Apostila Construção de Projetos Pedagogicos

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Construção de Projetos Pedagógicos Núcleo de Pós-Graduação

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Apostila Construção de Projetos Pedagogicos

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  • Construo

    de Projetos

    Pedaggicos

    Ncleo de Ps-Graduao

  • 2

    SUMRIO

    INTRODUO ................................................................................................... 5

    1. PROJETO POLTICO PEDAGGICO PPP ................................................ 6

    2. PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: BREVE HISTRICO ........................... 6

    3. O PLANEJAMENTO NA PERSPECTIVA DA GESTO DEMOCRTICA . 13

    4. A INOVAO REGULATRIA E O PROJETO POLTICO-PEDAGGICO...

    ...........................................................................................................................15

    5. O PROJETO POLTICO-PEDAGGICO COMO INOVAO EMANCIPATRIA OU

    EDIFICANTE ................................................................................................... 18

    6. CONCEITUANDO O PROJETO POLTICO-PEDAGGICO ...................... 21

    7. PRINCPIOS NORTEADORES DO PROJETO POLTICO-PEDAGGICO 25

    8. A IDENTIDADE DA ESCOLA ..................................................................... 32

    9. CURRCULO ESCOLAR .............................................................................. 33

    10. TRABALHO DE SENSIBILIZAO E PREPARAO ............................ 36

    11. METODOLOGIA DE TRABALHO PARA A ELABORAO DO

    PROJETO.......................................................................................................... 37

    12. MARCO REFERENCIAL.............................................................................41

    13. ESTRUTURA DO PROJETO POLTICO-PEDAGGICO..........................50

    REFERNCIAS..54

  • 3

    INTRODUO

    O presente material uma coletnea reflexiva a cerca da importncia da do Projeto

    Politico Pedaggico, sua conceituao, elaborao e papel edificante e emancipatrio na

    Educao.

    Fundamentalmente tarefa imperiosa a construo coletiva do Projeto Politico

    Pedaggico, como instrumento norteador das aes que permeiam os espaos escolares,

    porm ele no se constitui modelo rgido a se seguir, pois deve ser embasado por

    referenciais no que se refere prtica educativa e seus processos abrangentes.

    No nos referimos aqui mera carta de intenes, ou simplesmente a aspectos

    puramente tcnicos na construo do Projeto Politico Pedaggico.

    Nossa inteno ir alm, permitir e propiciar a reflexo critica desde o

    estabelecimento e elaborao do Marco Referencial at a Estruturao do processo de

    construo do Projeto.

    Oferecemos ento, possibilidades e desafios como subsdio do pensar e do fazer

    critico tendo como principio a educao de qualidade e como finalidade a proposta de uma

    educao onde alunos, professores e profissionais da educao sejam os reais

    protagonistas.

    Bons estudos!

    Prof Fatima Ramalho Lefone

  • 4

    1. PROJETO POLTICO PEDAGGICO - PPP

    O Projeto Poltico-Pedaggico (PPP) um dos mais importantes e polmicos documentos

    escolares e tende a ser marcado por um discurso acadmico por vezes muito bem

    embasado, todavia, desligado de uma perspectiva prxica. O senso comum costuma

    atribuir o carter aptico do PPP falta de conhecimento por parte de professores,

    gestores e alunos das prerrogativas legais, ticas e axiolgicas desse documento. Mesmo

    que o discurso do Projeto Poltico-Pedaggico seja plenamente compreendido pelo coletivo

    dos que com ele se relacionam na escola, se no houver uma adequada

    instrumentalizao e uma efetiva organicidade entre o PPP e outras aes letivas, se ter

    apenas um belo discurso encadernado.

    A realidade posta dentro do mbito escolar revela, porm que nem todos os segmentos

    que permeiam a construo do processo educativo constituem uma participao efetiva na

    elaborao do PPP.

    2. PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: BREVE HISTRICO

    Ao se pensar a educao, procura-se sempre fazer uma recomposio histrica uma vez

    que suas razes esto engendradas em um processo tardio de democratizao e em um

    ensino pblico que no foi prioridade das polticas pblicas que se implantaram ao longo

    da histria.

    O planejamento educacional no Brasil e o desenvolvimento econmico e social estiveram

    historicamente atrelados, isto , a educao no foi pensada em funo de benefcios para

    a populao, mas sim em funo do desenvolvimento econmico. o que afirma

    CALAZANS:

    O planejamento num sistema capitalista no mais do que a forma de racionalizao da reproduo ampliada do capital; fica, portanto, claro que no o planejamento que planeja o capitalismo, mas o capitalismo que planeja o planejamento. (...) se concordarmos que o capitalismo que planeja o planejamento, estaremos anuindo que o planejamento da educao tambm estabelecido a partir das regras e relaes da produo capitalistas, herdando, portanto as formas, os fins, as capacidades e os domnios do modelo do capital monopolista do Estado. (CALAZANS, 2007, p.13)

  • 5

    A preocupao com o sistema educacional e com uma poltica de educao estatal surge

    somente no final do Imprio e incio da Repblica, fruto do fortalecimento do Estado, pois

    at ento essa educao era delineada pela Igreja.

    At a dcada de 1920 no havia uma funo educadora para o nvel mdio e primrio,

    razo pela qual eles no mereceram ateno do Estado. A educao era um instrumento

    de mobilidade social e era utilizada como distintivo de classe, onde a classe mdia

    procurava como via de ascenso social, prestgio e integrao com o poder dominante.

    A dcada de 1930 no Brasil foi marcada por dois modelos de Estado, sendo que antes

    disso a estrutura econmica brasileira era baseada na agricultura e o poder poltico se

    concentrava nas oligarquias rurais, era uma economia primrio-exportadora, havendo

    ento a transio de uma sociedade oligrquica para urbano-industrial. A partir de 1930,

    surge o modelo econmico nacional-desenvolvimentista com a participao mais ativa do

    Estado na economia, passando este a desempenhar funes cada vez mais complexas no

    conjunto da economia, que vo desde a formulao de regras de desenvolvimento at a

    criao e manuteno de empresas estatais.

    Dentro deste cenrio nacional foram efetivadas as primeiras tentativas de planejamento no

    Brasil em decorrncia natural da nova concepo do estado como fomentador do

    desenvolvimento nacional.

    Com a Constituio Federal de 1934 houve a elaborao de um Plano Nacional de

    Educao implantando a gratuidade e obrigatoriedade do ensino primrio, e em 1937 com

    a nova Constituio previu-se a introduo do ensino profissionalizante. Aos poucos a

    sociedade brasileira passou a conscientizar-se da importncia estratgica da educao

    para assegurar e consolidar as mudanas econmicas e polticas que estavam sendo

    empreendidas.

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    As dcadas de 1930 e de 1940 so caracterizadas como marco inicial do planejamento no

    Brasil, quando aparece a ideia de Plano Nacional de Educao com o Manifesto dos

    Pioneiros na Educao Nova. Esse Manifesto fez um diagnstico da educao pblica

    brasileira e mostrou a necessidade de se criar um sistema de organizao escolar que

    estivesse de acordo com as necessidades do pas, aproximando a ideia de Plano de

    Educao relacionado com o conjunto de atividades educativas coerente e eficaz para uma

    determinada sociedade. Segundo Saviani, provavelmente a sua primeira manifestao

    explicita nos dada pelo Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova, lanado em 1932

    (2002, p.72), embora o contedo deste Plano de Educao seguia as orientaes que

    predominaria no Estado Novo, afastando-se da ideia dos pioneiros.

    As dcadas de 1940 e 1950 foram marcadas pela grande euforia do desenvolvimentismo.

    A educao, neste cenrio plenamente dominado pelo economicismo, aparece como

    instrumento para promover o crescimento e reduzir a pobreza, uma vez que o

    planejamento educacional considera o analfabetismo como responsvel pelo atraso e pelo

    subdesenvolvimento, passa a ser visto como necessrio e indispensvel ao

    desenvolvimento social. Mas somente a partir da dcada de 1960 foi possvel falar em

    planejamento educacional propriamente dito, com a promulgao da Lei de Diretrizes e

    Bases nmero 4.024, promulgada em 1961.

    Para confirmar e concluir este esboo histrico cita-se OLIVEIRA, para quem:

    A educao vista como um importante instrumento no planejamento do desenvolvimento medida em que deve prover o pas de conhecimentos tcnicos e de um grau de evoluo que favorea o crescimento da produo e a melhoria do nvel de vida dos habitantes. A educao deveria ser pensada em integrao com o planejamento econmico, fixando metas e quantificando recursos. (OLIVEIRA, 2003, p. 79)

    Durante o perodo de 1932 a 1962, o Planejamento Educacional era um instrumento de

    racionalismo cientfico sob a gide da Escola Nova e no perodo que se segue at 1985 o

    Planejamento Educacional transforma-se num instrumento de racionalidade tecnocrtica,

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    ou seja, tecnicista, devido s mudanas ocorridas no cenrio poltico e educacional.

    Segundo CALAZANS,

    Nos anos de 1964 a 1985 perodo da ditadura militar -, com o fim de planejar e promover o desenvolvimento, foram produzidos cerca de 6 planos nacionais de educao, incluindo-se os captulos dos Planos Globais de Desenvolvimento dedicados educao. Eles programavam objetivos na mesma direo, sedimentados pelo forte aparato da tecnoestrutura estatal e do neutro discurso tecnicista. (CALAZANS, 2003, p.25)

    Durante a dcada de 1980 o planejamento esteve ligado ao controle empreendido pelo

    sistema autoritrio do Regime Militar, embora este sistema j estivesse marcado pela crise

    econmica, poltica e social.

