Apostila TF

114
1 Material básico de apoio e estudo da disciplina: TECNOLOGIA DAS FERMENTAÇÕES Prof. Dr. Mário A. A. da Cunha Pato Branco – 2010 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ Curso de Química

Transcript of Apostila TF

Page 1: Apostila TF

1

Material básico de apoio e estudo da disciplina:

TECNOLOGIA DAS FERMENTAÇÕES

Prof. Dr. Mário A. A. da Cunha

Pato Branco – 2010

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

Curso de Química

Page 2: Apostila TF

2

Índice

1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................................ 3 1.1 Introdução a Tecnologia das Fermentações............................................................................................... 3 1.1.1 Histórico das Fermentações............................................................................................................. 3 1.3 Importância dos Processos Fermentativos................................................................................................. 8 1.3.1 Campos de Aplicação da Fermentação Industrial........................................................................... 8 1.4 Biotecnologia............................................................................................................................................. 9 1.5 Processo Fermentativo Genérico............................................................................................................... 10 1.6 Microrganismos de Interesse Industrial..................................................................................................... 12 2 METABOLISMO MICROBIANO........................................................................................................... 24 2.1 Metabolismo Anaeróbico.......................................................................................................................... 27 2.1.1 Glicólise (Via Embden-Meyerhof-Parnas)....................................................................................... 27 2.2 Fermentação............................................................................................................................................... 30 2.2.1 Fermentação de Carboidratos......................................................................................................... 31 2.3 Vias Alternativas de Utilização da Glicose............................................................................................... 33 2.4 Metabolismo Aeróbico (Respiração Celular) ........................................................................................... 33 2.4.1 Ciclo de Krebs.................................................................................................................................. 33 2.4.2 Cadeia de Transporte de Elétrons e Fosforilação Oxidativa........................................................... 35 3 NUTRIÇÃO MICROBIANA.................................................................................................................... 36 3.1 Matérias-primas para Composição de Meios Fermentativos Industriais................................................... 38 4 CULTIVO MICROBIANO....................................................................................................................... 40 4.1 Meios Sintéticos e Meios Complexos....................................................................................................... 42 5 ISOLAMENTO DE MICRORGANISMOS EM CULTURAS PURAS.................................................. 46 6 TÉCNICAS DE CONSERVAÇÃO DE MICRORGANISMOS VIÁVEIS EM LABORATÓRIO......... 52 7 MÉTODOS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO CRESCIMENTO MICROBIANO................................ 53 7.1 Determinação do Peso (massa) Seco......................................................................................................... 53 7.2 Turbidimetria............................................................................................................................................. 53 7.3 Determinação Química de Componentes Celulares.................................................................................. 54 7.4 Contagem do Número Total de Indivíduos............................................................................................... 54 7.5 Contagem de Microrganismos Viáveis...................................................................................................... 56 8 PROCESSOS FERMENTATIVOS.......................................................................................................... 57 8.1 Fatores que Influem na Velocidade de Crescimento................................................................................. 61 8.2 Estudo Cinético dos Processos Fermentativos.......................................................................................... 66 8.3 Parâmetros de Transformação................................................................................................................... 68 8.3.1 Fatores de Conversão....................................................................................................................... 68 8.4 Tipos de Fermentação................................................................................................................................ 69 8.4.1 Tipo 1 – Associada........................................................................................................................... 69 8.4.2 tipo 2 – Semi-Associada................................................................................................................... 70 8.4.3 Tipo 3 – Não Associada.................................................................................................................... 70 9 FORMAS DE CONDUÇÃO DOS PROCESSOS FERMENTATIVOS.................................................. 71 9.1 Fermentações Descontínuas...................................................................................................................... 72 9.1.1 Fermentação Descontínua Alimentada............................................................................................ 75 9.2 Fermentação Semicontínua........................................................................................................................ 77 9.3 Fermentação Contínua............................................................................................................................... 78 10 PRINCIPAIS PROCESSOS FERMENTATIVOS.................................................................................... 83 10.1 Fermentação Alcoólica.............................................................................................................................. 83 10.1.1 Histórico da Fermentação Alcoólica............................................................................................. 83 10.1.2 Generalidades................................................................................................................................. 84 10.1.3 Matérias-primas para Produção de Etanol por Fermentação....................................................... 85 10.1.4 Processo Industrial de Produção de Etanol por Fermentação...................................................... 86 10.2 Fermentação Lática.................................................................................................................................... 91 10.2.1 Produção de Ácido Lático por Fermentação................................................................................. 92 10.2.2 Fermentação Lática de Vegetais.................................................................................................... 96 10.3 Fermentação Acética................................................................................................................................. 99 10.3.1 Vinagre........................................................................................................................................... 99 10.3.2 Microbiologia da Fermentação...................................................................................................... 102 10.3.3 Processo de Fabricação (Acetificação)......................................................................................... 102

Page 3: Apostila TF

3

1. INTRODUÇÃO

1.1 Introdução a Tecnologia das Fermentações

1.1.1 Histórico das Fermentações

A fermentação foi um dos fenômenos que mais intrigou os pesquisadores de todas

as épocas, ao longo da história da humanidade. Na tentativa de melhor compreender esse

processo fascinante, conseguiu-se obter importantes avanços, que ajudaram a humanidade

a conhecer melhor sua natureza e a utilizar seus maravilhosos efeitos em seu benefício, de

forma mais racional.

Na infância do mundo, o ser humano descobriu que podia aproveitar reações que

ocorriam espontaneamente na natureza para tornar sua vida melhor e mais agradável. E

cedo, muito cedo, passou a utilizar, em seu benefício, os efeitos surpreendentes e, durante

muito tempo, utilizou os processos fermentativos para conservar alimentos e preparar

bebidas.

Assim, com os animais da floresta, bebedores da seiva doce que exsudava do tronco

de algumas árvores na primavera, os habitantes das cavernas aprenderam a consumir

aquele líquido vegetal fresco, doce e nutritivo, que podia sofrer transformações.

Desde a era pré-histórica, sabia-se, também, que a carne dos animais deveria ser

consumida dias depois do abate, porque essa prática melhorava seu paladar. O mesmo deve

ter acontecido com alguns cereais que cresciam naturalmente nos campos e com certos

frutos.

Aos poucos, os povos primitivos verificaram que, quando estavam muito maduros,

os açúcares neles contidos se alteravam, e seu suco ganhava efeitos inebriantes, que os

ajudavam não só a mitigar a sede, como a suportar temperaturas mais baixas do inverno.

Ao abandonar a vida nômade para iniciar as atividades agrícolas e a criação de

animais, há cerca de 10 000 anos, a necessidade de guardar alimentos se tornou

fundamental para os humanos. Dessa forma, os métodos de conservação evoluíram, por

meio de incessantes observações e experiências.

Diversas frutas e vegetais passaram a ser parcialmente desidratados. Outras sofriam

salga, e eram deixados para fermentar, dando origem a um produto ácido, agradável ao

paladar. O leite ordenhado era guardado em vasilhames, onde sofria transformações que

Page 4: Apostila TF

4

permitiam seu armazenamento por mais tempo, possibilitando o desenvolvimento de

variadas técnicas de preparo de queijos e coalhadas.

Sabe-se que os povos que viviam no passado, em terras australianas, cultivavam

uma espécie de inhame, obtendo grandes colheitas. Para guardá-las por longos períodos, a

fim de que durassem, pelo menos, até os frios meses do inverno, costumavam colocá-las

sob montículos de terra, relva e pedra vulcânica. Permanecendo, assim, por algum tempo, o

gosto e a textura desse alimento se modificavam, e podia até adquirir maior valor nutritivo,

sem apresentar sinais de decomposição. Mesmo sem entender muito bem o que se passava,

esses povos estavam usando a fermentação.

As mudanças que ocorriam naturalmente no trigo levaram à fabricação do pão. A

moagem primitiva do trigo e de outros grãos resultava em uma espécie de mingau grosso.

Acidentalmente, descobriu-se que, da combinação daquela massa com certos resíduos

orgânicos, depositados nas pedras quentes, onde ela era assada, surgia um produto mais

consistente, volumoso e saboroso.

A fabricação do pão é uma tradição milenar dominada pelos povos orientais, muito

antes de chegarem ao Ocidente. Sabe-se que os povos da Mesopotâmia e, depois, do Egito

conheciam, há pelo menos 6 000 anos, a técnica do preparo desse produto. Eles utilizavam

a espuma formada nos barris destinados à fabricação de cerveja para fazer o pão crescer.

Cenas de panificação também foram encontradas em murais, nas ruínas de Menfis, há 3000

anos a.C.

Grandes consumidores de vinho, os romanos antigos conheceram várias técnicas

para obter o fermento de panificação. Eles usaram o levedo selvagem, que flutuava no ar,

ou aquele que aparecia naturalmente nas cascas das uvas. Mas não se conseguia, ainda,

entender o que estava acontecendo de fato, porque os minúsculos seres responsáveis pela

maravilha eram invisíveis a olho nu.

Os romanos sabiam, ao certo, que o fenômeno era um mistério extraordinário, um

processo notável, e as palavras usadas para designá-lo comprovam esse fato. O verbo

fermentar é derivado da palavra latina “fervere”.

A palavra latina fervere significa etimologicamente o estado de ebulição, relativo à

condição de borbulhamento gasoso (aparecimento de bolhas devido à produção de dióxido

de carbono pela ação das leveduras sobre sucos, caldos de frutas ou de cereais).

No sentido tecnológico, significa todo processo em que atuam microrganismos,

controlados pelo homem, sobre substratos orgânicos através de suas enzimas, produzindo

determinadas substâncias de utilidade para o homem. Essas substâncias ou produtos de

Page 5: Apostila TF

5

fermentação vão desde alimentos modificados e bebidas alcoólicas, a outros produtos

industriais, como solventes, ácidos orgânicos, ésteres, aminoácidos, polissacarídeos,

enzimas, vitaminas, antibióticos e hormônios.

Do ponto de vista bioquímico, é uma manifestação fisiológica da célula viva.

Corresponde à geração de energia pelo catabolismo de compostos orgânicos, sem a

participação de oxigênio como aceptor final de elétrons. É um termo que denota a

degradação anaeróbica da glicose ou de outros nutrientes orgânicos em vários produtos

(característicos para os diferentes organismos) para obter energia na forma de ATP.

Os microrganismos realizam a fermentação com o objetivo de produzir energia na

forma de trifosfato de adenosina (ATP) para as necessidades de crescimento celular e

manutenção celular.

O uso de professos fermentativos pelo homem é bastante remoto e transcende, em

muito, o início da era cristã. Na antiguidade o homem, mesmo que inconscientemente, já

fazia uso de microrganismos. Documentos da história antiga revelam que o homem já

conhecia a arte de fabricar pão, cerveja, vinho e iogurte:

• Produção de vinho: 10.000 a.C., provavelmente o vinagre tenha sido descoberto na

mesma época;

• Cerveja: 5.000 – 6.000 a.C, os Egípcios deixavam a cevada germinar em potes de

barro, amassavam os grãos e deixavam fermentar para a obtenção da bebida. Mais

tarde por volta de 2.000 a.c, passaram a utilizar ainda as leveduras produzidas no

processo de obtenção da cerveja para o crescimento do pão.

• Os chineses há mais de 3000 anos utilizavam coalhada mofada de feijão-soja para

curar infecções da pele;

• Os habitantes primitivos da América Central empregavam fungos para o tratamento

de feridas infeccionadas;

• Entretanto, nos primórdios dos tempos não eram conhecidos os agentes causadores

das fermentações. Somente no século dezessete, o pesquisador Antonie Van

Leeuwenhock (um dos precursores no uso do microscópio) através da visualização

em microscópio de gotas de cerveja fermentada (1680), descreveu a existência de

seres tão minúsculos que eram invisíveis a olho nu.

• Somente 200 anos mais tarde, em 1857 Louis Pasteur, após investigações

detalhadas sobre as leveduras da cerveja e do vinho, concluiu que a causa das

fermentações era a ação desses seres minúsculos, os microrganismos, caindo por

Page 6: Apostila TF

6

terra a teoria, até então vigente, que a fermentação era um processo puramente

químico. Pasteur concluiu que as leveduras vivas fermentavam o açúcar,

transformando-o em etanol e CO2 quando em anaerobiose. Os estudos realizados

por Pasteur permitiram verificar que a fermentação alcoólica estava sempre

associada ao crescimento de leveduras, mas que se estas fossem expostas a maiores

quantidades de oxigênio produziam (em vez de álcool e dióxido de carbono) água e

dióxido de carbono. Destas observações, Pasteur concluiu que a fermentação é o

mecanismo utilizado pelos seres vivos para produzir energia na ausência de

oxigênio. Obs.: A sugestão de que a fermentação alcoólica era causada por

levedura, isto é, por seres vivos, já havia sido feita por outros pesquisadores, como

Thenard, Charles De La Tour, Schwan e Kützing, os quais sofreram forte oposição

por parte de químicos influentes da época, como Liebig, Berzelius e Whöhler que

admitiam ser aquele processo estritamente químico.

• Em 1881, Robert Kock (maior bacteriologista de todos os tempos) estudou e

desenvolveu técnicas de cultivo puro assim como outros métodos bacteriológicos

clássicos utilizados até hoje. O desenvolvimento da metodologia de cultivos puros

por kock proporcionou o surgimento de técnicas que permitiram estudar as

aplicações industriais de espécies microbianas individuais, iniciando-se o emprego

de cultivos puros, meios esterilizados e condições assépticas nas fermentações

industriais.

• Foi ainda Pasteur que provou que cada tipo de fermentação era realizado por um

microrganismo específico e que estes podiam viver e se reproduzir na ausência de

ar.

• Em 1901 Rudolf Emmerich e Oscar Low, isolaram a Piocianase, o primeiro

antibiótico do mundo (produzido por Pseudomonas aerugionosa). Diversos

pacientes foram tratados com êxito por este antibiótico, porém, a ausência de

controle de qualidade conduzia à desuniformidade dos lotes. Não existiam técnicas

para garantir que cada lote produzido da substância pudesse ser igualmente efetivo

causando insucesso em alguns casos, o que acarretou seu abandono;

• Em 1923, Pfizer inaugurou a primeira fábrica para a produção de ácido cítrico por

via fermentativa. O processo envolvia uma fermentação utilizando fungo

Aspergillus niger, pelo qual açúcar era transformado em ácido cítrico.

Page 7: Apostila TF

7

• Em 1928, a descoberta acidental de Alexander Fleming deu origem a Penicilina, o

primeiro antibiótico realmente efetivo. A produção de antibióticos foi o grande

marco de referência na fermentação industrial.

• As primeiras plantas industriais a utilizarem tecnologia de fermentação foram as

fábricas de cerveja. No entanto, foi só no final do século XIX e início do século XX

que essa tecnologia passou a ser gradativamente utilizada, tanto na indústria de

bebidas e alimentos, como na indústria química.

• Paradoxalmente, foram as grandes guerras mundiais que motivaram a produção em

escala industrial de produtos advindos de processos fermentativos. A indústria

química, no início do século XX, iniciou a produção de solventes orgânicos. Só no

início do primeiro grande conflito mundial as necessidades de acetona na produção

de explosivos estimularam substancialmente a pesquisa no potencial da tecnologia

de fermentação. A carência de munições sentida pelo exército britânico fez com

que Chaim Weizmann utilizasse milho maltado para produzir acetona por

fermentação, a qual é essencial na fabricação do explosivo cordite. Essa

fermentação contribuiu para o desenvolvimento dos fermentadores industriais e

técnicas de controle de infecções.

• A partir da primeira guerra, a Alemanha, que necessitava de grandes quantidades de

glicerol para a fabricação de explosivos, desenvolveu através de Neuberg, um

processo microbiológico de obtenção desse alcool, tendo chegado a produzir 1.000

toneladas do produto por mês.

• Dois elementos vitais deram início a era da Tecnologia de Fermentações

Industriais: o emprego de fungos filamentosos e leveduras na modificação de

alimentos e bebidas e os estudos microbiológicos pioneiros de louis Pasteur e

Robert kock.

• O desenvolvimento de fermentações em superfície ou semi-sólidas surgiu com o

desenvolvimento de alimentos orientais e durante as grandes navegações.

• O cultivo de algas e leveduras deu início ao processo industrial de obtenção de

proteínas alimentícias microbianas (proteínas de organismos unicelulares).

• A produção de vinagre e os estudos de Pasteur sobre a produção de ácidos abriram

caminho para o desenvolvimento de fermentações que produzem ácidos orgânicos.

Page 8: Apostila TF

8

1.3 Importância dos Processos Fermentativos

Atualmente as fermentações não estão restritas apenas à obtenção de alimentos e

bebidas fermentadas como, por exemplo, picles, chucrute, coalhadas, queijos, molhos,

temperos, etc. Mas também a produção de produtos químicos, através da “biossíntese”, em

contrapartida à “quimiossíntese”. A indústria farmacêutica produz hoje, em escala

crescente, antibióticos, vitaminas, aminoácidos, substâncias carotenóides (provitaminas),

esteróides modificados (hormônios), entre outros.

Outro campo de emprego dos bioprocessos inclui o biotratamento de resíduos

agroindustriais, efluentes industriais e domésticos. Solos contaminados por componentes

químicos tóxicos podem ser submetidos a processos biológicos de remediação, os quais

podem permitir eficiente detoxificação do ambiente.

1.3.1 Campos de Aplicação da Fermentação Industrial

Alimentos e Bebidas

PRODUTO MICRORGANISMOS Queijos Fungos e bactérias Iogurtes e Leites Fermentados Bactérias láticas Manteigas Bactérias láticas Bebidas alcoólicas (cervejas, aguardentes, vinhos, espumantes, sidra)

Leveduras alcoólicas

Produtos de Panificação (fermento e enzimas)

Levedura alcoólica e bolores

Vegetais fermentados (picles, azeitonas, chucrute)

Bactérias láticas

Carnes fermentadas (salames, lingüiças) Bactérias láticas Vinagre Cacau Chá Soja fermentada Proteína microbiana Desenvolvimento de sabores e aromas Enzimas (proteases, amilases, glicose oxidase)

Bactérias acéticas Leveduras e bactérias Enzimas oxidades (polifenoloxidase) Bolores, leveduras e bactérias Bolores, leveduras e bactérias Bolores Bactérias e fungos

Page 9: Apostila TF

9

Nas Indústrias Química e Farmacêutica

PRODUTO EXEMPLOS Solventes Etanol (carburante), acetona, butanol,

isopropanol Ácidos orgânicos Ácidos cítrico, lático, acético, glucônico Aminoácidos Glutâmico, lisina, triptofano Enzimas Amilases, proteases, lípases, pectinases, lactase,

celulase, etc. Vitaminas C Ácido ascórbico, vitamina B-2 riboflavina,

B12 cianocobalamina, β-caroteno Antibióticos Penicilinas, estreptomicina, tetraciclinas Polissacarídeos / Gomas Goma xantana, gelana Poliesteres Bioinseticidas (controle biológico de pragas)

PHAs, PHB Bacillus

Os avanços científicos conquistados pelo homem proporcionaram grande evolução

dos processos fermentativos, os quais fazem parte hoje de um campo mais amplo que é a

Biotecnologia.

1.4 Biotecnologia

A Biotecnologia é uma área de conhecimento tecnológico de caráter

multidisciplinar, que abrange diferentes campos do conhecimento: química, física,

biologia, microbiologia e engenharia. Embora a palavra biotecnologia tenha sido usada

pela primeira vez em 1919 por um engenheiro agrícola da Hungria (Karl Ereky), o

crescimento dessa área somente ocorreu a partir da década de 70 com o desenvolvimento

da tecnologia do ácido desoxirribonucléico (DNA) recombinante.

Na literatura podem ser observadas diferentes formas para definir o termo

biotecnologia. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

(CNPq), em seu Programa Nacional de Biotecnologia, definiu biotecnologia da seguinte

forma: “A utilização de sistemas celulares para obtenção de produtos ou desenvolvimento

de processos industriais”.

Podemos definir biotecnologia, sob o aspecto tecnológico, como a aplicação

controlada de agentes biológicos em operações técnicas para produção de bens e serviços.

A integração de técnicas e tratamento multidisciplinar, que buscam soluções para

viabilizar a produção de bioprodutos em escala comercial, vem sendo denominada de

Biotecnologia Industrial. Podemos dizer que a biotecnologia consiste na aplicação em

Page 10: Apostila TF

10

grande escala dos avanços científicos e tecnológicos, a partir de organismos vivos (células

e/ou moléculas) para produção racionalizada de substâncias, que resultam em produtos

comercializáveis.

A biotecnologia encontra muitas aplicações importantes em diferentes áreas de

atividades: agricultura, pecuária, saúde, preservação do meio ambiente e indústria. Suas

aplicações na indústria constituem o objetivo primordial da Biotecnologia Industrial.

A figura abaixo é uma representação gráfica da “localização” da Biotecnologia

Industrial e de sua interação com outros ramos do conhecimento.

Figura 1. Representação gráfica da “localização” da Biotecnologia Industrial e de sua interação com outros

ramos do conhecimento (Fonte: Coleção Biotecnologia Industrial. 1ª. Edição, 2001)

1.5 Processo Fermentativo Genérico

Figura 2. Esquema de um processo fermentativo genérico

Page 11: Apostila TF

11

O crescente interesse pelos processos biotecnológicos de produção é, em parte,

justificado pela possibilidade de produção de compostos de interesse através de uma

tecnologia considerada “limpa”, uma vez que os resíduos gerados por estes processos

comumente são resíduos de baixa toxicidade e de tratamento relativamente fácil. Outros

pontos positivos são a possibilidade de menor gasto energético no processo, visto que não

são empregadas condições de elevadas temperaturas e pressões. Além da possibilidade de

uso de resíduos ou subprodutos agrícolas ou agroindustriais como matérias-primas, fato

que em países com uma elevada atividade agrícola e agroindustrial, como o Brasil, é

bastante relevante.

O sucesso de determinado processo fermentativo está diretamente associado a

quatro fatores básicos: o microrganismo empregado no processo, a composição do meio de

cultivo, a forma de condução do processo e as etapas de recuperação do produto

(downstream).

A. Microrganismo:

O microrganismo desempenha papel fundamental em um processo fermentativo

industrial, uma vez que é o agente transformador do sistema, responsável pela conversão

de determinado substrato em produto de interesse. É importante que o microrganismo

empregado no processo apresente algumas características como:

• Ser eficiente na conversão do substrato em produto;

• Tolerar altas concentrações do produto no caldo fermentado;

• Não produzir substâncias incompatíveis com produto da bioconversão;

• Comportamento fisiológico estável (constante);

• Não ser patogênico;

• Não exigir condições de processo muito complexas;

• Não exigir meios de cultura caros;

B. Composição do Meio de Cultivo

A composição do meio de cultivo está diretamente correlacionada com o

microrganismo envolvido no processo. O sucesso de uma fermentação depende tanto das

características do microrganismo como da composição do meio, uma vez que o meio deve

Page 12: Apostila TF

12

fornecer ao microrganismo os elementos necessários ao seu bom desenvolvimento e

desempenho na bioconversão.

Algumas características necessárias do meio de cultivo incluem:

• Apresentar baixo custo;

• Atender as necessidades nutricionais do microrganismo;

• Auxiliar no controle do processo;

• Não contribuir para problemas de recuperação do produto;

• Não sofrer degradação durante esterilização;

• Não causar dificuldades no tratamento final do efluente.

C. Forma de Condução do Processo

A forma de condução do processo também tem grande influência no sucesso da

conversão. Os diferentes sistemas fermentativos (descontínuo, descontínuo alimentado,

semicontínuo, contínuo) e configurações de biorreatores (STR, coluna de bollhas, air-lift,

plug-flow, leito fixo, leito fluidizado, reatores de membrana, hollow-fiber, reatores de

bandejas, tambor rotativo) existentes contribuem para o desempenho global dos processos

fermentativos.

D. Etapas de recuperação do produto (downstream)

As operações de recuperação do produto (operações de downstream) são, na

maioria das vezes, responsáveis por grande parte dos custos do processo. Para a produção

de produtos de elevado valor agregado como antibióticos, enzimas, insulina, hormônios de

crescimento, vitaminas as operações de downstream podem corresponder a 50 ou 70 % do

custo do produto final.

1.6 Microrganismos de Interesse Industrial

Os produtos de relevância comercial oriundos das fermentações industriais podem

ser agrupados em 4 categorias: células microbianas, moléculas grandes como enzimas e

polissacarídeos, produtos básicos e metabólitos secundários os quais são importantes para

o crescimento celular. A indústria dos bioprocessos emprega principalmente espécies de

Page 13: Apostila TF

13

bactérias, algas, fungos filamentosos e leveduras, ainda que os avanços recentes no

desenvolvimento de técnicas de cultivos tenham permitido a utilização de células mais

complexas nos processos de fermentação.

Na natureza existem duas classes principais de células, ambas utilizadas nos

processos de fermentação industrial. São elas as células procariontes (células bacterianas)

e células eucariontes (leveduras, fungos filamentosos, células animais e vegetais).

As células eucarióticas (células com núcleo com membrana): Apresentam núcleo

delimitado por uma membrana (envoltório nuclear) e uma organização celular mais

complexa que as procarióticas, apresentando estruturas organizadas (organelas:

mitocôndrias ou cloroplastos, retículo endoplasmático, complexo de golgi e lisossomo)

(Figura 3A).

As células procarióticas (células sem núcleo com membrana): São geralmente

menores que as células eucarióticas, com dimensões entre 0,25 x 1,2 µm a 1,5 x 4 µm. Não

apresentam compartimentos membranares no seu interior. O material genético está

disperso no citoplasma. Possui uma organização mais simples que as eucarióticas, não

apresentando organelas (mitocôndrias, retículo endoplasmático, complexo de golgi e

lisossomo) que são compartimentos internos envoltos por membranas, e que caracterizam a

célula procariótica (Figura 3B).

Figura 3. Estruturas celulares: Eucariótica (A) e procariótica (B)

Os microrganismos também se diferenciam em função de suas exigências de

oxigênio, podendo desenvolver-se na presença ou na ausência de oxigênio. Com relação a

sua exigência em relação à oxigenação dividem-se em estritamente aeróbios, como a

Pseudomonas aeruginosa e a maioria dos fungos filamentosos, que podem desenvolver-se

unicamente em presença de O2. Os estritamente anaeróbios como o Clostrídium tetani, que

Page 14: Apostila TF

14

unicamente podem crescer na ausência de O2, os microrganismos facultativos (anaeróbios

facultativos), entre eles as leveduras industriais, que podem crescer em situação de

aerobiose e anaerobiose. Há ainda, os microaerófilos, que crescem somente em condições

de baixa disponibilidade de oxigênio e os aerotolerantes (anaeróbios aerotolerantes) que

suportam a presença de O2, embora não o utilizem como aceptor final de elétrons.

