Livro_Denis Alcides Rezende_Tecnologia Da Informacao Aplic Sist Informacao Empresariais_5 Ed 2008
Arquitetos Da Informacao Um Mundo a Hipe (1)
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Rio Grande do Sul, julho de 2010
Doutorado em Ciências da Comunicação na Unisinos – Universidade do Vale do Rio dos SinosDisciplina: Produção do Acontecimento Professora: Christa Berger Acadêmico: Marco Bonito Linha de pesquisa 3: Processos midiáticos - Cultura Midiática, cidadania e tecnologias da informação
ARQUITETOS DA INFORMAÇÃO:UM MUNDO A HIPERTEXTUALIZAR
A apropriação do acontecimento como notícia hipermidiática, peloprofissional jornalista ante ao webjornalismo de quarta geração.
Resumo
Este artigo busca tratar e discutir o conceito de “acontecimento jornalístico”, proposto principalmente por Charadeau e fomentado pela pesquisadora Virgínia P. da
Silveira Fonseca, ante as configurações do webjornalismo de 4ª geração, conforme
exposto por Carla Schwingel. Neste sentido, também nos valeremos do conceito de
“acontecimento” trabalhado por Adriano Duarte Rodrigues, bem como das
características do jornalismo digital enunciadas por Marcos Palácios para que possamos
contribuir com uma reflexão crítica a respeito das apropriações do conceito de
“acontecimento”, como notícia hipermidiática, pelos jornalistas, a partir dos fatos que a
configura perante suas ocorrências no webjornalismo do portal Terra atualmente.
1. O ACONTECIMENTO E SUA NOTABILIDADE MÍTICA
A comunicação midiática, como todo ato de comunicação, realiza-se segundoum duplo processo de transformação e de transação. Nesse caso, “o mundo a
descrever” é o lugar onde se encontra o “acontecimento bruto” e o processo
de transformação consiste, para a instância midiática, em fazer passar oacontecimento de um estado bruto (mas já interpretado) ao estado de mundo
midiático construído, isto é, de “notícia”. (CHARAUDEAU, 2007, p.114apud FONSECA, 2010, p183)
Sendo assim, podemos entender a importância da notabilidade dos fatos para as
questões de noticiabilidade, bem como, e não obstante a isto, o acontecimento tem
função significativa preponderante e essencial para a construção dos sentidos nas
práticas jornalísticas.
Rodrigues (1993, p.27) entende que no discurso jornalístico,
... o acontecimento constitui o referente de que se fala, o efeito de realidadeda cadeia dos signos, uma espécie de ponto zero da significação. Por isso,
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uma das regras da prática jornalística consiste em afirmar que a opinião élivre, mas que os factos são soberanos.
O autor ainda explora o conceito abordando sua natureza como algo que se
encontra na escala de “probabilidades de ocorrência, sendo tanto mais imprevisível
quanto menos provável for a sua r ealização” (Rodrigues, 1993, p.27), ou seja, o cão que
morde o homem é tão previsível que perde valor de noticiabilidade, justamente por ser
menos notável. Enquanto que se um homem morde um cão o imponderável agrega tal
valor ao fato que o torna um acontecimento de natureza especial, digno de ser noticiado.
Existem vários “registros de notabilidade” de fatos jornalísticos que contém
vigor potencial de que se tornem acontecimento, dentre os quais destacamos aqueles
que nos interessam à discussão proposta e que são classificados assim por Rodrigues: de
excesso, da falha, da inversão e do acidente. Por eles, entenderemos que os de excesso
são os mais comuns, visto que irrompe o funcionamento anormal da norma estabelecida
dos corpos individuais ou institucionais. Como, por exemplo, os feitos dignos de entrar
para o livro dos recordes. Já os da falha se notabilizam por defeito ou insuficiência no
funcionamento normal ou regular dos corpos, como por exemplo: os eventos cósmicos,
naturais, cataclísmicos, inundações, terremotos ou até mesmo do trânsito de automóveis
no cotidiano. Também temos os de inversão, cujo exemplo clássico já usei acima,
quando um homem morde um cão, ou em outro caso, quando um ladrão devolve o carroroubado com dois ingressos para o cinema e um bilhete de agradecimento pelo passeio
proporcionado à revelia. Por fim, os do acidente que “deixa vestígios e altera a
substância do mundo das coisas, das pessoas, das instituições” (Rodrigues, 1993, p.28),
como nos casos de nascimento e morte, as quais todas as outras ocorrências se
posicionam e se referem.
