Arbitragem Marítima Casos Práticos - CAMESC · Arbitragem Marítima –Casos Práticos. ......
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Bruno Tussi
Advogado inscrito na OAB/SC sob o nº 20.783, OAB/PR sob o n.º 61.829 e OAB/SP sob n.º
316.994.
Sócio fundador do escritório Tussi & Platchek Advogados Associados.
Graduado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí - Univali (2004).
Mestre em Direito Marítimo Internacional pela IMO - International Maritime Law Institute, República
de Malta (2006/2007).
Professor da disciplina de Direito de Navegação no curso de graduação em Comércio Exterior na
Univali.
Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Marítimo e Atividade Portuária, também pela
Univali.
Membro da Associação Brasileira de Direito Marítimo.
Principais Tribunais Arbitrais relacionados com Direito Marítimo
The London Maritime Arbitrators Association (http://www.lmaa.london)
Fundada em 1960 com sede em Londres, Inglaterra – originária do encontro de árbitros
membros do The Baltic Exchange;
Society of Maritime Arbitratiors, Inc. (http://smany.org)
Fundada em 1963 com sede em Nova Iorque, Estados Unidos da América;
Singapore Chamber of Maritime Arbitration (http://scma.org.sg)
Fundada em 2004 sob a gerência Singapore International Arbitration Centre, tornando-se
independente em 2009, com sede em Singapura;
Isabella Shipowners SA v Shagang Shipping Co Ltd (the "Aquafaith") [2012] 2
Lloyd's Rep. 61
Histórico:
Carta partida por tempo da embarcação Aquafaith, sob contrato NYPE, com início em 19 de
setembro de 2006 e duração de 59 meses. Data permitida para finalização (redelivery) do
contrato era 10 de novembro de 2011.
Devido a uma queda brusca nos valores no Baltic Dry Index (índice dos hires de 23 rotas
marítimas de carga granel seca), o afretador não quis manter a carta partida ativa e solicitou a
finalização antecipada em 9 de agosto de 2011.
O fretador não aceitou a finalização do contrato e resolveu iniciar um procedimento arbitral
para forçar o afretador a pagar o hire até o prazo final do contrato, tendo em vista que o
procedimento seria mais ágil que a busca por perdas e danos.
Fundamentos de cada parte:
Fretador – baseado no caso White & Carter (Councils) Ltd v McGregor (1962) A.C. 413, pelo
qual cabe a parte inocente de um contrato escolher entre aceitar sua quebra e solicitar perdas
e danos ou exigir o cumprimento do contrato.
Afretador – afirmou ser a demanda uma exceção ao caso indicado pelo fretador, tendo em
vista que a carta partida por tempo não é um contrato que possa ser executado sem a
coparticipação do afretador (quem indica as viagens a serem feitas), bem como não haveria
interesse legítimo na intenção do fretador em manter o contrato ativo em oposição ao seu
direito/dever de mitigar os seus danos no mercado e exigir perdas e danos.
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ep.61
Decisão arbitral:
Favorável ao afretador, pelas seguintes razões:
Existência de uma cooperação entre fretador e afretador na execução do transporte sob
égide de uma carta partida por tempo, em especial, pela obrigação do afretador em
fornecer o combustível da embarcação.
O fretador não possui interesse legítimo em manter o contrato ativo na circunstância em
que a embarcação possa ser colocada no mercado, quando o fretador pode, então,
recuperar suas perdas diretas pela diferença entre a tarifa da carta partida e o valor
obtido no mercado.
Apelação (High Court of England):
Modificada a decisão arbitral, julgando a lide favorável ao fretador, permitindo que o contrato
fosse mantido ativo e o afretador condenado ao pagamento do hire até a data aprazada, sob
os seguintes fundamentos:
O ganho do hire após a devolução da embarcação não depende de qualquer
cumprimento das obrigações do afretador. Mesmo que o afretador seja responsável pelo
fornecimento de combustível o fretador pode adquirir o combustível e cobrar do
afretador, quando do seu término. O árbitro cometeu um erro jurídico ao não aplicar o
caso White & Carter.