Cerca de 90 % do oxigênio consumido pelos microrganismos aeróbios são

utilizados como aceptor final da cadeia de transporte de elétrons, resultando na formação

de H2O; os 10 % restantes tomam parte em reações catalisadas por enzimas do tipo

oxidases ou oxigenases, que usam O2 como substrato. O metabolismo oxidativo gera

continuamente espécies de oxigênio apenas parcialmente reduzidos, extremamente

reativas, capazes de atacar qualquer composto orgânico e, portanto, extremamente tóxicas.

As espécies ativas de oxigênio formadas pela redução parcial de O2. A redução completa, com a transferência de quatro elétrons, leva a

formação de água.

O2 + 1 e- → ●O2- (radical superóxido)

O2 + 2 e- → H2O2 (peróxido de hidrogênio)

O2 + 3 e- → ●OH (radical hidroxila)

O2 + 4 e- → H2O água

Nos organismos aeróbios estão presentes várias enzimas incumbidas do processo de

eliminação destas espécies ativas de oxigênio. O radical superóxido pode ser eliminado

pela ação seqüencial de duas enzimas, a superóxido dismutase e a catalase, que catalisam

as seguintes reações:

●O2- + ●O2

- + 2 H+ → H2O2 + O2 (catalisada pela superóxido dismutase)

2 H2O2 → 2 H2O2 + O2 (catalisada pela catalase)

As superóxido dismutases são encontradas em todos os organismos aeróbios, mas

estão ausentes nos anaeróbios obrigatórios. Ainda mais, mutantes de bactérias aeróbias

facultativas, ao tornarem-se capazes de sintetizar superóxido dismutase, convertem-se em

anaeróbios estritos. Em algumas espécies microbianas altas tensões de oxigênio podem

inibir a superódixo dismutase. Este é provavelmente o motivo pelo qual bactérias

microaerófilas só se desenvolvem em ambientes com baixas concentrações de oxigênio.

Os microrganismos podem ser encontrados no solo, no ar, oceanos, pele, trato

digestivo dos animais, na superfície das folhas, nas frutas, etc. É estimado que a massa

Page 15: Apostila TF

15

microbiana total seja 25 vezes superior à massa total da vida animal. Os animais

transportam enormes populações microbianas, por exemplo, o corpo humano tem cerca de

10 bilhões de células e cerca de 100 bilhões de microrganismos.

Embora os microrganismos sejam, muitas vezes, lembrados como inimigos

(patogênicos), apenas uma pequena parcela está relacionada a doenças no homem. A

maioria são benéficos e muitos são utilizados em processos industriais.

As bactérias utilizadas nos processos fermentativos são principalmente

quimiorganotróficas, isto é, podem obter sua energia e seu carbono por oxidação de

compostos orgânicos. São microrganismos unicelulares, procarióticos e, portanto,

carecendo de membrana nuclear e outras estruturas observadas em eucarióticos. São

divididas em dois grupos as Eubactérias e as Arqueobactérias.

As arqueobactérias se assemelham às eubactérias, quando observadas por meio de

um microscópio. Entretanto, existem diferenças importantes com relação a sua composição

química, atividade e ao ambiente em que se desenvolvem. Muitas arqueobactérias são

encontradas em abientes inóspitos, como em águas com elevado teor salino (ex. mar

vermelho), em locais de elevada temperatura (fontes termais, bases de vulcões) e em meios

com elevada acidez. As arqueobactérias dividem-se em três grupos principais:

metanogênicos (eliminam metano a causa da sua respiração), halofílicos extremos (vivem

em ambientes muito salinos -Great salt lake, Utah; Mar morto), termofílicos extremos

(habitam águas quentes e sulfurosas como fontes termais).

As células bacterianas variam em tamanho dependendo da espécie, mas a maioria

tem aproximadamente de 0,5 a 1 µm em diâmetro. A relação da área de superfície de uma

bactéria e seu volume é extremamente alta. Isto significa que existe uma grande superfície

através da qual os nutrientes podem entrar em relação a um pequeno volume de substância

celular a ser alimentada. Isto explica, em parte, a alta taxa de metabolismo e crescimento.

Quanto à forma, a maioria das bactérias podem ser classificadas em três grupos

básicos: Cocos, Bacilos e espirilos. Podem agrupar-se em pares, grupos ou cadeias e

reproduzem por fissão binárias (em sua maioria). Nutrição autótrofa, heterótrofa ou por

fotossíntese (cianobactérias) e podem apresentar apêndices móveis chamados flagelos.

Page 16: Apostila TF

16

Figura 4. Morfologia das bactérias

As bactérias estão aptas a viver em ambientes com concentração de solutos muito

menores que as do seu citoplasma graças á presença de um envoltório rígido, a parede

celular. Esta estrutura vital é capaz de suportar pressões da ordem de 5, Kg.cm-2, podendo

estar em contato direto com o meio ambiente. A parede celular bacteriana é uma estrutura

rígida que recobre a membrana citoplasmática e confere forma às bactérias.

Ela é constituída por ácido diaminopimérico (DPA), ácido murâmico e teicoico

além de aminoácidos e lipídeos. Todos esses compostos estão reunidos para formar

substâncias poliméricas complexas que por sua vez estruturam a parede celular. Uma

macromolécula complexa denominada peptídeoglicana (também chamada de

mucopeptídeo ou mureína) forma a estrutura rígida da parede. Além disso, a parede celular

protege a célula, mantendo a pressão osmótica intrabacteriana.

As bactérias são agrupadas em dois grupos de acordo com a sua resposta a

coloração de Gram (gram-positivas e gram-negativas). A resposta à coloração de Gram

está ligada a diferenças na composição e estrutura da parede celular.

Gram-positivas: possuem uma quantidade maior de peptídeoglicano em sua parede

celular, o que torna a parede dessas bactérias mais espessas e rígida do que a das Gram-

negativas. Composta de proteínas, lipídeos, peptídeoglicano e ácidos teicóicos (cadeia de

polifosfato com resíduos de ribitol e glicerol). Essas bactérias são sensíveis a lizosima e

sua parede constitui o local de ação de alguns antibióticos.

Page 17: Apostila TF

17

Gram-negativas: a parede celular dessas bactérias é menos espessa e ela sãos mais

complexas do que as gram-positivas por apresentarem uma membrana externa cobrindo a

fina camada de peptídeoglicano. A membrana externa é o que distingue as bactérias gram-

negativas, servindo como uma barreira seletiva para a entrada e saída de algumas

substâncias da célula e podendo ainda causar efeitos tóxicos sérios em animais infectados.

A estrutura da membrana externa é composta por fosfolipídeos, lipoproteínas e

lipopolissacarídeos (LPSs). Os lipopolissacarídeos estão exclusivamente na camada

externa da membrana, enquanto que os fosfolipídeos estão presentes quase completamente

na camada interna. A porção lipídica do LPS é também conhecida como endotoxina e pode

atuar como veneno, causando febre, diarréia, destruição das células do sangue e um choque

potencialmente fatal.

Figura 5. Envelope gram-negativo e gram-positivo

Diversos grupos bacterianos têm importância e são usualmente utilizados na

indústria de fermentação:

Page 18: Apostila TF

18

Grupo Bacteriano Produto Biosintetizado

Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus casei, Bifidobacterium sp., Streptococus salivarius subsp thermophilus

Leite fermentado, coalhadas, leite acidófilo

Streptococcus salivarius subsp. thermophilus e Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus

Iogurtes

Lactococcus, Leuconostoc, Lactobacillus, Streptococcus salivarius subsp. thermophilus,Propionibacteria, Brevibactéria

Queijos

Streptococcus lactis, S. cremonis, S. paracitrovorus, S. diacetilacts

Manteigas, fragrância de manteiga (S. cremonis)

Acetobacter aceti, A. pasteurianus, A. xylinum, A. schützenbachii e Gluconobacter oxydans

Vinagre, ácido acético

Leuconostoc mesenteroides subsp. mesenbteroides, Lactobacillus plantarum, L. brevis, Pediococus acidilactici, Lactobacillus casei subsp.´casei, Lactobacillus delbruekii subsp. lactis.

Hortaliças e azeitonas fermentadas

Arthrobacter, Acinetobacter Lipídeos, ésteres

Bactérias ácido-láticas Conservação de forragens (silagem)

Neisseria meningitides, Clostridium tetani, Mycobacterium tuberculosis

Produção de vacinas (meningite, tétano, tuberculose)

Bacillus popilliae, B. moritae, B. thuringensis Controle biológico de pragas (inseticida biológico)

Rizhobium Fixação de nitrogênio no solo

Propionibacterium Cianocobalamina (vitamina B12)

Corynebacterium glutami Glutamato monossódico, lisina

Escherichia coli e Bacillus megaterium Penicilina G Acilase

Streptomyces, Bacillus Antibióticos

Xanthomonas campestris Goma Xantana

Agrobacterium radiobacter Polissacarídeos termoestáveis

Leuconostoc mesenteróide Dextrano

Clostridium Butanol, ácido butírico, acetona

Torolopsis mannitofaciens; Candida diddensis Manitol, D-arabitol

Blakeslae trispora beta-caroteno (pigmento)

Pseudomonas spp.; Sporobolomyces odorus; Kluyveromyces lactis; Trichoderma viride

ésteres de ácido graxo (fragrância de frutas); declactona (pêssego), genariol (rosas); 6-pentil-2-pirona (coco)

Os fungos são seres eucarióticos, heterotróficos, que não sintetizam clorofila,

portanto não fazem fotossíntese ou qualquer outro metabolismo autótrofo. Não armazenam

amido como material de reserva e sim glicogênio e não tem celulose na parede celular,

com exceção de alguns fungos aquáticos. Podem ser encontrados no ar, solo, água,

vegetais e animais.

Page 19: Apostila TF

19

Morfologicamente são divididos em bolores e leveduras, embora essa distinção não

tenha valor taxonômico. Pois ambas as formas podem ser encontradas num mesmo grupo

de fungos.

Alguns fungos filamentosos podem ser macroscópicos como é o caso dos

cogumelos comestíveis, compreendidos no grupo dos basidiomicetos. Reproduzem-se

sexuadamente ou assexuadamente. Neste último caso, a reprodução pode ocorrer por

fragmentação da hifa, ou por germinação de esporos. Em conduções favoráveis, o esporo

absorve água, aumenta de tamanho e germina emitindo um tudo germinal. Tais tubos se

alongam por crescimento da extremidade distal e se tornam filamentos longos que se

ramificam (cada filamento é chamado hifa).

Os bolores são constituídos por células multinucleadas que formam tubos chamados

hifas; ao conjunto de hifas dá-se o nome de micélio. As hifas podem ser contínuas ou

septadas. Nas hifas não septadas o protoplasma corre livremente através dos filamentos e

neste caso são chamadas de cenocíticas.

Quando crescidos em meio de cultura sólido, produzem hifas vegetativas, ou

nutritivas, que crescem para o interior do meio de cultura. Podem também produzir hifas

aéreas ou de reprodução, e, neste caso, seu crescimento é perpendicular ao meio. Estas

hifas aéreas podem sustentar estruturas que contém esporos de reprodução, dentre eles os

conidióforos, que contêm externamente, em cadeia, esporos chamados conidiósporos, ou

os esporângióforos, que contêm internamente os esporos chamados esporangiosporos.

Outros tipos de esporos fúngicos conhecidos são os artosporos, decorrentes da

fragemntação de uma hifa, os blastosporos, formados a partir de um brotamento de uma

célula de levedura, os clamidósporos, que possuem parede celular bem mais espessa que a

das células vegetativas, os zigosporos, característicos de zigomicetos, e os ascósporos,

característicos de ascomicetos.

• Micélio Vegetativo: parte que penetra no substrato, digerindo-o e

absorvendo-o;

• Micélio Reprodutivo: responsável pela produção de esporos;

O micélio reprodutivo e seus esporos variam grandemente nas diferentes espécies

de fungos e servem para classifica-los e identificá-los.

Os esporos fúngicos têm uma importância toda especial, pois além de serem as

formas mais freqüentes de reprodução, são os principais veículos de disseminação. A

Page 20: Apostila TF

20

maneira pela qual se formam e se dispõem, constitui elemento importante na identificação,

particular dos bolores.

Figura 6. Bolor em limão galego (A), pão (B), hifas de fungo filamentoso em pão (C) aparato de

reprodução assexuada do Aspergillus Níger (D, E) com conídióforo, fiálides e conídeos

Figura 7. Penicillium notatum em placas com BDA

A

B

C D

A

B

C D

Figura 8. Cogumelos comestíveis (fungos pluricelulares): Letinula edode - Shitake (A), Agaricus blazei -

Cogumelo do Sol (B), Agaricus bisporus – Champignon (C), Pleurotus ostreatus – Shimeji (D)

Page 21: Apostila TF

21

As leveduras são fungos geralmente unicelulares, de forma esférica, elíptica ou

filamentosa e se reproduzem de forma assexuada (por gemulação ou divisão binária) ou

sexuada. O tamanho varia de 1 a 5 µm de diâmetro a 5-30 µm de comprimento. A levedura

mais utilizada nos processos fermentativos industriais é a Sacharomyces cerevisae,

principalmente para produção de álcool e nas panificações.

A B CA B C

Figura 9. Leveduras isoladas em placa com BDA (A), células de levedura em gemulação (B), precipitado

formado com células de levedura

Diversos fungos filamentosos e unicelulares (leveduras) têm importância e são

usualmente utilizados na indústria de fermentação:

Fungo Produto Indústria Aplicação

Penicillium chrysogenum Penicilina G Farmacêutica medicamentos Aspergillus niger Ácido cítrico Alimentos,

Química Acidulante, conservante

Saccharomyces cerevisae Bebidas alcóolicas, etanol, produtos de panificação

Alimentos, Bebidas e Usinas de álcool

Fermentação alcoólica e preparação de panificados

Saccharomyces cerevisae Invertase Alimentos Mel artificial Pencillium roqueforti, P. camemberti Queijos Laticíneos Saborizante, ação

hidrolítica Trichoderma viride 6-pentil-2-pirona

(coco) Alimentos e Química

Aromatizante

Aspergillus Níger, A. oryzae, Mucor rouxi

Amilase Panificação Suplemento de farinha, preparação de massas, alimentos pré-cozidos, elaboração de xaropes

Aspergillus Níger, Mucor spp., Penicillium

Lipase Laticíneos, Química

Sabor ao queijo, produdos de limpesa

Aspergillus Níger, Rhizophus spp., Penicillium

Pectinase Alimentos Clarifcação de vinhos e sucos de frutas

Aspergillus oryzae Protease Cerveja, Alimentos

Impede que a cerveja fique turva ao esfriar, abranda as carnes

Page 22: Apostila TF

22

Os vírus não têm estrutura celular alguma, possui o material genético (DNA ou

RNA) contido por uma camada de proteína. Não possuem atividade metabólica e, portanto,

não sintetizam protoplasma, nem crescem. Em conseqüência disto sua multiplicação não

pode ser feita por um processo de divisão, como nos microrganismos celulares. Novos

vírus são “produzidos” pelas células nas quais penetram, de acordo com as informações

contidas no seu ácido nucléico. São agentes submicroscópicos que infectam as plantas,

animais e vegetais. Os vírus bacterianos (bacteriófagos) infectam os processos de

fermentação de cepas microbianas e causam sérios problemas, particularmente nos cultivos

“starter” utilizados no processamento de alimentos.

Figura 10. Vírus: utilizam a maquinaria celular do hospedeiro para se auto-replicar

Células animais e células também podem ser utilizadas nos processos fermentativos

industriais, principalmente para a produção de antibióticos e hormônios vegetais.

Necessitam de um meio nutritivo e são sensíveis a flutuações de fatores externos como

temperatura, pH, O2 e CO2 dissolvidos.

Os microrganismos têm sido utilizados pelo homem em diferentes processos e de

diferentes maneiras. Muitas substâncias de considerável valor econômico são produtos do

metabolismo microbiano. São empregados desde a produção industrial de materiais

importantes incluindo, químicos finos (farmacêuticos) e aqueles produzidos em grandes

quantidades que serão utilizados como matéria-prima.

Microrganismos que possam ter interesse industrial, podem ser obtidos basicamente

das seguintes formas:

1. Isolado a partir de recursos naturais: microrganismos potencialmente

produtores de compostos de interesse podem ser obtidos a partir de recursos naturais, como

solo, água, plantas, etc. A obtenção de novas linhagens de interesse industrial a partir do

Page 23: Apostila TF

23

meio ambiente, sempre foi uma atividade de grande relevância que pode levar a descoberta

de microrganismos produtores de novas substâncias. É um tipo de atividade que envolve

grande trabalho experimental e custos relativamente elevados.

2. Aquisição a partir de coleções de cultura: atualmente existem diversas coleções

de cultura espalhadas pelo mundo de onde podem ser adquiridas diferentes espécies de

microrganismos. No entanto, é de esperar que o microrganismo utilizado para a produção

de uma dado antibiótico (elevado valor econômico) não estará disponível em coleções de

cultura.

3. Obtenção de mutantes naturais: durante a etapa de proliferação das células de

determinado microrganismo, há sempre uma pequena possibilidade de surgimento de

mutantes naturais, os quais podem ser isolados e ensaiados objetivando a verificação de

sua potencialidade de produção.

4. Obtenção de mutantes induzidos: o surgimento de mutantes naturais de interesse

prático, poderá significar o dispêndio de muito tempo, razão pela qual prefere-se, há várias,

décadas, lançar mão de métodos que forcem o aparecimento de células mutadas, como é o

caso de submeter suspensões de células ou esporos a radiações ultravioleta ou a

substâncias químicas mutagênicas, como a nitrosoguanidina. Ao se permitir essa exposição

ou contato, ocorre uma drástica destruição da maioria das células, recuperando-se, a seguir,

aquelas que sobreviveram, verificando-se se mutaram na direção desejada. Essa é uma

técnica aleatória, tratando-se de recuperar as células sobreviventes em meios ou condições

específicas, de forma a dirigir este isolamento para as células que se pretende.

5. Obtenção de microrganismos recombinantes por técnicas de engenharia

genética: nas últimas décadas, as técnicas de engenharia genética, também designadas por

técnicas ou tecnologia de DNA recombinante, trouxeram um imenso avanço nas

possibilidades de se obter células mais produtivas, ou células produtora de substâncias que

normalmente não produzem.

A introdução de fragmentos de DNA de certas células em outras, via vetores como

os plasmídeos, permite a obtenção de células alteradas geneticamente, porém de forma

muito mais dirigida do que as metodologias acima mencionadas. Tais modificações podem

ser executadas não apenas com microrganismos, mas também com células animais e

vegetais.

Page 24: Apostila TF

24

2. METABOLISMO MICROBIANO

Os organismos vivos realizam inúmeras reações químicas utilizando-se de

compostos orgânicos e inorgânicos oriundos da natureza com a finalidade primordial de

produção de energia para realizar trabalho. Desta forma, pode-se definir metabolismo

como o somatório de todas essas reações químicas celulares, sendo o metabolismo como

fonte de obtenção de energia a chave para a manutenção da vida. O metabolismo é a soma

dos processos anabólicos (anabolismo), também conhecidos como processos sintéticos

(síntese de substâncias e material celular), e os processos catabólicos (catabolismo), estes

os grandes responsáveis pela geração de energia obtida através da quebra de moléculas

doadoras de energia, como por exemplo, a metabolização de carboidratos

(monossacarídeos, dissacarídeos ou polissacarídeos).

Os microrganismos podem ser classificados de acordo com a forma como obtêm

energia. Podem ser classificados como Quimiotróficos (aqueles que obtêm sua energia a

partir de um combustível químico, ou seja, a partir de uma molécula orgânica ou de uma

molécula inorgânica) ou como Fotolitotróficos (aqueles que usam a luz solar como sua

principal fonte de energia).

Certos organismos podem sintetizar algumas ou todas as suas subunidades

monoméricas, os intermediários metabólicos, e macromoléculas a partir de materiais

iniciais muito simples, tais como o CO2 e NH3; estes são os Autotróficos. Outros devem

adquirir alguns dos seus nutrientes pré-formados do seu ambiente (por organismos

autotróficos, por exemplo); estes são os Heterotróficos.

Figura 11. Principais tipos de metabolismos capazes de fornecer e captar energia

Os microrganismos podem obter energia a partir dos açucares (principalmente a

glicose) através do metabolismo anaeróbico (glicólise e fermentação) e/ou do metabolismo

Page 25: Apostila TF

25

aeróbico (respiração), no qual teremos a oxidação completa do açúcar através do Ciclo de

Krebs (Ciclo do ácido tricarboxílico), envolvendo ainda o transporte de elétrons e

fosforilação oxidativa.

Figura 12. Os três destinos catabólicos possíveis do piruvato formado na fase de pagamento da glicólise.

Adenosina tri-fosfato, ou simplesmente ATP, é um instrumento bioquímico

responsável pelo armazenamento de energia em suas ligações químicas e é encontrado

universalmente nos sistemas vivos.

Moléculas nutrientes, como todas as moléculas contêm energia associada com os

elétrons que formam as ligações entre seus átomos. Quando esta energia esta distribuída

por toda molécula, é difícil para a célula utilizá-la. Varias reações de vias catabólicas,

contudo concentram a energia dentro das ligações do ATP, que serve como um

conveniente transportador de energia. ATP é normalmente referido como tendo ligações de

“alta energia”. Atualmente um melhor termo seja provavelmente “ligações instáveis”.

Embora a quantidade de energia nessas ligações não seja excepcionalmente grande, ela

pode ser liberada rápida e facilmente.

É constituída por adenosina, uma base nitrogenada, associada a três radicais fosfato

conectados em cadeia. Sua função essencial é armazenar energia nas ligações entre os

fosfatos.

O ATP armazena energia proveniente da respiração celular e da fotossíntese (no

caso das plantas), para consumo posterior.

Page 26: Apostila TF

26

A molécula atua como uma moeda celular, ou seja, é uma forma conveniente de

transportar e armazenar energia.

Esta energia pode ser utilizada em diversos processos biológicos, tais como o

transporte ativo de moléculas, síntese e secreção de substâncias, locomoção e divisão

celular, entre outros. Para estocagem a longo prazo, a energia pode ser transferida para

carboidratos e lipídios.

As principais formas de produção do ATP são a fosforilação oxidativa (respiração)

e a fotofosforilação (plantas). Um radical fosfato inorgânico (Pi) é adicionado a uma

molécula de ADP, utilizando energia proveniente da decomposição da glicose (na

fosforilação oxidativa) ou da luz (na fotofosforilação).

Existem enzimas especializadas no rompimento desta mesma ligação, liberando

fosfato e conseqüentemente energia, usada nos processos celulares, gerando novamente

moléculas de ADP. Em certas ocasiões, o ATP é degradado até sua forma mais simples, o

AMP (adenosina mono-fosfato), liberando dois fosfatos e uma quantidade maior de

energia.

A reação que transforma o ATP em energia pode ser resumida da seguinte forma:

• Quimicamente, o ATP é um nucleotídeo de adenina cercado por três fosfatos;

• Há muita energia armazenada na ligação entre o segundo e o terceiro grupo de

fosfato que pode ser usada para alimentar as reações químicas;

• Quando uma célula precisa de energia, ela quebra essa ligação para produzir

difosfato de adenosina (ADP) e uma molécula livre de fosfato;

• Em alguns casos, o segundo grupo de fosfato também pode ser quebrado para

produzir monofosfato de adenosina (AMP);

• Quando uma célula tem excesso de energia, ela armazena esta energia produzindo

ATP a partir de ADP e fosfato.

Figura 13. Molécula de ATP

Page 27: Apostila TF

27

2.1 Metabolismo Anaeróbico

2.1.1 Glicólise (Via de Embden-Meyerhof-Parnas)

A glicólise é um dos processos mais antigos, na escala evolutiva. É a via catabólica

de maior utilização pela maioria dos organismos capazes de gerar o seu próprio alimento,

como os que utilizam fontes externas prontas visando à obtenção de energia sob a forma de

ATP, é a glicólise. Esta via é de extrema importância, pois é realizada tanto por

microrganismos aeróbicos como por anaeróbios em virtude de não requerer a presença do

oxigênio, e, por isso, ser conhecida como a fase anaeróbica da via glicolítica.

A via completa de utilização da glicose é composta de 10 reações catalisadas por

enzimas e fornece um saldo positivo de duas moléculas de ATP e duas moléculas de

NADH para cada molécula de glicose oxidada. Apesar de a glicose ser a principal fonte de

energia de alguns microrganismos, outros açúcares como lactose, galactose etc., também

podem ser utilizados devido à presença de enzimas específicas capazes de transformar

estes açúcares em um intermediário da via glicolítica. Desta forma, o açúcar também é

metabolizado até ácido pirúvico e, consequentemente, metabolizado aerobicamente ou

fermentado.

A glicose tem seis átomos de carbono (hexose) e sua divisão em duas moléculas de

piruvato, cada uma com três átomos de carbonos (triose), ocorre em uma seqüência de 10

passos e os cinco primeiros deles constituem a fase preparatória.

A glicose é inicialmente fosforilada no grupo hidroxila do C-6 (passo 1) à custa de

ATP. Esta reação é uma forma de aprisionamento” intracelular do açúcar nas células, cujas

membranas são impermeáveis á hexose fosforilada.

(passo 1)

A D-glicose-6-fosfato formada é convertida a D-frutose-6-fosfato (passo 2), a qual

é novamente fosforilada, desta vez no carbono 1, para liberar D-frutose-1,6-bifosfato

(passo 3). O ATP é o doador de fosfato nas duas fosforilações.

Page 28: Apostila TF

28

(passo 2)

(passo 3)

A seguir a frutose-1-6-bifosfato é quebrada para liberar duas moléculas com três

carbonos, a diidroxicetona fosfato e o gliceraldeído 3-fosfato (passo 4). A diidroxicetona

fosfato é isomerizada em uma segunda molécula de gliceraldeído-3-fosfato (passo 5) e com

isso termina a primeira parte da glicólise.

