Apostila capacitacao matematica

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Atividades com jogos para explorar a matemática na educação infantil 1 Atividades com jogos para explorar a matemática na educação infantil Profa. Aparecida Francisco da Silva (UNESP/IBILCE) Profa. Helia Matiko Yano Kodama (UNESP/IBILCE) Introdução Muitas vezes pensamos que a melhor forma de contribuir para analisar e transformar o processo de ensino e aprendizagem, seria descobrir uma fórmula mágica, uma metodologia de ensino com garantia absoluta de sucesso, independentemente dos sujeitos envolvidos. Todos sabemos que uma tal panacéia para todos os males não existe e não defendemos projetos que propõem mudanças radicais, pois, geralmente são de difícil concretização. O uso de jogos para o ensino da matemática, preconizado nos PCN´s, tem, contudo, encontrado resistência nas escolas em parte pelo desconhecimento do potencial desta ferramenta, em parte pelo desconhecimento de quais jogos e como cada um pode ser utilizado nas série específica em que o professor atua. O presente texto, de suporte a curso de atualização de professores da Educação Infantil, pretende orientar o trabalho com alguns jogos selecionados dentre os muitos que podem ser utilizados nesta fase. Observamos que a escolha se deve mais ao fato de adequações ao tamanho das turmas do curso, exploração de diferentes temas, do que uma orientação específica, baseada em pesquisa, de sequencia para trabalho em sala de aula. Embora, em algumas oportunidades tenhamos observado o trabalho com crianças bastante pequenas, cabe ao profissional que atua em sala de aula definir a melhor sequencia, se sente-se a vontade em sua exploração e qual a melhor idade para o seu uso, mesmo porque os alunos de mesma idade nem sempre tem o mesmo amadurecimento em relação ao conhecimento. A idéia de trabalhar com jogos é para aproveitar a curiosidade natural da criança e fazê-la interagir com ambientes propícios para o seu desenvolvimento, produzindo situações em que a criança deve descrever objetos, animais ou o próprio organismo; como atuam ou como funcionam; como se parecem; como e onde se localizam; quantos são; qual sua

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Atividades com jogos para explorar a matemática na educação infantil

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Atividades com jogos para explorar a matemática na

educação infantil

Profa. Aparecida Francisco da Silva (UNESP/IBILCE) Profa. Helia Matiko Yano Kodama (UNESP/IBILCE) Introdução

Muitas vezes pensamos que a melhor forma de contribuir para analisar e transformar o processo de ensino e aprendizagem, seria descobrir uma fórmula mágica, uma metodologia de ensino com garantia absoluta de sucesso, independentemente dos sujeitos envolvidos.

Todos sabemos que uma tal panacéia para todos os males não existe e não defendemos projetos que propõem mudanças radicais, pois, geralmente são de difícil concretização.

O uso de jogos para o ensino da matemática, preconizado nos PCN´s, tem, contudo, encontrado resistência nas escolas em parte pelo desconhecimento do potencial desta ferramenta, em parte pelo desconhecimento de quais jogos e como cada um pode ser utilizado nas série específica em que o professor atua.

O presente texto, de suporte a curso de atualização de professores da Educação Infantil, pretende orientar o trabalho com alguns jogos selecionados dentre os muitos que podem ser utilizados nesta fase.

Observamos que a escolha se deve mais ao fato de adequações ao tamanho das turmas do curso, exploração de diferentes temas, do que uma orientação específica, baseada em pesquisa, de sequencia para trabalho em sala de aula.

Embora, em algumas oportunidades tenhamos observado o trabalho com crianças bastante pequenas, cabe ao profissional que atua em sala de aula definir a melhor sequencia, se sente-se a vontade em sua exploração e qual a melhor idade para o seu uso, mesmo porque os alunos de mesma idade nem sempre tem o mesmo amadurecimento em relação ao conhecimento.

A idéia de trabalhar com jogos é para aproveitar a curiosidade natural da criança e fazê-la interagir com ambientes propícios para o seu desenvolvimento, produzindo situações em que a criança deve descrever objetos, animais ou o próprio organismo; como atuam ou como funcionam; como se parecem; como e onde se localizam; quantos são; qual sua

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periodicidade, seu ritmo e sua velocidade de funcionamento e assim por diante. Juntamente com as habilidades de comunicação, atenção e compreensão, memorização, imitação e de seguir instruções, os conceitos relativos a espaço, tempo e quantidade são centrais à aprendizagem que a escola considera fundamentais.

