Apologética - C .S. Lewis

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    C.S. LewiseFrancis Schaeffer:

    Lies para o sculo vinte e um, dos maisinfluentes apologetas da atualidade.

    **(Nota ao revisor: Favor mudar no texto de incrdulos e no-evangelizadospara no alcanados) ***

    Do Formatador ao Revisor

    No ndice Final, existe alguns astersticos que foram passados para mim, e outrosassunstos que no localizei pela busca do PageMaker, pode ser que esteja dispersopelo texto.

    Outra coisa que tinham outros astersticos, podendo ser que no fora colocado,pode ser que tenha que verificar com o original.

    O texto acima me foi passado junto com o texto no final do arquivo.Obrigado!Alessandro

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    EXPEDIENTE

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    Para Susie, Ashley, Lindsey e Ryan Burson, Cujas vidas souma prova contundente de que Deus bom.

    Para Bob e Marilyn Uhrig, Pete e Jan Edgington, Jack e JoyceKellenberger, John e Melinda Walls, e Joe e Tammy Walls:Contribuies pessoais para o meu rol de testemunhos deque o Cristianismo verdadeiro .

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    Agradecimentos....................................................................07

    Introduo.............................................................................111 - Pano de Fundo Biogrfico................................................272 - A Natureza da Salvao...................................................593 - A Soberania de Deus e o Significado do Homem............754 - Avaliando o Mistrio......................................................955 - A Autoria da Bblia e a Inspirao Divina......................1276 - Apologia Estratgica.....................................................1597 - Apologia Ofensiva........................................................354

    8 - Apologia Defensiva.......................................................3549 - Voltando Liberdade Libertria.....................................24710 - 21 Lies para o Sculo 21...........................................285Notas....................................................................................311ndice Onomstico..............................................................341

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    6 - Pensamento de C. S. Lewis & F. Schaeffer

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    Em primeiro lugar e, antes de mais nada, gostaramos de agradecer nossasfamlias por sua pacincia com a nossa permanncia no escritrio at mais

    tarde por meses consecutivos. Sem o sacrifcio delas, esse livro no teria chegadoa nascer.

    Tambm devemos muito a uma srie de colegas e organizaes. Odepartamento de comunicao do Seminrio de Asbury [SeminaryCommunications Department]- Fred Cramer, Alan Creech, Cathy Deon, WendellEsbenshade and Michele Sparks - ofereceram apoio constante. Ben WitheringtonIII acreditou nesse projeto e incentivou o editor a persegu-lo. Assistente depesquisa Scott Haire checou meticulosamente centenas de citaes por preciso.

    Linda Henson gentilmente deu acesso sua videoteca LAbri extensiva. O InstitutoFrancis Schaeffer forneceu importantes recursos eletrnicos e impressos. OLexington LAbri Commitee nos permitiu ter acesso conferncia LexingtonLAbri de 1996. Jerram Barrs, Lane Dennis, Os Guinness, Dick Keyes e JamesSire contriburam com preciosas consideraes quanto vida e ministrio deFrancis Schaeffer. Edith e Frank Schaeffer escreveram generosas cartas que muitonos ajudaram, em resposta aos nossos pedido.

    Chris Mitchell e Marjorie Mead do Wade Center prestaram valiosaassistncia na fase de levantamento de dados para este livro. Wayne Martindale

    ofereceu a sua hospitalidade e boas conversas durante nossa estadia emWheaton. Bruce Edwards contribuiu com vrias reflexes alternativas a respeitodo pensamento de Lewis, por ocasio de uma de suas ricas oficinas de vero.Os membros da lista de discusso eletrnicaLAbrie Simplesmente Lewis[MereLewis] contriburam com sries de discusso provocativas. Os estudantes doSeminrio C.S. Lewis [C.S. Lewis Seminar] junto ao Seminrio de Asbury[Asbury Seminary] foram enriquecendo nosso conhecimento sobre o autor, poranos consecutivos. Finalmente o editor-chefe da IVP, Rodney Clapp, fez sbiasrecomendaes, ostentando exemplar pacincia quando ficou claro que esseprojeto seria mais demorado, do que originalmente planejado.

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    Ser ignorante e simplista agora incapaz de enfrentar os inimigos em seuprprio terreno seria baixar nossas armas, e trair aqueles devotos que soindefesos, que, alm de Deus, no tm defesa, alm de ns, contra os ataquesintelectuais dos pagos. Se por nenhum outro motivo, a boa filosofia deve existir,no mnimo, porque a m filosofia deve receber resposta.

    1

    C. S. Lewis

    O cristo deve resistir ao esprito do mundo. Porm ao dizermos isto,devemos compreender que o esprito do mundo no toma sempre a mesmaforma. Portanto, o cristo deve resistir ao esprito do mundo na forma que eletoma na sua gerao. Se no o faz, de maneira alguma est resistindo ao espritodo mundo.

    2

    Francis Schaeffer

    A reflexo mais profunda sobre o Cristianismo de muitos evanglicos,muitos mesmo incluindo alguns lderes intelectuais dos mais eminentes - foi

    inspirada, essencialmente, pelos livros pioneiros de Francis Schaeffer,A Morteda Razo e O Deus que Intervm (1968). Talvez fosse justo mencionar, entretanto,que o livro de um autor sem sombra de dvida afetou os evanglicos cristosneste perodo mais do que os de Schaeffer... E esse autor no era nem americano,nem evanglico na sua quintessncia. claro que estou falando de C.S. Lewis.

    3

    John Stackhouse

    1. C.S. Lewis, Aprendendo em tempos de Guerra [Learning in Wartime] em O Peso da Glria [TheWeight of Glory], p. 28. N.T. Embora o ttulo do livro tivesse sido traduzido para o portugus (2 ed.,So Paulo: Editora Vida Nova, 1993), infelizmente, porm, no o foi integralmente, de modo que,neste caso, a traduo nossa.

    2. Francis Schaeffer, O Deus que Intervmtrad. Fernando Korndorfer. (So Paulo: Editora Refgio,ABU Editora, 1981), p 20.

    3. Christianity Today, (40, no 10, setembro 16, 1996):59.

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    A Paleo-ortodoxia numa era ps-moderna

    Alguns anos atrs, Michael Crichton e Steven Spielberg cativaram aimaginao do mundo todo com o sucesso de bilheteriasJurassic Park. Graas

    engenharia gentica e tecnologia de ltima gerao uma ilha tropical transformada em um parque de diverses com dinossauros vivos de verdade.Mas o sonho do paraso pr-histrico - e uma verdadeira indstria exploradorada mina de ouro do marketing instantaneamente abandonado quando o T-Rex de proveta invade o parque com toda a sua fria.

    O ator e diretor britnico Richard Attenborough faz o papel do fundadordo parque, uma fantstica mistura de Walt Disney com Marlon Perkins. Numacena bastante forte, o consultor pe em dvida o carter de Attenborough

    acusando-o de abuso do poder gentico: Vocs cientistas esto to preocupadoscom o quepodemfazer, que no param para refletir sobre que devemfazer.No filme expe-se a altamente destrutiva idia de que a cincia pode navegarcom segurana por guas desconhecidas, sem leme tico.

    Enquanto Jurassic Park superava todas expectativas de bilheteria deum lado do oceano, Attenborought quebrava paradigmas em outro projetoanacrnico na Gr Bretanha. Mas este era diferente. No havia qualquer efeitoespecial deslumbrante, nenhum predador pr-histrico aterrorizante s oretrato de um homem, cuja espcie est em franca extino, um homem que,

    em certa ocasio, disse: falando no por mim apenas, mas em nome de todosos homens ocidentais que voc possa ter encontrado antes, diria que melhor

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    aproveitarem esses espcimes raros enquanto podem. Pois j no devem restarmuitos dinossauros por a.

    1 claro que este espcime raro s podia ser o

    autor popular e apologeta cristo C.S. Lewis.A nova verso de Attenborought do filme Shadowlands oferecia um

    raro vislumbre de um verdadeiro clssico, e o fez, providenciando um saudvelrefresco incansvel fascinao de Hollywood pelo profano. O filme trocou aluxria pelo romance na terceira idade; o sangue, pelo incisivo problema domal; e, as expresses irreverentes, por um script levedado com espiritualidade.Foi um sucesso de bilheterias surpreendente.

    O apelo do filme deixou muitos sedentos por aprender mais sobre Lewis.Os editores reagiram inundando o mercado com uma nova onda de estudos,artigos e livros. A indstria do turismo tambm foi beneficiada. Um fluxocrescente de entusiastas visitaram marcos importantes da histria de Lewis,tais como o Wade centerno Wheaton College - a Meca americana dos lewisianos.Fundada pelo especialista em Lewis e professor em Wheaton, Clyde Kilby, oWade center o lar do guarda-roupas esculpido a mo, que inspirou os contosde Nrnia, a escrivaninha de Lewis, uma boa parte da sua biblioteca pessoal eum verdadeiro arsenal de material para pesquisa. No pice da onda deShadowlands, a taxa de visitas ao Wade Center quase que dobrou.

    2

    Hoje, um nmero crescente de turistas eletrnicos esto acessando Lewispela mega-estrada da informao. Aproximadamente uma dzia de estaes

    do espao ciberntico so dedicadas ao catedrtico de Oxford.3

    Dentro doGuarda-Roupa [Into the Wardrobe], a possivelmente mais popular pginana rota de Lewis, d as boas-vindas a mais de oito mil visitantes por ms.Outros sites do acesso a um pano de fundo biogrfico, pensamentos do grupode colegas de Oxford, conhecidos como os Do Barulho[Inklings], jogos defantasia interativos, um tour detalhado por Nrnia e fruns de discusso aovivo e autores correlatos. Os Lewisianos de Londres at Los Angelesreligiosamente discutem seus pensamentos sobre uma ampla variedade detpicos. E no muito difcil toparmos com um dos dois enteados de Lewis,Douglas Gresham, oferecendo aos seus fs tentadores tira-gostos de futilidades.

    Bruce Edwards, um professor de Ingls da universidade estadual deBowling Green [Bowling Green State University] usa a sua pgina na webpara incentivar o interesse acadmico por Lewis. Alm de divulgar seminriose oficinas agendadas, ele coloca no ar, ensaios, crticas e artigos de interessepara a comunidade Lewisiana. Em uma dessas contribuies, chamado Devolta para Lewis: Um dilogo Ps-moderno [Lewis Redux: A PostmodernDialog], Edward imagina criativamente como seria, ficar ligado um Lewis

    surfista da web. Nesta conversa fictcia, cheia dos altos e baixos da mar dosparadoxos e ressacas da vida ps-moderna, transportando Lewis para fora deseu planeta silencioso e para dentro das vastas galxias do espao ciberntico

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    interativo. Em certo trecho do dilogo, Edwards revela a Lewis a sua persistenteatualidade: Bem, Jack... Suponho que voc tenha notado que continua sendobastante popular os catlicos e igualmente os protestantes lem seus escritos,mas especialmente os evanglicos fundamentalistas ultra-conservadores...por

    que eles dificilmente lem outros autores cristos.4

    Apesar do evidente exagero desta afirmao, uma pesquisa de 1993,junto a leitores de Christianity Today, mostra que ela no est muito longe dosfatos. Perguntados a respeito de quais os livros que (alm da Bblia) maisinfluenciaram suas vidas espirituais, Cristianismo Puro e Simples

    5levou mais

    do que o dobro dos votos de qualquer outra obra, derrubando colossosmemorveis como O Custo do Discipulado[The Cost of Discipliship],Meumximo por Sua Majestade[My Utmost for his Highest] e O Peregrino. Nacategoria de novelas favoritas de todos os tempos, trs contos de fico deLewis (As Crnicas de Nrnia, Perelandra e Till we have Faces) estavamentre as 12 vencedoras.

