Apelação ZPA

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Tribunal de Justiça RIO GRANDE DO NORTE FL.______________ Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte Apelação Cível n° 2011.002862-4 Origem: 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN. Apte/apdo: Município de Natal. Procurador: Aldo de Medeiros Lima Filho. 1662/RN Apte/apdo: Flávio Leite D. Rezende Advogado: Araken Barbosa de Farias Filho Litis. Pass.: Lourival Tomaz de Brito, Francisco de Assis da Silva, João Inácio de Melo, José Marconi Guimarães, Ozete Barbosa de M. Souza, Josileide M. Ataíde Nascimento, Manoel dos Santos Advogados: Carlos Roberto de Araújo, Antonio Carlos P. Nunes, Alexandre Cunha de Carvalho, Rychardson de M. Bernardo e outros. Apelado: Ministério Público Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro. EMENTA : DIREITO PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINAR DE NULIDADE PROCESSUAL SUSCITADA PELO RELATOR. LITISCONSORTE NECESSÁRIO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. ACOLHIMENTO. 1. Constatada a ausência de citação de litisconsorte necessário, impõe-se a nulidade processual a partir de quando 1

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Direito Ambiental. Construções em área de duna. Ingresso de Litisconsortes Passivos. Preliminares de Ilegitimidade passiva ad causam e inépcia da inicial rejeitadas. Zona de proteção ambiental. Impossibilidade de construção Aplicação do art. 18 da Lei Complementar Municipal nº 82/2007 (Plano Diretor de Natal). Procedência da pretensão.

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Tribunal de Justiça RIO GRANDE DO NORTE

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Poder JudiciárioTribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte

Apelação Cível n° 2011.002862-4

Origem: 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN.

Apte/apdo: Município de Natal.

Procurador: Aldo de Medeiros Lima Filho. 1662/RN

Apte/apdo: Flávio Leite D. Rezende

Advogado: Araken Barbosa de Farias Filho

Litis. Pass.: Lourival Tomaz de Brito, Francisco de Assis da Silva, João Inácio de Melo,

José Marconi Guimarães, Ozete Barbosa de M. Souza, Josileide M. Ataíde Nascimento,

Manoel dos Santos

Advogados: Carlos Roberto de Araújo, Antonio Carlos P. Nunes, Alexandre Cunha de

Carvalho, Rychardson de M. Bernardo e outros.

Apelado: Ministério Público

Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL.

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

PRELIMINAR DE NULIDADE PROCESSUAL SUSCITADA

PELO RELATOR. LITISCONSORTE NECESSÁRIO.

AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. ACOLHIMENTO.

1. Constatada a ausência de citação de litisconsorte necessário,

impõe-se a nulidade processual a partir de quando deveria ter se

realizado o indispensável ato. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as

acima identificadas:

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível

deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, e em dissonância com o parecer

ministerial, acolher a preliminar de nulidade processual suscitada pelo Relator, nos termos do

seu voto, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

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Tratam-se de Apelações interpostas pelo Município de Natal e

por Flávio Leite Dantas de Rezende contra sentença proferida pelo juiz da 2ª Vara da Fazenda

Pública da Comarca de Natal que, nos autos de Ação Civil Pública, determinou ao Município

a demolição dos imóveis construídos na área correspondente a ZPA 10, no prazo de noventa

dias, bem como que realizasse a recuperação da área degradada no prazo de dez meses, a

contar do trânsito em julgado da decisão.

Em suas razões (fls. 394/402), o Município de Natal alegou que

a sentença se deu além do pedido, violando os artigos 459 e 460 do Código de Processo Civil,

uma vez que o pleito se restringia à demolição das construções irregulares constantes da

referida área, e não de todos os imóveis.

Disse, ainda, que o prazo fixado na sentença para a demolição e

recuperação da zona ambiental é por demais exíguo, existindo um impedimento técnico por

parte do município para cumpri-lo, tendo em vista a necessidade de instauração de processos

administrativos para a correta identificação das construções irregulares, o que demanda tempo

superior ao estabelecido como prazo.

Juntou documentos às fls. 403/404.