Segundo Moura (1990), a perspectiva do jogo na educação matemática não significa ser a “matemática transmitida de brincadeira”, mas a “brincadeira que evolui até o conteúdo sistematizado”.

A importância desta atividade é a de permitir, ainda que indiretamente, uma aproximação ao mundo mental da criança, pela análise dos meios, dos procedimentos utilizados ou construídos durante o jogo. A análise das ações permite que o sujeito enriqueça suas estruturas mentais e rompa com o sistema cognitivo que determinou os meios inadequados ou insuficientes para a produção de determinado resultado. Pressupõe Macedo (1992) que esta situação, dita artificial, possa servir de modelo ou quadro referencial para o sujeito, possibilitando transferir as estratégias utilizadas no contexto do jogo para outras situações. Uma má jogada constitui uma excelente oportunidade de intervenção do professor, por permitir uma análise dos erros cometidos, ou seja, as ações da criança que prejudicam o resultado almejado e das estratégias, isto é, do modo como são armadas as jogadas visando ao objetivo final.

Ainda que o trabalho seja direcionado aos aspectos cognitivos, quer na aprendizagem de noções, quer como meios de favorecer os processos que intervêm no ato de aprender, não se ignora o aspecto afetivo que, por sua vez, se encontra implícito no próprio ato de jogar.

A nosso ver, o jogo oferece uma oportunidade para as crianças estabelecerem uma relação positiva com a aquisição de conhecimento, pois conhecer passa a ser percebido como real possibilidade, tendo uma experiência em que aprender é uma atividade interessante e desafiadora. Por meio de atividades com jogos, as crianças vão adquirindo autoconfiança, são incentivadas a questionar e corrigir suas ações, analisar e comparar pontos de vista, organizar e cuidar dos materiais utilizados. Além disso, os jogos com regras são instrumentos para exercitar e estimular um agir-pensar com lógica e critério, condições para jogar bem e ter um bom desempenho escolar.

Piaget (1962 e 1976) diz que a atividade lúdica é o berço obrigatório das atividades intelectuais da criança, sendo, por isso, indispensável à prática educativa. É pelo fato de o jogo ser um meio tão poderoso para a aprendizagem das crianças que em todo lugar onde se consegue transformar

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em jogo a iniciação à leitura, ao cálculo ou a ortografia, observa-se que as crianças se apaixonam por essas ocupações, geralmente tidas como maçantes. Os jogos não são apenas uma forma de desafogo ou entretenimento para gastar energia das crianças mas meios que contribuem e enriquecem o desenvolvimento intelectual.

Na idade pré-escolar, mediante a brincadeira e a fantasia, a criança adquire a maior parte de seus repertórios cognitivos, emocionais e sociais. Dante (1994) sugere que, antes das atividades de ensino de matemática para o pré-escolar, devam ser realizadas atividades concretas que trabalhem o corpo da criança e envolvam o seu meio ambiente, usando sucata e materiais estruturados. Para Dante, as atividades concretas são fundamentais no processo de construção e compreensão das idéias matemáticas; e agrupa os conceitos nas seguintes categorias: noções de grandeza, noções de posição, noções de direção e sentido, noções de capacidade, noções de massa e de classificação (semelhante/diferente).

Platão ensinava matemática às crianças em forma de jogo e preconizava que os primeiros anos da criança deveriam ser ocupados com jogos educativos, praticado em comum pelos dois sexos, sob vigilância e em jardins-de-crianças ( Platão 348 a.C.,apud Almeida 1987).

Alguns aspectos devem ser considerados na aplicação de jogos:

• Nível de dificuldade:

Jogos extremamente “fáceis” ou cuja solução se coloque acima da capacidade do aluno causam desinteresse e pior ainda, associa baixa auto-estima a uma sensação de incapacidade ou fracasso. O professor deve organizar jogos que simbolizem desafios intrigantes e estimulantes, mas possíveis de serem concretizados pelos alunos. O nível de dificuldade ideal não é parte inerente do jogo, mas provém da acuidade e perspicácia de observação do professor que pode, aqui e ali, dar algumas “dicas” facilitadoras quando o jogo é muito difícil, ou criar estratégias mais complexas, se julga de fácil solução.

Uma observação importante, neste momento, é em relação ao desenvolvimento das crianças. Segundo Piaget (1991) na fase da educação infantil as crianças ainda jogam sozinhas, fazendo uma variedade de coisas que não podem ser chamadas de jogo (até os dois anos) ou imitam os colegas mais velhos, mas ainda jogam sozinha, não conseguindo ver outro ponto de vista.

