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1310 ANTÔNIO DE SOUZA NETTO E GASPAR SILVEIRA MARTINS: O FEDERALISMO NA PROVÍNCIA DO RIO GRANDE DO SUL NO SÉCULO XIX. Monica Rossato Mestranda do PPGH UFSM, bolsista FAPERGS/CAPES email: [email protected] Matheus Luis da Silva Acadêmico do 10° semestre do curso de História UFSM, bolsista PROBIC/ FAPERGS email:[email protected] Profa. Dra. Maria Medianeira Padoin Orientadora, professora coordenadora do PPGH UFSM email: [email protected] RESUMO Este artigo procura analisar a trajetória e atuação política de Antônio de Souza Netto, proclamador da República Rio-Grandense (1836) e de Gaspar Silveira Martins, um dos líderes do Partido Liberal e da Revolução Federalista (1892-95). A partir do estudo das trajetórias desses dois personagens, compreende-se que na região fronteiriça platina, ao longo do século XIX, o federalismo esteve presente nas independências e na construção dos Estados Nacionais, inserido em diferentes projetos de organização dos Estados autônomos, dentre eles na Revolução Farroupilha e na Revolução Federalista. Palavras-chaves: Antonio de Souza Netto; Gaspar Silveira Martins; federalismo Introdução Esse artigo apresenta duas pesquisas que vem sendo desenvolvidas no projeto guarda-chuva intitulado História da América Platina e os processos de construção e de consolidação dos estados nacionais no século XIX e no início do século XX, coordenado pela Profa. Dra. Maria Medianeira Padoin. A primeira pesquisa intitulada “Os farroupilhas no contexto do processo de formação e consolidação dos estados nacionais no espaço fronteiriço platino” vem sendo desenvolvida com bolsa de Iniciação Cientifica Fapergs. O objetivo do projeto é estudar qual foi o destino político dos lideres da Revolução Farroupilha (1835 – 1845) após o conflito, se esses líderes atuaram ou não na política do Império, como por exemplo, a sua participação, caso tenha havido, na Guerra do Paraguai. Nesse sentido, propomos a analisar a atuação político-militar de Antônio de Souza Netto após o período de 1845, levando em conta que o mesmo participou militarmente ao lado do Império na Guerra do Paraguai (1864 – 1870). Por ter auxiliado o Império

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ANTÔNIO DE SOUZA NETTO E GASPAR SILVEIRA MARTINS: O FEDERALISMO NA PROVÍNCIA DO RIO GRANDE DO SUL NO SÉCULO

XIX.Monica Rossato

Mestranda do PPGH UFSM, bolsista FAPERGS/CAPESemail: [email protected]

Matheus Luis da SilvaAcadêmico do 10° semestre do curso de História UFSM, bolsista PROBIC/

FAPERGSemail:[email protected]

Profa. Dra. Maria Medianeira PadoinOrientadora, professora coordenadora do PPGH UFSM

email: [email protected]

RESUMOEste artigo procura analisar a trajetória e atuação política de Antônio de Souza Netto, proclamador da República Rio-Grandense (1836) e de Gaspar Silveira Martins, um dos líderes do Partido Liberal e da Revolução Federalista (1892-95). A partir do estudo das trajetórias desses dois personagens, compreende-se que na região fronteiriça platina, ao longo do século XIX, o federalismo esteve presente nas independências e na construção dos Estados Nacionais, inserido em diferentes projetos de organização dos Estados autônomos, dentre eles na Revolução Farroupilha e na Revolução Federalista.Palavras-chaves: Antonio de Souza Netto; Gaspar Silveira Martins; federalismo

Introdução

Esse artigo apresenta duas pesquisas que vem sendo desenvolvidas no projeto guarda-chuva intitulado História da América Platina e os processos de construção e de consolidação dos estados nacionais no século XIX e no início do século XX, coordenado pela Profa. Dra. Maria Medianeira Padoin.

A primeira pesquisa intitulada “Os farroupilhas no contexto do processo de formação e consolidação dos estados nacionais no espaço fronteiriço platino” vem sendo desenvolvida com bolsa de Iniciação Cientifica Fapergs. O objetivo do projeto é estudar qual foi o destino político dos lideres da Revolução Farroupilha (1835 – 1845) após o conflito, se esses líderes atuaram ou não na política do Império, como por exemplo, a sua participação, caso tenha havido, na Guerra do Paraguai.

Nesse sentido, propomos a analisar a atuação político-militar de Antônio de Souza Netto após o período de 1845, levando em conta que o mesmo participou militarmente ao lado do Império na Guerra do Paraguai (1864 – 1870). Por ter auxiliado o Império

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na Guerra do Paraguai, Antonio de Souza Netto foi nomeado Brigadeiro Honorário do Império (1858).