(passo 4 e 5)

Duas moléculas de ATP precisam ser investidas para ativar, ou iniciar, a molécula

de glicose para a sua quebra em duas partes com três carbonos; haverá depois um retorno

positivo para este investimento. Resumindo: na fase preparatória da glicólise a energia do

ATP é investida, aumentando o conteúdo de energia livre dos intermediários, e as cadeias

carbônicas de todas as hexoses metabolizadas são convertidas em um produto comum, o

gliceraldeído-3-fosfato.

Page 29: Apostila TF

29

O ganho energético provém da fase de pagamento da glicólise. Cada molécula de

gliceraldeído-3-fosfato é oxidada (por transferência de elétrons ao NAD+) e fosforilada por

fosfato inorgânico (não pelo ATP) para formar 1,3-bifosfoglicerato (passo 6).

(passo 6)

A liberação de energia ocorre quando as duas moléculas de 1,3-bifosfoglicerato são

convertidas em duas moléculas de piruvato (passos 7 a 10). A maior parte dessa energia é

conservada pela fosforilação acoplada de quatro moléculas de ADP pata ATP. O produto

líquido são duas moléculas de ATP por molécula de glicose empregada, uma que duas

moléculas de ATP são investidas na fase preparatória da glicólise. A energia também é

conservada na fase de pagamento na formação de duas moléculas de NADH por molécula

de glicose.

(passo 7)

(passos 8,9 e 10)

Nas reações seqüenciais da glicólise três tipos de transformações químicas são

particularmente notáveis: 1. degradação do esqueleto carbônico da glicose para produzir

piruvato; 2. fosforilação de ADP a ATP pelos compostos de fosfato de alta energia

formados durante a glicólise e 3. a transfrência de átomos de hidrogênio ou elétrons para o

NAD+, formando NADH. O destino do produto, o piruvato, dependo do tipo de célula e

das circunst6ancias metabólicas.

Destinos do piruvato – o piruvato formado pela glicólise pode tomar três rotas

catabólicas alternativas. Nos organismos aeróbicos, a glicólise constitui apenas o primeiro

Page 30: Apostila TF

30

estágio da degradação completa da glicose. O piruvato é oxidado, com perda do seu grupo

carboxila como CO2, para liberar o grupo acetila da acetil-coenzima A, a qual é então

totalmente oxidada a CO2 pelo ciclo do ácido cítrico. Os elétrons originados dessas

oxidações são passados para o O2 através de uma cadeia de transportadores na mitocôndria

(cadeia de transporte de elétrons), formando H2O. A energia liberada nas reações de

transferência de elétrons permite a síntese de ATP nas mitocôndrias.

A segunda rota para o metabolismo do piruvato é a sua redução a lactato através da

chamada via da fermentação do ácido lático. Quando um tecido precisa funcionar

anaerobicamente, como o tecido muscular esquelético em contração vigorosa, o piruvato

não pode ser oxidado por falta de oxigênio. Nestas condições o piruvato é reduzido a

lactato. O lactato (a forma dissociada do ácido láctico) é também formado sob condições

anaeróbicas nos microrganismos que realizam a fermentação láctica (figura 3).

A terceira rota para o metabolismo do piruvato leva ao etanol. Em alguns

microrganismos como a leveduras cervejeiras (alcoólicas), o piruvato é convertido

anaerobicamente em etanol e CO2, um processo chamado de fermentação alcoólica (figura

3).

É importante salientar que o piruvato pode ter outros destinos, embora anabólicos.

Ele pode, por exemplo, fornecer o esqueleto carbônico para a síntese do aminoácido

alanina.

2.2 Fermentação

Após a glicose ter sido quebrada a ácido pirúvico, este pode ser completamente

degradada na respiração, ou pode ser convertido a um produto orgânico na fermentação.

Os microrganismos capazes de se desenvolver em ausência de oxigênio e de qualquer

outro aceptor final de elétrons exógeno conseguem oxidar substratos através de um

processo denominado fermentação. Neste processo, a oxidação do substrato é

acompanhada da redução de coenzimas, como na oxidação aeróbica. A falta de aceptor

final de elétrons impede, entretanto, que a reoxidação destas coenzimas possa ser feita pela

cadeia de transporte de elétrons. Esta oxidação é, então, obtida pela transferência dos

elétrons das coenzimas reduzidas diretamente para um composto orgânico, originado pela

própria via de oxidação do substrato. O composto reduzido resultante geralmente é

eliminado para o meio externo. Este processo de reoxidação de coenzimas acarreta

conseqüências importantes no processo de obtenção de energia:

Page 31: Apostila TF

31

a) a oxidação do substrato inicial é incompleta e os produtos finais da fermentação,

excretados no meio, são moléculas orgânicas apenas parcialmente oxidadas.

Podem, portanto, ser utilizadas como substrato oxidável por outros organismos;

b) não havendo cadeia de transporte de elétrons, não há fosforilação oxidativa e a

produção de ATP fica restrita às reações de fosforilacão a nível de substrato. O

rendimento energético da fermentação é, portanto, muito menor do que o da

oxidação aeróbica. O baixo rendimento energético da fermentação é revelado pela

baixa velocidade de crescimento apresentada pelos microrganismos fermentativos

que, via de regra, desenvolvem-se muito mais lentamente do que bactérias

crescendo em aerobiose.

Resumindo a fermentação:

1. Libera energia de açúcares ou moléculas orgânicas, tais como aminoácidos, ácidos

orgânicos, purina e pirimidina.

2. Não requer oxigênio (mas algumas vezes pode ocorre na presença deste)

3. Não requer o uso do ciclo de Krebs ou uma cadeia transportadora de elétrons.

4. Utiliza uma molécula orgânica como aceptor final de elétrons.

5. Produz somente pequenas quantidades de ATP (somente uma ou duas molécula de ATP

para cada molécula de material inicial)

6. Devido ao fato de grandes quantidades de energia original da glicose permanecer nas

ligações químicas dos produtos finais (Etanol ou Ác. lático).

2.2.1 Fermentação de Carboidratos

Embora outros compostos possam ser utilizados para as fermentações, os açúcares

são, de longe, os substratos mais freqüentes deste processo. Na fermentação de açúcares, a

degradação do substrato é normalmente realizada pela via glicolítica, com a produção de

piruvato. Esta seqüência de reações inclui uma reação de oxidoredução, a conversão de

gliceraldeído 3-fosfato a 1,3 bifosfoglicerato, com a produção de NADH. Na conversão de

uma molécula de glicose a duas de piruvato são, portanto produzidas duas moléculas de

NADH. Estas coenzimas reduzidas são oxidadas por transferência de seus elétrons para o

piruvato, ou para compostos dele derivados. Os compostos resultantes (lactato, etanol,

formiato, etc.) caracterizam cada tipo de fermentação e podem ser usados para a

identificação de microrganismos.

Page 32: Apostila TF

32

Existem vários tipos de fermentação, e estas diferenças são conhecidas pelo nome

do produto final da via, a saber:

1. Fementação lática: o ácido pirúvico é convertido exclusivamente em ácido lático,

utilizando-se dos elétrons fornecidos pela molécula de NADH. A oxidação do

NADH é obtida por transferência de seus elétrons diretamente para o piruvato, com

produção de lactato. Existem dois tipos de fermentação lática. Na primeira, ocorre a

formação apenas de lactato como produto final e é designada como homolática. Na

segunda, além do lactato é produzido etanol e CO2.

2. Fermentação alcoólica: o ácido pirúvico é convertido em gás carbônico e

acetaldeído, sendo este último reduzido a álcool etílico, também usando a molécula

de NADH. O NADH é oxidado pela redução do acetaldeído, formado pela

descarboxilação do piruvato.

Figura 13. Fermentação de alguns dissacarídeos

Page 33: Apostila TF

33

2.3 Vias Alternativas de Utilização da Glicose

Além do processo da glicólise, podemos encontrar em muitos microrganismos

outros tipos de rações oxidativas para a utilização da glicose. A via alternativa mais

comum é via das pentoses, que pode funcionar concomitantemente com a via glicolítica.

Esta via é importante, pois proporciona a quebra não somente de açucares de seis carbonos

(hexoses como a glicose), mas também de cinco carbonos (pentoses – por isso denominada

via das pentoses), e também por gerar a produção de pentoses importantes que poderão ser

utilizadas posteriormente na síntese de ácidos nucléicos.

Outra via também conhecida é a via Etner-Doudoroff. Os microrganismos que

possuem o aparato enzimático para realização desta via também são capazes de

metabolizar a glicose até a formação de duas moléculas de NADPH e uma molécula de

ATP sem, entretanto, passar por todas as etapas da via glicolítica.

2.4 Metabolismo Aeróbico (Respiração Celular)

A grande maioria dos microrganismos ditos aeróbicos é capaz de obter energia pela

fase anaeróbica da glicólise, entretanto muitos deles utilizam esta via como um mecanismo

preparatório para um outro processo que, no final, será mais produtivo e rentável quando

relacionamos a quantidade de moléculas de ATP geradas e, consequentemente, um

aproveitamento maior da molécula doadora de energia como a glicose, por exemplo.

Este processo é chamado de respiração aeróbica ou respiração celular devido à

presença e participação da molécula de oxigênio molecular (O2). A respiração celular

ocorre com a utilização do composto intermediário gerado na etapa anaeróbica da

metabolização da glicose (piruvato) por meio de dois processos metabólicos adicionais: o

ciclo de Krebs e Cadeia de transporte de elétrons – fosforilação oxidativa.

2.4.1 Ciclo de Krebs

O ciclo de Krebs (denominação que homenageia seu descobridor, o bioquímico

alemão Hans Krebs), ou ciclo dos ácidos tricarboxílicos, é formado por uma série de

reações que se iniciam com a entrada de acetil-CoA no ciclo. Esta acetil-CoA é originada

Page 34: Apostila TF

34

da descarboxilação do ácido pirúvico, formando acetil, que reage então com a coenzima A

(CoA), formando o intermediário que será utilizado no ciclo de Krebs.

Nas células procarióticas, essas reações acontecem no citosol, enquanto nas cálulas

eucarióticas as mesmas reações acontecem no interior da mitocôndria, mais

especificamente na matriz mitocondrial.

A molécula de acetil-CoA entra no ciclo de Krebs reagindo com o oxalacetato,

formado citrato. A partir de então, uma série de reações ocorre, envolvendo

descarboxilações e reações de oxidoredução, até que, finalmente, uma nova molécula de

oxalacetato é formada reiniciando o ciclo. A grande contribuição deste ciclo para o

processo de respiração é que cada volta completa do ciclo teremos a formação de grande

potencial energético através da geração de moléculas de NADH, FADH2 e GTP.

O ciclo de Krebs é uma via que promove a oxidação completa dos átomos de

carbono presentes na acetil-CoA. Neste ciclo, portanto, processa-se a oxidação final dos

átomos de carbono originalmente presentes na glicose a CO2.

A oxidação de um mol de acetil-CoA está associada à produção de três moles de

NADH e de um mol de FADH2. Também estas coenzimas serão oxidadas pela cadeia de

transporte de elétrons; desta oxidação deriva a formação de quantidades apreciáveis de

ATP. A molécula de GTP pode facilmente trasferir seu grupo fosfato terminal para o ADP,

resultando, portanto na formação de ATP.

A redução de coenzimas, com posterior produção de ATP, não é a única função do

ciclo de Krebs; vários compostos intermediários do ciclo podem ser utilizados como

precursores em vias biossintéticas.

Page 35: Apostila TF

35

Figura 14. Reações do ciclo de Krebs (ciclo dos ácidos tricarboxílicos)

2.4.2 Cadeia de Transporte de Elétrons e Fosforilação Oxidativa

Em sentido figurado, poderíamos comparar a cadeia de transporte de elétrons e

fosforilação oxidativa a pequenas quedas-d`água colocadas em série, em que a água,

caindo de um ponto mais alto até chegar ao seu ponto mais baixo, perderia “força”, a qual,

sob a forma de energia liberada, poderia gerar trabalho como, por exemplo a rotação de

uma moinho.

Na verdade. É exatamente isso que acontece nesses processos, ou seja, a cadeia

transportadora (também conhecida como cadeia respiratória) é composta por uma série de

enzimas-proteínas (moléculas transportadoras) que são capazes de realizar reações de

oxirredução.

Existem três classes de moléculas capazes de realizar transporte as quais estão

presentes na cadeia transportadora de elétrons: flavonóides (como a riboflavina ou

vitamina B2), citocromos e ubiquinonas ou coenzima Q.

Os elétrons carregados pelas coenzimas NADH e FADH2 (provenientes da via

glicolítica e do ciclo de Krebs), ao entrarem na cadeia transportadora, vão gradativamente

liberando energia ao passarem de um nível de maior energia para um de menor energia.

Page 36: Apostila TF

36

Esta energia liberada é então utilizada para a síntese de ATP a partir da junção de ADP +

Pi (fosforilação oxidativa) pela enzima ATP-sintase. Como aceptor de elétrons temos o

oxigênio molecular, que se torna reduzido formando água; portanto, todo o processo é dito

aeróbico.

A respiração aeróbica, em células eucarióticas, é um processo altamente rentável,

pois a metabolização completa de uma molécula de glicose seria capaz de gerar um ganho

final de 38 moléculas de ATP, enquanto no processo fermentativo, teríamos a produção de

apenas 2 moléculas de ATP, já que grande parte de energia original da molécula de açúcar

permanece nas ligações químicas dos produtos orgânicos finais como o ácido lático ou o

etanol.

Figura 15. Esquematização do transporte de elétrons na cadeia respiratória e geração da molécula de ATP.

Na membrana mitocondrial interna, após a passagem dos elétrons pelos complexos da cadeia respiratória, os

prótons são bombardeados para fora da matriz mitocondrial e retornam a ela, através de canais nas ATP-

sintases (F1F0), gerando energia para que ocorra a fosforilação do ADP, produzindo ATP (teoria

quimiosmótica)

3. NUTRIÇÃO MICROBIANA

Os microrganismos como todos os seres vivos necessitam de nutrientes para a sua

sobrevivência e desenvolvimento. Entretanto são bastante versáteis e diversificados,

enquanto alguns necessitam de compostos orgânicos complexos, minerais e vitaminas,

outros podem crescer em condições nutricionalmente pobres.

Os microrganismos necessitam de fontes de energia, material plástico e água.

Page 37: Apostila TF

37

Fonte de Energia:

Os fungos e a grande maioria das bactérias são “quimiotróficos”, obtendo energia

as custas de reações químicas, a partir da oxidação de compostos orgânicos

(organotróficos) ou compostos inorgânicos (litotróficos).

No grupo dos microrganismos litotróficos encontramos somente bactérias. Um

exemplo bastante relevante são as bactérias do gênero Thiobacillus que são capazes de

oxidar enxofre produzindo ácido sulfúrico.

No grupo dos microrganismos organotróficos encontramos os fungos, além de um

grande número de bactérias.

Fonte de Material Plástico:

Alguns elementos como o carbono, o hidrogênio, o oxigênio, o nitrogênio, o

enxofre e o fósforo são de grande importância para a renovação e multiplicação das

células.

Fonte de Carbono:

O carbono é um dos elementos químicos mais importantes e necessário para o

crescimento microbiano. Ele constitui o esqueleto das três classes de nutrientes orgânicos:

carboidratos, lipídeos e proteínas. De maneira geral os microrganismos apresentam em

torno de 50 % de carbono em sua massa celular.

Organismos autótrofos: CO2 (única fonte de carbono) ou o íon bicarbonato, a partir

dos quais conseguem sintetizar todos os compostos orgânicos que precisam.

Organismos heterótrofos: Exigem fontes orgânicas de energia.

Fonte de Nitrogênio:

O nitrogênio é um elemento essencial na constituição dos aminoácidos (proteínas).

Obs. As bactérias são particularmente versáteis com relação à utilização de nitrogênio.

� Grande parte dos microrganismos (bactérias, fungos, algas) utilizam compostos

inorgânicos de nitrogênio (sais inorgânicos, nitratos, nitritos). Ex.: bactérias dos

gêneros Azobacter, Rhizobium (simbiose com plantas leguminosas);

� Bactérias fixadoras de nitrogênio utilizam o N2 atmosférico e os converte em

nitrogênio orgânico (aminoácidos e proteínas);

Page 38: Apostila TF

38

� Alguns fungos e bactérias exigem fontes orgânicas de nitrogênio (nº variado de

aminoácidos);

Fontes de Minerais:

Os microrganismos exigem uma série de outros elementos seja em quantidades

apreciáveis (macronutrientes) ou em quantidades traços (micronutrientes).

� P: Fósforo na forma de fosfato (Metabolismo energético e na síntese de ácidos

nucléicos);

� S: Importante por fazer parte da molécula de alguns aminoácidos (cistina e cisteína)

e para a síntese de vitaminas (biotina e tiamina);

� K: ativador de enzimas e regulador da pressão osmótica;

� Mg: ativador de enzimas;

� Ferro: Fe++ requerido por enzimas catalases, succnil desidrogenase;

� Micronutrientes: Cu, Co, Zn, Mn, Na, etc.

Fatores de Crescimento:

Para diversos microrganismos é necessário incorporar determinados

micronutrientes e fatores de crescimento, como aminoácidos e vitaminas, que não podem

ser sintetizados pelos microrganismos e são indispensáveis uma vez que são constituintes

ou precursores de enzimas.

Ex. Vitaminas (especialmente do complexo B), aminoácidos, ac.graxos e nucleotídeos.

H20:

Indispensável para o crescimento dos microrganismos. Tem papel importante na

dissolução dos nutrientes que passarão através da membrana citoplasmática.

• Regulação da pressão osmótica;

• Regulação térmica;

3.1 Matérias-primas para Composição de Meios Fermentativos Industriais

Praticamente quaisquer produtos naturais de natureza orgânica, basicamente

produtos ou subprodutos da agricultura e do processamento de vegetais, podem constituir a

base ou substrato para processos fermentativos. Por isso, as indústrias de fermentação

muitas vezes são citadas como exemplos de quimurgia, ou seja, a aplicação da química no

uso mais eficiente dos recursos biológicos e sua conseqüente recompensa econômica.

Page 39: Apostila TF

39

A escolha de determinada matéria-prima depende, entre outros fatores, da natureza

do microrganismo e portanto do seu metabolismo.

Dada à importância dos carboidratos no metabolismo de qualquer célula viva, é

comum eles constituírem as principais matérias-primas de fermentações. Entretanto é

preciso estar presentes compostos nitrogenados, sob a forma de proteínas, aminoácidos,

sais amoniacais, fatores de crescimento como vitaminas e coenzimas, elementos traços.

Geralmente são os açúcares que determinam o maior ou menor rendimento da

matéria-prima, uma vez que na maioria das fermentações, industriais ou não, são eles que

se transformam nos diferentes produtos almejados; e mesmo porque as vias metabólicas

básicas dos microrganismos utilizados são as vias glicolítica e das pentoses.

As matérias-primas para os processos fermentativos podem ser agrupadas de acordo

com a facilidade com que as células dos agentes fermentativos têm acesso aos

carboidratos. Em outras palavras, se estes são prontamente fermentáveis, como os

carboidratos energéticos, ou se necessitam primeiramente ser liberados os cindidos,

hidrolisados, como os carboidratos de reserva (amido) ou de estrutura (celulose,

hemicelulose).

Assim a seguinte classificação é possível:

� Matérias-primas ricas em hexoses simples e dissacarídeos: as primeiras são

prontamente fermentáveis por bactérias e fungos; as segundas, se o agente

fermentativo possuir a enzima respectiva. São caldos e sucos de frutas e os grãos de

cereais, desde que maltados, contendo glicose, frutose, manose, galactose e

maltose, conforme a composição do carboidrato do produto natural.

� Matéria-primas sacarídicas: como os caldos resultantes da extração da cana-de-

açúcar, da beterraba açucareira e do sorgo sacarínico, todas ricas em sacarose,

prontamente fermentável por microrganismos, desde que possuam a enzima

sacarase ou invertase, como é o caso das leveduras. Matéria-prima sacarídica

sumamente importante é o melaço, subproduto da indústria açucareira, onde

também é conhecido como “mel final”. É o resíduo da cristalização do açúcar.

� Matérias-primas amiláceas: O amido é, depois da celulose, o carboidrato mais

encontrado na natureza. Os cereais como milho, arroz, cevada e outros, os farelos,

bem como os tubérculos (batata, mandioca, batata doce) são as principais fontes de

amido.

Page 40: Apostila TF

40

A maioria dos microrganismos não possui o sistema enzimático que cinde o amido,

condição necessária para seu aproveitamento biológico, dada a sua constituição

macromolecular. Entretanto aqueles que elaboram amilases, podem crescer em meio

amiláceo, já que as enzimas hidrolisam o amido a dextrinas, maltose e glicose, conforme o

caso. Isso se dá com muitas espécies de fungos dos gêneros Aspergillus, Rhizopus e Mucor

e com as bactérias Bacillus subtilis.

A hidrólise é também denominada sacarificação – no sentido de adoçamento. No

caso da hidrólise do amido tem-se maltose e glicose formadas, de sabor doce, ausente no

amido original.

A hidrólise de amiláceos pode ser obtida por via enzimática, ou por via química,

pela ação de ácidos.

� Subprodutos e resíduos:

d1) Leitelho: soro resultante da fabricação de manteiga e queijos em usinas de leite.

Apresentam razoável teor de lactose (2,5%).

d2) Materiais celulósicos e hemicelulósicos: resíduos agrícolas e da

industrialização de vegetais são constituídos fundamentalmente por material celulósico,

biologicamente sempre associado a hemicelulose. Entre estes resíduos encontram-se, as

cascas, fibras, palhas (arroz, mulho, sorgo, etc.) , caroços, sabugos, resíduos de madeira.

d3) Lixívias sulfitadas (liquor sulfitado): efluentes das fábricas de papel que

empregam o processo “sulfito” contendo proporções variadas de hexoses e pentoses. Os

açúcares encontrados nas lixívias são a xilose, arabinose, manose, frutose, glicose,

galactose. Os açúcares constituem cerca de 20 % do teor de soldos totais nas lixívias.

d4) Melaço: subproduto da fabricação do açúcar

4. CULTIVO MICROBIANO

Nos ambientes naturais os microrganismos se encontram, quase sempre, sob forma

de populações mistas. Portanto, para que seja possível estudar as características das

espécies que compõem estas misturas, é necessário fazer seu isolamento em cultura pura.

Para isso, é necessário um meio de cultura e de condições de incubação que facilitem o

crescimento do microrganismo desejado.

Page 41: Apostila TF

41

Todos os microrganismos necessitam de uma fonte de energia para seu

crescimento, que pode ser química (seres quimiotróficos) ou luminosa (seres fototróficos).

Além disso, os fatores necessários para o crescimento microbiano podem ser divididos em

duas categorias principais: os fatores físicos: temperatura, pH, pressão osmótica, e os

fatores químicos: Água e as diferentes fontes de carbono (C), de nitrogênio (N), de fósforo

(P), de enxofre (S) e de sais minerais, além de fatores de crescimento para os

microrganismos mais exigentes.

Em laboratório o crescimento de microrganismos é conseguido pela semeadura dos

mesmos em meios de cultura, cuja composição deve atender as necessidades e exigências

do microrganismo. O meio de cultura consiste em um material nutritivo, preparado em

laboratório, que se destina ao cultivo artificial dos microrganismos, devendo, portanto,

fornecer os nutrientes indispensáveis ao seu crescimento. O meio de cultivo pode ser

líquido, sólido ou semi-sólido.

Os meios líquidos consistem de misturas de ingredientes em água purificada

(destilada, deionizada) e podem ser acondicionados em tubos de vidro, em Erlenmeyers ou

em balões. Geralmente os microrganismos tem grande facilidade de desenvolvimento em

meio líquido, entretanto quando há mais de um tipo de microrganismo no material

semeado, se terá um crescimento misto de células, não sendo possível o adequado

aproveitamento de sua atividade ou reconhecimento de suas características.

Para que suas características sejam reconhecidas ou para que a sua atividade possa

ser aproveitada, ele deve se encontrar em “cultura pura”.

Para separá-los de um material ou cultura líquida, há necessidade de semeá-los na

superfície de um meio sólido. Os microrganismos devem ser corretamente diluídos e

espalhados na superfície do meio de modo a formar colônias de organismos iguais,

separadas umas das outras. Estas colônias isoladas são facilmente transferidas para um

novo meio, onde crescerão em “cultura pura”.

Os meios sólidos são acrescidos de um agente solidificante, o ágar, normalmente na

concentração de 1-2 %. Este consiste em um polímero, o ácido poligalacturônico, extraídos

de algas marinhas; é capaz de fundir a cerca de 100 ºC e solidifica-se em torno de 40 ºC.

Comumente é acondicionado em tudo de vidro na forma de ágar inclinado, ou em placas de

Petri. Já os meios semi-sólidos contêm ágar em concentrações menores, em torno de 0,3-

0,5 %, e normalmente são distribuídos em tubos de vidro na posição vertical.

Em função da grande variedade de microrganismos e, portanto de tipos nutritivos,

não existe um meio de cultura universal.

Page 42: Apostila TF

42

Algumas vezes o que é exigido para um determinado microrganismo pode

desfavorecer o crescimento de outro, ou até mesmo inibir completamente seu

desenvolvimento. Portanto para a formulação de um meio de cultivo é importante conhecer

a fisiologia do microrganismo.

4.1 Meios Sintéticos e Meios Complexos

Para se determinar as necessidades nutricionais de um microrganismo são utilizados

meios quimicamente definidos (sintéticos), ou seja, se conhece a composição exata de

tais meios. Meios de cultura mínimos ou basais são meios onde somente são fornecidos

elementos químicos necessários ao microrganismo, na forma de moléculas ou formas

iônicas simples. Nesses meios são encontrados uma única fonte de carbono (geralmente

glicose), de nitrogênio (saís de amônio ou nitratos), de fósforo, etc. e não são detectados

fatores de crescimento, aminioácidos ou ácidos nucléicos.

Existem basicamente dois grandes grupos de meios de cultura: os meios sintéticos e

os meios complexos.

Meio Sintético: Dependendo do tipo de microrganismos que será cultivado, o meio

de cultura poderá ser sintético, também chamado de quimicamente definido. A sua

composição química é conhecida qualitativamente e quantitativamente

Ex.: meio Caldo de Glicose-Sais Minerais, que é um meio que contém o mínimo de

ingredientes necessários ao desenvolvimento de microrganismo.