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    Esse apetite insacivel pela obra de Lewis no nenhuma novidade.Nas ltimas quatro dcadas, o interesse por seus escritos nunca foi seriamenteabalado. Desde a sua morte, o pblico promove banquetes com um cardpioestvel de biografias, antologias e estudos. Conferncias so organizadas emsua homenagem. Sociedades esto perpetuando sua obra. Suas obras originaiscontinuam ocupando as prateleiras de livrarias.

    De fato, muito difcil negar o impressionante e polmico impacto semparalelos de C. S. Lewis sobre o imaginrio evanglico contemporneo. Agoraque ingressamos num novo milnio, poderamos achar que Lewis no poderiaestar mais equivocado. Longe extinto, porm, este dinossauro sobreviveuseguramente era glacial da modernidade.

    Missionrio Entre os Intelectuais

    Em 1947 uma foto de C.S.Lewis enfeitou a capa da revista Time. O artigoque a acompanhou destacava o incrvel impacto apologtico que o catedrtico deOxford estava tendo atravs de seus livros cristos populares. Quatorze anosdepois, no muito antes da morte de Lewis, a Timevoltou fazer notcia de umnovo advogado da velha f. O peridico americano o caracterizava como omissionrio entre intelectuais, um evangelista excntrico, provinciano, degalochas e barbicha de bode, que recebia hippies, existencialistas e outros espiri-tualistas no seu chal no meio dos Alpes suos. Seu nome era Francis Schaeffer.

    A comunidade do LAbriLAbri7combinava hospitalidade com sincera

    reflexo intelectual. Atravs do calor do seu fogo crepitante, Schaefferexpurgava as bases do racionalismo iluminista, num momento, para alimentara chama do cristianismo clssico no momento seguinte. Ele tratava todo e

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    qualquer peregrino com respeito, dignidade, ouvindo pacientemente histrias deluta, confuso e dor de cabea. Muitas vezes com lgrimas escorrendo pelo rosto,Schaeffer demonstrava, de forma apaixonada, a futilidade de todo e qualquerestilo de vida ou viso de mundo que obstrusse a viso crist da realidade.

    Incontveis vidas desviadas encontraram sentido e propsito atravs doLAbriLAbri, mas foram os frteis escritos de Schaeffer que mais profundamentemarcaram toda uma gerao de crentes. Entre 1968 e 1980, ele era uma voz po-derosa no mundo evanglico, com uma srie de bestsellers sobre assuntos, quevo da apologtica at a formao espiritual para a cultura contempornea. Osestudantes universitrios foram os primeiros a descobrirem suas obras, mas porvolta do final dos anos setenta, Schaeffer havia aberto uma ampla brecha no pro-testantismo mais conservador, com sua defesa apaixonada do por vir e do antigo.

    No comeo dos anos oitenta, Schaeffer lutava contra o cncer, pregandoextensamente, mas contribuindo pouco para a sua obra em expanso. Quandomorreu em 1984, muitos quiseram saber, se o movimento de Schaefferconseguiria manter-se firme sem o seu lder mais influente. J.I. Packer ponderouqual seria lugar de Schaeffer na histria, em um prefcio bastante apropriadosReflexes sobre Francis Schaeffer [Reflections on Francis Schaeffer]:

    O que significa Schaeffer para a causa crist, longo prazo? Nem opresente prefcio, nem a obra que ele apresenta podem responder a

    essa pergunta, muito cedo para se dizer... Pode at ser que o grupo depessoas para o qual o que Schaeffer diz tenha representado, por muitotempo, a ltima palavra em sabedoria humana, se dissolva ou ento,quem sabe seus membros trabalhem agora para erigir o tmulo do seuprofeta, embalsamando com santa ignorncia aqueles pensamentos,que j representaram respostas s desesperanas do nosso tempo.Esperemos para ver. A lei da fama humana ir, sem dvida, tratarSchaeffer da mesma forma como sempre tratou todos, eclipsando-otemporariamente agora que est morto e permitindo-nos reconhecermossua real estatura somente daqui a dez ou vinte anos.

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    Mais do que uma dcada se passou desde que Packer colocou estaquesto, e parece que a posteridade de Schaeffer est comeando a ficar clara.Os sinais da vitalidade, da criatividade e at do crescimento sem paralelos dasinstituies que carregam sua marca, tudo testifica a continuidade da suainfluncia e relevncia.

    O testemunho mais bvio do legado permanente de Schaeffer o impactocontinuado do LAbriLAbri. Este movimento, que comeou em um chal em

    meados dos anos 50, tem florescido em dez locais de oito pases diferentes (Aus-trlia, Inglaterra, ndia, Coria, Pases Baixos, Sucia, Sua e os Estados Unidos).

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    Dick Keyes, que foi diretor do LAbriLAbri de Southbourgh (prximo aBoston) por muito tempo, relata que muitas dessas ramificaes esto carregadasde grande potencial, com envolvimento total em nvel de tempo integral.

    9Alm

    disso, muitos dos que no podem visitar um LAbriLAbri real procuram inspirao

    em seminrios e conferncias de fim de semana. Numa conferncia recente,ocorrida no campus do seminrio teolgico de Asbury [Asbury TheologicalSeminary], haviam mais de 400 participantes de trinta e seis estados. Muitostiveram que ser impedidos de entrar devido falta de espao.

    Conquanto que os lderes do LAbriLAbri continuam a homenagear oministrio de Francis Schaeffer e a usar muitas das suas obras e vdeos nassuas aulas, Schaeffer no foi endeusado ou idolatrado. Keyes e outros membrosdesse movimento ainda encontram grande valia em boa parte do pensamentode Schaeffer, atentando para suas tendncias profticas de antever os rumos dacultura, mas os lderes do LAbriLAbri podem ser melhor caracterizados comoseguidores do exemplo de Schaeffer e novos intrpretes do seu pensamentopara um novo dia, mais do que como meros reprodutores dos seus argumentos.

    Outro sinal de vitalidade o Instituto Francis Schaeffer no SeminrioTeolgico de Covenant [Francis Schaeffer Institute at Covenant TheologicalSeminary]. Desde a sua fundao em 1989, o seminrio viveu um acentuadocrescimento. Em 1991 as matrculas oscilavam em torno de cento e setentaestudantes, mas, em meados dos anos noventa, a quantidade de estudantes

    aumentou para mais de quinhentos. De acordo com James Albritton, um antigoadministrador do instituto, uma nova gerao de entusiastas de Schaeffer pareceestar emergindo. Os jovens esto descobrindo uma mensagem que to relevantehoje, quanto h dois ou trs dcadas atrs. O desafio de desenvolver uma visointegrada do mundo de uma perspectiva inteiramente crist um respiradouro dear puro para uma era que sofre as tentaes da poluio do pluralismo.

    10

    Um terceiro sinal da influncia continuada o atual nvel de interessepelos escritos de Schaeffer. Lane Dennis, editor do Crossway Books, registraque as vendas de Como Podemos Viver Assim? [How Should we then Live?]aumentou 55% num perodo de quatro anos recentes - uma tendncia no muitocomum para livros que estiveram fora do mercado por duas dcadas.

    11Se

    fizermos outra breve consulta pesquisa junto aos leitores de Christianity Todayem 1993, o clssico de Schaeffer O Deus que intervm, revela-se como o queganhou o stimo lugar no ranking da categoria dos livros mais influentes,apenas uma posio atrs da obra-prima de Calvino, As Institutas. Schaefferfoi o nico escritor apologeta a congratular-se com Lewis nessa lista prestigiosa.

    Esses pequenos fragmentos de evidncia convergentes - a vitalidade do

    LAbriLAbri, o sucesso do Instituto Schaeffer e o interesse bastante crescentena influncia duradoura dos escritos de Schaeffer - do apoio afirmao de queas credencias do legado desse evangelista mpar para os intelectuais est firme.

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    O C.S. Lewis da Minha Gerao

    No difcil encontrar os nomes de C.S. Lewis e Schaeffer associadosnos dias de hoje. Uma quantidade crescente de historiadores, filsofos e

    antroplogos esto reconhecendo a poderosa influncia desta dupla apologticasobre o desenvolvimento do mundo evanglico do sculo vinte.

    Consideremos a reportagem de capa de Cristianismo Hoje[ChristianityToday] sobre Schaeffer, escrita pelo historiador Michael Hamilton. Nesseextenso artigo, Hamilton destaca a influncia de Schaeffer sobre uma gamaamplamente diversificada de lderes cristos, inclusive o msico LarryNorman, o fundador da Maturidade Moral [Moral Majority], Jerry Falwell,seu vice-presidente nominal, em 1996, Jack Kemp e o telogo Clark Pinnock.

    Hamilton sugere: Provavelmente nenhum intelectual, exceto C.S. Lewis, afetouo pensamento dos evanglicos de forma mais profunda.12

    Jeff Jordan, um professor de filosofia da Universidade de Delaware[University of Delaware] tambm estabelece uma relao entre Schaeffer eLewis. Em um captulo de Deus e os Filsofos [God and the Philosphers],uma obra que traa o perfil autobiogrfico de filsofos teistas lderes, Jordancompartilha, como um dos livros de Schaeffer caiu em suas mos na poca dauniversidade. E, como muitos leitores dos anos sessenta e setenta, consideramo contedo revolucionrio. Ao invs de se afastarem do mundo, os leitores de

    Schaeffer eram desafiados a confrontarem todas as facetas da cultura com asverdades bblicas: Acredito que Schaeffer tenha sido o C.S. Lewis da minhagerao. No ano seguinte, aproximadamente, eu li praticamente todos os livrosescritos por Schaeffer ... Ele tinha um efeito poderoso sobre muitas pessoas daminha gerao, abrindo nossos olhos para a rica interao possvel entre a fcrist e as grandes idias da filosofia.

    13

    Jordan no era o nico a pensar assim. De fato, metade dos colaboradoresde Deus e os Filsofos, incluindo um dos autores deste livro, referem-se aLewis, Schaeffer ou a ambos, como fatores influentes em sua formao comofilsofos cristos.14 Entre eles encontra-se ningum menos do que ThomasMorris, editor do livro e autor deApologtica de Francis Schaeffer[FrancisSchaeffer Apologetics]. Morris fala em nome de todos os outros, quando atribuiao trabalho de apologetas populares como Lewis e Schaeffer o reavivamentoda filosofia crist.