Entre 1845 a 1866, período em que finda a Revolução Farroupilha até o período que Netto morre em Corrientes, existe pouca reflexão sobre seu papel político militar. Neste sentido, partindo da perspectiva da historia política nos propomos a fazer um levantamento bibliográfico e documental desse personagem1.

Outra pesquisa que vem sendo desenvolvida é intitulada Relações de poder na região fronteiriça platina: trajetória atuação política de Gaspar Silveira Martins, pesquisa que vem sendo trabalhada em curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em História da UFSM, com bolsa FAPERGS/CAPES. Nessa pesquisa procura-se analisar a trajetória e atuação política de Gaspar Silveira Martins, especialmente o projeto de federalismo e as relações sociais construídas ao longo de sua trajetória na segunda metade do século XIX. Sob o viés da historia política e de uma pesquisa bibliográfica e documental propõe-se realizar alguns apontamentos a respeito da trajetória e atuação política de Silveira Martins no século XIX.

O estudo da trajetória e atuação política desses dois personagens, Antonio de Souza Netto e Gaspar Silveira Martins permitem analisar as relações de poder que foram construídas na região fronteiriça platina como estratégias de manutenção e perpetuação de poder. Alem disso, são indivíduos que estiveram engajados em projetos políticos influenciados pelas idéias de federalismo, autonomia, independência que circularam pela região platina ao longo do século XIX.

O federalismo, presente nos discursos políticos dos Farroupilhas e nos discursos de Silveira Martins procurava dar uma maior autonomia as províncias e descentralizar a arrecadação de impostos, reivindicando ao Rio Grande do Sul um tratamento especial no que se refere às questões econômicas. Além disso, a Revolução Farroupilha e seus ideais serão resgatados posteriormente pelos republicanos e pelo próprio Silveira Martins. O federalismo também estará presente na Revolução Federalista (1893-1895) que tinha como principal líder Gaspar Silveira Martins, contra o sistema republicano presidencialista instituído. A seguir realizamos alguns apontamentos a respeito da trajetória de Antonio de Souza Netto e Gaspar Silveira Martins.

Antônio de Souza Netto e Gaspar Silveira Martins: trajetória, atuação política e federalismo no século XIX.

1 As fontes utilizadas ao nosso trabalho compreendem documentos de Antônio de Souza Neto presentes no Fundo Autoridades Militares (1838-1866)Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

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Antonio de Souza Netto pode ser considerado como o segundo homem em importância, dentro da República Riograndense, de acordo com Dante de Laytano (1983) e Claudio Moreira Bento (1992). Esses autores também destacam que Netto teve uma brilhante carreira militar, alcançando o posto de Coronel da Legião da Guarda Nacional de Piratini, legião esta que foi convertida, durante a Revolução Farroupilha, em Brigada Liberal.

Proclamador da República Riograndense, Netto atuou na Revolução Farroupilha desde seu primeiro momento até seu ultimo instante. Comandou o Exército Farrapo e foi o responsável pelo mais longo cerco à cidade de Porto Alegre, sem poder tomá-la para os farroupilhas. Com o fim da guerra civil Netto foi morar no Uruguai, naquilo que alguns autores chamam de “auto exílio”.

Estudou na Freguesia de São Francisco de Paula (atual Pelotas) junto com seus irmãos Rafael e Domingos Netto (Rosa, 1935). Já adulto mudou-se para Bagé, onde se tornou estancieiro, criador de gado e cavalos. Logo após a incorporação da Província Cisplatina pelo Império Brasileiro, foi residir em terras onde hoje é o Uruguai. Na guerra Cisplatina (1825-1828), foi nomeado Capitão de Milícia e encarregado da defesa da fronteira. Com a criação da Guarda Nacional (1831) passou a ser Coronel de Legião da Guarda Nacional de Bagé. Alguns autores falam que ao iniciar o movimento de 1835, Netto era Comandante do Corpo da Guarda Nacional de Piratini, que era composto por recrutas de Piratini, Canguçu, Cerrito (Vila Freire atual), Bagé até Piraí, todos esses locais eram distritos pertencentes à vila de Piratini (criada por decreto imperial em 1830).

