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X Simpósio de Recursos Hídricos do Nordeste 1 APLICAÇÃO DO MODELO HIDROLÓGICO SWAT (Soil and Water Assessment Tool) PARA A SIMULAÇÃO DA PERDA DE SOLO E DA DISPONIBILIDADE HÍDRICA EM UMA BACIA HIDROGRÁFICA NÃO INSTRUMENTADA Éverton Blainski 1 ; Luis Hamilton Pospissil Garbossa 2 & SimoneMalutta 3 RESUMO --- A preocupação com a sustentabilidade ambiental tem impulsionado pesquisas visando a conservação do solo e água em sistemas agrícolas. A modelagem hidrológica é uma tecnologia capaz de simular diferentes cenários de uso e ocupação do solo e seus efeitos sobre a dinâmica de bacias hidrográficas. Diante disso, o objetivo deste trabalho foi utilizar o modelo hidrológico SWAT (Soil and Water Assessment Tool) na bacia hidrográfica do Lajeado dos Fragosos, Santa Catarina, Brasil para avaliar a distribuição da produção de sedimentos e vazão para diferentes cenários agrícolas. Os cenários estudados foram: Uso atual, reflorestamento, introdução de culturas anuais em sistema de plantio convencional e introdução de culturas anuais em sistema de plantio direto. Os resultados demonstraram que tanto a vazão como a perda de solo foram alteradas pelo tipo de uso e ocupação do solo. O cenário II (reflorestamento) apresentou as menores perdas de solo por erosão hídrica. A implantação de culturas anuais em substituição das pastagens (cenários II e III) pode ocasionar aumento significativo na erosão do solo em função das características edáficas e topográficas da área estudada. ABSTRACT --- Environmental sustainability is pushing the advancement of research on soil and water conservation in agriculture systems. Hydrological modeling is a tool able to forecast different soil use scenarios and their effects on catchment soil and water dynamics. The main objective of this paper was to use the hydrological model SWAT (Soil and Water Assessment Tool) at Lajeado dos Fragosos watershed, Santa Catarina, Brazil. We evaluated sediment production and flows under different agriculture scenarios: I. actual use; II. reforestation; III. annual crop introduction in conventional soil preparation; and IV. annual crop introduction under no-tillage systems. The results obtained indicated that both soil flow and losses were affected by the different scenarios considered in this study. Scenario II (reforestation) showed the smallest soil losses due to hydrologic erosion. Annual crop introduction (scenarios III and IV) can significantly increase soil erosion considering the edaphic and topographic characteristics of the Lajeado dos Fragosos watershed. Palavras-chave: Perda de solo, modelagem hidrológica, disponibilidade hídrica. 1 Dr. Eng. Agrônomo, pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, Rod. Admar Gonzaga, 1347, 88034- 901, Florianóplis, Santa Catarina. E-mail: [email protected] 2 Dr. Eng. Civil, pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, Rod. Admar Gonzaga, 1347, 88034-901, Florianóplis, Santa Catarina. E-mail: [email protected] 3 Eng. Sanitarista e Ambiental, mestranda na Universidade Federal de Santa Catarina, Bairro Trindade, 88040-970, Florianópolis, Santa Catarina. Email: [email protected]

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APLICAÇÃO DO MODELO HIDROLÓGICO SWAT (Soil and Water