    15

    Alguns dos lderes cristo mais brilhantes de hoje, no apenas emfilosofia, mas atravessando uma ampla variedade de disciplinas, originalmentecomearam a perceber o potencial intelectual do cristianismo ortodoxo e

    histrico graas a livros comoMilagres, Cristianismo Puro e Simples,A morteda Razoe O Deus que Intervm. Uma gerao atrs, imperava o snobismocronolgico do racionalismo iluminista, com seus ditames da academia nas

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    salas esvaziadas da maioria das instituies de ensino superior. Enquanto estaideologia impregnava as cadeiras mais altas da academia, o tesmo clssicocristo parecia ser a sua ltima perna. Contudo, nos ltimos trinta anos,assistimos a uma revoluo marcante em muitos meios acadmicos. Hoje

    inmeros filsofos da religio eminentes so defensores convictos da paleo-ortodoxia.

    16Lewis e Schaeffer atenderam a uma necessidade, numa poca em

    que poucos eram os cristos que se aventurava nas guas profundas e obscurasda reflexo filosfica.

    17Eles encorajaram as geraes seguintes a reconciliar

    f e razo e conseqentemente inspiraram vrios estudiosos incipientes adetalharem o que j estava sendo se realizando a passos largos.

    Mas, conforme dizamos, muitos dalm do reino da academia foramprofundamente influenciados por Lewis, e tambm por Schaeffer. Na ediodo 14

    aniversrio de Cristianismo Hoje[Christianity Today], John Stackhouse,

    um professor da Universidade de Manitoba [University of Manitoba], nos duma idia geral dos livros que formaram a comunidade evanglica mais amplanas ltimas quatro dcadas. Stackhouse presta homenagens a um espectro amplode autores, que vo de Hal Lindsey at Carl Henry e James Dobson at John R.W. Stott, mas conclui com a nossa altamente influente dupla de apologetas.

    A reflexo mais profunda sobre o cristianismo de muitos evanglicos,muitos mesmo incluindo alguns lderes intelectuais dos mais eminentes

    - foi inspirada, essencialmente, pelos livros pioneiros de FrancisSchaeffer,A Morte da Razo e O Deus que Intervm (1968) . Talvezfosse justo mencionar, entretanto, que o livro de um autor sem sombrade dvida afetou os evanglicos cristos neste perodo mais do que osde Schaeffer ., E esse autor no era nem americano, nem evanglico nasua quintessncia. claro que estou falando de C.S. Lewis.

    18

    Enquanto Hamilton, Jordan, Morris e Stackhouse falam todos de dentrodo mundo evanglico, Richard John Neuhause, um brilhante analista cultural,

    oferece uma perspectiva, vista a partir de outra tradio. Sim, este proeminentetelogo catlico chega mesma concluso:

    Mas podemos dizer que, de fato, alguns dos nossos melhores amigosforam essencialmente formados por Francis Schaeffer e suacomunidade LAbri na Sua. Para muitos evanglicos Schaeffer, comseu impressionante autodidatismo, deu acesso a grande parte dahistria do pensamento ocidental, erigida a partir a sua visodistintivamente crist. Na comunidade evanglica, sua influncia foipossivelmente a nica. influncia secundria, ainda que numa segundaposio bastante distante, daquela de C.S. Lewis.19

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    O fato impressionante. Os sentimentos dos leitores de CristianismoHoje [Christianity Today], historiadores, filsofos, antroplogos e lderesevanglicos, parecem apontar todos para a mesma coisa: que possvel dar umtestemunho convincente, declarando C.S. Lewis e Schaeffer os mais influentes

    apologetas do sculo vinte.

    A Emergncia da Ps-modernidade

    claro que a influncia no exige necessariamente especializao. Pelomenos esta era a opinio predominante em alguns crculos acadmicos, nosquais o distanciamento de apologetas populares como Lewis e Schaeffer quase que um rito de passagem.

    20De acordo com a maioria dos crticos, Lewis

    e Schaeffer freqentemente recaem na armadilha inerente da apologticapopular, apresentando falsos dilemas, pecando pela pobreza de alternativaslgicas e reduzindo temas filosoficamente complexos, a solues simplistas.Os crticos chamam ateno ainda para o tom de triunfo que muitas vezesacompanha tais argumentos subdesenvolvidos. Os crticos freqentementeapontam para o famoso trilema de Lewis e para a polmica soluo dada porSchaeffer ao problema do desenvolvimento da civilizao ocidental, como exem-plos primordiais da extraordinria retrica e conhecimento de Segunda categoria.

    A situao torna-se ainda mais exacerbada quando as contracapas dos

    livros, os informes de imprensa e propagandas promocionais elevam aproeminncia filosfica desses escritores s maiores alturas. Consideremosum recente anncio do livro de Frank SchaefferDanando Sozinho[DancingAlone]. Este anncio sensacionalista joga o Schaeffer mais novo contra seu paie seus ensinamentos. primeira vista, parece no haver nenhum equvocoquanto ao assunto - afinal de contas Francis muito provavelmente teria estra-nhado a recente converso de Frank para a ortodoxia oriental. O problemasurge, entretanto, quando o Schaeffer mais velho inequivocadamente descritocomo o maior filsofo evanglico do nosso sculo. Esse no um caso isolado.H duas dcadas atrs, um texto de filosofia foi publicado, ao lado de pesospesados como So Toms, Descartes, Kant, Hume e Wittgenstein na capa. Oltimo nome da lista ilustre era o de ningum menos do que Francis Schaeffer.Afirmaes implcitas e explcitas muito semelhantes a estas so associadas aLewis, que no era professor de filosofia (embora ele tenha dado aula sobre estetpico por um breve perodo no incio de sua carreira acadmica) e sim, deliteratura medieval e renascentista. Podemos compreender o quanto tal propagandapode tornar-se comprometedoras para filsofos profissionais que levam a srio o

    rigor de sua cadeira. Thomas Morris resume sucintamente a preocupao dealguns estudiosos:

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    Quem trabalha arduamente no campo da filosofia h anos, chegandoa compreender a dificuldade de provar qualquer coisa exclusivamenteatravs da razo pura, e tendo se conformado a conviver com asincertezas desse mundo, fica mais do que irritado em ver seus alunos

    e pblico leitor em geral idolatrizando alguns bons escritores comose fossem grandes filsofos que provaram isto ou aquilo, e tudo omais, que realmente significativo para a filosofia, quando est claroao olho treinado que nenhum resultado desses foi de fato atingido.

    21

    Para alguns estudiosos, entretanto, o maior problema no a capacidadepersuasiva questionvel destes apologetas populares, mas antes a insistnciade tantos seguidores seguirem as mesmas velhas e conhecidas receitasapologticas, oferecidas a uma gerao, que j no est mais jantando mesa

    da modernidade. Nosso mundo est mudando. A ora inabalvel confiana noprojeto do iluminismo, que havia prometido liberdade irrestrita e felicidadehumanista, est rachada como a esttua da liberdade.

    Os dogmas da modernidade - da auto-suficincia autnoma, da supremaciada razo, do direito inalienvel liberdade e a certeza de progresso inevitvel -deram espao negao do absoluto, numa celebrao das inter-relaes, umarenovada busca pela espiritualidade, e um nihilismo ameaador.

    22O ocidente

    no pode mais ser definido por nenhum discurso metalingstico (como o cristia-nismo ou naturalismo); de fato, todos os paradigmas anteriores esto sendo vistos

    como construtos sociais epistemologicamente comprometidos e como estratgiasopressivas e alienantes, projetadas para reprimir o pluralismo e expresso deidias.

    23J que a realidade objetiva e a verdade absoluta no tm qualquer status

    ontolgico, todos os pontos de vista so igualmente vlidos. Neste contexto, opluralismo assenta-se no trono cultural tendo a tolerncia por lei mxima inquestio-nvel em suas terras.

    Evidentemente a ps-modernidade dificilmente poder ser detida por meiode descries superficiais e definies cuidadosas. Se quisermos definir algo,

    temos que Ter uma idia clara sobre sua estatura, extenso e consistncia. E nopossumos esses dados. Vivemos em uma era emergente em transio, que estem mutao para uma forma final que no temos como identificar ainda. A nicacoisa que sabemos que a cultura contempornea to multidimensional ediversificada que seria pouco recomendvel qualquer tentativa de erigir umanica tenda para todo esse circo bizarro. William Abraham nos apresenta umaviso por alto:

    Eu vejo o mundo moderno como um mundo lamentavelmente

    fragmentado e catico. De fato, falar de um s mundo moderno seriauma contradio em termos... Quando olhamos para nossa culturacomo um todo, somos confrontados com um emaranhadodestoante

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    de vozes, de vises de mundo, de tradies morais, de estilos devida, e de lgicas informais internas, que no podem ser reduzidas mesma coisa por qualquer anlise terica inteligvel - quer seja elaintelectual, econmica ou sociolgica.

    24

    Dentro da comunidade evanglica h pouco consenso sobre como reagiraos contornos emergentes do pensamento ps-moderno. Ttulos comoapologetasCristos no Mundo Ps-moderno [Christian Apologetics in the PostmodernWorld] e O Desafio da Ps-modernidade: um Compromisso Evanglico [TheChallenge of Postmodernism: An Evangelical Engagement] mostra a diversidadede opinies existente.

    25Alguns estudiosos cristos consideram a crtica ps-

    moderna a um tempo pungente e libertadora. Esta perspectiva v com bons olhoso rompimento com uma epistemologia que afirmam pertencer mais ao Iluminismo,

    do que tradio apostlica. Muitos desses estudiosos acreditam que o valor docristianismo pode ser melhor explicitado por meio de exemplos de confiveis,do que pela argumentao cognitiva.

    Outros estudiosos acreditam que a apologtica clssica ainda continuavivel nos nossos dias. Assim eles podem at apreciar alguns pensamentosdeRorty, Fish, Derrida e outros ps-modernistas, mas h uma grande aversocontra o comprometimento com suas respectivas teorias da verdade. De acordocom esta escola de pensamento, no se pode escapar dos princpios auto-

    evidentes que Deus embutiu no universo, o que inclui as leis da lgica. O queo mundo necessita no liberdade para pensar e agir, como bem lhe parece,mas antes a liberdade para pensar e agir como deve. Somente assim os ps-modernistas vero o caminho, a verdade e a vida e experimentaro a unidadee diversidade que to desesperadamente desejam.

    Ser ento a fascinao continuada por Lewis e Schaeffer uma ajuda ouum empecilho ao trabalho apologtico contemporneo? Ser que os continuam aapreciar as obras desses homens esto irremediavelmente atados ao passado?Ser que a passagem do racionalismo iluminista para a incerteza ps-moderna

    nos fora a jogar fora todo e qualquer compromisso com discusses havidas emetodologias prvias, ou ser que este estranho mundo novo est clamando poruma simples adaptao? O presente estudo pretende apresentar algumas respostas.

    Um Microcosmo de Evangelicalismo

    Mas antes de nos concentrarmos no futuro, preciso que prestemos umaboa e forte ateno ao passado. Uma anlise comparativa apropriada dessesdois homens deve ser prescrita contra o pano de fundo de seu contextonaturaldo sculo vinte. Quem eram eles? Que tipo de influncias moldaram o seupensamento? Que tipo de abordagem cada um deles utilizou em sua apologia?

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    Quais foram os argumentos por eles empenhados para progredir na defesa dasua f? Como as suas teologias informaram seus sistemas apologticos?

