APLICAÇÃO DO MODELO SHALSTAB PARA A DEMARCAÇÃO DE … · Introdução Os escorregamentos são...

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APLICAÇÃO DO MODELO SHALSTAB PARA A DEMARCAÇÃO DE ÁREAS SUSCETÍVEIS A ESCORREGAMENTOS NO MUNICÍPIO DE ITATIAIA-RJ Diego M. Carvalho¹, Otávio A. de A. Pessoa¹, Irina A. da Silveira¹, Roberto A. T. Gomes¹, Osmar A. de Carvalho Júnior¹ ¹Universidade de Brasília - Departamento de Geografia – Laboratório de Sistemas de Informações Espaciais ([email protected]; [email protected] ; [email protected] ; [email protected] ; [email protected] ) Introdução Os escorregamentos são eventos de ordem natural que fazem parte da dinâmica externa do processo de modelagem da superfície terrestre (FERNANDES e AMARAL, 2006). Porém, sua ocorrência pode estar relacionada a intervenções antrópicas que alteram o estado de equilíbrio das encostas, como por exemplo, cortes feitos para a construção de estradas ou casas, desmatamento, deposição de lixos em áreas inadequadas, entre outros. Os deslizamentos ganharam grande repercussão por estarem relacionados a catástrofes responsáveis por grandes perdas, humanas e materiais. Porém, não se pode atribuir o aumento no número destes desastres diretamente a um aumento no número de casos de deslizamentos, pois o que tem sido observado é o aumento da ocupação de áreas inadequadas, principalmente por parte da população de baixa renda, que por não ter acesso a áreas adequadas à moradia, ocupam áreas muito suscetíveis a deslizamentos, como as encostas. Sendo assim, a ocorrência de deslizamentos deixa de ser apenas um processo de modelagem do relevo ou um problema unicamente ambiental, e passa a representar um grave problema sócio-econômico que exige a implementação de políticas públicas objetivas, que atuem no sentido de demarcar as áreas de risco impróprias para a ocupação, prevenindo dessa forma que fenômenos naturais se transformem em catástrofes. Nesse sentido, o presente artigo tem como objetivo principal a aplicação do modelo SHALSTAB para a demarcação das áreas suscetíveis a escorregamentos. Como área de aplicação, foi escolhido o município de Itatiaia, localizado no Estado do Rio de Janeiro. Área de Estudo A área de estudo está localizada entre as coordenadas 44°28’ e 44°40’W, 22°19’ e 22°34’S, na porção oeste do estado do Rio de Janeiro, e faz divisa com o estado de Minas

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APLICAÇÃO DO MODELO SHALSTAB PARA A DEMARCAÇÃO

DE ÁREAS SUSCETÍVEIS A ESCORREGAMENTOS NO

MUNICÍPIO DE ITATIAIA-RJ Diego M. Carvalho¹, Otávio A. de A. Pessoa¹, Irina A. da Silveira¹, Roberto A. T. Gomes¹, Osmar A. de Carvalho Júnior¹

¹Universidade de Brasília - Departamento de Geografia – Laboratório de Sistemas de Informações Espaciais ([email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected])

Introdução

Os escorregamentos são eventos de ordem natural que fazem parte da dinâmica externa

do processo de modelagem da superfície terrestre (FERNANDES e AMARAL, 2006). Porém,

sua ocorrência pode estar relacionada a intervenções antrópicas que alteram o estado de

equilíbrio das encostas, como por exemplo, cortes feitos para a construção de estradas ou

casas, desmatamento, deposição de lixos em áreas inadequadas, entre outros.

Os deslizamentos ganharam grande repercussão por estarem relacionados a catástrofes

responsáveis por grandes perdas, humanas e materiais. Porém, não se pode atribuir o aumento

no número destes desastres diretamente a um aumento no número de casos de deslizamentos,

pois o que tem sido observado é o aumento da ocupação de áreas inadequadas, principalmente

por parte da população de baixa renda, que por não ter acesso a áreas adequadas à moradia,

ocupam áreas muito suscetíveis a deslizamentos, como as encostas.

