Arqueologia de Uma Prática Científica Em Portugal. Uma História Da Antropologia

15
Revista da Faculdade de Letras HISTÓRIA Porto, III Série, vol. 6, 2005, pp. 169-183 Maria de Fátima Nunes Arqueologia de uma prática científica em Portugal - uma história da fotografia * R E S U M O A fotografia é perspectivada, neste ensaio, como uma prática científica que teve um papel de relevo no século XIX, em Portugal. O papel comemorativo da Academia das Ciências de Lisboa, em 1940, levantou-nos várias hipóteses de investigação sobre uma outra história da fotografia que se pode relacionar com a construção material do Estado. Assim chegámos a dois referentes fundamentais para a história da fotografia como prática científica: José Júlio Rodrigues e Secção Fotográfica da Direcção Geral dos Trabalhos Geográficos. 1. A fotografia com História A fotografia entrou na História Contemporânea através de diferentes campos de análise, centrados num novo suporte, como material que passou à categoria de fonte nas (re)voltas epistemológicas da História 1 . De imagem positiva da realidade que possibilitou a democratização da imagem, em termos de uso individual e colectivo 2 interessou-me desde algum tempo a história da fotografia como uma prática científica 3 e como uma das áreas possíveis para entrar na história da ciência por via da história da cultura. Este tempo de inovação é concomitante do alargamento do conceito de fonte para a História, sobretudo para o período contemporâneo, tendo a produção/ fixação de imagem fotográfica criado valências variadas para caminhos específicos da História Social, da História Cultural e Política, História das Mentalidades, da Museologia, das Ciências de Documentação e Informação e da renovação da História de Arte e História das Artes Visuais. Entre nós, este tempo de inovação gerou ele mesmo uma História da Fotografia com vários nomes e instituições firmados entre nós, refira-se os casos de Teresa Siza e Carmen Serén no Centro Nacional de Fotografia do Porto, do historiador António Pedro Vicente, do investigador do centro Ceis20 da Universidade de Coimbra, Alexandre Ramires no Ceis20/Coimbra, passando ainda por António Sena, Luís Pavão, ou Carmen Almeida directamente envolvidos com Arquivos Municipais de Fotografia, em Lisboa e em Évora, respectivamente. Deste conjunto de contributos * Este texto teve como base um Seminário de Investigação do Centro de Estudos de História e Filosofia da Ciência da U.E. – Projecto PHYSIS; Teve também o apoio da FCT, através do POCTI7354572000/FCT-MUCT Historical Studies on Scientific Images in Portugal 17 th – 20th centuries. 1 VICENTE, 1984; SONTAG, 1986; AYER, 1996; BURKE, 2002; MONTI/ VICENTE, 1991; SENA, 1998; NUNES, 2003a; ALMEIDA, 2005 2 SENA, 1998 3 CARVALHO, 1976

description

Etnografia

Transcript of Arqueologia de Uma Prática Científica Em Portugal. Uma História Da Antropologia

169 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A L Revista da Faculdade de LetrasHISTRIAPorto, III Srie, vol. 6,2005, pp. 169-183Maria de Ftima NunesArqueologiadeumaprticacientficaemPortugal-umahistria da fotografia*R E S U M O A fotografia perspectivada, neste ensaio, como uma prtica cientfica queteve um papel de relevo no sculo XIX, em Portugal. O papel comemorativoda Academia das Cincias de Lisboa, em 1940, levantou-nos vrias hiptesesde investigao sobre uma outra histria da fotografia que se pode relacionarcomaconstruomaterialdoEstado.Assimchegmosadoisreferentesfundamentais para a histria da fotografia como prtica cientfica: Jos JlioRodrigues e Seco Fotogrfica da Direco Geral dos Trabalhos Geogrficos.1. A fotografia com HistriaA fotografia entrou na Histria Contempornea atravs de diferentes campos de anlise,centradosnumnovosuporte,comomaterialquepassoucategoriadefontenas(re)voltasepistemolgicas da Histria1. De imagem positiva da realidade que possibilitou a democratizaoda imagem, em termos de uso individual e colectivo2 interessou-me desde algum tempo a histriada fotografia como uma prtica cientfica3 e como uma das reas possveis para entrar na histriada cincia por via da histria da cultura. Este tempo de inovao concomitante do alargamentodo conceito de fonte para a Histria, sobretudo para o perodo contemporneo, tendo a produo/fixao de imagem fotogrfica criado valncias variadas para caminhos especficos da HistriaSocial, da Histria Cultural e Poltica, Histria das Mentalidades, da Museologia, das Cinciasde Documentao e Informao e da renovao da Histria de Arte e Histria das Artes Visuais.Entrens,estetempodeinovaogerouelemesmoumaHistriadaFotografiacomvrios nomes e instituies firmados entre ns, refira-se os casos de Teresa Siza e Carmen Sernno Centro Nacional de Fotografia do Porto, do historiador Antnio Pedro Vicente, do investigadordo centro Ceis20 da Universidade de Coimbra, Alexandre Ramires no Ceis20/Coimbra, passandoainda por Antnio Sena, Lus Pavo, ou Carmen Almeida directamente envolvidos com ArquivosMunicipais de Fotografia, em Lisboa e em vora, respectivamente. Deste conjunto de contributos* EstetextotevecomobaseumSeminriodeInvestigaodoCentrodeEstudosdeHistriaeFilosofiadaCincia da U.E. Projecto PHYSIS; Teve tambm o apoio da FCT, atravs do POCTI7354572000/FCT-MUCT Historical Studies on Scientific Images in Portugal 17 th 20th centuries.1 VICENTE, 1984; SONTAG, 1986; AYER, 1996; BURKE, 2002; MONTI/ VICENTE, 1991; SENA, 1998;NUNES, 2003a; ALMEIDA, 20052 SENA, 19983 CARVALHO, 1976170 M A R I A D E F T I M A N U N E SedetrabalhosinstitucionaisresultaramvriasExposiesFotogrficas,acompanhadasdeCatlogos, profissionalmente organizados que trazem sempre um excelente contributo para oalargamento do estado da arte sobre a histria da fotografia, sobre a biografia do fotgrafoe o impacto das suas obras de arte nos hbitos culturais e sociais do Portugal e da Europa deviragem do sculo XIX para o sculo XX.4 O investigador passou, pois, a dispor de um conjuntode instrumentos de trabalho diversificado quando pretende entrar no mundo das chapas quecaptaram instantneos (reais, imaginados ou construdos) da vida real.Sinais rpidos que merc do suporte em que se encontram inseridos passam para a categoriada memria do