Argentina Santos- 'Não sei se canto se rezo'

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Argentina Santos Não sei se canto se rezo I do not know whether I’m singing or praying

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catálogo da exposição - Museu do Fado 2010

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Argentina Santos Não sei se canto se rezo

I do not know whether I’m singing or praying

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Argentina Santos Não sei se canto se rezo

I do not know whether I’m singing or praying

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No canto de Argentina Santos confl uem, com sabedoria ancestral, a tangibilidade do quotidiano e a transcendência de existir. Relação improvável e úni-ca que emerge, inaudita, da sua forma de dizer e de sentir. Um jogo subtil entre profana verdade e sagrada confi ssão brotam do seu fado adensando o mistério. Talvez por isso o seu percurso artístico seja absolutamente original, marcado pelo profundo receio de quem reconhece que tal relação, apenas poderá guardar o seu frágil equilíbrio quando protegi-da dos vastos espaços, das grandes multidões ávidas de catarse. É o quotidiano que se canta, na secreta intimidade do eu, projectado numa densa fi ligrana de sentidos.É pois com o maior orgulho que a CML/EGEAC se envolvem na organização desta exposição que abre a programa de exposições temporárias do Museu do Fado em 2010; um espectáculo de homenagem a re-alizar no Teatro Municipal São Luiz, no início de Julho, complementará o tributo a um caminho tão verda-deiro e tão único.

Precioso o nome, preciosa a “vida…. vivida”.

Argentina Santos’ voice encompasses - with paramount ancestral wisdom - the tangibility of the daily life and the transcendence of being. An implausible and unique relationship that rather strangely emerges from her way of singing and feeling. A subtle game between profane truth and sacred confession blossoms from her fado and deepens the mystery. This may be the reason why her artistic path is absolutely original and marked by the deepest fear of someone who is aware that such relationship may only keep its frail balance if protected from the wide spaces and from catharsis seeking crowds. The daily life is sung within the secret intimacy of the self, and is thus projected in a thick fi ligree of senses.CML/EGEAC take great pride in participating in the organisation of this exhibition that opens the tem-porary exhibitions’ programme of Museu do Fado for 2010. A tribute to Argentina Santos will be held at Teatro Municipal São Luiz in the beginning of July and will complement this tribute to such a true and unique path.

Precious name, precious “lived…. life”.

Miguel Honrado

Presidente do Conselho de Administração da EGEACChairman of the Board of EGEAC

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Volta atrás vida vividaPara eu tornar a verAquela vida perdida

Que nunca soube viver

Go back lived lifeSo that I may see again

That lost lifeI never knew how to live

(João de Freitas / Filipe Pinto)

josé frade

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Argentina Santos, s/d

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“Em muitas coisas que canto lembro-me da vida que atravessei”

“I recall my life in many of my songs”

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O fado de Argentina Santos tem a força de um pregão e a contenção de uma prece. Canto de feição popular, nele se combinam autenticidade humana e artística, em perfeita simbiose. Nele relembramos algumas das súpli-cas de Oum Kalsoum. Destemido, o fado de Argentina Santos não conhece subterfúgios ou cedências. Basta-lhe ser autêntico. De pálpebras cerradas e mãos suplicantes, Argentina conta-nos também o fado de uma “viva vivida”. Único e irrepetível. Exacto e nítido. Cantando os poemas que chamou a si, o seu fado espelha também o seu pas-sado. Não fortuitamente. Neste seu canto feito prece, o tema favorito é, invariavelmente, “o mais triste”. Mas das agruras passadas não lhe sobram mágoas. Tão só o lúcido reconhecimento de que em muitos dos poemas cantados se espelha a sua própria vida.

The fado by Argentina Santos has the strength of a street cry and the restraint of a prayer. This popular song com-bines – in perfect symbiosis – both human and artistic authenticity. It reminds us of some of Oum Kalsoum’s prayers. The fado by Argentina Santos is fearless and knows neither excuses nor bonds. It is real. With her eyes shut and her praying hands, Argentina’s voice also tells us the fado of a “life that has been lived”. That is why it is unique and impossible to replicate. Both precise and clear. While singing the poems she chose, her fado also depicts her past. And not just by mere chance. In her chanting turned into prayer, her favourite theme is always the “saddest one”. But she holds no grudges from the past. Just a profound awareness that many of her poems depict her own life.

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LC

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Argentina Santos, s/d

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Pelo bairro da Mouraria ecoam as mais remotas memórias de Maria Argentina Pinto dos Santos, nas-cida a 6 de Fevereiro de 1924, no nº 52 da Rua João Outeiro. O fado corre-lhe nas veias. Do alto dos seus 86 anos, lembra-se dele dos tempos da Mouraria, cantarolado dia e noite, por becos e vielas. Toman-do a palavra a João de Freitas, recuamos à infância da “vida vivida” de Argentina Santos, uma das mais autênticas personalidades artísticas da história do fado.

The most remote memories of Maria Argentina Pin-to dos Santos, born on February 6, 1924, at no. 22, Rua João Outeiro, still linger in Mouraria. Fado runs through her veins. At 86 she recalls those days in the narrows streets and alleys of Mouraria, where she used to sing all day and all nightlong. Using the words of João de Freitas, we go back to the childhood of one of the utmost artistic personality of the history of fado, Argentina Santo’s “lived life”.

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Família de Argentina Santos: a mãe, Maria Martinha, o pai,Manuel Pinto dos Santos e os três irmãos, Georgina, Virgílio e Jorge, s/d

Argentina Santos’ family: Maria Martinha (mother) Manuel Pinto dos Santos (father), Georgina (sister) and her two brothers Vir-gílio and Jorge, s/d

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Em 1926, a morte prematura do pai ditava-lhe a separação abrupta da mãe e dos três irmãos mais velhos, anunciando uma infância dura. Cedo haveria de abandonar a instrução primária. Aos oito anos de idade já fazia recados à Praça da Figueira, de alcofa em punho para comprar “meio quilo disto ou daquilo (…)”. Sempre cantarolando. Como haveria de confessar mais tarde: “Tinha de estar sempre a cantar mas nunca me pas-sou pela cabeça que ia dar espectáculos e cor-rer tantos países”. Falecida a madrinha que a acolhera depois da morte do pai, Argentina che-ga a Alfama com apenas 10 anos de idade, onde fazia uns recadinhos aqui e ali, servindo numa casa de família e acumulando trabalho atrás de trabalho para poder comer e para poder viver1. Anos passados, haveria de subsistir descarre-gando o peixe para a lota: “Acordava às quatro da manhã. Já sabiam onde eu morava e iam chamar-me. Depois eu subia a Bica, descia a Calçada do Combro e ia até à Madragoa chamar as minhas colegas”. Tinha apenas 16 anos. “Era muito levezinha e muito magrinha (..) nessa altura ninguém me apanhava”2.