Estes resumidos dados podem ser encontrados em qualquer estudo mais elaborado que se proponha a fazer um levantamento do perfil de Netto. Talvez possam se juntar as descrições o fato de que lutou na Guerra do Paraguai a favor do Império do Brasil, foi nomeado Brigadeiro Honorário do Império e que abriu mão de seus vencimentos na Guerra do Paraguai. Porém, dentre 1845 até 1866, período em que finda a Revolução Farroupilha até o período que Netto morre em Corrientes, ainda carece de uma reflexão histórica acerca de sua atuação política. Sobre seu papel como segundo homem em importância da República Riograndense podemos afirmar que a questão é bem mais complexa. O fato de ter proclamado a república não torna Netto uma liderança incontestável dos farrapos. Sabemos que, entre outros, Bento Manoel Ribeiro teve uma relevância significativa tanto para as vitórias quanto para as derrotas sofridas por republicanos e realistas.

Antônio de Souza Netto identificou-se político e ideologicamente com o grupo da maioria. Esse grupo vai ter preponderância nas decisões sobre a guerra até meados de 1842, quando o grupo da minoria acende politicamente e vários integrantes da maioria, entre eles Antônio de Souza Netto e Bento Gonçalves, passam a ser contestados quanto

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lideranças políticas. Isso se deve aos constantes fracassos militares que a República sofre e as dificuldades de manutenção da guerra, bem como aos desentendimentos durante a assembléia geral constituinte de dezembro de 1842.

Após o fim da República Riograndense, a historiografia mais tradicional não menciona o destino político de Antônio de Souza Netto. E quando menciona, cai em contradição. Por exemplo, sobre ter ou não participado da guerra contra Oribe e Rosas: Dante de Laytano (1983), por exemplo, nos afirma que Netto participou da guerra contra Oribe e Rosas (1851-1852) e nesta oportunidade fora elevado a Brigadeiro Honorário do Imperial Exército Brasileiro. Moreira Bento (1992) diz, no entanto, que Netto jamais participara da Guerra contra Oribe e Rosas.

Sobre esta questão retomaremos mais adiante, mas é interessante notar que o próprio Claudio Moreira Bento diz em seu livro que Netto era um líder natural dos brasileiros vivendo no Uruguai, assinalando importância política no período embora para ele Netto parecesse uma liderança perigosa para o Império. Parece claro que este personagem vai continuar tendo uma participação política, principalmente como líder dos brasileiros no Uruguai. Na documentação que pesquisamos, pudemos ter acesso a documentos como a carta em que Netto aceita o posto de Brigadeiro do Exército Brasileiro:

Esta em meu poder o officio que V.Exª se dignou enviar-me a 18 de Maio, communicando ser o Exº Sr. Ministro da Guerra, em aviso de 19 de Abril, participando a essa Presidencia que Sua Majestade o Imperador houve por bem por Decreto do mesmo mês e igual anno, conceder-me as honras do Posto de Brigadeiro e uso dos competentes distintivos.Apreciando como he de meu grato dever [?], manifesto a V.Exª meu sincero reconhecimento e a adhesao do Augusto Monarcha. Deos Guarde V.Exª. Fazenda de Sta. Theotonia em Uruguay. 30 de Agosto e 1858. [Assina Antônio de Souza Netto]2

Como se pode ver, a data em que ele encaminha a Carta em que aceita o posto de Brigadeiro do Exército é cinco anos posterior a Guerra contra Oribe e Rosas. Nota-se também que assina de sua estância Santa. Theotonia, localizada em território do Uruguai. A partir disso, observamos as seguintes questões: A elevação ao posto de Brigadeiro pode ser um reflexo da sua atuação política no Uruguai? Acreditamos que sim, como nos diz Guazzelli (2009), Netto vai morar em território uruguaio após o fim da Farroupilha e ele e diversos chefes militares passam a ter constantes conflitos com os blancos de Oribe, que ocupavam a campanha e mantinham Montevidéu sob certo com o apoio político de Rosas. Assim esses chefes militares brasileiros, residentes no Uruguai, alegavam abusos por parte dos Blancos de Oribe. Netto comandava ataques em guerrilha contra as tropas dos blancos enquanto outros líderes como Francisco Pedro de Abreu (o Chico Pedro,

2 AHRGS – Fundo Autoridades Militares. Transcrição nossa.

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Moringue ou Barão do Jacuí) comandavam ataques e saques desde a fronteira3.Outra questão a ser considerada é que o Império necessitava de lideranças militares

para resguardar esta parte de seus domínios desde antes 1835 e, naquela época, ser uma liderança militar estava muito ligada a ser uma liderança política, social e também econômica. Além disso, estudos recentes de Ribeiro (2012), apontam que as guerras eram uma forma de ascensão política e social, muito significativas neste período.