O autor se posiciona afirmando que “o jornalismo inscreve-se
inequivocadamente neste processo de enquadramento e de regulação” (Rodrigues, 1993, p.29) relacionado às descrenças na veracidade de determinadas previsões enquadradas
na racionalidade moderna, mas que, contudo, contribui para que sejam criadas novas
formas de regulação dos acontecimentos imprevisíveis a partir do jornalismo.
Entretanto, sua conclusão mais interessante a respeito disto é que “o que torna o
discurso jornalístico fonte de acontecimentos notáveis é o facto de ele próprio ser
dispositivo de notabilidade, verdadeiro deus ex machina1” (Rodrigues, 1993, p.29). Esta
1 Deus ex machina: expressão latina vinda do grego "ἀπὸ μηχανῆς θεός" (apò mēchanḗs theós),
significa literalmente "Deus surgido da máquina". Sua origem encontra-se no teatro grego e refere-se a
http://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Latimhttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antigahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Latim
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é uma característica que contribui para exorcizar mitos que possam servir e asseguram o
“quadro de referência” comum da experiência do mundo, conforme ainda conclui:
A época moderna fez do pensamento mítico o dispositivo do obscurantismo eda dominação, considerou-o como a cegueira da razão iluminada, como oentrave ao conhecimento positivo da ciência. Ficou assim o homem modernodespojado dos quadros explicativos que organizavam o desenrolar dosacontecimentos do mundo e lhe asseguravam coerência. (RODRIGUES,1993, p.33)
Portanto, podemos entender que os discursos jornalísticos midiáticos contribuem
para organizar os fatos aleatórios e lhes confere racionalidade a partir de uma trama que
é tecida advinda do presente, a fim de que possa resultar numa “ordem identitária que
lhe devolva uma imagem coerente do destino” (Ibdem).
2.
O ACONTECIMENTO COMO NOTÍCIA HIPERMIDIÁTICA
O que faz com que assuntos sobre personagens próximas a celebridades e/ou
crimes cometidos por anônimos sejam pinçados do montante de acontecimentos que
constituem o espaço público, dentre os fatos cotidianos, para que adquiram visibilidade
e principalmente valor notícia?
Este é o questionamento que a pesquisadora Virginia Pradelina da Silveira
Fonseca faz em seu texto sobre “O acontecimento como notícia” que é fruto de suas
pesquisas a respeito do tema. Ela demonstra que “num primeiro momento, pode-se dizer
que tais registros têm em comum a condição de eventos com caráter de atualidade,
veracidade e impacto” (FONSECA, 2010, p.168) características comuns à classificação
dos valores notícia usados na prática jornalística. Contudo, a pesquisadora indaga:
“como ascenderam a esta condição?”. Para compreender esta situação ela se vale do
conceito de acontecimento proposto por Charaudeau e parte de um pressuposto básicosobre a matéria-prima do jornalismo ser a informação e a após a sua produção e sua
publicação ela pode ser “consumida” na forma de notícia.
uma inesperada, artificial ou improvável personagem, artefato ou evento introduzido repentinamente
em um trabalho de ficção ou drama para resolver uma situação ou desemaranhar uma trama. Este
dispositivo é na verdade uma invenção grega. No teatro grego havia muitas peças que terminavam com
um deus sendo literalmente baixado por um guindaste até o local da encenação. Esse deus então
amarrava todas as pontas soltas da história. Em termos modernos, Deus ex machina também podedescrever uma pessoa ou uma coisa que de repente aparece e resolve uma dificuldade aparentemente
insolúvel.
