períodos de 2008 e 2017, ano em que a intensidade carbônica de emissões diretas registrou 0,519 toneladas CO2e/t. Para Mario Rino, Gerente de Desenvolvimento Sustentável, o tema das mudan-ças climáticas impacta na área de pesquisas da Braskem, que acaba de lançar a primeira resina verde do mundo, feita a partir de etanol de cana de açúcar. O já mundialmente conhecido polietileno verde é o primeiro biopolímero do mundo a ser produzido em escala industrial, o que deverá conferir à indús-tria de calçados mais rapidez e sustentabilidade.

O impacto advindo da cultura de inventários, seja qual for o setor, se traduz em crédito, investimento e oportunidade para um trabalho em conjunto com atores que promovam uma cultura mais resiliente. Pois é fato que estamos falando de um instrumento econômico, que tem como objetivo internalizar as externalidades, ou seja, mudar o sistema de preços da economia e do comércio. Estamos falando, sim, de quem vai pagar a conta pelas emissões que precisamos reduzir, para que outros não tenham comprometido seu futuro por conta dos custos e das catástrofes gerados com o aumento da temperatura média global.

Nestes últimos 10 anos, o programa cresceu junto com uma série de funcionalidades e ferramentas que foram sendo incorporadas ao longo do processo, dentre as de maior des-taque está a ferramenta de cálculo (à disposição online para as empresas), que mede a emissão de CO2, além de dar as diretrizes para se criar o report que passará pelo processo de verificação, realizado, inclusive, por instituições treinadas e capacitadas pelo programa, como é o caso do INMETRO.

Atualmente, mais de 140 empresas participam do PBGHGP e mais de 2.100 inventários estão em registros públicos, com informações completas e de fácil acesso para toda sociedade civil, por um custo baixo.

Outro legado do PBGHGP é a ferramenta intersetorial que, em linguagem para leigos, transforma números de GEE em dados passíveis de gerenciamento no dia a dia, seja consumo de energia, seja litros de gasolina ou qualquer outra variável.

Em 2018, foram mais de 50 mil acessos ao site do PBGHGP, o que, para George Magalhães, Coordenador do Programa GHG Protocol, além da relevância em termos de emissão, demonstra um grupo cuja cultura de inventários tende a se estender para o resto da cadeia de valor das empresas em que atuam. “Pensar as ações de mitigação de maneira transversal na cadeia de valor das empresas é uma chance de desenvolver uma agenda positiva e inclusiva”, afirma Magalhães. Além disso, mais de 12 notas técnicas já foram emitidas, mais de 40 grupos de oficinas foram capacitados e cerca de 60 treinamentos com mais de 1.600 profissionais formados no método GHG Protocol foram realizados.

O grosso das emissões de CO2, desde o surgimento do programa, é proveniente de combustão estacionária, proces-sos industriais e combustão móvel. Setorialmente, das 176 milhões toneladas de CO2e – número maior que as emissões totais dos 144 países signatários da COP-21 – , a indústria de transformação foi o setor que mais emitiu, com 80 milhões toneladas CO2e, seguido pela indústria extrativista. Depois de aprovar a redução de emissões de GEE para os próximos 10 anos, o Governo assinou em agosto o termo de compromisso de tornar o Brasil carbono neutro, até 2060.

“É preciso criação de instrumentos econômicos para buscar cumprir tal compromisso. O objetivo de se coletar dados de emissões é o de desenhar políticas públicas sob medida para os setores que emitem, para enfim, gerenciar as emissões e fazer com que o potencial ambiental do Brasil se tornem, de alguma forma, competitividade global. É preciso ambição no olhar para se realizar as transformações tecnológicas, econômicas e sociais que deverão ser implantadas para se atingir o desafio de não ultrapassar os 1,5°C da temperatura global”, enfatiza Guarani Osório, Coordenador do Programa de Política Econômica Ambiental do FGVces,

Na visão do Consultor Especialista junto ao Ministério da Fazenda e Pesquisador do FGVces, Guido Penido, um sistema de relatos de emissões robusto é pré requisito para que o Governo Federal tenha base segura na avaliação de políticas públicas. Penido elenca ainda o controle de emissão de GEE, uma vez que a variável ambiental é dado de suma importância; o aprimoramento das informações da comunicação nacional do MCTIC; a avaliação socioambiental, uma vez que o Con-selho Monetário Nacional coloca como diretriz a avaliação de risco socioambiental para o bom funcionamento do Sistema Financeiro Nacional (SFN); e a precificação de CO2.

Da mesma forma, a padronização da metodologia de emis-sões e inventários de GEE garante os Princípios da Isonomia e da Transparência, os quais preveem tratamento equânime aos entes regulados. O Ministério da Fazenda está atuando de forma progressista e muito já vem sendo feito, mas para que o tema das regulações avance é fundamental que façam parte da agenda política e dos níveis mais altos de tomadas de decisão em Brasília.

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Mario Monzoni, Coordenador Geral do GVces

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Para comemorar o 50º aniversário do Clube de Roma, mais de 400 líderes do pensamento internacional e dignitários de todo o mundo se reuniram em Roma (17 e 18 de Outubro) para discutir os desafios e soluções mais urgentes que a humanidade e o Planeta enfrentam. A Cúpula teve como base o trabalho pioneiro do Clube de Roma, seu carro-chefe, o Relatório “Os Limites para o Crescimento” e apresentou sua nova Agenda para o Século 21, com o objetivo de avaliar coletivamente o estado do patrimônio global e responder aos mais urgentes pontos de inflexão atuais como a ruptura do clima, o declínio dos ecossistemas, a busca incessante do crescimento do PIB e a distribuição cada vez mais desigual da riqueza.

No livro mais recente “Come On!”, escrito por 35 membros do Clube pelo 50 aniversário da instituição; esses líderes do pensamento global estão convocando um novo Século das Luzes para a humanidade. “Come On!” pede a todos que restabeleçam um equilíbrio saudável entre os seres humanos e a natureza. A humanidade está enfrentando um colapso sistêmico em muitas frentes, incluindo ameaças aos fundamentos filosóficos da sociedade moderna na forma de democracia, respeito pelos direitos humanos, estado de direito, ciência e a carência de lideranças esclarecidas.

Os pontos de inflexão social, política, ambiental e econô-mica destacam a necessidade de um sistema de valores mais equilibrado e visão de futuro que englobe maior bem-estar e distribuição mais equitativa da riqueza dentro e entre os países.

“Os principais formuladores de políti-cas parecem incapazes de garantir o futuro do Planeta Terra. Precisamos encontrar a visão, a liderança e a criatividade para colaborar no desenvolvimento de soluções construtivas para oferecer um futuro decente às gerações presentes e futuras. Nós temos a capacidade, devemos encon-trar a vontade”, disse Anders Wijkman, co-Presidente do Clube de Roma.

A conferência de aniversário pediu aos governos nacionais que concordem com uma ação forte para redirecionar as economias nacionais na rota de um caminho sustentável, e para abordar imediatamente a emergência climática global que a humanidade enfrenta.

50 anos do Clube de Roma: a Agenda para o Século 21

Till Kellerhoff | Jornalista do Clube de Roma

“A humanidade tem as soluções tecnológicas, políticas e econômicas necessárias para lidar com o colapso dos ecossistemas e as mudanças climáticas e deve aproveitar as oportunidades que a transformação para uma sociedade mais sustentável e de baixo carbono apresenta”, afirmou Ernst von Weizsäcker, também co-Presidente do Clube de Roma.

Na Conferência do Aniversário, o Clube de Roma apresentou sua

Agenda para o Século 21

1. Iniciativa da emergência climática do Clube de Roma: um apelo à ação colaborativa.

A mudança climática é a preocupação mais urgente que a humanidade enfrenta agora. Até recentemente, era visto como uma ameaça futura. Hoje, é uma realidade, afetando a vida de milhões de pessoas. No entanto, o reconhecimento do desafio climático cria a base para um renascimento da sociedade de proporções sem precedentes.

Esta é a visão que o Clube de Roma gostaria de promover, uma visão do futuro, que garanta o bem-estar para os muitos e a harmonia entre o homem e o resto da natureza. Perceber essa visão requer uma ação rápida e a implementação coletiva de um dos planos de emergência mais abrangentes que a humanidade já contemplou. Acreditamos fundamentalmente que tal ação criará uma sociedade global muito mais saudável, mais feliz e mais inovadora.

As ameaças que enfrentamos exigem uma ação forte. Para abordar as causas profundas da mudança climática é vital reestruturar as economias nacionais num caminho sustentável. O Clube de Roma apela às empresas e aos líderes políticos para que se unam no objetivo de imple-mentar o Plano de Ação para Emergências Climáticas e garantir um caminho rumo ao bem-estar sustentável direcionado ao futuro. Os detalhes do Plano de Ação foram lançados durante a Cúpula do Aniversário e estão disponíveis no site do Clube de Roma.

2. Alcançar os Objetivos de Desen-volvimento Sustentável dentro dos limites planetários - um novo relatório para o Clube de Roma.