Assessment Tool) PARA A SIMULAÇÃO DA PERDA DE SOLO E DA DISPONIBILIDADE HÍDRICA EM UMA BACIA HIDROGRÁFICA NÃO

INSTRUMENTADA

Éverton Blainski1; Luis Hamilton Pospissil Garbossa2& SimoneMalutta3

RESUMO --- A preocupação com a sustentabilidade ambiental tem impulsionado pesquisas visando a conservação do solo e água em sistemas agrícolas. A modelagem hidrológica é uma tecnologia capaz de simular diferentes cenários de uso e ocupação do solo e seus efeitos sobre a dinâmica de bacias hidrográficas. Diante disso, o objetivo deste trabalho foi utilizar o modelo hidrológico SWAT (Soil and Water Assessment Tool) na bacia hidrográfica do Lajeado dos Fragosos, Santa Catarina, Brasil para avaliar a distribuição da produção de sedimentos e vazão para diferentes cenários agrícolas. Os cenários estudados foram: Uso atual, reflorestamento, introdução de culturas anuais em sistema de plantio convencional e introdução de culturas anuais em sistema de plantio direto. Os resultados demonstraram que tanto a vazão como a perda de solo foram alteradas pelo tipo de uso e ocupação do solo. O cenário II (reflorestamento) apresentou as menores perdas de solo por erosão hídrica. A implantação de culturas anuais em substituição das pastagens (cenários II e III) pode ocasionar aumento significativo na erosão do solo em função das características edáficas e topográficas da área estudada. ABSTRACT --- Environmental sustainability is pushing the advancement of research on soil and water conservation in agriculture systems. Hydrological modeling is a tool able to forecast different soil use scenarios and their effects on catchment soil and water dynamics. The main objective of this paper was to use the hydrological model SWAT (Soil and Water Assessment Tool) at Lajeado dos Fragosos watershed, Santa Catarina, Brazil. We evaluated sediment production and flows under different agriculture scenarios: I. actual use; II. reforestation; III. annual crop introduction in conventional soil preparation; and IV. annual crop introduction under no-tillage systems. The results obtained indicated that both soil flow and losses were affected by the different scenarios considered in this study. Scenario II (reforestation) showed the smallest soil losses due to hydrologic erosion. Annual crop introduction (scenarios III and IV) can significantly increase soil erosion considering the edaphic and topographic characteristics of the Lajeado dos Fragosos watershed.

Palavras-chave: Perda de solo, modelagem hidrológica, disponibilidade hídrica. 1 Dr. Eng. Agrônomo, pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, Rod. Admar Gonzaga, 1347, 88034-901, Florianóplis, Santa Catarina. E-mail: [email protected] 2 Dr. Eng. Civil, pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina, Rod. Admar Gonzaga, 1347, 88034-901, Florianóplis, Santa Catarina. E-mail: [email protected] 3 Eng. Sanitarista e Ambiental, mestranda na Universidade Federal de Santa Catarina, Bairro Trindade, 88040-970, Florianópolis, Santa Catarina. Email: [email protected]

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INTRODUÇÃO

Dentre os principais problemas ambientais, a degradação dos recursos naturais,

principalmente do solo e da água, vem crescendo de forma acentuada, alcançando níveis

preocupantes (Bertoni e Lombardi Neto, 1990).

Uma das principais causas de degradação dos solos agrícolas e assoreamento dos cursos

d’água é a erosão. A erosão hídrica, principal tipo de erosão em regiões tropicais, é um processo

complexo e se manifesta de maneira variável com dependência das condições climáticas, tipo de

solo, topografia uso e ocupação e práticas conservacionistas adotadas.

Com a substituição das paisagens naturais por usos agrícolas, dá-se inicio ou aceleram-se

diversos processos que culminam na degradação do solo. Os prejuízos oriundos do cultivo do solo

podem ser quantificados por meio da compactação e da perda de solo por erosão (Mc-Cormack,

1984). O processo de recuperação requer tanto tempo que o solo pode ser considerado como não

renovável, justificando a preservação deste recurso.

Além das perdas de solo oriundas do processo erosivo, o transporte e deposição dos

sedimentos afetam diretamente a qualidade das águas superficiais e subterrâneas. O assoreamento

dos cursos d’água traz grandes danos ao ambiente e tem impulsionado inúmeras pesquisas voltadas

ao desenvolvimento de modelos matemáticos capazes de prever o aporte de sedimentos na rede

hidrográfica (Chaves, 1991).

Pesquisas envolvendo essa problemática utilizam as bacias hidrográficas como formas de

representações mais apropriadas, pois envolvem um conjunto de áreas drenadas por um rio principal

e seus afluentes (Guerra, 1980) assim como toda a dinâmica do sistema solo, água, planta e

atmosfera. Dessa forma, monitorar, quantificar e simular os impactos causados pela ação antrópica

sobre o regime hídrico em bacias hidrográficas constitui uma estratégia importante para o

gerenciamento e preservação dos recursos naturais.

Ainda para o gerenciamento dos recursos naturais, a utilização de modelos matemáticos

auxilia na determinação dos impactos da ocupação antrópica sobre a quantidade e qualidade da água

e dessa forma possibilita o estudo de diferentes cenários (Bouraoui et al., 1997), muitos deles ainda

não explorados em experimentos reais (Grigg, 1996).

