Apresentação do PowerPoint · Facebook, a "Amor no Cabide". —Não passava de um teste, ninguém...

31

Transcript of Apresentação do PowerPoint · Facebook, a "Amor no Cabide". —Não passava de um teste, ninguém...

Jovens espalham cabides nas ruas para doação de agasalhosIniciativa surgiu em Porto Alegre e se espalhou por cidades brasileiras

Um projeto nascido numa tarde fria de Porto Alegre, em 2013, entre uma colherada e outra de caldinho de feijão, vem para aquecer o inverno de quem precisa. E surgiu de uma ideia simples: espalhar cabides pela cidade para que qualquer um pudesse pegar ou doar um agasalho.

No último 21 de junho, quase um ano após o almoço inspirador, as amigas Luana Flôres, 30 anos, Helena Legunes, 22 anos, e Laura Camardelli Brum, 24 anos, espalharam os primeiros cabides em três pontos da capital gaúcha e criaram a página do projeto no Facebook, a "Amor no Cabide".

— Não passava de um teste, ninguém esperava que desse tão certo — conta Luana, administradora.

E deu. Os exemplos iniciais se multiplicaram por meio de outros voluntários. Dezenas de cabides se espalharam por Porto Alegre, Caxias do Sul, Passo Fundo e outros Estados, como Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro. Na página no Facebook, onde as fotos do projeto e os "pontos de amor" em todo Brasil estão divulgados, já são quase 7 mil seguidores.— Tem até lojas que instalaram pontos na calçada e oferecem descontos para clientes que participem do projeto trazendo agasalhos para doação — conta Laura Brum, engenheira de produção.De tanta gente perguntando se era permitido copiar a ideia ("claro que é", respondem elas) e como se fazia para instalar um cabide de doação, o site do projeto já tem uma página com o passo-a-passo. Ela traz recomendações pertinentes: não colocar as roupas em árvores, protegê-las da chuva e, o fundamental, segundo as idealizadoras, conversar com as pessoas.— É importante que as pessoas não apenas levem roupas, mas que também conversem com quem está na rua, expliquem o projeto e façam com que se sintam a vontade para pegar o que precisarem. Que aproveitem esse momento para se transformar também — argumenta Luana.

Ver a população que precisa se beneficiar dessa ideia solidária já traria uma sensação suficientemente recompensadora. Mas elas garantem que a iniciativa não acaba em si.— Tem o exemplo de umas gurias de Caxias que não conheciam e, por quererem colocar o Amor no Cabide em prática na cidade, viraram amigas. Essas histórias paralelas vão além do projeto — conta Helena, especialista em Marketing.— O que mais me empolga com a continuidade desse projeto é o fato de ter saído da zona de privilégio, de deixar o quentinho da casa para conversar, para ouvir as pessoas que geralmente não são ouvidas. Acredito que essas pequenas ações mudam o nosso entorno —diz Luana.O trio garante que não tem segredo. É descomplicado assim: se você tem (agasalho, amor, sorriso), doe. Se você precisa, é seu.

— Você se dá conta de que quando faz o bem para os outros, acaba fazendo bem para si mesmo — conclui Laura.

Grade antimorador de rua ocupa quase um terço de calçada na Cidade Baixa

Síndico de prédio decidiu instalar a estrutura devido a reclamações de condôminos em relação ao mau cheiro

O espaço exato da marquise do prédio de número 393 da Rua da República, no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, está ocupado por uma grade antimorador de rua. A engenhoca começa na parede e vai descendo feito tobogã em direção ao chão. Assim, impede que qualquer pessoa invente de tirar uma soneca protegida das intempéries.O equipamento foi instalado pelo síndico contratado do Condomínio Puebla, André Rodrigues, baseado nas reclamações dos condôminos sobre o mau cheiro. A estrutura para evitar a presença dos moradores de rua no local, porém, vem sendo criticada nas redes sociais por ocupar quase um terço da calçada e pela desumanidade com os sem-teto.