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| clube de roma |

Este último relatório do Clube escrito, entre outros, por Jørgen Randers, Johan Rockström, também foi lançado na Conferência de Aniversário. Aborda os desafios da implemen-tação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) dentro dos limites planetários e demonstra as inconsistências internas da Agenda 2030 da ONU dentro do nosso modelo econômico atual, afirma que as metas socioeconômicas dos ODS são inconsistentes e contradizem seus objetivos ecológicos. Sem ambos, forte compromisso político e ampla mudança transformadora, não será possível alcançar os 17 ODS, até 2030 ou 2050.

Sobre o Clube de Roma

Em 1968, uma rede de empresários, diplomatas, cientistas e economistas foi criada em Roma por iniciativa do industrial italiano Aurelio Peccei e Alexander King, então diretor de ciência da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O grupo estava unido pela sua preocupação com o futuro da humanidade e do Planeta e assumiu a responsabilidade de conscientizar políticos e tomadores de decisão em todo o mundo sobre as questões mais cruciais do futuro. Nasceu o Clube de Roma. O primeiro rela-tório sobre a situação da humanidade, “Os Limites do Crescimento” advertiu sobre o crescimento material ilimitado e o consumo desenfreado num mundo de recursos limi-tados: se a atividade humana continuasse da mesma forma que entre 1900 e 1972, a humanidade estaria prestes a ultrapassar a capacidade de carga do Planeta Terra até o final do Século 20, o que já aconteceu.

50 anos depois

As preocupações do Clube de Roma não perderam sua relevância. Há 50 anos, o Clube afirmou que era possível e necessário alterar as tendências de crescimento e estabelecer novas condições para um mundo justo e sustentável, ofere-cendo estabilidade e equilíbrio global. Desde então, foram publicados mais de 40 relatórios do Clube de Roma e foram fundadas 35 Associações Nacionais nas quais essas questões são levantadas para benefício dos tomadores de decisão e da sociedade civil.

O recente relatório do Clube “Come On! Capitalism, Short-termism, Population and the Destruction of the Planet” (Come On! Capitalismo, Curto Prazo, População e Destruição do Planeta), lançado no 50º aniversário, foi escrito em coautoria por Ernst von Weizsäcker e Anders Wijkman, com mais 35

membros do Clube. Ele propõe uma agenda positiva e realista para o futuro e argumenta que agora temos conhecimento suficiente para alcançar a necessária transformação da sustentabilidade e preservar os ambientes naturais do mundo e os estoques de recursos, assegurando ao mesmo tempo o bem-estar humano em longo prazo.

Os 100 membros do Clube de Roma, especialistas mundiais renomados em suas respectivas disciplinas, são devotados ao princípio fundador do Clube: o compro-misso para um futuro sustentável da huma-nidade a partir de uma perspectiva holística, sistêmica e de longo prazo. O argumento central do Clube é que os desafios globais que a humanidade enfrenta estão interco-nectados e não podem ser enfrentados como eventos singulares e isolados.

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| clube de roma |

Dois pesquisadores norte-americanos foram agraciados com o Prêmio Nobel de Economia por suas contribuições para integrar parâmetros como políticas de inovação e mudanças climáticas na análise do crescimento econômico de longo prazo. A Real Academia de Ciências da Suécia, que seleciona os ganhadores, destacou os esforços de William Nordhaus, 77 anos, professor na Universidade de Yale, e de Paul Romer, 62 anos, professor na Universidade de Nova York e economista-chefe do Banco Mundial entre 2016 e 2018, na construção de metodologias “que explicam como a economia de mercado interage com a natureza e o conhecimento”.

O anúncio do prêmio aconteceu um dia após a divulgação, em Incheon, na Coreia do Sul, de um relatório do IPCC que enfatiza as consequências deletérias das mudanças climáticas e convoca governos a agirem com urgência para limitar o aumento da temperatura do planeta em 1,5 grau nos próximos anos. O relatório menciona os trabalhos de Nordhaus.

O trabalho de Romer evidencia a influência de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) no crescimento sustentável. Se já era reconhecida a importância do progresso tecnológico no aumento da produção, Romer deu um passo adiante ao mostrar como políticas públicas e condições de mercado determinam o surgimento de novas tecnologias e como as forças econô-micas incentivam a disposição das empresas de gerar novas ideias e produtos inovadores. Ele criou bases do que se tornou conhecido como Teoria do Crescimento Endógeno, que explica como as ideias exigem condições específicas para prosperar em um mercado, com a combinação de políticas públicas à ação de agentes privados, e abriu um campo de investigações sobre políticas e regulamentos para estimular o surgimento de inovações e o desenvolvimento de longo prazo.

O peso da inovação e do clima na sustentabilidade

Fabrício Marques | Editor de Política Científica e Tecnológica da Pesquisa Fapesp

“Nos anos 1950, os economistas Robert Solow e Trevor Swan haviam mostrado que o crescimento da economia não dependia apenas do capital e do trabalho e que a mudança tecnológica também desempenhava um papel importante. Mas esse papel da inovação foi visto por muito tempo como uma espécie de resíduo que os economistas não eram capazes de mensurar”, diz João Carlos Ferraz, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“Romer criou modelos matemáticos mostrando que a mudança tecnológica, longe de ser um resíduo, é resultado de investimentos em P&D, e que existem espaços para ren-dimentos crescentes na economia, vinculados à criação de ideias. Uma das chaves de sua teoria é que os seres humanos têm uma capacidade infinita de reconfigurar objetos físicos, podendo criar sempre novas aplicações para seu uso, como o microprocessador que ganhou aplicações que hoje vão do uso de sensores à inteligência artificial”.

Já William Nordhaus criou, nos anos 1990, em parceria com outros pesquisadores, o Modelo Dinâmico Integrado de Economia Climática (DICE), um esforço pioneiro para estimar os custos das mudanças climáticas. O modelo passou a ser utilizado em análises do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e da Agência de Pro-teção Ambiental dos Estados Unidos (EPA). Esse modelo reúne conhecimentos e parâmetros da física, da economia e da química, para simular como economia e clima evoluem combinadamente. O pesquisador foi um dos principais pro-ponentes da taxação do carbono para reduzir as emissões – seu modelo é usado para verificar as consequências de políticas climáticas como a tributação de emissões.

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William Nordhaus Paul Romer

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Dois estadunidenses foram os vencedores do Prêmio Nobel de Economia este ano. Ambos escolhidos por seus estudos estarem relacionados com interações entre o pro-gresso tecnológico, o meio ambiente e a economia. Não são teses explicitadas recentemente. Ao contrário, os estudos de William D. Nordhaus e Paul M. Romer representam muitos anos de trabalho para enfatizar as consequências das mudanças climáticas globais e a importância da inovação tecnológica, com nossas expectativas para as atividades econômicas e para o bem-estar da sociedade, no longo prazo.

A escolha aponta para a necessidade premente de maior evidência ao que, embora possa parecer óbvio, não representa um efetivo norteador da economia. Ou seja, tanto as variáveis ambientais como a inovação tecnológica não são fatores apon-tados pelo mercado como estrategicamente relevantes, numa dimensão suficiente e necessária. Mesmo com evidências cada vez mais acentuadas que demonstram as consequências da degradação ambiental e das mudanças do clima nos negócios, ao longo de nossa existência.

A busca pela harmonização entre a exploração da natu-reza – na forma de incontáveis atividades econômicas – e a manutenção das condições de longevidade dos negócios, da qualidade de vida e da proteção do meio ambiente, representa um assunto amplamente exposto nas últimas décadas. No entanto, com uma notória qualificação de estar mais voltado ao discurso do que para a prática. Efetivamente, há de se reconhecer a falta clamorosa de controle, dos governos e da sociedade em geral, para inibir práticas econômicas inade-quadas, que exacerbam os direitos individuais. E que atingem muito negativamente o interesse público, em função de suas consequências ambientais.

Nobel: a fragilidade da economia frente às variáveis ambientais

Clóvis Borges | Diretor-Executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS)

Esse cenário aponta para outras características do com-portamento humano, em que as decisões políticas são, em boa parte, mais determinantes do que o bom senso e o conheci-mento de maneira geral. De fato, não há uma relação direta entre as muitas ameaças globais que podem determinar uma situação de crise econômica, social e ambiental sem precedentes para a humanidade na maioria das vertentes da economia, pas-sada e presente. Torna-se evidente que enfatizar a importância de alguns dos poucos economistas que conseguem enxergar algo em meio à neblina do que denominamos “economia de mercado”, justifique uma premiação tão significativa.

O Nobel de Economia deste ano, ao aproximar temas como inovação tecnológica e proteção do meio ambiente, certamente não faz isso por acaso. Cabe observar que nenhuma dessas duas importantes demandas pode representar, isoladamente, uma solução plausível para os gigantescos desafios civiliza-tórios da atualidade. Mas a conciliação entre os progressos tecnológicos direcionados a diminuir os impactos sobre o meio ambiente e a efetiva ação de proteção da natureza, na forma de infraestrutura verde, podem garantir, de maneira efetiva e consistente, uma fórmula minimamente adequada para que a economia não continue proporcionando tantos desequilíbrios e riscos para a nossa sociedade.

Essas tentativas de sinalização não são de hoje. E, infe-lizmente, não vêm apontando para uma evolução suficiente para reverter prognósticos pouco alentadores. Dependemos da nossa própria capacidade de tomar decisões mais condi-zentes com a realidade e com o bem comum. Precisamos de agendas menos favoráveis ao continuísmo, proporcionado por alinhamentos políticos de grupos econômicos que, sistemati-camente, comprometem o nosso futuro comum.