O árbitro aplicou o critério errado de quando considerar ou não o fretador com interesse
legítimo em manter o contrato ativo pelos restantes 94 dias e cobrar o hire. O critério era
de que a parte inocente não teria interesse legítimo se as perdas fossem o remédio
adequado e a insistência em manter o contrato fosse totalmente irrazoável, extramente
irrazoável ou, ainda, nas palavras do julgador, Cook J., perversa. O árbitro nunca se
questionou se foi totalmente irrazoável manter a carta partida ativa. Com apenas 94 dias
restantes de um contrato de 5 anos, num mercado difícil, no qual uma carta partida por
tempo substituta era impossível, seria impossível caracterizar o desejo do fretador de
manter o contrato como irrazoável, muito menos totalmente irrazoável. Este não foi um
caso extremo ou incomum e a exceção ao princípio White & Carter não se aplicava.
Cláusulas compromissórias em contratos marítimos
Norwegian Sales Form 1993
6. Arbitration
a)* This Agreement shall be governed by and construed according with English law and any
dispute arising out of this Agreement shall be referred to arbitration in London in accordance with
the Arbitration acts 1950 and 1979 or any statutory modification or re-enactment thereof for the
time being in force, one arbitrator being appointed by each party. On the receipt by one party of the
nomination in writing of the other party's arbitrator, hat party shall appoint their arbitrator within
fourteen days, failing which the decision of he single arbitrator appointed shall apply. If two
arbitrators properly appointed shall not agree they shall appoint an umpire whose decision shall be
final.
b)* This Agreement shall be governed by and construed in accordance with Title 9 of the United
States of America Code and Law of the State of New York and should any dispute arise out of this
Agreement, the matter in dispute shall be referred to three persons at New York, one to be
appointed by each of other the parties hereto, and nthe third by the two so chosen; their decision
or that of any two of them shall be final, and for the purpose of enforcing any award, this
Agreement may be made a rule of the Court. The proceedings shall be conducted in accordance
with the rules of the Society or Maritime Arbitrators, Inc. New York.
c)* Any dispute arising out of this Agreement shall be referred to arbitration at, subject to the
procedures applicable there.The laws of shall govern this Agreement.
* 16 a), 16 b) and 16 c) are alternatives; delete whichever is not applicable. In the absence of
deletions, alternative 16 a) to apply
The “Griffon” [2013] 1 Lloyd’s Rep. 50 (Comm), and [2014] 1 Lloyd’s Rep. 471
(CoA).
Histórico:
Contrato de compra e venda de embarcação – Norwegian Sales Form 1993.
Em 01 de maio de 2010 o acordo foi assinado o qual prevê a obrigação do comprador de
depositar 10% do valor da compra em 3 dias bancários como uma segurança.
O pagamento do depósito não foi feito e os vendedores entenderam a falta como um repúdio
ao contrato e resolveram o contrato.
A arbitragem foi solicitada pelos vendedores junto à Associação Londrina de Árbitros
Marítimos (LMAA) e residia na interpretação da cláusula 13 do contrato e no direito dos
vendedores de solicitar o pagamento do depósito de USD 2.156.000,00 ou, alternativamente,
perdas e danos calculados pela diferença do preço de venda no contrato e do preço de
mercado, USD 275.000,00.
Informações importantes:
A cláusula 13 do NSF foi alterada na sua primeira revisão em 1983.
Na versão original de 1966:Should the purchase money not be paid as per Clause 16, the Sellers have the right to cancel this
contract in which case the amount deposited shall be forfeited to the sellers. If the deposit does not
cover the Sellers’ loss they should be entitled to claim further compensation for any loss and for all
expenses together with interest at the rate of 5% per annum.
