Apelação Cível n. 2009.007332-3

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Apelação Cível n. 2009.007332-3, de São Carlos Relator: Des. Newton Janke RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MATERIAL DECORRENTE DE ERRO DE ATO DE SERVIÇO DO CARTÓRIO DO REGISTRO CIVIL LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE NÃO OBRIGATÓRIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO DENUNCIANTE. NULIDADE INEXISTENTE. EQUÍVOCO DO NOME DA PESSOA FINADA NA EXPEDIÇÃO DA CERTIDÃO DE ÓBITO. FATO QUE IMPEDIU O AUTOR DE RECEBER A PENSÃO PREVIDENCIÁRIA POR MORTE DA ESPOSA. NECESSIDADE DE AJUIZAMENTO DE DEMANDA PARA RETIFICAÇÃO DO REGISTRO. RETARDAMENTO NA PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. DANO MATERIAL CARACTERIZADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. 1. "O Estado, na condição de delegante dos serviços notariais, responde objetivamente pela reparação dos danos que os tabeliães e registradores vierem a causar a terceiros em razão do exercício de suas funções" (AC n. 2007.061873-6, da Capital). 2. Se a falta de denunciação não implica na perda do direito de regresso nas hipóteses dos incs. I e II do art. 70, repugna aos princípios de economia e celeridade processual a idéia de se anular o processo em razão do indeferimento desse pleito, ainda quando a litisdenunciação fosse cabível. 3. "A indenização por dano material pode dizer respeito ao ressarcimento daquilo que, em cada situação, representou uma diminuição indevida do patrimônio do ofendido" (Resp 675147/RJ). Sob esta premissa, quem deixou de receber valores à que tinha direito em razão da atuação faltosa de preposto do Estado, deve ser indenizado na integralidade do montante a que, induvidosamente, fazia jus. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.007332-3, da comarca de São Carlos (Vara Única), em que é apelante Estado de Santa Catarina e apelado Sebastião Vargas:

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Responsabilidade civil. Julgado Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

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Apelação Cível n. 2009.007332-3, de São CarlosRelator: Des. Newton Janke

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOMATERIAL DECORRENTE DE ERRO DE ATO DE SERVIÇODO CARTÓRIO DO REGISTRO CIVIL LEGITIMIDADE PASSIVADO ESTADO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE NÃO OBRIGATÓRIA.AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO DENUNCIANTE. NULIDADEINEXISTENTE. EQUÍVOCO DO NOME DA PESSOA FINADANA EXPEDIÇÃO DA CERTIDÃO DE ÓBITO. FATO QUEIMPEDIU O AUTOR DE RECEBER A PENSÃOPREVIDENCIÁRIA POR MORTE DA ESPOSA. NECESSIDADEDE AJUIZAMENTO DE DEMANDA PARA RETIFICAÇÃO DOREGISTRO. RETARDAMENTO NA PERCEPÇÃO DOBENEFÍCIO. DANO MATERIAL CARACTERIZADO.RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE INDENIZARCONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO.

1. "O Estado, na condição de delegante dos serviçosnotariais, responde objetivamente pela reparação dos danosque os tabeliães e registradores vierem a causar a terceirosem razão do exercício de suas funções" (AC n.2007.061873-6, da Capital).

2. Se a falta de denunciação não implica na perda dodireito de regresso nas hipóteses dos incs. I e II do art. 70,repugna aos princípios de economia e celeridade processuala idéia de se anular o processo em razão do indeferimentodesse pleito, ainda quando a litisdenunciação fosse cabível.

3. "A indenização por dano material só pode dizerrespeito ao ressarcimento daquilo que, em cada situação,representou uma diminuição indevida do patrimônio doofendido" (Resp 675147/RJ). Sob esta premissa, quem deixoude receber valores à que tinha direito em razão da atuaçãofaltosa de preposto do Estado, deve ser indenizado naintegralidade do montante a que, induvidosamente, fazia jus.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.2009.007332-3, da comarca de São Carlos (Vara Única), em que é apelante Estadode Santa Catarina e apelado Sebastião Vargas:

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ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por unanimidade,negar provimento ao recurso. Sem custas.

1. RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo Estado de Santa Catarina contrasentença que, na ação indenizatória que lhe moveu Sebastião Vargas, julgouprocedente o pedido, condenando o réu "ao pagamento a título de Indenização pelosDanos Materiais causados ao autor, a importância de 01 (um) salário mínimo mensalentre o período de 26 de julho de 2003 até 21 de junho de 2006" (fl. 91), decorrentesda expedição, pelo Cartório de Registro Civil de São Carlos, da certidão de óbito daesposa do demandante com a grafia errada.

Em suas razões recursais, o apelante insiste no reconhecimento suailegitimidade passiva ad causam ao argumento de que "a responsabilidade civil porprestação defeituosa do serviço de Cartórios e Tabelionatos recai exclusivamente napessoa física do oficial titular" (fl. 118). Rechaçada este tese, pugna pelo decretaçãoda nulidade da sentença ante o indeferimento do pedido de denunciação à lide daregistradora que expediu a certidão de óbito com a grafia equivocada.

Quanto ao mérito propriamente dito, defende a inexistência de ato ilícitoa amparar o pleito indenizatório, argumentando que, em razão da existência dediversas grafias distintas nos documentos da esposa do apelado, não caberia exigirda cartorária conduta diversa da que adotou. Também assevera que não há qualquercomprovação do dano alegadamente sofrido pelo demandante. Por fim, requereu aredução da verba honorária fixada na sentença.

O recurso foi regularmente processado na origem.

2. VOTO

Discute-se no presente caso a responsabilidade do Estado de SantaCatarina pelo pagamento de indenização a particular em decorrência de danosmateriais causados em razão do cometimento de erro de grafia do nome da pessoafalecida em certidão de óbito expedida por Cartório de Registro Civil.

De início, cumpre repelir a aventada ilegitimidade passiva do entepúblico.

Com efeito, o Estado é parte legítima para figurar no pólo passivo dademanda posto que, malgrado o serviço notarial seja exercido por particulares,trata-se de atividade delegada do Poder Público.

A propósito, já assentou esta Corte que "o Estado, na condição dedelegante dos serviços notariais, responde objetivamente pela reparação dos danosque os tabeliães e registradores vierem a causar a terceiros em razão do exercício desuas funções" (AC n. 2007.061873-6, da Capital, Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros, j.

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Em 9/03/2008).Também não procede a investida tendente a nulificar a sentença por ter

sido indeferido ou inacolhido o pedido de denunciação da lide formulado nacontestação.

Independentemente de considerações a respeito do cabimento ou nãoda denunciação, o fato é que a ausência da formação dessa relação processualsecundária não é motivo para produzir a consequência pretendida pelo recorrente.

Conquanto o caput do art. 70, do Código de Processo Civil possa induzira outro entendimento, é certo que a denunciação da lide somente é obrigatória, sobpena da perda do direito de regresso, na hipótese do inciso I, conforme a precisa liçãode Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:

"Segundo indica o art. 70 do CPC, a denunciação da lide seria intervençãoobrigatória. Em verdade, a dicção do caput desse artigo diz mais do que queria (oupoderia), devendo-se entender o termo "obrigatória" - ressalvadas hipóteses em queoutras regras de direito efetivamente acoplem à figura alguma sanção própria para anão-denunciação - como a impossibilidade de, em não se efetivando a intervenção,exercer-se o direito de regresso no mesmo processo em que se questiona sobre arelação jurídica principal. Tomando-se essa afirmação por pressuposto, será forçosoconcluir que a denunciação da lide só será realmente obrigatória em um dos casos,ou seja, no de evicção (aquele previsto no inciso I do art. 70). A evicção é umagarantia, natural aos contratos comutativos, onde há obrigação de transferir domíniode determinada coisa, pela qual o alienante se obriga a reparar os prejuízos doadquirente (valor do preço pago, indenização dos frutos que tiver de devolver,despesas com o contrato e ainda despesas judiciais), case este venha a perder odomínio sobre a coisa em virtude de decisão judicial (que reconheça direito deterceiro anterior à aquisição). É de se sublinhar que a garantia da evicção pode serexcluída no contrato celebrado caso em que não operará esse benefício, nem teráutilidade a denunciação da lide. Existindo, todavia, a garantia da evicção, prevê odireito material (art. 456 do CC) a obrigatoriedade da denunciação, sob pena deperder o adquirente o direito resultante dessa garantia. Em relação aos demais casosde denunciação, não há propriamente obrigatoriedade na denunciação. Anão-efetivação da denunciação apenas impede que a ação subsidiária seja deduzidano mesmo processo em que se discute a relação principal" (in Manual do Processode Conhecimento. 5ª ed., São Paulo: RT, 2006, p. 190/191).