With her father’s premature death in 1926, she was suddenly separated from her mother and her three older siblings and experienced a diffi -cult childhood. She left school at an early age. At age 8 she was running errands at Praça da Figueira carrying her basket to buy “a pound of this or that (…)”. Singing all the time. As she would later confess: “I was always singing, but it never crossed my mind I would do shows and travel so many countries”. The godmother who took her in when her father died also died when Argentina was 10. She moves to Alfama and runs some errands here and there, serves as a maid, and works in many jobs to be able to eat and to be able to live3. Some years lat-er she would make ends meet carrying fi sh to the fi sh market: “I would get up at 4am. They knew where I lived and would call me. I would go up Bica, down Calçada do Combro, and go to Madragoa to round up my friends”. She was just 16. “I was tiny and skinny (...) no one could catch me back then”4.

1 - Argentina Santos em entrevista a José Eduardo Fialho Gou-veia, “O Independente”, 4 de Junho de 2004.2 - Argentina Santos em entrevista a José Eduardo Fialho Gou-veia. “O Independente”, 4 de Junho de 2004.3 - Argentina Santos in an interview by José Eduardo Fialho Gouveia, “O Independente”, June 4, 2004.4 - Argentina Santos in an interview by José Eduardo Fialho Gouveia, “O Independente”, June 4, 2004.

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À “Parreirinha de Alfama”, uma das mais emblemáticas casas de fado de Lisboa, haveria de chegar em 1950, com o seu companheiro Alberto Rodrigues. Ali se mantém ainda hoje, acumulando a gestão da casa com o seu fado. Único e irrepetível. A mestria e o gosto estendem-se aos dotes culinários: “Eu gosto tanto de fazer comer como de cantar. É igualzinho … E tanto improviso no comer como no fado”5.

O nº 1 do Beco do Espírito Santo em Alfama, albergou em fi nais do Século XIX uma carvoaria, posteriormente convertida numa modesta casa de pasto. Nos alvores da década de 1950, sob gestão de Alberto Rodrigues e Argentina Santos, conviviam na Parreirinha, entre copos e petiscos, estivadores, fragateiros, intérpretes espontâneos de fado e, também, fi guras de nomeada do universo fadista como Filipe Pinto ou José Porfírio.

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In 1950 she goes to “Parreirinha de Alfama” – one of Lisbon’s most famous fado restaurants – with her partner Alberto Rodrigues. She is still there today, managing the place and singing her fado. Unique and impossible to replicate. Her mastership and good taste also apply to her cooking skills: “I enjoy cooking as much as I do singing. At the same level … And I improvise in both cooking and fado”6.

By the end of the 19th century the no. 1 of Beco do Espírito Santo in Alfama housed a coal shop, and later a modest tavern. In the early 1950s, Alberto Rodrigues and Argentina Santos managed the Parreirinha, and its drinks and snacks would welcome harbour workers, fi shermen, amateur fado singers, and some major fado singers, like Filipe Pinto or José Porfírio.

5 - Fernando Magalhães, Prata da Casa, “Publico”, 3 de Abril de 2003.6 - Fernando Magalhães, Prata da Casa, “Publico”, April 3, 2003.

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The owner - Alberto Rodrigues – included the fado in the res-taurant’s programming, at the beginning in a non-formal way promoting Sunday events and later with a special permit hired a regular cast and advertise it in specialty newspapers as off 1952.

This press would involuntarily dictate the future of Parreirinha. On March 1, 1952, the paper “Ecos de Portugal” made front-page with the rebirth of fado in Alfama: “Fado is reappearing in its true popular essence, without aff ected or operetta manners... (...) keeping its fl avour and charm (...). In this vivid and fresh tavern everything is spontaneous and fresh. We praise the eff orts of Alberto Rodrigues that gave Alfama the place it deserves.”9.

Those days are still alive in the memory of 80-year-old Argentina Santos: “we had some Sunday fado events and some would last until the evening (…). Until one day some gentlemen booked a table for dinner. We weren’t aware of that but some of them were reporters and they wrote about us in the next day paper– with pictures and the whole thing! ... We were then summoned to the authors’ guild …”10. And that’s the way it happened. This story would trigger an inspection by Direcção Geral dos Espectáculos and they were given notice to either close the premises or obtain permit to operate as entertainment hall complying with all the existing rules and regulations.

O seu proprietário, Alberto Rodrigues, integraria naturalmente o fado na programação da casa, primeiro de modo espontâ-neo, depois promovendo matinés de domingo e, fi nalmente, com licenciamento próprio, elenco contratado e anunciado nos jornais da especialidade, a partir de 1952.

Seria a própria imprensa especializada a ditar, ainda queinvoluntariamente, o futuro da Parreirinha. De facto, a 1 de Maio de 1952 o jornal “Ecos de Portugal” destacava na primeira página o renascimento do fado em Alfama: “o Fado está a renascer na sua verdadeira feição popular e castiça, sem arrebiques de salão nem garganteados de opereta... (...) sem lhe tirar o sabor e a graça bairrista (...). Tudo é espontâ-neo e fresco nesta casinha fresca e garrida. Bem empregado o esforço de Alberto Rodrigues que dotou Alfama da casa que Alfama merece”7.

Na memória octogenária de Argentina Santos esses tempos são, ainda hoje, bem presentes: “proporcionava-se aos do-mingos fazer umas matinés de fado que por vezes fi cavam para a noite (…). Até que um dia uns senhores reservaram uma mesa e estiveram lá a jantar. Nós não sabíamos mas parte deles eram jornalistas e ao outro dia veio no jornal, com fotografi as e tudo!... Fomos logo chamados à sociedade de au-tores …”8. Assim foi. Da reportagem resultaria uma fi scaliza-ção da Direcção Geral dos Espectáculos obrigando ao encer-ramento da casa ou, em alternativa, ao seu licenciamento como recinto de espectáculos, contemplando as alterações necessárias ao cumprimento do regulamento da legislação em vigor.