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• Espaço

O ambiente é fundamental. O espaço necessário à manipulação das peças deve ser bem calculado, assim como a cuidadosa embalagem e organização do material, a higiene da mesa ou mesmo do chão que são utilizados.

• Tempo

Os jogos devem ter começo, meio e fim, serem cuidadosamente introduzidos e a posição dos alunos claramente definidas. Um jogo não deve ser interrompido sem prévia consulta ou negociação com os alunos.

Na perspectiva proposta os jogos devem ser escolhidos e trabalhados com o intuito de fazer o aluno ultrapassar a fase da mera tentativa e erro, ou de jogar pela diversão apenas.

“Essa metodologia representa, em sua essência, uma mudança de

postura em relação ao o que é ensinar matemática, ou seja, o professor será

um espectador do processo de construção do saber pelo aluno, e só irá

interferir ao final do mesmo, quando isso se faz necessário, através de

questionamentos, por exemplo, que levem os alunos a mudanças de hipóteses,

apresentando situações que forcem a reflexão ou para a socialização das

descobertas dos grupos, mas nunca para dar a resposta certa. Ao aluno, de

acordo com essa visão, caberá o papel daquele que busca e constrói o seu

saber através da análise das situações que se apresentam no decorrer do

processo”. ( Diniz M. I.S.V. “ A resolução de Problemas”)

Um cuidado metodológico que o professor deve considerar antes de levar os jogos para a sala de aula, é o de estudar cada jogo antes, o que só é possível jogando. Através da exploração e análise de suas jogadas e da reflexão sobre seus erros e acertos o professor terá condições de colocar questões que irão auxiliar seus alunos e terá noção das dificuldades que irão encontrar. O papel do professor é fundamental em sala de aula, é ele quem dá o “tom” do desafio proposto, ele deve ser o líder da situação, saber gerenciar o que acontece, tornando o meio o mais favorável possível, desencadeando reflexões e descobertas. É o professor que tem influência decisiva sobre o desenvolvimento do aluno e suas atitudes vão interferir fortemente na relação que ele irá estabelecer com o conhecimento.

Apresentaremos, no que segue, algumas atividades que podem ser

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exploradas com os Blocos Lógicos, Poliminós, Mancala, Quatro cores e Tangram, bem como referências bibliográficas para o leitor interessado e esperamos que a seleção de atividades aqui apresentadas e suas soluções possam contribuir para o enriquecimento do trabalho em sala de aula de cada um dos participantes e um estímulo para o trabalho de conteúdos de matemática.

Blocos Lógicos (Dienes)

Os jogos que seguem foram retirados em todo, ou parcialmente do texto [11], no qual consta que sua principal fonte foram os trabalhos de William Hull, que, segundo Dienes foi o primeiro a utilizar as peças lógicas como auxiliares na aprendizagem da Lógica. Dienes, empreendeu trabalhos análogos na Austrália e relata em [11] sequencia de atividades propostas e o que se pode esperar com tais atividades.

O material consiste em 48 peças de madeira ou EVA cada uma com quatro atributos: Forma (quadrado, retângulo, círculo, triângulo), Cores

(vermelho, amarelo, azul), Tamanho (grande, pequeno) e Espessura (grosso, fino). Com ele podemos trabalhar conceitos e raciocínio, não existe faixa rígida de idade para a introdução das peças e os jogos podem ser trabalhados em grupo ou individualmente e um jogo completo de peças pode ser utilizado por quatro a seis alunos.

Atividades Selecionadas:

1. Conhecendo as peças

Atividade livre onde as crianças montam figuras e fazem classificações espontâneas das peças.

2. Reconhecendo as peças

2.1. Solicitar que as peças sejam separadas segundo um dos atributos

2.2. Solicitar que separem as peças que possuem dois atributos, por exemplo, azul e grande

2.3. Solicitar que separem as peças que possuem um dos atributos indicados, por exemplo, quadrados ou amarelos.

2.4. O cozido: neste jogo o professor diz que vai fazer uma sopa e que as peças serão os ingredientes. Coloca uma panela (real ou imaginária) sobre a mesa e descreve algumas coisas: preciso de uma cenoura, ela é grande

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amarela e redonda, preciso de algumas cebolas, pequenas e azuis, preciso de alhos, pequenos e amarelos, etc. A cada peça colocada o professor mexe com a colher (real ou imaginária) prova e faz careta. Quando acha que já esta bom pergunta se mais alguém quer provar e brinca de faz de conta que distribui porções para as crianças.