Se a falta de denunciação não implica na perda do direito de regressonas hipóteses dos incs. I e II do art. 70, repugna aos princípios de economia eceleridade processual a idéia de se anular o processo em razão do indeferimentodesse pleito, ainda quando a litisdenunciação fosse cabível.

Trata-se, aliás, de orientação consagrada pelo Superior Tribunal deJustiça:

"[...] 2. A 1ª Seção desta Corte, por ocasião do julgamento dos EREsp313.886/RN, Relª. Minª. Eliana Calmon, DJ 22/03/04, firmou o entendimento de que'A denunciação da lide só é obrigatória em relação ao denunciante que, nãodenunciando, perderá o direito de regresso, mas não está obrigado o julgador aprocessá-la, se concluir que a tramitação de duas ações em uma só onerará em

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demasia uma das partes, ferindo os princípios da economia e da celeridade naprestação jurisdicional. (...) A denunciação da lide ao agente do Estado em açãofundada na responsabilidade prevista no art. 37, § 6º, da CF/88 não é obrigatória,vez que a primeira relação jurídica funda-se na culpa objetiva e a segunda na culpasubjetiva, fundamento novo não constante da lide originária.'

3. Merece ser confirmado o aresto recorrido que indeferiu a denunciação à lideda empresa referida. Não sendo hipótese de obrigatória denunciação da lide paraassegurar o direito de regresso, atenta contra o princípio da celeridade processualadmitir no feito a instauração de outra relação processual que verse fundamentodiverso da relação originária, a demandar ampliação da dilação probatória, onerandoa parte autora.

4. Recurso especial não-provido" (Resp nº 835.325/SC, Rel. Min. JoséDelgado, j. em 03.08.06, DJ 31.08.06, p. 262).

"A inadmissão da litisdenunciação, além de harmonizar-se com o princípio daceleridade processual, não impede que exerça o denunciante o direito de regresso"(Resp nº 228.964/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, j. em 21.08.01, DJ 08.10.01, p. 196).

"Indeferida a denunciação da lide, e julgada a causa, com ressalva do direitode regresso contra o autor do ato danoso, não houve prejuízo ao denunciante, quedeva ser reparado, não se justificando a anulação do processo" (Resp nº 94.274/SP,Rel. Min. Hélio Mosimann, j. em23.02.99, DJ 17.05.99, p. 152).

E também desta Corte:

"Mesmo que devida a litisdenunciação, descabe a anulação do processo paraque seja intentada tal providência, em face do princípio da economia processual,uma vez que o direito de regresso poderá ser exercitado, sem prejuízo, em açãoprópria" (TJSC, Ap. Civ. nº 1999.003292-2, rel. Des. Volnei Carlin, j. em 14.03.02).

"[...] 2. 'Os princípios da economia e da celeridade podem justificar a nãoanulação parcial do processo onde indevidamente não se admitiu a denunciação dalide (CPC, art. 70, III), ressalvado ao denunciante postular seus eventuais interessesna via autônoma' (RSTJ 63/212)" (TJSC, Ap. Civ. nº 1997.002093-7, Rel. Des.Newton Trisotto, j. em 19.05.98).

Ultrapassadas as objeções processuais, cumpre enfrentar o méritorecursal.

Pretende o Estado apelante eximir-se de condenação ao pagamento deindenização imposta em decorrência dos danos materiais alegadamente sofridos peloautor em razão de erro de grafia na certidão de óbito de sua esposa.

É incontroverso que, tal como reconheceu a sentença, em razão do errono documento expedido pelo Cartório de Registro Civil de São Carlos, o autor viu sernegado pelo INSS a concessão de benefício previdenciário (pensão por morte) devidoem razão do falecimento de sua esposa.

Como se sabe, em situações como esta, onde há uma atuação depreposto do poder público – e, como mencionado linhas atrás, os notários assim são

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considerados -, a responsabilidade civil por danos decorrentes de tal atuação éobjetiva, nos exatos termos do § 6º do art. 37 da Constituição Federal.