Meio sintético simples (quimicamente definido), de caldo de glicose-sais

minerais, para crescimento de bactérias quimioeterotróficas.

Ingredientes Quantidade Glicose 5,0 g NaNO3 1,0 g K2HPO4 2,0 g MgSO4.7H20 1,0 g NaCl 0,5 g Água, q.s.p 1.000 mL

Meio Complexo: Sua composição química não é perfeitamente conhecida. Pode

conter ingredientes, complexos como extrato de carne, rico em vitaminas e outros fatores

de crescimento orgânicos, e cuja composição química exata não é conhecida. Além do

extrato de carne, que compreende um pó, obtido da digestão de carne bovina, vários outros

Page 43: Apostila TF

43

extratos também são utilizados nos meios de cultura complexos (extrato de levedura,

extrato de malte, peptona).

Em geral os meios complexos são adequados ao crescimento de microrganismos

heterotróficos auxotróficos, como, por exemplo, algumas bactérias patogênicas. A grande

vantagem dos meios complexos é que a adição de um único ingrediente já garante a

presença de uma ampla variedade de substâncias necessárias ao crescimento do

microrganismo.

Meio complexo de caldo nutriente, para o cultivo de bactérias heterotróficas.

Ingredientes Quantidade Peptona 5,0 g Extrato de carne 3,0 g NaCl 8,0 g Água, q.s.p 1.000 mL

Meio complexo Glicose, extrato de levedura e sais minerais.

Ingredientes Quantidade Glicose 2,0 g K2HPO4 0,5 g MgSO4.7H20 0,5 g CaCl2 0,01 g Extrato de levedura* 0,2 g Água, q.s.p 1.000 mL

No caso de microrganismos mais exigentes, pode ser acrescido no meio substâncias

nutricionalmente ricas como, por exemplo, extrato de levedura que fornece uma grande

variedade de aminoácidos e vitaminas.

OBS: na prática, a maioria dos meios utilizados é do tipo complexo, podendo ser

utilizadas as mais diversas substâncias como peptonas, extrato de carne, extratos de

animais (ex: BHI e extrato de sangue).

Existem meios de cultura que são usados para o isolamento ou diferenciação dos

microrganismos, ou seja, meios com finalidades especiais:

Meios Seletivos: São utilizados para o isolamento de um grupo particular de

microrganismos. Permitem o crescimento de determinados microrganismos e impedem o

crescimento de outros que também estão na amostra. Nestes meios são adicionados

substâncias químicas que irão propiciar o desenvolvimento dos microrganismos de

interesse e vão inibir o desenvolvimento dos microrganismos acompanhantes (“microbiota

de acompanhamento”). Esta inibição pode ser feita com diferentes substâncias, tais como

Page 44: Apostila TF

44

antibióticos, os corantes, a bile ou os sais biliares. Um meio adicionado do antibacteriano

estreptomicina possibilitará o isolamento de fungos, da mesma forma que a adição do

antifúngico cicloheximida ao meio permitirá o isolamento de bactérias.

Além do uso de antibacterianos ou antifúngicos, outros mecanismos podem ser

usados, como por exemplo, o uso celulose ou amido como única fonte de carbono, de

modo a isolar somente os microrganismos celulolíticos ou amilolíticos, respectivamente.

Outro exemplo é simples é o uso de meios constituídos apenas de sais inorgânicos e

água, os quais permitem apenas o desenvolvimento de organismo fotolitotrófico e não de

heterotróficos.

Figura 16. Teste do amido – N placa contendo um meio enriquecido em amido e que, após o

crescimento, sofreu a adição de uma solução de iodo em sua superfície, a presença de uma zona clara ao

redor do crescimento indica a utilização do amido.

Meios Diferenciais: Meios que conferem características especiais a colônia que em

condições normais, seriam idênticas. Esses meios, via de regra, permitem a obtenção de

colônias com características fenotípicas diferenciadas (morfologia, coloração, etc), de

acordo com o processamento de agentes cromogênicos ou açúcares e indicadores

incorporados ao meio.

Alguns meios podem ter um objetivo combinado, ou seja, ser seletivo-diferenciais.

Um exemplo é o ágar MacConkey, um meio bastante utilizado para o isolamento de

enterobactérias e outros bastonetes Gram-negativos. Este meio contém como agentes

seletivos sais biliares e cristal violeta, com o objetivo de inibir o crescimento das bactérias

Gram-positivas e algumas Gram-negativas fastidiosas, e lactose e vermelho neutro, com o

objetivo de diferenciar colônias de bactérias que utilizam este carboidrato. Quando as

bactérias chamadas de lactose-positivas utilizam a lactose, suas colônias apresentam tons

variados de vermelho em função da mudança de cor do indicador de pH. Já as bactérias

Page 45: Apostila TF

45

lactose-negativas formam colônias incolores ou transparentes. Um outro meio interessante,

para a mesma finalidade, é o meio CLED (cisteína, lactato, eletrólito deficiente), que

contém o indicador azul de bromo timol. Neste caso, as bactérias lactose-positivas

conseguem virar o indicador, originalmente verde em pH neutro, para amarelo em

decorrência da produção de ácidos.

Figura 17. Meio seletivo-diferencial de MacConkey

Meios de Enriquecimento: São meios preparados para favorecer a multiplicação

dos microrganismos de interesse, quando estes estão presentes em pequeno número em

relação à microbiota de acompanhamento que se encontra em maior número. Alguns destes

meios são chamados de meios de enriquecimento seletivo (variações dos meios seletivos),

pois, além de propiciarem o desenvolvimento do microrganismo de interesse, eles inibem

total ou parcialmente a microbiota de acompanhamento. Estes meios são bastante usados

em microbiologia médica e de alimentos. O caldo tetrationato possui bile, que estimula o

crescimento das salmonelas, e vários agentes seletivos com diferentes funções, como o

verde-brilhante, que inibe as bactérias Gram-positivas e o tetrationato, que inibe os

coliformes e outras bactérias entéricas.

Na área de microbiologia do solo também é comum o uso dos meios de

enriquecimento. Um exemplo bastante simples é o isolamento do solo de microrganismos

capazes de degradar a celulose. Pode-se utilizar um meio de cultura contendo apenas sais

minerais e uma tira de papel de filtro de celulose como única fonte de carbono. Os tubos

que contém o meio são inoculados com amostra de solo e incubados a uma temperatura

adequada. Após certo período de tempo, o papel de filtro é colonizado por microrganismos

celulolíticos.

Page 46: Apostila TF

46

Figura 19. Meio de Agar-sangue, com colônias de Streptococcus grupo G apresentando halo de

hematócitos ao seu redor (Foto: Ivi Cristina M de Oliveira)

Meios para Anaeróbios: são meios pré-reduzidos empregados na coleta e

manutenção de bactérias anaeróbias, onde são adicionadas substâncias redutoras (ácido

ascórbico 0,1%, cisteína 0,1%, tiogliconato de sódio 0,1%) que se combinam com o

oxigênio e indicadores de oxi-redução (azul de metileno, resazurina).

Meios para o Cultivo de Bactérias: são meios que simulam o habitat natural das

bactérias. Pode ser adicionado sangue, soro animal, glicose, etc. Ex.: Brain heart Infusion

Agar – BHI Agar.

Meios para Cultivo de Fungos: os fungos podem crescer em uma mistura simples

contendo glicose, uma fonte de nitrogênio inorgânico ou orgânico e alguns minerais. Em

geral esses meios têm uma conmcentração maior de açúcar (4-5%) e um pH mais baixo

(3,8 a 5,6) que o meio para cultivo bacteriano (pH 6,5 a 7,5). Ex.: Agar Sabouraud.

5. ISOLAMENTO DE MICRORGANISMOS EM CULTURA PURAS

Na natureza encontramos várias espécies de microrganismos (bactérias, fungos

algas e protozoários) convivendo no mesmo ambiente. Para estudar as propriedades de um

determinado microrganismo em particular, deve-se primeiramente isolá-lo em cultura pura,

ou seja, uma cultura isenta de todos os demais tipos de organismos, onde todas as células

na população sejam idênticas (originárias de uma mesma célula parental).

Os ingredientes necessários para o crescimento de microrganismos podem ser

supridos por um sistema vivo, como um hospedeiro animal ou vegetal, uma cultura de

células, ou por uma mistura de todos os nutrientes requeridos juntos em um sistema

artificial, denominado meio de cultura.

Page 47: Apostila TF

47

Os meios de cultura contém os materiais nutrientes para o cultivo dos diferentes

microrganismos. Estes meios podem ser preparados no próprio laboratório com pós

desidratados, ou adquiridos prontos no comércio em placas de Petri ou tubos de ensaio. Os

meios líquidos são úteis para a obtenção de relativa grande biomassa de microrganismos e

revelação de provas bioquímicas, mas não permitem a separação de dois ou mais

microrganismos de espécies diferentes em uma população mista, não possibilitando a

observação de algumas características específicas dos microrganismos, como a morfologia

de suas colônias.

Os fatores que influenciam a escolha do meio são:

� a origem do material a ser estudado

� a espécie que se imagina estar presente na amostra

� as necessidades nutricionais dos microrganismos

As técnicas mais utilizadas para o isolamento de microrganismos em cultura pura,

são a técnica de esgotamento e a técnica das diluições em placas.

Essas técnicas baseiam-se no princípio de uma célula microbiana isolada, quando

depositada em um meio de cultura sólido apropriado, dará origem a um agrupamento

macroscopicamente visível chamado colônia.

Colônia: É um conjunto de células idênticas que tem como origem uma única

célula ou esporo. No caso de bactérias que formam agrupamentos (estafilococos e

estreptococos) a colônia pode ser proveniente de um destes agrupamentos de células

semelhantes. No caso de fungos filamentosos a colônia também poderá ser proveniente de

um fragmento de hifa.

Inoculação: Quando o inóculo (material colocado no meio de cultura), obtido de

uma suspensão original da amostra, é colocado dentro ou sobre um meio geleificante

(ágar), as células são imobilizadas e cada uma irá se multiplicar produzindo uma colônia

isolada. Cada colônia nada mais é do que células individuais agrupadas, com ancestral

único, visível a olho nu.

Técnica do Esgotamento por Estrias: A técnica de esgotamento consiste em

semear, com auxílio de uma alça de inoculação, uma porção de microrganismos, fazendo

na superfície do meio uma seqüência de estrias não sobrepostas, que vão das bordas para o

centro da placa, em três setores distintos conforme figura abaixo. À medida que a alça vai

deslizando sobre o meio sólido o material contido na alça vai sendo inoculado e sendo

progressivamente menor. Ao final do procedimento, as células contidas na alça irão se

Page 48: Apostila TF

48

depositar no meio separadamente umas das outras. Após incubação em temperatura e

tempos adequados, cada célula isolada dará origem a uma colônia isolada.

Cada colônia isolada obtida poderá ser então passada para um meio de cultura

novo, de modo a ser obtida uma cultura pura, contendo células idênticas.

Figura 18. Técnica de esgotamento do inóculo

Figura 19. Procedimento para obtenção de cultura pura

Para o sucesso da operação alguns aspectos devem ser considerados:

1. Realizar o maior número de estrias possíveis.

2. Não perfurar ou rasgar o meio de ágar.

3. Não voltar com a alça sobre as estrias, sobrepondo-as.

Page 49: Apostila TF

49

4. Iniciar a semeadura com uma pequena quantidade de material na alça de

inoculação.

Diluições em Placas: A técnica das diluições em placas tem uma dupla aplicação,

podendo ser utilizada tanto para o isolamento como para a contagem de microrganismos.

Esta técnica também é conhecida como método das diluições seriadas. Pode-se

partir de uma determinada amostra, que pode ser solo, alimento, ou outro material

qualquer. Inicialmente, no caso de amostras sólidas, em pó, ou muito viscosas, é feita uma

homogeneização inicial e a partir desta são preparadas diluições sucessivas em tubos. Estas

diluições são feitas geralmente em solução salina, ou soluções tamponadas, e são diluições

seqüenciais, na razão de 1 para 10, obtendo-se diluições 1/10 ou 10-1, 1/100 ou 10-2,

1/1.000 ou 10-3, ou superiores.

Após as diluições é procedido ao plaqueamento, ou seja, distribuição homogênea de

uma alíquota da referida diluição em meio sólido adequado (com auxílio de uma alça de

Drigaski), de modo que após incubação em temperatura e tempo adequados, as células ou

pequenos agrupamentos de células idênticas espalhadas cresçam isoladamente dando

origem a colônias que serão contadas na diluição apropriada e, portanto, chamadas de

unidades formadoras de colônias (UFC). Nos tubos muito diluídos poderá não haver

células suficientes, ao passo que nos tubos muito concentrados teremos excesso de células,

não sendo possível fazer a contagem adequada nas respectivas placas. A contagem das

colônias deverá ser feita considerando-se que o número estatisticamente válido é de 30 a

300 para uma placa de 9 cm de diâmetro, e deverão ser preparadas pelos menos 3 placas-

réplicas. Após os cálculos adequados, levando-se em conta os volumes utilizados, e as

diluições empregadas, determina-se o número de microrganismos presentes em um

determinado peso ou volume do material inicial.

Page 50: Apostila TF

50

Figura 20. Método das diluições em placas

O método das diluições em placas permite duas variantes: inoculação em superfície

(descrita acima) e a inoculação em profundidade (pour-plate).

Método Pour-plate: No método do espalhamento em profundidade (pour plate) o

inóculo é adicionado ao fundo da placa estéril, vazia, e o meio de cultura contendo ágar,

ainda líquido, mantido a 40-45 ºC, é vertido sobre ele. A homogeneização é feita através de

movimentos rotacionais suaves. As células crescerão não somente na superfície, como

também no interior do meio de cultura.

As células crescidas no meio sólido usando-se as técnicas de esgotamento ou

diluições em placas podem ser isoladas para meios de cultura apropriados como cultura

“pura”.

Page 51: Apostila TF

51

Figura 20. Técnicas de inoculações de suspensões microbianas para contagem e isolamento de

microrganismos: método de espalhamento em superfície (a), e em profundidade (pour plate), apropriadas

para a contagem de microrganismos viáveis em placas

Quando se deseja identificar a maior parte das espécies presentes em uma amostra

de uma população mista de microrganismos deve ser realizada a semeadura em tantos

meios e condições de inoculação diferentes quantos sejam necessários para se obter o

crescimento da maioria das espécies presentes na amostra.

Para isolamento de um tipo particular de microrganismo presente em uma

população mista, alguns podem ser empregados de acordo com as características do

microrganismo desejado, tais como meios diferenciais, meios seletivos enriquecidos, o

aquecimento do material, ação de álcalis ou ácidos.

Isolamento de Aeróbios: Estes microrganismos requerem oxigênio para sua

sobrevivência. Após a semeadura em placas ou tubos com meio de cultura, estes são

mantidos em estufa a 37ºC em presença de oxigênio do ar atmosférico. Existem grupos de

microrganismos que necessitam níveis elevados de dióxido de carbono (CO2), neste caso

pode ser utilizado o método da jarra microaerófila. Após semeados, os meios são

colocados dentro da jarra juntamente com uma vela acesa que é então fechada

hermeticamente. Após a vela se apagar será obtida uma quantidade reduzida de oxig~enio

livre e um teor de dióxido de carbono de aproximadamente 10 %.

Isolamento de Aneróbios: Durante a preparação dos meios, estes são fervidos para

que a maior parte do oxigênio dissolvido seja retirada. O gás nitrogênio livre de oxigênio é

colocado nos tubos contendo o meio, e então um agente redutor deve ser adicionado

Page 52: Apostila TF

52

(normalmente cisteína), o qual remove os últimos traços de oxigênio. Os meios são

esterilizados em autoclave na completa ausência de oxigênio.

Câmara de anaerobiose: a manipulação dos microrganismos é realizada dentro da

câmara que contém luvas especiais acopladas á parede da câmara. A atmosfera dentro da

cãmara é uma mistura de hidrogênio, dióxido de carbono e nitrogênio. O material é

introduzido ou removido da câmara por meio de um sistema fechado para o ar. Qualquer

resíduo de oxigênio na câmara é removido pela reação com o hidrogênio, na presença do

catalisador paládio.

Jarras de anaerobiose: os meios inoculados são colocados em uma jarra

juntamente com um envelope que contém substâncias químicas que geram hidrogênio e

dióxido de carbono. Este sistema é inadequado para o cultivo de anaeróbios estritos.

Método de Veillon: o microrganismo é inoculado em meio sólido em coluna alta,

crescendo no fundo do tubo de ensaio.

6. TÉCNICAS DE CONSERVAÇÃO DE MICRORGANISMOS VIÁVEIS EM

LABORATÓRIO

Após o isolamento de microrganismos de interesse, é de grande importância a sua

adequada manutenção para futura identificação taxonômica e/ou exploração tecnológica.

Várias técnicas permitem a manutenção de culturas viáveis no laboratório durante

períodos de tempo mais ou menos longos:

1. Manutenção em tubos com meio inclinado: Semeadura em tubos em meio sólido e

transferências periódicas para meio novo, mantendo-se os tubos a 4ºC para reduzir

o metabolismo microbiano.

Obs. Estes procedimentos são trabalhosos, principalmente quando o número de

microrganismos da coleção é grande.

2. Recobrimento do meio com óleo mineral estéril e manutenção em temperaturas de

4ºC: Esta técnica baseia-se na redução do suprimento de oxigênio e

conseqüentemente o metabolismo.

3. Congelamento: São preparadas suspensões de uma cultura pura do microrganismo,

em meio estéril contendo glicerol, e armazenadas em ultrafreezer (que permitem

uma temperatura igual ou inferior a –70ºC) ou em nitrogênio líquido (-196ºC).

Page 53: Apostila TF

53

Muitos microrganismos podem ser mantidos viáveis durante anos, se congelados à

temperatura de –70ºC ou a temperaturas inferiores.

4. Liofolização: o microorganismo é suspenso em meio adequado (leite, albumina)

colocado em uma ampola e rapidamente congelado (-30ºC) e seco por sublimação.

Após, as ampolas são hermeticamente fechadas.

Obs: o material pode ser guardado à temperatura ambiente ou em nitrogênio

líquido.

7. MÉTODOS PARA A QUANTIFICAÇÃO DO CRESCIMENTO MICROBIANO

O crescimento dos microrganismos em meio líquido pode ser mensurado por

diferentes técnicas:

7.1 Determinação do peso (massa) seco

A determinação do peso seco, sendo corretamente executada, constitui o processo

básico de medida de massa. Este tipo de procedimento é realizado quando não é necessário

determinar o número preciso de microrganismos presentes. Uma amostra da suspensão

microbiana é centrifugada, o sobrenadante desprezado e o sedimento celular lavado 2 ou 3

vezes com água destilada ou solução salina e colocado em um vidro de relógio

previamente tarado e, em seguida, secado em estufa até peso constante. É uma técnica

bastante simples, entretanto há algumas limitações. São necessárias amostras relativamente

grandes, não sendo portanto possível acompanhar o crescimento microbiano desde o início

do cultivo. É necessário que a biomassa celular atinja determinados níveis para que possa

ser quantificada por peso seco. Outros inconvenientes incluem o fato do procedimento de

lavagem da biomassa poder levar a perdas de células e esta técnica não pode ser

empregada quando o meio de cultura possui partículas sólidas em suspensão.

A determinação do peso seco é bastante empregada na quantificação de biomassa

fúngica, onde o micélio é retirado da cultura, lavado e transferido para um frasco ou placa

e submetido à secagem até peso constante.

7.2 Turbidimetria

Page 54: Apostila TF

54

Consiste na medida da turvação de uma suspensão microbiana. Pode ser medida a

absorbância em um espectrofotômetro ou a capacidade de dispersão da luz em um

nefelômetro. Tal metodologia requer a construção de curvas de calibração, com base em

determinações de peso seco. A análise turbidimétrica é bastante rápida e de fácil execução,

entretanto não permite a determinação de células viáveis.

Fonte

de luz

Filtro Amostra

contendo

células

microbianas

Detector

sensível

á luz

Leitura dos

resultados

em absorbância

ou transmitância

no

espectrofotômetro

Fonte

de luz

Filtro Amostra

contendo

células

microbianas

Detector

sensível

á luz

Leitura dos

resultados

em absorbância

ou transmitância

no

espectrofotômetro

Figura 21. Curva padrão para o cálculo de crescimento microbiano por turbidimetrria

7.3 Determinação Química de Componentes Celulares

Através da dosagem de certos componentes celulares, como proteínas e ácidos

nucléicos, é possível calcular a massa microbiana. Método bastante sensível, podendo ser

aplicado a amostras pequenas. O inconveniente do método reside no fato da composição

química das células microbianas, principalmente de bactérias, variar com as condições de

crescimento: composição do meio de cultura, idade da cultura e velocidade de crescimento.

7.4 Contagem do Número Total de Indivíduos (contagem direta ao microscópio)

Page 55: Apostila TF

55

Técnica que consiste na contagem direta do número de células em um microscópio,

seja de amostras coradas ou analisadas a fresco. O procedimento mais comum consiste em

colocar diluições conhecidas da suspensão em câmaras de contagem (ex.: Câmara de

Neubauer) e sob o microscópio contar diretamente o número de partículas presentes num

determinado volume. A contagem direta é uma técnica rápida, mas tem como principais

limitações a impossibilidade de distinção entre células vivas e mortas (o que pode ser

contornado pelo uso de corantes vitais) e contagens errôneas, devido às pequenas

dimensões das células, ou a formação de agregados celulares.

Obs. Existem aparelhos eletrônicos que contam automaticamente o número de partículas

de uma suspensão (aparelhos tipo Coulter).

Câmara de Neubauer

Figura 22. Esquema de uma câmara de contagem de células

A

B

Figura 23. Visualização das células ao microscópio. Aumento de 100 X (A) e Aumento de 400 X (B)

Page 56: Apostila TF

56

Figura 24. Coloração com azul de metileno para evidenciar células viáveis de leveduras – células azuis estão mortas; células sem coloração são células vivas

A Câmara de Neubauer possui 25 campos de contagem, sendo cada um dividido em

16 partes. A área total da câmara de Neubauer, ocupada por 25 campos de contagem,

corresponde a uma área total de 1 mm2 (1 mm de cada lado). Sabendo-se que a lamínula

fica a 0,1 mm acima da câmara, esta área comporta o volume de 0,1 mm3 (1mm x 1mm x

0,1 mm). No entanto, como as contagens são anotadas em cm3, o volume será de

0,0001cm3 (1/10000 cm3).

Portanto: n° de células/ml= n° de células (contadas em um campo contendo 16 divisões) x

25 (total de campos de contagem) / 0,0001 cm3 (ml).

7.5 Contagem de Microrganismos Viáveis

É o método mais utilizado para contagem de bactérias e leveduras, e nesse caso são

feitas diluições adequadas da suspensão de bactérias e leveduras. As diluições são

semeadas na superfície de meios sólidos e após um período de incubação, conta-se às

colônias que cresceram. Se o espalhamento foi bem feito e homogêneo, cada colônia

corresponde a uma bactéria. Levando-se em conta a diluição feita, calcula-se o número de

bactérias e leveduras vivas presentes na suspensão original. Esta técnica deve ser realizada

empregando-se várias diluições (100 a 104) das amostras.A contagem de viáveis pode ser

feita tanto pela semeadura em superfície como em profundidade (pour plate). Geralmente

o volume a ser inoculado não deve ultrapassar 0,1 mL, para evitar a confluência das

colônias. Esta técnica é precisa quando o número de colônias contadas situa-se entre 30 e

Page 57: Apostila TF

57

300 e quando condições culturais e ambientais estão adequadas para os microrganismos

analisados.

Figura 25. Diluições seriadas e contagem em placas

8. PROCESSOS FERMENTATIVOS

Crescimento celular (considerando uma cultura bacteriana - divisão binária)

Partindo-se de uma única célula tem-se:

1 → 2 → 4 → 8 → 16 → 32 → ...

Isto pode ser expresso como uma progressão geométrica

1 → 21 → 22 → 23→ 24 → 25 → ... 2n

n = Número de gerações

2n = Expressão algébrica para o número máximo de células produzidas.

Tempo de Geração (g): Intervalo de tempo necessário para que cada microrganismo se

divida (ou para que a população de uma cultura duplique).

O tempo de geração varia de uma espécie para outra, varia com as condições

nutricionais e condições físicas de incubação.

Page 58: Apostila TF

58

Ex.: E. coli (12,5 min., em meio líquido)

Mycobacterium tuberculosis (13 – 15 h)

Cálculo do tempo de geração:

N = 1 x 2n

N = população total final partindo de uma célula. Como o número de bactérias inoculadas

no tempo zero (N0) não é exatamente 1 tem-se.

N = N0 x 2n

Passado para a expressão log10 tem-se:

log N = log N0 + n.log 2

Rearranjando a equação acima:

2log

loglog 0NNn

−=

301,0

loglog 0NNn

−=

Por esta expressão pode-se calcular o número de gerações que ocorrem em uma

cultura, se o número da população inicial e final forem conhecidas.

n

tg =

onde t = tempo de crescimento

A recíproca do tempo de geração (durante fase exponencial) é a taxa de

crescimento (R).

t

nR =

Page 59: Apostila TF

59

Tais equações, entretanto, somente se aplicam a microrganismos que se dividem

binariamente e em condições de 100 % de viabilidade. Desta forma é mais conveniente

aplicar uma equação onde é considerada a variação da massa X em função do tempo.

Xdt

dx.µ=

Segundo esta equação a velocidade de crescimento é proporcional à concentração

de microrganismos num dado instante. A fração pela qual a população cresce na unidade

de tempo é dada por µ, que representa a “velocidade específica de crescimento”.

dt

dX

X.

1=µ

Integrando a equação acima se tem:

tX

X.ln

0

µ= ou tXX .lnln 0 µ+=

Transformando para logaritmos decimais tem-se:

tXX ∗+=3,2

loglog 0

µ

Quando um microrganismo é inoculado em um meio de volume e composição

conhecidos, o cultivo passa por uma série de fases, conforme figura 1.

Tempo

Log N

1

2

3 4 1. Lag

2. Log

3. Estacion ária 4. Decl í nio

Tempo

Log N

1

2

3 4 1. Lag

2. Log

3. Estacion ária 4. Decl í nio

Page 60: Apostila TF

60

Figura 26. Crescimento de um microrganismo em um cultivo descontínuo (sistema fechado)

Obs. Esta curva pode ser traçada se inocularmos um meio com um número

conhecido de células, determinarmos a população microbiana em intervalos de tempo e

então estabelecermos os valores logarítmicos de um número de células viáveis versus

tempo.