    Diante da crise do estado assistencialista e provedor, surge a necessidade de reformas

    administrativas possibilitando o desenvolvimento econmico com eqidade social, uma vez

    que as reformas propostas apresentam como tendncia geral descentralizao e

    desconcentrao dos poderes de deciso e restaurao da capacidade de coordenao

    e planejamento. Assim, a noo de planejamento centralizado comea a ser deixado de

    lado como um modelo a ser perseguido sendo apontado como um estilo de crescimento

    que exclui os mais pobres, acentuando ainda as distores sociais ao invs de corrigi-las,

    a crise de paradigmas do planejamento. Conforme GARCIA,

    O planejamento e os planejadores vivenciam esta situao de horizontes nebulosos com ansiedade e falta de perspectivas de curto e mdio prazo. As propostas de ontem j no servem para hoje. A ideologia de que o Planejamento uma tcnica neutra j foi esclarecida exausto, quando revela seu carter comprometido com um estilo de crescimento que exclui dos benefcios do desenvolvimento os mais pobres e ajuda a enriquecer ainda mais a diminuta parcela que tudo tem. Em realidade o planejamento em geral o Planejamento educacional em especial foram utilizados para sedimentar um modelo de sociedade que acentuou distores, ao invs de corrigi-las. (GARCIA, 2003, p.38)

    Dentro deste cenrio, o planejamento central comea a ser substitudo por formas mais

    flexveis de gesto, como a noo de planejamento descentralizado, indicando mudanas

    no deslocamento do eixo de poder. Segundo OLIVEIRA,

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    O planejamento burocrtico e centralizado deve ajustar-se realidade imediata, sem, contudo, abalar o equilbrio do todo, que deve sobreviver apesar das suas especificidades locais. A realidade emergente aponta para formas pluricentradas de planificao, onde o poder no emana mais exclusivamente do Estado. (...) No que o planejamento tenha sido descartado como um instrumento de poder, ao que parece, ele tem se adequado nova realidade que se apresenta de forma mais heterognea, mvel e flexvel. (OLIVEIRA, 2003, p.88-89).

    Em 1988, com a promulgao da Constituio Federal, ao incorporar a gesto democrtica

    da educao como demanda dos movimentos sociais garantiu-se novas formas de

    organizao e administrao do sistema, tendo como objetivo a universalizao do ensino

    a toda populao. A Constituio de 1988 garantiu o princpio da gesto democrtica do

    ensino pblico, na forma da lei (art. 206, inciso VI). E porque a gesto democrtica contm

    o princpio da participao da sociedade, a estendeu aos municpios o direito de

    organizarem, tambm, seus sistemas de ensino, com autonomia e em regime de

    colaborao entre si, com os estados e com a Unio (art. 211), traduzindo uma concepo

    de educao emancipadora, com fundamento no exerccio efetivo da cidadania.

    Embora a democratizao da escola tenha sido um tema constante na histria da

    educao brasileira, apenas recentemente as reflexes sobre esse tema paream ter se

    transformado em aes prticas, uma vez que foi apenas com a promulgao da

    Constituio Federal que ficou institudo o princpio da gesto democrtica no ensino

    pblico, desde ento, a questo da democratizao da gesto da escola pblica tem

    procurado enfocar a autonomia em todas as instncias da unidade escolar e a criao de

    mecanismos para a participao da sociedade.

    A questo da democratizao da gesto escolar vem-se concretizando via gesto

    participativa como um instrumento de melhoria da qualidade da educao e de acesso

    escola, pois gesto participativa pode ser compreendida como aquela que envolve em

    suas atividades, alm do gestor escolar, professores, funcionrios, alunos e pais que

    estejam imbudos na melhoria do processo pedaggico da escola.

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    A gesto escolar democrtica est associada ao fortalecimento da democratizao do

    processo pedaggico, pois parece ser um caminho mais vivel para a participao

    responsvel de todos nas decises necessrias e na sua efetivao mediante um

    compromisso coletivo com resultados educacionais cada vez mais efetivos e significativos,

    sendo assim a mesma vem sendo percebida como uma das alternativas possveis para a

    melhoria da qualidade do ensino.

    No contexto da educao brasileira, a partir de meados da dcada de 1990, houve uma

    ateno especial s questes referentes gesto escolar com superao do enfoque

    limitado, assentando-se sobre a organizao coletiva como condio bsica e fundamental

    da qualidade do ensino e da transformao da prpria identidade da escola.

    A Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN 9.394/96), no artigo 15,

    concedeu escola progressivos graus de autonomia pedaggica, administrativa e de

    gesto financeira.

    Ter autonomia significa construir um espao de liberdade e de responsabilidade para

    elaborar seu prprio plano de trabalho, definindo seus rumos e planejando suas atividades

    de modo a responder s demandas da sociedade, ou seja, atendendo ao que a sociedade

    espera dela. A autonomia permite escola a construo de sua identidade e equipe

    escolar uma atuao que a torna sujeito histrico de sua prpria prtica.

    Pensar no processo de construo de um projeto poltico-pedaggico requer uma reflexo

    inicial sobre seu significado e importncia.

    A LDBEN ressalta a importncia desse instrumento em vrios de seus artigos:

    No artigo 12, inciso I, que vem sendo chamado o artigo da escola a Lei d aos

    estabelecimentos de ensino a incumbncia de elaborar e executar sua proposta

    pedaggica.

  • 10

    O artigo 12, inciso VII define como incumbncia da escola informar os pais e

    responsveis sobre a frequncia e o rendimento dos alunos, bem como sobre

    a execuo de sua proposta pedaggica.

    No artigo 13, chamado o artigo dos professores, aparecem como

    incumbncias desse segmento, entre outras, as de participar da

    elaborao da proposta pedaggica do estabelecimento de

    ensino (Inciso I) e elaborar e cumprir plano de trabalho,

    segundo a proposta pedaggica do estabelecimento de

    ensino (Inciso II).

    No artigo 14, em que so definidos os princpios da gesto democrtica, o

    primeiro deles a participao dos profissionais da educao na elaborao

    do projeto pedaggico da escola.

    Segundo Libneo (2004), o documento que detalha objetivos, diretrizes e aes do

    processo educativo a ser desenvolvido na escola, expressando a sntese das exigncias

    sociais e legais do sistema de ensino e os propsitos e expectativas da comunidade

    escolar.

    Na verdade, o projeto poltico-pedaggico a expresso da cultura da escola com sua (re)

    criao e desenvolvimento, pois expressa a cultura da escola, impregnada de crenas,

    valores, significados, modos de pensar e agir das pessoas que participaram da sua

    elaborao.

    Assim, o projeto orienta a prtica de produzir uma realidade. Para isso, preciso primeiro

    conhecer essa realidade. Em seguida reflete-se sobre ela, para s depois planejar as

    aes para a construo da realidade desejada. imprescindvel que, nessas aes,

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    estejam contempladas as metodologias mais adequadas para atender s necessidades

    sociais e individuais dos educandos. Em sntese, suas finalidades so:

    Estabelecer diretrizes bsicas de organizao e funcionamento da escola, integradas

    s normas comuns do sistema nacional e do sistema ou rede ao qual ela pertence.

    Reconhecer e expressar a identidade da escola de acordo com sua realidade,

    caractersticas prprias e necessidades locais.

    Definir coletivamente objetivos e metas comuns escola como um todo.

    Possibilitar ao coletivo escolar a tomada de conscincia dos principais problemas da

    escola e das possibilidades de soluo, definindo as responsabilidades coletivas e

    pessoais.

    Estimular o sentido de responsabilidade e de comprometimento da escola na direo

    do seu prprio crescimento.

    Definir o contedo do trabalho escolar, tendo em vista as Diretrizes Curriculares

    Nacionais para ensino, os Parmetros Curriculares Nacionais, os princpios

    orientadores da Secretaria de Educao, a realidade da escola e as caractersticas do

    cidado que se quer formar.

    Dar unidade ao processo de ensino, integrando as aes desenvolvidas seja na sala

    de aula ou na escola como um todo, seja em suas relaes com a comunidade.

    Estabelecer princpios orientadores do trabalho do coletivo da escola.

    Criar parmetros de acompanhamento e de avaliao do trabalho escolar.

    Definir, de forma racional, os recursos necessrios ao desenvolvimento da proposta.

    A partir dessas finalidades, preciso destacar que o projeto poltico-pedaggico extrapola

    a dimenso pedaggica, englobando tambm a gesto financeira e administrativa, ou seja,

    os recursos necessrios sua implementao e as formas de gerenciamento. Em

    suma: construir o projeto poltico-pedaggico significa enfrentar o desafio da

    transformao global da escola, tanto na dimenso pedaggica, administrativa, como na

    sua dimenso poltica.

  • 12

    3. O PLANEJAMENTO NA PERSPECTIVA DA GESTO DEMOCRTICA

    A presena da gesto democrtica na Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    nmero 9394/96, tem seu respaldo na porfia dos segmentos populares e dos educadores,

    que lutaram para que esse princpio fosse contemplado em lei, embora venha arraigada

    com uma forte influncia das agncias internacionais nas diretrizes educacionais

    incorporadas Lei.

    Segundo LCK,

    O conceito de gesto, portanto, parte do pressuposto de que o xito de uma organizao social depende da mobilizao da ao construtiva conjunta de seus componentes, pelo trabalho associado, mediante reciprocidade que cria um todo orientado por uma vontade coletiva. Esta, alis, condio fundamental para que a educao se processe de forma efetiva no interior da escola, tendo em vista a complexidade e a importncia de seus objetivos e processos. Entende-se que o trabalho educacional, por sua natureza, demanda um esforo compartilhado, realizado a partir da participao coletiva e integrada dos membros de todos os segmentos das unidades de trabalho envolvidos. (LCK, 2006, p.22)

    A gesto democrtica est associada organizao de aes que desencadeiam a

    participao na tomada de decises em todas as questes que envolvam a escola e a

    poltica educacional. PARO considera a democracia, enquanto valor universal e prtica de

    colaborao recproca entre grupos e pessoas, um processo globalizante que,

    tendencialmente, deve envolver cada indivduo, na plenitude de sua personalidade

    (PARO, 2004, p.49).

    A abordagem do PPP como organizao do trabalho pedaggico escolar est fundada nos

    princpios que devero nortear a escola democrtica, pblica e gratuita, entre eles

    destacamos a gesto democrtica que exige uma ruptura histrica na prtica

    administrativa da escola, a compreenso dos problemas postos pela prtica pedaggica e

    a participao dos representantes dos diferentes segmentos da escola nas decises e nas

    aes administrativas e pedaggicas.

  • 13

    Para Veiga:

    O Projeto Poltico-Pedaggico, ao se constituir em processo democrtico de decises, preocupa-se em instaurar uma forma de organizao do trabalho pedaggico que supere os conflitos, buscando eliminar as relaes competitivas corporativas e autoritrias, rompendo com a rotina do mando impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as relaes no interior da escola. (VEIGA, 2007, p.13)

    H a necessidade de se refletir sobre por que os discursos, frequentemente crticos e

    inovadores encontrados nos textos nem sempre traduzem o cotidiano da escola refletindo

    a crise que ocorre na sociedade que caracterizado pelo distanciamento entre discurso e

    ao.