Nesse sentido, nos questionamos a respeito de quais foram as atividades de Netto no Uruguai a favor do Império. Dentre tantas, uma bastante significativa, que também nos fala Guazzelli (2009), é a manutenção do poder imperial nesta região. Ao tratar da questão de Oribe e Rosas, e mais tarde, dos conflitos que levarão a guerra do Paraguai este autor destaca que o Império intercede em favor dos Riograndenses tanto em defesa dos estancieiros radicados no Uruguai, quanto em defesa da manutenção da ordem, uma vez que Netto poderia ser um grande líder de outra revolta que poderia novamente separar a província do Império.

A importância político militar de Netto no pós-farroupilha é também mencionada por Ana Luiza Setti Reckziegel (2011). De acordo com a autora, em 1863 Netto vai até o Rio de Janeiro interceder pelos estancieiros brasileiros radicados no Uruguai. Vale observar que o Barão do Jacuí, que fora braço direito, na Farroupilha, do então Barão de Caxias, também estava envolvido nos conflitos e mesmo assim o negociador foi o republicano Netto, que em 1836 havia separado a província do Império, não o ajudante do pacificador da província. Em partes Ribeiro (2012) responde essa questão ao nos dizer que o Barão do Jacuí havia perdido prestígio na Corte Imperial em função dos seus sucessivos ataques aos blancos. No entanto, Netto também agia em guerrilhas contra os blancos e também trazia problemas para o Império, além de ter proclamado a República Riograndense em 1836 e, ao que tudo indica, a não aceitação dos termos do Tratado de Paz firmado em 1845 por Canabarro e a minoria.

O próximo documento que analisamos aqui, já se trata de uma ordem do dia, escrita desde o Quartel General do Comando da Brigada Ligeira, em Bagé, na data de 19 de Outubro de 1964. E os outros documentos datam dos três últimos anos de vida do então Brigadeiro Antônio de Souza Neto e sua preparação, planejamento e deslocamento para a Guerra do Paraguai. Embora diga diversas vezes que a Brigada sob seu comando está em “deplorável estado”, confirma que segue o inimigo de perto disposto a combatê-lo, não podendo vitimá-lo por falta de recursos4.

3 José Iran Ribeiro (2012) faz uma análise que se aproxima um pouco do que também buscamos em nossa pesquisa, focando-se no personagem do Barão de Jacuí, comandante militar que luta em favor do Império na Farroupilha e que recebe o título nobiliário no final da mesma. O texto que citamos foi retirados Anais da III Reunião do Comitê Acadêmico História, Região e Fronteira da Associação de Universidades do Grupo Montevidéu, realizado em 2012 na Universidade Federal de Santa Maria – RS – Brasil.4 NETTO, Antônio de Souza. Fundo Autoridades Militares. AHRGS, 1865.

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Em outra carta, podemos ver que embora comandasse uma Brigada de Voluntários, ele recebia algum tipo de auxílio do Império para sua empreitada, como podemos notar na carta abaixo:

Segue a apresentar-se a V.Exª o Senhor José Antônio da Costa para recolher e conduzir o fardamento que V.Exª mandou manufaturar para a Brigada de meu Comando; e algum armamento (NETTO, Antônio de Souza. Fundo Autoridades Militares. AHRGS, 1865)

A importância político militar de Netto pode ser constatada em documento onde faz petição para a promoção de um soldado:

É verdade quanto a [?] allega, tendo a acrescentar que não obstante ser preterido, a desempenho de suas obrigações farão cheias de importância, V.Exª mandaria o que foi servido, tendo a declarar que é um jovem approveitavel para as armas e mais bem louvaria a nação quando a promossão ao posto de Capitão, que tem movimento e aptidão. Quartel General do Comando da Brigada Ligeira na Ilha de [?] em 1º de Março de 1865. [Assina Antônio de Souza Netto] (NETTO, Antônio de Souza. Fundo Autoridades Militares. AHRGS, 1865)

Esta documentação evidencia que Antônio de Souza Netto não perdeu sua importância político militar após a Revolução Farroupilha, pois participou na guerra do Paraguai e esteve sempre vinculado ao circulo de poder, à Elite governante que fazia parte. Mesmo tendo se rebelado contra o Império não perdeu seu status e sua importância, lutou e defendeu o Império mesmo tendo, ao que tudo indica, ideais republicanos. Isso não significava incoerência, pois segundo Padoin (2001), as idéias de república e federalismo não estavam consolidadas como na atualidade, em que os farroupilhas conheciam essas teorias e havia disputas internas na própria elite farroupilha sobre essas idéias.