tempo!5 Sinais que evocam o extico e o pitoresco captado pelo fotgrafo, comoas clebres fotografias de Cunha Moraes, obtidas em frica no final do sculo XIX e publicadaspor David Corazzi no final de oitocentos.6 E , precisamente, a partir deste aspecto especficoque se comea a levantar a questo da funcionalidade cientfica da fotografia, quando ela umsuporteinstrumental,umaprticacientfica,aoserviodeetngrafos,deengenheiros,deantroplogos, de viajantes vs. exploradores cientficos, num arrojo de novo romantismo pautadopela paisagem e pelos enquadramentos humanos africanos.7Asfotografias,seleccionadas,classificadas,recolhidasemlbum(preferencialmentedeluxo) viriam a adquirir a funcionalidade de recrear, de pretexto para prticas de sociabilidadequernasalaburguesa,quernaSociedadedeGeografiadeLisboa,queremreproduesnaimprensa profissional informativa da poca.8 O que nos importa aqui reter a forma como oobjecto fotogrfico pode ser analisado historicamente: a arte de fotografar serviu como discursode legitimidade cientfica para divulgar novos mundos, para criar taxinomias antropolgicas eetnogrficas. Captar a imagem dependia da instrumentao existente e do saber de ptica e dequmica do fotgrafo, transformado em agente cultural e cientfico, assumindo a categoria deum praticante de procedimentos tcnicos e cientficos para levar a bom termo a sua expedio,o seu trabalho.Assim, percebemos que a fotografia com histria pode tambm ser um terreno de uma reaque ultrapassa o terreno disciplinar da Histria, passando para os domnios da histria da cinciae da histria da tcnica, integrando-as no mbito da histria da cultura cientfica e da divulgaocientfica. E vrias foram as perguntas em aberto que se nos colocaram. Fotografia e fotgrafospodiam entrar no mundo da histria da cincia e da sua historiografia como objectos de estudo?O laboratrio de fotografia era o espao por excelncia da profissionalizao do fotgrafo, tambmagente de vrios saberes? A fotografia ia adquirindo carcter de internacionalizao, de rede decontactos profissionais de forma a obter um estatuto institucional que a fazia ser um instrumentode progresso e modernidade essencial aos Estados do final do sculo XIX na Europa, ou melhorno mundo da civilizao ocidental?9.4 TORGAL, 1996; TENGARRINHA, 1997; SENA, 1998; CATALOGO EXPOSIO, 20005 CARVALHO, 1976; SENA, 1998; BURKE, 20026 MORAES, 1885-1888; MONTI/ VICENTE, 19917PONTI/VICENTE,1991;ARTEPHOTOGRAPHICA,1884-1885;CARVALHO,1940;CATALOGOESPECIAL, 19108 NUNES/ CUNHA, 2005b9 GOODMAN, 1992; PHILOSOPHICAL IMAGINATION, 1993; COOTER/ PUMFREY, 1994; SANCHEZRON, 1999; ON TIME , 2000; NUNES, 2001b; 2002a; 2002b;NUNES/ GUELHA, 2004b171 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A LNo fundo, pretendamos transpor algumas das inquietaes conceptuais e metodolgicasda historiografia da Cincia para o campo da FOTOGRAFIA, considerando a produo destafonte como um processo de prticas cientficas. E no mbito de pesquisas realizadas sobre imprensacultural e cientfica especializada10 percebemos que o campo cultural e cientfico da fotografiatinha igualmente a sua imagem colectiva, uma revista, Arte Photographica: um ttulo que marcavaa passagem para o encontro de vrias ocorrncias especializadas neste campo, desde a recepodeoutraspublicaesperidicasespecializadas,aonoticiardeCongressoseExposiesInternacionais, passando pelo noticiar de Sociedades de Fotografia, como sociedades cientficase culturais, para tambm realizar um verdadeiro publicismo cientfico e tcnico em torno deliesdeQumicaedeFsica!Destaextraordinriajunoresultaramprodigiososavanossciencia photographica11 para uso de fotgrafos e de instituies cientficas. Se nos centrarmosna anlise da Arte Photographica. Revista Mensal dos Progresso da Phtotographia e Artes correlativas.Direco Litteraria e Artistica da Photographia Moderna com o concurso dos nossos mais distinctosphotographosamadores12percebemosqueestamosperanteumadaspublicaesdecarctercientfico do sculo XIX, dos muitos ttulos que existiam pela Europa e pela Amrica (do Nortee do Sul) demonstrando o carcter de profissionalizao e de especializao dos actores de prticascientficas.Realizando a arqueologia do discurso emitido nesta publicaes especializada em fotografia,detectamos marcas claras de um universo de prtica cientfica, de sociabilidade cientfica, deuma matriz de profissionalizao em torno da construo, do aperfeioamento e da inovao deum novo objecto da Cincia: a fotografia.E tal como nas demais reas da cincia, a fotografia insinua-se nesta publicao atravs dosmltiplos contributos dos seus colaboradores,13 com sinais evidentes de apresentar ao pblico oprogressoqueacinciafotogrficaiaobtendonasredesdeconstruodesaberes.,pois,compreensvelquefaceaograndepblico,eparaumpblicoaltamenteespecializado,estapublicao(quefuncionoucomogramticadeoutraspublicaesdaespecialidade)tenhainmeras notcias a Congressos de fotografia, s Exposies que se iam realizando pela Europa, presena dos fotgrafos portugueses neste certames de festa e progresso que caracterizavam oambiente cultural e cientfico da segunda metade do sculo XIX na civilizao ocidental.A partir do objecto de anlise de uma publicao cientfica14 julgamos ser pertinente fazerdeslocar a fotografia do campo da produo de objectos artsticos e/ou melanclicos, da produode novos produtos iconogrficos para uma cultura de massas em crescimento, para o campo daexistncia de espaos cientficos e de prticas cientficas. O que implica que faamos a associaoentre dois signos fundamentais: laboratrio e fotografia. Assim, podemos organizar um caminhopara a histria da fotografia descentrada das grandes personagens que imperam como os pioneiros10 NUNES, 2001a; NUNES, 2003 b11 Usamos esta expresso retirada a publicao peridica Arte Photographica, 188412 Publicada no Porto, a partir de 1884, Editada pela Photographia Moderna, na Rua da Picaria, nmero 1.13 Destacamos os nomes de Antnio Ramos Pinto, Adriano Pinto, Cunha Moraes, James Searle, Carlos Relvasentre noutros.14 NUNES, 2001a; 2003 b172 M A R I A D E F T I M A N U N E SdaproduodeobjectosfotogrficosemPortugal.Percebemosqueparaalmdocultodapersonalidade do fotgrafo existe um ambiente cientfico prvio, a antecmara que