    As decises tomadas na escola, para se efetivarem, devem partir da prpria prtica

    cotidiana, sendo, portanto, necessrio conhec-la, pois a vida cotidiana insere-se na

    histria, modifica-se e modifica as relaes sociais. Muitas vezes, o trabalho nesta relao

    cotidiana deixa de ser vital, criador e prazeroso passando a ser um espao onde alguns

    valores como o individualismo, a neutralidade, a competio, intensificados pela estrutura

    capitalista de organizao social, se sobressaem. Veiga, ainda destaca que:

    A principal possibilidade de construo do Projeto Poltico-Pedaggico passa pela relativa autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua prpria identidade. Isto significa resgatar a escola como espao pblico, lugar de debate, do dilogo, fundado na reflexo coletiva. (VEIGA, 2007: p14)

    O PPP tem um papel fundamental, no sentido de garantir uma intencionalidade poltica no

    trabalho pedaggico, construindo um espao de reflexo para compreender a ideologia

    presente nos discursos e prticas pedaggicas. Pensar o papel poltico e pedaggico que

    a escola cumpre no interior de uma sociedade historicamente situada, dividida em classes,

    dentro de um modo de produo capitalista, implica em reconhecer a educao como um

    ato poltico, que possui uma intencionalidade e um compromisso social.

  • 14

    A escola ir conceber seu PPP buscando autonomia para execut-lo e avali-lo, partindo

    de uma reflexo sobre suas finalidades sociopolticas e culturais e sobre a organizao do

    seu trabalho pedaggico, tornando-se um desafio a construo de um PPP dentro de um

    processo de ao-reflexo.

    4. A INOVAO REGULATRIA E O PROJETO POLTICO-PEDAGGICO

    A inovao regulatria ou tcnica tem suas bases epistemolgicas assentadas no carter

    regulador e normativo da cincia conservadora, caracterizada, de um lado, pela

    observao descomprometida, pela certeza ordenada e pela quantificao dos fenmenos

    atrelados a um processo de mudana fragmentado, limitado e autoritrio; e de outro, pelo

    no desenvolvimento de uma articulao potencializadora de novas relaes entre o ser, o

    saber e o agir. Este tipo de inovao (...) uma rearticulao do sistema que se apropria

    das energias emancipatrias contidas na inovao, transformando-a numa energia

    regulatria (Leite et al., 1997, p. 10).

    A inovao regulatria ou tcnica deixa de fora quem inova e, portanto, no afetado por

    ela. H uma separao entre fins e meios, em que se escamoteiam os eventuais conflitos

    e silenciam as definies alternativas (Santos, 1989) em que se pressupem definidos os

    fins e a inovao incide sobre os meios.

    Nesta perspectiva, a introduo do novo implica mudana do todo pela mudana das

    partes. A reforma educacional, preconizada pela LDB, Lei n 9.394/96, tem-nos dado

    alguns exemplos de incitaes tericas a uma participao formal, legitimadora de um

    controle burocrtico cada vez maior sobre as instituies educativas, os professores, os

    servidores tcnico-administrativos e alunos. Dessa forma, as polticas pblicas

    constrangem e orientam algumas condies de inovao.

    Sabe-se hoje, por exemplo, como afirma Benavente, que (...) as inovaes no tm

    hipteses de sucesso se os atores no so chamados a aceitar essas inovaes e no se

    envolvem na sua prpria construo (1992, p. 28).

  • 15

    Os processos inovadores continuam a orientar-se por preocupaes de padronizao, de

    uniformidade, de controle burocrtico, de planejamento centralizado. Se a inovao

    instituda, h fortes riscos de que seja absorvida pelas lgicas preexistentes, pelos quadros

    de referncia reguladores.

    Introduzir inovao tem o sentido de provocar mudana, no sistema educacional. De certa

    forma, a palavra inovao vem associada a mudana, reforma, novidade. O novo s

    adquire sentido a partir do momento em que ele entra em relao com o j existente. Se

    tomarmos os elementos constitutivos desta concepo de inovao, percebemos, ento,

    que toda inovao se articula em torno da novidade, reforma, racionalidade cientfica,

    aplicao tcnica do conhecimento, de fora para dentro, ou seja, instituda. H ritualizao

    e padronizao do processo investigativo. De forma geral, as ideias de eficcia, normas,

    prescries, ordem, equilbrio permeiam o processo inovador.

    Inovar , portanto, introduzir algo diferente dentro do sistema, para produzir uma mudana

    organizacional descontextualizada. Este processo deixa de lado os sujeitos como

    protagonistas do institucional, desprezando as relaes e as diferenas entre eles, no

    reconhecendo as relaes de fora entre o institucional e o contexto social mais amplo.

    A inovao regulatria ou tcnica instituda no sistema para provocar mudana, mesmo

    que seja temporria e parcial. Essa mudana no produz um projeto pedaggico novo,

    produz o mesmo sistema, modificado.

    A introduo de uma inovao faz-se, assim, na lgica da dimenso cognitivo-instrumental

    da cincia e da tcnica. Com essa compreenso de inovao, temos construdo projetos,

    sem muita conscincia das consequncias para o sistema educativo.

    A inovao uma simples rearticulao do sistema, visando introduo acrtica do novo

    no velho. Neste sentido, o projeto poltico pedaggico, na esteira da inovao regulatria

    ou tcnica, pode servir para a perpetuao do institudo. Prevalece uma concepo de

  • 16

    projeto mais preocupado com a dimenso tcnica, em detrimento das dimenses poltica e

    sociocultural.

    A inovao regulatria significa assumir o projeto poltico-pedaggico como um conjunto de

    atividades que vo gerar um produto: um documento pronto e acabado. Nesse caso, deixa-

    se de lado o processo de produo coletiva. Perde-se a concepo integral de um projeto

    e este se converte em uma relao insumo/processo/produto. Pode-se inovar para

    melhorar resultados parciais do ensino, da aprendizagem, da pesquisa, dos laboratrios,

    da biblioteca, mas o processo no est articulado integralmente com o produto.

    A inovao de cunho regulatrio ou tcnico nega a diversidade de interesses e de atores

    que esto presentes, porque no uma ao da qual todos participam e na qual

    compartilham uma mesma concepo de homem, de sociedade, de educao e de

    instituio educativa. Trata-se de um conjunto de ferramentas (diretrizes, formulrios,

    fichas, parmetros, critrios etc.) proposto em nvel nacional. Como medidas e ferramentas

    institudas legalmente, devem ser incorporadas pelas instituies educativas nos projetos

    pedaggicos a serem, muitas vezes, financiados, autorizados, reconhecidos e

    credenciados.

    Olhando de modo mais especfico no que concerne ao projeto poltico-pedaggico, o

    processo inovador orienta-se pela padronizao, pela uniformidade e pelo controle

    burocrtico. O projeto poltico-pedaggico visa eficcia que deve decorrer da aplicao

    tcnica do conhecimento.

    O projeto poltico-pedaggico e a avaliao nos moldes inovadores das estratgias

    reformistas da educao so, portanto, ferramentas ligadas justificao do

    desenvolvimento institucional orientada por princpios da racionalidade tcnica, que

    acabam servindo regulao e manuteno do institudo sob diferentes formas. Este o

    desafio a ser enfrentado: compreender a educao bsica e superior no interior das

    polticas governamentais voltadas para a inovao regulatria e tcnica para buscar novas

    trilhas.

  • 17

    5. O PROJETO POLTICO-PEDAGGICO COMO INOVAO EMANCIPATRIA

    OU EDIFICANTE

    A inovao emancipatria ou edificante tem sempre (...)lugar numa situao concreta em

    que quem aplica est existencial, tica e socialmente comprometido com o impacto da

    aplicao (Santos,1989, p. 158). No h separao entre fins e meios, uma vez que a

    ao incide sobre ambos pois (...) os fins s se concretizam na medida em que discutem

    os meios adequados situao concreta

    fcil compreender que a intencionalidade permeia todo o processo inovador e,

    consequentemente, o processo de construo, execuo e avaliao do projeto poltico-

    pedaggico. Os processos inovadores lutam contra as formas institudas e os mecanismos

    de poder. um processo de dentro para fora. Essa viso refora as definies emergentes

    e alternativas da realidade. Assim, ela deslegitima as formas institucionais, a fim de

    propiciar a argumentao, a comunicao e a solidariedade.

    Em resumo, a inovao emancipatria ou edificante pressupe uma ruptura que, acima de

    tudo, predisponha as pessoas e as instituies para a indagao e para a emancipao.

    Consequentemente, a inovao no vai ser um mero enunciado de princpios ou de boas

    intenes...

    A inovao emancipatria ou edificante de natureza tico-social e cognitivo-instrumental,

    visando eficcia dos processos formativos sob a exigncia da tica. A inovao produto

    da reflexo da realidade interna da instituio referenciada a um contexto social mais

    amplo.

    Este ponto de vital importncia para se avanar na construo de um projeto poltico-

    pedaggico que supere a reproduo acrtica, a rotina, a racionalidade tcnica, que

    considera a prtica um campo de aplicao empirista, centrada nos meios.

  • 18

    Organizar as atividades-fim e meio da instituio educativa, por meio do projeto poltico-

    pedaggico sob a tica da inovao emancipatria e edificante, traz consigo a

    possibilidade de alunos, professores, servidores tcnico-administrativos unirem-se e

    separarem-se de acordo com as necessidades do processo.

    O projeto poltico-pedaggico, na esteira da inovao emancipatria, enfatiza mais o

    processo de construo. a configurao da singularidade e da particularidade da

    instituio educativa. Bicudo afirma que a importncia do projeto reside no seu poder

    articulador, evitando que as diferentes atividades se anulem ou enfraqueam a unidade da

    instituio (2001, p. 16). Inovao e projeto poltico-pedaggico esto articulados,

    integrando o processo com o produto porque o resultado final no s um processo

    consolidado de inovao metodolgica no interior de um projeto poltico-pedaggico

    construdo, desenvolvido e avaliado coletivamente, mas um produto inovador que

    provocar tambm rupturas epistemolgicas. No podemos separar processo de produto.

    Sob esta tica, o projeto um meio de engajamento coletivo para integrar aes dispersas,

    criar sinergias no sentido de buscar solues alternativas para diferentes momentos do

    trabalho pedaggico-administrativo, desenvolver o sentimento de pertena, mobilizar os

    protagonistas para a explicitao de objetivos comuns definindo o norte das aes a serem

    desencadeadas, fortalecer a construo de uma coerncia comum, mas indispensvel,

    para que a ao coletiva produza seus efeitos.