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apegam à aldeia e os que sonham com o planeta”. Além disso, a função de hierarquia
se daria em função da necessidade de um recorte do espaço público e da configuração
do acontecimento em critérios internos e externos. Os internos relativos aos perfis
editoriais de cada organização midiática e os externos relacionados aos modos de
aparição do acontecimento.
Neste sentido, a produção do acontecimento em tempos de hipermídia2 precisou
se reconfigurar em prol de uma adaptação que se fez necessária pelas práticas da
cibercultura que implicaram no modus operandi do fazer jornalístico. Marcos Palacios
(2003) releva, por exemplo, a importância da memória para o jornalismo online e
explica o porquê desta característica ter contribuído tanto para o desenvolvimento
conceitual e prático das notícias hipermidiáticas no ambiente da web:
... a acumulação de informações é mais viável técnica e economicamente naWeb do que em outras mídias. Acresce-se o fato de que na Web a Memóriatorna-se Coletiva, através do processo de hiperligação entre os diversos nósque a compõem. Desta maneira, o volume de informação anteriormente
produzida e diretamente disponível ao Usuário e ao Produtor da notíciacresce exponencialmente no Jornalismo Online, o que produz efeitos quantoà produção e recepção da informação jornalística. (PALACIOS, 2003, p. 4)
Sendo assim, podemos entender que esta característica do jornalismo online,
associada às outras seis, também baseadas nos estudos de Bardoel e Deuze, tais como:
interatividade, personalização de conteúdo (customização), hipertextualidade,
multimidialidade (convergência), interatividade e instantaneidade constituem a estrutura
para a composição das notícias hipermidiáticas no contexto do jornalismo digital.
Dentre estas a memória é a que mais potencializa o webjornalismo, já que
permitiu não apenas o acúmulo das informações geradas pelo contingente de notícias,
mas principalmente permitiu o resgate destas informações, tanto por parte dos autores,
quanto por parte dos demais interlocutores como, por exemplo, os leitores/usuários que
passaram a ter condições ativas ante ao consumo das informações jornalísticas. O
modelo tradicional de comunicação das principais mídias de massa no século XX que
funcionava, a priori, por emissão de mensagens (Um Todos), passa a ser
reconfigurado por uma nova lógica de demanda de produção e consumo que é
caracterizada pelas Novas Tecnologias da Comunicação (NTC), na década final do
século XX, passando a operar por disponibilização e acesso (Todos Todos).
2 Hipermídia: uma mídia cujas propriedades dos conteúdos contemple uma variedade de recursosmidiáticos em diversos formatos como texto, áudio, vídeos e imagens/fotos.
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Disponibilidade e acesso estão intimamente relacionados com as possibilidades
advindas da associação do webjornalismo com os bancos de dados, o que é
caracterizado e entendido como memória. Ora, senão vejamos que a pesquisa em
jornais, antes desta configuração digital, era morosa e custosa, feita em enormes galpões
com pilhas de jornais separados, quando muito, por data de publicação. O interessado
precisava ter espírito de arqueólogo, alguma intuição e referências para tentar encontrar
a informação desejada. Isto podia durar meses e até anos de trabalho.
Mas a partir da chamada 3ª geração do jornalismo digital, superadas as fases de
transposição (1ª geração) e metáfora (2ª geração) do jornalismo impresso, é que o
webjornalismo passa a incorporar, ainda que timidamente, sua produção a um banco de
dados dinâmico, o que contribuiu para a organização dos conteúdos gerados pelos
diversos canais jornalísticos, conforme vemos a seguir.