Os modelos matemáticos podem ser utilizados na avaliação de sistemas de manejo do solo

empregados em atividades agrícolas, servindo como ferramentas de gestão ambiental. A utilização

de modelos de previsão hidrológica possibilita a estimativa da erosão do solo e consequentemente

auxilia no planejamento das atividades agrícolas, tais como: tipo de cultura a ser implantada,

técnicas de manejo do solo empregadas e utilização de agroquímicos (fertilizantes, inseticidas e

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herbicidas). Com base nesta tecnologia, torna-se possível estimar os impactos ambientais causados

pela ação antrópica, antes mesmo que estes ocorram.

Diversos modelos hidrológicos podem ser utilizados para essa finalidade. Um desses modelos

é o SWAT (Soil and Water Assessment Tool), um modelo dinâmico e distribuído capaz de predizer

o efeito de diferentes usos do solo (cenários) sobre a qualidade e quantidade de água, produção de

sedimentos e cargas de poluentes em bacias hidrográficas não instrumentadas, conforme descrito

por Srinivasan e Arnold (1994).

Diante disso, o objetivo deste trabalho foi utilizar o modelo hidrológico SWAT na bacia

hidrográfica do Lajeado dos Fragosos, Santa Catarina, Brasil para avaliar a distribuição temporal e

espacial da produção de sedimentos e vazão para diferentes cenários agrícolas de uso e ocupação do

solo.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi conduzido na bacia hidrográfica do Lajeado dos Fragosos, localizada no

município de Concórdia, região oeste do estado de Santa Catarina, Brasil, entre as coordenadas

UTM (Universal Transversa de Mercator) 380.570 e 398.000, 6.984.000 e 6.990.000 m N (Fuso 22

S, meridiano central 51°W), com área aproximada de 5.865 ha (Figura 1).

Figura 1 – Localização da bacia hidrográfica do Lajeado dos Fragosos

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O clima da região oeste de Santa Catarina foi classificado, segundo Köppen, como temperado

úmido com verão quente (Cfa), com temperatura média anual de 18,0°C, mínima média de 13,5°C e

máxima média de 26,5°C. A precipitação total anual da região varia entre 1700 a 1900 mm

(Pandolfo et al., 2002).

Para a utilização do modelo hidrológico SWAT foram utilizados dados de entrada

correlacionados com características físicas da área de estudo. Esses dados representam o uso e

ocupação, parâmetros físico-hídricos de solo, clima e topografia da bacia hidrográfica.

Os principais componentes do SWAT incluem hidrologia, clima, sedimentos, temperatura do

solo, crescimento de plantas, nutrientes, agroquímicos e manejo do solo (Arnold et al., 1998). O

componente hidrológico do modelo inclui sub-rotinas para determinação do escoamento superficial,

percolação, fluxo lateral subsuperficial, fluxo de retorno do aquífero raso e evapotranspiração,

conforme Machado e Vettorazzi (2003).

Os dados de caracterização de solos foram inseridos diretamente no banco de dados do

modelo. Os parâmetros físico-hídricos cadastrados foram: número de camadas de solo,

profundidade das camadas, profundidade máxima de enraizamento no perfil de solo, porosidade

total, densidade do solo, capacidade de água disponível, conteúdo de carbono orgânico,

condutividade hidráulica saturada, conteúdo de argila, silte, areia e cascalho e fator de

erodibilidade.

As características de relevo foram expressas pelo modelo digital de elevação (MDE), gerado

a partir do modelo digital da Shuttle Radar Topographic Mission – SRTM, 2000.

As informações referentes ao uso do solo foram obtidas a partir de imagem do satélite de alta

definição. As principais classes de uso foram pastagem plantada, florestas, pastagem nativa,

agricultura e uso residencial/industrial (Tabela 1).

O mapeamento de solos foi realizado com base em perfis representativos da área estudada.

Estes perfis foram descritos, amostrados para análises químicas e físicas e classificados conforme o

Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (EMBRAPA, 2006). As classes predominantes foram:

Cambissolo Háplico, Nitossolo Vermelho, Neossolo Litólico e solos urbanos/associações. A

representatividade de cada classe de solo é mostrada na Tabela 1.

Tabela 1 - Uso da terra e classes de solos na bacia hidrográfica do Rio Araranguá

Cobertura Área

Solo Área

(ha) (%) (ha) (%) Pastagem plantada 3.445 59 Cambissolo Háplico (CX) 4.269 73 Floresta 1302 22 Nitossolo Vermelho (NV) 964 16 Pastagem nativa 620 11 Neossolo Litólico (RL) 555 9 Agricultura 415 7 Urbanos/Outros (Urb) 78 2 Residencial/Industrial 84 1 TOTAL 5.866 100 5.866 100

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A distribuição espacial da cobertura vegetal, mapeamento de solos e relevo é apresentada na

Figuras 2.