    Uma anlise detalhada destes sistemas revela uma intrigante convergnciae contraste. Ambos so lembrados por sua busca incansvel pela verdade, sua

    fascinao pelos clssicos, pela ampla gama de seguidores seculares, por teremtido ministrios na Europa destruda pela guerra e por terem tido encontrospessoais com o cncer avassalador. Mas h tambm diferenas marcantes.Schaeffer era um ministro ordenado pela igreja presbiteriana, Lewis, um leigoanglicano; Schaeffer era um fundamentalista assumido, Lewis, um crtico darigidez puritana que tomava cerveja e fumava cachimbo; Schaeffer foi um evange-lista de linha de frente e de batina; Lewis, um catedrtico em Oxford, de avental.No captulo um, estaremos apreciando algumas dessas similitudes e diferenas,em um breve resumo bibliogrfico.

    Nos captulos dois at cinco, estaremos considerando os pressupostosteolgicos desses homens. Se quisermos apreciar Lewis e Schaeffer enquantoapologetas, teremos que compreender, antes de mais nada, as doutrinas queeles defendiam e os postulados que informavam suas percepes apologticas.Ambos empenhavam-se na tarefa de comunicar a essncia da sua f, o queLewis chamou de Cristianismo Puro e Simples. Contudo, definir o que central f o alvo que tem desafiado a Igreja h sculos. Por mais que esses apologetastenham uma empreitada comum, existem algumas distines teolgicas centrais.

    De fato, uma comparao entre o calvinismo de Schaeffer e o arminianismoanglicano de Lewis cria um microcosmo fascinante do mundo evanglico comoum todo, revelando algumas tenses significativas que continuam a minar aunidade dentro da igreja contempornea, obstruindo o avano em direo metaapologtica/evangelstica.

    Uma distino fundamental pode ser encontrada no campo da autoridadebblica e inspirao divina. Sem dvida a questo da autoridade e integridadetextual um tema importante a ser considerado pelos apologetas. Estaremos nosremetendo a ele no captulo cinco. Embora ambos os escritores tivessem sidofirmes defensores da verdade objetiva , absoluta, ao explorarmos suas visessobre a inspirao, hermenutica e crtica mais alta, surgem diferenasfundamentais. Schaeffer, que encarava a aceitao da inerrncia

    26estrita, como

    teste indicador de acidez para evanglicos, certamente teria acusado adespreocupada aplicao da crtica literria de Lewis ao texto bblico. Lewis novia problema em classificar muitos milagres do Antigo Testamento na categoriade mitologia e at sugeriu a possibilidade de encontrar erros nos registros dosEvangelhos. Este captulo pretende comear a lanar luz sobre algumas distines

    epistemolgicas importantes.Enquanto os captulos um at cinco foram designados para revelar a viso-de-mundo de cada um dos pensadores, a segunda parte do livro ficar concentrada

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    nas formas pelas quais estes apologetas procederam para defender suas visespara o mundo. Em outras palavras, sua apologtica, propriamente dita. No captuloseis, estaremos explorando as diferenas entre trs escolas diferentes deabordagem apologtica: pressuposicionalismo, evidencialismo e verificacionismo.

    Estaremos avaliando a metodologia de Lewis e Schaeffer para determinarmos,qual das escolas melhor caracteriza suas respectivas estratgias.

    Os prximos trs captulos sero dedicados argumentao apologtica.William Lane Craig divide o campo da apologia em duas categorias: apologticaofensiva e defensiva. De acordo com Craig, a apologtica ofensiva buscaapresentar o lado positivo das reivindicaes de verdade do Cristianismo. Aapologtica defensiva tenta neutralizar as respostas a tais reivindicaes.

    27

    Os captulos sete a oito seguem as to teis distines categricas de Craig.No captulo sete, estaremos considerando os argumentos primrios

    ofensivos, aplicados pelos apologetas: o argumento moral de Lewis, seutrilema, seu argumento da racionalidade, seu argumento do desejo e seuargumento do gape, bem como os argumentos metafsicos, morais eepistemolgicos de Schaeffer. No captulo oito, estaremos explorando asrespostas defensivas de Lewis e Schaeffer, empreendidas para combater osataques contra o tesmo cristo. Grande parte do captulo estar tratando domais poderoso desafio lgico e existencial posto f crist, qual seja, o problemado mal. luz da preocupante violncia, racismo, aborto e desintegrao familiar

    dos nossos dias, o problema do mal continua extremamente intenso. Umaresposta crist existencialmente sensvel e digna de crdito seria uma parteimportante da apologtica contempornea.

    Uma vez sistematizados os argumentos ofensivos e defensivosconduzidos por esses pensadores, estaremos apresentando uma anlise crticano captulo nove. Determinaremos os principais pontos de contraste econcordncia entre esses dois apologetas, considerando os pontos fortes e fracosdos seus sistemas respectivos. Uma especial ateno ser dada relao entreos argumentos apologticos e as fontes teolgicas disponveis a cada pensador.

    No captulo final, estaremos resumindo e sintetizando, o que foidesenvolvido nos nove primeiros captulos. Estaremos buscando determinar oque Lewis e Schaeffer tm a oferecer nossa era pluralista, teraputica,consumista, orientada pelas aparncias. Sem dvida, os cristos devem oferecerum grau significativo de ingenuidade, criatividade, sensibilidade e versatilidade,se quisermos ser ouvidos no meio da algazarra de vozes na feira catica deidias do nosso tempo.

    Certa vez C.S. Lewis escreveu O padro do cristianismo constante deve

    manter-se claro nas nossas mentes e a partir deste padro que precisamostestar todo o pensamento contemporneo. De fato, temos de nos esforar, atodo custo, por nosermos levados pelos tempos

    28.

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    Como cristos, temos todas as razes do mundo para embarcar no sculovinte e um com confiana e esperanosa expectativa. Temos acesso maiortradio de intelectuais do mundo ocidental j conhecida. De fato, o padro docristianismo permanente resistiu a milnios de modismos e fetiches

    epistemolgicos. Tudo o que precisamos, para sairmos ao encontro dasnecessidades e desejos do nosso mundo ps-moderno pode ser escavado davelha e rica mina da paleo-ortodoxia. E, a nosso ver, os mais influentesapologetas do nosso tempo podem vir a tornar-se valiosas fontes pararecontarmos a velha e conhecida histria para a mais nova era.

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    Cedi enfim no perodo letivo subseqente Pscoa de 1929, admitindoque Deus era Deus, e ajoelhei-me e orei: talvez, naquela noite, o mais deprimidoe relutante converso de toda a Inglaterra. No percebi ento o que se revelahoje a coisa mais ofuscante e bvia: a humildade divina que aceita um conversomesmo em tais circunstncias.

    1

    C.S. Lewis

    ... por bem da honestidade, eu precisava ... percorrer o caminho de volta ameu agnosticismo para repensar todo o assunto. Reconheo que foi um perododifcil ... Eu caminhava, orava, e meditava naquilo que as Escrituras ensinavam,ao mesmo tempo que revia os motivos que me levavam a ser cristo. Gradualmentefui vendo que o problema era que, com todo os ensinamentos que eu havia recebidodepois de me tornar cristo, tinha ouvido muito pouco sobre o que a Bblia dizquanto ao sentido da obra consumada de Cristo para nossa vida presente. Aospoucos o sol raiou e a cano soou.

    2

    Francis Schaeffer

    O que me fascina em pensar que, quando Fran nasceu, C.S. Lewis eraum garoto de treze anos naquele seu miservel internato.

    3

    Edith Schaeffer

    1. C.S. Lewis . Surpreendido pela Alegria. Trad. Eduardo P. e Ferreira (So Paulo: Editora MundoCristo, 1998), p. 232.2. Francis A. Schaeffer. Verdadeira Espiritualidade(So Paulo: Editora Cultura Crist, 1999), p. 7-8.3. Edith Schaeffer, The Tapestry(Waco, Texas: Word, 1984), p. 37.

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    O caminho para a proeminncia apologtica

    Clive Staples Lewis (1898-1963)

    Toda gerao tem seus momentos decisivos. Nos anos 90 houve o julga-mento de O. J. Simpson. Nos anos 80, ocorreu o acidente com a Challenger. Nosanos 70, aconteceu o caso de Watergate. E os anos 60, foi o ano do assassinato doPresidente Kennedy.

    Dia 22 de novembro de 1963 foi declarado luto nacional. Condolnciasvieram de todo o mundo, invadindo a Casa Branca. Um telegrama de ummuulmano dizia Que lamentvel perda. Em Israel, David Ben-Gurion sconseguia exclamar em alta voz Por qu? Por qu? Em Berlim, vinte e cinco

    mil estudantes participaram de uma passeata luz de tochas. Em Londres, o BigBen bateu a cada minuto, por uma hora inteira uma honra geralmente dedicadasomente aos membros da famlia real.

    1

    Enquanto a morte do Presidente Kennedy comovia a rua Downing e todoo resto do mundo naquele dia, o aplaudido escritor e locutor popular da rdioBBC de Londres, durante a guerra, Clive Staples Lewis, passava silenciosamentedaqui para a eternidade, em seu lar, nas proximidades de Oxford.

    A perda do lder americano lanou totalmente nas sombras a notcia do

    falecimento de Lewis. Poucos jornais registraram sua morte e somente um gruporestrito de amigos participou do seu funeral. Essa no propriamente uma

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    homenagem adequada, para um dos representantes mais influentes e articuladosda f crist desse sculo, mas precisamente como Lewis a teria preferido.

    Ao contrrio de Kennedy, Lewis nunca se sentiu muito confortvel nasluzes da ribalta, preferindo o encanto de um bom livro e a conversa com alguns

    poucos amigos, ao esplendor e magia da vida pblica. Ele morreu uma semanaantes do seu sexagsimo quarto aniversrio, e, se tivesse vivido para v-lo, elesem dvida teria festejado, da mesma forma como costumava festejar a maioriados seus sessenta e trs aniversrios anteriores - em silncio, numa roda ntimade amigos.

    nsia Por Alegria

    Quando pequeno, o menino Clive declarou que no queria mais ser chama-do pelo nome. Ao invs disso, queria ser chamado de Jacksie, em memria docachorro da famlia, uma das vtimas dos primeiros acidentes de trnsito de Belfast.O apelido pegou, embora o seu irmo mais velho Warren (conhecido comoWarnie) continuasse chamando-o de seu irmo porquinho guloso, um apelidopelo qual a dupla foi batizada pela sua amvel ama-seca.

    2

    Jack e Warnie eram inseparveis na infncia, criando fantsticos mundosde faz-de-conta. Embora o seu gosto diferisse, todos os dois meninos davamouvidos sua capacidade imaginativa, para tecer as histrias das terras mais

    longnquas. Warnie resgatava sempre suas memrias da ndia, enquanto Jack,que era trs anos mais jovem, passava o seu tempo trabalhando nos campos eflorestas do seu Mundo dos bichos [Animal Land].