De acordo com Machado (2004), a partir do princípio da transcodificação deManovich (2001), os bancos de dados são a forma cultural adotadas pelosmeios digitais para a organização das informações nas sociedadescontemporâneas. É a tecnologia de banco de dados que evidencia ainda maisa noção da estrutura de um sistema (explicitada na arquitetura da informação)ser um suporte para as informações. A internet - desde suas proposiçõesiniciais - trabalha com a noção de memória estendida em bancos de dadosque podem ser acessados por diferentes pessoas de forma simultânea. A rederepresenta, na verdade, um grande banco de dados cujas indexações ocorrem
por remissões a suas páginas, onde os vínculos informativos são osendereços, as URLs (Uniform Resource Locator ), de acordo com aarquitetura do sistema. (SCHWINGEL, 2005, p.5)
Contudo, neste período/fase, ainda eram poucos os portais de notícias que
adotaram a sistemática, por conta do alto custo relacionado ao desenvolvimento de
tecnologias de transcodificação em banco de dados, fato que só foi resolvido em meados
da primeira década do século XXI, com o desenvolvimento, não apenas tecnológico,
mas, sobretudo, de recursos humanos capacitados para programar sistemas de
informação, o que permitiu uma oferta maior a este mercado contribuindo, assim, para oseu desenvolvimento, bem como para a chegada do jornalismo online de 4ª geração.
Neste ponto as condições tecnológicas já permitiam o relacionamento avançado
entre os diversos conteúdos por meio de palavras-chave que passariam a ser indexadas
pelos sistemas de informação e motores de busca de pesquisa da internet. O jornalista,
como produtor de conteúdo noticioso, precisou se adaptar às realidades do novo
mercado profissional, desempenhando papeis que anteriormente não o eram exigidos
como, por exemplo: a produção multimidiática de notícias com preocupaçõesrelacionadas à sistematização da organização do conteúdo. Isto exigiu também, uma
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quebra de paradigmas nas rotinas de produção jornalísticas, as pautas que antes eram
direcionadas apenas para a produção de um texto, passam a precisar ser pensadas
também para o formato e linguagem em vídeo, áudio, fotos, imagens ilustrativas e
infográficos animados, todo o conteúdo associado e sob um mesmo perfil editorial.
Se por um lado a evolução das prerrogativas profissionais foi perversa, sob o
ponto de vista de uma maior exigência sem a contrapartida da recompensa financeira
salarial compatível. Por outro, criou novas frentes de trabalho e inclusive novos cargos a
serem ocupados por profissionais da área, como foi o caso do “arquiteto de
informação”, como explica Schwingel:
No caso dos profissionais, destaca-se o arquiteto da informação, termocunhado por Rosenfeld e Morville (1998), que se caracteriza por ser aquele
profissional que possui uma visão sistêmica do processo. Suas atribuiçõesestão vinculadas a todas as etapas da elaboração de um produto, desde oarmazenamento das informações nas máquinas servidoras até as ferramentasde publicação, edição e divulgação das páginas internet, ou seja, do projeto àveiculação. É um profissional que precisa compreender de forma ampla, porteoria e prática, o ambiente internet, as características do ciberespaço e osconceitos propostos pela cibercultura, desde o hipertexto e seus princípiosfundadores. (SCHWINGEL, 2005, p. 6)
Estas novas atribuições garantem ao jornalista, diferentemente do imaginado por
Pierre Levy, uma condição de sobrevida profissional, justamente para servir e exercer a
função de produzir, editar, adequar as linguagens aos meios, organizar, ordenar e
planejar a distribuição dos diversos conteúdos jornalísticos. A quantidade de informação
gerada, agora não apenas pelo jornalista, que num primeiro momento foi vista como
ameaça à profissão, configura-se, no entanto, como aliada.
Desta maneira, a arquitetura da informação surge para cuidar das relações
comunicativas entre os chamados atores sociais em rede (Bruno Latour), representados
pelas diversas instâncias envolvidas neste processo de produção e consumo de
informações como, propriamente os jornalistas (autores), as empresas jornalísticas e osleitores que passam a ser coautores a partir de suas interações com a notícia. Além
disso, também oferece uma organização editorial que visa otimizar e garantir eficiência,
tanto na produção quanto no consumo das informações jornalísticas, como veremos a
seguir.