Os vizinhos das redondezas não se identificam ao falar sobrea grade para não criar conflito com os condôminos do 393.Ao se aproximar, um senhor de cabelos grisalhos balançava acabeça negativamente, olhando para o aparato. Parou ereclamou:— Que absurdo. Não pode um negócio desses obstruindo acalçada — disse.Ao perguntar se queria se identificar, respondeu que "nessabriga não dá para se meter, não". Uma mulher que saía deum prédio próximo também criticou a instalação.— É um perigo. De noite pode vir alguém caminhando etropeçar na grade — alertou.Outra vizinha admitiu que colocaria uma cerca em torno daentrada do empreendimento que tem no bairro, se fossepermitido. Há 11 anos com um negócio nos arredores,avaliou que nunca houve tanto morador de rua no bairro. Elapensa em mudar de endereço porque os clientes acabamsendo "achacados" pelos moradores de rua.

Locatários de um apartamento no Puebla, a chefe de cozinha Ana Paula Cardoso, 26 anos, e o gerente de casa noturnaWelinton Pinzon, 26 anos, se posicionaram contra a instalação da grade e disseram que não foram consultados sobre a obra,apesar de admitirem que o mau cheiro era intenso no local e combatido com altas doses de criolina todas as manhãs. Elesreconhecem o problema social, no entanto lamentam que a prefeitura não resolva o problema dos sem-teto.

— Eu acho ridícula essa grade, mas quando chamaram aprefeitura não havia só dois moradores de rua deitados, eram atéoito. O único problema que tínhamos com os moradores de ruaera o cheiro — comentou Pinzon.O condomínio pagou cerca de R$ 1,5 mil pela estrutura. Quemadministra a conta do Puebla é a imobiliária Sperinde, queconfirmou que as decisões cabem ao síndico. Rodrigues avisouque, se a Smov resolver multar o condomínio, vai se defender:— A grade foi uma alternativa que a gente achou. Se a Smovquiser nos notificar, vou exigir o mesmo tratamento aos bares darua, que ocupam as calçadas com mesas e cadeiras.A Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) já acionou seusfiscais para irem até o prédio. O órgão informou que ocondomínio terá 30 dias para retirar a estrutura. Os moradorespodem receber multa de R$ 514 por obstrução da calçada.Uma cartilha do órgão define as regras para utilização dascalçadas, e proíbe diversos tipos de intervenções que possamatrapalhar a circulação.

Mesmo com a grade, dois moradores de rua dormiam tapados até a cabeça em frente ao prédio na manhã desta terça-feira,só que mais adiante, perto do meio-fio. Segundo vizinhos, outro costume na região é enxotar essas pessoas com jatos deágua de mangueira, como se lavassem a calçada.

Especialista classifica artimanha como "trágica regressãocivilizatória"Quem começou com essas táticas antimoradores de rua foio próprio Estado (ou seja, o poder público em geral), aofechar espaços embaixo de pontes e viadutos e instalarbarras em bancos de praça para evitar que alguém deiteneles. A constatação é do sociólogo Eber Marzulo, professordo Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano eRegional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul(UFRGS). Ele lembra que moradores de rua são intrínsecos àcivilização ocidental. No passado, costumavam ser acolhidospor serviços pastorais. Hoje, essa atividade foi incorporadapelo Estado.— As comunidades cuidavam dos seus pobres. Hoje, não selida mais com o pobre, e sim com a pobreza, o que é umaconcessão abstrata. (A grade antimorador de rua) é umaforma de negar o direito à existência dessa população. Aideia é uma trágica regressão civilizatória — afirmou.Estruturas antimoradores de rua são comuns em PortoAlegre. Segundo a Smov, há denúncias contra prédios nasavenidas Borges de Medeiros e João Pessoa. Também hárelatos de edifícios com o mesmo estratagema nos bairrosBela Vista e Petrópolis.