O recurso do Estado escora-se em dois argumentos: a) a atuação dacartorária não se pautou por equívoco culposo em razão da falecida esposa doapelado, cujo verdadeiro nome era Angela Pinto Vargas, possuir diversos documentosgrafados com a designação lançada na certidão de óbito, qual seja, Angelina PintoVargas; b) não houve demonstração de dano por parte do autor.

No entanto, nenhuma destas duas teses se sustenta à vista do conjuntoprobatório, como bem assinalou a sentença no seguinte trecho:

"Ora, da análise dos autos, restou comprovado através da certidões de óbito(fls. 19 e 22) e de casamento (fls. 20 e 23) a troca do nome da falecida esposa dodemandante.

Por outro lado, os demais documentos, onde constam nomes diversos daquela,assim como sua certidão de nascimento, não são hábeis a desconstituir a decasamento, a qual se apresenta devidamente correta.

Outrossim, caberia à Oficiala, quando da realização da certidão de óbito, a qualconstava que a falecida tinha como estado civil o de casada, consultar, portanto, a decasamento, ante as divergências de nomes encontrados nos documentos da mesma,verificando-se, ainda, que o fato deve ser anotado à margem dos assentos denascimento e casamento, propiciando o conhecimento imediato sobre eventual mortede uma pessoa.

Desta feita, quando da realização deste registro (óbito), a divergência já seriaobservada pela Oficiala, a qual, em caso de dúvida, deveria verificar qual a certidãoque conteria o nome correto, uma vez que o autor da presente demanda se trata depessoa humilde e idosa, sem ter esclarecimentos acerca de qualquer ato sobremencionado registro.

No entanto, em razão disto, passou o demandante por conseqüência advindasda negligência do "agente" do réu, qual seja, ficar sem o recebimento do benefícioprevidenciário pelo lapso temporal de 03 anos, em razão do já mencionado erro,onde se verifica dos fundamentos da ação de retificação de registro de óbitoproposta pelo demandante nesta Comarca.

Assim, o demandado é o responsável, de forma objetiva, por seu agentepúblico, não havendo que se perquirir por sua culpa ou dolo, pois, o dano aconteceuem razão da atividade realizada sob seu controle, tendo a responsabilidade por base,não a culpa, mas pelo risco criado.

(...)Outrossim, verificou-se estar configurado o dano e o nexo de causalidade, pois,

foi em razão da negligência apurada pela Oficiala que o demandado deixou deperceber a quantia a ele devida pelo INSS, observados os requisitos necessáriospara a verificação da teoria da responsabilidade objetiva.

(...)Em relação a estes, analisando os documentos acostados aos autos,

verifica-se de maneira segura os prejuízos suportados pela vítima, pois, percebe-se,que restou juntado ao presente feito a carta de concessão da previdência social(fl.14), junto com os demais dados amealhados aos autos, estando relacionados coma presente causa" (fls. 89/91).

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Verificados, então, o dano e o nexo de causalidade deste com a atuaçãoda serventuária,indisputável o direito indenizatório perseguido pelo apelado.

Como se sabe, "a indenização por dano material só pode dizer respeitoao ressarcimento daquilo que, em cada situação, representou uma diminuiçãoindevida do patrimônio do ofendido" (Resp 675147/RJ, relª. Minª. Nancy Andrighi, j.20.03.2007).

Nessa perspectiva não poderia ser negado ao autor o ressarcimento daimportância que, sendo-lhe de direito, deixou de ser concedida pelo Institutoprevidenciário em razão do erro de grafia constante no assentamento do óbito dasegurada (esposa do demandante).

Apreciando situações semelhantes, onde se buscava atribuir ao Estadoo dever de indenizar os particulares prejudicados pela má prestação dos serviçosnotariais, esta Corte já decidiu:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO MOVIDA PELOSADQUIRENTES DO IMÓVEL VENCIDOS NA AÇÃO DE NULIDADE. ESCRITURADE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL, LAVRADA COM BASE EM PROCURAÇÃOPÚBLICA FALSA. AUSÊNCIA DE CAUTELA DO NOTÁRIO. DANO MORAL EMATERIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. SERVIÇOPÚBLICO DELEGADO A PARTICULARES. INDENIZAÇÃO DEVIDA ÀADQUIRENTE DE BOA-FÉ DE ACORDO COM O VALOR DO IMÓVELCONSTANTE NA ESCRITURA PÚBLICA. RECURSO DOS AUTORES PROVIDOPARCIALMENTE.