3. Reconhecendo as diferenças entre as peças

3.1. Reconhecendo uma diferença: o professor mostra duas peças, por exemplo um quadrado, vermelho, grande e fino e um circulo, vermelho, grande e fino e pergunta se há diferença e qual é ela.

3.2. Reconhecendo duas diferenças: o professor mostra duas peças, por exemplo, um quadrado, vermelho, grande e fino e um circulo amarelo, grande e fino e pergunta qual é a diferença. Se o aluno apontar apenas uma delas, o professor indaga, alguém percebe se há mais alguma diferença?

3.3. Reconhecendo três diferenças: idem aos anteriores tomando o cuidado de separar duas peças que sejam diferentes em pelo menos três quesitos.

3.4. Reconhecendo quatro diferenças: idem aos anteriores

OBS. Ao finalizar uma etapa como esta o professor deve conversar com os alunos sobre ser diferente e ser igual, em particular enfatizar que duas peças que são diferentes em apenas um atributo devem ser iguais nos outros três, se possuem duas diferenças, são iguais em dois atributos, se possuem três diferenças, preservam um atributo comum. Se são diferentes em quatro atributos, devem ter forma, cor, espessura e tamanhos diferentes.

4. Trenzinho

4.1. De uma diferença, nem mais, nem menos: distribuir as peças pelas crianças, uma delas começa o jogo colocando no centro da mesa uma peça qualquer. A segunda criança deve colocar ao lado da primeira peça uma outra que possua uma diferença e seja igual aquela em três atributos. A brincadeira continua tendo como referencia as peças das pontas. Quem não tiver peça para colocar passa a vez.

4.2. De duas diferenças, nem mais, nem menos: idem ao anterior, com o numero de diferenças, sendo dois.

4.3. De três diferenças, nem mais, nem menos

4.4. De quatro diferenças

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4.5. Variando o número de diferenças: coloca a peça central e define quatro direções para crescer a partir da peça inicial. Em cada uma delas um critério: uma diferença, duas diferenças, três diferenças e quatro diferenças.

5. Jogo do não

5.1. Solicitar que separem as peças que não possuem um determinado atributo, por exemplo as que peças que não são finas, as que não são vermelhas, as que não são quadrados, etc.

5.2. Solicitar que separem as peças que não possuam dois atributos escolhidos, por exemplo que não são vermelhas e grandes.

6. Reconhecendo propriedade

Colocar algumas peças em fila para o aluno descobrir a regra de formação e continuá-la.

7. Descubra o que está atrás do muro

Para cada conjunto de peças, formar dois grupos, com três ou quatro crianças. Separar as peças em dois grupos e entregar aos grupos de crianças, deixando-os explorar por um período. Em seguida, as equipes sentam-se de frente uma para outra e é feita uma muralha entre elas de modo que uma equipe não possa ver as peças da outra. As equipes se revezam, solicitando, a sua vez, uma peça para a outra equipe, que se possuí-la deve entregar à outra equipe. Se a outra equipe não tiver a peça, o solicitante passa a vez para o outro. Cada peça citada uma vez, não poderá ser pedida uma segunda vez. Termina o jogo depois de um tempo estipulado, ou quando uma equipe tiver um certo numero, pré-definido, de peças a mais que a outra. Ganha a equipe que tiver o maior número de peças.

8. Formando pares (comparando as características das peças para a formação de pares)

Formar um par de peças quaisquer e continuar formando pares que obedeçam a mesma regra.

OBS. É importante fazer rodízio entre as crianças e os grupos para que todos tenham oportunidade iguais.

9. Comparando o numero de peças:

O professor faz duas filas arbitrarias e o aluno informa onde há mais (ele pode não saber contar, mas pode comparar, eliminando, simultaneamente, das filas

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peças - onde sobrar peças, havia mais peças)

10. Piquenique - (Descoberta de atributos que tem o mesmo número de variáveis que as regiões que estão sendo apresentadas)

A professora conta uma história de algumas crianças que vão fazer um piquenique no parque e pedem para que façam de conta que as peças são as crianças e que as quatro caixas são os ônibus que vão levá-las. Em seguida, solicita que coloquem as crianças (peças) nos ônibus segundo alguma característica comum.

Quando chega no parque há dois portões e espera-se que as crianças agrupem por tamanho ou espessura.

Dentro do parque as crianças podem escolher brincar de três jogos. Vamos arrumar as filas para cada jogo?