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William Nordhaus

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O navio RV Celtic Explorer aportou em Agosto último em Galway, na costa da Irlanda, trazendo mapeamento inédito, em alta resolução, de um cânion submarino. A expedição foi um dos desdobramentos do projeto internacional que tem entre seus membros o pesquisador Luis Americo Conti, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo. Um dos objetivos é entender o papel dos corais que vivem nessas águas frias na captura de CO2 da atmosfera.

“Os corais vivem no topo do cânion e, à medida que morrem, seus fragmentos vão se depositando no fundo. O carbono que eles absorveram ao longo da vida continua nesses detritos e, à medida que se acumulam, esse carbono é transferido para os depósitos sedimentares”, disse Conti, cujo estudo teve apoio da FAPESP. A expedição de 15 dias mapeou toda a área do Porcupine Bank Canyon, na Irlanda, de 1.800 km2, maior que o município de São Paulo. Foram usados um sistema de sonar de alta resolução e um veículo submarino controlado remotamente (ROV).

O papel de corais na capturade carbono da atmosfera

André Julião | Jornalista da Agência FAPESP

Apesar de o cânion ter uma profundidade de até 3 mil metros, o ROV Holland I submergiu até aproximadamente 2 mil metros, onde estão os detritos mais recentes. “As amostras colhidas pelo ROV (Remotely Operated Vehicle) ajudarão a entender a dinâmica desses fenômenos ao longo dos últimos 10 mil anos, que podem nos dar pistas para compreender as mudanças climáticas que estamos vivenciando agora”, disse Conti à Agência FAPESP.

Além de coletar sedimentos do fundo do cânion, ricos em detritos de corais, o veículo retirou amostras de corais vivos das paredes e do topo, que serão analisados por biólogos a fim de conhecer as espécies que habitam aquela área e seu parentesco com as de outras regiões.

O ROV fez ainda registros em vídeo das colônias de corais, que complementam o mapeamento de sonar realizado pelo navio. Dessa maneira, foi possível estabelecer uma cor-relação entre os mapas topográficos do cânion com as áreas colonizadas por corais.

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Veículo submarino controlado remotamente - ROV Holland I

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| pesquisas |

“O cânion é um vasto sistema submarino, com penhascos quase verticais de até 700 metros e alguns lugares com até 3 mil metros de profundidade. Seria possível empilhar 10 torres Eiffel”, disse o chefe da expedição, Aaron Lim, pesquisador da School of Biological, Earth and Environmental Sciences da University College Cork (UCC), na Irlanda.

Diferentemente dos corais de água quente, que obtêm nutrientes por meio de um processo de simbiose com algas que vivem dentro deles (zooxanthelas), os de água fria como os do cânion Porcupine dependem do plâncton morto que desce da superfície. “Em águas profundas como essas, não há luz para que as algas façam a fotossíntese e, como as águas não são ricas o suficiente em nutrientes, os cânions são ideais porque neles as correntes marítimas são mais intensas e carregam bastante dessa matéria orgânica, que é filtrada pelos corais”, disse Conti.

“Os corais absorvem o carbono do plâncton morto que ‘chove’ da superfície do oceano, logo, da atmosfera”, explicou Andy Wheeler, professor da UCC e do Irish Centre for Research in Applied Geosciences (iCRAG), em comunicado da universidade. “As crescentes concentra-ções de CO2 na atmosfera estão causando eventos climáticos extremos. Os oceanos absorvem esse gás carbônico e os cânions são uma rota rápida para bombeá-lo para as profundezas, onde ele é estocado de forma segura”, disse Wheeler.

Com as amostras coletadas, os pesquisadores poderão eventualmente saber se as concentrações de carbono na atmos-fera têm influência no crescimento das colônias de corais e na morte de porções delas. Embora o cânion estivesse estável no momento da coleta, periodicamente há algum evento violento que o faz erodir. “É o que se chama de um evento pulsante. Em alguns lugares, como a Noruega, ocorrem verdadeiras avalanches de corais mortos nesses cânions. Em outros, há uma movimentação mais lenta, porém constante”, disse Conti.

Outro objetivo do pesquisador brasileiro era aprimorar técnicas de mapeamento, a fim de aplicá-las em projetos de

pesquisa no Brasil. “A costa brasileira ainda é pouco conhecida. O navio oceanográfico Alpha Crucis, da USP [adquirido com apoio da FAPESP], tem equipamentos adequados para o mape-amento submarino. É pouco, mas é um bom começo. A descoberta dos corais na foz do Amazonas também foi uma conquista importante”, disse Conti.

No entanto, segundo o pesquisador, faltam projetos de mapeamentos mais detalhados, como um levantamento topográfico sistemático do leito marinho brasileiro. “A Irlanda, há 15 anos, realizou um grande programa de mapeamento de seu leito marinho. Graças a ele é que foi possível descobrir e escolher a área desse cânion como um laboratório natural”, disse. “Sem algo assim, ficamos dois passos atrás”.

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| pesquisas |

A Iniciativa Regional de Conservação e Uso Racional dos Ecossistemas de Manguezais e Recifes de Coral foi apresentada à comunidade internacional no dia 26 deste mês (Outubro), em evento paralelo durante a programação da 13ª Conferência das Partes (COP-13) da Convenção de Ramsar. O encontro reúniu em Dubai (Emirados Árabes Unidos), representantes de diversos países com o objetivo de definir ações de proteção para áreas úmidas em nível global. Na ocasião, foi apresentado um vídeo com mensagem do Ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, aos participantes do encontro.

O Ministro destacou os avanços do Brasil nessa agenda. Entre eles, a designação de duas áreas úmidas como Sítios Ramsar – o Sítio Regional do Rio Juruá, no Amazonas, e o Sítio de Taiamã, no pantanal mato-grossense –, cujos certificados foram entregues ao Brasil no primeiro dia da COP-13. Edson Duarte reafirmou, também, o interesse do Governo Federal em lançar, por meio de portaria, até o fim do ano, a Estratégia Nacional de Conservação e Uso Sustentável das Áreas Úmi-das. O documento será o primeiro, no Brasil, que direciona políticas públicas específicas para as áreas úmidas.

Segundo o Ministro, o país trabalha com empenho, desde 1996, para a implementação da Convenção no Brasil, que hoje possui 27 sítios designados Ramsar. “Em Março deste ano, recebemos o certificado de mais três Sítios Ram-sar, sendo dois deles regionais, formados por grandes áreas úmidas, favorecendo a conectividade entre os ambientes e a organização de uma governança conjunta entre vários tipos de áreas protegidas, como unidades de conservação e terras indígenas”, afirmou.

A designação de Sítio Ramsar permite a obtenção de apoio internacional para o desenvolvimento de pesquisas, além do acesso a fundos internacionais para o financiamento de projetos e da criação de um cenário favorável à cooperação internacional. Em contrapartida, o Brasil assume o compro-misso de manter as características ecológicas dos sítios – os elementos da biodiversidade e os processos que os mantêm – e deve atribuir prioridade para sua consolidação diante de outras áreas protegidas, conforme, inclusive, previsto no Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas.

Os principais resultados de uma ação que reúne diversos países da América Latina em prol dos manguezais e corais foram debatidos no evento paralelo realizado na COP-13. Criada em 2007, a Iniciativa Regional de Conservação e Uso Racional desses ecossistemas envolve, hoje, Brasil, Colôm-bia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, México, Panamá, Peru, República Dominicana e Venezuela. Para manter as características ecológicas desses ambientes, a iniciativa promove a adoção de parcerias e alianças estratégicas.

Países debatem proteção de corais e manguezais

Waleska Barbosa | Jornalista do Ministério do Meio Ambiente

Uma das representantes do Brasil no evento, a Diretora de Conservação de Ecossistemas do MMA, Ana Paula Prates, foi a responsável por apresentar a iniciativa. De acordo com ela, as conclusões do projeto GEF/Mangues englobam dois grandes resultados: a conclusão do mapeamento de todos os manguezais e a produção do Atlas de Manguezais do Brasil.

A Coordenadora de Monitoramento e Planejamento de Paisagens, Adriana Risuenho Leão, que coordenou o Projeto Manguezais do Brasil – concluído no ano passado –, apresentou um vídeo com os principais resultados alcançados pelo projeto no país. Além disso, entregou, o “Atlas de Manguezais do Brasil” aos coordenadores da Iniciativa Regional e à Secretaria para as Américas da Convenção de Ramsar.

O Projeto Manguezais do Brasil (GEF/Mangue) foi implementado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com o apoio do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), e coordenado pela Diretoria de Ações Socioambientais e Consolidação Territorial de UCs (DISAT), do ICMBio.

O Brasil é o segundo país em extensão de mangues, com aproximadamente 14 mil km2 ao largo do litoral do Brasil. Ao todo, 120 Unidades de Conservação têm manguezais em seu interior, abrangendo uma área de 12.114 km2, o que representa 87% do ecossistema em todo o Brasil. Já os corais, estão presentes em cerca de 2,4 mil km de costa (do Maranhão à Bahia) e mais os da Costa da Amazônia.

