Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

download Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

of 11

Transcript of Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    1/11

    Rio Grande do Sul, julho de 2010 

    Doutorado em Ciências da Comunicação na Unisinos – Universidade do Vale do Rio dos SinosDisciplina: Produção do Acontecimento Professora: Christa Berger Acadêmico: Marco Bonito Linha de pesquisa 3: Processos midiáticos - Cultura Midiática, cidadania e tecnologias da informação  

    ARQUITETOS DA INFORMAÇÃO:UM MUNDO A HIPERTEXTUALIZAR

    A apropriação do acontecimento como notícia hipermidiática, peloprofissional jornalista ante ao webjornalismo de quarta geração. 

    Resumo

    Este artigo busca tratar e discutir o conceito de “acontecimento jornalístico”, proposto principalmente por Charadeau e fomentado pela pesquisadora Virgínia P. da

    Silveira Fonseca,  ante as configurações do webjornalismo de 4ª geração, conforme

    exposto por Carla Schwingel. Neste sentido, também nos valeremos do conceito de

    “acontecimento”  trabalhado por Adriano Duarte Rodrigues, bem como das

    características do jornalismo digital enunciadas por Marcos Palácios para que possamos

    contribuir com uma reflexão crítica a respeito das apropriações do conceito de

    “acontecimento”, como notícia hipermidiática, pelos jornalistas, a partir dos fatos que a

    configura perante suas ocorrências no webjornalismo do portal Terra atualmente.

    1.  O ACONTECIMENTO E SUA NOTABILIDADE MÍTICA

    A comunicação midiática, como todo ato de comunicação, realiza-se segundoum duplo processo de transformação e de transação. Nesse caso, “o mundo a

    descrever” é o lugar onde se encontra o “acontecimento bruto” e o processo

    de transformação  consiste, para a instância midiática, em fazer passar oacontecimento de um estado bruto (mas já interpretado) ao estado de mundo

    midiático construído, isto é, de “notícia”. (CHARAUDEAU, 2007, p.114apud FONSECA, 2010, p183)

    Sendo assim, podemos entender a importância da notabilidade dos fatos para as

    questões de noticiabilidade, bem como, e não obstante a isto, o acontecimento tem

    função significativa preponderante e essencial para a construção dos sentidos nas

     práticas jornalísticas.

    Rodrigues (1993, p.27) entende que no discurso jornalístico,

    ... o acontecimento constitui o referente de que se fala, o efeito de realidadeda cadeia dos signos, uma espécie de ponto zero da significação. Por isso,

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    2/11

    uma das regras da prática jornalística consiste em afirmar que a opinião élivre, mas que os factos são soberanos.

    O autor ainda explora o conceito abordando sua natureza como algo que se

    encontra na escala de “probabilidades de ocorrência, sendo tanto mais imprevisível

    quanto menos provável for a sua r ealização” (Rodrigues, 1993, p.27), ou seja, o cão que

    morde o homem é tão previsível que perde valor de noticiabilidade, justamente por ser

    menos notável. Enquanto que se um homem morde um cão o imponderável agrega tal

    valor ao fato que o torna um acontecimento de natureza especial, digno de ser noticiado.

    Existem vários “registros de notabilidade”  de fatos jornalísticos que contém

    vigor potencial de que se tornem acontecimento, dentre os quais destacamos aqueles

    que nos interessam à discussão proposta e que são classificados assim por Rodrigues: de

    excesso, da falha, da inversão e do acidente. Por eles, entenderemos que os de excesso 

    são os mais comuns, visto que irrompe o funcionamento anormal da norma estabelecida

    dos corpos individuais ou institucionais. Como, por exemplo, os feitos dignos de entrar

     para o livro dos recordes. Já os da falha se notabilizam por defeito ou insuficiência no

    funcionamento normal ou regular dos corpos, como por exemplo: os eventos cósmicos,

    naturais, cataclísmicos, inundações, terremotos ou até mesmo do trânsito de automóveis

    no cotidiano. Também temos os de inversão, cujo exemplo clássico já usei acima,

    quando um homem morde um cão, ou em outro caso, quando um ladrão devolve o carroroubado com dois ingressos para o cinema e um bilhete de agradecimento pelo passeio

     proporcionado à revelia. Por fim, os do acidente  que “deixa vestígios e altera a

    substância do mundo das coisas, das pessoas, das instituições” (Rodrigues, 1993, p.28),

    como nos casos de nascimento e morte, as quais todas as outras ocorrências se

     posicionam e se referem.