Além disso, bancos com barras de ferro paraevitar que sem-teto deitem foram colocados naPraça General Daltro Filho no ano passado.Menos recentes são os fechamentos de vãos emviadutos e pontes para impedir que sejamusados como abrigo, com destaque para aAvenida Ipiranga. Outra estratégia é rechear opiso sob viadutos com paralelepípedos depontas viradas para cima.

No final da tarde desta terça-feira, a Fasc encaminhou uma nota sobre asituação dos moradores de rua:A Política de Assistência Social do Município busca oferecer toda aassistência e acompanhamento às pessoas em situação de rua natentativa de promover o acesso à rede de serviços socioassistenciais, bemcomo reinseri-los às comunidades de origem. Não compete à Fundação deAssistência Social e Cidadania retirá-los da rua, mas buscar, através daformação de vínculos no espaço rua, o acesso aos espaços de proteção eàs demais políticas públicas.O Serviço de Abordagem Social trabalha prioritariamente com apossibilidade de retomada do vínculo com a família, com a comunidade etambém com a perspectiva de produção de autonomia. A partir dadiscussão de caso com a rede de proteção regional, que inclui serviços deassistência social, saúde, escolas, entre outros, é estabelecido um Planode Acompanhamento visando construir alternativas para a situação derua, na perspectiva de garantia de direitos.Em muitos casos o Serviço Especializado em Abordagem Social tem êxito,promovendo o acesso dessas pessoas aos espaços de proteção, masmuitas vezes esse acolhimento não é aceito ou eles voltam ao espaço darua.A Fasc vai continuar acompanhando as pessoas em situação de rua comtransversalidade e intersetorialidade entre as políticas públicas.O serviço de abordagem social pode ser solicitado durante o dia pelotelefone 3289-4994 e à noite pelo telefone 3346-3238.

Grade antimorador de rua é retirada de prédio da Cidade BaixaEstrutura havia sido instalada na Rua da República no último fim de semana

Objeto de polêmica ao longo desta semana em Porto Alegre, a grade antimorador de rua que estava em frente a um prédio na Rua da República, no bairro Cidade Baixa, foi retirada no início da tarde desta sexta-feira. A estrutura foi considerada irregular pela Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) por ocupar um pedaço da calçada. O órgão havia solicitado a retirada na quarta-feira, com prazo até a próxima terça-feira.— Agora vamos acompanhar para ver o que vai acontecer, se algum morador de rua vai voltar a ficar ali. Se a prefeitura vai tomar alguma providência pelo pessoal que faz abordagem (aos moradores de rua). Tem que tirar, né, porque está ilegal, e vai que alguém se machuca. Mas não foi intenção de prejudicar ninguém — afirmou o síndico contratado do prédio, André Rodrigues.

O caso da grade instalada para impedir a presença de sem-teto sob a marquise de um prédio da Rua da República levantou odebate nas redes sociais sobre a rejeição à presença de moradores de rua, na terça-feira. Locatários de apartamentos doedifício reclamavam do mau cheiro. Ao longo da semana, Zero Hora constatou que as estruturas antimoradores de rua seespalharam pela cidade.Uma ideia para combater o problema é adaptar as cidades para quem vive na rua. A grade caiu, mas o debate sobre a situação dosmoradores de rua ainda está longe do fim.

Quanto às demais estruturas identificadas pela reportagem,a Smov provavelmente não poderá interferir. Nenhuma delasavançava sobre o passeio público a ponto de atrapalhar acirculação de pedestres. Em vez disso, fecham espaços combarras de ferro em uma área chamada de faixa de serviços,rente às construções.Para o sociólogo Eber Marzulo, professor do Programa dePós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional daUniversidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), evitar osmoradores de rua é uma "trágica regressão civilizatória".No início da sociedade ocidental, as cidades criarammecanismos de acolhimento, explica. Esses mecanismosacabaram se perdendo quando deixaram de ser atividadescomunitárias (praticadas por igrejas, pelo trabalho pastoral)e foram incorporados pelo Estado. Uma solução seriamelhorar os albergues e abrigos públicos, cujo regimeMarzulo classifica como "carcerário".