A partir disso, compreende-se que o século XIX foi o período em que o espaço fronteiriço platino assistiu aos processos de construção e de consolidação dos Estados Nacionais. O estudo da trajetória, pensamento e projetos políticos de Antonio de Souza Netto e Gaspar Silveira Martins, não podem estar desvinculados da região fronteiriça platina. Assim, entendemos que eles circularam por esse espaço e estiveram em contato com ideais e projetos de organização de estados. Antonio de Souza Netto esteve inserido no grupo dos farroupilhas que reivindicavam em seus discursos o federalismo, a republica influenciados por idéias, leituras e autores que circulavam no Prata ao longo do século XIX. Gaspar Silveira Martins, oriundo de uma região fronteiriça, apresenta um projeto federalista em sua atuação política no Império.

Gaspar Silveira Martins nasceu na Fazenda Aceguá em 1834 e foi batizado em 1835 na Freguesia de Cerro Largo, hoje cidade de Melo no Uru-

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guai, terras de um espaço fronteiriço platino entre domínios e influências de brasileiros e uruguaios. Era filho do casal Carlos Silveira e Maria das Dores Martins, brasileiros, donos de uma vasta extensão de terras na região da fron-teira platina.

Seu tio materno, José Luis Martins casou-se com Maria Luísa Suarez, filha de Joaquim Suarez, presidente do Uruguai, conhecido como o “bene-mérito da pátria”. Uma das filhas do casal, Plácida Martins Suarez casou-se com Pedro Luis Osório, oficial do exército e irmão do general Osório. Além disso, o irmão de Silveira Martins, Baltazar da Silveira casado com D. Maria Inácia Martins morava na estância do Minuano, no Departamento de Taqua-rembó, no Uruguai. Seu outro irmão, Francisco Carlos Silveira e sua esposa Florentina Antiqueira moravam no Aceguá, Departamento de Cerro Largo, no Uruguai (CARVALHO, 1937).

Outra questão a ser considerada é o registro de seu sobrenome. O reg-istro do sobrenome materno “Martins” após o sobrenome paterno “Silveira” demonstra ser esta uma tradição espanhola, sendo comum sua utilização na região onde Gaspar foi batizado5. Nesse sentido, evidencia-se o vínculo e inserção de Silveira Martins na região fronteiriça platina, estabelecido pelo seu nascimento, pelas relações político-partidárias, econômicas e familiares com a região que configuraram e moldaram sua carreira e atuação política no Império brasileiro e na República.

Silveira Martins, ao cursar a Faculdade de Direito de São Paulo, esteve inserido nesse espaço de sociabilidade, construindo contatos e amizades importantes com futuros políticos do centro do Império. Após formar-se em Direito em 1856, foi convidado a ocupar o cargo de juiz municipal junto a Corte pelo então Ministro da Justiça do Império, o Barão de Muritiba, e casa-se com Adelaide Coutinho, filho de seu patrão, o advogado Lafayete Coutinho.

Após a experiência de juiz, retornou a Província do Rio Grande do Sul, onde juntamente com Félix da Cunha, reorganizaram o Partido Liberal Histórico, partido o qual atuou como Deputado Provincial, Deputado Geral, Ministro da Fazenda, Senador do Império e Presidente de Província.

A apresentação de uma proposta federalista nos seus discursos na Câ-mara dos Deputados e Senado Federal buscava reformar o sistema constitu-

5 Alvin (1985) afirma que a seqüência dos sobrenomes Silveira Martins respeita o costume do Uruguai (tradição espanhola), no qual o último sobrenome deve ser o da mãe. De acordo com Contreiras Rodrigues (1945) a ordem “Silveira Martins” foi adotado por uma pretensão estética.

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cional monárquico, descentralizando a administração e atribuindo uma maior autonomia as províncias e municípios que não tinham poder de legislar e decidir sobre os seus assuntos. A Província do Rio Grande do Sul deveria ter uma legislação fiscal separada, pois convivia com a presença de uma fronteira e do contrabando. Assim como a Província tinha um regime militar especial por parte do Império, deveria ter também uma legislação fiscal especial para proteger a indústria e o comercio que estariam sendo prejudicados pelo con-trabando e pela entrada de produtos a baixo custo vindos do porto de Monte-vidéu.