    3Desde o incio, o jovem

    Lewis reservava no corao um lugar especial ao mundo natural.As doenas provocadas pelo clima mido de Belfast muitas vezes foravam

    Jack a apreciar a natureza apenas de longe. A viso dos msticos montes deCastlereagh cativava a sua fantasia e evocava um forte desejo, difcil de definir.No interior da casa, no havia nada que oferecesse estmulo visual. Seu pai foi

    um advogado bem sucedido e sua me possua uma mente matemtica aguada,mas nenhum dos dois primava na arte de decorar ambientes.4

    Certo dia Warnie trouxe um novo gosto de natureza para dentro doconfinamento hermtico do seu lar. Era um pequeno jardim de brinquedo, feitode musgo, dentro das quatro paredes de uma lata de biscoito. Este rstico parasobotnico marcou a memria de Lewis para todo sempre. A calma, serenidade,frescor e exuberncia caractersticos do jardim de Warnie evocavam o mesmotipo de desejo que as distantes montanhas provocavam.

    5Por todo resto de sua

    vida, a viso de paisagens e ou cenrios naturais teriam sobre Lewis esse efeito

    de remet-lo imediatamente devolta ao seu paraso de musgo. Muito depois disso,ele reconheceria esta mesma experincia misteriosa nos escritos de Traherne,

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    Coleridge e Wordsworth, uma experincia, que estes autores chamavam deSehnsuchtou joy (alegria).

    6Mas no se tratava, contudo, da alegria, no seu

    sentido mais usual. Palavras comoprazer, realizao efelicidade no do contade sua essncia. O fato que a alegria, no sentido romntico, precisamente o

    contrrio: a ausncia de realizao, um desejo profundo, uma auto-conscinciada ausncia, a constatao da incompletude. Ocasionalmente, ela se manifestaem uma fugaz e desconcertante onda de euforia. Em outras ocasies, ela vemcomo uma vazia e sofrida dor de perda. Em todos os casos, a alegria caracteriza-se por sua natureza provocadora de iluso, incerteza, permanente inconstncia.Ela nunca surge sob encomenda, mas muitas vezes, quando menos se espera.

    Todo resto da infncia de Lewis, representa uma grande histria doencontro com Joy, sob uma grande variedade de formas. s vezes ela o acometiaem tardes frescas e coloridas de outono do Condado de Down. Noutros, ela oassaltava, pelas formas criativas do contos infantis, mitologia celta nrdica, oudas Valqurias de Wagner. Lewis buscava esses momentos. Todo o resto davida empalidecia perto desta experincia mstica cativante.

    Tais momentos romnticos eram contrabalanadas por uma perspectivasurpreendemente amarga da vida. O pessimismo de Lewis devia-se, em grandeparte, a um defeito congnito, um polegar deslocado. Esta anormalidade nasmo privava Lewis de dedicar-se aos passatempos tpicos dos garotos, comomanusear ferramentas ou o basto de beisebol. No que ele gostasse de graxa

    embaixo das unhas, ou sujeira nas suas calas, pois tanto mecnica, quantoesportes eram territrios para os quais faltavam a Lewis, tanto talento, quantointeresse. Sua maior habilidade, entretanto, vinha sendo desde sempre o dedespertar os seus sonhos para a vida. Seu interesse todo era de construir castelosde papelo e animais, vestidos com armaduras combativas - expressestridimensionais da sua imaginao. Mas todas as suas tentativas de construo,nada trouxeram, a no ser frustrao. J que estava impedido de construir seumundo imaginrio com as mos, Lewis apelou para a segunda melhor alternativa constru-lo com palavras.

    7

    claro que a excelncia literria dificilmente garantida, exclusivamentedevido a uma inaptido fsica. Felizmente para Lewis, ele possua outras trsfontes para nutrir suas aspiraes: uma mente valiosa, uma casa cheia de livrose uma boa dose de tranqilidade. Lewis nos apresenta os primeiros anos emcores vivas:

    Sou um produto de longos corredores, cmodos vazios e banhadosde sol, silncio no piso superior, stos explorados na solido, rudosdistantes de caixas dgua e tubos, e o barulho do vento sob as telhas.Alm disso livros infindveis... Nas tardes aparentemente intermi-nveis de chuva, eu tirava das estantes volume atrs de volume.

    8

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    Enquanto outros garotos subiam em rvores e corriam atrs de bolas,Lewis estava se graduando em Twain, Nesbitt, Tenniel e Potter.

    9Ler alimentava

    seu desejo de criar. Nessa poca Animal-Land estava se tornando um pascompleto, com todos os detalhes geogrficos e espaciais necessrios.

    Mas aos nove anos de idade, o mundo imaginativo de Jack foi obscurecidopor uma dura realidade. Diagnosticaram cncer na sua me. Quando ele soubeda doena de sua me, lutou para expulsar todas as suas angstias, recolhendotoda a f que pudessem redundar em esperanas de cura. Mas a cura nuncaveio. O que surgiu foi um pessimismo renovado, que o perseguiu at a faseadulta bem amadurecida.

    Criando o Tempo

    Poucas semanas aps a morte de sua me, Jack foi transportado para oprimeiro de uma srie de internatos. Ele comparou sua estadia na primeira escola,Wynyard, ao equivalente a um campo de concentrao. Em Wynyard, os alunosbatalhavam contra um diretor opressor, desvairado, que lhes passava a palmatriasregularmente, por qualquer equvoco na matemtica. Depois de dois meses,sentindo-se miservel, Jack ingressou numa escola chamada Campbell, onde eleteve seu primeiro encontro com a beleza da poesia, a atrao dos contos de fadae os encantos da fantasia. Infelizmente, sua estadia prazerosa em Campbell durou

    apenas um ano. A prxima parada foi Cherbourg House; onde a mstica do ocultoe sensualidade teceu a sua teia de feitio, em torno do pr-adolescente. Apsdois anos em Cherbourg, Lewis ingressou em Marvern, uma escola preparatriapara a universidade. Em Malvern ele se tornou um snobe assumido, afastando-se da estrutura social superficial da vida pblica escolar.

    10

    So poucas as experincias de adolescente, que valem a pena destacar. Aprimeira, deu-se em Wynyard. Enquanto Lewis estava contando os dias para sualibertao, ele comeou a freqentar regularmente a igreja. Pela primeira vez,

    Lewis ouvia a cerca dos postulados da f, proclamados por pessoas, que realmenteacreditavam neles. Este ostensiva exibio de Cristianismo autntico animousua f nominal. A doutrina do inferno era especialmente fascinante. Semelhan-temente aos clrigos da Nova Inglaterra, que sentiam o calor do inferno de chamasdurante a fala de Jonathan Edwards, Lewis comeou a temer por sua alma. Oresultado foi o desejo de praticar uma disciplina espiritual. Alm das confrater-nizaes na igreja, Lewis comeou a orar, ler a Bblia e obedecer a sua conscincia.

    Esta deciso, entretanto, no perdurou. A semente foi lanada na pocaem que ele deixou o terceiro internato. Foi aqui, em Cherbourg, que as chamas

    da paixo sobrepujaram o medo do fogo do inferno. Uma danarina amante euma matrona, entrou pela porta dos fundos aberta para um mundo de prazeres

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    proibidos. Mas foi mais do que paixo que desviou Lewis da f. Trs outrosfatores contriburam para seu desvio.

    Primeiro, em Wynyard, Lewis desenvolveu um trabalho bastante acticode aproximao f crist. Fazia suas oraes regularmente noite, mas acreditava

    que nenhum de seus sacrifcios seria satisfatrio, sem as claras percepescorrespondente.

    11Ficava hora aps hora, deitado na cama, tentando conjurar as

    imagens mais apropriadas e concentrao que pudesse ser aprovada como prece.Para sua surpresa, Lewis vive noites interminveis de insnia e frustrao,acreditando que suas expresses repetitivas tivessem cado em ouvidos surdos.As sementes da incerteza estavam lanadas.

    Em segundo lugar, Lewis comeou a ler os clssicos, sendo conseqen-temente confrontado com uma multido de religies conflitantes e persuases

    filosficas. Muitos comentaristas modernos estavam descartando, de cara, todaa sensibilidade religiosa pag. Lewis comeou a considerar as vantagens inespe-radas do Cristianismo, se fosse verdade. Se todas as outras religies so absurdas,por que o Cristianismo deveria ser visto de forma diferente? Com o fundamentointelectual da f, Lewis no tinha como responder a essa pergunta.

    12As ervas

    daninhas estavam se multiplicando.Terceiro, o problema do mal continuava a atormentar Lewis. O efeito

    cumulativo de sua deficincia fsica, a morte de sua me, a disposio pessimistado pai, lendo fico cientfica para alimentar a viso amargurada da realidade,

    levou Lewis a no conseguir reconciliar a beleza esttica do mundo natural, comtodos os seus aparentes defeitos.

    13A erva daninha do atesmo finalmente abalara

    a vitalidade da sua f.

    O Grande Knock

    Finalmente Lewis foi absolvido da experincia negativa dos internatos devez por todas. Ele havia convencido o seu pai a envi-lo a um professor particular,

    W. T. Kirkpatrick, ao qual ele se referia de forma carinhosa como O GrandeKnock.14

    O pai de Lewis foi muito bem preparado pelos ensinamentos deKirkpatrick e tinha certeza de que Kirkpatrick prepararia Jack para ingressar emOxford (chegaria o dia em que Lewis aclamaria Kirkpatrick como elemento chavedo seu desenvolvimento intelectual.) Mas, a princpio, a inexorvel presso paracontinuamente esclarecer, refinar e aguar suas faculdades lgicas era umaexperincia bastante amedrontadora para um garoto, que tinha passado a maiorparte de sua infncia, escavando o jardim de sua imaginao.

    Isso no quer dizer que Lewis fosse um pensador passivo - longe disso.

    Acontece que ele nunca mais iria conhecer algum como Kirkpatrick. Nenhumaafirmao era descartada. Na presena do grande Knock, at mesmo os

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    comentrios mais triviais sobre o tempo e paisagem serviam de desculpa parauma srie de debates dialticos.

    Podemos ter uma idia da figura de Kirkpatrick em O Leo, a Feiticeirae o Guarda-Roupa, na pessoa de Digory Kirke, o simptico professor que

    convida os irmos Pedro, Susana, Edmundo e Lcia a permanecerem na suacasa durante a guerra.

    15Numa das primeiras cenas, Lcia tenta fazer os seus

    irmos acreditarem na sua primeira aventura em Nrnia, mas eles no acreditamnela. Frustradas, as crianas pedem socorro ao professor, apelando para queele a fizesse voltar a si. Depois de argir com as crianas, no sentido maispuramente socrtico, o professor passa imediatamente a esclarecer quais eleacredita que so as nicas opes imaginveis:

    Lgica! disse o professor para si mesmo. Por que no ensinammais lgica nas escolas E dirigindo-se aos meninos declarou: - S htrs possibilidades: ou Lcia est mentindo; ou est louca; ou estfalando a verdade.

    16

    H, entretanto, uma diferena fundamental entre Kirkpatrick e o professor.Como um racionalista radical e ateu convicto, Kirkpatrick no tinha tempo parao invisvel e sobrenatural. Tem-se a impresso de que, se os irmos Pedro, Susana,Edmundo e Lcia tivessem encontrado com o verdadeiro Kirkpatrick, eles teriam

    recebido uma resposta totalmente diferente possivelmente uma exposio,baseada em Hume, sobre o pressuposto dado da baixa probabilidade dos milagres.O ensino de Kirkpatrick intensificou a tenso interna que Lewis j estava

    sentindo entre o concreto e o mstico, a razo e a imaginao, o analtico e ointuitivo. Lewis sintetizou a situao, nos seguintes termos: Praticamente tudoo que eu amava, cria ser imaginrio; praticamente tudo o que eu cria ser real,julgava desagradvel e inexpressivo.