Como escrevemos no início, os conceitos podem ser introduzidos ou reforçados, utilizando os jogos. No caso dos blocos lógicos, os conceitos redondo, grande e pequeno, espessura, perto de, vizinho de, podem ser introduzidos ou mesmo reforçados. Muitos outros jogos podem ser explorados alguns descritos em [1], outros esperando a sua colaboração e capacidade criativa.

Mancala

Há muito coisa escrita sobre o mancala. No livro Os melhores jogos do mundo (sem data, p.122-125), encontramos:

� A palavra mancala origina-se do árabe naqaala, que significa mover. Com o tempo, esse termo passou a ser usado pelos antropólogos para designar uma série de jogos disputados num tabuleiro com várias concavidades e com o mesmo princípio de distribuição de peças. A forma pela

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qual este se realiza está intimamente associada à semeadura. Esse fato, aliado ao local de origem, leva a crer que os jogos da família mancala são talvez os mais antigos do mundo.

• A origem mais provável é o Egito. A partir do Vale do Nilo, teriam se expandido para o restante do continente africano e para o Oriente. Alguns estudiosos supõem que os mancalas têm cerca de 7 mil anos de idade (...). Os mancalas são atualmente jogados em toda a África, ao sul da Ásia, Américas e na maior parte da Oceania.

� Segundo o pesquisador H. J. R. Murray, existem quase 200 tipos diferentes de mancala. Conforme o lugar de origem, têm diferentes denominações.

� Antigamente, o jogo era associado a ritos mágicos e sagrados. Dependendo do lugar, era reservado apenas para homens ou para os mais velhos, ou ainda, era exclusivo dos sacerdotes. Mas, na maior parte dos países onde é atualmente jogado, perdeu seu caráter mágico e religioso. Contudo, ainda há regiões em que os mancalas estão ligados a raízes sagradas.

� Entre os alladins – povo da Costa do Marfim – o hábito de jogar awelé, jogo da família mancala, é restrito apenas à luz do sol. (...) À noite, deixam os tabuleiros nas portas das casas para os deuses poderem jogar, e , ninguém se atreve a tocar nos tabuleiros, temendo o castigo divino. Nessa mesma nação, quando um rei morre, os pretendentes ao trono jogam awelé entre si, durante a noite que se segue aos ritos funerários. O novo rei – afirmam eles – será escolhido pelos deuses e o sinal é a vitória que eles obtêm no jogo.

� Os escravos, que tanto influenciaram a cultura americana, trouxeram para as Antilhas e os Estados Unidos um determinado tipo de mancala – o adi – originário da região de Daomé. Daí se explica a popularidade desse jogo nessas regiões.(...) No Brasil, o adi também foi muito popular. Segundo consta, teria sido desbancado posteriormente pelo dominó, mas associado a um forte sentido mágico e religioso, é uma amostra concludente da força dos mancalas também na cultura afro-brasileira.

� Outra versão sobre a origem desse jogo é apresentada por De Voogt (1997). Segundo esse autor, acredita-se que o mancala originou-se na Ásia ou na África, mas o desenrolar de sua história continua obscuro, principalmente porque não se estudou muito os jogos de mancala asiáticos nem há informações mais aprofundadas sobre africanos.

As características gerais comuns às diferentes modalidades encontradas:

1. São jogados por duas pessoas, uma em frente à outra, com o tabuleiro colocado entre elas;

2. No início do jogo, cada cavidade do tabuleiro deve ter o mesmo número de sementes;

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3. Os jogadores se alternam para jogar, distribuindo as sementes da cavidade escolhida, uma a uma, no sentido anti-horário, nas cavidades subseqüentes;

4. Sempre há captura de sementes, mas a forma de captura pode ser diferente, dependendo do jogo em questão;

5. A partida termina quando resta muito poucas sementes para o jogo continuar ou quando resta apenas uma semente em cada lado;

6. Ganha quem tem o maior número de sementes;

No trabalho que estamos propondo utilizaremos a seguinte versão do mancala: o material é constituído de 36 sementes e de um tabuleiro retangular contendo 14 cavidades, sendo duas fileiras de 6 casas cada uma e duas maiores que servem de reservatório (oásis), como mostra a figura abaixo:

Fonte: http://photos1.blogger.com/x/blogger/628/3957/1600/432238/mancala.png

Participam dois jogadores e o objetivo é obter maior quantidade de sementes que o adversário.