Figura 2 - Distribuição espacial do uso e ocupação; classes de solo e topografia na bacia

hidrográfica do Lajeado dos Fragosos

Para completar os dados de entrada do SWAT, foram implementadas as variáveis que

descrevem o clima da região: Temperatura (°C), Precipitação (mm), Umidade relativa (%), Vento

(m.s-1) e Radiação solar (MJ.m-2). Essas informações foram obtidas a partir de estações

climatológicas situadas na bacia hidrográfica e proximidades administradas pela Empresa de

Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI) e pela Empresa Brasileira de

Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).

Com base nos dados de entrada, o SWAT foi utilizado para simulação de vazão (mm.ano-1) e

a perda de solo (Mg.ha-1.ano-1). Os dados de vazão simulados pelo SWAT foram comparados com

dados medidos e utilizados para a calibração do modelo.

Após a calibração do SWAT, foram feitas simulações de cenários agrícolas de uso e ocupação

do solo para diferentes tipos de cultura e manejo com o objetivo de avaliar possíveis efeitos das

práticas agrícolas sobre a perda de solo e produção de água na bacia hidrográfica estudada.

As alterações dos coeficientes para cada cenário foram feitas com base em dados de literatura

e informações constantes na base de dados do modelo hidrológico. Por se tratar de uma bacia

hidrográfica não instrumentada, os dados de perda de solo simulados não foram comparados com

dados medidos, entretanto, a aplicação do modelo possibilitou a estimativa das alterações na

dinâmica da bacia hidrográfica antes que estas ocorram em função das alterações antrópicas,

auxiliando no gerenciamento dos recursos naturais.

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Foram simulados quatro cenários de uso, manejo e ocupação do solo. Essas simulações foram

sistematizadas por meio da interação entre o modelo hidrológico e o Sistema de Informações

Geográficas (SIG) realizada por meio da interface do SWAT denominada ArcSWAT (v. 1.0.6,

desenvolvido pelo Blackland Research Center Texas Agricultural Experiment Station e USDA

Agricultural Research Service) e do software ArcMap® (desenvolvidos pela Environmental

Systems Research Institute - ESRI, Redlands, California, EUA). Essa interface possibilitou a

alteração do Plano de Informação (PI) de uso e ocupação do solo (Figura 3) permitindo a

comparação das variáveis estudadas para cada cenário proposto.

Os quatro cenários de uso, manejo e ocupação dos solos estudados correspondem às

principais atividades agrícolas da região e estão em conformidade com a aptidão das terras, sendo:

CENÁRIO I – Uso atual: caracterizado pela presença de pastagens degradadas em áreas com

declividade elevada, com baixa rentabilidade e baixa taxa de infiltração oriunda da compactação do

solo ocasionada pelo pisoteio animal, entretanto, com algumas áreas ocupadas por vegetação nativa

composta por espécies florestais típicas da região (floresta estacional semidecidual);

CENÁRIO II – Reflorestamento com vegetação nativa (floresta estacional semidecidual) em

substituição as pastagem e áreas agrícolas: por se tratar de um ecossistema frágil, com predomínio

de áreas com elevada declividade e solos pouco profundos, optou-se por avaliar esse cenário para

quantificar as perdas de solo e vazão sem os efeitos da ação antrópica (testemunha);

CENÁRIO III – Culturas anuais em substituição à pastagem e campos utilizando sistema de

preparo convencional - SPC (aração + gradagem), com exceção das áreas com declividade

acentuada e/ou presença de pedregosidade;

CENÁRIO IV – Implantação de culturas anuais em substituição à pastagem e campos utilizando

preparo conservacionista caracterizado pela ausência de revolvimento do solo e manutenção dos

resíduos vegetais na superfície do solo (plantio direto - SPD) com exceção das áreas com

declividade acentuada e/ou presença de pedregosidade.

Conforme descrito anteriormente, na figura 5 estão espacializadas as áreas em que os PI’s

serão alterados, denominados de “Cenários” e “Agricultura”, as demais áreas compostas por

florestas e solos urbanos/industriais serão mantidas em todos os cenários estudados.