    Costa & Madeira (1997) consideram alguns elementos conceituais do projeto poltico-

    pedaggico:

    a) o projeto diz respeito concepo de escolas socialmente determinadas e referidas

    ao campo educativo;

    b) na fase de reflexo que a instituio define e assume uma identidade que se

    expressa por meio do projeto;

    c) o projeto serve de referente ao de todos os agentes que intervm no ato

    educativo;

  • 19

    d) o desenvolvimento do projeto implica a existncia de um conjunto de condies, sem

    as quais ele poder estar condenado a tornar-se apenas mais um formulrio

    administrativo;

    e) a participao s poder ser assegurada se o projeto perseguir os objetivos dos

    atores e grupos envolvidos no ato educativo, em sua globalidade.

    O projeto poltico-pedaggico d o norte, o rumo, a direo; Ele possibilita que as

    potencialidades sejam equacionadas, deslegitimando as formas institudas (Veiga, 2000,

    p. 192).

    Sob esta tica, o projeto poltico-pedaggico apresenta algumas caractersticas

    fundamentais:

    a) um movimento de luta em prol da democratizao da escola que no esconde as

    dificuldades e os pessimismos da realidade educacional, mas no se deixa levar por esta,

    procurando enfrentar o futuro com esperana em busca de novas possibilidades e novos

    compromissos. um movimento constante para orientar a reflexo e ao da escola.

    b) Est voltado para a incluso a fim de atender a diversidade de alunos, sejam quais

    forem sua procedncia social, necessidades e expectativas educacionais (Carbonell,

    2002); projeta-se em uma utopia cheia de incertezas ao comprometer-se com os desafios

    do tratamento das desigualdades educacionais e do xito e fracasso escolar.

    c) Por ser coletivo e integrador, o projeto, quando elaborado, executado e avaliado,

    requer o desenvolvimento de um clima de confiana que favorea o dilogo, a cooperao,

    a negociao e o direito das pessoas de intervirem na tomada de decises que afetam a

    vida da instituio educativa e de comprometerem-se com a ao.

    O projeto no apenas perpassado por sentimentos, emoes e valores. Um processo de

    construo coletiva fundada no princpio da gesto democrtica rene diferentes vozes,

    dando margem para a construo da hegemonia da vontade comum. A gesto

    democrtica nada tem a ver com a proposta burocrtica, fragmentada e excludente; ao

    contrrio, a construo coletiva do projeto poltico-pedaggico inovador procura ultrapassar

  • 20

    as prticas sociais aliceradas na excluso, na discriminao, que inviabilizam a

    construo histrico-social dos sujeitos.

    d) H um vnculo muito estreito entre autonomia e projeto poltico- pedaggico. A

    autonomia possui o sentido sociopoltico e est voltada para o delineamento da identidade

    institucional.

    A identidade representa a substncia de uma nova organizao do trabalho pedaggico. A

    autonomia anula a dependncia e assegura a definio de critrios para a vida escolar e

    acadmica. Autonomia e gesto democrtica fazem parte da especificidade do processo

    pedaggico.

    e) A legitimidade de um projeto poltico-pedaggico est estreitamente ligada ao grau e

    ao tipo de participao de todos os envolvidos com o processo educativo, o que requer

    continuidade de aes.

    f ) Configura unicidade e coerncia ao processo educativo, deixa claro que a

    preocupao com o trabalho pedaggico enfatiza no s a especificidade metodolgica e

    tcnica, mas volta-se tambm para as questes mais amplas, ou seja, a das relaes da

    instituio educativa com o contexto social.

    Construir o projeto poltico-pedaggico para a instituio educativa significa enfrentar o

    desafio da inovao emancipatria ou edificante, tanto na forma de organizar o processo

    de trabalho pedaggico como na gesto que exercida pelos interessados, o que implica o

    repensar da estrutura de poder.

    A instituio educativa no apenas uma instituio que reproduz relaes sociais e

    valores dominantes, mas tambm uma instituio de confronto, de resistncia e

    proposio de inovaes. A inovao educativa deve produzir rupturas e, sob essa tica,

    ela procura romper com a clssica ciso entre concepo e execuo.

  • 21

    6.CONCEITUANDO O PROJETO POLTICO-PEDAGGICO

    No sentido etimolgico, o termo projeto vem do latim projectu, particpio passado do verbo

    projicere, que significa lanar para diante. Plano, intento, desgnio. Empresa,

    empreendimento. Redao provisria de lei. Plano geral de edificao (Ferreira 1975,

    p.1.144).

    Ao construirmos os projetos de nossas escolas, planejamos o que temos inteno de fazer,

    de realizar. Lanamo-nos para diante, com base no que temos, buscando o possvel.

    antever um futuro diferente do presente. Nas palavras de Gadotti:

    Todo projeto supe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortvel para arriscar-se, atravessar um perodo de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em funo da promessa que cada projeto contm de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visveis os campos de ao possvel, comprometendo seus atores e autores. (1994, p. 579)

    Nessa perspectiva, o projeto poltico-pedaggico vai alm de um simples agrupamento de

    planos de ensino e de atividades diversas. O projeto no algo que construdo e em

    seguida arquivado ou encaminhado s autoridades educacionais como prova do

    cumprimento de tarefas burocrticas. Ele construdo e vivenciado em todos os

    momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da escola.

    O projeto busca um rumo, uma direo. uma ao intencional, com um sentido explcito,

    com um compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedaggico da escola

    , tambm, um projeto poltico por estar intimamente articulado ao compromisso

    sociopoltico com os interesses reais e coletivos da populao majoritria. poltico no

    sentido de compromisso com a formao do cidado para um tipo de sociedade. "A

    dimenso poltica se cumpre na medida em que ela se realiza enquanto prtica

    especificamente pedaggica" (Saviani 1983, p. 93). Na dimenso pedaggica reside a

    possibilidade da efetivao da intencionalidade da escola, que a formao do cidado

    participativo, responsvel, compromissado, crtico e criativo.

  • 22

    Pedaggico, no sentido de definir as aes educativas e as caractersticas necessrias s

    escolas de cumprirem seus propsitos e sua intencionalidade.

    Poltico e pedaggico tm assim uma significao indissocivel. Neste sentido que se

    deve considerar o projeto poltico-pedaggico como um processo permanente de reflexo

    e discusso dos problemas da escola, na busca de alternativas viveis efetivao de sua

    intencionalidade, que "no descritiva ou constatativa, mas constitutiva" (Marques 1990,

    p. 23). Por outro lado, propicia a vivncia democrtica necessria para a participao de

    todos os membros da comunidade escolar e o exerccio da cidadania. Pode parecer

    complicado, mas trata-se de uma relao recproca entre a dimenso poltica e a dimenso

    pedaggica da escola.

    O projeto poltico-pedaggico, ao se constituir em processo democrtico de decises,

    preocupa-se em instaurar uma forma de organizao do trabalho pedaggico que supere

    os conflitos, buscando eliminar as relaes competitivas, corporativas e autoritrias,

    rompendo com a rotina do mando impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as

    relaes no interior da escola, diminuindo os efeitos fragmentrios da diviso do trabalho

    que refora as diferenas e hierarquiza os poderes de deciso.

    Desse modo, o projeto poltico-pedaggico tem a ver com a organizao do trabalho

    pedaggico em dois nveis: como organizao da escola como um todo e como

    organizao da sala de aula, incluindo sua relao com o contexto social imediato,

    procurando preservar a viso de totalidade. Nesta caminhada ser importante ressaltar

    que o projeto poltico-pedaggico busca a organizao do trabalho pedaggico da escola

    na sua globalidade.

    A principal possibilidade de construo do projeto poltico-pedaggico passa pela relativa

    autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua prpria identidade. Isto significa

    resgatar a escola como espao pblico, lugar de debate, do dilogo, fundado na reflexo

    coletiva. Portanto, preciso entender que o projeto poltico-pedaggico da escola dar

  • 23

    indicaes necessrias organizao do trabalho pedaggico, que inclui o trabalho do

    professor na dinmica interna da sala de aula, ressaltado anteriormente.

    Buscar uma nova organizao para a escola constitui uma ousadia para os educadores,

    pais, alunos e funcionrios.

    E para enfrentarmos essa ousadia, necessitamos de um referencial que fundamente a

    construo do projeto poltico-pedaggico. A questo , pois, saber a qual referencial

    temos que recorrer para a compreenso de nossa prtica pedaggica. Nesse sentido,

    temos que nos alicerar nos pressupostos de uma teoria pedaggica crtica vivel, que

    parta da prtica social e esteja compromissada em solucionar os problemas da educao e

    do ensino de nossa escola. Uma teoria que subsidie o projeto poltico-pedaggico e, por

    sua vez, a prtica pedaggica que ali se processa deve estar ligada aos interesses da

    maioria da populao. Faz-se necessrio, tambm, o domnio das bases terico-

    metodolgicas indispensveis concretizao das concepes assumidas coletivamente.

    Mais do que isso, afirma Freitas que:

    As novas formas tm que ser pensadas em um contexto de luta, de correlaes de fora s vezes favorveis, s vezes desfavorveis. Tero que nascer no prprio "cho da escola", com apoio dos professores e pesquisadores. No podero ser inventadas por algum, longe da escola e da luta da escola. (Freitas 1991, p. 23)

    Isso significa uma enorme mudana na concepo do projeto poltico-pedaggico e na

    prpria postura da administrao central. Se a escola nutre-se da vivncia cotidiana de

    cada um de seus membros, coparticipantes de sua organizao do trabalho pedaggico

    administrao central, seja o Ministrio da Educao, a Secretaria de Educao Estadual

    ou Municipal, no compete a eles definir um modelo pronto e acabado, mas sim estimular

    inovaes e coordenar as aes pedaggicas planejadas e organizadas pela prpria

    escola. Em outras palavras, as escolas necessitam receber assistncia tcnica e financeira

    decidida em conjunto com as instncias superiores do sistema de ensino.

  • 24

    Isso pode exigir, tambm, mudanas na prpria lgica de organizao das instncias

    superiores, implicando uma mudana substancial na sua prtica.

    Para que a construo do projeto poltico-pedaggico seja possvel no necessrio

    convencer os professores, a equipe escolar e os funcionrios a trabalhar mais, ou mobiliz-

    los de forma espontnea, mas propiciar situaes que lhes permitam aprender a pensar e

    a realizar o fazer pedaggico de forma coerente.

    O ponto que nos interessa reforar que a escola no tem mais possibilidade de ser

    dirigida de cima para baixo e na tica do poder centralizador que dita as normas e exerce o

    controle tcnico burocrtico. A luta da escola para a descentralizao em busca de sua

    autonomia e qualidade.