As regras são as seguintes:

1. Distribuem-se 3 sementes em cada uma das 12 cavidades (exceto nas casas da extremidade, chamadas oásis);

2. O território de cada jogador é formado pelas 6 casas da fileira à sua frente, acrescido do oásis à direita (somente utilizado pelo proprietário);

3. À sua vez, o jogador pega todas as sementes de uma de suas casas e distribui uma a uma nas casas subseqüentes, em sentido anti-horário; inclusive no seu oásis, se passar por ele, sem colocar, no entanto, nenhuma semente no oásis adversário;

4. Toda vez que a última semente for colocada numa casa vazia pertencente ao jogador, ele pode “comer” todas as sementes que estiverem na casa adversária paralela à sua, colocando-as no seu oásis;

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5. Ao terminar a distribuição das sementes (“semeadura”), o jogador passa a vez, exceto quando a última semente distribuída for colocada no seu próprio oásis. Nesse caso, ele deve jogar de novo.

6. O jogo termina quando todas as casas de um dos lados estiverem vazias e o jogador da vez não tiver mais nenhuma casa com um número suficiente para alcançar o outro lado;

7. Vence quem tiver maior número de sementes em seu oásis (as sementes restantes no tabuleiro não entram na contagem).

Lembramos que a exploração significativa com jogos para a formação de conceitos, ou sua fixação, pressupõe o questionamento dos alunos, durante as jogadas ou ao final do jogo. Em uma discussão coletiva (pela classe toda ou grupos de alunos), podem ser simuladas situações que tenham aparecido no jogo, ou não. Por exemplo, as casas podem ser enumeradas (ou apontadas para os alunos) conforme exemplos a seguir e podem ser propostas as seguintes atividades:

1. Observe a situação abaixo. A partida será iniciada pelo jogador A. Qual a melhor casa para começar o jogo? Justifique.

12 11 10 9 8 7

A (3) (3) (3) (3) (3) (3)

(0) (0)

B (3) (3) (3) (3) (3) (3)

1 2 3 4 5 6

2. O jogo está como mostra a situação abaixo.

12 11 10 9 8 7

A (4) (4) (0) (3) (3) (3)

(1) (0)

B (3) (3) (3) (3) (3) (3)

1 2 3 4 5 6

a) Se você fosse o jogador A, em qual casa mexeria? Por quê? b) Suponha que o jogador A mexeu na casa 7 e ganhou, portanto, 3 sementes. O que B poderia fazer para ganhar mais que essa quantia de sementes já na próxima vez?

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3. Observe a figura abaixo. Descreva a seqüência de movimentos que o jogador A deve fazer para colocar o maior número de sementes em seu oásis. Quantas sementes consegue capturar?

12 11 10 9 8 7

A (1) (2) (3) (0) (0) (0)

(9) (13)

B (0) (0) (0) (1) (3) (4)

1 2 3 4 5 6

4. Analise a situação abaixo e responda as questões a seguir:

a) Qual jogador você gostaria de ser?

b) Suponhamos que A seja o próximo a jogar. É possível uma captura de 12 sementes, nesta jogada? Se for, descreva a seqüência necessária para ele conseguir capturá-las.

12 11 10 9 8 7

A (1) (2) (10) (3) (0) (0)

(5) (3)

B (1) (1) (0) (2) (1) (7)

1 2 3 4 5 6

5. Depois de jogar algumas vezes, podemos propor, ainda algumas alterações nas regras do jogo, como por exemplo:

� O que ocorre se mudarmos a quantidade inicial de 3 sementes em cada casa, até chegar a 6?

� Modificar a contagem de pontos no final da partida. Cada jogador deve subtrair do total de sementes existentes em seu oásis as sementes restantes em seu campo. O resultado dessa operação corresponderá à sua pontuação final. Adotar esse critério para determinar o vencedor de uma partida obriga o jogador a não aglutinar um excesso de sementes em seu território. Desta forma, propomos um critério que enfatiza a necessidade de semear, que é uma forma de reforçar a importância do planejamento.

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Jogos de Quatro Cores

O problema que levou à criação de Jogos das Quatro Cores data de 1852, quando Francis Guthrie, percebeu que a maioria dos mapas encontrados em atlas eram pintados com quatro cores, respeitando-se o critério de não utilizar a mesma cor em territórios adjacentes. Daí, surgiu o teorema: quatro cores bastam para colorir qualquer mapa sem que as regiões vizinhas tenham a mesma cor.