    17

    Kirkpatrick se empenhava em reforar o compromisso dos seus alunoscom o realismo naturalista, a viso de que a verdade fundamental s pode ser

    descoberta por meio dos sentidos. Entretanto, a imaginao recusava-se aentregar- se. Na primavera de 1916, enquanto esperava pelo trem, Lewiscomprou uma edio de Phantastes de George Mac Donald. Mais uma vezLewis estava sendo arrebatado pelas vibraes cativantes da alegria. Mas estaexperincia j estava sendo diferente. Tinha mais profundidade, e uma qualidadeque parecia trazer alguma aparncia de continuidade sua existnciadesesperadamente dividida. Todos os encontros anteriores com a Alegria haviamlanado o mundo tangvel em uma massa informe, mas esta experincia estavaprovocando exatamente o contrrio. O lado mstico que, de alguma forma,estava sendo trazido para o reino da realidade:

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    Mas agora via a sombra brilhante saindo do livro, entrando no mundoreal e pairando ali, transformando todas as coisas comuns sem noentanto se alterar. Ou, mais precisamente, via as coisas comuns sendoengolidas pela sombra brilhante... Naquela noite minha imaginao

    foi, num certo sentido, batizada; o restante de mim, no sem razo,demorou mais tempo. Eu no tinha a menor noo daquilo em queme envolvera ao comprar Phantastes.

    18

    Embora levasse muitos anos ainda, at que Lewis recuperasse sua fcrist, o encontro com Phantastes tornou-se um ponto de retorno. Lewis tornou-se um vido leitor de Mac Donald e viria, futuramente, a editar uma antologiade suas obras. impossvel exagerar o que Lewis devia a Mac Donald. Deacordo com Lewis, todo e qualquer livro que ele publicou na vida inclui pelo

    menos uma citao desse escritor do romantismo escocs.

    A Grande Guerra

    Os anos que Lewis passou com Kirkpatrick mostraram-se inestimveis.Lewis fez excelentes exames de admisso e foi admitido no curso de graduaoda Universidade de Oxford, em 1917. Ficar pulando de uma escola para outratornou-se coisa do passado. Com exceo de dois anos de servio militar pres-tados durante a I Guerra Mundial, Lewis acabaria por passar o resto de seusdias em Oxford.19

    E, de fato, as sagradas salas da academia caiam para Lewis, como um parde sapatos bem confortvel. difcil imaginar qualquer outro rumo para a suavida, se ele tivesse falhado em realizar as suas aspiraes estudantis.

    20Toda a

    sua vida preparou-o para uma carreira de leituras, publicaes, reflexes,orientaes, aulas e debates.

    Oxford teve um impacto profundo sobre a trajetria intelectual e espiritualda vida de Lewis. Ele considerava os estmulos intelectuais revigorantes e pouco

    era necessrio para ele se envolver prontamente numa srie de debates, em queele desenvolvia a defesa de seus pontos de vista com admirvel habilidade.Um dos seus oponentes prediletos era Owen Barfield, que ingressou em Oxfordna mesma poca que Lewis. Barfield, que viria a se tornar um advogadoexcepcional, mostrou-se o oponente ideal, competindo os debates anteriormentetravados com o Grande Knock. Os incontveis confrontos com Barfieldacabaram se tornando conhecidos como a Grande Guerra.

    21Anos de debate

    intenso aguaram o pensamento de ambos, mas foi Barfield quem, finalmente,acabou derrotando o realismo de Lewis.

    Embora Lewis no tivesse como admitir a viso de mundo de Barfield,ele teve de reconhecer duas falhas na sua prpria viso. Em primeiro lugar,

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    Barfield ajudou Lewis a reconhecer a arrogncia do seu prprio esnobismocronolgico [chronological snobbery], a crena de que os novos sistemas depensamento sempre so inerentemente melhores do que aqueles de pocaspassadas.

    22Da mesma forma que os seus contemporneos, Lewis tinha a ten-

    dncia de usar o termo medieval, no seu sentido pejorativo. A revelao destevis ajudou-o, por sua vez, a renovar a sua apreciao pelo pensamento clssico.Em segundo lugar, Barfield mostrou a Lewis que a sua viso no tinha recursossuficientes para dar sentido razo e ao conhecimento. Se a razo fosse algopuramente subjetivo, ento os meios pelos quais algum poderia chegar a talconcluso seriam inaceitveis.

    23O realismo cedeu ao idealismo, a crena de

    que a realidade seja, em ltima instncia, mental. Barfield havia convencidoLewis da existncia do Absoluto, mas seria preciso uma persuaso a mais paratorn-lo em um teista.

    Parte desta persuaso emergiu das pginas dos seus autores prediletos. Asobras de Mac Donald, Chesterton, Johnson, Spencer, Milton, Plato e Virgliohaviam nutrido Lewis com a profundidade que faltava a outros autores. O quetodos esses autores tinham em comum, era uma viso religiosa do mundo. Mas,ao mesmo tempo, Lewis tambm passou a dar-se conta de que os autores quepromoviam a viso de mundo que ele adotara para si, pareciam superficiais. Hmuito tempo, Lewis j estava sentido uma baforada na parte de trs da nuca: Araposa fora expulsa da Floresta Hegeliana e agora corria em campo aberto...E

    quase todos agora (de uma forma ou de outra) faziam parte da matilha: Plato,Dante, Mac Donald, Herbert, Barfield, Tolkien, Dyson, e a prpria Alegria.24

    Lewis havia percebido a corrupo da viso atia da realidade. Querendoou no, ele no podia mais concordar com o seu idealismo. Desde a mais tenraidade, no interior, ele valorizava, acima de tudo, a autonomia a liberdade defazer o que ele quisesse, quando quisesse. Ele se ressentia de figuras autoritriasquerendo meter-se em seus assuntos particulares. E agora a figura de autoridadesuprema, o guarda csmico, o estava encostando contra a parede para tomaruma deciso. Em 1929, Lewis finalmente deu o brao a torcer, admitindo queDeus era Deus, e ajoelhei-me e orei: talvez, naquela noite, o mais deprimido erelutante converso de toda a Inglaterra.

    25

    O Retorno do Filho Prdigo

    Lewis havia se convertido ao tesmo, mas o Filho Prdigo ainda estavabastante longe da porta de entrada. O fato que levou mais dois anos at Lewisretornar ao Cristianismo. Ele lembra de ter-se sentado no assento lateral da

    motocicleta do seu irmo enquanto incrdulo para, depois um breve passeio,desembarcar um cristo convertido.

    26No houve nenhuma experincia inusitada

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    e luminosa no meio da estrada de Damasco, somente a convico de que JesusCristo era de fato quem ele reivindicava ser o Filho de Deus e o nico caminhopara a salvao.

    O obstculo final talvez tenha sido o mais desafiador para Lewis. Como

    afirmamos anteriormente, um dos fatores que contriburam para a sua apostasiaadolescente foi a sua incapacidade de reconciliar a verdade do Cristianismo coma falsidade de todas as outras religies e filosofias. Com ajuda de alguns colegas,J. R. R. Tolkien e Hugo Dyson, noites antes de sua converso, Lewis conseguiuacabou reconhecendo a mo soberana de Deus no apenas na histria doCristianismo, mas igualmente em outros sistemas de f. O mito dos deuses dotrigo, que morrem e voltam a emergir das religies pags no anulava o fato deque Jesus Cristo morreu e ressuscitou. Bem pelo contrrio estes mitos pagoscontribuem involuntariamente para nos convidar a reforar a verdade dos relatoscristos. De acordo com Tolkien e Dyson, um Deus amoroso esteve trabalhandodiligentemente para preparar cada pessoa e cultura para o Evangelho do seuFilho. Assim as histrias da mitologia foram dadas ao homem para anunciar oufazer o teste piloto de um projeto que viria se tornar um fato histrico. OCristianismo no meramente a realizao do sonho dos judeus, e sim, a realizaode todas as demais religies e sistemas filosficos.

    27

    Esta nova perspectiva do problema da exclusividade fazia muito sentidopara Lewis. O Cristianismo , de fato, verdadeiro, mas isso no quer dizer que

    todas as demais vises de mundo sejam totalmente falsas. Todas as criaturas deDeus foram agraciadas com certa dose de intuio, por mais limitada ou obscuraque seja, que tem o intuito de acenar para a sua mais completa manifestao napessoa divina de Jesus Cristo.

    medida que Lewis se conscientizava de que o Cristianismo e outrossistemas de f podem de fato conviver harmoniosamente em certos pontos,aliviava-se a eterna tenso entre a razo e a imaginao. Sob a gide doCristianismo, ambos hemisfrios do crebro podiam coexistir harmoniosamente.E o que mais importante: Lewis finalmente percebeu que o prazer no um fimem si mesmo, mas apenas um indicador que nos conduz mais alm e mais afundo. E Lewis fazia questo de comunicar esta epifania a todo que estivessedisposto a ouvir.

    Um Pau Para Toda Obra

    O que se sucedeu a isso foi uma prspera carreira como escritor. Barfielddestaca que na realidade, haviam trs C.S. Lewis distintos: o que escrevia obras

    acadmicas de crtica literria, o autor de fantasias e novelas, e o que escreviatratados teolgicos e apologticos em defesa do Cristianismo histrico e

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    ortodoxo.28

    Parte da sua abrangente popularidade atribui-se ao espantoso alcancede sua literatura. Muitos apreciam um gnero, sem ter idia da sua proficinciaem outros campos. Tal abrangncia certamente d sentido apresentao meunome Jack (Tal abrangncia certamente traz um novo sentido a velha frase um

    homem de vrios chapus ou um pau para toda obra).A diversidade das obras de Lewis, entretanto, rene-se em torno de duas

    linhas mestras: uma viso inteiramente crist da realidade e um desejo sincerode que o leitor adote este mesmo ponto de vista vantajoso. Lewis admite, semhesitar, que a maior parte de seus livros, tanto os explicitamente apologticos,quanto os no apologticos, tm um vis claramente evangelstico. Nesse sentido,Lyle Dorsett foi muito feliz em declarar Lewis um evangelista literrio.

    29

    Atualmente existem mais de 40 milhes de cpias de seus livros publi-

    cadas.

    30

    Apesar de que ningum pudesse jamais ter previsto esta notvel popula-ridade no final de sua carreira literria. Antes de sua converso, Lewis publicoudois livros de poesias Spirits in Bondage (1919) [Espritos em Cativeiro] eDymer(1926). Nenhum dos dois foi sucesso de vendas, nem obteve boas crticas. Aterceira publicao tambm no teve muito melhor sorte. Somente dois anosaps a sua converso, Lewis publicou uma apologtica alegrica sobre Cristia-nismo, razo e imaginao The Pilgrims Regress [O Regresso do Peregrino],que segue a tradio do famoso livro de Bunyam. Muitos julgaram seus nadasutis ataques contra o pensamento moderno detestveis. Apesar de O Regresso

    do Peregrino ser amplamente reconhecido como uma obra vigorosa e espirituosa,Lewis mesmo chegou a admitir, numa fase espiritualmente mais madura, o desne-cessrio obscurantismo e tom demasiadamente srio da sua primeira obra crist.