Em um sistema descontínuo (fechado), onde nenhum novo nutriente é adicionado e

nenhum produto do metabolismo microbiano é removido, à medida que o tempo passa a

quantidade de nutrientes diminui e produtos do metabolismo são acumulados no meio.

Essas modificações têm uma considerável influência sobre o crescimento dos

microrganismos em cultura descontínua em meio líquido.

No início do processo há uma fase de latência, em que o microrganismo se adapta

as condições do meio. Nesta fase não há aumento no número de células, entretanto

determinações de massa geralmente acusam aumento, reflexo de um aumento no tamanho

dos indivíduos, pois as células estão sintetizando novo protoplasma. Esta fase ocorre

quando o inóculo provém de uma cultura velha (não mais em crescimento exponencial).

Culturas velhas já perderam certos sistemas enzimáticos.

Inóculo na fase “exponencial” semeado em meio idêntico não apresentará fase

“lag” e isso é importante em um sistema fermentativo em grande escala.

Após certo período de tempo a velocidade de crescimento das células aumenta (fase

de crescimento celular) até atingirem uma velocidade constante máxima (fase de

crescimento exponencial ou logarítmica). No final da fase.

Page 61: Apostila TF

61

Na fase exponencial as células estão plenamente adaptadas, absorvendo os

nutrientes, sintetizando seus constituintes e se multiplicando regularmente.

À medida que o crescimento continua, os nutrientes vão se esgotando e os produtos

vão sendo excretados pelo organismo, a velocidade de crescimento diminui (fase

estacionária). Nesta fase o número de indivíduos novos é igual ao número de indivíduos

que morrem, há esgotamento de um nutriente é/ou acúmulo de algum produto tóxico.

Finalmente há a fase de declínio ou morte, onde a maioria das células está em processo de

morte, o número de organismos que morrem torna-se progressivamente superior aos que

surgem. Em alguns casos há lise das células.

8.1 Fatores que Influem na Velocidade de Crescimento

O crescimento de um microrganismo varia em função de diversos fatores:

• Tipo de célula;

• Condições físico-químicas do meio ambiente;

• Temperatura;

• pH;

A velocidade de crescimento varia com o tipo de célula microbiana e também em

função das condições físico-químicas do meio ambiente. Em geral, o tempo para que se

duplique a biomassa aumenta com a complexidade do microrganismo, de forma que os

tempos de duplicação médios para as células animais e vegetais são substancialmente

maiores que os mofos e leveduras, que por sua vez são maiores que das bactérias.

O crescimento celular varia com a temperatura, uma vez que todos os processos de

crescimento são dependentes de reações químicas, as quais são afetadas pela temperatura.

A maioria dos microrganismos cresce entre 25 ºC e 35 ºC. Dentro desta faixa de

temperatura o crescimento aumenta com o aumento da temperatura até um valor máximo,

acima do qual a velocidade cai rapidamente devido ao incremento da taxa de morte

microbiana.

O pH influi no crescimento da mesma forma que na atividade enzimática. A

maioria dos microrganismos cresce em uma faixa de pH variando de 3 a 8. O pH ótimo é

normalmente bem definido para cada espécie. Encontra-se no valor mediano de variação

de pH sobre o qual o crescimento acontece, diferentemente da temperatura ótima. Para o

melhor crescimento do microrganismo num meio ácido ou básico, ele deve ser capaz de

Page 62: Apostila TF

62

manter o seu pH intracelular em torno de 7.5, não importando qual o valor do pH externo.

A maneira de obter o pH da célula viva nessa faixa, é expulsando ou absorvendo íons

hidrogênio (até um certo limite). As variações de pH podem ser mortal ao cultivo de

microrganismo, isto pode ser prevenido pela adição de um tampão ao meio.

A velocidade de crescimento da célula microbiana depende da atividade de água

(AW) e da umidade relativa. As bactérias necessitam uma AW de 0,95 enquanto os mofos

podem crescer em valores de atividade de água menores, de até 0,7.

Como em qualquer reação química, a velocidade de crescimento é função da

concentração do substrato ou de um nutriente essencial para o crescimento. Esta relação,

taxa de crescimento e concentração do substrato limitante, pode ser descrita pela equação

de Monod.

SK

S

SX

+= maxµµ

onde:

µ X= velocidade específica de crescimento;

µmax = máxima velocidade específica de crescimento;

KS = constante de saturação, e equivale à concentração do substrato (S) quando µX é igual à

metade de µmax .

2

maxµ

S (g/L)

µ (h-1)

nutriente

Taxa d

e a

bso

rção

de n

utr

ien

te

2

maxµ

S (g/L)

µ (h-1)

nutriente

Taxa d

e a

bso

rção

de n

utr

ien

te

Figura 27. Representação gráfica da equação de Monod

Page 63: Apostila TF

63

O crescimento microbiano depende da capacidade da célula para utilizar os

nutrientes do meio e sintetizar os compostos macromoleculares das estruturas celulares e

também os compostos de baixo peso molecular, necessários para a atividade celular. O

metabolismo intermediário inclui as reações que transformam os compostos de carbono e

nitrogênio que entram na célula em novo material celular ou em produtos que são

excretados. A síntese desses compostos necessita energia e a maioria das células utilizada

nas fermentações, são heterotróficas e obtém sua energia a partir da quebra de compostos

orgânicos.

Nos processos respiratórios ou aeróbios, os microrganismos são capazes de oxidar

completamente alguns dos substratos a CO2 e água, obtendo o máximo de energia para a

conversão dos substratos remanescentes em nova massa celular. No metabolismo

fermentativo ou anaeróbio, as células são menos eficazes para converter os substratos

orgânicos em material celular e usualmente excretam intermediários degradados

parcialmente.

O crescimento de uma cultura microbiana pode ser dividido em fases ou estágios.

Após a inoculação de uma cultura em um meio nutriente existe um período durante o qual

o crescimento parece não ocorrer; este período refere-se a fase “Lag” e pode ser

considerada uma fase de adaptação. Seguindo um período durante o qual a taxa de

crescimento das células aumenta gradualmente, as células crescem a uma taxa constante,

este período é conhecido como fase exponencial. Quando o crescimento diminui ou cessa

as células entram na fase estacionária. Após um longo período de tempo o número de

células viáveis decresce e a cultura entra na fase de morte ou declínio.

A fase Lag pode virtualmente ser eliminada aumentando o tamanho do inóculo e

otimizando as condições físicas dentro do fermentador. Em um processo industrial a

duração da fermentação contribui para o custo do produto, logo uma fase Lag mínima é

aconselhável.

Quando um microrganismo cresce em um ambiente no qual todos os seus nutrientes

essenciais estão em excesso, esse nutrientes se transformam em produtos finais do

metabolismo energético, em calor, ou em compostos requeridos para a reprodução de

novas células. Durante a fase exponencial de crescimento a divisão celular ou velocidade

de aumento da biomassa chega a ser máxima e os produtos gerados são essencialmente

para o crescimento das células e incluem: aminoácidos, nucleotídeos, proteínas, ácidos

Page 64: Apostila TF

64

nucleicos, lipídios, carboidratos, etc. Estes produtos são conhecidos como os primeiros

produtos do metabolismo ou “Metabólitos Primários” e a fase a qual eles são produzidos

(fase log ou exponencial) como trofofase. Também se inclui nesta categoria a biomassa

celular que pode ser considerada como o metabólito mais primário.

Os metabólitos primários se caracterizam por uma função metabólica direta, e são

compostos intermediários essenciais nas vias catabólicas e anabólicas.

Tabela 1. Produtos do metabolismo primário e sua significância comercial

Metabolismo Primário Uso comercial Etanol Ingrediente ativo em bebidas alcoólicas,

usado como combustível. Ácido cítrico Acidulante na indústria de alimentos Ácido glutâmico Realçador de sabor Lisina Suplemento alimentar Nucleotídeos Intensificador de flavor Fenilalanina Precursor do aspartame Polissacarídeos Espessante, estabilizante na indústria de

alimentos Vitaminas Suplemento alimentar

Durante a desaceleração e na fase estacionária, algumas culturas microbianas

sintetizam compostos os quais não são produzidos durante a trofofase e os quais parecem

não ter nenhuma função óbvia no metabolismo celular. A estes compostos nos referimos

como “Metabólitos Secundários” e a fase na qual eles são produzidos (equivalente à fase

estacionária) como idiofase.

Os metabólitos secundários são compostos que não são necessários para a

biossíntese celular, não tendo um papel direto no metabolismo energético. A biossíntese

destes compostos está intimamente ligada com o metabolismo primário das células que os

produzem, já que normalmente seus precursores são metabólitos primários ou modificados,

como ácidos orgânicos, aminoácidos, derivados de açúcares e bases nitrogenadas.

Os metabólitos secundários mais importantes do ponto de vista comercial são os

antibióticos, entre eles a Penicilina, cuja produção anual chega a 10.000 ton/ano. As

toxinas e os alcalóides representam o resto dos metabólitos secundários de importância

industrial.

Page 65: Apostila TF

65

Quando se observa que determinado microrganismo cresce a taxas relativamente

baixas de crescimento no seu meio ambiente natural, isto sugere indícios de que é a

idiofase que prevalece sobre a trofofase, a qual pode ser mais uma das propriedades das

culturas de microrganismos.

Nutriente limitante do crescimento: Se o nutriente está presente em concentrações

que limitam o crescimento das células, denomina-se nutriente limitante do crescimento.

Substrato Limitante: É a substância cuja mudança de sua concentração promove

mudanças nas velocidades de crescimento do microrganismo, de consumo do substrato e

de formação do produto. Quando o nutriente limitante é a principal fonte de carbono e de

energia, denomina-se substrato limitante do crescimento.

Existindo vários substratos limitantes, a equação de Monod pode ser estendida para:

nn

nnX SK

SK

SK

SK

SK

SK

+

⋅++

+

⋅+

+

⋅⋅= ...max

22

22

11

11

1

µµ

Se existir um excesso de todos os substratos, então µX = µmax e a cultura está na

fase log, na sua velocidade máxima de crescimento.

Se o primeiro substrato for exaurido e outro substrato estiver presente, tem-se uma

segunda fase lag e log com outro tempo de geração que caracteriza a metabolização deste

segundo substrato. Este fenômeno é denominado de DIAUXIA. Isto ocorre porque um dos

substratos, geralmente a glicose, é catabolizada preferencialmente e inibe a quebra de

outros substratos. As enzimas que catabolizam os outros substratos são indutivas (durante a

segunda fase lag) após a metabolização completa do primeiro substrato.

Tempo (horas)

0 6 12 18 24 30

glicose maltose maltotriose

Log

No.

lula

s

Tempo (horas)

0 6 12 18 24 30

glicose maltose maltotriose

Log

No.

lula

s

Figura 28. Crescimento triáuxico de Fusarium graminearum

Page 66: Apostila TF

66

8.2 Estudo Cinético dos Processos Fermentativos

O estudo cinético de um processo fermentativo consiste basicamente no

acompanhamento das variações das concentrações de um ou mais componentes do sistema

(microrganismo, metabólitos, nutrientes ou substratos) em função do tempo de

fermentação.

Os valores das concentrações de biomassa (X), produto (P) e substrato (S) quando

representados graficamente em função do tempo, nos permite traçar as curvas de ajuste.

Figura 29. Curvas de ajuste de uma fermentação. X, P e S são as concentrações do microrganismo, do

produto e do substrato residual no meio, respectivamente.

É importante ressaltar que muitas vezes apenas dois valores dos parâmetros X, S e

P (valores finais e iniciais) são observados. Neste caso não se pode afirmar que um estudo

cinético do processo tenha sido realizado, pois é necessário o conhecimento dos valores

intermediários. Estes valores permitem definir os perfis das curvas ou a forma matemática

destas, para uma análise adequada do fenômeno sob o ponto de vista cinético.

O entendimento do comportamento de cada parâmetro de fermentação (X, P, S) em

função do tempo é essencial para a transposição de um experimento de laboratório para a

escala industrial, bem como para o dimensionamento de uma instalação produtiva.

O estudo cinético também permite a comparação quantitativa entre diferentes

condições de cultivo (pH, temperatura, etc.) através de variáveis como: as velocidades de

transformação e os fatores de conversões, obtidos a partir das curvas de ajuste.

Dispondo de um conjunto de dados experimentais de X, S e P em função do tempo têm-se:

Page 67: Apostila TF

67

dt

dXX =µ ,

dt

dSS −=µ ,

dt

dPP =µ

Crescimento, Consumo, Formação

Não são os melhores parâmetros para se avaliar o estado em que se encontra o

sistema.

Velocidades específicas:

� Crescimento: dt

dX

X

1=µ

� Consumo de substrato: dt

dS

XS

1−=µ

� Formação de produto dt

dP

XP

1=µ

Distribuindo-se os dados da fase exponencial em coordenadas semilogarítmicas, tem-

se:

µ==dt

dX

Xdt

Xd.

1)ln( (equação que expressa à velocidade específica de crescimento)

Como essa fase tem a distribuição de uma reta à velocidade específica é constante e

máxima.

)max(loglog 0 titXX −+= µ

Onde X0 = Concentração celular no instante de início da fase exponencial

Rearranjando a equação anterior:

)(max0

titeXX −⋅⋅= µ

Ou, re-escrevendo de outra forma, tem-se:

tX

X.ln

0

µ= ou tXX .maxlnln 0 µ+=

Page 68: Apostila TF

68

Assim, pode-se obter o tempo de duplicação da biomassa, onde X – 2 X0:

max

2ln

µ=dupT

8.3 Parâmetros de Transformação

8.3.1 Fatores de Conversão

Considerando-se determinado tempo (t) de fermentação, os correspondentes valores

de X (biomassa microbiana), S (substrato) e P (produto) podem ser relacionados entre si,

através dos fatores de conversões definidos por:

A. Fator de conversão de Substrato em Biomassa (YX/S: g/g)

SS

XX

S

XY SX

−=

∆=

0

0/

Onde:

X0 = Concentração celular inicial

X = Concentração celular no instante t

S0 = Concentração inicial de substrato

S = Concentração residual do substrato no instante t.

O fator de conversão de substrato em biomassa pode ser obtido também através de:

SSXY

µ

µ=/

Coeficiente de manutenção

SXSS Y

m/'

µµ +=

(velocidade específica de consumo de substrato para manutenção da viabilidade celular)

B. Fator de Conversão de Substrato em Produto (YP/S: g/g)

Page 69: Apostila TF

69

SS

PP

S

PY SP

−=

∆=

0

0/

C. Produto Formado por Unidade de Células (YP/X: g/g)

0

0/ XX

PP

X

PY XP

−=

∆=

D. Produtividade volumétrica em produto (QP: g/L.h)

fP t

PP

t

PQ 0−

=∆

∆=

E. Produtividade volumétrica em biomassa (QX: g/L.h)

fX t

XX

t

XQ 0−

=∆

∆=

F. Taxa global de consumo do substrato (QS: g/L.h)

fS t

SS

t

SQ 0−

=∆

∆=

8.4 Tipos de Fermentação

As fermentações são agrupadas em três tipos distintos de processo:

8.4.1 Tipo 1 – Associada (Fermentações com Formação de Produto com Crescimento

Associado)

Neste tipo de fermentação, a formação do produto ocorre em paralelo, ou quase,

com o crescimento do agente e com o consumo do substrato. Produto e substrato se

relacionam praticamente por estequiometria.

No processo associado o produto é derivado diretamente do metabolismo primário,

usado para a produção de energia. O crescimento, o catabolismo de carboidratos e a

formação do produto ocorrem ao mesmo tempo. A TRODOFASE (fase de crescimento) e a

IDIOFASE (fase de formação do produto) não são separadas.

Exemplos: fermentação alcoólica (etanol), a produção aeróbica de leveduras, a

fermentação lática por Lactobacillus homofermentativos.

Page 70: Apostila TF

70

8.4.2 Tipo 2 – Semi-Associada (Fermentações com formação de Produto com Crescimento

Misto)

Neste caso, o crescimento do microrganismo é parcialmente separado da formação

do produto. Há duas fases: na primeira, a velocidade específica de formação do produto é

inversamente relacionada com o crescimento do agente e com a utilização do substrato; na

segunda, a velocidade específica de formação do produto está em boa correlação com as

velocidades específicas de consumo de substrato (µS) e crescimento (µX).

O produto é derivado de um substrato usado no metabolismo primário, mas segue

uma rota colateral. A trofofase e a idiofase são separadas. Em fermentação em batelada

este tipo de cinética possui dois pontos importantes:

a) crescimento celular acompanhado de alto consumo de substrato e pouca ou

nenhuma formação de produto

b) o crescimento diminui e a formação do produto começa acompanhada de um alto

consumo de substrato.

Exemplos: produção de ácido cítrico e a fermentação glucônica.

A B C

D E

Metabolismo Primário

Produto

A B C

D E

Metabolismo Primário

Produto

8.4.3 Tipo 3 – Não Associada (Fermentações com Formação de Produto com Crescimento

não Associado)

Aqui, a formação do produto é retardada, somente se iniciando, quando a

reprodução celular do agente cessa ou está em franco declínio e o substrato foi quase ou

totalmente consumido.

O metabolismo primário e a formação do produto ocorrem em tempos separados. O

produto não é derivado do catabolismo, mas de rotas anfibólicas. Neste tipo de

fermentação, o metabolismo primário ocorre acompanhado do consumo de substrato, após

isto o produto é formado por reações do metabolismo intermediário.

Neste tipo de processo freqüentemente as condições ótimas para o crescimento

celular não são as mesmas para a formação do produto e a fermentação pode ser dividida

em duas etapas, onde na primeira se dá condições para as células crescerem e após altera-

se a temperatura, pH, quantidade de oxigênio ou concentração de nutrientes para favorecer

a formação do produto.

Exemplos: fermemntação penicilínica, outros processos de produção de antibióticos

e também vitaminas.

Page 71: Apostila TF

71

A classificação dos processos depende da produção do metabólito, da composição

do meio de cultura e da regulação da cepa utilizada. Podem ocorrer formas intermediárias:

produção de ácido lático (tipo 1 e 2), produção de antibióticos aminoglicosídicos (tipo 2 e

3).

Um processo pode se comportar de duas formas distintas, conforme os parâmetros

de fermentação. Por exemplo, a produção de etanol é um processo associado, mas pela

modificação das condições de fermentação, pode ser forçado a se comportar como não-

associado.

Figura 30. Cinética das fermentações alcoólica, cítrica e penicílica, em graficação normal, convertidas em

velocidades e convertidas em velocidades específicas, segundo Gaden.

9. FORMAS DE CONDUÇÃO DOS PROCESSOS FERMENTATIVOS

O termo fermentação no sentido mais amplo possível pode ser definido como todo

o processo no qual o microrganismo catalisa a conversão de uma dada substância num

determinado produto. O processo de conversão pode requerer ou não oxigênio, e os

próprios microrganismos podem estar incluídos entre os produtos formados.

As fermentações industriais podem ser classificadas de acordo com os tipos de

alimentação das dornas (maneira através da qual o substrato é adicionado) e como o

produto é retirado, em processos contínuos e descontínuos (batelada). Assim sendo, numa

Page 72: Apostila TF

72

fermentação descontínua, o substrato é inicialmente carregado num recipiente e, ao

término do processo, o produto é retirado do mesmo. Em uma operação contínua a matéria-

prima é adicionada com uma vazão constante e o meio fermentado é retirado com a mesma

vazão de alimentação. Há ainda os processos semicontínuos, nos quais a adição do meio e

a retirada do produto são efetuadas intermitentemente. Tais processos podem ser

considerados como intermediários entre os descontínuos e os contínuos.

9.1 Fermentações Descontínuas

Uma fermentação descontínua ou “em batelada” é, na verdade um processo de

formação de produto a partir da ação metabólica de um microrganismo, agindo sobre o

meio nutritivo ou mosto, em um sistema fechado (o fermentador).

A fermentação descontínua (batelada simples) é considerada um sistema fechado

exceto pela adição de oxigênio, um agente antiespumante e um ácido ou base para

controlar o pH. Contém uma quantidade limitada de meio, em que o inóculo passa por um

número de fases (curva de crescimento). Em cada batelada é utilizado inóculo novo e

terminada a fermentação o produto é retirado e o resto é descartado. Tem elevado custo.

Características do sistema descontínuo (batelada simples):

� O fermentador contém um volume fixo de mosto, com uma quantidade limitada de

nutrientes.

� O meio não é renovado (durante fermentação).

� No instante inicial a solução nutriente esterilizada no fermentador é inoculada com

microrganismos e incubada, de modo a permitir que a fermentação ocorra sob

condições ótimas. No decorrer do processo fermentativo nada é adicionado, exceto

O2 (Ar - no caso de processos aeróbios), antiespumante, ácido ou álcali para

Page 73: Apostila TF

73

controle de pH. Terminada a fermentação, descarrega-se a dorna, e o meio

fermentado segue as etapas de recuperação do produto (downstream).

� O volume do reator no decorrer do processo descontínuo permanece constante (não

havendo adição de soluções para controle do processo, nem perda de líquido por

evaporação).

� A fermentação descontínua pode levar a baixos rendimentos ou produtividades

quando o substrato, adicionado de uma só vez no início da fermentação, exerce

efeitos de inibição, repressão, ou desvia o metabolismo celular a produtos que não

interessam.

� Apresenta tempos mortos (lavagem, esterilização, carga/descarga).

� Apresenta menores riscos de contaminação comparado ao processo contínuo.

� É o sistema de fermentação mais utilizado na indústria de alimentos (iogurtes,

vinho, cerveja);

� Grande flexibilidade de operação.

Figura 31. Exemplo de cinética de cultivo descontínuo (batelada simples)

Inóculo: Chama-se inóculo, pé-de-cuba ou pé de fermentação um volume de

suspensão de microrganismo de concentração adequada capaz de garantir, em condições

econômicas, a fermentação de um dado volume de mosto.

O volume de inoculo introduzido no fermentador varia de 0,5 % a 50 % v/v do

mosto, sendo comumente ao redor de 10 % v/v. A técnica de preparo do inoculo

compreende duas fases: uma de laboratório e a outra industrial.

A partir de uma cultura estoque, propaga-se o microrganismo por meio de

metodologia adequada. Normalmente na fase inicial passa-se do meio sólido, em condições

assépticas, para um tubo de ensaio contendo meio líquido esterilizado, adequado para o

desenvolvimento microbiano. Após incubação por um determinado período transfere-se o

Page 74: Apostila TF

74

conteúdo desse tubo para frascos apropriados para agitadores rotativos (Shakers) contendo

meio esterilizado. Após incubação, transfere-se a suspensão microbiana para frascos

maiores contendo meio nutriente esterilizado. O número de transferências vai depender do

volume útil do germinador (pré-fermentador). Dependendo do volume do fermentador,

poderá se necessário mais de um germinador.

A cada passo, os organismos devem crescer rapidamente, sendo as transferências

feitas na fase logarítmica de crescimento. Apenas na fase que corresponde ao inoculo (que

será adicionada ao fermentador), pode-se deixar que a cultura atinja a fase de declínio de

velocidade de crescimento, caso seja interessante iniciar a fase de produção com células de

um estágio mais avançado de curva de crescimento microbiano.

Mosto: Mosto é o termo industrial usado para designar o meio de cultivo

empregado no processo. O mosto deve possuir os nutrientes necessários para o crescimento

celular, além de favorecer a produção do produto desejado. A formulação de um meio de

cultivo (mosto) deve levar em conta a composição celular, o requerimento energético e a

necessidade de substâncias específicas.

Classificação dos processos fermentativos descontínuos:

Os processos descontínuos podem ser classificados em três grandes grupos:

� Fermentações em que cada dorna recebe um inóculo: Consiste na inoculação de

uma dorna com um microrganismo que foi propagado a partir de uma cultura pura.

Oferece poucos riscos de contaminação se a propagação do inóculo foi feita em

boas condições de assepsia. Nas fermentações em que o meio é rico e o

microrganismo é altamente suscetível a contaminação, a utilização deste processo é

indicada. Este sistema é o que oferece as melhores condições para uma boa

fermentação, uma vez que cada fermentador recebe uma suspensão de

microrganismos de elevada atividade e, praticamente, isenta de células

contaminantes.

� Fermentações com recirculação do microrganismo: É aproveitado como inóculo o

microrganismo da batelada anterior. Para tanto, se espera que o microrganismo

sedimente no fermentador (como é o caso das cervejarias), ou se centrifuga o meio

fermentado, separando-se as células e reutilizando-as. Esse procedimento é comum

em destilarias de álcool.

� Fermentação por meio de cortes: Inicia-se o trabalho inoculando-se uma dorna

(Dorna A) com pé-de-cuba, quando a fermentação atinge um estágio apropriado,

Page 75: Apostila TF

75

passa-se parte do conteúdo do fermentador A para um fermentador vazio (Dorna B)

e, em seguida, enchem-se as duas dornas com meio a fermentar. Essa operação

recebe o nome de corte. Esses cortes podem ser feitos na fase de crescimento mais

intenso quando se deseja propagar o inóculo, ou após o término do processo

fermentativo. A sucessão dos cortes pode levar a sérias quedas no rendimento,

principalmente quando se trabalha com meio não esterilizado. O número máximo

de cortes sucessivos não pode ser previsto. Em cada caso somente o controle do

rendimento poderá dizer em que momento é conveniente suspender-se o trabalho

por meio de cortes e iniciar-se nova fermentação com inóculo novo. As vezes o

processo de cortes é utilizado na fase industrial do preparo do próprio inóculo,

podendo-se operar do seguinte modo: em um dos tanques de crescimento do

microrganismo uma vez alcançado o momento da transferência para o tanque

subseqüente apenas uma fração da suspensão microbiana é transferida,

completando-se o tanque com mosto novo. Consegue-se, dessa maneira, em alguns

casos evitar diversas das etapas iniciais do processo de preparo do inóculo.

Na prática industrial há a possibilidade de serem utilizados processos mistos

(batelada + cortes) É o que acontece, por exemplo, em algumas fábricas de aguardente de

cana que durante a semana trabalham pelo processo de corte e no fim da semana submetem

o conteúdo de alguns fermentadores a uma centrifugação, utilizando a suspensão

microbiana obtida como inóculo de fermentadores para a semana subseqüente. A principal

desvantagem das fermentações descontínuas quando se utiliza para produção de produtos

associados ao crescimento, é que a formação eficiente de produto tem lugar unicamente

durante uma fração do ciclo de fermentação.