O federalismo partiria de uma descentralização administrativa do Império, atribuindo a cada província e município a organização do seu próprio governo. As províncias deveriam ter a autonomia de criar suas próprias leis de acordo com suas características regionais. Gaspar Silveira Martins pensou a organização das províncias a partir da criação de um executivo provincial, em que administraria e decidiria os interesses de cada província melhor do que os presidentes nomeados pelo governo central.6

Os municípios deveriam ser fortalecidos, segundo Silveira Martins. De acordo com a constituição do Império, os municípios estavam sob a tutela das Assembléias Provinciais que eram responsáveis por aprovar o orçamento, posturas e regimentos que as câmaras municipais deveriam adotar. A municipalidade naquele momento, segundo Silveira Martins “quando não depende immediatamente do ministro do império, esta submettida a assembléia provincial; as decisões desta são burladas pelo presidente da província, que é dependente dos ministros, que o são do chefe do Estado”.7 Então, a reforma nas municipalidades para Silveira Martins compreenderia a criação de conselhos municipais compostos por vereadores que escolhem um executivo municipal.

Para Silveira Martins, a idéia de organização dos municípios através da criação de conselhos municipais seguiu o exemplo da Itália, onde o conselho municipal de uma cidade de igual população da cidade do Rio de Janeiro teria 60 membros. Ou seja, o aumento da representação através do aumento do número de vereadores para compor os conselhos deveria ser proporcional as povoações, cidades ou vilas8. Os conselhos municipais eleitos eram o poder legislativo responsável por escolher a comissão executiva encarregada de administrar o município. Observa-se que a representação é coletiva e vem demonstrar a valorização ao poder legislativo a nível local por parte de Silveira Martins.

Ao buscar aumentar a representatividade nos municípios, Gaspar Silveira Martins

6 Gaspar Silveira Martins. Anais do Senado. Sessão do dia 27 de abril de 1882, p. 52. Os Anais do Senado estão disponíveis em: http://www.senado.gov.br/publicacoes/anais/asp/PQ_Pesquisar.asp.7 Gaspar Silveira Martins. A Reforma, 6 de julho de 1886. Museu de Comunicação Hipólito José da Costa.8 Gaspar Silveira Martins, loc cit.

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destacava que “Em alguns países tem voto nas eleiçoes municipaes os estrangeiros proprietários, as mulheres maes de família e que pagam impostos e ate as corporaçoes de mao morta”9. A partir desse seu discurso, pode-se refletir sobre o que consiste a representação eleitoral de Silveira Martins, pois parece que somente os indivíduos que possuem propriedade e que pagam impostos teriam o direito de participação política.

Na busca de aumentar a representatividade, Silveira Martins defendia uma reforma nas administrações municipais e provinciais. A representatividade pensada por Silveira Martins se inspiraria na monarquia inglesa, citando a Câmara dos Communs, “que é a verdadeira expressão do povo inglez, mas que houve uma época em que não representava senão o governo” 10. Assim, a representação do país deve ser livremente eleita e independente como a da Inglaterra, através da mesma prática de os governos irem ao Parlamento dar satisfação dos seus atos e procurar na soberania do povo a força para governar11. O povo, para Silveira Martins, é soberano para a escolha de seus representantes através da delegação de sua soberania. Portanto, a eleição direta e a liberdade de voto constituíam-se a base da representatividade, de acordo com Silveira Martins.

Mais tarde, ao se pronunciar durante a discussão de um projeto relativo ao alargamento do voto, aos juízes de paz e câmaras municipais, Silveira Martins defendeu que nas eleições municipais deveriam votar também os estrangeiros, pois era contrário a uniformidade das eleições municipais, justificando que a cidade do Rio de Janeiro não se achava em circunstâncias iguais a cidade de Goiás ou das aldeias do interior do Pará12. No que se refere à representação provincial, Silveira Martins enviou um requerimento a Câmara dos Deputados onde pedia o aumento da representação na província, na qual levasse em conta a quantidade de população existente na Província13.

A reforma constitucional reivindicada por Silveira Martins que procurava reformar a administração dos municípios e províncias era algo necessário para reanimar a instituição monárquica e reformar o sistema parlamentarista do Império. Sobre essas reformas que eram vistas como necessárias, Silveira Martins utilizou o exemplo dos Estados Unidos, onde ali os presidentes dos estados não eram nomeados pelo presidente da Federação, como acontecia no Brasil. Nos EUA, “cada estado da União é como um pequeno paiz soberano, tem sua constituição, seus códigos, sua magistratura: o governo de Washington só dirige os negócios federaes propriamente ditos”14.

9 Gaspar Silveira Martins, loc cit.10 Anais da Câmara dos Deputados. Sessão do dia 20 de dezembro de 1878, p. 104. Os Anais da Câmara dos Deputados estão disponíveis em http://imagem.camara.gov.br/diarios.asp.11 Ibid., p. 104.12 Anais do Senado. Sessão do dia 17 de maio de 1886.13 Ibidem. 14 Gaspar Silveira Martins. A Reforma, 10 de junho de 1886, p. 1.