    31

    Em 1936 Lewis imprimiu a sua marca como professor de literatura, com apublicao de The Allegory of Love [A Alegoria do Amor]. Este original estudofoi resultado de uma investigao do conceito de amor romntico e da alegoriana Idade Mdia. Ele foi objeto de inmeros artigos, sendo amplamente consideradouma de suas melhores obras de crtica literria. Quase vinte e cinco anos depois,Lewis explicitaria este mesmo tema do relacionamento, em um nvel maispopular, em Os Quatro Amores(1960).

    No final dos anos trinta, Lewis voltou a escrever fico, no que viria atornar-se a sua primeira tentativa de impregnar o Evangelho a contrabando emmentes insuspeitas, pela via imaginativa da literatura.

    32Inspirado pela fico

    cientfica de H.G. Wells, Lewis resolveu produzir uma viso alternativa do cosmos.Ao invs de extra-terrestres sinistros e um quadro extensamente evolucionista,Longe do Planeta Silencioso(1938), Perelandra (1942) e Esta Fora Tenebrosa(1945) exibem um quadro colorido e concreto de outros mundos, encantados por

    uma rica variedade de criaturas sensitivas racionais, morais e estticas. A triologiaespacial de Lewis entra em forte contraste com obras como Guerra nas Estrelas,que pintam os seres aliengenas de bandidos. Na galxia lewisiana, a terra

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    encontra-se ocupada por hostes demonacas e um poder totalitrio a maiorameaa sobrevivncia final do universo.

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    medida que Lewis ocupava a imaginao, impregnando teologia acontrabando pela porta traseira, sua razo batia na porta da frente, por meio de

    obras explcitas como O Problema do Sofrimento(1940),A Extino do Homem(1943) e Milagres (1947). O Problema do Sofrimento representou a primeiratentativa de Lewis de encarar de frente, um assunto profundamente filosfico eteolgico. A questo do mal, sofrimento e injustia vinha torturado-o desde a suainfncia. Nessa obra lcida, Lewis buscou contrapor um Deus todo poderoso,todo amoroso ao que h de inegavelmente tenebroso nesse nosso mundo.

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    Esse horror estava se manifestando de forma especialmente grave no inciodos anos 40. A mquina de fazer guerra da Alemanha avanava com umaeficincia assustador. Foi contra este pano de fundo que Lewis elevava o moralde milhes de pessoas, por meio das suas palestras divulgadas pela rdio BBC deLondres. Inmeros britnicos reconheceram esperana e sentido na reconfortante,colorida e inspiradora viso de mundo da f crist histrica. Estas falas seriamimpressas mais tarde, como Cristianismo Puro e Simples (1952).

    Os anos quarenta provaram ser um perodo especialmente rico paraLewis. Ele mal conseguia publicar seus livros, rpido o suficiente para umpblico que apreciava sua graa, rigor e estilo. EnquantoA Extino do HomemeMilagreslevantavam a hiptese da objetividade dos valores e do sobrenatural,

    as Cartas do Coisa-Ruim (1942) e O Grande Abismo(1945) davam ao mundoinvisvel uma credibilidade palpvel. Esta estratgia de aliar a razo imaginao, credibilidade e plausibilidade, nunca ficou mais evidente, do quenos anos 40.

    Na final daquela dcada, Lewis passou a concentrar mais a sua energia nomundo imaginativo, sentindo-se menos competente para enfrentar as tentaesdo positivismo lgico, que estava assolando a elite intelectual da Inglaterra. Muitosatribuem esta mudana de tendncia ao seu famoso debate com a filsofa profis-sional Elizabeth Anscombe, que desafiou radicalmente os principais argumentosde Lewis contra o naturalismo, sistematizados emMilagres. As opinies variammuito quanto aos efeitos da crtica de Anscombe. Alguns sugerem que Lewis sesentiu arrasado e publicamente humilhado nas mos de uma filsofa altamentepreparada, enquanto outros acreditam que ele dificilmente teria levado o incidenteto a srio. Apesar de o efeito pessoal do debate ser discutvel, no resta dvidade que Lewis levou a crtica a srio. Tanto que as consideraes de Anscombelevaram Lewis retrabalhar um captulo chave, j revisado, deMilagres.

    35

    Toda a ltima dcada da vida de Lewis foi dedicada produo da sua

    obra mais famosa,As Crnicas de Nrnia, de sete volumes. Lewis nunca perdeuo desejo ardente por criar mundos imaginrios, cheios de animais falantes. Suapaixo de infncia foi expressa de forma adulta nas figuras de Aslan, Ripichpi

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    e Bri. Como de costume, Lewis submeteu a primeira verso aos seus colegasautores. A reao foi dividida. Tolkien, que dedicou anos produo de ummundo imaginrio para a trilogia do Senhor dos Anis, levantou objees contrauma criao to rpida e suspeita, por sua miscelnea de figuras mitolgicas.

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    Apesar destes pontos de reprovao de Tolkien em relao ao mundo de Nrnia,as Crnicascativaram milhes de crianas e adultos por seu vigoroso imaginrioe sua simbologia profundamente teolgica.

    Um Profeta Para Nossa Era

    Os anos cinqenta mostraram-se novamente excepcionalmente produtivospara Lewis. Alm das Crnicas de Nrnia, ele pde completar um corpo variado

    de obras, incluindo uma autobiografia, Surpreendido pela Alegria(1955), ummito clssico,At nos Vermos Face a Face(1956), e um livro sobre interpretaobblica,Reflexes sobre os Salmos (1958).

    Por outro lado, os anos 50 tambm foram uma dcada de mudanas. Aprimeira deu-se na sua vida profissional, que at ento vinha sendo provisria,ao ser-lhe oferecida uma cadeira como professor titular em Cambridge. Lewis,que tinha passado trinta anos como um orientador e professor adjunto dauniversidade de Oxford, passava a ocupar a cadeira recentemente formada deLiteratura Inglesa Medieval e Renascentista, cargo que ele ocupou at o ano

    de sua morte.Em segundo lugar, sua to previsvel vida pessoal sofreu uma reviravolta.

    O que comeou como uma troca amigvel de cartas acabou virando uma amizade,que chegou ao casamento. Seu bem-documentado enlace com Helen JoyDavidman provocou novos auges de felicidade, mas ao mesmo tempo tambmas maiores profundezas do desespero. Os seus ltimos anos representaram umrolo compressor de emoes, uma vez que Joy teve cncer, sendo completamentecurada, mas acabou, logo em seguida, sendo vitimada pela doena em 1961,depois de alguns breves anos de desfrute das bnos nupciais.

    A morte de Joy obscureceu profundamente a alma de Lewis. A GriefObserved (1961) [Uma Agonia Observada], originalmente publicado compseudnimo o relato da luta de Lewis contra a dor da perda de sua esposa.Mas a sua f, apesar de abalada, emergiu inteira.

    37Esta obra representa um

    complemento existencial ao seu tratado anterior dado ao mal em O Problemado Sofrimento.

    Somente dois breves anos aps a perda da esposa, aproximadamente umahora antes da morte do Presidente Kennedy, Lewis partiu silenciosamente para a

    eternidade nos Kilns, seu lar perto de Oxford. Lewis no foi a nica eminncia,cujo falecimento foi totalmente ignorado naquele dia. A morte de Kennedy tam-bm lanou nas sombras do esquecimento a partida de um eminente filsofo

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    Aldous Huxley. Em O Dilogo, Peter Kreeft usa esta misteriosa coincidnciapara conduzir um fascinante debate entre esses trs homens, direto do purgatrio,sendo cada um deles representante de uma viso de mundo diferente: o tesmocristo (Lewis), o humanismo moderno (Kennedy) e o pantesmo oriental (Huxley).

    Embora Kennedy sem dvida permanea a figura mais reconhecvel dogrupo, na conscincia pblica coletiva, Kreeft acredita que os outros dois sealiavam, quando se tratava de antecipar o futuro. Em um outro livro, C.S. Lewisfor the Third Millenium[C.S. Lewis para o Terceiro Milnio], Kreeft escreveEu acredito que os dois livros mais profticos do nosso sculo soAdmirvelMundo Novo, de Aldous Huxley e A Extino do Homem, de C.S. Lewis. Sevoc quiser dar uma olhada no terceiro milnio, leia estes livros.

    38

    Os pensamentos de Lewis realmente ultrapassavam em muito a existncia

    terrena. De fato, as fontes secundrias sobre sua vida e idias hoje impedem ocrescimento de sua prpria contribuio volumosa. Em um sentido muito real,Lewis no apenas antecipou o futuro, mas tambm ajudou a construi-lo.

    Francis August Schaeffer (1912-1984)

    Um primeiro aspecto que perpassa toda obra A Tapearia, o relato deEdith Schaeffer, a respeito da vida com seu marido, a convico de que aspessoas e suas decises importam. Cada escolha que fazemos como uma onda

    no mar, que surte efeitos no apenas sobre ns e sobre aqueles que esto nossavolta, mas tambm, em alguns casos, at mesmo as pessoas que esto do outrolado do mundo ou em eras futuras. Vivemos numa rede de inter-relaes.

    Nas primeiras pginas do seu livro, Edith contextualiza a vida de Francisem um quadro global e extensivo. Quando Schaeffer nasceu, Jean Paul Sartretinha sete anos de idade, Salvador Dali oito e Pablo Picasso j tinha pintadosua obra primaDemoiselles dAvignon. No final, e o que mais interessantepara os nossos propsitos, Edith escreve O que me fascina em pensar quequando Fran nasceu, C.S. Lewis era um garoto de treze anos naquele seumiservel internato.39

    E, de fato, Lewis estava penando naquele internato, comeando a despertarpara as coisas ocultas, enquanto Schaeffer estava sendo despertado para a vida,pelas mos de um mdico bbado. Enquanto sua me se esforava, seu paipersuadia o cirurgio a ficar longe da sua garrafa o bastante para facilitar a chegadade seu filho. O ato foi consumado sem maiores problemas, mas os efeitosposteriores do lcool impediram o doutor de registrar o nascimento no dia seguinte.Trinta e cinco anos depois, ao emitir o seu passaporte, Francis descobriu que o

    seu nascimento sequer havia sido registrado. Por sorte, a sua me ainda estavaviva para atestar que Francis August Schaeffer tinha realmente ingressado nomundo no dia 30 de janeiro de 1912.

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    O ponto central do mundo do jovem Francis, era o lar modesto emGermantown, Pensilvnia. Ao contrrio de Lewis, Schaeffer foi educado emum meio onde se valorizava e cultivava o corpo, enquanto o intelecto eraignorado. A famlia Schaeffer orgulhava-se de trabalhar com as mos e Francis

    despendia incontveis horas, ajudando o seu pai, com todo o tipo de serviosmanuais. Subir escadas, cortar lenha, consertar canalizaes e dar uma deeletricista tornava-se a sua segunda natureza. Ele parecia destinado a seguir ospassos de seu pai, ganhando a vida pelo suor do seu rosto.