9.1.1 Fermentação Descontínua Alimentada (Batelada Alimentada)

Pode ser definida como sendo o processo no qual um ou mais nutrientes são

supridos ao meio (adicionados no fermentador) durante cultivo e, no qual os produtos

permanecem no reator até o final do cultivo.

Page 76: Apostila TF

76

Características do sistema descontínuo alimentado (batelada alimentada):

� Neste sistema é possível o controle das concentrações dos nutrientes (substratos) no

fermentador através do controle da vazão de alimentação, o que propicia a manutenção de

uma concentração de substrato favorável ao processo.

� Alternativa cada vez mais empregada nos processos biotecnológicos.

� Apresenta algumas vantagens como: possibilidade de níveis baixos de

determinados substratos inibidores como metanol, etanol, ácido acético entre

outros.

� Níveis baixos de glicose, permitindo assim, reduzir o efeito da repressão catabólica

na síntese de várias enzimas indutivas.

� Possibilidade de controle dos níveis de substratos indutores.

� Possibilidade de obtenção de elevadas produtividades tanto em células quanto em

produtos metabólicos.

� Reposição de água perdida por evaporação durante o processo

Obs.: processos industriais de longa duração (2 semanas) operados a 1 vvm podem

chegar à perdas de ≅ 25 %.

Figura 32. Exemplo de cinética de cultivo descontínuo alimentado (batelada alimentada)

Classificação do processo descontínuo alimentado conforme modo de

alimentação

Page 77: Apostila TF

77

O sistema descontínuo alimentado (batelada alimentada) pode ser classificado

segundo o modo de alimentação em: sistema em malha aberta e sistema em malha fechada.

1. Sistema em Malha Aberta:

A vazão é pré-estabelecida ou pré-calculada com base no conhecimento adquirido,

podendo ser intermitente ou contínua.

2. Sistema em Malha Fechada:

Utiliza o monitoramento de uma ou mais variável do processo para alterar a vazão

(feedback control). O sistema em malha fechada tem como vantagens: Permite ajuste do

fornecimento de [S] em relação à demanda do processo e melhor controle do processo.

A. Controle de realimentação direta

ex.: monitoramento da concentração do nutriente alimentado.

B. Controle de realimentação indireta

ex.: monitoramento de outros parâmetros (pH, O2, etc).

9.2 Fermentação Semicontínua

Pode ser definida como sendo o processo no qual após o reator ser carregado com o

meio de fermentação e o inóculo são realizados as seguintes operações:

Operação 1 – fermentação propriamente dita.

Operação 2 – parte do caldo fermentado é retirado (o restante é mantido no reator).

Operação 3 – adição de um volume de meio novo igual ao retirado.

O meio fermentado (parte) que fica dentro do reator (operação 2) serve como

inóculo ao meio de fermentação adicionado e nova fermentação é reiniciada. A

seqüência das operações 1, 2 e 3 são repetidas enquanto não houver queda da

produtividade do processo.

O processo é chamado semicontínuo porque tanto o fluxo de entrada de meio no

reator quanto o de saída do caldo fermentado são intermitentes.

É um processo não muito usado, entretanto pode apresentar algumas vantagens tais

como:

� Possibilidade de operação do fermentador por longos períodos (até meses) sem a

necessidade de preparação de inoculo.

Page 78: Apostila TF

78

� Possibilidade de obtenção de produtividades maiores que as observadas em sistema

descontínuo, quando conhecidas as melhores condições de operação.

Figura 32. Exemplo de cinética de cultivo semicontínuo

9.3 Fermentação Contínua

O processo de fermentação contínua caracteriza-se por possuir uma alimentação

contínua do meio de cultura a uma determinada vazão constante, sendo o volume de

reação mantido constante através da retirada contínua de caldo fermentado.

A fermentação contínua ocorre quando há formação do produto a partir do cultivo

de microrganismo em um sistema aberto, no qual se pode manter o cultivo microbiano

permanentemente em crescimento, por contínua adição de meio nutritivo, de modo a não

alterar o ambiente celular, constante.

A manutenção de volume constante de meio no reator é essencial para que o

sistema atinja a condição de estado estacionário ou regime permanente, condição na qual

as variáveis de estado ([X], [S limitante] e [P]) permanecem constantes ao longo do tempo

de operação do sistema. O estado estacionário é, portanto, alcançado quando não há

alteração no conteúdo do fermentador ou reator: a massa celular, a concentração do

substrato e a do produto permanecem constantes, bem como o estado metabólico do

agente.

Page 79: Apostila TF

79

A manutenção de volume constante dentro do reator pode ser conseguida com o

uso de sistemas de retirada de líquido por transbordamento (“ladrão”) ou com bombas de

alta vazão.

Um sistema contínuo, contrariamente a um descontínuo, onde o meio ambiente,

muda constantemente, fornece ótimas condições para estudar e avaliar a resposta dos

microrganismos ao seu meio. O sistema contínuo em quimiostato é especialmente útil para

avaliar o desempenho e a influência de um nutriente ou fator essencial ao crescimento

celular, possibilitando aplicar a equação de Monod.

Apesar do grande esforço desprendido por vários pesquisadores, as fermentações

contínuas ainda constituem um enorme campo a ser explorado, principalmente no que se

refere a sua aplicação em processo de interesse econômico. Na prática, há um número

relativamente pequeno de instalações industriais que utilizam os processos contínuos de

fermentação. Pode-se dizer que, os processos contínuos constituem uma das tecnologias

mais promissoras no campo da biotecnologia, pois, apesar da escassez das instalações

industriais existentes e da pouca diversidade dos produtos fabricados, muitos

pesquisadores têm mostrado em escala piloto ou semiindustrial, a possibilidade de

fabricação de diversos produtos através de cultivo contínuo. Como exemplo tem-se a

produção de ácido glicônico, ácido lático, cloranfenicol, penicilina, vitamina B12. Entre os

microrganismos produzidos, pode ser citado os gêneros Aerobacter, Azobacter, Bacillus,

Clostridium, Penicillium, Sacharoromyces, Torula, etc.

Os primeiros sistemas contínuos de fermentação foram os de dornas ligadas em

série, com quantidade e tamanhos variados, em cascata, em que as primeiras dornas

continham cerca de 70% do volume total em fermentação. Com a evolução dos processos

da fermentação, ocorreu uma otimização dos mesmos com redução dos volumes e do

tempo de fermentação com aumentos na produção. O processo ainda é em cascata, com

melhoramento nos sistemas de agitação e com diferenciado traçado geométrico das dornas.

O sistema de fermentação contínua tem economia de matérias, menor espaço de

instalação e menos equipamentos requeridos, menor necessidade de mão de obra (se for

automatizada). Além disso, aludido sistema tem operacionalidade e manutenibilidade

inferior ao por batelada (em caso de um acidente em uma das dornas, não se pode isolá-la

do sistema e prosseguir com o processo, sem grandes perdas). “Ou seja, mais suscetíveis à

infecção”.

Page 80: Apostila TF

80

Vantagens em relação ao Processo Descontínuo

� Aumento da produtividade do processo, em virtude de uma redução dos tempos

mortos;

� Menor volume de equipamentos em geral;

� Obtenção de caldo fermentado uniforme;

� Manutenção das células em um mesmo estado fisiológico, o que é interessante para

estudos de mecanismos de regulação metabólica e otimização de composição de

meio de cultura;

� Menor necessidade de mão de obra;

� Maior possibilidade de automação (amplas possibilidades de automação e uso da

informática);

Desvantagens em relação ao Processo Descontínuo

� Investimentos iniciais na planta superiores ao descontínuo;

� Possibilidade de ocorrência de mutações gênicas espontâneas;

� Maior possibilidade de ocorrência de contaminação do processo;

� Dificuldade de manutenção de homogeneidade no reator quando em condições de

baixas vazões;

� Formação de espuma, crescimento do microrganismo nas paredes do reator ou nos

sistemas de entrada e saída, fatores estes que dificultam a operação em estado

estacionário.

Formas de Operação do Sistema Contínuo

1. Contínuo em um estágio

• Sem reciclo de células

• Com reciclo de células

2. Contínuo em múltiplos estágios (“n” reatores em série)

• Com uma única alimentação

• Com múltiplas alimentações

Page 81: Apostila TF

81

Sistema Contínuo em um único estágio, sem

reciclo de células

Sistema Contínuo em um único estágio, com

reciclo interno de células

Sistema Contínuo em um único estágio, sem reciclo externo de células

Sistema Contínuo em múltiplos estágios, com uma única alimentação e com

reciclo

Sistema Contínuo em múltiplos estágios, com múltiplas alimentações e com

reciclo

Page 82: Apostila TF

82

Equacionamento para um fermentador contínuo ideal sem reciclo de células:

Variação da massa de células no reator

Massa de células que

entra

Massa de células que

sai

Massa de células que aparece devido

ao crescimento+

Variação da massa de células no reator

Massa de células que

entra

Massa de células que

sai

Massa de células que aparece devido

ao crescimento+

Como o volume de trabalho é constante:

oCrescimentdt

dXVXFXF

dT

dXV

⋅+⋅−⋅=⋅ 0 Equação 1

A velocidade global instantânea de crescimento, por sua vez, pode ser expressa

como:

Xdt

dX

oCresciment

⋅=

µ Equação 2

Define-se a “vazão específica de alimentação” (D) (“diluition rate”), como sendo a

relação entre a vazão volumétrica de alimentação e o volume de meio no reator. Assim,

tem-se que:

( )1−= hV

FD Equação 3

Sendo que, =D

1Tempo de residência hidráulico no reator

Substituindo-se as equações 2 e 3 na equação 1, tem-se que:

( ) XXXDdt

dX⋅+−⋅= µ0

Como freqüentemente X0 = 0, tem-se que:

DXXdt

dX−= µ

Considerando um estágio estacionário no fermentador tem-se [X] constante

(situação de estado estacionário), logo 0=dt

dX(a concentração celular permanece

constante), portanto:

DXX =µ

Ou, ainda: D=µ

Page 83: Apostila TF

83

� Na condição de Regime Permanente a Concentração celular [X] é constante graças

ao equilíbrio entre µ (velocidade de crescimento celular) e a velocidade de retirada

das células.

� Velocidade específica de crescimento (µ) = Vazão específica de alimentação (D).

� Através do uso de uma determinada vazão de alimentação ao reator, é possível

controlar a velocidade específica de crescimento (µ), significando que é possível

fixar o estado fisiológico das células.

� Washout = lavagem (arraste de células) do reator em função de desequilíbrios entre

a vazão de alimentação e a velocidade de cre4scimento das células.

10. PRINCIPAIS PROCESSOS FERMENTATIVOS

10.1 Fermentação Alcoólica

A fermentação alcoólica pode ser considerada como a oxidação anaeróbica, parcial,

da glicose, por ação de leveduras, com a produção final de álcool etílico e gás carbônico,

além de outros produtos secundários. É um bioprocesso de grande importância, através do

qual é obtido todo o álcool industrial e todas as bebidas alcoólicas, e tendo como produto

secundário o gás carbônico.

10.1.1 Histórico da Fermentação Alcoólica

BECHNER: Século XVII – somente os líquidos açucarados são capazes de entrar em

fermentação alcoólica. O álcool era formado durante o processo de fermentação, mas de

forma errônea acreditava na necessidade de ar para que ocorresse a fermentação, a qual

dizia ser semelhante a combustão.

BLACK: Século XVIII – postulou que álcool etílico e o gás carbônico (C02) eram os

únicos produtos formados a partir do açúcar durante a fermentação alcoólica.

LAVOSIER 1789 – foi o primeiro a efetuar um estudo qualitativo da fermentação

alcoólica, identificando além do álcool etílico e do CO2 outro composto, o ácido acético.

*Álcool etílico + C02 + Ác. Acético

Page 84: Apostila TF

84

GAY LUSSAC: seguiu os estudos de Lavosier, formulou a equação que julgava

representar o fenômeno da fermentação alcoólica:

C6H12O6 → 2C2H5OH + 2CO2

PASTEUR: 1857 – Explicou a natureza da fermentação alcoólica, atribuindo-a a atuação

de seres vivos invisíveis a olho nu, as leveduras.

EMBDEN, MAYERHOFF, ROBISON, NEUBERG, PARNAS E WARBUG: Século XX

– foram os arquitetos pioneiros da identificação das rotas bioquímicas que hoje

representam a fermentação alcoólica em todas as suas etapas.

10.1.2 Generalidades:

No Brasil, as indústrias de açúcar e de álcool estiveram sempre intimamente

ligadas, desde o tempo do descobrimento. Deduz-se que a produção de álcool iniciou na

Capitania de São Vicente, porque nela foi montado o primeiro engenho de açúcar do país

após a vinda das primeiras mudas de cana-de-açúcar vindas da Ilha da Madeira em 1532.

Certamente, transformava-se o melaço residual da fabricação do açúcar em cachaça e,

diretamente da garapa fermentada produzia-se aguardente. Por séculos as bebidas

alcoólicas foram o único álcool produzido. A indústria de álcool industrial desenvolveu-se

na Europa, nos meados do século 19; no último quarto desse século iniciou-se a produção

de etanol no Brasil, com as sobras de melaço da indústria de açúcar, que ampliava sua

capacidade produtiva.

A Alemanha e, principalmente a França, deram grande contribuição ao

desenvolvimento das técnicas de fermentação alcoólica, de destilação e de construção de

aparelhos de destilação. Utilizava-se o etanol para fins farmacêuticos, para bebidas e como

fonte de energia térmica, por combustão, em algumas atividades.

A I grande guerra (1914/1918) contribuiu para o desenvolvimento da produção em

grande escala. Naquele período usou-se o álcool como combustível líquido de motores de

explosão. Em 1929 a grande crise internacional colocou em xeque as economias de todos

os países e, no Brasil, a indústria açucareira não ficou a salvo. Sobrava açúcar e cana e

faltavam recursos para a aquisição de combustível líquido. A primeira destilaria de álcool

anidro foi instalada e o Governo Federal, em 1931, estabeleceu a obrigatoriedade da

Page 85: Apostila TF

85

mistura de 5 % de etanol à gasolina (Decreto 19.717), como medida de economia na

importação de combustível para amparar a lavoura canavieira.

A crise internacional do petróleo em 1974, fez com que se iniciasse no Brasil, uma

nova fase na produção de etanol. Na busca de alternativas para combustível líquido, o

álcool adquiriu uma importância sem paralelo. Com a utilização desse combustível

alternativo, ampliaram-se os canaviais, fez-se a modernização das destilarias anexas, a

instalação de unidades autônomas. O plano de desenvolvimento da produção de álcool no

Brasil, denominado de Proálcool, contribuiu para que o pais passasse a produzir álcool em

grande quantidade e a desenvolver tecnologias nacionais para melhorar a produção

industrial. No entanto, nos finas dos anos 1980 e início dos anos 1990 a produção nacional

de álcool combustível entra em decadência, em função de uma série de fatos entre eles o

abaixamento do preço internacional do petróleo.

Com o crescente interesse nos combustíveis oriundos de fontes renováveis, com

menor potencial poluidor e com as atuais altas nos combustíveis derivados do petróleo

atualmente o álcool voltou na ser um produto de grande importância comercial.

10.1.3 Matérias-primas para Produção de Etanol por Fermentação

Qualquer produto que contenha açúcar ou outro carboidrato, constitui-se em

matéria-prima para obtenção de etanol. Entretanto, para que seja viável economicamente, é

preciso considerar seu volume de produção, o rendimento industrial e o custo de

fabricação. Três tipos de substratos podem ser utilizados na obtenção de etanol por

fermentação.

a. raízes que contenham amido, tubérculos ou grãos

b. melaços ou suco de cana-de-açúcar ou de beterraba açucareira

c. lignocelulósicos, madeira ou resíduos do processamento de madeiras

Page 86: Apostila TF

86

10.1.4 Processo Industrial de Produção de Etanol por Fermentação

O etanol (álcool etílico) foi uma das primeiras substâncias orgânicas obtidas pelo

homem a partir de processos fermentativos. Seu ponto de fusão é -115 °C e ponto de

ebulição é 78,5°C. A temperatura ambiente este álcool é líquido. O etanol também é

conhecido por álcool etílico ou álcool de cereais, e é obtido pela fermentação de

polissacarídeos (amido, celulose) ou dissacarídeos (sacarose, maltose). As fontes naturais

mais importantes são: cana-de-açúcar(Brasil), beterraba, batata, cevada e arroz.

No Brasil e em outras regiões tropicais do planeta o açúcar e o álcool são

produzidos a partir da cana-de-açúcar, enquanto na Europa o açúcar é extraído da

beterraba. No Brasil, basicamente o álcool é obtido da cana de açúcar. A mandioca

também tem certo potencial, mas em pequena escala. Um hectare de plantação de cana

pode produzir 3350L de álcool, a mesma área de plantação de mandioca, produz 2550L.

Nos canaviais, a cana-de-açúcar passa pelas fases de crescimento – na época quente

e de chuvas – e maturação – na época fria e seca. Nesta fase a quantidade de sacarose

aumenta muito. Chega então o momento do corte, que deve ser feito na época certa, senão

a própria planta começa a consumir o açúcar que produziu, diminuindo a quantidade de

Page 87: Apostila TF

87

álcool a ser obtida. As usinas são responsáveis pela transformação da cana em AÇÚCAR e

ÁLCOOL. Esta produção envolve áreas agrícolas e industriais.

A cana é composta em média, de 65% a 75% de água, mas seu principal

componente é a sacarose, correspondendo de 70 a 91% de seus sólidos solúveis. A planta

também contém glicose (de 2% a 4%), frutose (de 2% a 4%), sais (de 3% a 5|%), proteínas

(de 0,5% a 0,6%), amido (0,001% a 0,05%), ceras e graxas (0,05% a 0,15%) e corantes

(3% a 5%).

Após o corte, a cana é transportada para as usinas, onde é lavada desprendendo a

sujeira mais grossa, picada e moída.

Moagem

A cana que chega à unidade industrial é processada o mais rápido possível. Este

sincronismo entre o corte, transporte e moagem é muito importante, pois a cana é uma

matéria prima sujeita a contaminações e conseqüentemente de fácil deterioração.

Antes da moagem, a cana é lavada nas mesas alimentadoras para retirar a terra

proveniente da lavoura. Após a lavagem, a cana passa por picadores que trituram os

colmos, preparando-a para a moagem. Após o preparo, a cana desfibrada é enviada à

moenda para ser moída e extrair o caldo. Na moenda, a cana desfibrada é exposta entre

rolos submetidos a uma pressão de aproximadamente 250 kg/cm², expulsando o caldo do

interior das células.

Este processo é repetido por seis vezes continuamente. Adiciona-se água numa

proporção de 30%. A isto se chama embebição composta, cuja função é embeber o interior

das células da cana diluindo o açúcar ali existente e com isso aumentando a eficiência da

extração, conseguindo-se assim extrair cerca de 96% do açúcar contido na cana.

O caldo extraído vai para o processo de tratamento do caldo e o bagaço para as

caldeiras. Apesar do tratamento preliminar citado, o caldo de cana contém, ainda ,

impurezas menores, que podem ser solúveis, coloidais ou insolúveis. Assim, ele passa por

um tratamento químico que visa principalmente à coagulação, à floculação, e à

precipitação destas impurezas, que são eliminadas por sedimentação. É necessário ainda

fazer a correção do pH para evitar inversão e decomposição da sacarose.

Obs. O caldo tratado pode ser enviado á fabricação de açúcar ou de álcool, e o

bagaço é utilizado como combustível na geração de vapor.

O bagaço que sai da moenda com muito pouco açúcar e com umidade de 50%, é

transportado para as caldeiras, onde é queimado para gerar vapor, que se destina a todas as

Page 88: Apostila TF

88

necessidades que envolvem o acionamento das máquinas pesadas, geração de energia

elétrica e o processo de fabricação de açúcar e álcool. A sobra de bagaço é vendida para

outras indústrias. O bagaço é muito importante na unidade industrial, porque é o

combustível para todo o processo produtivo. Um bom sistema térmico é fundamental.

Parte do vapor gerado é enviado aos turbogeradores, que produzirão energia elétrica

suficiente para movimentar todos os acionamentos elétricos e a iluminação.

Tratamento Químico do Caldo

Inicialmente adiciona-se anidrido sulfuroso (SO2) ao caldo, que o absorve,

baixando o seu pH original a aproximadamente 4,0. Este processo tem como objetivos

principais inibir reações que causam a formação de cor; a coagulação de colóides solúveis

e conseqüentemente auxiliar na sedimentação das partículas de impureza; a formação do

precipitado CaSO3 (sulfito de cálcio); e diminuir a viscosidade do caldo e;

conseqüentemente do xarope, massas cozidas e méis, facilitando as operações de

evaporação e cozimento (no caso da produção de açúcar). O SO2 gasoso é produzido na

usina através da queima do S (enxofre) na presença de ar, em fornos especiais.

Posteriormente, adiciona-se ao caldo uma solução de hidróxido de cálcio

(Ca(OH)2). Este processo tem por objetivo a eliminação de corantes do caldo, a

neutralização de ácidos orgânicos e a formação de sulfito e fosfato de cálcio, produtos

estes que, ao sedimentar, arrastam consigo impurezas presentes no líquido e elevam o pH

do caldo para valores da ordem de 6,8 a 7,2. A solução de hidróxido de cálcio também é

produzida na própria usina segundo a equação:

CaO + H2O → Ca(OH)2 + calor

Parte do caldo tratado quimicamente é desviada para tratamento específico para

fabricação álcool. Este tratamento consiste em aquecer o caldo a aproximadamente 105ºC

sem adição de produtos químicos, e após isto, decantá-lo.

Após decantação, o caldo clarificado irá para a pré-evaporação e o lodo para novo

tratamento, semelhante feito ao lodo do açúcar. Na pré-evaporação o caldo é aquecido a

aproximadamente 115ºC, evapora água e é concentrado a 20ºBrix. Este aquecimento

favorece a fermentação por fazer uma "esterilização" das bactérias e leveduras que

concorreriam com a levedura do processo de fermentação. Livre de impurezas e

devidamente esterelizado, o caldo está pronto para ser enviado a fermentação.

Prepara-se o mosto, cuja concentração de açúcar foi ajustada de forma a facilitar

sua fermentação) e com a adição de levedura (fermentos biológicos) , consegue-se a

Page 89: Apostila TF

89

transformação da sacarose em etanol em duas etapas, devido ás enzimas produzidas pelas

leveduras, tais como Saccharomyces Cerivisae.

No preparo do mosto define-se as condições gerais de trabalho para a condução da

fermentação como, regulagem da vazão, teor de açúcares e temperatura. Densímetros,

medidores de vazão e controlador de Brix automático monitoram este processo.

Inicialmente, a sacarose, que é um dissacarídeo, se hidrolisa na presença da enzima

invertase, produzindo glicose e frutose, ambas monossacarídeos (C6H12O6). Glicose e

frutose são substâncias isoméricas, ou seja, apresentam a mesma fórmula molecular, mas

possuem arranjos geométricos diferentes.

C12H22O11 → C6H12O6 + C6H12O6

H20

sacaroseinvertase

glicose frutose

C12H22O11 → C6H12O6 + C6H12O6

H20

sacaroseinvertase

glicose frutose

Na seqüência, sob ação da enzima zimase, os monossacarídeos são fermentados

produzindo etanol e gás carbônico.

C6H12O6 → 2 C2H5OH + 2 CO2

Glicose ou frutose etanol gás carbônico

zimaseC6H12O6 → 2 C2H5OH + 2 CO2

Glicose ou frutose etanol gás carbônico

zimase

Durante a reação, ocorre intensa liberação de gás carbônico, a solução aquece-se e

ocorre a formação de produtos secundários como álcoois superiores, glicerol, aldeídos, etc.

A liberação de gás carbônico é facilmente observada pela formação de bolhas, o

que causa a impressão de que está em ebulição, o que não é verdade. Esse fenômeno é

conhecido como fervura fria.

O tempo de fermentação varia de 4 a 12 horas. Ao final deste período, praticamente

todo o açúcar já foi consumido, com a conseqüente redução da liberação de gases. Ao

terminar a fermentação, o teor médio de álcool nestas dornas é de 7% a 10%, e a mistura

recebe o nome de vinho fermentado.

Devido à grande quantidade de calor liberado durante o processo e á necessidade da

temperatura ser mantida baixa (34°C), é preciso realizar o resfriamento do vinho,

circulando água em serpentinas internas às dornas, ou em trocadores de calor, por onde o

vinho é bombeado continuamente com água contracorente.

Após a fermentação o vinho é enviado para as centrífugas, para que a levedura

usada no processo seja recuperada.

Page 90: Apostila TF

90

A levedura após passar pelo processo de fermentação se "desgasta", por ficar

exposta a teores alcoólicos elevados. Após a separação do fermento do vinho, o fermento a

60% é diluído a 25% com adição de água. Regula-se o pH em torno de 2,8 a 3,0

adicionando-se ácido sulfúrico que também tem efeito desfloculante e bacteriostático. O

tratamento é contínuo e tem um tempo de retenção de aproximadamente uma hora.

O fermento tratado volta ao primeiro estágio para começar um novo ciclo

fermentativo; eventualmente é usado bactericida para controle da população contaminante.

O vinho “delevedurado” irá para os aparelhos de destilação onde o álcool é

separado, concentrado e purificado.

Destilação e Desidratação

O vinho que vem da fermentação possui em sua composição, 7 a 10 % de etanol,

além de outros componentes de natureza líquida, sólida e gasosa. Dentre os líquidos,

encontram-se água (89 a 93%), glicerina, aldeído acético, etc. Já os sólidos são

representados por bagacilhos, leveduras e bactérias, sais minerais, etc, e os gasosos,

principalmente CO2 e SO2.

O etanol presente neste vinho é recuperado pela destilação, processo que se utiliza

dos diferentes pontos de ebulição das diversas substâncias voláteis presentes, separando-as.

A operação é realizada com auxílio de colunas de destilação. A destilação é processada em

colunas superpostas, nas quais, o álcool é separado do vinho e sai com a flegma (vapores

com 40 a 50°GL).