    O autor se posiciona afirmando que “o jornalismo inscreve-se

    inequivocadamente neste processo de enquadramento e de regulação” (Rodrigues, 1993, p.29) relacionado às descrenças na veracidade de determinadas previsões enquadradas

    na racionalidade moderna, mas que, contudo, contribui para que sejam criadas novas

    formas de regulação dos acontecimentos imprevisíveis a partir do jornalismo.

    Entretanto, sua conclusão mais interessante a respeito disto é que “o  que torna o

    discurso jornalístico fonte de acontecimentos notáveis é o  facto  de ele próprio ser

    dispositivo de notabilidade, verdadeiro deus ex machina1” (Rodrigues, 1993, p.29). Esta

    1 Deus ex machina: expressão latina vinda do grego "ἀπὸ μηχανῆς θεός" (apò mēchanḗs theós),

    significa literalmente "Deus surgido da máquina". Sua origem encontra-se no teatro grego e refere-se a

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Latim

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    3/11

    é uma característica que contribui para exorcizar mitos que possam servir e asseguram o

    “quadro de referência” comum da experiência do mundo, conforme ainda conclui:

    A época moderna fez do pensamento mítico o dispositivo do obscurantismo eda dominação, considerou-o como a cegueira da razão iluminada, como oentrave ao conhecimento positivo da ciência. Ficou assim o homem modernodespojado dos quadros explicativos que organizavam o desenrolar dosacontecimentos do mundo e lhe asseguravam coerência. (RODRIGUES,1993, p.33)

    Portanto, podemos entender que os discursos jornalísticos midiáticos contribuem

     para organizar os fatos aleatórios e lhes confere racionalidade a partir de uma trama que

    é tecida advinda do presente, a fim de que possa resultar numa “ordem identitária que

    lhe devolva uma imagem coerente do destino” (Ibdem). 

    2. 

    O ACONTECIMENTO COMO NOTÍCIA HIPERMIDIÁTICA

    O que faz com que assuntos sobre personagens próximas a celebridades e/ou

    crimes cometidos por anônimos sejam pinçados do montante de acontecimentos que

    constituem o espaço público, dentre os fatos cotidianos, para que adquiram visibilidade

    e principalmente valor notícia?

    Este é o questionamento que a pesquisadora Virginia Pradelina da Silveira

    Fonseca faz em seu texto sobre “O acontecimento como notícia” que é fruto de suas

     pesquisas a respeito do tema. Ela demonstra que “num primeiro momento, pode-se dizer

    que tais registros têm em comum a condição de eventos com caráter de atualidade,

    veracidade e impacto” (FONSECA, 2010, p.168) características comuns à classificação

    dos valores notícia usados na prática jornalística. Contudo, a pesquisadora indaga:

    “como ascenderam a esta condição?”. Para compreender esta situação ela se vale do

    conceito de acontecimento proposto por Charaudeau e parte de um pressuposto básicosobre a matéria-prima do jornalismo ser a informação e a após a sua produção e sua

     publicação ela pode ser “consumida” na forma de notícia. 

    uma inesperada, artificial ou improvável personagem, artefato ou evento introduzido repentinamente

    em um trabalho de ficção ou drama para resolver uma situação ou desemaranhar uma trama. Este

    dispositivo é na verdade uma invenção grega. No teatro grego havia muitas peças que terminavam com

    um deus sendo literalmente baixado por um guindaste até o local da encenação. Esse deus então

    amarrava todas as pontas soltas da história. Em termos modernos, Deus ex machina também podedescrever uma pessoa ou uma coisa que de repente aparece e resolve uma dificuldade aparentemente

    insolúvel.