Sendo assim, a ocorrência de deslizamentos deixa de ser apenas um processo de

modelagem do relevo ou um problema unicamente ambiental, e passa a representar um grave

problema sócio-econômico que exige a implementação de políticas públicas objetivas, que

atuem no sentido de demarcar as áreas de risco impróprias para a ocupação, prevenindo dessa

forma que fenômenos naturais se transformem em catástrofes.

Nesse sentido, o presente artigo tem como objetivo principal a aplicação do modelo

SHALSTAB para a demarcação das áreas suscetíveis a escorregamentos. Como área de

aplicação, foi escolhido o município de Itatiaia, localizado no Estado do Rio de Janeiro.

Área de Estudo

A área de estudo está localizada entre as coordenadas 44°28’ e 44°40’W, 22°19’ e

22°34’S, na porção oeste do estado do Rio de Janeiro, e faz divisa com o estado de Minas

Gerais (Fig. 1). Possui uma área de aproximadamente 225km², sendo que, cerca de 36% desta

área faz parte do Parque Nacional do Itatiaia (PNI).

Do ponto de vista climático, prevalece na região, o clima Tropical de Brasil Central,

com temperaturas médias variando entre 22 e 24°C nos meses mais quentes, e entre 18 e 20°C

nos meses mais frios. Com relação à pluviosidade, de acordo com o Instituto Nacional de

Meteorologia (INMET), o índice de chuva acumulada é maior entre os meses de janeiro a

março e entre outubro e dezembro, período em que o mínimo chega a 120 mm e o máximo

pode atingir 300 mm. No período de abril a setembro, verifica-se uma queda no índice,

variando entre 30 e 50 mm nos meses mais secos, geralmente junho e agosto.

Na região são encontrados os seguintes solos: gleissolo, latossolo, cambissolo e litólico.

Com relação à suscetibilidade à erosão, Guerra (2006) classifica estes tipos de solo da

seguinte maneira: o gleissolo, devido à sua localização em áreas planas, não favorece esse

fenômeno; o latossolo possui baixa suscetibilidade; o cambissolo possui suscetibilidade

variável, dependendo de sua profundidade, declividade do terreno, teor de silte e do gradiente

textural; já o solo litólico é o que apresenta a maior suscetibilidade a escorregamentos.

Com relação à geomorfologia, o município do Itatiaia está inserido na faixa de

Dobramentos e Coberturas Metassedimentares Associadas, que é um grande domínio

morfoestrutural. Ao norte se encontra parte da Serra da Mantiqueira, onde se verifica a

ocorrência de escarpas e reversos, ao passo que, ao sul, na região drenada pelo rio Paraíba do

Sul, encontra-se uma região marcada por depressões.

Fig. 1 - Mapa de localização do município de Itatiaia

Metodologia

A questão da demarcação das áreas suscetíveis a escorregamentos é aqui subsidiada pela

aplicação do modelo matemático determinístico em bases físicas.

Modelo SHALSTAB

O modelo SHALSTAB é um modelo matemático determinístico que tem por intuito a

delimitação das áreas mais suscetíveis à ocorrência de escorregamentos translacionais rasos.

Para isso, ele tem como variáveis controladoras da deflagração do escorregamento a

declividade e a área de contribuição.

De acordo com Fernandes et al. (2001) “em termos gerais, o modelo SHALSTAB

analisa, para cada célula dentro de um grid, obtido a partir de um modelo digital de terreno, o

resultado da combinação de um módulo hidrológico com um módulo de estabilidade. ”

O primeiro módulo, modela os locais na paisagem que estarão submetidos a saturação, o

segundo simula a estabilidade de uma porção de solo situada diretamente sobre o

embasamento rochoso. Para a análise desses módulos são incorporados parâmetros climáticos

e diversas propriedades do solo.