7 - “Ecos de Portugal”, 1 de Maio de 1952.8 - Entrevista realizada no Museu do Fado a 24 de Agosto de 2006.9 - “Ecos de Portugal”, May 1, 1952.10 - Interview at Museu do Fado on August 24, 2006.

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Alfredo Marceneiro,“Parreirinha de Alfama”, s/d

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Poucos anos corridos sobre a abertura da Parreirinha, Argentina Santos integrava o elenco. De facto, a partir de um acaso fortuito em que participara numa “desgarrada” por insistência da clientela da noite, haveria de construir-se uma das mais autênticas e consensuais personalidades artísticas da história do fado.

Not many years after the opening of Parreirinha Argentina was part of the regular cast. And thus one of the most authentic and consensual fado artistic personalities was born by mere chance when she was asked to sing at the restaurant.

Berta Cardoso, Lina Maria Alves, Alfredo Marceneiro, Acácio Gomes, “Parreirinha de Alfama”, s/d

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Argentina Santos, s/d

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A autenticidade das suas interpretações, a dimensão expressiva e a noção de pathos impressos ao momento do canto, haveriam de afi rmar Argentina Santos na tradição das grandes vozes femininas do passado, valen-do-lhe desde muito cedo a admiração con-sensual e alargada no universo de cultores do género.

The authenticity of her interpretations and the expressive dimension and notion of pathos of her singing would confi rm Argentina Santos as heiress to the major female voices of the past, and she would very soon gain the consensual and wide admiration of all those who admired this genre of music.

Argentina Santos, 28 de Junho de 1962, June 28 1962

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Argentina Santos, “Parreirinha de Alfama”, s/d

José Maria Carvalho e Alcindo de Carvalho, “Parreirinha de Alfama”, s/d

Alfredo Marceneiro, Lina Maria Alves e Mariana Silva, “Parreirinha de Alfama”, 5 de Setembro de 1962, September 5 1962

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Em 1952, sob a gerência de Alberto Rodrigues e Argentina Santos, a “Parreirinha de Alfama” já acolhera nomes grandes da estirpe fadista como Amália Rodrigues, Alberto Ribeiro ou Joaquim Pimentel. Folheando a imprensa da especialidade ali se reconhece a devoção dos seus proprietários pelo fado, nomeadamente na decoração da casa: “um recantozinho da sala de jantar, [que] presta humilde mas ternurenta homenagem a uma extraordinária fadista. É o «cantinho da Amália»”11.

Ao longo da década de 1950 pela “Parreir-inha de Alfama” passaria uma plêiade de artistas - como Lucília do Carmo, Alfredo Marceneiro, Júlio Vieitas, Berta Cardoso, Maria Amorim, Manuel Fernandes, Lina Maria Alves, Tristão da Silva, Flora Pereira, Alberto Costa ou Fernanda Maria – que inequivocamente contri-buiria para a projecção da casa. Afi rmando-se paulatinamente como um dos mais emblemáti-cos locais de fado da cidade, a Parreirinha era local de presença obrigatória de poetas de nomeada como João Linhares Barbosa, Henrique Rego ou Francisco Radamanto autor da quadra que convida à entrada na casa:

In 1952, by the hands of Alberto Rodrigues and Argentina Santos, the “Parreirinha de Alfama” welcomes some of the major names of fado, such as Amália Rodrigues, Alberto Ribeiro or Joaquim Pimentel. Reading the specialty press one may feel their love and devotion for fado, namely in the restaurant’s interior design: “a corner of the dinning room pays a humble yet sweet tribute to an outstanding fado singer. It is the «Amália’s corner»”12.

A wide range of artists made appearances at “Parreirinha de Alfama” during the 1950’s - Lucí-lia do Carmo, Alfredo Marceneiro, Júlio Vieitas, Berta Cardoso, Maria Amorim, Manuel Fernandes, Lina Maria Alves, Tristão da Silva, Flora Pereira, Alberto Costa or Fernanda Maria – thus con-tributing to its good name in the business. Step by step the Parreirinha became one of the most famous fado restaurants in Lisbon and among its regular clients were included some major poets, as João Linhares Barbosa, Henrique Rego or Francisco Radamanto – who wrote the inviting quatrain that hangs on the entrance:

Berta Cardoso, Maria Carmen, Lina Maria Alves, Manuel Fernandes, “Parreirinha de Alfama”, s/d

Luis Cunha e Silva, Beatriz Costa, Alfredo Marceneiro, “Parreirinha de Alfama”, s/d

11 - “Ecos de Portugal”, 1 de Maio de 1952.12 - “Ecos de Portugal”, May 1, 1952.

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Alfredo Marceneiro com “Fadista” o cão de Argentina Santos, Lisboa, s/dAlfredo Marceneiro and “Fadista”, Argentina’s dog, Lisbon, s/d

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Sobre a génese desta quadra explicaria a própria Argentina: “um dia houve uma fes-ta grande (…) e ele fez-me muitas quadras para se pôr aqui na casa, quadras muito bonitas. Mas a que me disse mais foi esta (...) como tenho a mania das obras e de andar sempre a embonecar mandei fazer esta em azulejo…”13

Argentine explained how this quatrain was created: “once we threw a big party (…) he wrote plenty of this type of quatrains, very nice quatrains to hang on these walls. But this one touched me deeply (...) and since I’m a big fan of renovation works and inte-rior design, I had it painted on tile…”14

Não tenham medo da famaD’Alfama mal afamada,

Que a fama às vezes difamaGente boa, gente honrada!

Francisco Radamanto

Don’t be afraid of fameOf Alfama with the bad name,

Because fame sometimes slandersGood people, honourable people!

Francisco Radamanto

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13 - Baptista Bastos (1999), “Fado Falado”, pp. 74.14 - Baptista Bastos (1999), “Fado Falado”, pp. 74.