A Convenção de Ramsar

Estabelecida em fevereiro de 1971, na cidade iraniana de Ramsar, a Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional, mais conhecida como Convenção de Ramsar, foi incorporada plenamente ao arcabouço legal do Brasil em 1996, pela promulgação do Decreto nº 1.905/96

Foi criada inicialmente no intuito de proteger os habitats aquáticos importantes para a conservação de aves migrató-rias, por isso foi denominada de “Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional, especialmente como Hábitat para Aves Aquáticas”. Ao longo do tempo, ampliou sua preocupação com as demais áreas úmidas, de modo a promover sua conservação, uso sustentável e o bem-estar das populações humanas que delas dependem.

A Convenção Ramsar estabelece marcos para ações nacionais e para a cooperação entre países com o objetivo de promover a conservação e o uso racional de áreas úmidas no mundo. Elas são fundamentadas no reconhecimento, pelos países signatários da Convenção, da importância ecológica e do valor social, econômico, cultural, científico e recreativo de tais áreas.

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| ecossistemas |

A Amazônia está em transição. A alternância entre períodos de secas seguidos por cheias, uma das características principais da região, está mais espaçada. Estima-se que a cada década a temporada de estiagem ganhe 6,5 dias, ou um mês de seca a mais a cada 40 anos.

Houve também o crescimento de 30% do fluxo do rio Amazonas, na altura da cidade paraense de Óbidos. A mudança ocorreu nos últimos 25 anos. A região amazônica também está mais quente, e não é pouco. Observou-se um aumento de 0,9°C na temperatura média do ar, o suficiente para mudar o comportamento de plantas, animais e do ser humano.

Mudanças no balanço energético e nos ciclos hidrológicos da região têm sido observadas em estudos científicos. Essas mudanças têm impacto profundo na composição da biodi-versidade, do solo e também no cotidiano amazônico. Porém, para que haja políticas públicas voltadas ao desenvolvimento social sustentável na região, estudos ambientais na Amazônia devem estar integrados a questões socioeconômicas.

A avaliação foi feita por participantes no workshop Scien-tific, Social and Economic Dimensions of Development in the Amazon, realizado em Washington, Estados Unidos, em 24 de Setembro. O evento – continuação de outro realizado em Manaus em Agosto – foi organizado pela FAPESP em conjunto com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e o Wilson Center.

Na abertura do workshop, foi apresentado um vídeo com mensagem de Thomas Lovejoy, professor da George Mason University, nos Estados Unidos.

“A Amazônia tem um ciclo hidrológico que permite gerar seu padrão de chuva. Hoje, esse ciclo está sendo impactado pelo desmatamento, pelo uso excessivo de fogo e pelas mudanças climáticas. Com isso, existe o risco de chegarmos a um ponto de inflexão, quando o desmatamento estiver prestes a atingir um determinado limite a partir do qual regiões da floresta tropical podem passar por mudanças irreversíveis”, disse.

Em fevereiro deste ano, Lovejoy e Carlos Nobre, coor-denador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas – um dos INCTs apoiados pela FAPESP no Estado de São Paulo em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) –, publicaram um alerta na revista Science Advances.

“Mudanças no balanço energético e em ciclos hidrológicos já são observadas em pesquisas realizadas na Amazônia. Esta-mos descobrindo e monitorando essas mudanças. Porém, para conseguir que políticas públicas sejam feitas para a região, é preciso integrar aos estudos científicos aspectos socioeconô-micos críticos para a sustentabilidade da região”, disse Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais.

Pesquisa ambiental na Amazônia é também socioeconômica

Maria Fernanda Ziegler | Jornalista da Agência FAPESP

Mudanças no ciclo de cheias e secas afetam a biodiversidade e o cotidiano na região. “Nem todas as plantas são adaptadas ao período de seca prolongado. Com isso, a composição da biodiversidade acaba sendo alterada e ocorre maior mor-tandade de árvores, por exemplo, o que pode impactar no armazenamento de carbono”, disse.

Por ser tão extensa, a Floresta Amazônica é capaz de arma-zenar uma grande quantidade de carbono da atmosfera, questão determinante para o avanço das mudanças climáticas.

“A Amazônia armazena entre 100 bilhões e 120 bilhões de toneladas de carbono na biomassa. Porém, nos últimos anos, com o aumento da perda de árvores – por seca, enchente e desmatamento –, se uma pequena fração desse montante for para a atmosfera, vão ocorrer grandes mudanças no balanço do dióxido de carbono atmosférico”, disse o professor Paulo Artaxo.

Registros históricos recentes de dados de chuva e ocorrência de secas e cheias mais intensas comprovam essa transição no bioma. “Foram três secas muito fortes, uma após a outra, em menos de 20 anos. Isso é um indicador grave. Os dados mostram que algo importante está acontecendo”, disse José Marengo, Coordenador-Geral do Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). Esses eventos climáticos extremos têm aumentado também o risco de incêndios na floresta.

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Paulo Artaxo

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| análise |

“Nem toda a seca é provocada pelo El Niño. Algumas são, outras têm relação com o Atlântico Tropical Norte mais aquecido, como ocorreu em 2005 e 2010. Em alguns casos, quem manda é o El Niño [aquecimento natural das águas do Pacífico], em outros é o Atlântico e em outros os dois vêm juntos, como em 1983 e 1998”, disse Marengo. Ele ressaltou que, seja por El Niño ou por aquecimento do Atlântico, essa é a parte natural. Não inclui a ação humana. “Se acrescentarmos ao El Niño e ao aquecimento do Atlântico outras condições, como por exemplo o aumento no desmatamento, veremos que a situação pode ser muito mais agravada”, disse.

As consequências da intensidade de secas e cheias vão além das fronteiras amazônicas. Estima-se que 70% dos recursos hídricos da Bacia do Rio da Prata dependem da evaporação da Amazônia. A transição passada pela Amazônia e o impacto em seu ciclo hidrológico podem ter graves consequências no agronegócio das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, assim como na Argentina.

Marengo defende a necessidade de maior integração entre as pesquisas. Foi coordenador do projeto Metrópole, inicia-tiva internacional que estuda estratégias de adaptação aos impactos das mudanças climáticas. O estudo estimou perdas econômicas, modelagem dos extremos climáticos e impactos na saúde. “Poderíamos fazer algo nesse sentido na Amazônia. A previsão é de significativo aumento dos eventos extremos na região nas próximas décadas”, disse.

Rita Mesquita, pesquisadora do INPA, concorda com a necessidade de maior integração. “Os estudos precisam ser interdisciplinares. Modelos sociais, econômicos e ambientais nem sempre têm os interesses alinhados. Mas só quando colocarmos todos esses aspectos juntos, poderemos avançar em questões de sustentabilidade”, disse.

Estimar a ação do homem

Questionado pela plateia sobre qual seria a o peso do efeito antrópico nas queimadas na Amazônia, Artaxo respondeu: “100%. Mesmo nos períodos de seca, trata-se de uma floresta úmida, onde é difícil fazer e manter o fogo”, disse.

A destruição da floresta por queimadas tem se mostrada muito mais significativa que o corte para a exploração madei-reira. “O fogo é a maneira mais eficiente para destruir”, disse Douglas Morton, do Goddard Space Flight Center, da NASA, durante sua fala no workshop.

“O Brasil foi um dos líderes no moni-toramento do desmatamento. Sistemas como o PRODES [monitoramento por satélites do desmatamento por corte raso na Amazônia Legal] e o Deter do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) criaram uma base, com dados históricos, mas é preciso ir além, com mais investimento”, disse.

Morton coordena um projeto para medir a degradação das florestas. Nele aviões sobrevoam a Floresta Amazônica para identificar a degradação em três etapas (alturas) da floresta.

Além disso, como Morton comen-tou, a NASA dispõe de 20 satélites de monitoramento, com dados abertos.

“Os satélites dão padrões sobre o que está ocorrendo. Temos modelos para previsões que podem servir para a criação de políticas públicas”, disse.

No evento em Washington, pesquisadores apresentaram outros resultados de projetos apoiados pela FAPESP, para uma plateia formada por cientistas e representantes de ONGs e de agências norte-americanas ligadas ao meio ambiente. A intenção foi trocar experiência para no futuro elaborar cola-borações internacionais no estudo da Amazônia.

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José Marengo Rita Mesquita

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| análise |

O atual texto do Projeto de Lei 750/2011 (Lei do Pan-tanal) precisa ser modificado para se tornar uma legislação que promova a conservação e o desenvolvimento sustentável no bioma, a maior área úmida continental do Planeta. Essa é a opinião dos representantes do Observatório Pantanal, coalizão com 18 organizações, reunidos na última quarta (26/9/2018) no seminário Contribuições da Sociedade Civil para a Lei do Pantanal, para discutir o texto que tramita na Comissão de Meio Ambiente do Senado (CMA), sob relatoria do Senador Pedro Chaves.

O seminário também contou com a participação de pesqui-sadores, líderes de associações de pescadores e representantes do setor do turismo. As apresentações deixaram claras as graves ameaças ao Pantanal e a necessidade de uma Lei que proteja o bioma, prevista na Constituição de 1988 mas que 30 anos depois ainda não virou realidade.