Flávio Leite D. de Rezende alegou às fls. 405/416 que o seu

imóvel não pode ser considerado construção irregular pois possui Escritura Pública de Cessão

de Direitos Aquisitivos e Carta de Aforamento.

Sustentou que a sentença feriu a razoabilidade ao buscar a

proteção de pequena área ambiental ao custo do desabrigo de várias famílias. Disse que os

direitos em conflito são de índole constitucional (princípio da dignidade da pessoa humana,

direito à moradia e direito ambiental) e não foram devidamente sopesados.

Afirmou não ser mais possível o reflorestamento da área.

Alternativamente, pediu a fixação de indenização pela

demolição de sua moradia, a ser paga pelo Município.

Em contrarrazão às fls. 418/122, o Município de Natal disse não

ser devida indenização pela futura demolição das residências, uma vez que suas construções

ocorreram de forma irregular, sem o competente Alvará.

O Ministério Público, em contrarrazões (fls. 423/425v) pediu,

em síntese, a manutenção da sentença.

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A Décima Sexta Procuradoria de Justiça, em substituição à

Vigésima Procuradoria, opinou, em resumo, pelo desprovimento dos apelos.

Lourival Tomaz de Brito requereu habilitação nos autos (fls.

443/444), que restou deferida (fls. 453) por este Relator.

É o breve relato.

VOTO

I. PRELIMINAR DE NULIDADE PROCESSUAL, SUSCITADA PELO RELATOR.

Após uma detida análise dos autos, constatei a ausência de

pressuposto de desenvolvimento regular do processo: citação de litisconsorte passivo

necessário, o que enseja a nulidade processual a partir de quando deveria ter se realizado o

indispensável ato.

Verifica-se às fls. 64 ss, que a Secretaria Especial de Meio

Ambiente e Urbanismo do Município de Natal, em atendimento à solicitação do Ministério

Público (fl. 62), fez um levantamento das construções clandestinas da área em questão,

individualizando os proprietários e os respectivos imóveis.

Considerando os documentos à fl. 136v e fl. 184, vê-se que fora

identificada a construção no terreno “K”, na R. Ex-combatente Jaime da Silva, s/n, bairro Mãe

Luíza, como de propriedade do Sr. Frederico Alexandre Medeiros, que não chegou a ser

citado, como se verifica à fl. 331v (2º vol.), pelo motivo de não residir no endereço constante

do mandado, qual seja, R. Largo do Farol, 100, bairro Mãe Luíza, o que revela ter havido um

equívoco na indicação do endereço do litisconsorte, não tendo sido tomada qualquer

providência para a sua sanação.

Ora, o Sr. Frederico Alexandre Medeiros, sendo um dos

proprietários de imóvel irregularmente construído, é pessoa diretamente atingida pelo

resultado da demanda, donde patente o seu interesse jurídico no deslinde do caso, devendo lhe

ser facultada a defesa do seu interesse, em atenção aos princípios da ampla defesa e

contraditório, figurando nesta lide como litisconsorte passivo necessário, nos termos do art. 47

do Código de Processo Civil. Verbis:

Art. 47. Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de

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lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a

lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a

eficácia da sentença dependerá da citação de todos os

litisconsortes no processo.

Devido à redação não técnica do dispositivo legal, valho-me das

palavras de Nelson Nery Jr. (Código de Processo Civil Comentado, 11ª ed., p. 273) a respeito

do litisconsórcio necessário:

“... o litisconsórcio pode ser classificado em necessário e

facultativo. É necessário quando a lei ou a natureza da relação

jurídica discutida em juízo determina sua formação,

independentemente da vontade da parte.”

Há precedentes desta Corte em julgados semelhantes, em que

não houve a citação de litisconsorte necessário, e, consequentemente, foi determinada a

nulidade processual: Ap. Cível nº 2010.014405-9, Rel. Des. Expedito Ferreira, j. 23/08/2011;

Ap. Cível nº 2008.009761-2, Rel. Des. Amaury Moura Sobrinho, j. 05/03/2009; Ap. Cível nº

2008.000665-9 Rel. Des. Cláudio Santos, j. 10/04/2008. A título de ilustração, colaciono a

seguinte ementa:

EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.

APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NULIDADE DO

PROCESSO, POR AUSÊNCIA DE FORMAÇÃO DE

LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO, SUSCITADA

PELO RELATOR. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA E,

COMO TAL, ARGÜÍVEL EX OFFICIO.  SERVIDOR

PÚBLICO APOSENTADO. AÇÃO ORDINÁRIA AJUIZADA

UNICAMENTE EM FACE DO ESTADO. INTELIGÊNCIA

DA LEI COMPLEMENTAR Nº 308/2005. PRETENSÃO QUE,

EM CASO DE SER ACOLHIDA, REPERCUTIRÁ NA

ESFERA JURÍDICA DO IPERN, ANTE AS ATRIBUIÇÕES A

ESTE CONFERIDAS PELO CITADO DIPLOMA LEGAL.

INTEGRAÇÃO À LIDE. NECESSIDADE.  PRELIMINAR

QUE SE ACOLHE, PARA DECRETAR A INVALIDADE DO

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PROCESSO E DETERMINAR A CITAÇÃO DO

LITISCONSORTE NECESSÁRIO, NOS TERMOS DO ART.

47 DO CPC, FICANDO PREJUDICADO O EXAME DO

APELO. (Ap. Cível 2010.002525-4 – Rel. Cláudio Santos, j.

09/11/2010)

Por pertinente, colaciono, ainda, o seguinte julgado do Tribunal

de Justiça do Distrito Federal:

“Ementa: AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. QUERELA NULLITATIS INSANABILIS. DESCONSTITUIÇÃO DE SITUAÇÃO JURÍDICA FORMADA ENTRE AUTOR E RÉU. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DO RÉU DO PROCESSO QUE SE PRETENDE RECONHECER A NULIDADE. RETORNO À ORIGEM.1. O escopo da tutela jurisdicional buscada em uma querela nullitatis insanabilis lança-se sobre situação jurídica construída por norma jurídica concreta, materializada em sentença judicial. Por ser a relação processual (processo) uma espécie de relação jurídica que liga autor e réu, certo é que, em uma querela nullitatis insanabilis, a solução jurisdicional atingirá as esferas jurídicas do autor e do réu do processo objeto de exame de modo uniforme. 2. Com esteio no disposto no art. 47, do CPC, conclui-se que, em uma querela nullitatis insanabilis movida por terceiro ao processo que se pretende reconhecer nulo, é imprescindível que integrem o polo passivo da querela o autor e o réu (litisconsortes passivos necessários unitários).3. Verificada a ausência de citação de um dos litisconsortes passivos necessários, evidencia-se a nulidade do processo desde a citação, devendo os autos retornar à Origem, para que, sob pena de extinção, seja oportunizada a promoção da citação do litisconsorte faltante (art. 47, parágrafo único, do CPC).4. Nulidade do processo relativa à querela nullitatis insanabilis reconhecida com a determinação de retorno dos autos à Origem.”(20090710180885APC, Relator J.J. COSTA CARVALHO, 2ª Turma Cível, julgado em 26/10/2011, DJ 04/11/2011 p. 72)Por fim, friso que em casos dessa espécie, em que não houve a

citação de litisconsorte necessário, a sentença é considerada ineficaz para alguns

doutrinadores (Nelson Nery Jr1), ou inexistente para outros (Alvim Wambier2), mas o fato é

1 Código de Processo Civil, 11ª ed., p. 277.2 in in Nelson Nery Jr, Código de Processo Civil, 11ª ed., p. 276.

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que será incapaz de produzir qualquer efeito, como, por exemplo, a coisa julgada, em razão do

vício transrescisório (ausência de citação).

Ante o exposto, em dissonância com o parecer ministerial, voto

pela declaração de nulidade processual desde a citação, determinando o retorno dos autos à

origem a fim de se oportunizar ao autor a promoção da citação do litisconsorte passivo

necessário faltante, Frederico Alexandre de Medeiros, sob pena de extinção do processo.

Prejudicado o exame dos recursos interpostos.

Natal, 23 de fevereiro de 2012.

DESEMBARGADOR AMAURY MOURA SOBRINHOPresidente

DESEMBARGADOR VIVALDO PINHEIRORelator

Dra. MARIA DE LOURDES MEDEIROS DE AZEVEDO15ª Procuradora de Justiça

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