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O culto da poesia popular era aliás, pro-movido por Alberto Rodrigues, ele próprio criador de vários poemas do repertório de Argentina Santos (“Coração não batas tanto”, “Passeio fadista”, “A minha pronúncia”, entre outros), Lina Maria Alves (“O cigano é só meu”, “Marcha do povo” ou “Minha Alfama”, entre outros), Mariana Silva (“Errei mas não fui cul-pada”), ou Alberto Costa (“Boneca de loiça”).

The cult of popular poetry had always been encouraged by Alberto Rodrigues, who also wrote several fados for the repertoire of Argentina Santos (“Coração não batas tanto”, “Passeio fadista”, “A minha pronúncia”, and many other), Lina Maria Alves (“O cigano é só meu”, “Marcha do povo” or “Minha Alfama”, among many more), Mariana Silva (“Errei mas não fui culpada”), or Alberto Costa (“Boneca de loiça”).

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Em Lisboa, o contexto do circuito fadista das décadas de 1950 e 1960 correspondeu a um período de franca vitalidade destes recintos, quer pela proliferação de novas casas, quer pela dinamização de espaços existentes, muitos deles abertos pelos próprios artis-tas, desde a década de 30. Constituem bons exemplos deste tipo a “Adega Machado” (Rua do Norte), que abriu em 1937 por iniciativa do violista Armando Machado e da sua es-posa, a fadista Maria de Lourdes Machado; a “Adega da Lucília” (posteriormente “Faia” – Rua da Barroca), casa que Lucília do Carmo inaugurou em 1947; “A Tipóia”, de Adelina Ramos (Rua do Norte), inaugurada em 1950; a “Márcia Condessa” (Praça da Alegria), aberta pela fadista na década de 1950; a “Viela” (Rua das Taipas), que se torna propriedade de Celeste Rodrigues em 1957; o “Solar da Hermínia” (Largo Trindade Coelho), restau-rante aberto em 1958 por Hermínia Silva; “A Toca” de Carlos Ramos (Travessa dos Fiéis de Deus), aberta em 1959; o “Lisboa à Noite” da fadista Fernanda Maria (Rua das Gáveas), com abertura em 1964; ou a “Taverna do Embuçado” (Beco dos Costumes) de João Ferreira Rosa, casa aberta em 1966.

Throughout the 1950s and 1960s fado res-taurants lived a golden era in Lisbon by the opening of new ones and by the promoting of the ones that were operating in those days. The artists themselves after the 1930s had established many of the latter. Some good examples are the “Adega Machado” (Rua do Norte), established in 1937 by the violin player Armando Machado and his wife the fado singer Maria de Lourdes Machado; the “Adega da Lucília” (later “Faia” – Rua da Barroca), established by Lucília do Carmo in 1947; “A Tipóia” by Adelina Ramos (Rua do Norte), opened in 1950; the “Márcia Condessa” (Praça da Alegria), established by this fado singer in the 1950s; the “Viela” (Rua das Taipas), acquired by Celeste Ro-drigues in 1957; the “Solar da Hermínia” (Largo Trindade Coelho), a restaurant esta-blished in 1958 by Hermínia Silva; “A Toca” de Carlos Ramos (Travessa dos Fiéis de Deus), in 1959; the “Lisboa à Noite” established in 1964 by the fado singer Fernanda Maria (Rua das Gáveas); or the “Taverna do Embuçado” (Beco dos Costumes) established in 1966 by João Ferreira Rosa.

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Joaquim Pimentel, Teresinha Alves, Manuel Mendes (guitarra portuguesa/portuguese guitar), “Parreirinha de Alfama”, 1972

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A assumpção destes espaços como garante da autêntica tradição fadista, pontuada pela cozinha tradicional portuguesa espelhava-se necessariamente na imagem publicitada, desde os anos 50 pela “Parreirinha de Alfama”, como ilustra o anúncio à casa, publicado em 1954: “No coração mais típico de Lisboa, existe uma casa «A Parreirinha», onde todas as noites ressurge o fado antigo dos trovadores popula-res, na sua expressão mais pura. Um momento de fado na «Parreirinha», - É sempre um mo-mento de saudade e evocativa emoção!”15.

The postulation of these concepts as an au-thentic fadista tradition combined with the traditional Portuguese gastronomy was also conveyed by the advertising image of “Par-reirinha de Alfama” in the 1950s, as stated in the 1954 advertisement: “In the very heart of Lisbon there is a restaurant - «A Parreirinha» - where every evening the purest fado of the ancient popular troubadours is reborn again. A moment of fado at «Parreirinha» is always a moment of emotion and nostalgia!”16.

Santos Moreira, Amália Rodrigues, “Parreirinha de Alfama”, s/d

15 - “Voz de Portugal”, 10 de Setembro de 1954.16 - “Voz de Portugal”, 10 September 10, 1954.

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Nos alvores da década de 1960, a Parreirinha é consensualmente reconhecida como “um dos templos do Fado (….) pela sua anti-guidade, pela sua história, pelas suas tradições, pelo elenco que sempre soube seleccionar”17. Procurando disponibilizar ao público a caracterização fi el das noites de fado na Parreirinha, a Alvorada grava os seus artistas ao vivo no espaço da casa de fados lan-çando em 1962 o disco em formato LP “Uma Noite na Parreirinha de Alfama”. Aqui encontramos as interpretações de Maria da Fé, Lina Maria Alves, Alberto Costa, Mariana Silva, Celeste Rodrigues e, obviamente, a proprietária do espaço – Argentina Santos. Quatro anos depois, a mesma etiqueta volta a editar um EP, desta vez com António Bessa na guitarra e Santos Moreira na viola, que regista as interpretações de Lina Maria Alves, Celeste Rodrigues, Natalino Duarte e Argentina Santos. O sucesso deste tipo de registo não de-ixa dúvidas e o espaço da Parreirinha voltará a ser objecto de edição discográfi ca, em 1972, desta feita com a marca Rapsódia, no EP de título “A Parreirinha de Alfama”.