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Figura 3 - Distribuição espacial do uso e ocupação do solo nos quatro cenários estudados. SPC – Sistema de plantio convencional e SPD – Sistema de plantio direto

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após a calibração do modelo hidrológico, o coeficiente de Nash e Sutcliffe (NASH) atingiu

0,73 para a variável vazão, para o intervalo de tempo mensal. O valor de NASH pode variar desde o

negativo infinito até um, sendo este último o indicativo de que o modelo está com um ajuste

perfeito. Entretanto, segundo Krysanova et al. (1998), para um bom ajuste do modelo são aceitos

valores de NASH superiores de 0,7. Portanto, o modelo apresentou-se como um estimador melhor

do que a média dos dados medidos.

Os resultados apresentados na Tabela 2 demonstraram que as alterações no uso e ocupação do

solo ocasionaram diferenças significativas na perda de solo por erosão hídrica. O cenário II,

caracterizado pelo reflorestamento com vegetação nativa, apresentou os menores valores de perda

de solo para o período simulado (2005 a 2009).

O cenário I (uso atual) apresentou perdas de solo médias entre 3,3 e 7,7 Mg.ha-1.ano-1 para o

mesmo período (Tabela 2). De maneira geral, neste cenário, as perdas de solo podem ser

consideradas aceitáveis, visto que para os solos de maior ocorrência na região, são toleráveis

valores entre 7,4 e 10,5 Mg.ha-1.ano-1 (Bertol e Almeida, 2000). Para os cenários III e IV as perdas

de solo aumentaram significativamente (Tabela 2). Esse aumento pode ser associado à elevada

declividade da área estudada e ao revolvimento do solo (cenário III) e/ou substituição do sistema

radicular das gramíneas por culturas com sistema radicular menos abundantes, a exemplo de

culturas anuais como o milho, trigo e soja, comuns na região. Além disso, a substituição das

Uso atual Reflorestamento

Agricultura – SPC Agricultura – SPD

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paisagens naturais por sistemas agrícolas expõe a superficie do solo ao impacto direto das gotas de

chuva, principalmente na fase inicial de desenvolvimento das culturas e/ou na fase de maturação

fisiológica. Essa exposição contribui para a desagregação do solo e consequentemente favorece a

perda de solo por erosão hídrica.

Tabela 2 – Distribuição temporal de precipitação e perda de solo para a bacia hidrográfica do Lajeado dos Fragosos – SC, no período 2005/2009 para os quatro cenários estudados. I: uso atual;

II: reflorestamento; III: culturas anuais (SPC); IV: culturas anuais (SPD)

A N O

PRECIPITAÇÃO

CENÁRIO

I II

III IV PERDA DE SOLO

mm.ano-1 Mg.ha-1.ano-1 Mg.ha-1.ano-1 Mg.ha-1.ano-1 Mg.ha-1.ano-1 2005 1.874 7,62b

3,18a

87,62d

74,58c

2006 1.285 3,31b

0,94a

27,75c

21,12c 2007 1.971 7,73b

2,69a

74,01d

61,80c

2008 1.605 4,97b

1,55a

42,79c

36,14c 2009 1.860 3,86b

1,37a

36,48c

31,76c

Letras diferentes na mesma linha representam diferença estatística (α = 0,05) entre os cenários em cada ano.

Na Figura 4 são mostradas as perdas de solo estimadas para cada cenário em diferentes

subdivisões da bacia hidrográfica (sub-bacias). Essas sub-bacias foram definidas por meio do

modelo hidrológico com base na topografia, tipo de uso e ocupação e mapeamento de solos.

Observa-se que a pior condição (maior perda de solo anual – Mg.ha-1.ano-1) foi constatada no

cenário III (agricultura – culturas anuais – SPC), com perdas de solo que podem, em alguns locais

superar 500 Mg.ha-1.ano-1. No cenário II, com reflorestamento, as perdas de solo máximas ficam

abaixo de 50 Mg.ha-1.ano-1, mesmo nas áreas mais vulneráveis. Dessa forma, pode-se constatar a

severa degradação do ambiente que a implantação de culturas anuais em sistema de preparo do solo

convencional pode causar nesta bacia hidrográfica, resultado da exposição e revolvimento do solo,

associado à topografia local acidentada e aos solos com pequena profundidade. Dessa forma, é

possível classificar essas áreas como inaptas à implantação de culturas anuais em sistema de

preparo do solo convencional.

Entretanto a construção de terraços e a adoção de medidas conservacionistas podem viabilizar

a implantação de culturas anuais nas áreas menos acidentadas. Para a simulação com culturas anuais

implantadas no sistema de plantio direto – SPD (Figura 4), observou uma redução significativa na

perda de solo em comparação com o SPC, corroborando esta hipótese.