    Do exposto, o projeto poltico-pedaggica no visa simplesmente a um rearranjo formal da

    escola, mas a uma qualidade em todo o processo vivido. Vale acrescentar, ainda, que a

    organizao do trabalho pedaggico da escola tem a ver com a organizao da sociedade.

    A escola nessa perspectiva vista como uma instituio social, inserida na sociedade

    capitalista, que reflete no seu interior as determinaes e contradies dessa sociedade.

    7. PRINCPIOS NORTEADORES DO PROJETO POLTICO-PEDAGGICO

    A abordagem do projeto poltico-pedaggico, como organizao do trabalho da escola

    como um todo, est fundada nos princpios que devero nortear a escola democrtica,

    pblica e gratuita:

    a) Igualdade de condies para acesso e permanncia na escola. Saviani alerta-

    nos para o fato de que h uma desigualdade no ponto de partida, mas a igualdade no

    ponto de chegada deve ser garantida pela mediao da escola. O autor destaca:

    Portanto, s possvel considerar o processo educativo em seu conjunto sob a condio de se distinguir a democracia como possibilidade no ponto de partida e democracia como realidade no ponto de chegada.(1982,p.63)

  • 25

    I

    Igualdade de oportunidades requer, portanto, mais que a expanso quantitativa de ofertas;

    requer ampliao do atendimento com simultnea manuteno de qualidade.

    b) Qualidade que no pode ser privilgio de minorias econmicas e sociais. O

    desafio que se coloca ao projeto poltico-pedaggico da escola o de propiciar uma

    qualidade para todos.

    A qualidade que se busca implica duas dimenses indissociveis: a formal ou tcnica e a

    poltica. Uma no est subordinada a outra; cada uma delas tem perspectivas prprias.

    A primeira enfatiza os instrumentos e os mtodos, a tcnica. A qualidade formal no est

    afeita, necessariamente, a contedos determinados. Demo afirma que a qualidade formal:

    "( ...) significa a habilidade de manejar meios, instrumentos, formas, tcnicas,

    procedimentos diante dos desafios do desenvolvimento" (1994, p.14).

    A qualidade poltica condio imprescindvel da participao. Est voltada para os fins,

    valores e contedos. Quer dizer "a competncia humana do sujeito em termos de se fazer

    e de fazer histria, diante dos fins histricos da sociedade humana" (Demo 1994, p.14).

    Nesta perspectiva, o autor chama ateno para o fato de que a qualidade centra-se no

    desafio de manejar os instrumentos adequados para fazer a histria humana. A qualidade

    formal est relacionada com a qualidade poltica e esta depende da competncia dos

    meios.

    A escola de qualidade tem obrigao de evitar de todas as maneiras possveis a

    repetncia e a evaso. Tem que garantir a meta qualitativa do desempenho satisfatrio de

    todos. Qualidade para todos, portanto, vai alm da meta quantitativa de acesso global, no

    sentido de que as crianas, em idade escolar, entrem na escola. preciso garantir a

    permanncia dos que nela ingressarem. Em sntese, qualidade "implica conscincia crtica

    e capacidade de ao, saber e mudar" (Demo 1994, p.19).

  • 26

    O projeto poltico-pedaggico, ao mesmo tempo em que exige dos educadores,

    funcionrios, alunos e pais a definio clara do tipo de escola que intentam, requer a

    definio de fins. Assim, todos devero definir o tipo de sociedade e o tipo de cidado que

    pretendem formar. As aes especificas para a obteno desses fins so meios. Essa

    distino clara entre fins e meios essencial para a construo do projeto politico

    pedaggico.

    c) Gesto democrtica um princpio consagrado pela Constituio vigente e

    abrange as dimenses pedaggica, administrativa e financeira. Ela exige uma ruptura

    histrica na prtica administrativa da escola, com o enfrentamento das questes de

    excluso e reprovao e da no-permanncia do aluno na sala de aula, o que vem

    provocando a marginalizao das classes populares. Esse compromisso implica a

    construo coletiva de um projeto poltico-pedaggico ligado educao das classes

    populares.

    A gesto democrtica exige a compreenso em profundidade dos problemas postos pela

    prtica pedaggica. Ela visa romper com a separao entre concepo e execuo, entre

    o pensar e o fazer, entre teoria e prtica. Busca resgatar o controle do processo e do

    produto do trabalho pelos educadores.

    A gesto democrtica implica principalmente o repensar da estrutura de poder da escola,

    tendo em vista sua socializao. A socializao do poder propicia a prtica da participao

    coletiva, que atenua o individualismo; da reciprocidade, que elimina a explorao; da

    solidariedade, que supera a opresso; da autonomia, que anula a dependncia de rgos

    intermedirios que elaboram polticas educacionais das quais a escola mera executora.

    A busca da gesto democrtica inclui, necessariamente, a ampla participao dos

    representantes dos diferentes segmentos da escola nas decises/aes administrativo-

    pedaggicas ali desenvolvidas. Nas palavras de Marques:

  • 27

    A participao ampla assegura a transparncia das decises, fortalece as presses para que sejam elas legtimas, garante o controle sobre os acordos estabelecidos e, sobretudo, contribui para que sejam contempladas questes que de outra forma no entrariam em cogitao. (1990, p.21)

    Neste sentido, fica claro entender que a gesto democrtica, no interior da escola, no

    um princpio fcil de ser consolidado, pois trata-se da participao crtica na construo do

    projeto poltico-pedaggico e na sua gesto.

    d) Liberdade outro princpio constitucional. O princpio da liberdade est

    sempre associado ideia de autonomia. O que necessrio, portanto, como ponto de

    partida, o resgate do sentido dos conceitos de autonomia e liberdade. A autonomia e a

    liberdade fazem parte da prpria natureza do ato pedaggico. O significado de autonomia

    remete-nos para regras e orientaes criadas pelos prprios sujeitos da ao educativa,

    sem imposies externas.

    e) Valorizao do magistrio um principio central na discusso do projeto

    poltico pedaggico.

    A qualidade do ensino ministrado na escola e seu sucesso na tarefa de formar cidados

    capazes de participar da vida socioeconmica, poltica e cultural do pas relacionam-se

    estreitamente a formao (inicial e continuada), condies de trabalho (recursos didticos,

    recursos fsicos e materiais, dedicao integral escola, reduo do nmero de alunos na

    sala de aula etc.), remunerao, elementos esses indispensveis profissionalizao do

    magistrio.

    A formao continuada um direito de todos os profissionais que trabalham na escola,

    uma vez no s ela possibilita a progresso funcional baseada na titulao, na qualificao

    e na competncia dos profissionais, mas tambm propicia, fundamentalmente, o

    desenvolvimento profissional dos professores articulado com as escolas e seus projetos.

  • 28

    A formao continuada deve estar centrada na escola e fazer parte do projeto poltico

    pedaggico.

    Assim, compete escola:

    a) proceder ao levantamento de necessidades de formao continuada de

    seus profissionais;

    b) elaborar seu programa de formao, contando com a participao e o apoio

    dos rgos centrais, no sentido de fortalecer seu papel na concepo, na execuo e na

    avaliao do referido programa.

    Assim, a poltico-pedaggico, no deve limitar-se aos contedos curriculares, mas se

    estender discusso da escola como um todo e suas relaes com a sociedade.

    Inicialmente, convm alertar formao continuada dos profissionais, da escola

    compromissada com a construo do projeto para o fato de que essa tomada de

    conscincia, dos princpios norteadores do projeto poltico-pedaggico, no pode ter o

    sentido espontanesta de se cruzar os braos diante da atual organizao da escola, que

    inibe a participao de educadores, funcionrios e alunos no processo de gesto.

    preciso ter conscincia de que a dominao no interior da escola efetiva-se por meio das

    relaes de poder que se expressam nas prticas autoritrias e conservadoras dos

    diferentes profissionais, distribudos hierarquicamente, bem como por meio das formas de

    controle existentes no interior da organizao escolar.

    Para que as finalidades do projeto poltico-pedaggico sejam alcanadas, alguns

    processos precisam ser desenvolvidos. Em vrios momentos, esses processos se

    entrecruzam e so dependentes uns dos outros, como se ver a seguir. Antes,

    necessrio que fique claro que no h uma nica forma de se construir um projeto, devido

    s singularidades de cada unidade escolar.

  • 29

    O processo de participao

    A importncia da participao vem sendo ressaltada por todos que defendem uma gesto

    democrtica. No entanto, embora nenhum segmento tenha uma importncia menor que a

    do outro nesse trabalho coletivo, importante definir, com clareza, as responsabilidades

    que cada um deve assumir, considerando a existncia de funes e nveis hierrquicos

    diferenciados dentro da escola. Ou seja, todos devem ter o seu espao de participao,

    mas no se deve confundir o espao das atribuies, ultrapassando os limites de

    competncia de cada um:

    Direo, professores e profissionais de suporte pedaggico so os responsveis diretos

    pela mobilizao da escola e da comunidade para a construo da proposta. Alm disso,

    cabe-lhes a tomada de decises sobre contedos, mtodos de ensino e carga horria das

    disciplinas do currculo.

    Os alunos so fontes de informao das suas necessidades de aprendizagem, que se vo

    constituir no ncleo das preocupaes da escola. So eles, de fato, o alvo de todo esse

    esforo.

    O trabalho dos funcionrios, por se realizar em uma escola, tem uma dimenso

    pedaggica que muito pouco reconhecida, at por eles prprios. As relaes que eles

    estabelecem com os alunos e com os pais poderiam ser exploradas na direo da

    formao da cidadania.

    Os pais e a comunidade devem participar efetivamente das decises sobre o oramento e

    a utilizao dos recursos financeiros que a escola recebe. Alm disso, os pais devem

    participar das discusses sobre as caractersticas do cidado que se quer formar, sobre o

    uso do espao e do tempo escolar e sobre as formas de organizao do ensino que a

    escola deve adotar.

  • 30

    O processo de mobilizao

    Para que o projeto poltico-pedaggico seja, de fato, um instrumento de melhoria de

    qualidade da escola, ele precisa ser construdo coletivamente, com responsabilidade e

    compromisso, a partir de um processo contnuo de mobilizao que envolve elaborao,

    execuo, acompanhamento, avaliao e reelaborao.

    Uma das mais importantes tarefas da equipe gestora encontrar pontos de partida para

    atingir um nvel esperado de mobilizao, pois, durante o processo, muitas lideranas vo

    emergir, provocando novas adeses. O papel do Conselho Escolar nesse trabalho

    de mobilizao fundamental, j que ele congrega os representantes dos diversos

    segmentos da escola. No entanto, sempre desejvel que a participao da comunidade

    seja ampliada com a presena de outras pessoas, alm daquelas que j fazem parte do

    Conselho.