prepara epermite o clique mgico da produo da chapa desejada.Teriam os progressos tcnicos e cientficos, que a fotografia conheceu ao longo do sculoXIX e primeira metade do sculo XX, sido proporcionados pela necessidade de encontrar soluesprticas cincia e tcnica aplicada realidade e inovar reas do saber em desenvolvimento?Haveria um paralelismo entre o fascnio e o rpido progresso dos procedimentos fotogrficos eoProgressodosaberemgeral?Embuscasbibliogrficascruzadasencontrmososeguintetestemunho do incio do sculo XX, em Portugal:A fotografia desempenha, hoje ainda, uma funo de capital importncia na investigaojudiciria, to numerosas e variadas so as suas aplicaes. A fotografia permite, assim por exemplo,obter uma imagem fiel das disposies que, por ventura, se observem no local dum crime, dumsuicdio, dum acidente ou de uma catstrofe; esta uma das suas mais importantes aplicaesem matria judiciria.15A fotografia era vista, pois, como um instrumento de trabalho, como uma prtica cientficaquefaziadafotografiaaprovadocumentalquecoadjuvavaoutrosprocessosdeinvestigao.Estamos num campo semelhante ao da fotografia e uso da imagem fotogrfica para Medicina,com especial destaque para o seu uso na Escola Mdico-Cirrgica de Lisboa, no Museu Anatmicodependncia onde se iniciou formao duma coleco de peas de Anatomia Patolgica, deembriologia e de Anatomia Fisiolgica, naturais ou modelados em cera ou outros materiais.Arquivaram-se,tambm,nestaseco,osprimeirosdocumentosiconogrficosobtidospormtodos pticos.16Pistas que nos foram chegando de forma a olharmos os processos de inovao e de aplicaoprticadeprocedimentoscientficos,manipuladosedesempenhadosporumacomunidade/sector da populao muito especial: os fotgrafos.Ser que as primeiras geraes de fotgrafos no devem ser visionadas no mbito de umacomunidade cientfica alargada, com peso e importncia em redes de comunicao cientfica,em canais de sociabilidade cientfica e com mecanismos prprios de construo de identidadeprofissional, de cariz tcnico e cientfico?Pelo manuseamento de fontes e de bibliografia de referncia para a histria da fotografia17percebemosaexistnciadeumespaopblicooitocentistaqueproporcionousuportesparadivulgar imagens de cultura. Nelas se insere a imagem positiva da realidade: a photo graphia,enquantoprocedimentodeumconjuntodeprticascientficasinterligadas.Eapartirdaencontramos uma herana cultural como forma de identificao de uma comunidade cientfica,capaz de construir a sua prpria memria. Surgem espaos da cincia como patrimnio, centradosnos Laboratrios, peas de construo de memria de cincia no centro de um Imprio: Lisboa.1815 PESSOA, 1914: 516 PIMENTEL, 1996:12, Publicao que contm, de forma sistematizada, um itinerrio cronolgico do uso dosprocedimentos fotogrficos com a vertente de ptica e de qumica na Escola Mdico Cirrgica de Lisboa.17Cfr.bibliografiareferenciadanesteartigoqueexpressaadiversidadedecamposdeproduobibliogrficaexistente sobre a memria cientfica da fotografia e o seu uso no espao pblico.18HALBWACHS,1968;NORA,1984-1993;POMIAN,1998;NUNES,1998;MATOS,1998;COMMEMORATIVE PRACTICES, 1999; ON TIME, 2000; ANDRADE, 2001; LALIEU, 2001; NUNES, 2001b;MEMRIAS PROFESSORES, 2001; JOO, 2002; NUNES, 2002a; NUNES, 2004 a173 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A L o momento de partir do epicentro da capital e estudar as ligaes da comunidade cientficaportuguesarededeinternacionalizao,entendendoasprticascientficascomoformasdepensaraideiadeEuropa/unificaodosEstadosnosculoXIX.Instituiesecomunidadecientficas manifestam-se em trs registos: o da transmisso, imprensa cientfica especializadaassociada a relatrios e catlogos de congressos cientficos; a difuso da cincia face ao seu pblico,englobando os espaos de cultura que tocam os contornos do turismo cientfico (caso dos museus,das exposies de cincia e de tcnica, de aqurios, de jardins botnicos e zoolgicos); o timbreda popularizao, ou seja as prticas de consumo cincia. Com novos conceitos de fontes podemdefinir-sediferentesescalas:um,anliseespacial;dois,perfildecomunidadecientfica;trs,pblico de cincia; quatro, prticas de cincia (s). As prticas cientficas encontram-se associadas investigao, experimentao, produo de memria e valorizao patrimonial de locais,de edifcios, de utenslios, de arquivos e de paisagem.Neste contexto inserimos como forma metodolgica de chegar ao nosso objecto de trabalhoa estratgia do laboratrio smbolo e imagem de profissionalizao da Cincia e do cientista,como espao de instrumentao cientfica e de manuseamento tcnico. Para o nosso presenteensaio interessa-nos a sua utilizao por personalidades ligadas ao mundo da Cincia, ou seja osfotgrafos, uma gerao de membros de uma comunidade de saberes cientficos no campo doscompartimentos do Positivismo, a fsica e qumica.19Elegemos,assim,umconjuntodeestratgiasquesonecessriasparafazerfuncionarolaboratriodefotografiaestamosnafasedaconstruodopercursodeinvestigaoedaorganizao de materiais e de construo de hipteses.Fotografar implica uma componente terica, de conhecimento cientfico, com uma com-ponente de prtica instrumental. A fotografia e o fotgrafo como zooms experimentais parauma investigao em Histria e Filosofia da Cincia em Portugal20: problema do centro, e daperiferia. Perfil e a aco do fotgrafo redes de contacto, de formao e de informao, redesde difuso, implantao do laboratrio de fotografia, apetrechamento tcnico e cientfico dolaboratrio;fotgrafoemredesnacionaiseinternacionaisEuropaeEstadosUnidosdeforma a podermos ver neste terreno de investigao experimental um campo para uma utensilagemconceptual que hoje a histria da cincia tem para trabalhar na rea da cultura21.19 CATROGA, 199820 FITAS, 200021Referimo-nosaconceitosquenahistoriografiaanglo-saxnicasovitaisparasepoderestabeleceraponteentre os historiadores e os cientistas que fazem a histria da cincia, Deixamos o registo de expresses mais marcantespara o nosso trabalho - popularisation of science; uses of scienc; public of science; collective scientific memory; local scientificheritage documentation, machinery and instruments.; science in regional historical context and the public understandingof science.174 M A R I A D E F T I M A N U N E S2. A