1) O ponto de vista do morador - protesto contra moradores de rua questionam de quem é o espaço público

Protestos contra moradores de rua questionam a quem pertence o espaço público

Enquanto aguardava o lanche ficar pronto na barraca de cachorro-quente na Trindade, em Florianópolis, o casal dividia uma garrafa de refrigerante de dois litros. Um homem aparentando cerca de 60 anos, com a imagem mais estereotipada de um morador de rua – cabelo desgrenhado, roupas sujas, meio bêbado –aproximou- se e pediu um copo a eles, com uma reverência até mesmo exagerada.

Embora se tratasse de um estabelecimento a céu aberto, desses sem paredes e com cadeiras de plástico na rua, o homem sabia que era indesejado e manteve distância das mesas para evitar que sua presença se tornasse ainda mais evidente.

Quando o casal lhe informou que ele precisaria pedir um copo no balcão, se instaurou um cenário constrangedor para todos os presentes: a mulher que preparava os lanches não queria dar um copo para ele, porque "se dá para um, logo vêm todos", repetindo alto o bastante para que todos ouvissem.Os donos do refrigerante ficaram com vergonha e não quiseram intervir, enquanto o atendente não sabia se dava o copo ou não, aparentemente com pena e ao mesmo tempo preocupado com a opinião da chefe. Após um ou dois minutos de discussão, o homem – acanhado, ainda sem entrar no espaço das mesas da lanchonete – conseguiu o copo de plástico, encheu, agradeceu e foi embora por uma rua próxima.

A simples presença das pessoas sem moradia fixa costuma ser vista com desconforto pela população em geral. Avessos à mídia, às pesquisas acadêmicas e aos censos, os moradores de rua sequer constam nas informações do IBGE, que contabiliza os brasileiros dividindo-os por domicílios. Qualquer estimativa se torna ainda mais imprecisa quando se leva em conta a quantidade de pessoas que permanece em constante movimentação, de cidade em cidade, de país em país.

Realizei uma pesquisa com parte dessa população no mestrado em Antropologia Social da UFSC entre 2011 e 2013, quando passei pelo menos um mês em contato direto com moradores de rua no Centro de Florianópolis, além de um longo período de outros contatos, visitas a pontos frequentados por eles, almoços comunitários ou simples passeios pelo ambiente noturno da Capital.

O primeiro preconceito que cai ao chão quando a gente se aproxima de alguém que usa a rua como moradia é a fantasia de uma identidade única. A noção de "morador de rua" é considerada bastante imprecisa, já que a maioria deles possui uma longa história de idas e vindas. É por essa razão que parte das entidades sociais e pesquisas acadêmicas preferem usar o termo "em situação de rua" – alguém que está, e não que pertence a uma determinada condição.

Na linguagem cotidiana, "morador de rua" vira sinônimo de "mendigo" ou de "andarilho", embora uma coisa não implique outra. Cada pessoa que conheci durante a pesquisa encontrava uma maneira diferente de permanecer na rua: pedindo dinheiro, lavando e cuidando de carros, juntando latinhas, vendendo artesanato ou pinturas e fazendo o meio de campo entre traficantes e usuários com medo de subir o morro. Alguns apelam a assaltos, enquanto outros se sentem humilhados até mesmo em esmolar, vivendo apenas de pequenos bicos – pintor, jardineiro, latoeiro, pedreiro.

Os que trabalham mais duro, obviamente, são aqueles que precisam de mais dinheiro: os dependentes químicos. A vida é agitada quando se precisa dos constantes estímulos que algumas substâncias proporcionam. Como meu trabalho trata justamente das formas de subsistência de quem mora na rua, achei prudente me aproximar desse grupo específico no Centro de Florianópolis. Uma das primeiras pessoas que conheci na rua, um rapaz de 25 anos, havia saído de Porto Alegre, mas chegando em Florianópolis começou a "aprontar", como me disse.