Cabível a condenação do Estado ao pagamento de danos morais decorrentede anulação de compra-e-venda, efetivada com base em instrumento de mandatofalso, lavrado em tabelionato de notas.

Demonstrado que a perda do imóvel decorreu exclusivamente de falsificaçãoem papel público de responsabilidade notarial, caracterizada está a obrigação doEstado de indenizar o valor despendido pela adquirente de boa-fé quando daaquisição do imóvel, ou seja, o valor descrito na escritura pública (...)" (TJSC, Ap.Cív. n. 2006.047282-1, de Criciúma. Rel. Des. Subst. Ricardo Roesler, j. em29/08/2008).

"ATO JURÍDICO - NULIDADE - AQUISIÇÃO DE IMÓVEL - PROCURAÇÃO EESCRITURA PÚBLICA LAVRADAS FRAUDULENTAMENTE - DENUNCIAÇÃO ÀLIDE DA FAZENDA PÚBLICA - TABELIÃO - SERVIÇO DELEGADO -RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATO PRATICADO PORPREPOSTO NO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE DELEGADA - INTELIGÊNCIA DOARTIGO 37, PARÁGRAFO 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL -INDENIZAÇÃODEVIDA À ADQUIRENTE DE BOA-FÉ DE ACORDO COM OVALOR DO IMÓVELCONSTANTE NA ESCRITURA PÚBLICA - RECURSOS E REMESSADESPROVIDOS.

1. O exercício da atividade de serviço notarial e de registro, em caráter privadopor delegação do Poder Público, consoante previsão na Constituição Federal (art.236), não desfigura a sua função eminentemente pública, ordenada e disciplinadapor normas de direito público, com a fiscalização do Poder Judiciário (§ 1º).

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Logo, quando o art. 22, da Lei n. 8.935/94 estabelece que - os notários eoficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem aterceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direitode regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos -, demonstra que aresponsabilidade civil resulta do desvio ou falha no exercício de uma função públicapor delegação do Estado em face de sua intervenção nos atos e fatos da vidaparticular para lhes conferir certeza e segurança jurídica.

Dessa forma, se o ato praticado ou o serviço prestado pelo titular do serviço seinsere no âmbito dessa função pública delegada, a relação jurídica aí existente éeminentemente de natureza pública, devendo o Estado ser responsabilizadoobjetivamente pelo ato do tabelião, caracterizado como agente público e,conseqüentemente, acolhido pela norma constitucional do art. 37, § 6º, garantido odireito de regresso contra o responsável.

2. Restou comprovado que o mandato lavrado está eivado de nulidade, eis queos verdadeiros proprietários sequer tinham conhecimento de sua existência,inexistindo portanto a manifestação de vontade, requisito essencial para configurar oato jurídico. Assim, nulos também são os atos dele decorrentes.

3. Demonstrado que a perda do imóvel decorreu exclusivamente de falsificaçãoem papel público de responsabilidade notarial, caracterizada está a obrigação doEstado de indenizar o valor despendido pela adquirente de boa-fé quando daaquisição do imóvel, ou seja, o valor descrito na escritura pública" (TJSC, Ap. Cív. n.2001.008736-7, de Chapecó. Rel. Des. Nicanor da Silveira, j. em 21/10/2004).

"Responsabilidade civil do Estado. Indenização a particular lesado por ato deagente do Estado na compra de imóvel, em que representado o suposto vendedorpor mandatário munido de procuração pública falsificada.

- Responsabilidade objetiva do Estado, decorrente do § 6º do art. 37 da CF, porato de agente seu, como o é o delegado de serviços notariais, como o atesta ampladoutrina.

(...)- Prova inequívoca do ato ilícito e existência nos autos de elementos para

definir o valor da indenização, pelo que substituída a forma de liquidação, dearbitramento, para a de que trata o art. 604 do CPC" (TJSC, Ap. Cív. n. 99.009079-5,da Capital. Rel. Des. João José Schaefer, j. em 18/11/1999).

À luz destes precedentes e das considerações antes externadas, votopelo desprovimento do recurso.

3. DECISÃO

Nos termos do voto do relator, decidiu a Câmara, por unanimidade,negar provimento ao recurso.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos.Desembargadores Cid Goulart e João Henrique Blasi.

Florianópolis, 15 de março de 2011.

Newton Janke

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PRESIDENTE E RELATOR

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