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    4/11

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    5/11

    apegam à aldeia e os que sonham com o planeta”.  Além disso, a função de hierarquia 

    se daria em função da necessidade de um recorte do espaço público e da configuração

    do acontecimento em critérios internos e externos. Os internos relativos aos perfis

    editoriais de cada organização midiática e os externos relacionados aos modos de

    aparição do acontecimento.

     Neste sentido, a produção do acontecimento em tempos de hipermídia2 precisou

    se reconfigurar em prol de uma adaptação que se fez necessária pelas práticas da

    cibercultura que implicaram no modus operandi do fazer jornalístico. Marcos Palacios

    (2003) releva, por exemplo, a importância da memória para o jornalismo online e

    explica o porquê desta característica ter contribuído tanto para o desenvolvimento

    conceitual e prático das notícias hipermidiáticas no ambiente da web:

    ... a acumulação de informações é mais viável técnica e economicamente naWeb do que em outras mídias. Acresce-se o fato de que na Web a Memóriatorna-se Coletiva, através do processo de hiperligação entre os diversos nósque a compõem. Desta maneira, o volume de informação anteriormente

     produzida e diretamente disponível ao Usuário e ao Produtor da notíciacresce exponencialmente no Jornalismo Online, o que produz efeitos quantoà produção e recepção da informação jornalística. (PALACIOS, 2003, p. 4)

    Sendo assim, podemos entender que esta característica do jornalismo online,

    associada às outras seis, também baseadas nos estudos de Bardoel e Deuze, tais como:

    interatividade, personalização de conteúdo (customização), hipertextualidade,

    multimidialidade (convergência), interatividade e instantaneidade constituem a estrutura

     para a composição das notícias hipermidiáticas no contexto do jornalismo digital.

    Dentre estas a memória é a que mais potencializa o webjornalismo, já que

     permitiu não apenas o acúmulo das informações geradas pelo contingente de notícias,

    mas principalmente permitiu o resgate destas informações, tanto por parte dos autores,

    quanto por parte dos demais interlocutores como, por exemplo, os leitores/usuários que

     passaram a ter condições ativas ante ao consumo das informações jornalísticas. O

    modelo tradicional de comunicação das principais mídias de massa no século XX que

    funcionava, a priori, por emissão de mensagens (Um   Todos), passa a ser

    reconfigurado por uma nova lógica de demanda de produção e consumo que é

    caracterizada pelas Novas Tecnologias da Comunicação (NTC), na década final do

    século XX, passando a operar por disponibilização e acesso (Todos Todos).

    2  Hipermídia: uma mídia cujas propriedades dos conteúdos contemple uma variedade de recursosmidiáticos em diversos formatos como texto, áudio, vídeos e imagens/fotos.

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    6/11

    Disponibilidade e acesso estão intimamente relacionados com as possibilidades

    advindas da associação do webjornalismo com os bancos de dados, o que é

    caracterizado e entendido como memória. Ora, senão vejamos que a pesquisa em

     jornais, antes desta configuração digital, era morosa e custosa, feita em enormes galpões

    com pilhas de jornais separados, quando muito, por data de publicação. O interessado

     precisava ter espírito de arqueólogo, alguma intuição e referências para tentar encontrar

    a informação desejada. Isto podia durar meses e até anos de trabalho.

    Mas a partir da chamada 3ª geração do jornalismo digital, superadas as fases de

    transposição (1ª geração) e metáfora (2ª geração) do jornalismo impresso, é que o

    webjornalismo passa a incorporar, ainda que timidamente, sua produção a um banco de

    dados dinâmico, o que contribuiu para a organização dos conteúdos gerados pelos

    diversos canais jornalísticos, conforme vemos a seguir.