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Nesse sentido, Silveira Martins deixa claro que:

Não fallo das confederações, reunião de estados com soberania local, como a Suissa, os Estados Unidos, a Allemanha e outros países; não fallo da Maior Bretanha, como chama Seeley, a grande federação inglesa da Europa, America, Ásia, áfrica e Oceania; mas da Grã-Bretanha, paiz unitário – que tem leis que so vigoram na Irlanda, ou só na Escóssia, ou só no Condado de Galles; fallo da Italia e ate da França, representante do tipo de centralismo, que não ´so tem leis especiaes para as colônias, mas ella própria tem muitas tarifas: - a chamada tarifas geraes e convencional15.

Percebe-se que Gaspar Silveira Martins fundamentou seus ideais através de exemplos de países unitários como a Inglaterra e até mesmo centralistas como e França, onde as leis elaboradas com base nas características locais e provinciais conviveriam ao lado de leis federais que vigoram em todo o território. Da mesma forma, ao lado da elaboração de leis com base nas especificidades de cada província, a criação de tarifas deveria ser a cargo da administração de cada província e região, pois muitos dos impostos recolhidos na província eram implantados pelo governo central e a sua arrecadação era dirigida ao Império.

Segundo Miriam Dolhnikoff (2005), Gaspar Silveira Martins se empenhou em descentralizar a arrecadação dos impostos enquanto ministro da Fazenda em 1877. A proposta de criação de uma tarifa especial para a Província do RS que buscava atender as principais praças comerciais da Província, prejudicadas pelo contrabando na fronteira e pela concorrência dos produtos platinos, foi apoiada por Gaspar Silveira Martins e decretada enquanto exercia o cargo de Ministro da Fazenda.

A tarifa especial foi executada por Silveira Martins, quando este era ministro da Fazenda do Império pelo decreto n. 7101, de 30 de novembro de 1878. A partir de 1º de janeiro de 1879, diversos produtos de importação chegaram a ter uma redução de 60% em relação às taxas comuns sobre mercadorias despachadas para consumo nas alfândegas do Rio Grande, Porto Alegre e Uruguaiana, na Província de São Paulo e na de Corumbá, em Mato Grosso (SOUZA, 2008). Em discurso na Câmara dos Deputados no ano de 1879, Gaspar se pronuncia:

Foi a tarifa uma medida fiscal para augmentar a renda do thesouro e não favor indébito para desfalcál-o em proveito de uma província. As fazendas que fazem objecto da tarifa especial mui poucas se importam pelas alfândegas, a totalidade entra de contrabando pelas fronteiras sem pagar direitos; o commercio licito difficulta-se na proporção que o contrabando prospera; as cidades marítimas decahem, enquanto as cidades da fronteira levantam-se pujantes (...) Foi, portanto, o interesse do thesouro que dictou essa disposição, verdadeira medida fiscal, que o nobre deputado por Pernambuco lançou-me em rosto como um acto de puro provincialismo16.

15 Anais do Senado. Sessão do dia 5 de setembro de 1888, p.554.16 Anais da Câmara dos Deputados. Sessão do dia 10 de janeiro de 1879, p. 413.Anais da Câmara dos Deputados. Sessão do dia 10 de janeiro de 1879, p. 413.

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Nesse fragmento do discurso de Silveira Martins está claro a tomada de uma medida fiscal a fim de melhorar a renda do tesouro, prejudicado pela entrada de produtos contrabandeados na região fronteiriça. Ao mesmo tempo, recebeu acusação do deputado José Mariano, da Província de Pernambuco, de ser uma medida provincialista, que beneficiaria apenas a Província do RS. Respondendo a esse mesmo deputado, Gaspar Silveira Martins se pronunciou em relação a essa conquista:

A tarifa não é um presente ao Rio Grande. Quinze annos vivi lutando naquela província por esta idéia que se acaba de realizar; dos meus adversários obtive o reconhecimento pleno deste direito e da justiça com que o reclamava: o gabinete de 7 de Março decretou a estrada de ferro do Rio Grande em 1873 por uma lei de cuja passagem fez questão de gabinete. Tal era o interesse que então ligava-se a esta medida altamente econômica e altamente patriótica, que obrigou o nobre deputado de Minas, o Sr. Martinho Campos a dizer – dou o meu voto porque essa estrada suppre um corpo de exércitos17.

A partir da sua fala evidencia-se sua atuação política a favor da aprovação da tarifa especial levada à discussão na Câmara dos Deputados e implementada pelo próprio ministro da Fazenda Gaspar Silveira Martins, em 1878. Porém, essas medidas não surtiram efeito em relação ao contrabando, pois imediatamente o Uruguai baixou o preço de suas tarifas e direitos de trânsito.