Fotografia, a Cincia e a prtica cientfica. Comemorar em 1940No contexto de comemoraes de 194022 a Academia das Cincias de Lisboa, sob o impulsodeAugustodaSilvaCarvalho23organizaumnmerotemtico24sobreascomemoraesdafotografia em Portugal, ou seja, a comunidade cientfica pertencente elite da Academia dasCincias realiza uma prtica comemorativa a partir de um desempenho cientfico: a fotografia eo seu uso, dado que [A]mquina fotogrficav mais que os nossos olhos. A melhor provadeste critrio o facto bem conhecido de alguns dias antes que sejam visveis as pstulas variolosas,a prova fotogrfica revelar a sua existncia. O mesmo demonstram com a maior evidncia asdemonstraes da fotografia para a descoberta dos carimbos de papel, que tentaram apagar, dasescritascomtintassimpticas,dasfalsificaesdaescritaedasnotasdebanco,eemtantosexamesnaprticadamedicinaLegal,emqueoInstitutodeLisboateveainiciativaesoubeaplicar e aperfeioar por forma digna de todo o elogio.25Folheando este nmero temtico das Memrias da Academia tomamos contacto com osoutros discursos comemorativos da prtica e do uso da fotografia em Portugal e na Europa. Umtomo temtico, organizado por membros da comunidade cientfica em Portugal, de 1940, comvisibilidade pblica em diferentes nveis de discursos de cincia e de imagens de cincia, quepermite congregar uma galeria de contributos centrado no tema Fotografia, prtica e uso cientficoem Portugal. Vejamos a listagem:Mendes Correia Nota sobre a fotografia aplicada Antropologia em Portugal; Pedro Jos daCunha Do provimento dos lugares vagos de Lentes de Qumica da Escola Politcnica em 1896; 26A.Celestino da Costa A microfotografia; Henrique de Vilhena Notas sobre a fotografia na anatomia;Egas Moniz A fotografia da circulao normal e patolgica do crebro; Vtor Hugo de Lemos Notas para a histria da fotografia area e da sua aplicao cartografia; Achilles Machado Asaplicaes da fotografia qumica e fsico-qumica e Friedrich Wohlwill Sobre a importnciados mtodos fotogrficos na anatomia patolgica.Um rpido olhar por estes contributos colocam-nos na senda exclusiva de a fotografia tersido um instrumento cientfico ao servio de desenvolvimento e da legitimao documental devrias reas do conhecimento, da Antropologia Cartografia, passando pela Medicina exercitadapeloPrmioNobelportugusEgasMoniz.Noepicentrodetodaestaprticaculturaldecomemorarcientificamenteafotografiaencontra-seolaboratriodequmica,oespaodeconsagrao cientfica de todo um processo que levou cem anos a construir!22 NUNES, 2002a; 2004a;23 NUNES, 2005a24MemriasClasseCincias,vol.III,1940.Comemoraodocentenriodafotografia.Subsdioparaahistria da introduo da Fotografia em Portugal.25 CARVALHO, 1940:36.26 (concursos existentes quando Pedro Jos da Cunha foi fazer os seus estudos para a Politcnica) trio visado:Antnio Augusto de Aguiar (qumica mineral), Agostinho Vicente Loureno (Anlise Qumica e Qumica Orgnica);JosJliodeBettencourtRodrigueslentesubstitutodasduascadeiras.ohistorialdesubstituiescomimpugnaes....!175 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A LEste conjunto de repositrios informativos, e de timbre comemorativo, constitui um terrenofrtil para retirar dados factuais que nos fornecem pistas para os itinerrios culturais, cientficose tcnicos da fotografia como prtica cientfica e como uso instrumental para o saber aplicadoem vrios ramos da Cincia. interessante perceber que este conjunto de estudos funcionoucomo uma gramtica de referncias de prtica cientfica para o domnio da fotografia que AntnioSena27 utiliza como uma memria da fotografia e do seu uso pela via da comunidade cientfica,mdicos da Escola Mdico Cirrgica de Lisboa (rea de frenologia) Francisco Martins Pulidoe Joo Jos Simas.Mas, a primeira parte da histria da fotografia de Antnio Sena caracterizada por fornecerinformao sobre fotgrafos e membros da comunidade cientfica, ainda que no se estabeleamrelaes causais de histria de prticas cientficas, ainda que normalmente, era nos circuitoscientficos ou artsticos, das Academias de Cincias ou Artes, que as apreciaes e investigaescirculavam. Muito raramente, nos primeiros dez anos de vida da fotografia, atingiu sequer osmeios industriais.28Mas se no atingiu os meios de circulao de massas, sendo uma rea de cultura reservadaaos cultores e utilizadores de uma cultura cientfica, a fotografia no deixou de ser um suportefundamental de instituies cientficas e de membros da comunidade cientfica portuguesa dosculo XIX. A partir do ba de memrias comemorativas de 1940 possvel estabelecer umateia de referncias de instituies e de personalidades cientficas que se cruzaram ao longo davida com o uso da fotografia. Deixemos o registo naturalista desse levantamento, atravs de umquadro de sntese elaborado a partir do cruzamento de referncias das memrias comemorativasda histria da fotografia, em 1940, em Portugal.27 SENA, 199828 SENA, 1998:21Quadroreferncias relativas utilizao de fotografia na segunda metade do sc. XIXInstituioGabinete Escola Mdico-Cirrgica LisboaLaboratrio Qumica - Esc. Politcnica LisboaDireco Geral Trabalhos GeodsicosDireco Geral Trabalhos Hidrogrficos - MarinhaEscola Mdica LisboaInstituto Industrial e Comercial de LisboaEscola ExrcitoDireco Geral Trabalhos Geolgicos HidrogrficosObservatrio Meteorolgico D. Luiz IObservatrio Astronmico da AjudaInstituto Industrial do PortoSeco Fotogrfica Instituto Geogrfico CadastralAssociao dos ArquelogosSociedade de Geografia de LisboaUniversidade de CoimbraMembro Comunidade CientficaMdico Joo Jos dos SantosJos Jlio Bettencourt RodriguesFilipe FolqueCarlos May Figueira (curso microfotografia)Francisco Fonseca BenevidesMarqus S da Bandeira - curso de fotografiaCarlos Ribeiro; Nery DelgadoJ. C Brito CapeloCsar Augusto de Campos RodriguesOito fotgrafos frequentam cursos qumica/fsicaEstcio da VeigaAugusto Dias de Carvalho - expedio AngolaJlio Augusto Henriques176 M A R I A D E F T I M A N U N E SApartirdestequadrosumrio,verificamosqueasinstituiescientficasportuguesaspartilhavam do entusiasmo e da utilidade do uso da fotografia, no como um processo ldico erecreativo, mas como uma prtica coadjuvante do seu quotidiano profissional e da construode um progresso material de que o Estado