Teodoro Irigaray, ex-Procurador do Mato Grosso e pro-fessor na Universidade Federal daquele Estado, demonstrou preocupação com o texto que foi protocolado e poderá ser colocado em votação. “Não podemos ter mais uma Lei ruralista. Não apenas o Pantanal, como também todas as áreas úmidas do país ficaram fragilizadas com o Código Florestal”, analisou.

Irigaray sugeriu a inclusão de um Conselho Gestor para o Pantanal, que envolveria Governo Federal, governos estaduais, órgãos de pesquisa e sociedade civil organizada. “O Conselho acompanharia e aprovaria planos de gestão e indicaria áreas prioritárias para ações de pagamentos por serviços ambientais”, exemplificou o docente e ex-Procurador. As organizações presentes ao seminário aprovaram a sugestão.

Sociedade civil contribui à Lei do Pantanal

Bruno Taitson | Jornalista do WWF

Letícia Garcia, professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, reforçou a necessidade do Projeto de Lei incluir, em sua unidade de gestão, a região das cabeceiras do Alto Rio Paraguai, onde nascem os rios que formam o Pantanal. “Não adianta querer proteger a planície pantaneira sem proteger o planalto. Se a gente quer proteger o Pantanal, é fundamental proteger ainda mais as nascentes”, avaliou.

As organizações defendem que a Lei precisa definir ins-trumentos econômicos que estimulem produtores rurais e comunidades locais a produzir de forma sustentável, restaurar áreas degradadas e proteger o Bioma. “O projeto representa uma oportunidade de gerar lucro para quem protege e promove benefícios ecológicos”, enfatizou a professora da UFMS.

O pescador Aparecido dos Santos, conhecido como Foca, também fez uma apresentação no seminário. Ele destacou uma série de vulnerabilidades que têm afetado diretamente as comunidades pesqueiras. “Temos visto muito assorea-mento, desmatamento sem critério, degradação de rios e matas pela lavoura, uso exagerado de veneno, esgoto sem tratamento despejado nos rios e barulho muito alto de motor de embarcações. O Rio Aquidauana baixou de nível e a gente atravessa a pé em vários locais. Por conta disso precisa cuidar das cabeceiras”, observou Foca.

O relatório atual, protocolado este mês pelo Senador Pedro Chaves na Comissão de Meio Ambiente, apresentou algumas pioras em relação ao texto anterior, de autoria do mesmo parlamentar. Com o seminário, as organizações do Observatório do Pantanal esperam levar novas contribuições ao relator, para que o texto seja aprimorado.

Segundo Júlio César Sampaio, coordenador do programa Cerrado-Pantanal do WWF-Brasil, a sociedade civil está cumprindo seu papel de apoiar, com dados científicos, infor-mações técnicas e conhecimentos tradicionais, a formulação de políticas públicas relevantes para o país. “O Senador Pedro Chaves vem se mostrando, como relator da Lei do Pantanal, bastante aberto às contribuições encaminhadas pelas orga-nizações. Certamente ele acolherá com atenção as sugestões dos membros do Observatório do Pantanal, como tem feito até o momento”, afirmou.

Estiveram presentes no seminário representantes das instituições: Associação Guyrá Paraguai, Centro de Pesquisa do Pantanal, Colônia de Pescadores Z18, Ecoa, Fundação de Turismo de Mato Grosso do Sul, Instituto Arara Azul, Ins-tituto Homem Pantaneiro, Mulheres em Ação no Pantanal, Observatório das Águas, Projeto Bichos do Pantanal, Socie-dade de Direito Ambiental (Bolívia), SOS Pantanal, UFMS, GECA-UFMT, Wetlands International, WWF-Paraguai e WWF-Brasil. O Observatório do Pantanal lançará a publica-ção Contribuições da Sociedade Civil para a Lei do Pantanal, contendo as sugestões levantadas no evento.

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| legislação ambiental |

Usando uma ferramenta genética conhecida como código de barra da ADN, uma equipe de pesquisadores brasileiros rastreou potenciais delitos cometidos contra espécies de tubarões ameaçadas ao longo da costa de São Paulo, e assim contribuir a deter sua extinção.

A pesca de tubarões está proibida no Brasil, fato que não impede que continue abastecendo o mercado clandestino das regiões costeiras do país, sobretudo pelas barbatanas, cujo valor no mercado internacional pode chegar a US$ 1.000 o quilo.

Com o objetivo de se esquivar dos funcionários encargados de fazer cumprir a proibição, os pescadores geralmente cap-turam o tubarão, lhe cortam as barbatanas e outras partes de interesse comercial, e o jogam com vida à água. Como já não podem nadar, agonizam ate morrer. Isso faz más difícil ainda identificar e estimar se as espécies protegidas são capturadas e comercializadas. Nos supermercados estas são vendidas em forma de pequenos filetes.

A técnica descrita num estudo publicado na revista “Fishe-ries Research” permite distinguir as diferentes espécies se baseando somente em segmentos curtos de aproximadamente 650 pares de bases do genoma mitocondrial do tubarão.

Para provar o método, os pesquisadores analisaram amostras de tubarão coletadas entre 2015 e 2016 dos barcos pesqueiros que usam redes de arrastre de fundo e dos mer-cados de distribuição de peixes localizados ao longo da costa de São Paulo.

Comércio de barbatanas põe em risco tubarões do Brasil

Rodrigo de Oliveira Andrade | Jornalista da SciDev

O ADN extraído foi comparado com as sequencias dispo-níveis na base de dados do Barcode of Life Online Database (www.boldsystems.org) e no GenBank (www.ncbi.nlm.nih.gov/genbank) base de dados de informação de sequencias de ADN e aminoácidos do Centro Nacional para a Informação Biotecnológica dos Estados Unidos.

Desta maneira conseguiram identificar traços morfológicos e relaciona-os a três espécies de tubarões: Squatina guggenheim, Squatina occulta y Pseudobatos horkelii.

As três estão catalogadas como espécies em perigo de extinção na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), um inventario global sobre o estado de conservação de espécies e subespécies de plantas e animais.

A captura, transporte, armazenamento, manipulação, processamento e comércio destas espécies de tubarão, que atualmente já apresentam uma drástica diminuição de sua população estão proibidas no Brasil desde 2012.

Os autores propõem que este método seja usado pelas autoridades locais para que os pescadores que capturam e comercializam as espécies ameaçadas sejam punidos, mesmo que seja posteriormente à captura da espécie. “Os tubarões estão sendo pescados excessivamente no Sudeste do Brasil, apesar das leis que proíbem esta prática e das denúncias dos pesquisadores e ambientalistas”, confirma à SciDev.Net Bruno Ferrette, biólogo do Instituto de Biociências da Universidade Estadual de São Paulo e um dos autores do estúdio.

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| espécies ameaçadas |

Explica que os tubarões são muito sensíveis à sobrepesca porque crescem lentamente, chegar ao amadurecimento sexual lhes toma muito tempo e têm poucas crias. Além disso, o aniquilamento das populações deste peixe pode causar estragos nos ecossistemas que habitam e suas consequências poderiam se estender aos ribeirinhos que dependem da biodiversidade marina como fonte de ingresso e alimento.

Um estúdio publicado na revista PlosOne em 2013 esti-mou que ao redor de 100 milhões de tubarões são capturados e mortos pelos seres humanos cada ano, o que representa aproximadamente 8% de todos os tubarões. Ao eliminar seu principal predador, suas presas podem florescer e comprome-ter toda a cadeia alimentar, afetando a comida marina que consumem os humanos, ressaltou esse estúdio.

Renata Guimarães Moreira, bióloga do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, destaca que as descobertas são preocupantes, especialmente porque essas espécies de tubarões estão ameaçadas de extinção.

“A situação é pior ainda nos países em desenvolvimento, como Moçambique e Índia, onde a carne de tubarão é vendida comumente sem identificação adequada”, comenta Moreira a SciDev.Net. Desta forma, os pescadores comercializam espécies ameaçadas como se não fossem.

Guimarães indica que nos supermercados brasileiros, por exemplo, todos os tubarões são vendidos como “cação”, nome popular para qualquer peixe de esqueleto cartilaginoso, incluídos os tubarões.

“Os consumidores não entendem que cação se refere a uma ampla subclasse de peixes, tubarões independentemente do seu tamanho ou espécie”, explica a bióloga, que não partici-pou do estúdio. “Este etiquetado intencionalmente incorreto compromete os esforços de diminuir o consumo de tubarões ou de promover o consumo de espécies não ameaçadas”, complementa.

Para Blanca Sousa Range, bióloga que também trabalha no Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, mas que não participou do trabalho, “o código de barras da ADN garante a precisão na identificação das espécies, sendo então um método eficiente de identificação de tubarões, inclusive se o animal carece de um caráter distintivo”.

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| espécies ameaçadas |

A evolução de nossa sociedade em direção à sustentabili-dade é visível. Retroceder parece impossível, mas precisamos estar sempre alertas visando potencializar os benefícios e ao mesmo tempo escapar das armadilhas. Algumas estão sendo reapresentadas disfarçadas de “soluções disruptivas inova-doras”, no embalo da indústria de conceitos. Com a devida vênia do Mestre Monteiro Lobato, vamos tratar aqui dos aditivos “mágicos” que prometem afastar eventuais impactos causados por materiais plásticos quando dispostos de forma inadequada na natureza.