In the early 1960s Parreirinha is well known as “one of the temples of Fado (….) by its antiquity, history, traditions, and well chosen cast”18. In order to convey a faithful portrait of Parreirinha’s fado evenings, the recording company Alvorada records live shows and in 1962 releases the LP “Uma Noite na Parreirinha de Alfama”. This record features Maria da Fé, Lina Maria Alves, Alberto Costa, Mariana Silva, Celeste Rodrigues, and – obviously – the owner of the restaurant Argentina Santos. Four years later this same label releases an EP featuring António Bessa on the Portuguese guitar and Santos Moreira on the guitar, and the voices of Lina Maria Alves, Celeste Rodrigues, Natalina Duarte, and Argentina Santos. This record was a huge success and in 1972 Parreirinha’s shows are once again taped for an EP record released by Rapsódia called “A Parreirinha de Alfama”.

17 - Texto promocional do EP “Uma Noite na Parreirinha de Alfama”, Alvorada (AEP 60776), 1966.18 - EP’s promotional text “Uma Noite na Parreirinha de Alfama”, Alvorada (AEP 60776), 1966.

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Amália Rodrigues, “Parreirinha de Alfama”, 6 de Maio de 1954. May 6 1954

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Celeste Rodrigues, António Bessa (guitarra portuguesa/ portuguese guitar) Santos Moreira, “Parreirinha de Alfama”, s/d

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No ano de 1963, depois do falecimento de Alberto Rodrigues e da compra das quotas à família19 Argentina Santos assume a responsabilidade da gestão da sua casa. Recusando por largos anos a exposição mediática, a sua carreira confi nou-se ao circuito tradicional das casas de fado, nomeadamente à sua Parreirinha, com raras aparições no exterior e sempre em fes-tas de amigos. Ainda assim e durante décadas, Argentina can-tou ao lado de grandes vozes como Lucília do Carmo, Berta Cardoso, Celeste Rodrigues, Alfredo Marceneiro, Maria da Fé, Fernanda Maria20, Mariana Silva, Natércia da Conceição, Natalina Bizarro, Helena Tavares, Leonor Santos, Beatriz da Conceição, Flora Pereira, Júlio Peres, entre muitos outros.

In 1963 – following the death of Alberto Rodrigues and the acquisition from the family21 - Argentina Santos steps in as manager of her restaurant. Always refusing media exposure, her career was confi ned to the traditional fado restaurants’ cir-cuit, namely at her own Parreirinha or, very seldom, in diff erent places or at some friends’ private parties. For many decades nevertheless Argentina sang with the major fado voices, as Lucília do Carmo, Berta Cardoso, Celeste Rodrigues, Alfredo Marceneiro, Maria da Fé, Fernanda Maria22, Mariana Silva, Natércia da Conceição, Natalina Bizarro, Helena Tavares, Leonor Santos, Beatriz da Conceição, Flora Pereira, and Júlio Peres among many more.

19 - “Plateia”, 10 de Abril de 1963, pp. 7.20 - Fernanda Maria iniciou a sua carreira na “Parreirinha de Alfama”. 21 - “Plateia”, 10 de April 10, 1963, pp. 7.22 - Fernanda Maria lauched her career at “Parreirinha de Alfama”.

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Desde muito cedo consciente da importância de um repertório próprio e original, Argentina Santos fez questão de cantar temas exclusi-vos, à excepção do fado “A Lágrima”, de Amália Rodrigues, e de “Lisboa Casta Princesa”, do repertório de Ercília Costa, mas popularizado por Lucília do Carmo. Temas como “A Minha Pronúncia”, o “Chafariz d’ El Rei”, “As Duas Santas” e “Juras” tornaram-se na sua ima-gem de marca, desde logo registados nos seus primeiros trabalhos discográfi cos, ainda em formato de 78 rpm, gravados para a editora Estoril, logo no ano da sua estreia, em 1953. A sua tímida personalidade, porém, haveria de ditar-lhe uma produção discográfi ca não muito vasta, pontuada por períodos – como a década de 1980 - de ausência de quaisquer edições. Nos últimos anos, foram editados os albuns “Argentina Santos”, (Movieplay, 1998) e “Argen-tina Santos”, (CNM, 2004).

Since she was well aware of the importance of having her own original repertoire Argentina Santos – apart from the fado “A Lágrima”, by Amália Rodrigues, and “Lisboa Casta Princesa”, from Ercília Costa’s repertoire and popularised by Lucília do Carmo – always sang exclusive songs. Some fados, as “A Minha Pronúncia”, “Chafariz d’ El Rei”, “As Duas Santas” and “Ju-ras” became her trademark. These songs were included in her fi rst 78-rpm records, released by the Estoril recording company on her debut in 1953. Her shy personality however would pre-vent her from recording many records. Some decades – like the 80s – had no recordings. Nevertheless two albums were recently re-leased: “Argentina Santos”, (Movieplay, 1998) and “Argentina Santos”, (CNM, 2004).

Nicolau Neves, Argentina Santos e Adelina Ramos, “A Tipóia”, s/d

Mariana Silva, Argentina Santos, Celeste Rodrigues, Lina Maria Alves, “Parreirinha de Alfama”, s/d

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“Eu não saía de casa. O Carlos do Carmo dizia que era um peixinho de aquário. Saí por causa dele”

“I wouldn’t go out. Carlos do Carmo used to say I was a golden fi sh in a fi shbowl. He was the reason I left my home”

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Nas décadas de 1980 e 90 desenvolver-se-ia o circuito discográfi co e de espectáculos, nomeadamente através da expansão do interesse mediáti-co da world music. Como explica Rui Vieira Nery “o universo das casas de fado – último depositário de uma tradição contínua vinda da déca-da de 1930 em que até aí se tinha baseado o contacto privilegiado do público com o género e o próprio processo de recrutamento e legitimação de novos intérpretes – está agora, na sua essência, afastado deste quadro mediático e fechado sobre si próprio.”23

Confi nando as suas apresentações ao espaço da Parreirinha a partir do qual se projectara já consensualmente no círculo de cultores do fado como uma das suas mais autênticas intérpretes, seria somente a partir de 1994, pela mão do seu querido amigo e admirador, Carlos do Carmo, que o grande público português conheceria Argentina Santos. Da amizade que os une, ela própria testemunharia em entrevista: “eu tinha muita admira-ção por ele, pela maneira de ele com aquela idade já ser muito seguro de si. Não era uma criança (…) Com catorze anos (…) ele já era um senhor (…) Admirei-o sempre. E ele, não sei porquê, também gosta muito de mim.”24