Na versão de 1983 e seguintes:Should the deposit not be in accordance with Clause 2, the Sellers have the right to cancel this
contract, and they shall be entitled to claim compensation for their losses and for all expenses
incurred together with interest. Should the Purchase Money not be paid in accordance with Clause 3,
the Sellers have the right to cancel this Agreement, in which case the amount deposited together with
interest earned shall be released to the Sellers. If the deposit does not cover their loss, they shall be
entitled to claim further compensation for their losses and for all expenses together with interest.
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e“G
riffon”
[201
3]
1Lloyd’s
Re
p.
50
(Co
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[2014]
1Lloyd’s
Re
p.471
(Co
A).
Fundamentos de cada parte:
Vendedores:
O depósito previsto na cláusula 2 é um depósito garantia para o cumprimento do
contrato, portanto, deve ser vista como penalidade.
O direito adquirido antes da quebra do contrato sobrevive ao seu término, salvo descrito
em contrário no contrato.
Aos vendedores é dado o direito de reclamar pelo depósito inadimplido como débito pelo
fato de já ter adquirido tal direito.
Basearam sua argumentação no caso The “Blankenstein” [1985] 1 Lloyd’s Rep. 93, o
qual analisou a cláusula 13 do NSF 66 e afirmou o direito do vendedor de requerer o
depósito da cláusula 2 ainda que a obrigação não tivesse sido desencadeada, bem
como a expressão “compensação” introduzida na NSF 83 não teria o poder de mudar tal
interpretação.
Compradores:
A cláusula 2 deve ser interpretada em conjunto com a cláusula 13 e, tendo em vista que
a nova redação abrange a hipótese do término do contrato pela falha em cumprir com o
depósito, ela cria o remédio específico para o vendedor.
Uma vez que a cláusula 13 se refere a “compensação” a ser paga pelo evento do
término do contrato pela inadimplência no depósito, diferente do segundo parágrafo de
tal cláusula, o primeiro parágrafo não se referem a “penalidade” e, portanto, tem como
efeito a privação do direito dos vendedores em reclamar pelo depósito não pago,
limitando-se às perdas e danos medida pela venda da embarcação.
Th
e“G
riffon”
[201
3]
1Lloyd’s
Re
p.
50
(Co
mm
),a
nd
[2014]
1Lloyd’s
Re
p.471
(Co
A).
Decisão arbitral:
Favorável aos compradores.
O tribunal entendeu que nenhuma das expressões da cláusula 13 afirma que no caso de
inadimplência da cláusula 2 os vendedores poderiam reclamar pelo valor do depósito.
Ao contrário, o primeiro parágrafo da cláusula 13 prevê pela “compensação”, o que, por
si só, preclui o direito ao depósito.
Apelação (Commercial Court / Court of Appel):
Modificada a decisão arbitral, julgando a lide favorável aos vendedores sob os seguintes
fundamentos:
É trivial no direito que quando se constrói um contrato presume-se que nenhuma das
partes têm a intenção de abandonar qualquer remédio pela inadimplência/quebra.
A cláusula 13 não prescreve o que acontece quando o depósito é inadimplido, mas
apenas pretende suplementar o direito dos vendedores com valiosa expressão de
término e reclamação por danos, afastando qualquer incerteza quanto a tal direito.
O direito dos compradores à garantia prevista na cláusula 2 não é afetada pelas
adicionais “armas no arsenal” criado pela cláusula 13.
A cláusula 13 não deve ser vista como um código completo sobre o que deve acontecer
sempre que o depósito não seja pago, tendo em vista que uma resolução pode ser
aceitável antes do prazo para o pagamento do depósito, mas as perdas dos vendedores
a ser reclamada como danos deve, ainda, ser o valor do depósito.
Em qualquer evento, a palavra “compensação” não é incompatível com a reclamação da
dívida ou dos danos no valor do depósito.
Proprietário de navio tanque “A” (fretador) v Companhia de Óleo “B” (afretador)
Caso retirado da Singapore Chamber of Maritime Arbitration – sem maiores detalhes frente ao sigilo
Histórico:
Carta partida por viagem, sob contrato “Shellvoy 6”;
Disputa entre as partes referente a Cláusula 14 (Torm Interim Clause) a qual prevê a
possibilidade de cobrança de um custo extra pelo fretador ao afretador quando designado
mais de um porto de carregamento ou mais de um porto de descarregamento na carta partida.