necessitava, imagem dos outros pases europeus, semelhana do que os representantes oficiais a Exposies e Congressos Internacionais tomavamcontacto.29 Percebemos, igualmente, uma profunda ligao tcnico-cientfica com as instituiesmilitares, reservatrio de saberes de ponta aplicados realidade material dos recursos naturais ehumanos do pas.30Assim, percebemos que a fotografia como prtica cientfica utilizada por elites culturais,amadores das novidades do progresso tcnico, e por profissionais que praticam o manuseamentofotogrfico,querinstrumentalquerlaboratorial,noquadrodassuasatribuiesdeexecutartarefas tcnicas ou de investigao, ao ponto de encontrarmos na realidade portuguesa instituiescientficas com seco de fotografia prpria, com prestgio e prmios internacionais. neste contexto que enquadramos os aspectos do ensino de fsica e qumica nos InstitutosIndustriais, nas instituies Politcnicas do Porto e de Lisboa aplicados fotografia. E por setratardeumcampodeprofissionalizaodaCinciaexistiamosCongressoseExposiesregulares,umarededeinternacionalizaoquesemanifestavampelagrandecirculaodepublicaesperidicasespecializadas,emvriaslnguas,desdeofrancs,ingls,espanhol,alemoUma prtica cientfica com uso social, til ao Progresso e avano tcnico cientfico doPasocarizdeutilidadeedeaplicao.Aspectosfundamentaisparaaimagempblicadafotografia e do fotgrafo oitocentista. Afinal, a primeira nota de notoriedade e de prestgio foidada pela batuta da Cincia e no pelos caminhos da Arte!3. Fotografia e construo do ProgressoConsideramos de alguma utilidade neste ensaio exploratrio sobre prtica cientfica e culturalda fotografia deixar uma breve incurso pela Seco Photographica ou Artstica da Direco Geraldos Trabalhos Geodsicos. Vamos seguir o seu protagonista principal o lente de qumica daEscola Politcnica de Lisboa, Jos Jlio Rodrigues31, que atravs das suas publicaes nos permiteentender como a fotografia foi uma actividade fulcral para um conjunto de instituies cientficasquetinhamcomodesempenhoestratgicoaconstruodosalicercesdoEstado-Nao:cartografia, metrologia, estatstica.32Em1876,olentedequmicadaEscolaPolitcnicadeLisboafaziapublicaroestudointitulado A seco photographica ou artistica da Direco Geral dos Trabalhos Geodesicos no 1 deDezembro de 1876. Breve noticia acompanhada de doze specimens, editada sob a responsabilidadetipogrfica da Academia Real das Cincias33, instituio da qual era scio.29 NUNES/ GUELHA, 2004 b30 1 EXPOSIO, 1937; ASSIS, 200531 Tambm conhecido como Jos Jlio Bettencourt Rodrigues, j diversas vezes referenciado neste texto.32 BRANCO, 2003; NUNES/ GUELHA, 2004b33 Jos Jlio Rodrigues faz publica igualmente os agradecimentos especficos a Carlos Ribeiro, Filippe Nery daEncarnao Delgado, aos responsveis pelos servios tipogrficos da Academia Carlos Augusto Pinto Ferreira e JosMaurcio Vieira, assim como a Carlos Cyrilo da Silva Vieira, na qualidade de director tcnico da tipografia da Academia.177 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A LSe pretendermos usar imagens metafricas diremos que este opsculo uma verdadeirafotografia narrativa do uso institucional desta seco fotogrfica e artstica, quando o artistaainda era tambm o que necessitava de engenho e de saber para desempenhar funes atribudasrelacionadas com os processos fotogrficos.34Notemos,emprimeirolugar,queestapublicaoseinserenadinmicadaocorrnciaregular de encontros cientficos, dado que ela surge no contexto do Congresso Internacional dasCincias Geogrficas, organizado pela Sociedade de Geografia de Paris, em 1875. Afinal, umpretexto cientfico para estabelecer uma memria cultural da seco fotogrfica que se encontravasediada na Direco Geral dos Trabalhos Geodsicos.Segundo Jos Jlio Rodrigues, estavam criadas as condies para publicitar a importncia(artstica e cientfica) realizada para a carta do territrio nacional, na escala de 1/1000.000 e quenoCongressodeParisobtiveraumacartadedistino,prestgioquerevertia,afinal,paraoEstado portugus. E se Jos Jlio Bettencourt era o rosto de uma equipa, a referncia que eranacional e internacionalmente conhecia, por via do laboratrio de qumica e por via da fotografia,no deixa de, nesta edio da Academia das Cincias de Lisboa, publicitar o quadro do pessoalexistente em 1876 na Seco Fotogrfica.35Temos, pois, uma equipa, um dirigente e um espao prprio para desempenhar as vriasetapas do trabalho fotogrfico. A partir da fotografia cientfica, aplicada Direco Geral dosTrabalhosGeogrficos,oresponsvelfotogrficodesenvolveumaimagemderetricaelegitimidade cientfica (nacional e, sobretudo, internacional) que esta Seco estatal pretendiademonstrarfaceopiniopblicaeaosdiferentespoderespblicos,como,porexemplo,asautoridades acadmicas da Escola Politcnica de Lisboa36.A portaria de 15 de Novembro de 1872 foi o ponto de incio de uma histria caracterizadapor um itinerrio de funcionalidade legislativa, de acordo com o esforo de sistematizao e denarrativa que o Autor apresenta. Em ofcio de 15 de Janeiro de 1872, Folque37 elogia os novosprocedimentos fotogrficos como sendo altamente vantajosos sobre o antigo sistema de gravura,pocausadonacartografiaexistente.Mas,jem5deAbrilde1872voltaFilipeFolqueareiterarasuaconfiananosnovosprocessosdereproduodecartas,confiandotaltarefadireco exclusiva de Jos Jlio Rodrigues. A 13 agosto 1872 props ao governo de S. Majestadea criao de uma oficina, permitindo que a Seco fotogrfica fosse criada por portaria de 15 deNovembro de 1872 como uma realidade institucional em Portugal.Um facto que j era aceite e reconhecido por pases cultores do sculo do progresso e deesclarecida actividade Frana, Blgica, Holanda, ustria, Alemanha, Itlia; espaos em que34 LABORATORIO DE QUIMICA, 199635 Faziam parte da seco fotogrfica catorze portugueses; um suo; um brasileiro. Regista-se a existncia devrias categorias tcnicas at chegar de fotgrafo: fiel, escriturrio, ajudante, litgrafo estampador, gravador qumico,aprendiz de estampador, desenhador, servente, evidenciando um grau hierarquizado na construo do saber prtico dafotografia. Como cooperantes do fotgrafo chefe Jos Jlio Rodrigues encontravam-se os fotgrafos operadores Jos Baptista Gomes Fotgrafo e Joaquim Theodoro Coelho36 bvio que podemos ter