    De acordo com Machado (2004), a partir do princípio da transcodificação deManovich (2001), os bancos de dados são a forma cultural adotadas pelosmeios digitais para a organização das informações nas sociedadescontemporâneas. É a tecnologia de banco de dados que evidencia ainda maisa noção da estrutura de um sistema (explicitada na arquitetura da informação)ser um suporte para as informações. A internet - desde suas proposiçõesiniciais - trabalha com a noção de memória estendida em bancos de dadosque podem ser acessados por diferentes pessoas de forma simultânea. A rederepresenta, na verdade, um grande banco de dados cujas indexações ocorrem

     por remissões a suas páginas, onde os vínculos informativos são osendereços, as URLs (Uniform Resource Locator ), de acordo com aarquitetura do sistema. (SCHWINGEL, 2005, p.5)

    Contudo, neste período/fase, ainda eram poucos os portais de notícias que

    adotaram a sistemática, por conta do alto custo relacionado ao desenvolvimento de

    tecnologias de transcodificação em banco de dados, fato que só foi resolvido em meados

    da primeira década do século XXI, com o desenvolvimento, não apenas tecnológico,

    mas, sobretudo, de recursos humanos capacitados para programar sistemas de

    informação, o que permitiu uma oferta maior a este mercado contribuindo, assim, para oseu desenvolvimento, bem como para a chegada do jornalismo online de 4ª geração.

     Neste ponto as condições tecnológicas já permitiam o relacionamento avançado

    entre os diversos conteúdos por meio de palavras-chave que passariam a ser indexadas

     pelos sistemas de informação e motores de busca de pesquisa da internet. O jornalista,

    como produtor de conteúdo noticioso, precisou se adaptar às realidades do novo

    mercado profissional, desempenhando papeis que anteriormente não o eram exigidos

    como, por exemplo: a produção multimidiática de notícias com preocupaçõesrelacionadas à sistematização da organização do conteúdo. Isto exigiu também, uma

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    7/11

    quebra de paradigmas nas rotinas de produção jornalísticas, as pautas que antes eram

    direcionadas apenas para a produção de um texto, passam a precisar ser pensadas

    também para o formato e linguagem em vídeo, áudio, fotos, imagens ilustrativas e

    infográficos animados, todo o conteúdo associado e sob um mesmo perfil editorial.

    Se por um lado a evolução das prerrogativas profissionais foi perversa, sob o

     ponto de vista de uma maior exigência sem a contrapartida da recompensa financeira

    salarial compatível. Por outro, criou novas frentes de trabalho e inclusive novos cargos a

    serem ocupados por profissionais da área, como foi o caso do “arquiteto de

    informação”, como explica Schwingel:

     No caso dos profissionais, destaca-se o arquiteto da informação, termocunhado por Rosenfeld e Morville (1998), que se caracteriza por ser aquele

     profissional que possui uma visão sistêmica do processo. Suas atribuiçõesestão vinculadas a todas as etapas da elaboração de um produto, desde oarmazenamento das informações nas máquinas servidoras até as ferramentasde publicação, edição e divulgação das páginas internet, ou seja, do projeto àveiculação. É um profissional que precisa compreender de forma ampla, porteoria e prática, o ambiente internet, as características do ciberespaço e osconceitos propostos pela cibercultura, desde o hipertexto e seus princípiosfundadores. (SCHWINGEL, 2005, p. 6)

    Estas novas atribuições garantem ao jornalista, diferentemente do imaginado por

    Pierre Levy, uma condição de sobrevida profissional, justamente para servir e exercer a

    função de produzir, editar, adequar as linguagens aos meios, organizar, ordenar e

     planejar a distribuição dos diversos conteúdos jornalísticos. A quantidade de informação

    gerada, agora não apenas pelo jornalista, que num primeiro momento foi vista como

    ameaça à profissão, configura-se, no entanto, como aliada.

    Desta maneira, a arquitetura da informação surge para cuidar das relações

    comunicativas entre os chamados atores sociais em rede (Bruno Latour), representados

     pelas diversas instâncias envolvidas neste processo de produção e consumo de

    informações como, propriamente os jornalistas (autores), as empresas jornalísticas e osleitores que passam a ser coautores a partir de suas interações com a notícia. Além

    disso, também oferece uma organização editorial que visa otimizar e garantir eficiência,

    tanto na produção quanto no consumo das informações jornalísticas, como veremos a

    seguir.