Decisão:
A cláusula afirma que o afretador é responsável em pagar pelos custos extras de combustível
consumido no porto intermediário (interino).
O terceiro parágrafo da cláusula confirma que o estágio da viagem, sem autorização de tempo
para Notícia de Prontidão ou deduções de tempo perdido, deveria ser incluído no cômputo do
que é pago ao fretador quando o navio recebe a ordem de proceder ao porto intermediário. O
parágrafo não deve ser lido para excluir ou limitar a responsabilidade do afretador em relação
ao consumo extra de combustível. Assim, o afretador deve pagar pelo combustível.
Geden Operations Ltd (afretador) v Dry Bulk Handy Holdings Inc (fretador) (The
“Bulk Uruguay”) [2014] EWHC 885 (Comm)
Histórico:
Carta partida por tempo para embarcação Bulk Uruguay, sob contrato NYPE, assinado em 02
de julho de 2010 para um período entre 35-37 meses, a uma diária de USD 18.500,00.
Contratação da cláusula Conwartime 2004 e a cláusula de pirataria da BIMCO, na qual foram
deletados os parágrafos (a)-(b), refletindo a prática de mercado cuja intenção era permitir a
ordem do afretador para passagem da embarcação pelo Golfo do Áden sem o necessário
consentimento do fretador – denominada GOA OK.
Essa determinação traria uma vantagem econômica para o afretador de algo em torno de USD
1.250,00 por dia.
Durante as negociações, o afretador deixou claro que a não aceitação da GOA OK seria
motivo para a quebra da negociação.
Na época do início do contrato, julho de 2011, o fretador deixou claro que para o cumprimento
das ordens ou diretrizes do trânsito do Golfo do Áden haveria necessidades de prévia
autorização do fretador em cada caso.
Com tal insistência, o afretador considerou o fretador em quebra contratual, pela qual
pretendeu aceitar o término do contrato.
O fretador aceitou o término do contrato, contudo afirmou que a pretensão de terminar o
contrato do afretador era, por si só, a quebra contratual.
Fundamentos de cada parte:
Afretador – quebra contratual do fretador por insistir, no momento do início do contrato, que o
afretador obtivesse autorização prévia para transitar no GOA.
Fretador – o pedido de extinção contratual do afretador era a quebra contratual que levou ao
término do contrato.
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Decisão arbitral:
Favorável ao fretador, por maioria.
O tribunal entendeu que o fretador não expressou a intenção de não cumprir com a carta
partida quando exigiu que o trânsito pelo GOA dependeria de seu consentimento prévio.
O afretador não foi substancialmente privado de todos os benefícios do contrato,
baseado nos padrões antecipados de navegação da embarcação, no valor do GOA OK
comparado com a taxa de hire e nas desvantagens competitivas de não ter uma GOA
OK contra a habilidade do navio de navegar para qualquer lugar do mundo.
Condenou o afretador a pagar indenização no valor de USD 6.500.000,00.
Apelação (Commercial Court):
Direito de apelar rejeitado.
O afretador alegou que a conduta do fretador teria tornado a execução do contrato
impossível no futuro, evidenciando sua intenção de recusar a ordem de trânsito pelo
GOA, se e quando fosse feita, o que seria uma renúncia ao contrato. O juiz entendeu
que o afretador estava tentando tornar uma questão de fato, julgada por maioria pelo
tribunal arbitral, em uma questão de direito.
O tribunal arbitral tinha feito uma apreciação de fato, cuja posição do fretador não
deveria ser entendida como incapacidade ou relutância no cumprimento da ordem, se e
quando a ordem de uma viagem pelo GOA fosse feita. Isso foi uma decisão de fato. Por
qual motivo deveria ser vista como questão de direito?