3. A REENGENHARIA JORNALÍSTICA DAS TAGS
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As tags3 só se tornaram viáveis e eficientes à produção jornalística a partir do
advento dos bancos de dados. Estas passaram a funcionar como etiquetas em prol da
categorização dos conteúdos para aperfeiçoar os processos de pesquisa que ficaram
muito mais ágeis via web. Podemos entender as tags como uma evolução da retranca
jornalística, que é usada nos cabeçalhos das laudas e que tem função interna de
classificação e organização do conteúdo produzido nos jornais. Hoje em dia, como a
produção jornalística é colaborativa, o autor (jornalista) precisa lidar em sua
composição de conteúdo (texto, vídeo, som e imagem) com palavras-chave que melhor
otimizem o processo de pesquisa dos sistemas de busca como, por exemplo, o Google e
lembrar que não é mais “dono” do seu conteúdo, que este será apropriado pelos leitores
e inclusive reetiquetado ao bel prazer do usuário.
Isto significa, não apenas ter que se preocupar com um texto técnico jornalístico,
como organizá-lo composto com palavras que possam servir de “boas iscas” ao Google
para que sua matéria esteja em destaque, de preferência na primeira página da busca,
aumentando assim a chance de aumento de audiência, mas principalmente facilitar o
encontro da informação. A esta condição podemos chamar de reengenharia jornalística,
algo impensável no surgimento do jornalismo impresso, mas que é essencial para o
webjornalismo.
Hoje, com o avanço da tecnologia de bancos de dados, é possível relacionar
todos os diversos conteúdos jornalísticos armazenados, classificando os textos às fotos,
fotos aos áudios, vídeos aos infográficos e todas as demais combinações possíveis entre
si. Assim como também ficou muito mais simples e viável mensurar a audiência gerada
a partir destas combinações. Por conta disto, o jornalista individualmente passou a ser
cobrado por índices de audiência que são medidos instantaneamente e acabam por
influenciar diretamente na sua produção.
Em entrevista concedida a mim por telefone, um jornalista do portal Terra, que pediu para não ser identificado, contou que as editorias do referido portal possuem
“metas” mensais e anuais de audiência para cumprir perante a direção da empresa.
Funciona assim, segundo ele:
3
Uma tag, ou em português: "etiqueta", é uma palavra-chave (relevante) ou termo associado com umainformação (ex: um texto, uma imagem, um artigo, um vídeo e etc...) que o descreve e permite umaclassificação e categorização da informação baseada em palavras-chave.
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As matérias que uma editoria produz precisam alcançar a meta de audiênciamensal estipulada pelo portal, que variam de acordo com a editoria ou eventoque está sendo coberto. Quando a meta está abaixo do normal, editores e
jornalistas podem usar a experiência de um histórico conhecido para produzirmatérias que costumeiramente geram bons índices de audiência, bem comonegociar com o editor responsável pela capa (capista) a inserção de matérias
em locais de destaque. (JORNALISTA [anônimo] do PORTAL TERRA,Entrevista, 2011)
Isto demonstra a influência da audiência na produção de notícias hipermidiáticas
e como isto implica na artificialidade da apropriação do acontecimento de fatos para se
alcançar metas.
Ele ainda explicou que o “capista” exerce a função de “ gatekeeaper pós-
moderno” e, embora haja alguma negociação por parte dos repórteres, é dele a decisão
de designar ou não a ida de uma chamada pra capa, bem como em que posição e qual
tipo de destaque esta terá. Ao nosso entender, a função do “capista”, no portal Terra,
assemelha-se às funções de um arquiteto da informação que intermedia a produção
jornalística, como um dos atores sociais, entre o jornalista e o público.