Fumava crack e não tinha nenhum pudor em falar disso, apesar de sempre comentar o assunto num tom sério, e não com orgulho ou achando graça. Em 2012, já morava há dois anos na rua, mas ainda se impressionava com o quanto o ser humano se acostuma a tudo: dormia em qualquer lugar, comia o que os restaurantes davam na hora de fechar e fazia vários bicos pela rua durante a madrugada.

– Não importa como ou quanto eu ganhe, vai tudo para crack e pó. Beber, eu não bebo quase nada; meu negócio é a pedra e a cocaína. Nesse fim de semana fiz um corre para uns playboys, ganhei R$ 150. Cheirei tudo, comprei umas buchas enormes e acabei dormindo na rua de novo.

Embora pelo menos 10% da população brasileira seja considerada alcoólatra e 15% tabagista, o poder do vício ainda parece ser uma grande surpresa para nossa sociedade. Já para os usuários de crack, nenhuma novidade: absolutamente

todas as pessoas com quem conversei sobre a droga enfatizaram os perigos que rondam a dependência química. Um usuário me fez prometer que jamais fumaria crack, e mais tarde me deu um livro com uma dedicatória repetindo a orientação.

– Ver a minha filha nascer havia sido a maior emoção da minha vida, até fumar crack pela primeira vez. Fui expulso de casa pela minha esposa e agora estou tentando voltar – confessou um andarilho que passava por Florianópolis em 2010, comemorando os seis meses longe da droga.

Acompanhei moradores de rua em todo o tipo de situação cotidiana, e embora vários deles infringissem a lei com frequência, é impossível generalizar um universo tão complexo como este ou recomendar tratamentos compulsórios, como se ouviu em meio aos recentes protestos de Florianópolis. Criminalizar as pessoas que evidenciam a maior ferida da modernidade é tomar a consequência como causa, tentar curar uma doença grave tomando remédios para dor de cabeça.

Nas últimas semanas, criou-se uma forte discussão a partir do discurso incisivo de alguns manifestantes em Florianópolis, mas as grandes cidades brasileiras enfrentam o mesmo dilema interno há décadas. Atualmente, são cerca de 350 moradores de rua na capital catarinense, como afirma o secretário de Assistência Social, Alessandro Abreu. A estimativa é que cheguem mais 150 na temporada, principalmente artistas de rua.

A antropóloga Simone Frangella explica como a cidade de São Paulo já utiliza artimanhas para manter moradores de rua em constante circulação desde o começo dos anos 1990: bancos de ônibus em que é difícil se deitar, iluminação de becos vazios, pisos irregulares embaixo de viadutos – elementos da técnica que ficou conhecida como "arquitetura antimendigo".

O poder público, sem ter muito o que fazer, colabora com o jogo de empurra-empurra. Como agir diante de um morador de

rua que não quer receber nenhum tipo de intervenção? Interná-lo à força num albergue? Ressuscitar a antiga lei contra "vadiagem" de 1941, que prendia desempregados ociosos que permaneciam em lugares públicos? Tais opções batem diretamente contra os direitos constitucionais, mas a pressão popular é forte e o poder público se vê obrigado a resolver instantaneamente um problema histórico e global.

A Cracolândia, na capital paulista, é o maior exemplo recente desse disfarce da trágica realidade urbana. Desde 2005, a prefeitura vem retirando moradores de rua, prostitutas, catadores de latinha e usuários de crack do local com o propósito de revitalizar a área. O principal resultado da operação é a migração de todas essas pessoas para regiões próximas, e nenhuma melhoria real na qualidade de vida delas.

Há dois anos, conheci um homem que havia dormido nas ruas de Florianópolis por 15 dias. Eram duas da tarde de uma segunda-feira quando conversávamos. Inocentemente, perguntei se a polícia os encaminharia a outro lugar caso os encontrassem deitados àquela hora perto da Praça XV, no centro da cidade.

