Arte popular brasileira essa nossa ainda desconhecida por Germana Moro

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Texto descrevendo sobre a arte popular brasileira e suas distinções entre o artesanato brasileiro. Autora: Germana Moro

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ARTE POPULAR BRASILEIRA: ESSA NOSSA AINDA

DESCONHECIDA.

Por: Germana Moro – Galerista e Curadora da M’Boitatá Arte & Antiguidade

(www.mboitata.com.br)

Ao visitar uma galeria, uma exposição ou ao ver uma obra de arte popular brasileira o grande

público em geral não sabe diferenciá-la do artesanato, e por vezes nem se dá conta da sua

existência. Apreciada por estrangeiros, é pouco conhecida pelos brasileiros. Um paradoxo! A

explicação, é que ainda poucas pessoas compreendem e reconhecem a beleza da arte do povo

brasileiro.

O artesanato pode ser o utilitário que usamos em nosso dia-a-dia ou as famosas

“namoradeiras”, que para os que desconhecem, são aquelas bonecas de cerâmica pintada que

vemos nas janelas de várias cidades turísticas no interior de Minas. No artesanato é utilizado o

método de repetição de um mesmo tema e mesmo material. O artesão diferente do artista

repete obras em série de acordo com as formas, moldes e técnicas que aprendeu. Não são

esperados originalidade ou expressão individual do artesão, mas sim domínio artesanal e a

capacidade para executar as obras. Não há um processo criativo e sim repetitivo. Agora, do

artesão pode surgir um artista e o contrário também acontece.

A arte popular assim como o artesanato, é muito rica. Porém é distinta, pois tem uma

linguagem sofisticada e cheia de significados. Constitui-se, em sua grande maioria na produção

de obras feitas por pessoas provenientes de camadas mais humildes da sociedade, oriundos do

meio rural ou das periferias dos grandes centros urbanos. Carpinteiros, agricultores,

cortadores de cana, policiais, e outras profissões podem ser o segundo ofício destes artistas

que produzem em seus momentos de folga. São autodidatas, espontâneos ou intuitivos, como

costumamos chamar as pessoas que não frequentam escolas de arte. As obras irrompem do

universo particular do artista, da sua vivência, do seu cotidiano, expressando os valores

próprios ou das comunidades onde vivem. Cito aqui Mestre Vitalino, um cronista que extraia

figuras arquetípicas do seu meio e as inseria em suas obras com muito humor e uma pitada de

critica social. Por vezes são retiradas do rico imaginário popular ou do inconsciente coletivo do

povo brasileiro, povoado por mitos, lendas, crendices e superstições. O artista popular cria

junto com a sua obra, uma identidade pessoal, imprimindo na mesma a sua marca e estilo,

personalizando-a.

A arte popular é a cara do Brasil. Deriva de uma mestiçagem imanente. É a arte raiz dos

brasileiros. Ela retrata fielmente a nossa identidade, nossos costumes e tradições. É

despretensiosa, livre de conceitos e convenções. Não se propõe a ser mais do que é. Busca

sempre a oportunidade de expressão. E nessa busca, ela é autêntica. Verdadeira. Suas

principais características são a espontaneidade, a diversidade, seus símbolos de identidade,

sua linguagem lúdica, plena de vitalidade graciosa e inventiva.

José Antônio da Silva, Agostinho Batista de Freitas, Chico da Silva, Manoel dos Santos Agnaldo,

Chico Tabibuia, Alcides Pereira, Artur Pereira, Geraldo Teles de Oliveira, Nhô Caboclo,

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Ranchinho, Mestre Guarany, Mestre Vitalino e J.Borges são alguns dos grandes artistas cujas

obras fazem parte do extenso acervo da arte popular brasileira. Contribuem ou contribuíram

para o continuo processo de renovação desta arte que hoje ocupa a posição de destaque em

museus no Brasil e no exterior e em coleções particulares. Trabalham o barro, a madeira e as

telas e delas extraem obras de imenso valor artístico como pinturas, desenhos, esculturas,

xilogravuras e cerâmicas.

Países como Portugal, França, Haiti, tem uma arte popular rica, mas a nossa conta com uma

maior diversidade. Cada região produz arte com características próprias e distintas. Tome-se

como exemplo, o Vale do Jequitinhonha, cujos artesãos e artistas utilizam a tabatinga (engobe

branco) e a tinta vermelha (engobe marrom) para a criação de suas obras, imprimindo

características que as distinguem das demais cerâmicas do restante do país. Minas Gerais está

dentre os estados que mais produzem arte popular brasileira, ficando atrás apenas de

Pernambuco, Alagoas e Ceará. Alguns dos maiores nomes da arte popular brasileira como

Artur Pereira, G.T.O., Jadir João Egídio, Isabel Mendes, Zezinha, Ulisses Pereira, Noemisa, são

mineiros.

Atualmente existem diversas outras formas de se nominar a arte popular, tais como Naif, arte

primitiva e arte ingênua. Não passam apenas de nomenclaturas vigentes na história da arte

posto que vivemos em um mundo onde tudo precisa ser classificado e categorizado em nome

de um padrão comum. Concordo com Eduardo Etzel quando disse: “A palavra “popular” pode

ter uma conotação pejorativa, como produção vulgar, sem valor, o que se poderia ser um

resíduo das antigas ideias aristocráticas de desprezo pelo povo”. Contudo, isso não diminui a

beleza com que a arte popular mostra a sua face, espelho das tradições e cultura do nosso

povo.

Citando Jorge Amado: “Sou daqueles que acham que a única arte brasileira que possui caráter

genuinamente nacional e se expressa numa forma decorrente de nossa cultura mestiça é a

naif, ingênua, primitiva, cada um que escolha a designação que lhe pareça melhor”.

Para se entender a arte popular tem que se ter um olhar apurado, sensibilidade e

principalmente uma mente livre dos conceitos pré-estabelecidos pelos padrões artísticos

atuais e vigentes. Conhecer melhor a arte popular é conhecer melhor o Brasil e os brasileiros.