Conforme parecer técnico elaborado pelo Centro de Tec-nologia de Embalagem- Instituto de Tecnologia de Alimentos (CETEA/ITAL) é equivocado pensar que a decomposição de materiais no meio ambiente seja uma solução para a destinação de embalagens em geral. Não é possível considerar normal que resíduos sejam jogados diretamente no meio ambiente, supondo que este teria condições para processar/decompor tais materiais no curto prazo. A responsabilidade da sociedade sobre a gestão de seus resíduos deve ser assumida, de forma compartilhada.

Pirlimpimpim?André Vilhena | Diretor Executivo do CEMPRE

Produtos como detergentes, amaciantes, shampoos, condicionadores etc. devem ser biodegradáveis, pois são necessariamente descartados no esgoto e a característica de biodegradabilidade é muito útil no tratamento de esgoto, que normalmente utiliza processos biológicos. Por outro lado, não é uma proposta viável enviar para o esgoto o resíduo sólido domiciliar (embalagens, sacolas plásticas, resíduos de alimentos, óleo de cozinha...). Ou seja, propostas para tratamento de efluentes são diferentes daquelas adequadas à gestão e valorização dos resíduos sólidos.

O quadro pode ser ainda pior quando a ação de degra-dação é induzida/acelerada por aditivos que prometem solucionar o problema como num passe de mágica, mas que na verdade ajudam a agravar a contaminação do ambiente, a partir da fragmentação de macromoléculas (polímeros). Os tais aditivos “oxi-degradáveis” ou “oxi-biodegradáveis” para embalagens plásticas, atrapalham a reciclagem e agravam a contaminação de lençóis freáticos, rios, mares, oceanos, etc., além de inviabilizar a reciclagem de diversos produtos. O tal pó de pirlimpimpim para plásticos não “transporta” o material para outro lugar, as moléculas continuam lá só que agora fragmentadas, contaminando o meio ambiente e inviabilizando a reciclagem.

Por fim, devemos lembrar que o consumidor tem direito à informação correta e não pode ser confundido com termos não sinônimos como “biodegradável” e “biopolímero”. Biopo-límeros são plásticos fabricados a partir de fontes renováveis (milho, cana-de-açúcar etc.) e têm importância estratégica para o futuro, principalmente quando utilizam energia reno-vável em todo seu ciclo de vida (produção agrícola, processos industriais, transporte etc.). Biopolímeros não precisam ser biodegradáveis/biodegradados, podem ser recicláveis.

Algumas empresas de grande porte no Brasil e em outros países já caíram nesse embuste num passado recente. No Bra-sil até Projetos de Lei e Decretos obrigando a sua utilização tivemos. Será que vamos ver esse ciclo se repetir?

Sobre o CEMPRE

O Compromisso Empresarial para Reciclagem (CEMPRE) é uma associação sem fins lucrativos, que trabalha para cons-cientizar a sociedade sobre a importância de reduzir, reutilizar e reciclar lixo por meio de programas de conscientização. A entidade utiliza publicações, pesquisas técnicas e seminários, e mantém para consulta pública um banco de dados sobre o assunto em sua sede na capital paulista. Fundado em 1992, o CEMPRE vem sendo mantido por contribuições de empresas privadas de diversos setores. Entre elas estão: Adm, Ambev, Arcor, Braskem, Brf, Bunge, Cargill, Coca-Cola, Colgate-Pamolive, Danone, Femsa, Heineken Brasil, Hershey’s, Hp, Klabin, Mcdonalds, Mondelez, Nestlé, Owens Illinois, Pão De Açúcar, Pepsico Do Brasil, SC Johnson, Sig Combibloc, Suzano, Tetra Pak, Unilever Brasil e Vigor.

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| resíduos sólidos |

O Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM) entregou no dia 25 deste mês (Outubro) à Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, um “Manifesto por Ar Limpo”, assinado por dezenas de entidades ambientalistas, pedindo uma revisão eficaz da Resolução Conama 03/1990, que está defasada em relação às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a proteção da qualidade do ar no Brasil. O documento é assinado também pela Asso-ciação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (ABRAMPA), que congrega os promotores e procuradores do setor no país.

Segundo o PROAM, a minuta de revisão da Resolução 03/90 que tramita no Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e poderá ser votada proximamente sugere valores de poluição do ar com o dobro da recomendação da OMS, permite agregar mais poluição por meio de licenciamento ambiental em áreas já saturadas, não prevê níveis de alerta adequados e não tem mecanismos para informar adequada-mente a população sobre os riscos que corre.

Carlos Bocuhy, Presidente do PROAM, lembra que, conforme dados da OMS, morrem no Brasil mais de 50 mil pessoas por ano em função da poluição atmosférica. “Estudos da Faculdade de Saúde Pública da USP apontam um custo anual estimado de US$ 1,7 bilhão nas 29 maiores cidades do país devido à péssima qualidade do ar”, afirma o ambientalista, que também é Conselheiro do Conama.

Os grupos mais vulneráveis são as populações de baixa renda, que se encontram em áreas menos preservadas, as crianças e os idosos, mais suscetíveis à poluição devido a uma saúde mais frágil. “Estas mortes poderiam ser evitadas com uma corajosa política por ar limpo, especialmente com o controle das fontes de emissão de poluentes, como o material particulado e os precursores de ozônio”, diz Bocuhy.

Ambientalistas enviam à PGR um Manifesto por Ar Limpo

Mauro Arbex | Jornalista

O “Manifesto por Ar Limpo” destaca que, no processo de revisão da resolução Conama, a defesa da saúde pública vem sendo obstruída pelo setor produtivo e governos esta-duais, que se omitem da responsabilidade legal de cumprir os dispositivos constitucionais.

Em 1990, saiu a primeira resolução do Conama, com valores de referência para qualidade do ar da OMS. Em 2005, a OMS revisou os valores e publicou os padrões atuais, mais restritivos e protetivos. Em 2007, o Proam solicitou a revisão dos padrões ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA) de São Paulo. Em 2012, o Estado adotou as novas referências, mas sem prazo para atingimento das metas.

Entre 2012 e 2017, a discussão proposta pelo PROAM se ampliou em nível nacional, até que neste ano houve a aprovação da minuta, sem adoção das recomendações da OMS, que agora vem sendo contestada por ambientalistas e Ministério Público Federal. A votação final da minuta está prevista para o final deste mês. Segundo Bocuhy, se aprovada, “a minuta levará o Brasil a um atraso de décadas no combate à poluição do ar”.

O Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM) é uma ONG que estimula ações e políticas públicas com a finalidade de tornar o ambiente saudável, principalmente em grandes áreas urbanas. Fundada em Abril de 2003, a ONG é presidida pelo ambientalista Carlos Bocuhy. Desde sua fun-dação, o PROAM trabalha em defesa da boa normatização e indicadores ambientais para a elaboração de políticas públicas, realizando diagnósticos ambientais, vistorias, denúncias e cobrança de soluções e da eficácia na atuação dos órgãos competentes. Além disso, a ONG desenvolveu a campanha ambiental “Billings, Eu te quero Viva!” e o programa Metró-poles Saudáveis. Este programa, atualmente em andamento, é coordenado pelo PROAM e apoiado pela OMS.

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Uma mudança global em direção a dietas saudáveis e mais baseadas em vegetais, reduzindo pela metade a perda e o desperdício de alimentos, e melhorando as tecnologias e práticas agrícolas são necessárias para alimentar 10 bilhões de pessoas de forma sustentável até 2050, segundo um novo estudo publicado na revista Nature. A adoção dessas opções reduz o risco de ultrapassar os limites ambientais globais relacionados à mudança climática, o uso de terras agrícolas, a extração de recursos de água doce e a poluição dos ecos-sistemas por meio da aplicação excessiva de fertilizantes, de acordo com os pesquisadores.

Este é o primeiro estudo a quantificar como a produção e o consumo de alimentos afetam as fronteiras planetárias e um espaço operacional seguro para a humanidade, além do qual os sistemas vitais da Terra podem se tornar instáveis. “Não há uma solução única que seja suficiente para evitar cruzar fronteiras planetárias. Mas, quando as soluções são implementadas em conjunto, nossa pesquisa indica que pode ser possível alimentar a população em crescimento de forma sustentável”, destaca Marco Springmann, do Programa Martin Martin sobre o Futuro da Alimentação e do Departamento de Saúde Populacional Nuffield da Universidade de Oxford, que liderou o estudo. “Sem a coordenação dessas ações de correção de rota, a pesquisa mostra que os impactos ambien-tais do sistema alimentar poderiam aumentar de 50 a 90% até 2050 como resultado do crescimento populacional e do aumento de dietas ricas em gorduras, açúcares e carne. Nesse caso, todas as fronteiras planetárias relacionadas à produção de alimentos seriam superadas, algumas delas por mais de duas vezes”.

Alimentar 10 bilhões depessoas até 2050 é possível

Owen Gaffney | Jornalista do Centro de Resiliência de Estocolmo

O estudo, financiado pela EAT como parte da Comissão EAT-Lancet para Alimentos, Planeta e Saúde e pela parceria “Nosso Planeta, Nossa Saúde” da Wellcome sobre Pecuária Ambiente e Pessoas, combinou contas ambientais detalhadas com um modelo do sistema global de alimentos que rastreia a produção e o consumo de alimentos em todo o mundo. Com esse modelo, os pesquisadores analisaram várias opções que poderiam manter o sistema alimentar dentro dos limites ambientais e descobriram que:

• As mudanças climáticas não serão suficientemente mitigadas sem alterações significativas no menu para dietas principalmente baseadas em vegetais. Adotar em todo o mundo uma alimentação mais flexível, baseada em hortaliças poderia reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa em mais da metade e também reduzir outros impactos ambientais, como a aplicação de fertilizantes e o uso de terras cultiváveis e água doce, de um décimo a um quarto.