O modelo gera 7 classes que podem ser descritas da seguinte forma: A –

Incondicionalmente Instável e saturado; B - Incondicionalmente estável e não saturado; C -

Estável e não saturado; D - Instável e não saturado; E - Instável e saturado; F -

Incondicionalmente instável e não saturado e G - Incondicionalmente instável e saturado.

Para maiores informações sobre as formulações matemáticas do modelo ver Guimarães

et al(2003).

Aplicação do modelo SHALSTAB no Município de Itatiaia – RJ

Para a aplicação do modelo foram seguidas as seguintes fases: 1 - Obtenção e

estruturação dos dados; 2 - geração do modelo digital de terreno, mapas derivados e

demarcação da área a ser aplicado o Modelo SHALSTAB; 3 - aplicação do modelo

SHALSTAB para confecção do mapa de suscetibilidade a escorregamentos. Essas fases serão

respectivamente descritas a seguir:

1 – Obtenção de cartas topográficas da região de estudo na escala 1:50.000 em formato

vetorial e matricial, a partir do sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

As cartas vetoriais em formato DGN foram convertidas para o formato Shape File; As cartas

matriciais, referentes aos fotolitos sépia e azul, foram georreferenciadas e vetorizadas. Após

esses processos todos os dados foram unidos; a direção de fluxo, dos rios, foi corrigida e os

valores das cotas das curvas de nível e pontos cotados foram adicionados.

2 – Utilizando a ferramenta Topo To Raster do Software ArcGIS 9.2, foi gerado um

MDT com resolução espacial de 10m. O MDT serviu de base para a geração dos seguintes

mapas derivados: declividade, direção de fluxo e área de contribuição.

A partir do mapa de direção de fluxo foram delimitadas as bacias que estavam contidas

ou intersectavam os limites do município. Para delimitar a área de interesse em que o modelo

seria aplicado foram seguidas as seguintes regras: fariam parte da área de interesse todas as

bacias completamente contidas nos limites do município; todas as bacias que tivessem seu

exutório no interior do município e somente a parte, que estivesse dentro do município,

daquelas bacias que possuíssem seu exutório na região externa ao limite do município.

3 – A terceira etapa é relativa à aplicação do modelo shalstab, para isso, foram

importados para o Software ArcView os mapas de declividade, área de contribuição e o MDT,

os quais foram utilizados para o cálculo da relação Q/T através da ferramenta SHALSTAB.

Foram consideradas para esse cálculo uma densidade de 2000 kg/m3 para o solo e um ângulo

de atrito de 45º, conforme Gomes et al. (2008). Não foi considerada neste trabalho a coesão

do solo. Assim, pôde-se criar um geo-campo temático, cujos, valores representam a

susceptibilidade à ocorrência de escorregamentos translacionais.

Resultados e discussões

O resultado final do trabalho foi a obtenção do mapa de suscetibilidade do município do

Itatiaia (fig. 2).

A análise do mapa permite concluir que o município não possui grandes áreas

suscetíveis a escorregamentos, visto que somente cerca de 3% da área analisada pertence às

classes D,E,F e G, consideradas de risco. E além, verifica-se que a maior parte dessas áreas

estão situadas dentro do limite do PNI.

Conclusão

A relação entre os resultados obtidos e a metodologia aplicada, pode ser considerada

satisfatória, mesmo utilizando cartas em uma escala relativamente pequena. A principal

vantagem dessa metodologia, que privilegia o papel desempenhado pelo relevo no

condicionamento dos escorregamentos translacionais, é a agilidade, visto que além dos dados

provenientes das cartas topográficas podem ser utilizados dados de sensores imageadores que

Fig. 2 - Mapa de Suscetibilidade a escorregamentos

gerem imagens com informações altimétricas.

Assim, conclui-se que o modelo SHALSTAB trata-se de uma ferramenta eficaz no

planejamento da ocupação do território, visto que, diminui a subjetividade na determinação de

áreas cuja vulnerabilidade a esse risco ambiental é alta.

A adição de outros parâmetros ao modelo, juntamente com observações de campo,

podem melhorar a acurácia das previsões. Por isso é importante a continuidade dos estudos.

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