esta leitura a partir do contributo de Pedro Jos da Cunha, em 1940, no nmerocomemorativo do centenrio da fotografia ao apresentar aspectos de um conflito acadmico em 1896 (cfr. nota 8 destetexto).178 M A R I A D E F T I M A N U N E Sesta ideia no era vista como sui-generis capaz de gerar conflitos e discusses, mas antes produtodo reflexo do progresso da Cincia e da Tcnica ao servio da modernizao do Estado. Ideiaque prprio Autor fez questo de expressar ao expor o enorme beneficio, que importa para ospoderes do Estado a aplicao metdica e racional da fotografia ao desempenho de muitas evariadosservios,quelhescompetedesenvolverefacilitar,parece-mefastidiosarepetiojsabida de todos, sem proveito por isso, como sem oportunidade.38A Seco Fotogrfica ficou, pois, incorporada com as oficinas de publicaes do InstitutoGeogrfico e como anexo 6 seco deixava de existir, apenas permanecia no papel timbradoque a criava. Est na lei, mas desapareceu de facto como entidade prpria, para se incorporarna 6 seco, de onde nunca realmente saiu, seno por convenincias de momento e necessidadede curta durao, de carcter essencialmente provisrio [] Raros so os estabelecimentos que,comoeste,nocurtoespaode4anos,apesardemuitosmesesperdidoscomtrabalhosdeinstalao,dotaramoseupascomprocessosnovos,seusealheios,importandoefazendofuncionar com prontido e manifesta utilidade diversas maquinas e aparelhos, absolutamentedesconhecidos entre ns e ainda hoje pouco vulgarizados no estrangeiro.39Mas, importa reter que a Seco Fotogrfica trouxe inmeros outros benefcios inovadoresaoPortugaldaRegeneraorelacionadoscomousodaelectricidadeparailuminao,dascanalizaes de gaz, das medidas preventivas de incndios, do correcto encaminhamento dosdespejos de guas e lquidos inteis e de resduos fotogrficos, da ventilao das oficinas.Trata-se de uma lio por escrito, muito criteriosa sobre os mtodos de preparar e fazer afotografia e a sua impresso; este novo processo era usado para os processos de fabricao demapasdeondedependiaestamesmaSecoFotogrfica.Temosumainstituiocientficaespecializadadentrodeoutraousejaumcasodecinciaemaco,decientistasemacoconcertada para benefcio de um mundo civilizado.Aps a caracterizao de procedimentos cientficos, encontramos a imagem da retrica dalegitimidade cientfica, da internacionalizao e do reconhecimento da comunidade profissionalda fotografia como cincia e como prtica cientfica para o desenvolvimento material dos Estados,de um tipo de desenvolvimento que fosse sentido e percepcionado por todos os seus cidadosnacionais. Mecanismo cultural expresso na referncia exaustiva das citaes e das referncias aCatlogos de Exposies Fotogrficas, a Boletins de Sociedades de Fotografia, ao uso da fotografiaem Bibliotecas e Arquivos como forma de preservar e reproduzir a documentao.40Em 1879 o mesmo Jos Jlio Rodrigues consegue levar a cabo uma estratgia internacionalde forma a promover a difuso do seu trabalho como fotgrafo ao servio da cincia em Portugal.Referimo-nos edio em Paris do livro Proceds photographiques et mthodes diverses dimpresssionsauxencresgrassesemploysalasectionsphotographiqueetartistiquedeladirectiongnraledestravaux gographiques du Portugal par , chef de la section photographique, commandadeur delordre de Saint-Jacques de la Lgion dhonneur, officier de linstruction publique, membre de37 ASSIS, 200538 RODRIGUES, 1876: 1239 RODRIGUES, 1876: 12-1340 RODRIGUES, 1876: 55-76179 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A LlAcadmie des Sciences de Lisbonne. Obra que esteve a cargo dos labores editoriais de Gauthier-Villars, Imprimeur-Libraire.Dedicado ao rei D. Luiz, pela alta proteco que tem concedido fotografia cientfica eao servio fotogrfico do governo portugus, recupera a referncia ao decreto real de 18 deDezembro de 1869 que estabelecera a Direco Geral dos Trabalhos Geodsicos, Topogrficos,Hidrogrficos, Geogrficos do Reino, colocando a fotografia geogrfica no nmero dos serviosde grande mrito desta Direco Geral em Portugal.41Jos Jlio Rodrigues faz o historial da Seco Fotogrfica, com dados numricos, caracte-rizaes tcnicas (processos de litografia e de tipografia que mudam para a fotografia nas fases deimpresso e de reproduo). Nesta memria, em francs, destaca uma vez mais o servio empreen-dedor de Filipe Folque para explicar a importncia dos procedimentos tcnicos da fotografiapara a cartografia e servios geogrficos do Pas.Estamos, pois, perante uma memria cientfica, de cunho internacional que denota o carcterprofissionalecientficoquerdosserviosgeogrficos,querdeJosJlioRodrigues,querdaimagem que se pretendia dar de Portugal Europa, e ao mundo ocidental da poca: a Europa eos imprios coloniais em crescimento e sedimentao.42Seco fotogrfica, Estado, Progresso, Cincia e Jos Jlio Bettencourt Rodrigues tornaram-sesignos indissociveis neste nosso percurso (ainda muito) em aberto. Este conjunto de reflexesinserem-se na lgica de um working in progress e destinam-se a serem alargados e discutidos.Pretendemos chamar a ateno para as potencialidades de utilizar novas fontes para a histriada cultura cientfica em Portugal. Na senda das fontes e das imagens da Cincia procuramosabrir novos campos para determinar geografias de espaos de cincia ou de cultura cientfica,quando estamos inseridos num pas perifrico da grande cincia, quando temos a tradio daEuropa do sul que se isola dos centros de cosmopolitismo doa saberes43Pensamosqueafotografiacomoprticacientficapodedesbravarnovosterrenos,podeabrir algumas janelas a fim de contrariar uma viso ensimesmada e triste que, por vezes, Portugaltem de si mesmo. Acreditamos que algumas personalidades oitocentistas ligadas cultura cientficano tinham sido (ainda) tocadas pelo paradigma do medo de existir.44 Acreditamos que ir embuscadeespaosdeprticascientficasemPortugalnospodeajudaracompreenderolargosculoXIX,ograndelaboratriodeideias,deprticasculturais,desonhosvisionriosedeutopias que ficaram por realizar. Fica o terreno da investigao e do apetrechamento terico emaberto, o pretexto da fotografia como prtica cientfica e cultural de Portugal num tempo europeu,comoumdesafioparaosprximostemposacadmicosdoCentrodeEstudosdeHistriaeFilosofia da Cincia da Universidade de vora. Lisboa / vora, Setembro 2005.42 LABORATORIO QUMICA, 199643 DIAS, 195344 Cfr. O ensaio de Jos Gil, Portugal Hoje, o medo de existir, editado em 2005 e com enorme sucesso editorial.Um tpico para reflectir (mos).180 M A R I A D E F T I M A N U N E SReferncias Bibliogrficas1 EXPOSIO NACIONAL DE FOTOGRAFIA MILITAR, 1937 III Semana Militar Maio 1937. 