    Essa mobilizao indispensvel, sob pena de no se conseguir construir a proposta de

    uma forma democrtica, legitimada por aqueles que fazem da escola um espao vivo e

    atuante.

    O processo de negociao

    preciso compreender que, nas sociedades humanas, nenhum processo se faz de forma

    linear e harmnica e, portanto, a negociao se torna um elemento central na realizao

    de qualquer trabalho que envolva a coletividade. A participao democrtica, condio

    essencial de formao do cidado, supe a presena de conflitos. O prprio exerccio da

    participao abre espao para a emergncia desses conflitos. impossvel evitar tais

    situaes, porque elas existem de fato e revelam a variedade de concepes que norteiam

    as aes pessoais. necessrio, pois, reconhecer a existncia de tenses ou conflitos

  • 31

    entre as necessidades individuais e os objetivos da instituio e compreender a sua

    natureza, de modo a capitalizar as divergncias em favor de um objetivo maior.

    aqui que entra o papel da negociao. Saber negociar significa dar lugar ao debate,

    expresso das vrias necessidades e das diferenas, produzindo um ambiente do qual

    resulte a assuno coletiva dos conflitos e dos problemas, a cooperao voluntria no

    trabalho em equipe, a repartio mais igualitria do poder e dos recursos.

    Assim, a autonomia da escola no , isoladamente, a autonomia dos gestores ou a dos

    professores ou a dos alunos ou a dos pais. Ela resultante da confluncia de vrias

    formas de pensamento e de interesses diversos que preciso saber gerir, integrar e

    negociar. O projeto poltico-pedaggico, portanto, vai significar uma sntese desses

    diversos interesses e tem como propsito dar um sentido coletivo s autonomias

    individuais.

    Tanto a mobilizao como a participao e a negociao no ocorrem no vazio. A

    proposta pedaggica tem um contedo que vai sendo construdo por meio desses

    processos. Dentre esses contedos, est a definio do cidado que se quer formar.

    Que caractersticas devem ter o cidado para viver no mundo contemporneo? A escola

    tem espao para definir essas caractersticas? Afinal, que espao tem a escola nessa

    definio?

    A despeito de se considerar que competncias, conhecimentos, habilidades e valores so

    bsicos para a vida do cidado em qualquer lugar do mundo, tambm reconhecida, hoje,

    a necessidade da preservao e do desenvolvimento de aspectos que constituem a

    especificidade das diversas culturas. Isso significa dizer que o espao da escola o da

    formao de cidados capazes de enfrentar os novos desafios do mundo contemporneo,

    mas que tenham conscincia de suas razes histricas, conhecimento da produo cultural

    de seu povo, de forma a afirmar a sua identidade. o espao do ensino competente que,

  • 32

    sem negar as tradies e, at mesmo, tomando-as como base, prepare seus alunos para a

    plena participao na vida econmica, sociopoltica e cultural do pas.

    Para que isso se torne possvel, recomenda-se:

    Que o coletivo da escola tome essas questes como foco de discusso,

    passando a entender, com maior clareza, tanto a concepo de cidado posta

    nos documentos oficiais que definem e orientam a educao brasileira, quanto

    dimenso do papel que a escola tem na sua formao.

    Que a escola desenvolva mecanismos de conhecimento de quem so seus

    alunos, quais as suas condies de vida, as suas aspiraes, as expectativas da

    famlia e da comunidade.

    Que sejam realizados levantamentos e estudos das manifestaes culturais

    locais (religiosas, folclricas, esportivas, artsticas) que, incorporadas ao

    currculo, estabeleam elos significativos com o conhecimento escolar formal,

    fazendo emergir a identidade de cada grupo ou comunidade que participa da

    escola.

    8. A IDENTIDADE DA ESCOLA

    Toda escola deve ter uma alma, uma identidade, uma qualidade que a faz ser nica para

    todos que nela passam uma parte de suas vidas... Esse vnculo cognitivo e afetivo deve

    ser construdo a partir das vivncias propiciadas a toda a comunidade escolar. E essa

    preocupao deve estar presente na elaborao do projeto poltico pedaggico, o qual

    deve contribuir para criar ou fortalecer a identidade da escola. Quanto a esse aspecto, a

    comunidade escolar deve levantar as caractersticas atuais da escola, suas limitaes e

    possibilidades, os seus elementos identificadores, a imagem que se quer construir quanto

    a seu papel na comunidade em que est inserida. Esse levantamento dos traos

  • 33

    identificadores da escola constitui um diagnstico que servir de base para a definio dos

    objetivos a perseguir, dos contedos que devem ser trabalhados, das formas de

    organizao do seu ensino. Algumas questes podem conduzir realizao desse

    diagnstico:

    Onde est localizada a escola?

    Quais os principais problemas dessa comunidade?

    Que formas a escola tem de insero na comunidade?

    Como o seu espao utilizado pela comunidade?

    Que limitaes ou possibilidades a escola percebe nas suas relaes com a

    comunidade?

    Quem o aluno que frequenta a escola?

    H alunos em idade escolar fora da escola na comunidade?

    Existem alunos com jornada formal de trabalho?

    Como se vm dando o desempenho escolar dos alunos nos ltimos dois anos?

    Quais so os ndices de aprovao, reprovao e evaso apresentados pela

    escola?

    Qual a relao entre a idade dos alunos e a srie que frequentam?

    Quem so os profissionais que atuam na escola?

    O nmero de professores suficiente para atender os alunos?

    Qual a qualificao dos professores?

    A escola tem funcionrios em nmero suficiente?

    H agentes de apoio pedaggico?

    Quais so as condies fsicas e materiais da escola?

    Quais as condies de uso das dependncias escolares?

    Como vem sendo utilizado o tempo pedaggico?

    Quantas turmas ela atende?

    Como so organizadas as classes?

    Como est organizado o espao da escola?

    Ele vem se constituindo em espao de formao da cidadania?

  • 34

    9. CURRCULO ESCOLAR

    Sabe-se que o currculo escolar um dos pontos mais difceis a serem enfrentados pela

    escola. Duas questes podem ser inicialmente levantadas em relao a esse aspecto:

    Quem define o que e como a escola deve ensinar? Tradicionalmente, as escolas

    pblicas tm a sua prtica pedaggica determinada ou por orientaes oriundas

    das secretarias de educao ou pelos prprios livros didticos. Isso resulta, na

    maioria das vezes, em uma prtica curricular muito pobre, que no leva em conta

    nem a experincia trazida pelo prprio professor, nem a trazida pelo aluno, ou

    mesmo s caractersticas da comunidade em que a escola est inserida. Por outro

    lado, isso restringe a autonomia intelectual do professor e o exerccio da sua

    criatividade. E pior: no permite que a escola construa sua identidade.

    Relacionada a isso, existe uma concepo restrita de currculo, prxima do conceito

    de programa ou, pior ainda, de uma simples grade curricular, ou de mera listagem

    dos contedos que devem ser tratados. Da porque muitos professores se orientam

    apenas pelos sumrios ou ndices dos livros didticos. O currculo, entretanto,

    abrange tudo o que ocorre na escola, as atividades programadas e desenvolvidas

    sob a sua responsabilidade e que envolvem a aprendizagem dos contedos

    escolares pelos alunos, na prpria escola ou fora dela, e isso precisa ser muito bem

    pensado na hora de elaborar um projeto poltico-pedaggico.

    Assim sendo, indispensvel que a escola se rena para discutir a concepo atual de

    currculo expressa tanto na LDBEN quanto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os

    diferentes nveis de ensino e tambm nos Parmetros Curriculares Nacionais (PCNs). A

    legislao educacional brasileira, quanto composio curricular, contempla dois eixos:

  • 35

    Uma Base Nacional Comum, com a qual se garante uma unidade nacional, para

    que todos os alunos possam ter acesso aos conhecimentos mnimos necessrios

    ao exerccio da vida cidad. A Base Nacional Comum , portanto, uma dimenso

    obrigatria dos currculos nacionais e definida pela Unio.

    Uma Parte Diversificada do currculo, tambm obrigatria, que se compe de

    contedos complementares, identificados na realidade regional e local, que devem

    ser escolhidos em cada sistema ou rede de ensino e em cada escola. Assim, a

    escola tem autonomia para incluir temas de seu interesse.

    atravs da construo da proposta pedaggica da escola que a Base Nacional Comum e

    a Parte Diversificada se integram. A composio curricular deve buscar a articulao entre

    os vrios aspectos da vida cidad (a sade, a sexualidade, a vida familiar e social, o meio

    ambiente, o trabalho, a cincia e a tecnologia, a cultura, as linguagens) com as reas de

    conhecimento (Lngua Portuguesa, Matemtica, Cincias, Geografia, Histria, Lngua

    Estrangeira, Educao Artstica, Educao Fsica e Educao Religiosa).

    H vrias formas de composio curricular, mas os Parmetros Curriculares Nacionais

    indicam que os modelos dominantes na escola brasileira, multidisciplinar e

    pluridisciplinar, marcados por uma forte fragmentao, devem ser substitudos, na

    medida do possvel, por uma perspectiva interdisciplinar e transdisciplinar. O que isso

    significa?

    Interdisciplinaridade significa a interdependncia, interao e comunicao entre

    campos do saber, ou disciplinas, o que possibilita a integrao do conhecimento em

    reas significativas.

  • 36

    Transdisciplinaridade a coordenao do conhecimento em um sistema lgico,

    que permite o livre trnsito de um campo de saber para outro, ultrapassando a

    concepo de disciplina e enfatizando o desenvolvimento de todas as nuances e

    aspectos do comportamento humano.

    Com base nessas formas de composio curricular, que os Parmetros Curriculares

    Nacionais introduzem os temas transversais que, tomando a cidadania como eixo bsico,

    vo tratar de questes que ultrapassam as reas convencionais, mas permeiam a

    concepo, os objetivos, os contedos e as orientaes didticas dessas reas.

    Essa transversalidade supe uma transdisciplinaridade, o que vai permitir tratar uma

    nica questo a partir de uma perspectiva plural. Isso exige o comprometimento de toda a

    comunidade escolar com o trabalho em torno dos grandes temas definidos pelos

    Parmetros Curriculares Nacionais, como tica, Sade, Meio Ambiente, Pluralidade

    Cultural e Orientao Sexual, os quais podem ser particularizados ou especificados a partir

    do contexto da escola.