Também nos chamou a atenção o fato de que, conforme relatado pelo jornalista,
a maioria da audiência provém da página principal (capa). Isto nos faz crer que há falta
de orientação quanto às formas de sistematização do Google que poderiam otimizar o
encontro das referidas informações no site.. É importante ressaltar, que não se trata
exclusivamente de aumentar a audiência e gerar melhores condições comerciais, temos
outro propósito mais nobre que é o de facilitar o acesso às informações a partir de uma
reengenharia que está baseada na “etiquetagem” (via tags) das matérias produzidas.
4. Considerações finais
Sendo assim, temos que o acontecimento jornalístico noticioso, proposto por
Charaudeau, é então hipermidiático e ganhou novas configurações – reengenharia - nos
seus processos de produção a partir das condições tecnológicas provenientes da
chamada 4ª geração do jornalismo online. Estas apropriações, por vezes, com funções
apenas comerciais associadas à audiência, mas não somente, tem influenciado a
produção jornalística sob o ponto de partida do acontecimento. Os fatos jornalísticos,
embora continuem a se tornar notícia, acabam disputando espaço com notícias
artificialmente produzidas, com valores-notícia viciados que operam a favor de uma
“necessária audiência” para atingir metas. Esta reengenharia jornalística, a partir das
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etiquetagens (tags), nestes casos, passa a perverter a ordem natural do acontecimento
jornalístico e corrompe a natureza dos fatos em prol de uma necessidade institucional e
é neste sentido que este artigo busca contribuir para uma reflexão crítica a respeito do
assunto. Longe de querer defender uma posição romântica jornalística o intuito é
fomentar a ideia de que não é necessário criar artifícios para forjar um acontecimento
jornalístico, travestido de notícia, para alavancar a audiência e assim alcançar a meta
estabelecida pela instituição para a qual se trabalha. Acreditamos que a reengenharia
jornalística associada a uma adequação do conteúdo, composto por palavras-chave no
contexto, bem como na manchete ou título, nos vídeos, áudios e fotos/imagens podem
contribuir para uma potencialização natural da audiência. Vale ressaltar ainda, que uma
notícia hipermidiática deve estar “amarrada”, através da linguagem e usabilidade, entre
seus diversos conteúdos, estimulando o leitor/usuário a consumir ela por inteiro em
diversas seções de experiências seja por leitura, ouvindo, vendo, customizando e
interagindo com os conteúdos gerados pelo jornalista.
Definitivamente, em tempos de webjornalismo exige-se mais dos jornalistas e
estes precisam estar preparados para lidar com os novos desafios já propostos, bem
como ter condições de encontrar soluções para os que hão de vir no futuro. Como
vimos, não é possível que diante de tantas atribuições complexas e tamanhas exigências
de qualificação profissional ainda tenhamos que lidar com a falta de respeito pela
profissão ante a não exigência do diploma para o exercício do jornalismo. Se por um
lado os contextos e os valores são pós-modernos, o webjornalista é, por demais, exigido
e na maioria dos casos mal recompensado. Que este artigo possa contribuir para gerar
novos argumentos e discussões a respeito dos temas propostos.
5.
Referências Bibliográficas
FONSECA, Virginia Pradelina da Silveira. Acontecimento como notícia: do conceito à práticaprofissional. In Jornalismo e acontecimento: mapeamentos críticos. Florianópolis: Insular, 2010.
JORNALISTA [anônimo] DO PORTAL TERRA, Entrevista por telefone. São Paulo, junho de 2011.
PALACIOS, Marcos. Ruptura, continuidade e potencialização no jornalismo online: o lugar damemória. In: MACHADO, Elias & PALACIOS, Marcos (Orgs), Modelos do Jornalismo Digital,Salvador: Editora Calandra, 2003.
RODRIGUES, Adriano Duarte. O acontecimento. In: Jornalismo: questões, teorias e “estórias”. Lisboa:Veiga, 1993.
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SCHWINGEL, Carla. Jornalismo Digital de Quarta Geração: a emergência de sistemasautomatizados para o processo de produção industrial no Jornalismo Digital. In: Compós, 2005,
Niterói. CD ROM Compós, 2005.