A destilação elimina ainda impurezas (estéres e aldeídos). Esta etapa tem por

finalidade esgotar a maior quantidade possível de álcool do seu produto de fundo, que é

denominado vinhaça. A vinhaça, rica em água, matéria orgânica, nitrogênio, potássio e

fósforo, é utilizada na lavoura para irrigação da cana, na chamada fertirrigação.

O álcool hidratado, produto final do processo de destilação e retificação, é uma

mistura binária álcool e água que atinge um teor da ordem de 96°GL. Isto ocorre devido a

formação de uma mistura azeotrópica, fenômeno físico no qual os componentes não são

separados pelo processo de destilação.

Este álcool hidratado pode ser comercializado desta forma ou passar pelo seguinte

tratamento:

Em uma coluna de desidratação, o ciclohexano (pode também utilizar benzeno) é

adicionado á esta mistura, pois tem a capacidade de formar uma mistura azeotrópica

Page 91: Apostila TF

91

ternária, ciclohexano-água-álcool, com ponto de ebulição inferior ao do álcool anidro,

portanto o álcool é retirado do fundo da coluna com aproximadamente 99, 7°GL.

A desnaturação do álcool é uma prática oriunda da regulamentação, pela autoridade

responsável pelo controle de bebidas alcoólicas, que visa marcar, com a finalidade de

poder identifica-lo facilmente, quando necessário, o etano, industrial. O etanol industrial é

marcado com uma ou mais substâncias que devem: a) ser dificilmente elimináveis por

meios físicos ou químicos; b) não ser cáustica ou corrosivas. As seguintes substâncias são

usadas para este fim, sós ou combinadas: metanol, cânfora, benzeno, corantes de anilina,

beses pirimídicas, entre outras.

10.2 Fermentação Lática

A fermentação lática está entre as mais importantes fermentações industriais,

estando os detalhes metabólicos da rota fermentativa bem definidos e estudados. Na

fermentação láctica, a glicose sofre glicólise exatamente como na fermentação alcoólica.

Porém enquanto na fermentação alcoólica o aceptor de hidrogênios é o próprio aldeído

acético, na fermentação láctica o aceptor de hidrogênios é o próprio ácido pirúvico, que se

converte em ácido láctico. Portanto não havendo descarboxilação do ácido píruvico, não

ocorre formação de CO2.

Equação simplificada da fermentação láctica (homolática):

C6H12O6 → 2C3H6O3 + 2ATP

A fermentação lática é realizada por microorganismos (certas bactérias, fungos e

protozoários) e por certos animais. O ácido lático também é produzido nos músculos a

partir do ácido pirúvico, durante exercícios vigorosos, produzindo dores musculares ou

cãibras. A respiração é intensificada durante um exercício muscular, porque consome-se

mais oxigênio. Nossos músculos, porém, são dotados de um mecanismo que garante a

continuação do esforço, mesmo na ausência do oxigênio: a respiração anaeróbia, onde a

glicose se decompõe na ausência do gás oxigênio, reproduzindo ácido lático. Quanto maior

a atividade muscular, mais ácido lático se acumula no músculo, tornando-o fatigado e

incapaz de contrair-se, produzindo cansaço e até cãibras. A acumulação de ácido láctico no

corpo é designada por acidose láctica.

As bactérias do gênero Lactobacillus são muito empregadas na fabricação de

coalhadas, iogurtes e queijos. Elas promovem o desdobramento do açúcar do leite (lactose)

Page 92: Apostila TF

92

em ácido lático. O acúmulo de ácido lático no leite torna-o "azedo", indicando uma

redução do pH. Esse fato provoca a precipitação das proteínas do leite, formado o coalho.

A partir da fermentação lática pode ser obtido o ácido lático, o qual encontra

inúmeras aplicações na indústria. A fermentação lática é também é largamente utilizada na

preservação dos alimentos. Importantes produtos de origem vegetal como picles, chucrute

e azeitonas e de origem animal como queijos e embutidos fermentados (salames.piperoni)

são elaborados por meio da fermentação lática. Outros produtos como iogurtes, leite

acidófilo, bebidas como “Quefir”, coalhadas, polvilho azedo e manteigas também incluem

a fermentação lática no processo de produção. Também é empregada para a conservação

de forrageiras (silagem), onde contribui para o aumenta da digestibilidade da forrageira,

melhora o sabor e contribui para o enriquecimento protéico.

Na fermentação de produtos pouco ácidos como leite e carnes, a fermentação lática

é realizada com objetivo de aumentar a concentração de microorganismos fermentadores.

Para reduzir o tempo de fermentação e inibir o crescimento de germes patogênicos e

deterioradores, adiciona-se uma determinada quantidade de microorganismos selecionados,

com o objetivo de iniciar a fermentação; essa cultura de microorganismos é conhecida

como "cultura starter".

10.2.1 Produção de Ácido Lático por Fermentação

ácido 2-hidroxipropanóicoácido 2-hidroxipropanóicoácido 2-hidroxipropanóico

O ácido lático, ácido 2-hidroxipropanóico foi isolado por em 1880 por um químico

Sueco (Carl Wilhelm Scheele) a partir de leite azedo. Tornou-se comercialmente

importante desde 1881 tendo aplicação nas indústrias alimentícia, farmacêutica, cosmética,

têxtil, de couro e química.

Na indústria química é empregado como matéria-prima para produção de plásticos

biodegradáveis. No entanto, a maior aplicação do ácido lático e seus derivados é efetuada

na indústriade alimentos, onde é utilizado com as funções de diminuição de pH; como

Page 93: Apostila TF

93

agente antimicrobiano; adjuvante de sabor; solvente; estabilizador; umectante;

emulsificador; plasticizante, além de ser reconhecido como seguro pela “Food and Drug

Administration” (FDA).

O ácido lático pode ser obtido tanto pela ação fermentativa de bactérias, fungos e

leveduras quanto por síntese química. Porém, os processos fermentativos podem ser mais

vantajosos do ponto de vista econômico. A produção de ácido lático em escala comercial

ainda é feita, em sua maioria, pela fermentação descontínua.

As bactérias láticas são bastante exigentes quanto às condições de crescimento. O

açúcares representam as melhores fontes de carbono para estas bactérias, havendo também

necessidade de fonte de nitrogênio, vitaminas e sais minerais para o bom desempenho da

fermentação lática.

Devido à sua estrutura química, o ácido lático ocorre em duas formas isoméricas: ácido L

(+) lático e ácido D (-) lático. Ambas as formas isoméricas podem ser utilizadas para a

síntese de polímeros com diferentes propriedades. Por outro lado, sob o ponto de vista

nutricional, o uso ou a formação (por fermentação) de ácido D (-) lático em alimentos e

bebidas é indesejável uma vez que esta forma isomérica não é facilmente metabolizada por

mamíferos, incluindo humanos. Além disso, o consumo excessivo de ácido D (-) lático

pode levar a distúrbios médicos e não é recomendado na alimentação de bebês e crianças.

Até pouco tempo atrás (início da década de 90), a produção de ácido lático em

escala comercial era considerada uma tecnologia madura, com uma produção global média

em torno de 40 mil toneladas por ano. Até então, tanto a fermentação quanto a síntese

química eram igualmente utilizadas em escala industrial. O ácido L (+) lático obtido por

fermentação era destinado principalmente para o uso como acidulante em alimentos

processados. Por outro lado, o ácido lático obtido por síntese química era utilizado

principalmente para a produção de derivados devido à maior pureza química, apesar de sua

natureza racêmica.

O emprego de síntese química para a produção de ácido lático em escala industrial

foi largamente substituído pelo processo fermentativo, baseado no cultivo anaeróbio de

Lactobacillus.

Cerca de 90% da produção mundial é obtida por fermentação, enquanto o restante é

obtido sinteticamente através da hidrólise de lactonitrila. Rendimentos, concentrações e

produtividades da ordem de 95%, 100g/l e 2g/lh, respectivamente, são obtidos em escala

industrial. A produção global nos dias atuais é estimada como sendo em torno de 100 mil

toneladas por ano, com um valor de mercado da ordem de 150 milhões de dólares.

Page 94: Apostila TF

94

As bactérias láticas são os catalisadores preferidos para a produção de ácido lático.

Atualmente, estas bactérias são compostas pelos seguintes gêneros de bactérias gram-

positivas: Carnobacterium, Enterococcus, Lactobacillus, Lactococcus, Leuconostoc,

Oenococcus, Pediococcus, Streptococcus, Aerococcus, Tetragenococcus, Vagococcus e

Weissela.

Em geral, as bactérias láticas são anaeróbias facultativas. Devido à tolerância ao

oxigênio, a exclusão completa deste elemento durante as fermentações não é um requisito

absoluto. A temperatura ótima de crescimento varia entre 20 e 45ºC, dependendo do

microrganismo considerado. Estas bactérias exibem baixa atividade proteolítica e

lipolítica, e apresentam capacidade limitada de biosíntese, requerendo a adição de

aminoácidos e vitaminas do complexo B ao meio de cultivo para crescimento.

Incapazes de sintetizar ATP por meio de respiração, as bactérias láticas obtêm

energia através de fosforilação ao nível de substrato. Dependendo das vias metabólicas

utilizadas durante o metabolismo de açúcares, a fermentação pode ser homolática (ácido

lático obtido como único produto do metabolismo), heterolática (CO2, etanol e/ou acetato

obtidos como subprodutos do metabolismo, ao lado de ácido lático).

Além disso, dependendo das condições prevalecentes durante o cultivo, o

metabolismo de açúcares pelas bactérias láticas pode ser alterado, resultando em

subprodutos adicionais. Em teoria, bactérias homofermentativas como Pediococcus,

Streptococcus, Lactococcus e alguns Lactobacillus produzem 2 moles de lactato e 2 moles

de ATP por mol de glicose consumida.

A proporção entre os isômeros, L (+) e D (-), obtidos durante a fermentação varia

com o gênero e, dentro de um mesmo gênero, com a espécie do microorganismo. Ácido L

(+) lático é produzido por Aerococcus, Carnobacterium, Enterococcus, Lactococcus,

Tetragenococcus, Streptococcus, e Vagococcus. Ácido D (-) lático é produzido por

Leuconostoc e Oenococcus. Microorganismos dos gêneros Lactobacillus, Pediococcus e

Weissella produzem ambas as formas isoméricas, isolada ou conjuntamente, dependendo

da espécie considerada e das condições de cultivo.

Page 95: Apostila TF

95

Processo fermentativo de Produção do Ácido Lático

Fluxograma esquemático do processo fermentativo de produção de ácido lático

Matéria-prima: amido hidrolisado, xarope de dextrose, outros açucares, subprodutos( soro

de queijo, melaço, água de maceração de milho); usado suplementos como vegetais crus

(fontes de vitaminas do complexo B) e Carbonato de Cálcio (2 moles por mol de hexose);

1. Usados comercialmente Lactobacilos homofermentativos;

2. 12-13 % de substrato para evitar a cristalização do lactato;

3. Processo sem aeração (os lactobacilos são estritamente fermentativos –

aerotolorantes ou anaeróbios);

4. Agitação lenta para manter o CaCO3 suspenso;

5. Controle de p 6,3-6,5 (72 h de cultivo);

6. O substrato açúcar deve ser todo consumido pois interfere na recuperação do ácido

(YC: 99,9%);

7. Rendimento do processo: 93 % - 95 %;

8. Dowstrem: As células são separadas do caldo fermentado por filtração, o filtrado é

tratado com ácido sulfúrico para a precipitação do cálcio (CaSO4.2H20). A

suspensão é filtrada e o cálcio precipitado é lavado. A água de lavagem do sulfato

de cálcio é misturada ao filtrado e o ácido é recuperado por evaporação. Para uso

alimentício (solução 50 %) antes do processo de recuperação a solução é submetida

a processo de descoloração com carvão ativado;

Page 96: Apostila TF

96

Obs.: Vantagens da Rota Fermetativa sobre a Química

• Algumas cepas podem produzir a forma D ou L pura, enquanto a rota química

produz sempre uma mistura racêmica;

• Possibilidade de uso de substrato de fontes renováveis (já existe cepas

recombinantes capazes de fermentar xilose e, portanto a possibilidade de uso de

material lignocelulósico).

10.2.2 Fermentação Lática de Vegetais

Processo Fermentativo de produção do Chucrute

Segundo as Normas Técnicas Especiais Relativas a Alimentos e Bebidas, chucrute

é o produto obtido pela fermentação lática de repolho (Brassica oleraceae), principalmente

da variedade branca, lisa, e apresentando-se sob a forma de tiras finas, úmidas de cor

amarelo-esverdeada e de gosto ácido característico.

Fluxograma esquemático do processamento do chucrute

Processamento:

Recepção: Deve-se fazer uma seleção, usando apenas cabeças firmes, de alta densidade e

sadias. Normalmente são deixadas em locais sombreados e bem aerados para murchar um

pouco e evitar quebras no corte.

Page 97: Apostila TF

97

Preparo: Remoção das folhas externas manualmente e retirada do caule por meio de facas

cônicas rotativas ou manualmente. A seguir o repolho é cortado em tiras finas.

Adição de Sal: Comumente são utilizadas quantidades entre 2 % e 3 % (2,5 %). O sal deve

ser bem misturado com o repolho picado. O repolho picado e salgado é levado aos tanques

ou tonéis de fermentação, onde deve ser bem compactado para criar um ambiente

anaeróbio. O sal mais a compactação extraem o suco do repolho e, após cheio, o tanque ou

tonel cobre toda a massa compactada. É colocada uma falsa tampa no tanque ou tonel e

sobre esta tampa pesos para manter a compactação e evitar a flotação pois, no início da

fermentação, quantidades consideráveis de gás são produzidas.

A flora natural do repolho é variada e suficiente para produzir uma boa

fermentação, mas também há a flora deteriorante que, em princípio é inibida pelo sal, mas

às vezes deteriora o produto ou provoca reações paralelas, permitindo uma variabilidade no

produto final, principalmente em sabor e aroma, pela produção de compostos orgânicos

variados. Por isso, pode ser usado culturas puras, que são inoculadas no repolho picado.

A temperatura ideal para a fermentação é de 18ºC. Deve-se remover a pelícola

formada na superfície para evitar a degradação do ácido lático ou então cobrir o selo

líquido com óleo mineral. O chucrute, após fermentação, tem em média 1,8 % de ácido

lático, mas pode passar de 2 % em alguns casos (máximo de 3 %).

Enlatamento: A estabilização térmica do chucrute é feita geralmente por enchimento a

quente (acima de 85ºC), ma vez que a penetração de calor no chucrute em latas é bastante

difícil.

O chucrute é colocado em tacho encamisado e aquecido sob agitação até próximo à

temperatura de fervura. A seguir ele é enlatado prensado e coberto com o próprio caldo

quente de fermetação. Em seguida as latas são fechadas, de preferência sob fluxo de vapor,

dando-se após um rápido tratamento em banho-maria para esterilizar o recipiente e a

tampa. Ou então, desde que a temperatura de enchimenrto esteja acima de 90ºC, faz-se a

inversão do recipiente durante 5 minutos para esterilização da tampa.

Após o enlatamento, pasteurização o produto segue para as etapas de resfriamento,

estocagem, rotulagem e encaixotamento.

Processamento de Azeitonas

Para esse tipo de produto, utilizam-se apenas azeitonas de cor verde ou ligeiramente

amareladas. As verdes, bastante amargas, são colocadas em tanques de madeira ou de

Page 98: Apostila TF

98

cimento, a fim de passar por tratamento com soda. Essa operação tem por finalidade

remover parcialmente o amargor resultante do glicosídeo oleuropeína. Os frutos são

tratados com uma solução de soda (NaOH), cuja concentração varia de 1,25% a 2 %. As

soluções mais fortes devem ser usadas com cuidado a fim de se evitar a queima ou

amolecimento dos frutos. Os lotes das variedades de frutos grandes devem ser tratados com

mais cuidado. A solução fica em contato com os frutos até que penetre cerca de dois terços

(2/3) da espessura da polpa. A penetração da solução de soda pode ser controlada com o

auxílio de solução alcoólica de fenolftaleína a 1 %. O tempo para a penetração da soda

varia de 4 a 12 h, ou mais, dependendo da concentração de soda, variedade, tamanho dos

frutos, temperatura da solução, grau de maturação, etc. Uma pequena da polpa, junto ao

caroço, não deve ser tratada, porque um ligeiro amargor é essencial para dar ao fruto

fermentado o sabor e aroma característico. Uma vez terminado o tratamento com soda,

afim de se remover o seu excesso, procede-se à lavagem dos frutos. Fazem-se trocas de

água frequentemente, sendo que, de modo geral, é feita de 4 em 4 horas durante o dia e

intervalos de 10 horas durante a noite. Os frutos são lavados até que cerca de 75%-80%

deles não apresentem mais reação com a fenolftaleína. As azeitonas devem ficar

completamente abrigadas de contato com o ar, o que se verifica apenas durante a troca de

água e deve ser feita o mais rapidamente possível, para evitar o seu escurecimento. Após a

lavagem, são colocadas em barris com salmoura. Geralmente, empregam-se barris com

capacidade para 545 litros (170 galões). Em cada um deles são colocados

aproximadamente 125 quilos de frutos, que devem ficar completamente cobertos por 76

litros de salmoura. Os barris fechados com batoques, preferivelmente, de carvalho usados

são colocados nos terreiros, em cima de suportes de madeira e conservados deitados, a fim

de sofrerem a fermentação lática. Antes de ser utilizados devem ser lavados, inteiramente,

com uma solução aquecida de carbonato de sódio, com água quente e tratados com vapor.

Devem passar por um tratamento enérgico, de modo a se eliminar, completamente, todo o

aroma e o sabor estranhos. A salmoura utilizada apresenta uma concentração que varia de

6 % a 8 %, dependendo da variedade que está sendo processada. Para algumas delas é

necessário iniciar a fermentação com uma salmoura de concentração mais baixa e elevá-la

gradativamente, a fim de se evitar o enrugamento dos frutos. As azeitonas em contato com

a salmoura vão absorvendo certa quantidade de sal e a concentração, na salmoura, pode

baixar para 2,5 %. Mais sal é adicionado, gradativamente, para elevar a concentração de

salmoura até 6-8%. Durante esse período, processa-se a fermentação lática, que dura de 6 a

10 semanas ou mais. A flora microbiana presente vai depender da concentração da

Page 99: Apostila TF

99

salmoura. No caso da fermentação de azeitonas da variedade “Manzanillo”, a concentração

de salmoura varia de 7-8% e é encontrado quase que exclusivamente espécies

homofermentativas de Lactobacillus plantarum. Quando se utilizam concentrações de

salmoura ao redor de 5 %, encontram-se espécies homofermentativas e heterofermentativas

de Lactobacillus. Durante a fermentação pode ocorrer a formação de gás, que provocará a

perda de certa porção da salmoura. A fim de se evitar a exposição dos frutos ao ar, o nível

da salmoura, nos barris, deve ser ajustado diariamente, se exigido. Para que ocorra a

fermentação lática, é necessário que os frutos apresentem certa quantidade de açúcares

fermentescíveis. Os frutos frescos de azeitona geralmente contêm glicose, frutose, sacarose

e manitol. Entretanto, durante o tratamento com a solução de soda, cerca de 5 % dos

açúcares podem ser destruídos, o que acarretará retardamento na fermentação lática. Nesse

caso, é conveniente juntar certa quantidade de açúcar aos barris com a finalidade de

acelerar a fermentação. Empregam-se, geralmente, cerca de 450-900 gramas por barril. O

comumente utilizado é o de milho (glicose). Durante a fermentação, cuja temperatura não

deve ser inferior a 24ºC, o pH vai decrescendo, terminando o processo fermentativo

quando baixar para 3,8. Muitas vezes, para evitar o aparecimento de fermentações

indesejáveis, junta-se à salmoura certa quantidade de ácido lático. O produto final terá uma

acidez de 0,8 a 1,25 %, calculada em ácido lático presente na salmoura. A cor verde inicial

dos frutos adquire, no produto final, tom verde-amarelado. As azeitonas são colocadas em

vidros cheios com salmoura a 7-7,5% e lavadas várias vezes para eliminar os sedimentos.

Algumas vezes esta é acidificada com ácido lático na base de 0,25-0,50 gramas/cm3, antes

de ser adicionada aos vidros.

10.3 Fermentação Acética

10.3.1 Vinagre

O vinagre, assim como o vinho, a cerveja, o pão, o Kefir e o iogurte, é um alimento

fermentado conhecido há milhares de anos. Seu nome provém do francês vinaigre ou vinho

azedo, estendendo-se a quase todas as línguas ocidentais (excesso o italiano aceto e o

alemão essig).

As primeiras referências do vinagre datam de 8000 anos a.C. Na época, tratava-se

de um condimento muito aproveitado devido às propriedades benéficas ao organismo

humano e à sua importância na alimentação. Foi muito utilizado como bebida refrescante,

Page 100: Apostila TF

100

diluído na água e também como medicamento. Foi recomendado, também, para tratar de

disfunções respiratórias, feridas e úlceras, devido às suas propriedades desinfetantes e

antiinflamatórias.

Na cozinha, o emprego do vinagre era generalizado e constante. Nas guerras, o

vinagre era recomendado aos soldados, principalmente quando atuavam em ambientes

úmidos, fazendo parte da ração diária, para prevenir possíveis contaminações

microbiológicas, para desinfetar e temperar os alimentos.

Nas epidemias de cólera que ocorreram no passado, o vinagre foi utilizado para

desinfecção, para isso recomendavam lavar as mãos antes e depois de visitar um doente e

lavar as frutas e verduras antes do consumo. Estudos posteriores mostraram que um

vinagre com 5% de ácido acético é letal para os vibriões da cólera, quando em contato por

cinco minutos.

O vinagre é o produto da transformação do álcool em ácido acético por bactérias

acéticas, estando sua história estreitamente ligada com a do vinho. Lavoisier (1743-1794),

em 1790, comprovou cientificamente a responsabilidade do oxigênio na formação do

vinagre e, Pasteur (1822-1895), 74 anos mais tarde, comprovou a necessidade de um

fermento vivo para transformação do etanol em ácido acético. A primeira equação química

representando a formação do ácido acético a partir do etanol foi descrita por Dobereiner

em 1822.

O vinagre é considerado um condimento, pois a sua principal finalidade é atribuir

gosto e aroma aos alimentos. Os condimentos, de modo geral, quando ingeridos em

quantidades moderadas, estimulam a digestão. O vinagre apresenta propriedades

estimulantes, pois favorece a secreção do suco gástrico aumentando a ação dissolvente. Em

quantidade moderada, a ação do vinagre é somente local, excitando as glândulas

secretoras; a sua pequena adstringência e ação moderadora sobre os capilares das mucosas

fazem dele um moderador da sede. Quando ingerido em excesso, a ação digestiva é

prejudicada até o momento que se torna corrosivo para a mucosa gastrointestinal. Nesse

sentido, não é adequado para pessoas nervosas e com os órgãos respiratórios irritáveis.

A ação do vinagre sobre os alimentos dá-se no sentido de torná-los mais digestivos,

especialmente os fibrosos que são amaciados e transferidos em melhores condições para

serem tratados pelo suco digestivo. Para o organismo humano, a reação ácida não só

aumenta a atividade dos fermentos gástricos, mas promove ao mesmo tempo um efeito

excitante da glândula pancreática. O homem, em geral, sente uma sensação agradável

quando degusta produtos com acidez compreendida entre 0,3% e 0,8%. O ácido acético do

Page 101: Apostila TF

101

vinagre é, entre os ácidos orgânicos, o mais dissociável, de onde resulta sua ação favorável

à digestão. Devido ao baixo peso molecular do ácido acético, o vinagre é considerado um

produto superior em relação aos outros alimentos ácidos cuja molécula apresenta maior

complexidade estrutural e, assim sendo, de mais difícil solubilidade e absorção.

O vinagre também é utilizado para conservar vegetais e outras substâncias,

atribuindo-lhes gosto agradável. Além disso, é empregado como purificador de ar. Nesse

sentido, foi utilizado no passado como desinfetante. Nas epidemias de cólera, que

arrasaram a Europa, a recomendação era lavar com vinagre todas as frutas e hortaliças

antes do consumo. O vinagre não apresenta ação antisséptica somente contra a cólera, mas

também em relação à Salmonella spp. e outros patógenos do intestino que causam

infecções e epidemias. O vinagre assegura um ambiente ácido do suco gástrico que

representa uma defesa contra as intoxicações microbianas que podem ocorrer.

O vinagre foi utilizado, no passado, também como medicamento, na cura de feridas

e úlceras, devido a sua propriedade desinfetante e antiinflamatória.

O vinho e o vinagre foram os dois primeiros produtos de fermentação espontânea

utilizados pelo homem na alimentação. Embora o termo vinagre, isoladamente,

corresponda ao produto obtido da acetificação do vinho, a matéria-prima utilizada para sua

elaboração é variável em função da disponibilidade de cada país. Assim, na Itália,

Espanha, França e Grécia, países de grande tradição vitícola, o vinagre é feito sobretudo de

vinho. Na China e no Japão, é feito a partir do arroz, enquanto que nos Estados Unidos e

na Inglaterra, a partir da sidra e do malte. Na Alemanha, é mais utilizado o vinagre de

álcool.

No Brasil, os vinagres são elaborados principalmente a partir do álcool de cana-de-

açúcar e do vinho. E, assim como em outros países com culturas semelhantes, a maior

parte da população não dá a devida importância á qualidade dos vinagres, considerando-o

apenas como um condimento azedo, menosprezando-se, assim, suas propriedades

nutritivas, sensoriais, sanitizantes e até medicinais. Esse comportamento induz à produção

a partir de matérias-primas cada vez mais baratas e por processos cada vez mais

produtivos, obtendo-se, por conseguinte, vinagres que se apresentam realmente apenas

como uma solução ácida, em detrimento da obtenção de vinagres finos originados de

vinhos de frutos, mel, cereais, etc., tão apreciados em países com elevado grau de

desenvolvimento, cujo preço de uma única garrafa pode atingir dezenas de dólares, sendo

comum a realização de testes sensoriais por degustadores experientes, similarmente ao que

ocorre com vinhos, cervejas e uísques.

Page 102: Apostila TF

102

10.3.2 Microbiologia da Fermentação Acética

A fermentação acética corresponde à transformação do álcool em ácido acético por

determinadas bactérias, conferindo o gosto característico de vinagre.