No que segue apresentaremos basicamente três jogos diferentes envolvendo o problema: Cilada das cores, Dominó das Quatro Cores, Tetracores, usando como referência [15] e [16]

Para o trabalho com a família de jogos e a proposta do problema podem ser seguidas as seguintes atividades:

1. Colorir mapas

Nesta atividade é apresentada uma figura e solicita-se que o aluno pinte a figura, utilizando o mínimo de cores possível, de forma que regiões vizinhas (aquelas separadas por uma linha) não possuam a mesma cor.

2. Cilada das cores

Nesta modalidade, trata-se de colorir a figura dada, mas com dois jogadores. O objetivo é criar uma situação na qual o oponente não possa mais cumprir as regras apresentadas a seguir:

- os jogadores devem colorir a mesma figura; - ambos usam as mesmas quatro cores; - cada qual, à sua vez, pinta uma região da figura, vizinha à última colorida por seu oponente; - se o item não puder ser cumprido, deve-se fazer da seguinte forma, de acordo com o caso: Situação 1 - o jogador caiu numa cilada ( não há cor disponível para ser utilizada): o jogador deve colocar a inicial de seu nome na região que não pode ser colorida e colorir outra região, desde que vizinha a uma já colorida. Situação 2 - a última região colorida não apresenta regiões vizinhas sem colorir: neste caso, o jogador escolhe uma região qualquer, desde que vizinha a uma que já foi colorida.

3. Dominó das quatro cores

3.1. Como um quebra-cabeça, o desafio do jogo consiste em compor um quadrado com as peças de modo que cores iguais não sejam vizinhas, nem mesmo pelos vértices.

3.2. Jogado em duplas, cada jogador, à sua vez, escolhe uma peça e a coloca

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sobre uma base quadrada (a peça não precisa ser adjacente à ultima colocada). Perde o jogo aquele que não conseguir, à sua vez, colocar uma peça dentro da área do quadrado, seguindo as regras.

3.3. Cada jogador escolhe nove peças ao iniciar a partida. À sua vez, só poderá colocar uma dentre as peças pré-selecionadas. O jogo prossegue até que um dos jogadores não possam mais colocar peças para formar o quadrado. Ganha quem ficar com menos peças ao final da partida.

4. Tetracores

É distribuído um quadrado como na figura 1. A seguir solicita-se que pintem os quadrados de modo que em cada quadrado sejam usadas as quatro cores e os triângulos vizinhos, separados por um lado do quadrado, sejam pintados com a mesma cor.

Depois recortam-se os triângulos e solicita-se que montem a figura original ou seguindo a regra usada para colorir.

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Figura 1.

Poliminós

O pentaminó (quebra-cabeça geométrico) da forma comercial hoje utilizada, foi apresentado por S. W. Golomb em artigo publicado em 1954 ([7]), onde além de introduzir a nomenclatura, apresenta uma série de problemas envolvendo recobrimento de tabuleiros de xadrez com poliminós. Para Golomb, um poliminó é uma figura plana obtida pela justaposição de quadrados de forma que não fique “buracos” e dois quadrados justapostos têm sempre um lado em comum. Desde a publicação de Golomb até os dias de hoje é crescente o interesse pelos problemas propostos e seus desdobramentos.

Basicamente temos apenas uma forma com um quadrado, ou dois quadrados. Com três quadrados, podemos formar duas figuras diferentes e com quatro quadrados, cinco formas diferentes, conforme pode ser visto na Figura 2. Já com cinco quadrados, os pentaminós, são 12 formas diferentes, vide Figura 3.

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Figura 2 Figura 3

Os hexaminós são formados por seis quadrados e podemos obter 35 formas diferentes, o que dificulta sua utilizado em sala de aula. Do hexaminó em diante o número de peças formadas aumenta muito.

Algumas atividades que podem ser exploradas são:

1. Construindo diferentes formas

1.1. Construir figuras quaisquer utilizando os “monominós”; 1.2. Contar quantas peças foram usadas nas figuras; 1.3. Construir figuras utilizando 2 quadrados; 1.4. Repetir o processo para 3, 4, 5 ou mais quadrados; 1.5. Colocar a regra: ter um lado em comum e utilizando a regra, formar figuras com duas, três, quatro, cinco ou mais peças. 2. Composições Planas Direcionada 2.1. Construir figuras planas com os pentaminós 2.2. Fornecer às crianças a figura pronta e solicitar que recubram com os pentaminós, por exemplo, figuras abaixo e, em seguida, retirando os pentaminós, colorir de modo que cada pentaminó seja representado por uma cor diferente ou tonalidades diferentes de uma mesma cor. Aqui pode-se utilizar as composições elaboradas pelos alunos.