    3.  A REENGENHARIA JORNALÍSTICA DAS TAGS

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    8/11

    As tags3 só se tornaram viáveis e eficientes à produção jornalística a partir do

    advento dos bancos de dados. Estas passaram a funcionar como etiquetas em prol da

    categorização dos conteúdos para aperfeiçoar os processos de pesquisa que ficaram

    muito mais ágeis via web. Podemos entender as tags como uma evolução da retranca

     jornalística, que é usada nos cabeçalhos das laudas e que tem função interna de

    classificação e organização do conteúdo produzido nos jornais. Hoje em dia, como a

     produção jornalística é colaborativa, o autor (jornalista) precisa lidar em sua

    composição de conteúdo (texto, vídeo, som e imagem) com palavras-chave que melhor

    otimizem o processo de pesquisa dos sistemas de busca como, por exemplo, o Google e

    lembrar que não é mais “dono” do seu conteúdo, que este será apropriado pelos  leitores

    e inclusive reetiquetado ao bel prazer do usuário.

    Isto significa, não apenas ter que se preocupar com um texto técnico jornalístico,

    como organizá-lo composto com palavras que possam servir de “boas iscas” ao Google

     para que sua matéria esteja em destaque, de preferência na primeira página da busca,

    aumentando assim a chance de aumento de audiência, mas principalmente facilitar o

    encontro da informação. A esta condição podemos chamar de reengenharia jornalística,

    algo impensável no surgimento do jornalismo impresso, mas que é essencial para o

    webjornalismo.

    Hoje, com o avanço da tecnologia de bancos de dados, é possível relacionar

    todos os diversos conteúdos jornalísticos armazenados, classificando os textos às fotos,

    fotos aos áudios, vídeos aos infográficos e todas as demais combinações possíveis entre

    si. Assim como também ficou muito mais simples e viável mensurar a audiência gerada

    a partir destas combinações. Por conta disto, o jornalista individualmente passou a ser

    cobrado por índices de audiência que são medidos instantaneamente e acabam por

    influenciar diretamente na sua produção.

    Em entrevista concedida a mim por telefone, um jornalista do portal Terra, que pediu para não ser identificado, contou que as editorias do referido portal possuem

    “metas” mensais e anuais de audiência para cumprir perante a direção da empresa.

    Funciona assim, segundo ele:

    3

     Uma tag, ou em português: "etiqueta", é uma palavra-chave (relevante) ou termo associado com umainformação (ex: um texto, uma imagem, um artigo, um vídeo e etc...) que o descreve e permite umaclassificação e categorização da informação baseada em palavras-chave.

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    9/11

    As matérias que uma editoria produz precisam alcançar a meta de audiênciamensal estipulada pelo portal, que variam de acordo com a editoria ou eventoque está sendo coberto. Quando a meta está abaixo do normal, editores e

     jornalistas podem usar a experiência de um histórico conhecido para produzirmatérias que costumeiramente geram bons índices de audiência, bem comonegociar com o editor responsável pela capa (capista) a inserção de matérias

    em locais de destaque. (JORNALISTA [anônimo] do PORTAL TERRA,Entrevista, 2011)

    Isto demonstra a influência da audiência na produção de notícias hipermidiáticas

    e como isto implica na artificialidade da apropriação do acontecimento de fatos para se

    alcançar metas.

    Ele ainda explicou que o “capista” exerce a função de “ gatekeeaper   pós-

    moderno” e, embora haja alguma negociação por parte dos repórteres, é dele a decisão

    de designar ou não a ida de uma chamada pra capa, bem como em que posição e qual

    tipo de destaque esta terá. Ao nosso entender, a função do “capista”, no portal Terra,

    assemelha-se às funções de um arquiteto da informação que intermedia a produção

     jornalística, como um dos atores sociais, entre o jornalista e o público.