    Essas expresses do currculo vo constituir o conjunto das aprendizagens realizadas

    pelos alunos, e o reconhecimento dessa trama, presente na vida escolar, vai dar equipe

    da escola melhores condies para identificar as reas problemticas da sua prtica

    pedaggica.

    Assim, no processo de elaborao da proposta pedaggica ao definir o que ensinar, para

    que ensinar, como ensinar , a equipe gestora e a comunidade escolar devem estudar a

    legislao educacional, bem como a documentao oficial da Secretaria de Educao e do

    Conselho Estadual e ou Municipal de Educao, produzida com o objetivo de orientar a

    implantao desses dispositivos legais no que se refere ao currculo. A partir da, torna-se

    necessrio identificar que aes precisam ser planejadas e realizadas pela escola para

    colocar em prtica um currculo que contemple os objetivos da educao bsica.

    A direo da escola, ou a equipe gestora como um todo, tem, nesse contexto, um papel

    fundamental. Alm de liderar a construo permanente da proposta pedaggica, deve

    estar todo o tempo viabilizando as condies para sua execuo, e uma delas a

  • 37

    formao contnua de seus professores para que eles possam desenvolver, com

    competncia, o currculo expresso na proposta pedaggica.

    10. TRABALHO DE SENSIBILIZAO E PREPARAO

    Antes de se iniciar a elaborao do Projeto Poltico-Pedaggico, preciso uma etapa de

    sensibilizao, de motivao, de mobilizao para com a proposta de trabalho, a fim de

    que esta tarefa seja assumida, tenha significado para a comunidade.

    Se os sujeitos no perceberem o sentido, se no acreditarem, de nada adiantar os

    passos seguintes.

    A questo do sentido do projeto muito importante; comum vermos escolas que passam

    rapidamente por esta etapa, considerando-a quase desnecessria, j que o que vem a

    seguir uma coisa boa e temos que chegar logo l'. Deve-se estar atento a este momento

    para no se cair num ritual vazio, semelhante distoro que ocorreu com o Plano de

    Ensino-Aprendizagem. Vale a pena relembrar que no basta o indivduo estar fazendo; h

    que se analisar corno est fazendo. O professor pode estar preenchendo os papis,

    respondendo s perguntas, mas sem estar envolvido.

    Na sensibilizao, cabe apresentar a viso geral da proposta de trabalho, fundamentando-

    a." Alis preciso enfrentar os possveis obstculos epistemo- lgicos: o Projeto Poltico-

    Pedaggico entra no campo do planejamento, um campo minado para os professores,

    em funo de experincias negativas do passado.

    Talvez o critrio maior na etapa de sensibilizao seja a verdade: fundamental que seja

    baseada numa realidade no falseada. Para que a verdade possa emergir, preciso

    garantir um clima de respeito e liberdade pessoas joguem claro, coloquem suas dvidas,

    suas desconfianas, etc. para que as questes do grupo possam aparecer, serem

    discutidas, e assim se chegar a uma deciso.

  • 38

    Deciso Coletiva

    Feita a sensibilizao, cabe deciso. Deve ficar claro que se trata de deciso mesmo e

    no de 'jogo de cena' para ratificar uma deciso j tomada. Concretamente: a possibilidade

    de no iniciar a elaborao do projeto deve ser real: se o grupo no percebeu ainda a

    importncia, de nada adianta desencadear o processo de construo.

    Uma vez decidida coletivamente a realizao, deve-se definir outros aspectos quanto ao

    grau de elaborao do Projeto Poltico-Pedaggico: nvel de abrangncia (sistema, plano

    global da escola, planos setoriais dos servios, departamentos); nvel de participao dos

    sujeitos da comunidade educativa (professores, funcionrios, alunos, pais, comunidade

    local, equipe de coordenao e direo), bem como a forma (participao direta ou atravs

    de representao); nvel de complexidade da elaborao (plano de mdio prazo, curto

    prazo; objetivo geral-especfico x programa-projeto; poltica-estratgia x linha de ao).

    Alm disto, importante se fazer uma previso primeira dos passos e do tempo (incio e

    trmino), e se constituir uma equipe de coordenao da elaborao do Projeto. Esta

    equipe deve se capacitar para tal. Dos participantes no necessrio o domnio de toda

    metodologia; para a equipe isto imprescindvel.

    11. METODOLOGIA DE TRABALHO PARA A ELABORAO DO PROJETO

    Para a expresso daquilo que o grupo pensa e quer, usamos o recurso metodolgico do

    questionamento, da problematizao, sintetizada nas pergun tas. Por que perguntar?

    Para provocar um desequilbrio no sujeito, para estabelecer um desafio que leve a uma

    reflexo e produo.

    E claro que a pergunta no neutra. Ela dirige, provoca a ateno da pessoa para

    determinado aspecto da realidade. Isto nos remete importncia da elaborao das

  • 39

    perguntas: se perguntarmos de forma equivocada, as respostas dificilmente podero

    apontar para o que efetivamente relevante. Antes de iniciar a elaborao, a rigor,

    precisamos checar: Entendemos que a metodologia das perguntas a mais adequada

    para a construo do Projeto Educativo?

    Que perguntas devem orientar a elaborao do nosso Projeto?

    As perguntas so apropriadas? Apontam para o essencial, so relevantes, provocam os

    sujeitos, propiciam a expresso?

    A ideologia dominante ocupa nossa ateno com pseudoproblemas, com perguntas que

    desviam a nossa ateno do essencial. Devemos, pois, sempre nos questionar se estamos

    atentos s questes essenciais.

    Observamos que, muitas vezes, as escolas simplesmente repetem as perguntas

    sugeridas, sem uma anlise da prpria realidade. O grupo deve elaborar suas perguntas,

    de acordo com suas especificidades e necessidades.

    Questo das Contradies Internas ao Projeto

    Na elaborao coletiva do Projeto podem ocorrer proposies contraditrias.

    Estas contradies no devem ser camufladas ou desprezadas. Devem ser apontadas e

    trabalhadas. E importante que a contradio seja discutida pelo grupo, para ser assumida,

    no deixando pairar ambiguidades. Se for necessrio, que se prolongue a discusso, que

    se busquem subsdios, assessoria, de forma a ajudar o discernimento e superao da

    contradio pelo grupo. Por outro lado, quando na elaborao do Projeto algum ponto

    ficar por demais polmico, pode ser mais produtivo prever, como uma ao concreta da

    Programao, um momento especfico para se aprofundar a discusso.

  • 40

    Questo dos Conflitos

    Nossa formao enquanto educadores, imersos no caldo cultural maior do pas do

    'jeitinho', da 'cordialidade', torna difcil o enfrentamento de conflitos.

    Preferimos, frequentemente, os 'panos quentes', o 'no bem assim', o 'depois a gente se

    entende', o 'no era bem isto que queria dizer', etc. Por outro lado, ficamos muito

    susceptveis crtica: qualquer crtica feita tomada como destruidora.

    Muitas pessoas consideram que a elaborao de um Projeto Poltico-Peda ggico, atravs

    de um processo de Planejamento Participativo, ser a sada 'mgica' para os problemas.

    No entanto, medida que as coisas comeam a acontecer, assustam-se com os conflitos

    que emergem, chegando, no polo oposto, a atribuir ao Projeto tais conflitos. Na verdade,

    numa anlise mais atenta, percebemos que o que passa a ocorrer apenas a

    manifestao, a explicitao dos conflitos j presentes na comunidade, mas que estavam

    'represados' (ou camuflados) em funo da falta de canais apropriados para manifestao.

    O Projeto pode ajudar a encar-los de uma maneira refletida, comunitria. Possibilita

    tambm a combinao das diferenas: alguns atinam mais para o sonho, outros para a

    crtica da situao presente, outros ainda para o fazer. Estamos, portanto, apontando para

    uma outra possibilidade de resolver conflitos que no aquela tpica do planejamento

    normativo: os conchavos, as estratgias de negao de espao e poder do outro. Pelo

    contrrio, assumimos a perspectiva da coordenao intersubjetiva, da argumentao

    discursiva.

  • 41

    Dificuldades na elaborao do Projeto Poltico-Pedaggico

    No processo de elaborao do Projeto, muitos fatores podem interferir de forma a

    compromet-lo parcial ou totalmente. Podemos citar, por exemplo:

    Comodismo por parte dos sujeitos: no quererem a desacomodao que poder vir em

    decorrncia da concretizao das ideias ali colocadas;

    Imediatismo: ter pressa, no querer 'perder tempo' com as discusses; achar que no h

    necessidade de se fazer a elaborao terica, que se deveria ir direto ao;

    Perfeccionismo: querer chegar a um texto extremamente preciso e correto;

    Falta de esperana/confiana na instituio: 'No adianta falar que nada vai acontecer

    mesmo;

    Formalismo: perigo de reduzir o Projeto a uma sequncia de passos, a simplesmente

    elaborar um documento, sem vida, sem significado, sem envolvimento com as ideias, com

    as propostas;

    Mera reproduo do novo senso comum pedaggico;

    Nominalismo: achar que definir uma linha de trabalho para a escola se 'filiar' a alguma

    concepo corrente (educao libertadora, construtivismo, etc.);

    Falta de experincia de caminhada comum enquanto grupo; a rotatividade das pessoas

    na instituio;

    Falta de condies objetivas de espao-tempo para encontro, reflexo, elaborao e

    acompanhamento;

    Falta de exerccio democrtico na escola.

    Estes eventuais obstculos, uma vez localizados, devero ser tematizados, enfrentados,

    tendo em vista sua superao.

  • 42

    12. MARCO REFERENCIAL

    O Marco Referencial a tomada de posio da instituio que planeja em relao sua

    identidade, viso de mundo, utopia, valores, objetivos, compromissos. Expressa o 'rumo', o

    horizonte, a direo que a instituio escolheu, fundamentado em elementos tericos da

    filosofia, das cincias, da f. Implica, portanto, opo e fundamentao.

    O Marco Referencial nasce como busca de resposta a um forte questiona mento que nos

    colocamos: em que medida enquanto escola democrtica, podemos efetivamente

    colaborar para a construo do homem novo e da nova sociedade? So tantas as

    contradies da realidade e da prpria escola... O que fundamenta o nosso querer

    enquanto escola? Constatamos que, diante destes questionamentos, muitas escolas, por

    no encontrarem sentido para a prpria existncia, acabaram perdendo toda fora e

    capacidade de aglutinao, o que no surpreende, visto que ningum consegue viver sem

    um sentido maior que sustente a dura luta... No Marco Referencial procuramos expressar o

    sentido do nosso trabalho e as grandes perspectivas para a caminhada.