2.3. Construir retângulos: 3x20,4x15, 5x12, 6x10, etc.

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2.4. Formar retângulos com buraco com formato de um pentaminó.

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Exemplo do retângulo 5x13 utilizando o pentaminó Z

3. Problemas de Ampliação

3.1. Duplicação

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3.2. Triplicação apresentamos duas soluções e as demais podem ser encontradas em [ 13 ]

4. Tabuleiros mutilados Como temos 12 peças com cinco quadrados cada podemos recobrir uma área de 60 quadradinhos. Um tabuleiro de xadrez possui 64 quadradinhos. Podemos escolher locais para deixarmos sem recobrir quatro casas e usando os pentaminós recobrir as demais. Diferentes soluções podem ser encontradas em [13]

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Tangram O Tangram é um quebra-cabeça chinês, de origem milenar. Ao contrário dos outros quebra-cabeças ele é formado por apenas sete peças com as quais é possível criar e montar cerca de 1700 figuras entre animais, plantas, pessoas, objetos, letras, números, figuras geométricas e outros. As regras desse jogo consistem em usar as sete peças em qualquer montagem colocando-as lado a lado sem sobreposição. Pelo que se tem noticia, esse jogo foi trazido da China para o Ocidente por volta da metade do século XIX e em 1818 já que era conhecido na América, Alemanha, França, Itália e Áustria. A origem e significado da palavra Tangram possui muitas versões.

Atividades selecionadas: 1. Apresentação do material para os alunos, com informações contidas na introdução e reconhecimento das figuras geométricas do Tangram 2. Criação das mais variadas figuras, dentre as quais se destacaram objetos e animais. 3. Construindo figuras planas utilizando peças do Tangram: 3.1. Construção de quadrados utilizando apenas triângulos.

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3.2. Construção de outras peças do tangram usando apenas os dois triângulos pequenos.

3.3. Utilização de quaisquer peças para montar o triângulo grande

3.4. Construção de triângulos e quadrados utilizando uma, duas, três peças do tangram.

3.5. Construção de Polígonos utilizando as peças do tangram BIBLIOGRAFIA

[1] Martin Gardner: Mathematical Puzzles & Diversions, New York 1959 bild der wissenschaft -7/1976

[3] Solomon W. Golomb: Polyominoes, Princeton, New Jersey 1994 (ISBN0-691-08573-0)

[4] LudoMania - http://www.ludomania.com.br/clube/pentaminos.html

[5] Jogos Antigos - http://www.jogos.antigos.nom.br/qcabeca.asp

[6] Nova Escola - Abril - http://novaescola.abril.com.br/ed/112_mai98/html/cc_matematica.htm

[7] Art & Fatos Poéticos - www.artefatospoeticos.com

[8] Mathematische Basteleien -http://www.mathematische-

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basteleien.de/pentominos.htm

[9] Silva, A. F.; Kodama, H. Y. Poliminós. In: Núcleos de Ensino, p. 349-370. Universidade Estadual Paulista – Publicações, São Paulo, 2003.

[10] Centurión, M. – Conteúdo e Metodologia da Matemática: Números e

Operações. Editora Scipione,1995 – 2a edição

[11] Dienes, Z.P.- Golding, E.W. – Lógica e Jogos Lógicos. Editora Pedagógica e Universitária – São Paulo, 1976 – 3a edição

[12] Macedo, L. e outros. Aprender com Jogos e Situações-Problemas. Artmed, 2000.

[13] Sócio Industria e Comércio de Brinquedos Ltda. Pentaminó (Quebra-Cabeças Geométricos).

[14] Souza, E.R.; Diniz, M.I.S.V.; Paulo, R.M.; Ochi, F.H. a Matemática das

Sete Peças do Tangram. IME-USP, 2a edição, 1997

[15] Macedo, L., Petty, A .L.S., Passos, N.C. - Quatro Cores, senha e dominó: oficinas de jogos em uma perspectiva construtivista e psicopedagógica. – São Paulo: Casa do Psicólogo Livraria e Editora Ltda, 1997.

[16] Silva, A. F.; Kodama, H. Y. Dominó das Quatro Cores. In: Núcleos de Ensino, p. 200-214. Universidade Estadual Paulista – Publicações, São Paulo, 2005.

[17] Fanti, E.L.C.; Silva, A.F. Informática e Jogos para o ensino da matemática - notas de minicurso em 2ª Bienal da SBM - 2004.