No ano de 1888, durante os trabalhos no Senado, Gaspar Silveira Martins apresenta uma emenda procurando rever a tarifa da Alfândega do RS, procurando dar a ela uma tarifa especial e integral para satisfazer as praças comerciais da Província e reduzir os impostos das repúblicas vizinhas.18 Nesse mesmo momento, Silveira Martins reclama também do imposto cobrado sobre o sal importado pela economia charqueadora da Província,

(...) porque mata a grande indústria da província; imposto impolitico, porque atira a província do Rio Grande do Sul nos braços do Estado Oriental. O sal, é matéria prima para a industria das carnes; e ao passo que no Estado Oriental e Republica Argentina paga elle um imposto insignificante de 60rs. por 100 litros, no Brazil paga-se pela mesma quantidade 1$, isto é: 919 rs. mais!19

Nesse sentido, a política tarifária era motivo de desavença entre a Província do RS e o governo central, pois os interesses dos comerciantes do litoral, da capital e da indústria do charque estavam sendo prejudicados com os entraves colocados à importação dos produtos comercializáveis e de matérias-primas. Assim como, se manifesta em seus discursos, o regime fiscal do Império que estaria arruinando e empobrecendo os rio-grandenses. Buscando atender esses grupos socioeconômicos incomodados pelo contrabando e pela

17 Ibid., p. 412 e 413.18 Anais do Senado. Sessão do dia 13 de novembro de 1888, pg. 554.19 Anais do Senado. Sessão do dia 14 de novembro de 1888, p. 555.

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concorrência dos produtos platinos, Gaspar Silveira Martins desabafa:

Os rio-grandenses não nos levantamos contra esses sacrifícios, que são necessários a defeza da pátria, e naturaes pela posição geographica da província; o que reclamamos é que a posição que nos reconhecem para sujeitar-nos a um regimen militar especial, nos seja igualmente reconhecida para nos darem regimen fiscal, que não nos empobreça e arruínem. Quem mais perdera com a conservação do status quo é o Estado, pois quanto mais exaggerados forem os impostos, mais lucro offerecerá o contrabando, e mais apoio encontrara nos povos, que por elle serão suppridos do necessário por preços muito mais barato20.

O comércio ilícito representado pelo contrabando era intensificado devido à política tarifária e impostos excessivos cobrados pelo governo imperial. O fim do contrabando só seria possível pela combinação de duas medidas, a redução dos impostos e fiscalização na fronteira, para Silveira Martins.

A atuação política de Silveira Martins junto a setores comerciais da Província, manifestando descontentamento com as políticas tarifária do governo central para com a Província também compõe seu projeto de federalismo, que buscava dar mais autonomia e poder às províncias, a partir de uma legislação fiscal específica sobre esses assuntos. Essa reivindicação de uma legislação fiscal separada para a Província do RS foi justificada pela presença do contrabando, das altas tarifas cobradas sobre matérias-primas para a indústria do charque e demais produtos importados e exportados pelo comércio da Província. Silveira Martins considerava a Província do RS uma região peculiar, devido à condição de ser uma Província de fronteira, em contato com o Estado Oriental e com a presença do contrabando, necessitando assim, de uma política tarifária e fiscal diferenciada.

Por ter atuado a favor dos grupos comerciantes da Província, Gaspar Silveira Martins foi homenageado pela Praça Comercial de Porto Alegre com a colocação de um retrato seu na sala de reuniões da Praça, segundo Franco (1980). Esse fato está presente em um dos seus discursos na Câmara dos Deputados em que: “A cidade de Porto Alegre, o commercio, não sabem quem, dignou-se, fez-lhe o favor não merecido, é o primeiro que reconhece, de mandar tirar o retrato do orador e remetê-lo para seu pai”21.

Conclusão

A partir da analise da trajetória e atuação política de Antonio de Souza Netto e Gaspar Silveira Martins percebe-se que ambos tiveram sua trajetória marcada por

20 Ibid., p. 558.21 Anais da Câmara dos Deputados. Sessão do dia 16 julho de 1879, p. 229.

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contatos e relações sociais na região platina. Nesse sentido, destacamos que as lideranças farroupilhas, mesmo tendo perdido a guerra, a república ter sido dissolvida e o território ter sido reintegrado ao Império em 1845, não foram totalmente excluídas do círculo de poder do Império do Brasil, assumindo postos militares neste e afirmando sua importância no mundo fronteiriço platino.

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