During the 1980s and 1990s this genre had a widespread develop-ment, namely by the rising interest the media had for world music. According to Rui Vieira Nery “the universe of fado restaurants – the ultimate guardian of a continuous tradition from the 1930s that until then had been supported by the relationship with the public, and by its own re-cruiting and legitimating of new interpreters process – is now in its deep essence away from the media and shut upon itself.”25

Until this moment she would only appear at Parreirinha – where she had already a great number of fans and was seen as one of the major fado singers. As off 1994 the general Portuguese audiences would know Argen-tina Santos by the hand of her close friend and admirer Carlos do Carmo. Talking about their reciprocal friendship, she mentioned in an interview: “I had great admiration for him because he was so young and yet so sure of himself. He was not a child (…) At fourteen (…) he was a real gentleman (…) I always admired him. I don’t know why but he is also very fond of me.”26

23 - Rui Vieira Nery (2004); “Para uma História do Fado”, pp. 26524 - Argentina Santos em entrevista a Baptista-Bastos, “Fado Falado”, Ediclube, 1999, pp. 74.25 - Rui Vieira Nery (2004); “Para uma História do Fado”, pp. 26526 - Argentina Santos in an interview by Baptista-Bastos, “Fado Falado”, Ediclube, 1999, pp. 74.

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Argentina Santos em actuação para o programa “Um Abraço Português” de Carlos do Carmo, RTP I,Novembro 1997

Argentina Santos appearing at Carlos do Carmo TV Show “Um Abraço Português”, RTP I, November 1997

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Participando nos concertos de Carlos do Carmo no Coliseu dos Recreios (1994) e no Centro Cultural de Belém (1998), estavam reunidas as condições para a mediatização nacional e internacional da artista Argentina Santos. Desde a sua primeira aparição no palco do Coliseu a sua carreira conheceu uma projecção internacional inédita até então. No mesmo ano actua em Londres, no Queen Elizabeth Hall e, no ano seguinte regressaria àquele palco e participa ainda no Festival Internacional de Edimburgo, com Jorge Fernando e Pedro Caldeira Cabral. A crítica aplaude-a, afi rmando: “Argentina Santos (…) had the audience holding their breath as she pulled her voice back in a supplicating whisper at those moments when fado states unbearable truth.”27

Em 1998 Portugal aplaude-a no espectáculo de Ri-cardo Pais “Raízes rurais. Paixões Urbanas”. Mais tarde, a cidade de Paris enaltece-a no Festival Les Mediterranéennes, em Paris, nos espectáculos com Carlos Zel e Jorge Fernando. Ainda em 1999, integra a programação “Iberian Voices” do Festival Giving Voice onde representa o fado com Jorge Fernando ao lado do artista de fl amenco, Tomas Utrera. Na Union Chapel, em Londres, numa programação consagrada às músicas da Geórgia, Portugal, Espanha e Córsega, Argentina Santos é enaltecida na sua extraordinária expressividade melódica mas também no seu ca-risma e na sua entrega: “Argentina Santos has been described by Plácido Domingo as enrapturing and she commands enormous respect amongst musicians of many genres for her extraordinary melancholy vocal style. (…) She is a transcendent musician, her cha-risma and delivery bridging the gap to audiences who do not understand the language of her songs.”28 A 18 de Outubro de 1999, Argentina Santos sobe ao palco do Town Hall, em Nova Iorque, no espectáculo “A tribute to Amália Rodrigues”.

Her special appearances in concerts by Carlos do Carmo - Coliseu dos Recreios (1994) and Centro Cultural de Belém (1998) – triggered Argentina’s national and international mediatisation. As off her fi rst appearance on the stage of Coliseu dos Recreios her career had an international projection as never seen before. That same year she also appears in London, at Queen Elizabeth Hall, and the following year at the same stage and at the Edinburgh International Festival, with Jorge Fernando and Pedro Caldeira Cabral. The reviews praise her and express: “Argentina Santos (…) had the audience holding their breath as she pulled her voice back in a supplica-ting whisper at those moments when fado states unbearable truth.”29

In 1998 Portugal cheers Argentina in the show by Ricardo Pais “Raízes rurais. Paixões Urbanas”. Later on the city of Paris praises her performance at Fes-tival Les Mediterranéennes in the shows co-starring Carlos Zel and Jorge Fernando. Also in 1999 she ap-pears in “Iberian Voices” at the Giving Voice Festival on behalf of Fado with Jorge Fernando and the fa-mous Flamenco artist Tomas Utrera. At the Union Chapel, in London, Argentina Santos is praised for her extraordinary melancholy vocal style and for her charisma and delivery bringing in a programme dedi-cated to the music from Georgia, Portugal, Spain, and Corsica: “Argentina Santos has been described by Plácido Domingo as enrapturing and she commands enormous respect amongst musicians of many genres for her extraordinary melancholy vocal style. (…) She is a transcendent musician, her charisma and delivery bridging the gap to audiences who do not understand the language of her songs.”30 On October 18, 1999, Argentina Santos takes the stage at the New York Town Hall appearing in the show “A tribute to Amália Rodrigues”.

27 - Jan Fairley, “Fado Review”, “The Scotsman”, 28 de Agosto de 199528 - Programa do espectáculo “Giving Voice at the Union Chapel”, 9 a 11 de Abril de 1999.29 - Jan Fairley, “Fado Review”, “The Scotsman”, August 28, 199530 - Programme of the show “Giving Voice at the Union Chapel”, April 9 – 11, 1999.

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Espectáculo de Homenagem a Argentina Santos, Coliseu dos Recreios, 28 de Abril de 2000.

April 28 2000

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No ano seguinte os amigos de uma vida celebram com ela 50 anos de carreira num comovente con-certo no Coliseu dos Recreios: Carlos do Carmo, Camané, Maria da Fé, Rodrigo, Jorge Fernando, Ma-falda Arnauth, Carlos Macedo, Ricardo Rocha, Paulo Parreira, José Maria Nóbrega, Costa Branco e mui-tos outros celebram a vida, o afecto e a arte de Argentina Santos.