– Encaminhar? Eles dão é um corre na gente! Falam "some daqui, senão vai ver só". Tem um cara dormindo aqui atrás de uma árvore agora. Se a polícia vier, logo correm com ele daqui da praça.

Uma ambígua rede de compreensão e repulsa também ajuda a manter as pessoas circulando de um lado para o outro pela cidade. Era comum conhecer homens que andavam quilômetros no mesmo dia atrás de um almoço comunitário na Catedral Metropolitana do Centro, um banho na casa de alguém na Trindade, atendimento no posto de saúde em Coqueiros.

Na hora de dormir, sempre o mesmo dilema: andar mais duas horas até um local onde guarda suas coisas, escondido no

mato, ou deitar em qualquer lugar, sujeito a ser roubado durante o sono ou acordar apanhando? É conhecido que inúmeras prefeituras facilitam como podem a concessão de passagens para que moradores de rua voltem a seus locais de origem. Entretanto, a lenda dos ônibus cheios de mendigos sendo enviados para longe serve apenas para demonstrar o caráter passivo que tal personagem assume nas discussões sobre liberdade individual e autonomia.

Uma afirmação como essa pressupõe que um morador de rua seja incapaz de tomar decisões por conta própria, enquanto, na verdade, a movimentação é tão constante no universo deles que existe até mesmo uma expressão para quem não sai da estrada: trecheiros.

Florianópolis é uma cidade que não vive um abismo tão grande entre o poder institucional e os indivíduos marginalizados, como já acontece nas grandes capitais brasileiras, mas tem caminhado nessa direção. É urgente parar de ver o meio urbano como uma guerra e entender o risco de determinar quem pode (e como pode) usar o espaço público.

2) O ponto de vista do morador de rua - moradores de rua de porto alegre se recusam a ir para albergues

Maioria dos moradores de rua de Porto Alegre se recusa a ir para um albergueProcesso para ampliar capacidade de acolher moradores de rua na Capital corre há sete anos na Justiça

Porto Alegre, 8h30min. O termômetro em frente ao Mercado Público marcava 7ºC e o movimento era intenso no terminal de ônibus Parobé. O ruído parecia não perturbar o sono de Omarci Carvalho, 48 anos. Contra o frio, além de um cobertor, ele só tinha o carinho do cão, Tobi. O vira-lata tomava conta do carrinho com materiais reciclados que Omarci recolhera no dia anterior. Latia alto contra quem se aproximava. Bastou o dono colocar o rosto para fora do cobertor para o cusco enchê-lo de lambidas.Em frente a um dos cartões postais da Capital, a cena passava despercebida pela maioria apressada. Tornou-se tão comum que virou paisagem. Há anos, Porto Alegre tropeça na população de rua sem uma política eficiente para reduzi-la. O último levantamento da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), de 2011, mostra aumento de 12% em relação ao de 2007, para um total de 1.347. A Fasc pretende dar início a novo censo neste ano.