• Além das mudanças na dieta, é necessário melhorar as tecnologias e práticas de manejo na agricultura para limitar as pressões sobre terras agrícolas, extração de água doce e uso de fertilizantes e agrotóxicos. Aumentar a produtividade das terras agrícolas existentes, equilibrar a aplicação e a recicla-gem de fertilizantes e melhorar a gestão da água poderiam, juntamente com outras medidas, reduzir esses impactos em cerca de metade.

• Finalmente, reduzir pela metade a perda de alimentos e o desperdício é necessário para manter o sistema alimentar dentro dos limites ambientais. A redução da perda de alimentos e do desperdício poderia, se alcançada globalmente, reduzir os impactos ambientais em até um sexto (16%).

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“Muitas das soluções que analisamos estão sendo imple-mentadas em algumas partes do mundo, mas será necessária uma forte coordenação global e um rápido aumento de escala para que seus efeitos sejam sentidos”, disse o pesquisador Marco Springmann.

“Melhorar as tecnologias agrícolas e práticas de gestão exigirá um investimento crescente em pesquisa e infra-estrutura pública, os esquemas de incentivos adequados para os agricultores, incluindo mecanismos de apoio para adotar melhores práticas disponíveis e melhor regulamentação, por exemplo de uso de fertilizantes e qualidade da água”, diz Line Gordon, diretor executivo do Centro de Resiliência de Estocolmo e autor do relatório.

Fabrice de Clerck, diretor de ciência da EAT sintetiza: “Combater a perda e o desperdício de alimentos exigirá medidas em toda a cadeia alimentar, desde armazenamento e transporte, embalagens e rotulagem de alimentos até mudanças na legislação e no comportamento dos negócios que promovem cadeias de suprimento de lixo zero. Quando se trata de dietas, abordagens abrangentes de políticas e negócios são essenciais para possibilitar mudanças na dieta em direção a dietas saudáveis e mais baseadas em vegetais, além de atraentes para um grande número de pessoas. Aspectos importantes incluem programas escolares e nos locais de tra-balho, incentivos econômicos e rotulagem, e o alinhamento de diretrizes alimentares nacionais com as evidências científicas atuais sobre alimentação saudável e os impactos ambientais de nossa dieta”, acrescenta Springmann.

A EAT é uma plataforma global sem fins lucrativos de base científica para a transformação de sistemas alimentares fundada pela Fundação Stordalen, pelo Centro de Resiliência de Estocolmo e pelo Wellcome. O relatório do EAT-Lancet será publicado em janeiro de 2019.

A Wellcome é uma fundação global de caridade, tanto política como financeiramente independente, que apoia os cientistas e pesquisadores, enfrenta grandes problemas, ali-menta a imaginação e desperta o debate.

A parceria “O Nosso Planeta, Nossa Saúde” entre a Wel-come e a Livestock Environment and People (LEAP) é um programa de pesquisa baseado na Oxford Martin School, Universidade de Oxford. que visa compreender os efeitos sanitários, ambientais, sociais e econômicos do consumo de carne e laticínios para fornecer evidências e ferramentas para que os tomadores de decisão promovam dietas saudáveis e sustentáveis.

A Oxford Martin School da Universidade de Oxford é um centro líder mundial de pesquisa pioneira que aborda desafios globais. Investe em pesquisas que envolvem disciplinas para lidar com uma ampla gama de questões, como mudança climática, doenças e desigualdade. A Escola apoia projetos inovadores e multidisciplinares que podem não se encaixar nos canais convencionais de financiamento porque a quebra de fronteiras pode produzir resultados que poderiam melhorar drasticamente o bem-estar desta e das futuras gerações. A base de toda a nossa pesquisa é a necessidade de traduzir a excelência acadêmica em impacto - de inovações em ciência, medicina e tecnologia, até o fornecimento de consultoria especializada e recomendações de políticas.

O documento, “Opções para manter o sistema alimentar dentro dos limites ambientais”, foi publicado pela Nature em 10 de outubro de 2018 em http://dx.doi.org/10.1038/s41586-018-0594-0

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| segurança alimentar |

Há apenas 3 anos, em Setem-bro de 2015, todos os Estados-membros da ONU aprovaram a Agenda 2030 para o Desenvol-vimento Sustentável. Líderes de todo o mundo consideraram a erradicação da fome e de todas as formas de desnutrição (ODS 2) como uma medida fundamental para um mundo mais seguro, mais justo e mais pacífico. Para-doxalmente, a fome não parou de crescer desde então.

Segundo as últimas estimativas, o número de pessoas subnutridas aumentou em 2017 pelo terceiro ano consecu-tivo. No ano passado, 821 milhões de pessoas passaram fome (11 por cento da população mundial – uma em cada nove pessoas no Planeta), em sua maioria agricultores familiares que vivem em áreas rurais pobres na África Subsaariana e no sudeste da Ásia.

No entanto, o nível crescente de subnutrição no mundo não é o único desafio que enfrentamos. Outras formas de desnutrição também estão aumentando. Em 2017, pelo menos 1,5 bilhão de pessoas sofriam de deficiências de micro-nutrientes que prejudicam sua saúde e sua vida. Ao mesmo tempo, a proporção de obesidade entre adultos continuou a aumentar, de 11,7% em 2012 para 13,3% em 2016 (ou 672 milhões de pessoas).

A fome limita-se a áreas específicas, especialmente aquelas atingidas por conflitos, secas e pobreza extrema. A obesidade, porém, está em toda parte e continua a crescer em todo o mundo: estamos testemunhando sua globalização. Um exemplo disso é o fato de que as taxas de obesidade estão subindo mais rápido na África do que em qualquer outra região – oito dos 20 países com as taxas de crescimento mais rápidas estão lá.

Além disso, em 2017, o número de crianças com excesso de peso atingiu a marca de 38 milhões de menores de 5 anos. Sendo que 46% dessas crianças vivem na Ásia e 25% na África. Se não tomarmos medidas urgentes para frear esse aumento, em breve, o mundo terá mais obesos do que pessoas desnutridas.

O crescimento da obesidade gera um enorme custo socioeconômico. É um fator de risco para muitas doenças não transmissíveis, como doenças cardíacas, derrame, diabetes e certos tipos de câncer. Estimativas indicam que o impacto global da obesidade é de cerca de 2,8% do PIB mundial. Combinado, é um custo igual ao impacto do tabaco e do conflito armado.

José Graziano da Silva | Diretor-Geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO)

Dia Mundial da Alimentação: nossas ações são o futuro

O Dia Mundial da Alimentação (16 de Outubro) tem como objetivo lembrar a comunidade internacional do seu compromisso político para erradicar todas as formas de des-nutrição e que alcançar a Fome Zero no mundo, em 2030 ainda é possível. De acordo com estimativas da FAO, a fome no Brasil atingia 10,6% da população total (cerca de 19 milhões de pessoas) no início de 2000 e menos do que 2,5% no período 2008-2010, que é o valor mínimo pelo qual a FAO pode fazer inferências estatísticas confiáveis. Esta redução do número de pessoas subnutridas foi possível, principalmente, devido ao forte compromisso do ex-Presidente Lula e da implementação de políticas públicas e programas de proteção social que detiveram a extrema pobreza e o impacto da seca prolongada na parte Nordeste do país.

Na verdade, os governos têm o papel mais importante para alcançar a Fome Zero e garantir que as pessoas mais vulneráveis tenham renda suficiente para comprar os alimentos de que necessitam, ou os meios para produzi-los, mesmo em tempos de conflito.

No entanto, os líderes mundiais devem levar em conta que o conceito Fome Zero é mais amplo e não se limita à luta contra a desnutrição. O Fome Zero também visa assegurar que todos tenham os nutrientes necessários para levar uma vida saudável, erradicando todas as formas de desnutrição. Não é apenas sobre a alimentação das pessoas, mas também sobre se alimentarem bem.

Os atuais sistemas alimentares aumentaram a disponibi-lidade e o acesso a alimentos processados altamente calóricos, densos em energia, com alto teor de gordura, açúcar e sal. Esses sistemas devem ser transformados para que todos possam consumir alimentos saudáveis e nutritivos.

Temos que abordar a obesidade como uma questão pública, não como um problema individual. Isso requer a adoção de uma abordagem multissetorial que envolve não apenas os governos, mas também organizações internacionais, sociedade civil, setor privado e cidadãos em geral.

Uma dieta saudável deve ser o resultado de um esforço coletivo que inclua, por exemplo, a criação de normas (como rotular e proibir ingredientes nocivos), a introdução de ali-mentos mais nutritivos nos cardápios escolares, a adoção de métodos para reduzir perdas e desperdícios de alimentos e o estabelecimento de acordos comerciais que não impeçam o acesso a alimentos frescos, nutritivos e cultivados localmente pelos agricultores familiares.