No mesmo ano, o fascínio em torno da fi gura de Argentina Santos, estender-se-ia a Itália numa tournée organizada pela Embaixada de Portugal em Roma através da qual o espectáculo protagoniza-do por si e Carlos Zel fará digressão por Oristano, Perugia e Torino e Modena31. Deslumbrando o pú-blico italiano, o jornal “Gazzetta di Modena” chama-lhe “la sublime Argentina Santos” e relata desta forma a experiência de a ouvir cantar: “É diffi cile tradurre in parole l’emozione che si prova ascoltan-do la sua voce intensa, ruvida, ma soprattutto ca-pace di eff etti timbrici straordinari, su tutti quel pianissimo intenso e caldo come brividi che i brividi che ti assalgono al suono della sua voce. Argentina Santos canta scandendo le parole come se reci-tasse e questo suo recitar cantando proiettano le parole delle canzoni dentro l’animo dell’ ascoltatore al quale non resta che abbandonarsi al fascino delle storie di amori appassionati e storie di vita vissuta in cui il fado, l’italiano fato, decide i destini di uomini e donne.”32

The following year her lifelong friends joined her in celebrating her 50th career anniversary in a deeply touching concert at Coliseu dos Recreios: Carlos do Carmo, Camané, Maria da Fé, Rodrigo, Jorge Fernando, Mafalda Arnauth, Carlos Macedo, Ricardo Rocha, Paulo Parreira, José Maria Nóbrega, Costa Branco, and many more celebrated the life, love and art of Argentina Santos.

That same year Italy would also be overwhelmed by Argentina in a tour organised by the Portu-guese Embassy in Rome starring Argentina and Carlos Zel. This shows took place in Oristano, Perugia, Torino, and Modena.33 Dazzling the Italian audiences, the paper “Gazzetta di Modena” calls her “la sublime Argentina Santos” and depicts the experience of hear-ing her singing: “É diffi cile tradurre in parole l’emozione che si prova ascoltando la sua você intensa, ruvida, ma soprattutto capace di eff etti timbrici straordinari, su tutti quel pianissimo intenso e caldo come brividi che i brividi che ti assalgono al suono della sua voce. Argentina Santos canta scandendo le parole come se recitasse e questo suo recitar cantando proiettano le parole delle canzoni dentro l’animo dell’ ascoltatore al quale non resta che abbandonarsi al fascino delle storie di amori appassionati e storie di vita vissuta in cui il fado, l’italiano fato, decide i destini di uomini e donne.”34

José Luís Nobre Costa, Joel Pina, Argentina Santos, Francisco Gonçalves, Carlos Zel, Teatro del Pavone, Perugia, Itália, Fevereiro February de 2000

31 - “Ultime Notizie”, 6 de Fevereiro de 2000.32 - “Gazzetta di Modena”, 7 de Fevereiro de 2000.33 - “Ultime Notizie”, February 6, 2000.34 - “Gazzetta di Modena”, February 7, 2000.

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Mariza, Argentina Santos, Carlos do Carmo, Museu do Fado, 2 de Outubro de 2008

Mariza, Argentina Santos, Carlos do Carmo, Museu do Fado, October 2, 2008

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Desde 1994, a carreira de Argentina Santos conhece a vertigem do êxito com espectáculos pelas salas de es-pectáculo mais prestigiadas do país e do estrangeiro. Em 2005, Ricardo Pais encena “Cabelo Branco é Saudade”, um espectáculo com as vozes de Argentina Santos, Celeste Rodrigues, Alcindo de Carvalho e Ricardo Ribeiro. Corren-do, nesse ano, os palcos dos grandes teatros nacionais, o espectáculo apresenta-se nos anos seguintes em Madrid (2006) e em Paris na Cité de la Musique (2007).

As off 1994 Argentina Santo’s career goes through the vertigo of success and appears in some of the major theatres in Portugal and abroad. In 2005 Ricardo Pais stages “Cabelo Branco é Saudade”, a show starring the voices of Argentina Santos, Celeste Rodrigues, Alcindo de Carvalho and Ricardo Ribeiro. This show tours the stages of the major domestic theatre halls as well as abroad: Madrid (2006) and Paris – Cité de la Musique (2007).

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“Cabelo Branco é Saudade”, de Ricardo Pais, São Luiz Teatro Municipal, Lisboa, 2005

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Em simultâneo, a sua arte merece reconhecimento público com homenagens institucionais: no Museu do Fado é-lhe prestada homenagem em 1999. Mais tarde, a cidade de Lisboa assinala o seu local de nascimento por iniciativa da Junta de Freguesia do Socorro (2003). No mesmo ano a Casa da Imprensa atribui-lhe o prémio Casa de Fados, na “Grande Noite do Fado”. Em 2005 a Fundação Amália Rodrigues atribui-lhe o Prémio Carreira. Em Itália, no mesmo ano, a Academia do Fado em Racanati, presta-lhe homenagem tornando-a madrinha da escola desta institu-ição, que toma o seu nome. Finalmente em 2007 o fi lme “Fados” de Carlos Saura, vinha conferir projecção universal à arte de Argentina Santos.

At the same time her art gets a public recognition with institutional tributes in Lisbon - Museu do Fado (1999), marking her birthplace promoted by Junta de Freguesia do Socorro (2003), and at “Grande Noite do Fado”. That same year Casa da Imprensa also awarded her the Casa de Fados prize. In 2005 the Fundação Amália Rodrigues grants her a life achievement award. That same year in Italy the Ranati’s Academia do Fado honours her by inviting her to be patron and naming the school after her. Finally - in 2007 – Carlos Saura’s feature fi lm “Fados” gave an international projection to the art of Argentina Santos.

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“A mim ninguém me diz nada. Nem a maneira de cantar. Eu nunca canto igual, nem repertório nem nada. Eu estou muito acostumada a mandar em mim, gosto muito de mandar em mim, de maneira que aquilo que gosto é aquilo que canto, é aquilo que sinto.”

“No one tells me anything. Not even how to sing. I never sing the same way, nor my repertoire is the same. I’m used to be my own boss; I enjoy being my own boss. That is why I sing what I like and what I feel.”

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Autenticidade. Eis o que melhor descreve o fado de Argentina Santos. Um canto que se espraia, vagaroso, num murmúrio lento capaz de se elevar ao limite de ruptura da nota. Sustemos a respiração, à medida que o seu fado acende palavras que toma como suas.