As bactérias acéticas constituem um dos grupos de microrganismos de maior

interesse econômico, de um lado pela sua função na produção do vinagre e, de outro, pelas

alterações que provocam nos alimentos e bebidas.

Inicialmente, as bactérias acéticas foram designadas por Micoderma vini. Depois,

em relação ao aspecto morfológico, foram classificadas em três espécies: Bacterium aceti,

Bacterium pasteurianum e Bacterium kurtzingianus. Somente em 1898 foram classificadas

como sendo do gênero Acetobacter.

Pela classificação atual, as bactérias acéticas pertencem à família

Pseudomonodaceae; aos gêneros Acetobacter e Gluconobacter. As principais espécies de

bactérias acéticas são: Acetobacter aceti, Acetobacter pasteurianus, Acetobacter xylinum,

Acetobacter schützenbachii e Gluconobacter oxydans.

As bactérias acéticas são particularmente instáveis, mostrando acentuado

polimorfismo e variação da propriedade bioquímica. Em alguns casos, podem perder até

mesmo a capacidade fundamental de oxidar o etanol a ácido acético.

As principais espécies de Acetobacter, utilizadas na produção de vinagre,

apresentam-se nas formas de bastonetes e cocos, formando correntes e filamentos. Em

relação à temperatura, o melhor rendimento é obtido entre 25°C e 30°C, embora suportem

temperatura mínima de 4°C a 5°C e máxima de 43°C. No entanto temperaturas inferiores a

15°C e superiores a 35°C tornam a fermentação acética muito lenta, pois reduzem a

atividade bacteriana. Quanto ao álcool, a maior parte das espécies suportam até 11,0% v/v.

Em relação ao ácido acético, as bactérias acéticas geralmente suportam até 10,0%.

A bactéria acética ideal é aquela que resiste à elevada concentração de álcool e de

ácido acético, com pouca exigência nutritiva, elevada velocidade de transformação do

álcool em ácido acético, bom rendimento de transformação, sem hiperoxidar o ácido

acético formado, além de conferir boas características gustativas ao vinagre.

Essas bactérias acéticas necessitam do oxigênio do ar para realizarem a

acetificação. Por isso multiplicam-se mais na parte superior do vinho que está sendo

transformado em vinagre, formando um véu conhecido como "mãe do vinagre". Esse véu

pode ser mais ou menos espesso de acordo com o tipo de bactéria.

Page 103: Apostila TF

103

Segundo a equação da reação oxidativa, o rendimento da transformação do álcool

em ácido acético é o seguinte:

CH3 - CH2OH + O2 ---> CH3 - COOH + H2O

46g de álcool ---> 60g de ácido acético

1g de álcool ---> 1,304 g de ácido acético Na prática, para se determinar a quantidade de ácido acético de um vinagre a partir

do vinho que lhe deu origem, estima-se que, para cada 1% v/v de álcool do vinho, forma-se

1% de ácido acético no vinagre. Por exemplo, um vinho de 10% de álcool originará um

vinagre de 10% de ácido acético, no entanto esse rendimento é baixo para os acetificadores

industriais. Outra maneira de calcular o rendimento em ácido acético é multiplicar o grau

alcoólico do vinho por 1,043. Nesse caso, o vinho com 10% v/v de álcool daria origem a

um vinagre de 10,43% de ácido acético.

As principais perdas de ácido acético, no processo de acetificação, são devidas ao

consumo elevado de álcool pelas bactérias, à evaporação natural dos constituintes voláteis

(álcool, ácido acético) e a problemas industriais.

Em alguns casos, as perdas de ácido acético podem ser mais elevadas devido à

transformação do ácido acético em água e dióxido de carbono, pela presença predominante

de bactérias Acetobacter xylinum.

Padronização e legislação

Pode-se definir vinagre com um alimento do grupo dos condimentos, obtido por

fermentação acética de soluções alcoólicas diluídas, sendo estas resultantes de

fermentações alcoólicas de mostos açucarados ou amiláceos. De acordo com a legislação

brasileira vigente os vinagres deverão apresentar:

COMPONENTES máximo mínimo Vinagre de vinho Acidez volátil em ácido acético (g/100 mL) 4,0 Etanol em volume a 20 ºC (G/L) 1,0 Cinzas 1,0 Extrato seco reduzido, tinto e rose (g/L) 7,0 Extrato seco reduzido, branco (g/L) 6,0 Sulfato de potássio (g/L) 1,0 Vinagre de álcool Acidez volátil em ácido acético (g/100 mL) 4,0 Etanol em volume a 20 ºC (G/L) 1,0 Extrato seco reduzido (g/L) 0,2 Resíduo mineral fixo (g/L) 0,02 Fonte: Aquarone, E., et al. (2001)

Page 104: Apostila TF

104

É proibida a elaboração de vinagres por diluições de ácido acético de origem não

fermentativa.

Para os vinagres concentrados, vigorarão as mesmas características, respeitadas as

proporções de concentração.

O vinagre será classificado em vinagre de vinho tinto ou de vinho branco, de

acordo com a matéria-prima que lhe deu origem. O produto resultante da fermentação

acética de outros líquidos alcoólicos será denominado fermentado acético, podendo ser

usada a palavra vinagre no rótulo, desde que seja acrescida do nome da matéria-prima de

sua origem. Exemplos: vinagre de álcool, vinagre de maça, vinagre de malte, etc.

Os vinhos destinados à fabricação de vinagre (vinho-base) deverão ser acetificados

na origem, pela adição de vinagre duplo, de modo que apresentem uma acidez acética

mínima de 0,6g/100 mL. Essa acetificação visa descaracterizar o vinho utilizado como

matéria-prima para acetificação como vinho de mesa.

A conservação deve ser feita através de pasteurização ou adição de dióxido de

enxofre, no limite máximo de 200 ppm.

É proibido o uso de corantes, melaço ou outro tipo de aditivo, salvo prévia

autorização do órgão competente.

O vinagre poderá ser submetido à colagem, clarificação, aeração e envelhecimento.

Terminologia da indústria do vinagre

� Vinagraria: estabelecimento destinado à elaboração de vinagres.

� Vinho-base: matéria-prima destinada à elaboração de vinagres.

� Vinagre forte não-pasteurizado: vinagre em estágio final de fermentação, usado

como inóculo para outra fermentação.

� Vinagre duplo ou triplo: vinagre com acidez igual ou superior a 8 % e 12 %,

respectivamente, que deverá ser diluído para obtenção de vinagre comercial.

� Fermentado acético de frutas ou vinagre de frutas: denominação utilizada para

distinguir estes vinagres em relação aos de vinho tinto ou branco.

� Acetificação: processo de transformação do etanol do vinho-base em ácido acético.

� Acetificador: fermentador específico para realizar a acetificação

� Mãe do vinagre ou zoogléia: material gelatinoso (polissacarídeo, alfa-celulose)

produzido por bactérias acéticas, que ocupam a superfície do meio em fermentação

pelo processo lento.

� Sulfitagem: adição do dióxido de enxofre como conservante.

Page 105: Apostila TF

105

� E.T.A: porcentagem de aumento de ácido acético numa fermentação em 24 horas.

Ex.: E.T.A.2 significa que a cada 24 h se formam 2,0 g de ácido por 100 mL.

� G.K. (concentração total); soma da concentração de etanol e de ácido acético num

meio, em percentagem mássica. Ex.: % etanol = 4g/100 mL e porcentagem de ácido

acético = 6 g/ 1oo mL. G.K. = 4 + 6 = 10.

� Calda ou mistura: meio líquido contendo todos os nutrientes (incluindo álcool e

ácido acético) para que ocorra a fermentação acética. Equivale ao mosto de outras

fermentações.

Obs.: em tecnologia vinagreira, os termos mosto e vinho podem causar confusão,

pois o vinagre, produto da fermentação acética, poderia ser classificado genericamente

como vinho em tecnologia das fermentações. Por isso, é preferível a utilização dos termos

vinho-base, calda ou mistura para o mosto a ser acetificado e vinagre forte ou duplo / triplo

para o produto da acetificação.

Matérias-primas

Como o vinagre provém, em geral, de duas fermentações sucessivas, a alcoólica e a

acética, toda matéria-prima usada para a produção fermentativa de álcool serve, em

princípio, também como matéria-prima do vinagre.

Em função da matéria-prima da qual se parte, pode-se fazer a seguinte classificação

genérica de vinagres:

� Vinagres de sucos de frutas: uva, uva-passa, maçã, abacaxi, laranja, pêra. Morango,

framboesa, ameixa, figo, pêssego, jabuticaba, caqui, etc.

� Vinagres de tubérculos amiláceos: batata, batata-doce, mandioca, etc.

� Vinagres de cereais: cevada, centeio, trigo, arroz, milho, etc.

� Vinagres de matérias-primas açucaradas: xarope de açúcar, mel melaço, soro de

leite, etc.

� Vinagres de álcool propriamente dito diluído, aguardentes, outros destilados.

As matérias-primas amiláceas necessitam hidrólise prévia e esta preferencialmente

deve ser enzimática, pois as ácidas introduzem no meio, substâncias não indicadas para

fins alimentícios. As matérias-primas de origem vegetal (frutos, cereais, mel) já contêm

nutrientes suficientes para as bactérias acéticas. A fermentação alcoólica prévia também

contribui para o enriquecimento do meio. Por outro lado, para a fabricação de vinagre de

destilados, a adição de nutrientes é indispensável.

Page 106: Apostila TF

106

O emprego de vinhos de qualidade inferior ou com algum defeito de fabricação é

fato comum, entretanto algumas subst6ancias indesejáveis podem passar para o vinagre,

depreciando sua qualidade.

Bebidas alcoólicas contendo conservantes ou mesmo antissépticos naturais como o

lúpulo da cerveja, podem afetar o andamento da acetificação.

A água utilizada para o preparo de mostos, cujas matérias-primas não possuam fase

líquida suficiente, deve ser potável, de baixa dureza, livre de sedimentos ou partículas em

suspensão e isenta de cloro.

10.3.3 Processos de Fabricação (Acetificação)

Processo lento

Antigamente, o vinagre era produzido lentamente através do contato de um

substrato alcoólico com o ar, como por exemplo o vinho, a cerveja, o hidromel, o álcool de

batata e o álcool de cana-de-açúcar. Havia intervenção humana apenas para acrescentar um

pouco de vinagre não pasteurizado ou uma porção de uma massa gelatinosa (mãe do

vinagre) onde estavam presentes as bactérias acéticas. Renovando o substrato e extraindo o

vinagre, conseguia-se continuar a acetificação, obtendo-se vinagres com 4% a 5% de ácido

acético e uma certa quantidade de álcool sem acetificar. O processo lento de acetificação e

a presença de álcool residual favorecem a formação de ésteres e outros compostos voláteis

que conferem aroma e sabor peculiar aos vinagres assim elaborados.

Em Orléans, na França, o método de acetificação foi aperfeiçoado e designado com

o nome da cidade. O processo Orléans é o mais antigo e tradicional método de elaboração

do vinagre. Ele consiste em favorecer o contato do ar com uma fina camada gelatinosa, que

se mantém na superfície do vinho (mãe do vinagre). O vinho é colocado para acetificar em

barris de madeira adaptados e designados de acetificadores (Figura 31).

Para iniciar o processo de elaboração do vinagre, recomenda-se adicionar cerca de

10% do volume útil do acetificador de um vinagre não pasteurizado, isto é, com as

bactérias ativas, que funcionam como pé-de-cuba. Não é necessário adicionar substâncias

nutritivas para o desenvolvimento das bactérias acéticas, visto que elas estão presentes

naturalmente no vinho.

Depois de 15 dias, pode-se retirar, aproximadamente, 10% do volume do vinagre

que deve ser substituído pelo mesmo volume de vinho para acetificar. A seguir, a operação

de retirada de vinagre e colocação de vinho pode ser realizada semanalmente, tornando-se

Page 107: Apostila TF

107

o processo contínuo. Sempre que se retirar o vinagre, é importante efetuar uma análise,

para verificar a sua qualidade.

A retirada do vinagre e a adição do vinho no acetificador deve ser feita com

cuidado para evitar o rompimento do véu e a conseqüente precipitação das bactérias no

fundo do recipiente.

Figura 31 - Recipiente utilizado para elaboração de vinagre pelo processo Orleans.

Fonte: Aquarone et al. (1983)

As dimensões dos barris são estabelecidas em função da quantidade de vinagre a

elaborar. As aberturas para passagem do ar deverão ser protegidas por uma tela fina para

evitar a entrada da mosquinha-do-vinagre.

Os barris são colocados em locais onde a temperatura permanece elevada no

inverno, para que a acetificação ocorra de forma mais rápida. Os rendimentos da

transformação do álcool em ácido acético são baixos. Entre os principais aspectos

negativos do processo, destaca-se a possibilidade de proliferação de bactérias produtoras

de celulose e consumidoras de ácido acético além do aparecimento de anguilulas.

Deve-se sempre evitar o contato do vinho e do vinagre com materiais ou

equipamentos que contenham ferro, cobre, alumínio ou outros metais que causam

problemas de turvação e de toxicidade.

Processo rápido(alemão)

Os processos rápidos de elaboração de vinagre foram desenvolvidos a partir do

início do século XVII, com a utilização de diferentes materiais porosos como sabugo de

milho, engaço da uva e, especialmente, maravalha de madeira, para aumentar a superfície

de contato das bactérias acéticas com o vinho. Inicialmente, utiliza-se maravalha de

Page 108: Apostila TF

108

madeira para enchimento de um recipiente tronco-cônico, provido de orifícios para

ventilação nas paredes laterais (Figura 32).

Figura 32 - Corte transversal de um acetificador com suporte poroso; A) grade; B) maravalha de

madeira; C) bomba para movimentação do vinho em processo de acetificação; D)dispersor do vinho; E)

refrigerante de água; F) dispositivo de condensação de vapores.

Fonte: Aquarone et al. (1983)

Um falso fundo permite recolher o vinho em processo de acetificação, que passa

pela camada porosa formada pela maravalha e é recolocado na parte superior tantas vezes

quantas necessárias, para alcançar o grau acético desejado. Como no caso anterior, o início

do processo é feito a partir de um vinho adicionado de aproximadamente 10% de vinagre

não pasteurizado como pé-de-cuba. A mistura de vinho e vinagre, na passagem através da

maravalha, recebe o ar que se movimentava de baixo para cima devido ao aquecimento

provocado pelo calor liberado no processo de acetificação. Esse processo é mais rápido que

o método Orleans. Quando a concentração de álcool do vinho utilizado para acetificação

alcançar próximo a 0,3% v/v, retira-se aproximadamente 4/5 do volume de vinagre, que é

substituído por um mesmo volume de vinho reiniciando-se o processo. A retirada de

vinagre é feita, em média, a cada 10 dias.

Esse sistema de acetificação representa o primeiro passo para a industrialização do

processo de elaboração do vinagre. No entanto, mesmo tendo representado um notável

avanço tecnológico, o processo apresenta alguns problemas, tais como:

Page 109: Apostila TF

109

� perda de substâncias voláteis por evaporação é de aproximadamente 10%, é

portanto, muito elevada;

� material utilizado como suporte, geralmente maravalha de madeira, se contamina

facilmente, exigindo uma limpeza periódica, o que ocasiona sua substituição

praticamente todos os anos;

� novo material necessita de um minucioso acondicionamento até a sua impregnação

de vinagre.

Processo submerso

Atualmente, a rapidez na produção industrial do vinagre determina a preferência

pelo sistema que utiliza a fermentação acética submersa.

Nesse caso, também o processo inicia com um vinho previamente acetificado com,

aproximadamente, 10% de vinagre não pasteurizado que funciona como pé-de-cuba.

O método baseia-se na presença da bactéria acética submersa no vinho para

acetificar, saturado constantemente por finas partículas de ar. Diferentemente dos

processos anteriores, as bactérias acéticas se encontram imersas no vinho, sem nenhum

suporte de material poroso, mas em íntimo contato com o oxigênio do ar proveniente de

intenso arejamento. O equipamento utilizado é formado por um recipiente de grande

capacidade, geralmente feito de aço inoxidável, com uma turbina de ar no fundo e tubos

por onde circula a água para refrigeração que funciona automaticamente (Fig. 33 e 34). Ao

entrar no fermentador acético, o ar é dispersado de forma homogênea em todo o vinho e na

forma de borbulhas de tamanho menor possível. Quando o vinho do fermentador alcançar

aproximadamente 0,2% v/v de álcool, o que acontece em intervalos de 30 a 40 horas,

retiram-se aproximadamente de 40% a 45% do volume de vinagre que é substituído pelo

mesmo volume de vinho a acetificar. O controle da temperatura nesse processo é feito

mediante um sistema interno de refrigeração, que funciona automaticamente.

Page 110: Apostila TF

110

Figura 33. Vista geral de um acetificador em aço inoxidável.

Fonte: Mecca et al. (1979)

Figura 34 - Corte transversal de um acetificador para elaboração de vinagre pelo método com fermentação

acética submersa; a- turbina de ar; b- compensador de ar; c- dispositivo para coletar líquido de condensação;

d-e- dispositivo para controlar a formação de espuma; f- dispositivo para medir o álcool; g- serpentina para

refrigeração; h- dispositivo para refrigeração; i- termômetro; j- bomba para entrada do vinho; k- bomba para

retirada do vinagre.

Fonte: Mecca et al. (1979).

Page 111: Apostila TF

111

Através desse processo de acetificação, é possível reduzir as perdas por evaporação

para 3% a 5%, não havendo necessidade de material de suporte e, conseqüentemente, os

problemas advindos da sua manutenção. É possível incorporar sistemas automáticos para

carga e descarga do fermentador e controle de temperatura.

O vinagre produzido por esse processo apresenta-se turvo, com qualidade inferior

àquele obtido pelo método lento, devido ao revolvimento acentuado e persistente

provocado pela quantidade de ar introduzido sob pressão na acetificação.

Vinagre balsâmico

O vinagre balsâmico é um produto distinto devido ao processo de elaboração e às

características aromáticas que adquire. O mais conhecido é o "Vinagre Balsâmico

Tradicional de Modena" que é protegido por uma "Denominação de Origem" desde 1983.

A história do vinagre balsâmico inicia-se na região de Modena, pois as condições

de clima da região proporcionavam apenas produção de vinhos com baixa graduação

alcoólica, portanto não recomendados para exportação, mas apropriados para a produção

do vinagre.

O vinagre balsâmico é o produto obtido da fermentação alcoólica e acética do

mosto de uva Trebbiano, cozido, o qual é obtido a partir da uva esmagada e separado no

início da fermentação alcoólica. Ocozimento é feito em fogo direto até o teor de açúcar

alcançar valor compreendido entre 28 e 33 °Babo, o que corresponde a uma redução de

20% a 30% do volume inicial do mosto. Um mosto mais cozido dará origem a um vinagre

balsâmico mais doce. Os vinagres feitos de mostos menos cozidos são os preferidos e

necessitam de mais tempo para serem feitos. O mosto, assim concentrado, é colocado em

recipientes de madeira, até tornar-se vinagre balsâmico, o que acontece com o tempo, com

o tipo de recipiente e da madeira.

Uma bateria adequada para a elaboração de vinagre balsâmico é constituída de uma

barrica de madeira de amoreira de 60 L, uma de castanheira de 50 L, uma de cerejeira de

40 L, uma de fresno de 30 L e uma de carvalho de 20L. Uma vinagreira em condições deve

ter as barricas perfeitamente limpas e esterilizadas.

Os recipientes utilizados para elaborar o vinagre balsâmico são colocados em locais

quentes e bem arejados, para favorecer a atividade das bactérias acéticas. Geralmente, no

inverno, quando a atividade microbiana é reduzida devido ao frio, é o momento

recomendável para efetuar trasfegas e adição de mosto cozido. Nos demais períodos do

ano, o vinagre necessita de repouso e de um discreto acompanhamento. O tempo

Page 112: Apostila TF

112

necessário para a elaboração do vinagre balsâmico é de, no mínimo, 20 anos e é comum

encontrarem-se vinagres com até 50 anos.

No início do processo de elaboração do vinagre balsâmico, é recomendável deixar a

abertura superior da barrica coberta apenas com um pano, para proteger da entrada de

poeira e insetos e favorecer a aeração. Somente mais tarde é recomendável utilizar um

batoque de madeira para fechar a abertura da barrica.

Visto que o vinagre balsâmico é considerado um produto tradicional na Itália, é

muito difícil definir um processo de produção em escala industrial.

O aspecto microbiológico da formação de vinagre balsâmico é importante, pois as

fermentações alcoólica e acética ocorrem simultaneamente no mosto. A fermentação

alcoólica acontece, geralmente, com a participação de leveduras osmofílicas do gênero

Zygosaccharomyces, que se caracterizam pela baixa capacidade fermentativa, pois

fermentam lentamente e produzem apenas de 5% a 6% de álcool, além de quantidades

elevadas de acidez volátil. Essa fermentação ocorre no primeiro recipiente e, normalmente,

não adquire aspecto tumultuoso. Por isso, muitas vezes, não é percebida e até mesmo

questionada na produção de vinagre balsâmico.

A fermentação acética também acontece no primeiro recipiente e conta com a

participação de bactérias acéticas do gênero Acetobacter que formam película na

superfície, constituindo a "mãe do vinagre".

Assim, no primeiro recipiente se concentra a atividade microbiológica; nos demais,

as transformações são de ordem físico-químicas (oxidação, combinações químicas,

evaporação).

O vinagre balsâmico, quando pronto, adquire aspecto denso, xaroposo e escuro,

com perfume e sabor doce/ácido inconfundível, resultado de todas as operações efetuadas

durante o longo período de elaboração e estocagem/envelhecimento nos diferentes tipos de

madeira.

O vinagre balsâmico é considerado um dos mais refinados condimentos. É

recomendável utilizá-lo em saladas e frituras, além de combinar perfeitamente e exaltar o

gosto e o aroma quando utilizado em pratos com carnes. É utilizado também em gargarejos

para proteger a garganta de determinadas infecções, além de ser considerado um ótimo

antioxidante.

Page 113: Apostila TF

113

Fatores que afetam a qualidade do vinagre

A qualidade de um vinagre está relacionada a sabor e aroma, maciez, limpidez e

composição dentro dos padrões definidos pela legislação específica.

Ao contrário do que ocorre com os vinhos, o aparecimento no vinagre de sabor e

aroma característicos da matéria-prima que o originou (uva de mesa, banana, maçã, etc)

não deprecia sua qualidade e, por vezes, até melhora.

Os principais fatores que podem afetar a qualidade dos vinagres são:

� Natureza, conservação, estado de maturidade e teor dos componentes da matéria-

prima;

� Tipo e controle do processo fermentativo utilizado;

� Presença de contaminantes ou infestantes nas fases de produção, acabamento e

armazenamento;

� Tempo de fermentação inadequado;

� Excesso ou carência de nutrientes;

� Utilização de aditivos impróprios;

� Processo de clarificação ou tempo de envelhecimento inadequado; e

� Embalagens impróprias

Dentre estes fatores, os que mais depreciam a qualidade dos vinagres nacionais são

a excessiva utilização de álcool como matéria-prima e a insuficiência no tempo de

envelhecimento.

Page 114: Apostila TF

114

Referências Consultadas

AMORIM, H. V (Organizador). Fermentação Alcoólica – Ciência e Tecnologia. Piracicaba: Fermentec,

2005, 448p.

AQUARONE, E.; BORZANI, W.; SCHMIDELL, W.; LIMA, U. A. Biotecnologia Industrial. São Paulo:

Edgard Blücher, 2003. v. 4, 523p.

BARBOSA, H. R.; TORRES, B. B. Microbiologia Básica. São Paulo: Editora Atheneu, 2005. 196p.

BAILEY, J. E.; DAVID, D. F. Biochemical Engineering fundamentals. New york: McGraw-Hill, 1986.

BLANCH, H.; CLARCK, D. Biochemical Engineering. Marcel Dekker, 1997.

BORZANI, W.; SCHMIDELL, W.; LIMA, U. A.; AQUARONE, E. Biotecnologia Industrial - Fundamentos.

São Paulo: Edgard Blücher, 2003. v. 1, 254p.

HOFFMANN, A. Embrapa Uva e Vinho. Sistema de Produção de Vinagre. Disponível em:

www.cnpuv.embrapa.br/publica/sprod/Vinagre/>. Acesso em: 27 fev. 2010.

LEHNINGER, A. L.; COX , M.M.;NELSON, D. L. Princípios de Bioquímica. São Paulo: Sarvier, 2006.

LIMA, U. A.; AQUARONE, E.; BORZANI, W.; SCHMIDELL, W.; Biotecnologia Industrial – Processos

Fermentativos e Enzimáticos. São Paulo: Edgard Blücher, 2003. v. 3, 593p.

O Processo de fabricação de Açúcar e Álcool na Usina Ester. Disponível em:

<http://www.usinaester.com.br/Produtos/produtos.html>. Acesso em: 27 fev. 2010.

PELCZAR, M. J.; REID, R.; CHAN, E. C. S. Microbiologia. 2ª Ed. São Paulo: Makron Books, 1996.

REGULY, J. C. Biotecnologia dos Processos Fermentativos – Fermentações Industriais / Biomassa Celular.

Pelotas: Editora e Gráfica Universitária – UFPel, 1996. v. 2, 222p.

REGULY, J. C. Biotecnologia dos Processos Fermentativos – Fundamentos. Pelotas: Editora e Gráfica

Universitária – UFPel, 1996. v. 1, 327p.

REGULY, J. C. Biotecnologia dos Processos Fermentativos – Produção de Enzimas / Engenharia das

Fermentações. Pelotas: Editora e Gráfica Universitária – UFPel, 1996. v. 3, 218p.

SCRIBAN, R. Biotecnologia. São Paulo: Manole Ltda, 1985.

SILVA,E.R.; NÓBREGA, O.S. e SILVA, R.H. Química- Transformações e energia. São Paulo: Editora

Áttica, 2001.

TORTOLA, G. J.; FUNKE, B. R.; CASE, C. C. Microbiologia. 8ª. Ed. São Paulo: Artmed, 2005.

VERMELHO, A. B.; PEREIRA, A. F.; COELHO, R. R. R.; SOUTO-PADRÓN, T. Práticas de

Microbiologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. 239p.

SCHMIDELL, W.; LIMA, U. A.; AQUARONE, E.; BORZANI, W.; Biotecnologia Industrial – Engenharia

Química. São Paulo: Edgard Blücher, 2003. v. 2, 541p.