    Era natural que Francis acabasse concentrar todos seus esforos escolaresno aperfeioamento das suas habilidades manuais. Contudo, j em terna idade,surgiram os primeiros sinais de uma acuidade intelectual excepcional. Uma cartaindicava que os seus escores de desempenho cognitivo colocavam-no em segundolugar em inteligncia entre todos os alunos a ingressarem naquela escola elementarem vinte anos.41 A maioria dos pais teria vibrado, mas no era o caso dos pais deFrancis. Eles preferiam esconder esta novidade do seu filho, aparentemente, commedo de que isso o levaria escolha do mau caminho, em direo ao mundo dosarranha-cus de conhecimentos acadmicos inteis. Ao invs disso, o casalSchaeffer continuou a empurrar Francis rumo a uma vocao tcnica, que opreparasse para negcios prticos e a rotina de um trabalhador honesto.

    Ovdio e Moiss

    Por ocasio do Segundo Grau, o futuro profissional de Schaeffer estavatraado. As aulas de marcenaria e eletricidade reforavam as habilidades prticas,que o seu pai lhe havia ensinado em casa. Mas para um jovem homem denegcios todo cuidado pouco: o canto da sereia dos prazeres culturais poderiamsurgir nos lugares menos esperados. Essa tentao assaltou a vida de Schaeffer,quando ia passando diante de uma loja de eletrodomsticos. O som da aberturade 1812 de Tchaikovsky rajou pelo vento, tocando Schaeffer, da mesma formaqueA Cavalgada das Valkriasde Wagner, devem ter tocado o jovem C. S.Lewis. O amor de Schaeffer pela msica clssica estava nascendo.

    O seu prximo encontro com a cultura deu-se de forma ainda maisinesperada. A famlia Schaeffer no era propriamente uma famlia religiosa, maseles costumavam freqentar uma Igreja Presbiteriana liberal. Um professor daEscola Dominical desta igreja perguntou a Francis se ele estaria disposto a auxiliarum conde Russo no aprendizado do Ingls. Francis concordou e tratou logo deprocurar um livro texto na livraria mais prxima. O funcionrio da livraria, todavia,cometeu um erro e entregou a Francis um outro livro. Ao invs de um livro texto

    em Ingls, Schaeffer recebeu um livro em filosofia grega. Tal erro provou seruma esplndida descoberta. Francis ficou deslumbrado com o contedo do livroe comeou a meditar sobre as grandes questes da vida.

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    A mente de Schaeffer era ativa e extremamente analtica. Ele comeou,por um lado, a criticar o evangelho raso e liberal que era pregado do plpito desua igreja, bem como as meditaes metafsicas dos filsofos gregos. Decidiuento abandonar o Cristianismo completamente. Mas por uma questo de

    compromisso com a honestidade intelectual, ele no o faria, enquanto no tivesselido a Bblia.

    Assim, aos dezessete anos de idade Schaeffer embarcou em sua buscapela verdade. Por uma perodo de seis meses, ele leu a Bblia e, paralelamente,leu Ovdio, comparando e contrastando as duas peas de literatura. No levoumuito at que Francis percebesse que a filosofia grega estava levantando asperguntas certas mas no dava respostas plausveis. A Bblia, por sua vez,estava repleta de respostas. E a maioria das respostas podiam ser encontradaslogo no incio do livro de Gnesis. Ela lhe dizia, de onde viemos, por queestamos aqui e para onde estamos indo. Dava sentido complexidade do beme do mal existentes no mundo. E fornecia uma base, cheia de sentido, paratodas as rea da vida. O compromisso que Schaeffer assumiria pelo resto dasua vida, em relao ao poder auto-autentificador da Bblia e sua mensageminerente, radicava-se na sua prpria experincia, como Edith afirmava:

    Se voc quiser saber, porque o Fran se preocupa tanto com a Bblia esente que ela adequada para responder s questes da vida, a resposta

    certa encontrada aqui mesmo. Quando tinha os seus dezessete anosde idade, o rapaz, com toda a sua sede por respostas aosquestionamentos da vida, comeou a descobrir, por si mesmo,respostas adequadas e completas diretamente na Bblia.

    42

    Schaeffer rendeu sua vida para Cristo e, subitamente, o universo tornou-se repleto de significado. Alm de ler as Escrituras, Francis comeou a alimentara sua vida espiritual nascente por meio da orao. J que o Evangelho queestava sendo ensinado na sua igreja era totalmente estranho ao que ele estava

    abraando nas pginas das Escrituras, Schaeffer sentiu-se, como se fosse onico cristo do mundo a acreditar na Bblia. Ento, certo dia, quando eleestava descendo a rua, escutou a voz de um evangelista apaixonado rajandopelo ar. Ele seguiu o barulho at um local de encontro, onde centenas de pessoasestavam reunidas em baixo de uma tenda, para ouvir as proclamaes doCristianismo histrico, bblico. Schaeffer ficou mais do que alegre em saberque, afinal de contas, no estava sozinho. Existiam outras pessoas que criamcomo ele. Por outro lado, Schaeffer no percebeu o importante papel que estapequena rua, Asmead Place, iria assumir em sua histria de vida. Mal sabia ele

    que, em pouco tempo, ele iria ver-se voltando a Ashmead para conquistar a suafutura esposa.

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    Deu cara

    medida que a f de Schaeffer comeava a seguir o seu rumo, eleapercebeu-se de que estava na hora de alterar os rumos da sua carreira para um

    ministrio de tempo integral. Seus pais persistentemente procuravam faze-lo darcontinuidade ao curso e perseguir a sua carreira na engenharia eltrica. Seu paino podia suportar a idia de Francis de tornar-se um pastor. No que o tocava, ospastores eram verdadeiros parasitas.

    Em um esforo por agradar seus pais, Francis passou a freqentar umaescola vocacional nas proximidades por um semestre, estudando engenhariaeltrica. Mas o chamado para o ministrio continuou dominando seuspensamentos. Contra o desejo da sua famlia ele finalmente decidiu seguir a

    conduo de Deus e matricular-se na faculdade de Hampden-Sydney na Virginia.Na manh da sua partida, ele acordou cedo para despedir-se do seu pai.O que resultou em um rduo confronto. Seu pai expressou extrema desapro-vao, fazendo questo de que Francis reconsiderasse. Por respeito aos seuspais, o jovem Schaeffer foi ao poro para orar sobre o assunto pela ltima vez.Francis buscou a Senhor de forma fervorosa, apostando tudo, na nica estratgiade deciso que conhecia. Tirou uma moeda do bolso e orou, em poucas palavrasSenhor, se voc quer que eu v, faa com que d cara. A moeda voou pelosares e deu cara. Ento, ele repetiu o processo, Senhor, se voc quiser que eu

    v, faa com que d coroa Dessa vez, deu coroa. S para ter certeza, Francisdeu um ltimo lance: Senhor, se voc quer que eu v, faa com que d caranovamente. Deu cara. Para o mximo desapontamento do seu pai, Francismatriculou-se em Hampden- Sydney, confiante de que a mo de Deus estavasobre o seu futuro. Um dia Schaeffer iria apontar para esse momento marcante,como o principal elo de ligao no encadeamento de fatos que resultaram nasalvao do seu pai. Daquele momento em diante, seus pais no podiam maisquestionar a deciso do seu filho e seu forte compromisso com a f crist.

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    Em Hampden-Sydney Schaeffer sentiu-se como um peixe fora dgua. Amaioria dos rapazes eram aristocratas do sul, de esprito libertado. O honestocidado viu-se rodeado de arruaceiros, que desligavam a luz nos corredores dosdormitrios e atazanavam a vida do boa-pinta Schaeffer o mximo que podiam.Mas Francis recusava-se a ficar intimidado. Ele coordenava estudos bblicos dedormitrio e ministrava a seus colegas em palavra e em ao. Uma das expressesmais contundentes do reflexo de Cristo ocorria a cada noite de Sbado. Enquantoa maioria dos residentes do dormitrio saa para beber e fazer a festa, Schaefferficava estudando. Semana aps semana eles voltavam em um estado de

    embriaguez tal, que s podiam confiar em Francis para gui-los atravs doscorredores escuros at as suas respectivas camas. Esta expresso de bondade s

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    tinha uma condio apenas: Francis exigia que eles acordassem cedo e fossem igreja com ele na manh seguinte.

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    Nos domingos de manh, ele saa para servir na igreja, e s tardes ele seaventurava atravs dos campos de cereais, para visitar uma igreja Afro-

    Americana, onde ele era professor de escola dominical para crianas. Os anosque passou nessa igreja lanaram as bases para o que viria a se tornar um diaum ministrio internacional para crianas.

    Ele voltava para casa sempre que podia, visitando seus pais e amigos daigreja presbiteriana. Essa igreja era to pouco ortodoxa que, certa tarde, umministro da linha unitria falou aos jovens. O ttulo de sua pregao era Comoeu sei, que Jesus no o filho de Deus, e como eu sei, que a Bblia no aPalavra de Deus.

    46O ministro foi despejando suas convices sobre estas

    jovens e impressionveis mentes, at que Schaeffer no agentou mais.Levantou-se e manifestou suas objees, com a audcia de um Lutero, masinfelizmente, sem nenhuma proposta a oferecer no seu lugar. No calor daquelasituao de emergncia, ficou evidente que suas opinies estavam indo almdos seus conhecimentos. Tudo que Schaeffer conseguia fazer era apelar para aautoridade dos professores do Seminrio, que afirmavam que h razessuficientes para se sustentar o Cristianismo ortodoxo.

    Enquanto Francis falava, uma jovem mulher, que se encontrava do outrolado do salo, estava tomando nota. Ela perguntou a um amigo, quem era ele.

    O amigo lhe disse que era Francis Schaeffer e que seus pais o tratavam mal,porque ele queria ser um pastor. Assim que Schaeffer sentou, essa jovemlevantou-se e passou a citar algumas boas e suficientes razes, s quais Schaefferhavia s aludido. Francis ficou estupefato. Voltando-se para um amigo, pergun-tou quem era ela. O seu amigo disse que era Edith Seville e que ela tinha semudado para l recentemente, vinda de Toronto. Francis havia encontrado umaalma gmea.

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    Edith era filha de missionrios. Nascida na China, ela teve o privilgio de,desde pequena, conhecer o poder da orao e do discipulado. Ela tambm entendiaa importncia de uma f racional. Quando a famlia de Edith estava instalada nasua nova vizinhana em Ashmead Place, os professores do Seminrio Teolgicode Westminister comearam a freqentar a sua casa. O jantar mesa dos Sevillesempre vinha acompanhado de conversaes animadas sobre teologia reformadae liberalismo radical. Com a caneta na mo, a jovem Edith era entusiasmada emanotar todos os tira-gostos de sabedoria que podia colher. Pode-se dizer, semexageros, que Edith era mais versada em teologia do que Francis, no incio deseu relacionamento. Alis, foi ela que o introduziu aos escritos de J. Gresham

    Machen, um homem que teve grande influncia sobre a vida dos dois.

  • 8/11/2019 Apologtica - C .S. Lewis

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