Na extensa lista de admiradores de Argentina Santos, encontramos os nomes de Carlos Tê, Ricardo Pais, José Tolentino de Mendonça, Carlos Saura, Carlos do Carmo, Camané, Jorge Fernando, Ricardo Ribeiro, Fernanda Maria, Maria da Fé, Rodrigo, Carminho, Caetano, Gal, Lúcio Dalla, Gilberto Gil e tantos outros…

Recusando durante décadas qualquer exposição mediática, Argentina Santos confi nou grande parte do seu percurso artístico ao espaço da “Parreirinha de Alfama”. Ao fazê-lo, fez também da sua casa uma autêntica ofi cina de fados, cenário de afectos e palco da cumplicidade criativa de poetas, músicos e fa-distas.

Ocupando um lugar de absoluta centralidade no inventário das memórias da canção urbana de Lisboa, Argentina Santos protagonizou as grandes mutações nos contextos performativos do fado ao longo da segunda metade do século XX. Construída através de um permanente diálogo com a cidade de Lisboa, na história do fado se entreteceram as histórias dos seus protagonistas, de todos aqueles que o criaram e recriam, por estes alvores do século XXI. Na voz de Argentina Santos escutamos hoje, para nosso fascínio, as mais arreigadas tradições fadistas.

Authenticity. This is the best word to describe the fado of Argentina Santos. A chanting that unhurriedly expands in a slow whisper able to reach the limits of the burst of the melody. We hold our breath as her fado lights the words she takes as her own.

Among Argentina’s wide list of fans we can fi nd such names as Carlos Tê, Ricardo Pais, José Tolentino de Mendonça, Carlos Saura, Carlos do Carmo, Camané, Jorge Fernando, Ricardo Ribeiro, Fernanda Maria, Maria da Fé, Rodrigo, Carminho, Caetano, Gal, Lúcio Dalla, Gilberto Gil and so many more…

For decades Argentina Santos refused any media exposure and most part of her artistic career was confi ned to “Parreirinha de Alfama”. And on doing so she also turned her restaurant into a true fado workshop, a set of aff ections and stage for creative complicity for poets, musicians and fadistas.

Occupying a core place within the inventory of Lisbon’s urban song memories, Argentina Santos starred the major changes of fado’s performing contexts throughout the second half of the 20th century. Built through an everlasting dialogue with Lisbon, the story of fado weaved the stories of its major personalities, of all those who created and recreated it in the dawn of this 21st century. For our utmost fascination in the voice of Argentina Santos we can nowadays listen to the most deep-rooted fado traditions.

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Discografi a

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Disco Record EP Argentina Santos – Parreirinha de AlfamaMarfer MEL. 2-121, Madrid, Espanha, 1972183 x 183 mmEspólio de Collection Argentina SantosOferta de Off ered by Junta de Freguesia de Santo EstêvãoInv. nº 10847

Disco Record EP Uma Noite na Parreirinha de Alfama 1Alvorada AEP 60509, déc. 60180 x 179 mmEspólio de Collection Alexandra Mendes

Disco Record EP Uma Noite na Parreirinha de Alfama 2Alvorada AEP 60510, déc. 60179 x 178 mmEspólio de Collection Alexandra Mendes

Disco Record EP Uma Noite na Parreirinha de AlfamaAlvorada AEP 607 76, 1966182 x 180 mmEspólio de Collection Alexandra Mendes

Disco Record EP Argentina SantosRapsódia EPF 5.617, 1972180 x 181 mmEspólio de Collection Judite Marques Pessoa

Disco Record LP Argentina SantosRR LP 2051, 1968310 x 312 mmEspólio Collection Argentina SantosOferta Off ered by Maria Emília VicenteInv. Nº 13936

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Disco Record LP Argentina SantosRR LP 2051, 1978310 x 309 mmEspólio de Collection Maria Cristina Pita

Disco Record EP A Parreirinha de AlfamaRapsódia EPF 5.615, 1972180 x 182 mmEspólio de Collection Alexandra Mendes

CD Argentina Santos – Meu FadoDiscossete, 1995125 x 142 mmEspólio de Collection Alexandra Mendes

CD Argentina Santos – Fado AntologiaCompanhia Nacional de Música, 2004126 x 143 mmEspólio de Collection Museu do Fado

CD Argentina SantosColecção Fados do FadoMovieplay Portuguesa, 1998124 x 142 mmEspólio de Collection Museu do Fado

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Projecto da Exposição António Viana

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Ficha Técnica Credits

Produção / Production: EGEAC E.E.M./Museu do Fado

Conselho de Administração da EGEAC / EGEAC Boarding AdministrationMiguel Honrado Lucinda Lopes Paulo Braga

Comissariado / Curator: Sara Pereira

Concepção Plástica e Realização / Artistic Conception: António VianaAssistente de Realização Editor Assistant: Miguel Costa

Pesquisa, Catalogação / Research, Cataloguing: Ana Gonçalves, Sofi a Bicho, Susana Costa

Produção Executiva / Executive Producer: Cristina Almeida

Fotografi a, Audiovisual / Photography, Audiovisual: Luís Carvalhal

Textos / Texts: Sara Pereira, Sofi a Bicho

Construção e Montagem / Assembly: Construções Sampaio

Comunicação Gráfi ca / Graphical Communication: Ofi cina de Museus

Projecto de Luminotecnia / Electrical Project: Vítor Vajão

Áudio Guias / Audio Guides: FCO

Design Catálogo / Catalogue Design: Luís Carvalhal

Retroversão / Retroversion: Luiza Albuquerque

Impressão / Printed By: Gráfi ca Maiadouro

Colaboração / Cooperation: Agostinha Sousa, Ana Rodrigues, Arlindo Santos, Mariana Branco, Sónia Garrancho, Ricardo Almeida, Ricardo Bóia, Rita Oliveira.

ISBN: 978-989-96629-0-2Depósito Legal:

Agradecimentos / Acknowledgments: Alexandra Mendes, Alzira Rocha Pereira Judite, Junta de Freguesia de Sto. Estevão, Marques Pessoa, Maria Cristina Pita, Maria Emília Vicente, Maria Odete Sona.

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