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Figura 4 – Distribuição espacial da perda de solo simulada considerando os diferentes cenários estudados. SPC – Sistema de plantio convencional e SPD – Sistema de plantio direto

Os resultados apresentados na tabela 3 demonstram a simulação de perda de solo para as

classes de solo de maior ocorrência na área de estudo. Para o cenário II as perdas de solo

mantiveram-se abaixo dos limites propostos como aceitáveis para as respectivas classes de solo,

conforme metodologia proposta por Galindo e Margolis (1989) e aplicada por Bertol e Almeida

(2000) para os solos de SC. Para os cenários III e IV, as perdas de solo ocasionadas pela introdução

de culturas anuais mostraram-se significativamente maiores que no cenário II, para as classes de

solo Nitossolo Vermelho (NV), Cambissolo Háplico (CX) e Neossolo Litólico (RL). A presença

desses solos em locais com topografia acidentada associada à pedregosidade e a pequena

profundidade constatada nos CX e RL e a textura dos NV tornam esses solos altamente susceptíveis

a erosão hídrica (Testa et al., 1992).

Tabela 3 – Perda de solo (Mg.ha-1.ano-1) média (2005 a 2009) na bacia hidrográfica do Lajeado dos Fragosos – SC. Tolerância de perda de solo definida conforme metodologia proposta por Galindo e

Margolis (1989) e aplicada por Bertol e Almeida (2000) para os solos de SC

Solo Tolerância

Mg.ha-1.ano-1

Perda de solo – Mg.ha-1.ano-1

CENÁRIO I II III IV

NV 10,5 6,3b 0,2a 12,1c 11,6c CX 7,4 40,1b 0,4a 64,7c 59,6c RL 1,7 48,7b 0,1a 61,4b 58,9b

Letras diferentes na mesma linha representam diferença estatística (α = 0,05) entre os cenários para uma mesma classe de solo.

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No estudo de disponibilidade hídrica, observou-se que a vazão média anual (mm.ano-1)

apresentou variação entre os cenários simulados (Tabela 4). De maneira geral, os cenários I e II

apresentaram maiores vazões médias anuais do que os cenários III e IV. Somente no ano de 2006

que o cenário II não apresentou diferença significativa com relação aos cenários III e IV (Tabela 4),

provavelmente associado ao menor volume precipitado que contribuiu para a redução das diferenças

entre os tratamentos simulados. De maneira geral, as diferenças entre os cenários podem ser

atribuídas às diferentes taxas de evapotranspiração das culturas estudadas e às alterações no

escoamento superficial e infiltração de água no solo em função do tipo de sistema radicular, manejo

e taxa de cobertura do solo.

Tabela 4 – Distribuição temporal de precipitação e vazão para a bacia hidrográfica do Lajeado dos

Fragosos – SC, no período 2005/2009 para os quatro cenários estudados. I: uso atual; II: reflorestamento; III: culturas anuais (SPC); IV: culturas anuais (SPD)

A N O

PRECIPITAÇÃO

CENÁRIO

I II

III IV VAZÃO

mm.ano-1 mm.ano-1 mm.ano-1 mm.ano-1 mm.ano-1 2005 1.874 1.059a

997a

906b

907b

2006 1.285 414a

342ab

301b

307b 2007 1.971 1.193a

1.059b

919c

925c

2008 1.605 904a

778b

686c

683c 2009 1.860 952a

870b

815c

832bc

Letras diferentes na mesma linha representam diferença estatística (α = 0,05) entre os cenários em cada ano. CONCLUSÕES

Por meio da utilização do modelo SWAT constatou-se que tanto a vazão como a perda de solo

foram alteradas pelo tipo de uso e ocupação do solo. O cenário II (reflorestamento) apresentou as

menores perdas de solo por erosão hídrica.

A implantação de culturas anuais em substituição das pastagens pode ocasionar aumento

significativo na erosão do solo em função das características edáficas e topográficas da área

estudada, ocasionando perdas acima do limite máximo tolerável.

AGRADECIMENTOS

À FINEP pelo apoio financeiro através do projeto MCT/FINEP/Ação transversal – Previsão

de Clima e Tempo 04/2008 – Projeto Climasul. Ao Centro de Treinamento de Concórdia – Epagri

pelo apoio no desenvolvimento do projeto.

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