    Também nos chamou a atenção o fato de que, conforme relatado pelo jornalista,

    a maioria da audiência provém da página principal (capa). Isto nos faz crer que há falta

    de orientação quanto às formas de sistematização do Google que poderiam otimizar o

    encontro das referidas informações no site.. É importante ressaltar, que não se trata

    exclusivamente de aumentar a audiência e gerar melhores condições comerciais, temos

    outro propósito mais nobre que é o de facilitar o acesso às informações a partir de uma

    reengenharia que está baseada na “etiquetagem” (via tags) das matérias produzidas.

    4.  Considerações finais

    Sendo assim, temos que o acontecimento jornalístico noticioso, proposto por

    Charaudeau, é então hipermidiático e ganhou novas configurações –  reengenharia - nos

    seus processos de produção a partir das condições tecnológicas provenientes da

    chamada 4ª geração do jornalismo online. Estas apropriações, por vezes, com funções

    apenas comerciais associadas à audiência, mas não somente, tem influenciado a

     produção jornalística sob o ponto de partida do acontecimento. Os fatos jornalísticos,

    embora continuem a se tornar notícia, acabam disputando espaço com notícias

    artificialmente produzidas, com valores-notícia viciados que operam a favor de uma

    “necessária audiência” para atingir metas. Esta reengenharia jornalística, a partir das

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    10/11

    etiquetagens (tags), nestes casos, passa a perverter a ordem natural do acontecimento

     jornalístico e corrompe a natureza dos fatos em prol de uma necessidade institucional e

    é neste sentido que este artigo busca contribuir para uma reflexão crítica a respeito do

    assunto. Longe de querer defender uma posição romântica jornalística o intuito é

    fomentar a ideia de que não é necessário criar artifícios para forjar um acontecimento

     jornalístico, travestido de notícia, para alavancar a audiência e assim alcançar a meta

    estabelecida pela instituição para a qual se trabalha. Acreditamos que a reengenharia

     jornalística associada a uma adequação do conteúdo, composto por palavras-chave no

    contexto, bem como na manchete ou título, nos vídeos, áudios e fotos/imagens podem

    contribuir para uma potencialização natural da audiência. Vale ressaltar ainda, que uma

    notícia hipermidiática deve estar “amarrada”, através da linguagem e usabilidade, entre

    seus diversos conteúdos, estimulando o leitor/usuário a consumir ela por inteiro em

    diversas seções de experiências seja por leitura, ouvindo, vendo, customizando e

    interagindo com os conteúdos gerados pelo jornalista.

    Definitivamente, em tempos de webjornalismo exige-se mais dos jornalistas e

    estes precisam estar preparados para lidar com os novos desafios já propostos, bem

    como ter condições de encontrar soluções para os que hão de vir no futuro. Como

    vimos, não é possível que diante de tantas atribuições complexas e tamanhas exigências

    de qualificação profissional ainda tenhamos que lidar com a falta de respeito pela

     profissão ante a não exigência do diploma para o exercício do jornalismo. Se por um

    lado os contextos e os valores são pós-modernos, o webjornalista é, por demais, exigido

    e na maioria dos casos mal recompensado. Que este artigo possa contribuir para gerar

    novos argumentos e discussões a respeito dos temas propostos.

    5. 

    Referências Bibliográficas

    FONSECA, Virginia Pradelina da Silveira. Acontecimento como notícia: do conceito à práticaprofissional. In Jornalismo e acontecimento: mapeamentos críticos. Florianópolis: Insular, 2010. 

    JORNALISTA [anônimo] DO PORTAL TERRA, Entrevista por telefone. São Paulo, junho de 2011.

    PALACIOS, Marcos. Ruptura, continuidade e potencialização no jornalismo online: o lugar damemória. In: MACHADO, Elias & PALACIOS, Marcos (Orgs), Modelos do Jornalismo Digital,Salvador: Editora Calandra, 2003.

    RODRIGUES, Adriano Duarte. O acontecimento. In: Jornalismo: questões, teorias e “estórias”. Lisboa:Veiga, 1993.

  • 8/17/2019 Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)

    11/11

    SCHWINGEL, Carla. Jornalismo Digital de Quarta Geração: a emergência de sistemasautomatizados para o processo de produção industrial no Jornalismo Digital.  In: Compós, 2005,

     Niterói. CD ROM Compós, 2005.