2salo de artistas militares e 1 . Iniciativa da Revista Defesa Militar, Lisboa, Sociedade Nacionalde Belas Artes.ACADEMIA DAS CINCIAS DE LISBOA, 1940 Memrias: classe de Cincia.ALMEIDA, Crmen 2000 Jos P. B. Passaporte e Antnio Passaporte (Loty), dois fotgrafos de vora, Ed.C. M. vora.ALMEIDA, Crmen, 2005 Objectos Melanclicos. vora, Lisboa, Ed. Caleidoscpio.ANDRADE, Lus Oliveira, 2001 Histria e Memria. A Restaurao de 1640: do liberalismo s comemoraescentenrias de 1940, Coimbra, Ed. Minerva.ARTE PHTOGRAPHICA, 188-4-1885 Revista Mensal dos progressos da photographia e artes correlativas,Porto, Photographia Moderna Editora.ASSIS, Jos Lus, 2005 Cincia e Tcnica na Revista Militar 1849-1910, Lisboa, Ed. Caleidoscpio.AYER, 1996 24: Imagem e Histria, Madrid, Ed. Marcial Pons.BRAGA,Tefilo,1892-1912HistoriadaUniversidadedeCoimbranassuasrelaescomainstruopblica portugueza, 4 tomos, Lisboa, Typographia da Academia das Sciencias.BRANCO, Rui Miguel, 2003 O Mapa de Portugal. Estado, territrio e poder no Portugal de oitocentos,Lisboa, Livros Horizonte.BRIEN, ric (Dir.),1996, Histoire et mmoire de lAcadmie des Sciences. Guide de recherches, Paris, Londres,Nova York.BURKE,Peter,2002Vistoynovisto.Elusodelaimagencomodocumentohistrico,Barcelona,Ed.Crtica.CARVALHO, Augusto da Silva, 1940 Comemorao do Centenrio da Fotografia. Subsdios para a histriada introduo da fotografia em Portugal, Sep. Memrias da Academia das Cincias de Lisboa classeCincias, tomo III, PP.CARVALHO, Rmulo de, 1976 Histria da Fotografia (3 edio), Coimbra, Atlntida Editora.CARVALHO, Rmulo de, 1996 Histria do Ensino em Portugal desde a fundao da nacionalidade at aofim do regime de Salazar-Caetano (2. edio), Lisboa, Fundao Calouste Gulbenkian.CARVALHO, Rmulo de, 1997 Colectnea de Estudos Histricos 1953-1994. Cultura e actividadescientficas em Portugal, vora, Universidade de vora.CATLOGO DA EXPOSIO PORTUGAL 1900, 2000 Lisboa, Ed. Fundao Calouste Gulbenkian.CATALOGO ESPECIAL DE ARTIGOS PARA PHOTOGRAHIA, 1910 A Cidade e os Campos, n.29, Maro, Armazns Grandella.CATROGA, Fernando, 1998 Cientismo e historicismo, Seminrio sobre o Positivismo, vora, Centrode Estudos de Histria e Filosofia da Cincia, pp. 11-57.CHANET, Jean-Franois, 2000 - La Fabrique des Heros. Pdagogie Rpublicaine et culte des grands hommes,de Sedan Vichy, Vingtime Sicle. Revue dhistoire, n. 65, janv.-mars, pp.13-33.COMMEMORATIVE PRACTICES IN SCIENCE, 1999 - Historical Perspectives on the Politicis of CollectiveMemory, Osiris, Edited by Pnina G. Abir-Am and Clark A. Elliot, vol. 14.COOTER, Roger; PUMFREY, Stephen, 1994 Separate spheres and public places: reflections on the historyof science popularization and science in popular culture, in History of Science, vol. 32, n. 97, pp.237-267.DIAS, Jos Sebastio da Silva, 1952 Portugal e a Cultura Europeia (sculos XVI a XVIII), Sep. Biblos,Coimbra.DIRECOGERALTRABALHOSGEOGRAPHICOSPORTUGUEZES,1875SecodePhotographia.PrimeiraExpsoioNacionalianuguradanodia15deAbrilde1875.Photographiaapplicada aos trabalhos geographicos. Processos de impresso photographica com tintas gordas, Lisboa,Typ Academia Real das Sciencias.181 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A LESCOLA (A) POLITCNICA DE LISBOA, 1937 Primeiro centenrio de fundao da escola politcnicade Lisboa, Lisboa, Tipografia da Faculdade de Cincias de Lisboa.FACULDADE DE CINCIAS DA UNIVERSIDADE DE LSIBOA, 1987 Passado/presente. PerspectivasFuturas, 150. aniversrio da Escola Politcnica/75. Aniversrio da Faculdade de Cincias, coordenaode Fernando Bragana Gil et all., Lisboa, Ed. Museu de Cincia.FITAS, Augusto; RODRIGUES, Marcial; NUNES, M. Ftima, 2000 A filosofia da cincia no PortugaldosculoXIX,HistriadoPensamentoFilosficoPortugus(direcoPedroCalafate),vol. V,tomo II, Lisboa, Ed. Caminho, pp. 421-582.GONALVES, Maria Eduarda, 2000 Cultura cientfica e participao pblica, Lisboa, Celta.GOODMAN, Dena, 1992 Public sphere and private life: toward a synthesis of current historiographicalapproaches to the old regime, History and Theory. Studies in the Philosophy of History, vol. 31,n1, pp. 1-20.HALBWACHS, Maurice, 1968 La Mmoire Colective, Paris, P.U.F.JOO, Maria Isabel, 2002 Memria e Imprio. Comemoraes em Portugal (1880-1960), Lisboa, F.C.T./F.C.G.LABORATORIO (o) DE QUIMICA, 1996 Mineral da Escola Politcnica de Lisboa (1884-1894), Ed.AnaLuisaJANEIRA/M.ElisaMAIA/PilarPEREIRA,Lisboa,Ed.CentroInterdisciplinardeCincia Tecnologia e sociedade da Universidade de LisboaLALIEU, Olivier, 2001 Linvention du devoir de memoire,Vingtime Sicle. Revue dhistoire, n.69, janv.-mars, pp. 61-82.LONARD, YVES, 1999 Le Portugal et ses sentinelles de pierre. LExposition du Monde Portugais en1940, Vingtime Sicle. Revue dhistoire, n. 62, avril-juin, pp. 27-37.MATOS, Srgio, 1998 Historiografia e memria nacional (1846-1898), Lisboa, Ed. Colibri.MEMRIAS DE PROFESSORES CIENTISTAS, 2001 Faculdade de Cincias, Universidade de Lisboa1911-2001, coordenao cientfica Ana Simes, Lisboa, Ed. Faculdade de Cincias da Universidadede Lisboa.MENDES, H. Gabriel, 1982 As origens da Comisso de Cartografia e a aco determinante de Jos JlioRodrigues,LucianoCordeiroeFranciscoAntniodeBritoLimpo:ahistriapolticadasexploraesafricanasdeHermenegildoCapelo,RobertoIvenseSerpaPinto;Lisboa,Ed.JuntadeInvestigaoCientfica e Ultramarina.MONTI, Nicolas/VICENTE, Antnio Pedro, 1991 Cunha Moraes. V iagens em Angola, 1877-1897,Coimbra, Casa Museu Bissaya Barreto.MORAES, Cunha, 1885-1888 Africa Occidental, Album Photographico, Lisboa, Ed. Corazzi.NORA, Pierre (dir.), 1984-1993 Les Lieux de la Mmoire, 7 vols. Paris, Ed. Gallimard.NUNES, M. Ftima, 1998 Histria da Cincia em Portugal a institucionalizao editorial da memriacientfica. Notas de uma investigao, Seminrio sobre o Positivismo, vora, Centro de Estudos deHistria e Filosofia da Cincia, pp. 311-335NUNES, M. Ftima (1999), Leituras de Histria da Cincia no Jornal de Sciencias Mathematicas, Fisicas eNaturais(1917-1923).SubsdiosparaaarqueologiadaculturacientficaemPortugal,RevistadeHistria das Ideias, vol. 20 O livro e a Leitura, pp.353-368.NUNES, M. Ftima, 2001a Imprensa Peridica Cientfica (1772-1852). Leituras de sciencia agricolaem Portugal, Lisboa, Estar-Editora.NUNES, M. Ftima, 2001b Lio de sntese na Agregao Universidade de vora, Setembro 2002,sob o titulo Histria da Histria da Cincia em Portugal: 1872-1953. Da construo cultural de umamemria identidade da comunidade cientfica em Portugal., vora, Universidade de vora.NUNES, M. Ftima, 2002a O VIII Congresso do Mundo Portugus Histria da Actividade cientficaPortuguesa. Para uma arqueologia do discurso da comunidade cientfica portuguesa na primeira metadedo sculo XX, Cincia em Portugal na primeira metade do sculo XX. Encontro de vora sobreHistria e Filosofia da Cincia, vora, Ed. Universidade de vora; pp. 307-348.182 M A R I A D E F T I M A N U N E SNUNES, M. Ftima, 2002b Opinio Pblica, Cincia e Tecnologia. Portugal XVIII-XX, Cultura, 15,Lisboa, Centro de Histria da Cultura; pp. 211-223.NUNES, M. Ftima, 2003a A fotografia como abordagem cultura contempornea da inovao cientficasnovasfonteshistricas,DidcticaseMetodologiasdaEducao.PercursoseDesafios,Dep.Pedagogia e Educao da Universidade de vora.NUNES, M. Ftima, 2003b A Imprensa especializada na 2 metade do sculo XIX em Portugal, EstudosemHomenagemaLusAntniodeOliveiraRamos,FaculdadedeLetrasdoPorto,vol.3,pp.799-804.NUNES, M. Ftima, 2004a The History of Science in Portugal (1930-1940). The sphere of action of ascientific community, @Journal of Portuguese History, vol. 2.2 -www.brown.edu/Departmensts/Portuguese_Brazilian_Studies / Winter 2004NUNES,M.Ftima/GUELHA,Vera,2004bAideiacientficadeEuropa.Metrologia,memriaecincia em vora, Lisboa, Ed. Caleidoscpio.NUNES, M. Ftima, 2005a Augusto da Silva Carvalho. Histria da cincia e prticas culturais no sculoXX, Transformaes Estruturais no Campo Cultural Portugus, (orgs. Antnio Pedro Pita e LusTrindade), Coimbra, Ceis20; pp. 51-78.NUNES, M. Ftima/ CUNHA, Norberto, 2005b Imagens da Cincia em Portugal: sculos XVIII-XX.Estudos Histricos, Lisboa, Caleidoscpio.ON TIME: HISTORY, SCIENCE AND COMMEMORATION, 2000 The British Journal for the Historyof Science. A special issue, Guest Editor: William Ashworth, Jon Agar and Jeff Hughes.PEREIRA, M. Ftima de S Guerra Marques, 2001 Casa fotogrfica Moraes, tese de Mestrado HistriaContempornea, Universidade do Porto.PESSOA,Alberto,1914 Afotografiamtricanaprticajudiciria.Ifotografianoslocais,Coimbra,Frana e Armnio livreiros editores.PHILOSOPHICAL IMAGINATION AND CULTURAL MEMORY (1993), Ed. Patricia Cook, London /Durham, Duke University Press.PIMENTEL, J. Cortez, 1996 A documentao pela imagem em medicina. Histria da sua utilizao emLisboa, Lisboa, Universitria editora.PITA, Joo Rui Pita/ PEREIRA, Ana Leonor, 2002 A Europa cientfica e a farmcia portuguesa na pocacontempornea, Estudos do Sculo XX, n. 2 Coimbra, Ed. Quarteto/Ceis20; pp. 231-265.POMIAN, Krizysztof, 1998 De lhistoire, partie de la mmoire, la mmoire, objet dhistoire, Revue deMtaphysique et de Morale , janv.-mars, n. 1, pp. 63-110.RIBEIRO, Jos Silvestre Ribeiro, 1871-1893 Histria dos Estabelecimentos Scientificos, Litterarios e Artisticosde Portugal, 18 vols., Lisboa, Typographia da Academia Real das Sciencias.RODRIGUES,JosJlio,1876AsecophotographicaouartisticadaDirecoGeraldosTrabalhosGeodesicos no 1 de Dezembro de 1876. Breve noticia acompanhada de doze specimens por , Lisboa,Typographica Academia Real das Sciencias.RODRIGUES, Jos Jlio, 1879 Proceds photographiques et mthodes diverses dimpresssions aux encresgrasses employs a la sections photographique et artistique de la direction gnrale des travaux gographiquesdu Portugal par , chef de la section photographique, commandadeur d lordre de Saaint-Jacquesde la Lgion dhonneur, officier de linstruction publique, membre de lAcadmie des Sciences deLisbonne, Paris, Gauthier-Villars, Imprimeur-LibraireRODRIGUES,JosJlio,1879Procdsphotographiquesetmthodesdiversesdimpressionsauxencresgrasses, employs la section photographique et artistique de la direction gnrale des travaux gographiquesdu Portugal , Paris, Imprimerie de Gauthier-Villars.RODRIGUES, Jos Jlio, 1885 Exposio ao Conselho da Escola Polytecnica sobre o ensino e mais serviosda 6 cadeira acompanhada de varias propostas tendentes a melhorarem e a reformarem o ensino dachimica mineral por Lente substituto da mesma Escola, Lisboa, Typographia Universal.RODRIGUES,JosJlio,1892Simplesapontamentosdealgunstrabalhoseserviosdedurante28annos de vida publica em Portugal, Lisboa, Typ. Academia [das Sciencias de Lisboa].183 A R Q U E O L O G I A D E U M A P R T I C A C I E N T F I C A E M P O R T U G A LRODRIGUES, Jos Jlio, 1893 La section photographique et artistique de la Direction Gnrale des travauxgographiques, Lisbonne: Imp. de lAcadmie Royal des Sciences.RODRIGUES, Jos Jlio, 1893 Projecto summario de regulamento dos trabalhos e servios do Laboratoriode Chimica Mineral da Escola Polytechnica de Lisboa, Lisboa, Imp. Nacional.RODRIGUES, Jos Jlio, 1885 Publicaes de [] (at maro de 1885), s/l, s/dRODRIGUES,JosJlio,1893 ExposioaoconselhodaEscolaPolitcnica,Lisboa, Typ.de ThomazQuintino Antunes.RODRIGUES, Jos Jlio, 1893 Comisso Central Permanente de Geographia: conferncia de 3 de Novembrode 1877 / Lisboa: s.n..SANCHEZ RON, Jos Manuel, 1999 Cincel, martillo y piedra. Historia de la ciencia en Espaa (siglosXIX y XX), Madrid, Ed. Taurus.SENA, Antnio, 1998 Histria da Imagem Fotogrfica em Portugal 1839-1997, Porto, Porto Editora.SONTAG, Susan, 1986 Ensaios sobre a Fotografia, Lisboa, Ed. D. Quixote.TENGARRINHA, Jos, 1997 La historiografa portuguesa en los ltimos veinte aos, in Ayer la historiaen el 96, ed. Celso Almuia, Madrid, Ed.Marcial Pons.TORGAL, L. Reis; MENDES, J. Amado; CATROGA, Fernando, 1996 Histria da Histria em Portugal,scs. XIX-XX, Lisboa, Crculo de Leitores. Universidade de vora; 25 vol. I, 3 pp. 258.VICENTE, Antnio Pedro Vicente, 1984 Carlos Relvas, fotgrafo. contribuio para a histria da Fotografiaem Portugal no sculo XIX, Lisboa, IN/CM.