    Tem como funo maior tensionar a realidade no sentido da sua superao /

    transformao e, em termos metodolgicos, fornecer parmetros, critrios para a

    realizao do Diagnstico.

    O Marco Referencial composto de trs grandes partes: O Marco Situacional (onde

    estamos, como vemos a realidade) O Marco Doutrinal ou Filosfico (para onde queremos

    ir) O Marco Operativo (que horizonte queremos para nossa ao).

    Marco Situacional: O Marco Situacional um olhar do grupo que planeja sobre a

    realidade em geral: como a v, quais seus traos mais marcantes, os sinais de vida e de

    morte. , portanto, o momento da anlise da realidade mais ampla na qual a instituio

    est inserida. E importante por situar, dar todo o pano de fundo, os elementos estruturais

    que condicionam a instituio e seus agentes. Devemos enfatizar aqui que neste Marco o

  • 43

    que se visa uma viso geral da realidade e no uma anlise d instituio, (essa anlise

    mais prxima ser feita posteriormente no Diagnstico).

    Muitas vezes, quando vamos fazer consideraes sobre a realidade, temos a tendncia de

    apontar apenas os aspectos negativos, pois so os que mais nos incomodam. No entanto,

    temos de resgatar a contraditoriedade da realidade; perceber os aspectos positivos

    fundamental, pois podem nos apontar caminhos e fortalecer a esperana.

    Marco Doutrinal: O Marco Doutrinal (ou Filosfico) corresponde direo, ao horizonte

    maior, ao ideal geral da instituio (realidade global desejada). E a proposta de sociedade,

    pessoa e educao que o grupo assume. Aqui so expressas as grandes opes do grupo

    (utopia fim). Contm os critrios gerais de orientao da instituio.

    Como sabemos, toda educao se baseia numa viso de homem e de sociedade. O que

    ocorre frequentemente nas escolas que estas vises no so explicitadas, nem

    discutidas, podendo levar a srias distores na formao dos educandos, que estaro sob

    influncias dspares num momento precioso da constituio de seu carter e

    personalidade. Obviamente, no estamos nos referindo aqui a uma massificao, onde

    todos professores tossem iguais. O que queremos apontar um necessrio acerto em

    torno de um ncleo axiolgico mnimo (ideais, valores).

    O processo de elaborao do Marco Doutrinal d esta oportunidade tanto de explicitao,

    quanto de debate e busca de um consenso mnimo.

    Marco Operativo: O Marco Operativo expressa o ideal especfico da instituio. E a

    proposta dos critrios de ao para os diversos aspectos relevantes da instituio, tendo

    em vista aquilo que queremos ou devemos ser.

    Marco Operativo diz respeito a trs grandes dimenses do trabalho escolar, a saber:

    Dimenso Pedaggica

    Dimenso Comunitria

    Dimenso Administrativa

  • 44

    Apesar de estarem intrinsecamente relacionadas, tm aspectos especficos, que como tais

    devem ser tratados.

    Algumas questes de como desejamos na escola:

    O Processo de Planejamento?

    O Currculo?

    O Professor?

    A Equipe Tcnica?

    Os Objetivos?

    O Relacionamento com a Famlia?

    Os Servios (Secretaria, Limpeza, Audiovisuais, Alimentao etc?).

    Os Contedos?

    O Relacionamento com a Comunidade?

    As Formas de Participao dos Trabalhadores?

    A Metodologia?

    A Avaliao? Organizao dos Alunos?

    A Obteno e Gerenciamento dos Recursos Financeiros?

    A Disciplina?

    A relao Professor-Aluno?

    As Atividades Esportivas e Culturais?

    O Espao de Trabalho Coletivo Constante (reunies pedaggicas semanais)?

    COMO ELABORAR O MARCO REFERENCIAL

    A elaborao do Marco Referencial segue uma metodologia que se aplica no s a ele,

    mas a todas as partes do Projeto Poltico-Pedaggico. Envolve essencialmente trs

    dinmicas: individual, grupo e plenrio.

    Elaborao Individual

    o momento do posicionamento pessoal dos participantes; muito importante, pois a

    base de todo o restante do trabalho, devendo existir, portanto, a mxima dedicao e

    empenho.

  • 45

    Trata-se da contribuio de cada um e de todos para a melhoria da instituio.

    Cada participante escreve em um pedao de papel a resposta a uma pergunta (relao

    biunvoca), procurando deixar clara sua resposta, sem ser prolixo. Cada um deve ter

    oportunidade de responder todas as questes, mas pode escolher aquelas que mais se

    interessa (para no ficar uma tarefa desgastante e desprovida de significado). Deve-se, no

    entanto, garantir um nmero mnimo de respostas para cada item. Para que alguma rea

    no fique sem um nmero significativo de respostas, aconselhvel a coordenao fazer

    levantamentos intermedirios para verificar se est havendo manifestao em relao a

    todos os aspectos da instituio; em caso negativo, pode-se solicitar que mais algumas

    pessoas, voluntariamente, respondam, at que se tenha uma quantidade mnima para

    cada aspecto.

    Comear pelo individual e por escrito favorece a participao efetiva de cada um e de

    todos; racionaliza o tempo de discusso (normalmente no grupo discute-se muito alguns

    membros e depois o resultado que aparece sempre muito inferior ao contedo do

    debate).

    Trabalho Coletivo

    a etapa que corresponde sistematizao das ideias expressas individualmente. O

    grupo vai fazer uma primeira redao, que nada mais do que um agrupamento inteligente

    das ideias (no uma mera colagem); , portanto, uma tarefa tcnica de construo de um

    texto, no de julgamento; no importa, neste momento, a opinio do grupo; a discusso do

    contedo se dar no plenrio.

    O critrio fundamental para esta tarefa a fidelidade s ideias de origem; garantir a ideia

    bsica. Cabe tambm identificar possveis contradies entre as respostas; verificar qual a

    tendncia predominante. Explicitar na redao a contradio encontrada. Apontar ideias

    que eventualmente 'no se encaixaram'. A redao deve ser feita no grupo: um escreve,

    mas todos participam.

  • 46

    Deve-se tomar cuidado para no perder a riqueza do que vem e querer sintetizar tudo com

    chaves (tentar resumir tudo numa palavra). Estar atento tambm com a armadilha do

    'trenzinho' sequncia de adjetivos ou sequncia de tpicos. Procurar dar um corpo

    redao (dissertao).

    O trabalho de grupo precedido de uma organizao das respostas, juntando-as por

    pergunta e dividindo-as pelos grupos. Pode-se deixar dois grupos com a mesma pergunta,

    mas com conjuntos diferentes de respostas para se ter opo de redao.

    Como uma tarefa tcnica, a rigor, pode ser feita por uma ou vrias comisses de

    redao, no necessitando que o grupo todo esteja reunido no mesmo horrio.

    Plenrio

    O plenrio o momento da partilha dos trabalhos, do debate, das decises e dos

    encaminhamentos. Normalmente comea por uma breve explicao de como foi feito o

    texto pelo grupo (contextualizao); faz-se a leitura (todos devem ter cpias em mos das

    diversas redaes). Explicitam-se as contradies encontradas, bem como eventuais

    pontos tidos como fora de contexto. Inicia-se a anlise em cima de trs aspectos bsicos:

    Fidelidade: cada um se reconhece no texto? Alguma ideia, que considera

    significativa, foi colocada no papel, e no foi contemplada? Todos devem

    reconhecer, de alguma forma, sua resposta na sntese; isto fundamental!

    Tcnico: este um texto coerente para tal parte do Projeto (Marco Referencial,

    Diagnstico ou Programao, de acordo com o momento respectivo da

    elaborao)?

    Contedo: isto que desejamos para nossa escola? Estamos de acordo com as

    ideias expressas no texto?

  • 47

    Quando h um espao entre o trabalho de redao e o plenrio, interessante, pois

    possvel a leitura prvia do material, qualificando e racionalizando a discusso (as pessoas

    j vm com as dvidas ou discordncias anotadas).

    DIAGNSTICO

    Diagnstico aqui est sendo entendido no num sentido difundido no senso comum

    educacional como 'levantamento de dificuldades ou de dados da realidade', mas no sentido

    mais preciso de localizao das necessidades da instituio, a partir da anlise da

    realidade e/ou do confronto com um parmetro aceito como vlido.

    Diagnstico tem origem no grego diagnostiks, sendo que foi apropriado pela Medicina na

    acepo de conhecimento ou determinao de uma doena pelo(s) sintoma(s) e/ou

    mediante exames diversos (laboratoriais, radiolgicos, etc.) (cf. Aurlio). Sua raiz,

    diagnose, tambm do grego (dignosis = discernimento, exame), podendo ser entendida

    a partir de seus dois componentes dia -t- gnosis como atravs do conhecimento. Ocorre

    que o termo diagnose foi incorporado Histria Natural ou Botnica com o sentido de

    descrio minuciosa do animal e da planta, feita pelo seu classificador, em geral em latim

    (cf. Aurlio). Seu uso est muito marcado por esta perspectiva de descrio ou mera

    classificao. No Projeto Poltico-Pedaggico, todavia, o diagnstico no pode ser

    assumido com este significado.

    O Diagnstico a pane de um plano que profere um juzo sobre a instituio planejada em

    todos ou em alguns aspectos tratados no Marco Operativo (que descreveu o modo ideal de

    ser, de se organizar, de agir da instituio), juzo este realizado com critrios retirados do

    mesmo Marco Operativo e, sobretudo, do Marco Doutrinal. O Diagnstico o resultado da

    comparao entre o que se traou como ponto de chegada (Marco Referencial) e a

    descrio da realidade da instituio como ela se apresenta.

    O Diagnstico corresponde s seguintes tarefas:

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    Conhecer a Realidade

    O conhecimento da realidade vai se dar pela pesquisa (levantamento de dados da

    instituio) e anlise (estudo dos dados no sentido de captar os problemas, os desafios,

    bem como os pontos de apoio para o processo de mudana da realidade institucional). A

    anlise visa apreender ' movimento do real.

    Julgar a Realidade

    O julgamento se d em funo do referencial assumido pelo coletivo. E o confronto entre o

    ideal e o real, entre aquilo que desejamos e aquilo que estamos sendo. Podemos apontar

    aqui duas esferas: o quanto nos aproximamos ou distanciamos do desejado (quais os

    fatores facilitadores/ dificultadores para concretizar o desejado), e uma anlise sobre isto:

    quais as foras de resistnc