O lema do Dia Mundial da Alimentação de 2018 é “Nossas ações são o nosso futuro”. É hora de renovar nosso compromisso e, ainda mais importante, o apoio político a um mundo sustentável, livre da fome e de todas as formas de desnutrição.

FAO

José Graziano da Silva

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| dia mundial da alimentação |

Um grupo de cientistas desco-briu que boa parte do nitrogênio aplicado como fertilizante em plan-tações de soja e milho na Amazônia fica guardada até seis metros abaixo do solo – mas até quando ainda não se sabe. O estudo, publicado no início do mês no site Scien-tific Reports, da revista britânica “Nature”, traz mais informações sobre o que significa intensificar a agricultura na região.

Os pesquisadores, liderados por KathiJo Jankowski, da Agência de Pesquisa Geológica dos Estados Unidos, analisaram o que acontece com o fertilizante aplicado em plantios na Fazenda Tanguro, em Mato Grosso, onde o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) coordena trabalhos científicos em ecologia.

Quando até 80 quilos de nitrogênio por hectare são apli-cados em plantações de milho, a planta absorve o fertilizante quase totalmente. Quando a quantidade é maior do que isso – 120, 160 e até 200 quilos de nitrogênio por hectare – a produtividade não sobe e o excedente fica estocado.

A intensificação da agricultura é uma forma de evitar o desmatamento de novas áreas para a produção. Porém, seus impactos ambientais ainda são pouco entendidos, entre eles os decorrentes do uso de mais fertilizantes.

O estudo agora publicado traz um pouco mais de conhe-cimento sobre esse tema. Os cientistas receiam que, quando o solo saturar, esse nitrogênio atinja os corpos d’água da Amazônia, com consequências ainda desconhecidas para a biodiversidade e o clima.

A preocupação tem uma razão de ser: nos Estados Unidos, por exemplo, o uso excessivo de fertilizantes na bacia do Rio Mississipi derrubou a qualidade da água nessa região e criou uma zona morta onde o rio desagua, no Golfo do México, que no ano passado atingiu mais de 22 mil quilômetros quadrados – a concentração de nitrogênio e fósforo é tão alta e a taxa de oxigênio, tão baixa que a vida marinha se tornou inviável ali.

Jankowski explica que há diferenças entre a situação americana e a brasileira, como a forma e a quantidade de nitrogênio aplicado na agricultura, assim como o tipo de solo. Contudo, há semelhanças suficientes entre ambos os casos para levantar uma bandeira de atenção, além de um fator determinante para manter a análise constante da situação: o ineditismo de uma prática sendo aplicada num ritmo alto e de forma extensiva por uma região muito grande.

Solo da Amazônia acumula nitrogênio dos fertilizantes

Cristina Amorim | Jornalista do IPAM

“A conversão (da vegetação nativa) para soja e milho fertiliza-dos com nitrogênio é muito mais recente na Amazônia e no Cerrado do que na Bacia do Mississipi. A área de cultivo casado de soja e milho cresceu mais de 10 vezes em Mato Grosso desde 2001”, diz Jankowski. O tipo de solo onde o estudo foi feito, e que funcionou como uma “esponja” para o nitro-gênio, é o latosolo intemperizado, formado em locais quentes e úmidos. Ele é o mais comum na transição entre Cerrado e Amazô-

nia, onde a agricultura se intensificou nos últimos anos. Em 2015, cerca de 2,3 milhões de hectares da soja da região (ou 68% do total cultivado) e 4,9 milhões do cultivo casado de soja e milho (80% do total) estão nesse tipo de solo.

O pesquisador Christopher Neill, do Centro de Pesquisa Woods Hole, que também participou do estudo, reforça que a maior parte da monocultura da Amazônia tem se expandido sobre um tipo de solo que, até agora, impediu que o excesso de nitrogênio se movesse para rios e córregos. Mas isso não significa passe livre para o uso indiscriminado de fertilizantes. “Esse sistema de cultivo tem menos de 20 anos na região, e não conhecemos ainda qual é a capacidade de proteção do solo, quanto tempo dura ou o que acontece se o índice de nitrogênio acumulado for maior do que a capacidade de retenção”, diz o cientista. “Esses resultados sugerem que é possível usar algum grau de fertilizantes na Amazônia, mas essas são as perguntas críticas que determinarão a sustentabilidade ambiental de um modelo mais intensivo de agricultura na região”.

No caso da quantidade de nitrogênio exceder a capaci-dade de retenção do solo, a manutenção de matas ciliares é apontada pelos cientistas como fundamental para reduzir o risco de contaminação de rios e córregos. A vegetação pode servir como filtro. Outro fator ambiental que também pre-ocupa os cientistas é a emissão de óxido nitroso (N2O), um gás com potencial 300 vezes maior de piorar o Efeito Estufa do que o gás carbônico, associado ao uso do fertilizante. Pela medição dos cientistas, apenas 0,23% da quantidade aplicada normalmente vira N2O, uma taxa muito menor do que a observada globalmente. “A grande maioria do fertilizante é consumida pelo milho, que deixa pouco para ser emitido como N2O”, conta Jankowski. A preocupação vem da escala da produção: extrapolando a medição, o uso do fertilizante nessa região pode equivaler de 8,8% a 14,7% das emissões diretas de N2O no Brasil.

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| resíduos tóxicos |

Dois cientistas propuseram uma versão revisada da Teoria Gaia da vida na Terra à luz de uma nova época: o Antropoceno. Eles querem reaplicar um argumento às vezes controverso – originalmente introduzido como a hipótese de Gaia – ao modo como os humanos administram o clima e os recursos do Planeta: desta vez deliberadamente e com plena consciência das consequências da ação humana.

A Teoria de Gaia, como é agora conhecida, propõe que a soma da vida na Terra, nos últimos três bilhões de anos, poderia ser considerada como um superorganismo que incons-cientemente moderou a temperatura e a química do Planeta, sua atmosfera para o bem maior: isto é, para a sobrevivência a longo prazo dos seres vivos.

A ideia foi introduzida pelo cientista britânico James Lovelock em 1972, e recebeu o nome de Gaia, em homena-gem à antiga deusa grega da Mãe Terra. A escolha do nome foi uma metáfora: os pesquisadores também rotularam o raciocínio como biogeofisiologia e o ensinam como Ciência do Sistema Terrestre.

Na Teoria de Gaia, micróbios, plantas, fungos e animais no Planeta coletivamente gerenciam e reciclam ar e água, e traficam a rocha e a química do solo, de forma a sustentar o coletivo da vida. Agora, Tim Lenton, Diretor do Instituto de Sistemas Globais da Universidade de Exeter, no Reino Unido, e Bruno Latour, filósofo e antropólogo parisiense, acham que é hora de uma atualização: eles propõem o Gaia 2.0, no qual uma consciente, sensível e vulnerável forma de vida torna-se parte do sistema autorregulador do Planeta.

Repensar a Teoria de Gaia de James Lovelock

Tim Radford | Jornalista. Editor do Climate News Network

Eles argumentam na revista Science, que o Gaia 2.0 pode-ria se tornar uma estrutura eficaz para promover um Planeta sustentável. “Se quisermos criar um mundo melhor para a crescente população humana neste século, precisamos regular os nossos impactos no nosso sistema de suporte à vida e criar deliberadamente uma economia mais circular que dependa – como a biosfera – da reciclagem de materiais movidos a energia sustentável”, disse o professor Lenton.

Os dois cientistas argumentam que, com o início do Antropoceno – uma era na qual a humanidade molda cada vez mais a paisagem e a atmosfera – e a exploração frenética dos recursos do Planeta, é hora de os seres humanos delibe-radamente seguirem o exemplo involuntário estabelecido

por todas as outras criaturas na biosfera e ajustar as condições de sobrevivência.

“Atualmente, os seres humanos extraem energia fóssil, fosfato de rocha e outras matérias-primas da crosta terrestre muito mais rapidamente do que normalmente chegariam à superfície, e depois despejam os resíduos na terra, na atmosfera e no oceano. Comparado a Gaia, esse é um conjunto de invenções muito mal acoplado e insustentável”.

E eles argumentam que isso pode ser feito. “A entrada de energia solar tem a capacidade de superar de longe o consumo atual de ener-gia fóssil, e as energias renováveis estão se tornando competitivas em termos de custo com a energia dos combustíveis fósseis para geração

de eletricidade”, escrevem eles. O uso de combustível fóssil já aumentou o dióxido de carbono atmosférico para níveis vistos pela última vez 3 ou 5 milhões de anos atrás.

“Um objetivo central para este século é certamente alcançar um futuro florescente para toda a vida neste Planeta, incluindo uma projeção de 9 a 11 bilhões de pessoas. O florescimento humano não é possível sem um sistema biodiverso e susten-tador da vida”. O problema é que os humanos ainda não têm os dados, o entendimento ou a vontade de mudar de curso. Mas o desafio para a ciência seria entregar o know-how para o sucesso do Gaia 2.0. A tecnologia humana poderia adicionar outra camada mais “autoconsciente” ao gerenciamento do Planeta, dizem eles. “Se na política o cego guia o cego, então a esperança está em encontrar a melhor maneira de ativar a bengala branca para se atrapalhar no escuro”.

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James Lovelock

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| opinião |