A primeira contagem, feita pela Fasc em parceria com pesquisadores da UFRGS, coincide com o início de processo até hoje em discussão na Justiça. A Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos do Ministério Público pediu ampliação da rede de acolhimento, que tem pouco mais de 600 vagas, metade em rede conveniada com o município. Em dezembro de 2013, a juíza Rosana Broglio Garbin deu sentença obrigando o município a criar, em até três anos, 300 vagas com prioridade a idosos e pacientes em recuperação de problemas de saúde ou dependência de álcool e drogas. Em junho passado, o município recorreu ao Tribunal de Justiça.Para o sociólogo Ivaldo Gehlen, um dos pesquisadores da UFRGS que participou da elaboração dos dois censos da população de rua em Porto Alegre, abrir mais vagas não resolve a questão.– O abrigo é estruturado pela nossa maneira de pensar e de querer que eles vivam. Essas pessoas desenvolveram uma espécie de identidade de rua. Modificar esse perfil é um processo lento e progressivo, e as políticas não preveem esse ritmo, a sociedade quer respostas rápidas – diz Gehlen.Nas abordagens da Fasc, 64% das pessoas em situação de rua se recusam a ir para um albergue. No inverno, a aceitação chega perto de 40%, mas a maioria ainda prefere a rua a um abrigo para não se separar do pouco que tem: um colchão, um carrinho de supermercado, um fogareiro ou um vira-lata.O guardador de carros Fábio Dutra, por exemplo, montou um pequeno lar sob o viaduto da Avenida Silva Só com mobília recolhida do lixo e alguns objetos recebidos como doação. Aos 27 anos, desde os nove morando na rua, Dutra adotou a cadela Peluda para lhe fazer companhia. Mesmo a oferta de duas refeições, banho, roupa limpa e uma cama com três cobertores para passar a noite não entusiasma Dutra. Teme que levem seus apetrechos.– Infelizmente, nem sempre temos como transportar todos os pertences no veículo da Fasc e nem teríamos espaço para colocar tudo no guarda-volumes – explica o coordenador do Albergue Municipal, Franque Hendler.Os cães, acrescenta, ficam do lado de fora, presos à grade ou esperando o dono voltar. Não há previsão de investimentos para adequar a estrutura.

3) Hoje

Porto Alegre tem mais de 1,3 mil moradores de rua, diz pesquisaHomens são 82%, e 60% do total desempenha atividades pela cidade.

Reportagem acompanhou a rotina de alguns moradores de rua.

Porto Alegre tem mais de 1.347 moradores de rua, cerca de metade deles nascidos na capital gaúcha. Os homens sãogrande maioria – 82%, e cerca de 60% do total desempenha atividades como catar material reciclável, realizar atividadesde reciclagem, guardar e lavar carros na rua. Os dados são de uma pesquisa realizada pela Fundação de Assistência Social eCidadania (Fasc), órgão ligado à prefeitura.Pouco mais de um terço – 27,3% – vive no Centro. E quase todos estão expostos à violência, como a que matou umpapeleiro em Caxias do Sul, na Serra gaúcha. A reportagem da RBS TV acompanhou a rotina de alguns deles, como mostrareportagem do Jornal do Almoço (veja no vídeo).Um adolescente de 14 anos, saiu de casa há um mês, após brigar com a família. Desde então, ele carrega consigo apenasum cobertor para se proteger do frio. Hoje mora sob de uma das pontes do Arroio Dilúvio, na Avenida Ipiranga, na RegiãoCentral. "Eu não queria fazer o serviço, e eles me obrigaram. Aí pulei a cerca e saí correndo", conta o menino.Em frente ao Foro Central, vive Seu Carlos, de 65, anos que sobrevive nas ruas de Porto Alegre há 25 anos. A únicacompanhia que tem é dos gatos de estimação. O próprio morador tem dificuldades para explicar o motivo da situação quepassa, e afirma que evita entrar em contato com a família. "Minha família hoje é aqui", diz.Sob da sombra de uma enorme paineira na Rua Vicente da Fontoura vive Paulo, um homem com o olhar triste e quetransparece um passado conturbado, mas cheio de saudades. Tudo o que ele tem foi doado por moradores. Na salaimprovisada em frente à barraca onde dorme, ele passa a maior parte do tempo escutando rádio e lendo jornais e livros."Trabalhei em outras coisas, mas não me adaptava. Voltava para isso de novo", declarou.

População de rua de Porto Alegre aumenta 57% em 5 anos, diz pesquisaFasc divulgou números do levantamento de 2016 em comparação com 2011.

Quase metade da população de rua vive assim há mais de cinco anos.

De 2011 para 2016, a população de rua aumentou 57%em Porto Alegre. Os dados foram divulgados pelaFundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), emparceria com a Universidade Federal do Rio Grande doSul (UFRGS), nesta quinta-feira (15). O estudo foirealizado de 8 de setembro a 10 de outubro em toda acidade, e apontou a existência de 2.115 pessoas adultasnessa situação.De todos os moradores de rua encontrados, 1.758aceitaram participar da pesquisa e tiveram seus dadoscadastrados.De acordo com a pesquisa, 25,2% da populaçãoinvestigada está há menos de um ano na rua. Por outrolado, agregando os dados daqueles que estão há maisde 5 anos na rua, temos quase a metade da população(47,8%), o que revela uma permanência na situação derua de mais longo prazo.

25,2% da população investigada está há menos de um ano na rua.

47,8% estão há mais de 5 anos nessa situação.

"Comparando aos dados de 2016 com as pesquisas anteriores, vê-seuma tendência de cronicidade da situação de rua, com crescimento dospercentuais de tempo em faixas temporais de mais de 10 anos de rua",diz o estudo.Além das ruas, foram contabilizadas pessoas que se encontram emabrigos e albergues destinados ao acolhimento e/ou ao abrigotemporário, intermitente ou definitivamente.A pesquisa apontou ainda que a região de maior concentração foi Centro(39,7%), Floresta (12%), Menino Deus (7%), o que totaliza o percentualde 58,7% dos pesquisados.A maioria da população de rua é masculina (85,5%), nasceu em PortoAlegre ou na Região Metropolitana (59,1%), e tem mais de 35 anos(61,4%). A maior parte possui o ensino fundamental incompleto (57,4%).Os autodeclarados negros (24,5%) e pardos (12,4%) constituem 36,9%da população, e os autodeclarados brancos são 34,3%.Das análises dos que não nasceram em Porto Alegre, o estudo indica aexistência de deslocamento do interior para capital e a consolidação damoradia em Porto Alegre entre grande parte da população adulta emsituação de rua, na medida em que 51,1% vive na cidade há mais de 20anos.

4) Curiosidade - quanto ganha um mendigo

Você ganha bem? Veja quanto pode faturar um mendigo

Você já parou pra pensar quanto fatura um mendigo? Você sabia que ele pode estar ganhando mais do que você? É isso que mostra uma pesquisa feita por um estagiário de nível superior.Preste atenção nessa interessante pesquisa de um estagiário:Um sinal de trânsito muda de estado em média a cada 30 segundos (trinta segundos no vermelho e trinta no verde). Então, a cada minuto um mendigo tem 30 segundos para faturar pelo menos R$ 0,10, o que numa hora dará:60 x 0,10 = R$6,00Se ele trabalhar 8 horas por dia, 25 dias por mês, num mês terá faturado:25 x 8 x 6 = R$ 1.200,00Será que isso é uma conta maluca?Bom, 6 Reais por hora é uma conta bastante razoável para quem está no sinal, uma vez que, quem doa nunca dá somente 10 centavos e sim 20,50 e às vezes até 1 Real.

Mas, tudo bem, se ele faturar a metade: R$3,00 por hora terá R$600,00 no final do mês, que é o salário de um estagiário com carga de 35 horas semanais ou 7 horas por dia.Ainda assim, quando ele consegue uma moeda de R$1,00 (o que não é raro), ele pode descansar tranquilo debaixo de uma árvore por mais 9 viradas do sinal de trânsito, sem nenhum chefe pra encher por causa disto.Mas isto é teoria, vamos ao mundo real. De posse destes dados fui entrevistar uma mulher que pede esmolas, e que sempre vejo trocar seus rendimentos na Panetiere (padaria em frente ao CEFET).Então lhe perguntei quanto ela faturava por dia. Imagine o que ela respondeu?É isso mesmo, de 35 a 40 reais em média o que dá (25 dias por mês) x 35 = 875 ou 25 x 40 = 1000, então na média R$ 937,50 e ela disse que não mendiga 8 horas por dia.

Moral da História:É melhor ser mendigo do que estagiário, e pelo visto, ser estagiário é pior que ser Mendigo…Se esforce como mendigo e ganhe mais do que um estagiário.Estude a vida toda e peça esmolas; é mais fácil e melhor que arrumar emprego.