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    [T]

    A tcnica como poder e o poder da tcnica:

    entre Hans Jonas e Andrew Feenberg1[I]

    Technique as power and the power of technique:

    between Hans Jonas and Andrew Feenberg

    [A]

    Jelson R. de Oliveira*

    Pontifcia Universidade Catlica do Paran (PUCPR), Programa de Ps-Graduao em Filosofia, Curitiba, PR,

    Brasil

    [R]

    Resumo

    Pretende-se, neste artigo, analisar a perspectiva segundo a qual Hans Jonas e Andrew

    Feenberg compreendem a tcnica como um poderde nova magnitude no mundo mo-

    derno e como, a partir de suas anlises, uma na perspectiva tica (Jonas) e outra na

    perspectiva poltica (Feenberg), ambos analisam as formas de exerccio desse poder, ouseja, suas potencialidades, seus limites, seus riscos, as consequncias de suas interven-

    es e as exigncias tericas e ticas do seu uso. Trata-se, ento, de compreender a tc-

    nica como um poder e, ao mesmo tempo, de perguntar sobre o quanto de poder ela tem

    1 O presente artigo resultado de pesquisa financiada pela Fundao Araucria.

    * JRO: doutor em Filosofia, membro de Grupo de Pesquisa Hans Jonas do Brasil e do Ncleo de Estudos da Tcnica da PUCPR, e-mail:

    [email protected]

    Rev. Filos., Aurora, Curitiba, v. 27, n. 40, p. 143-166, jan./abr. 2015

    DOI: 10.7213/aurora.27.040.DS06 ISSN 0104-4443

    Licenciado sob uma Licena Creative Commons

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    ou, em outras palavras, o quanto de poder tem o homem (individual ou coletivamente)

    de determin-la tica e politicamente. O poder, assim, ser o fio condutor da reflexo, a

    fim de demonstrar como Jonas pensa a responsabilidade como exerccio do poder tico

    de controle da tcnica, e como Feenberg pensa a democratizao da tcnica como me-dida de interveno e como alternativa tecnocracia reinante, em vista de uma transfor-

    mao dos interesses que guiam as escolhas tcnicas.[P]

    Palavras-chave: Tecnologia. Hans Jonas. Andrew Feenberg. Tecnocracia. Responsabilidade. #[#][B

    Abstract

    The aim of this paper is to analyze the perspective from which Hans Jonas and Andrew Feenberg

    understand the technique as a power of new magnitude in the modern world and how, from their

    analysis, one in ethical perspective (Jonas) and another in political perspective (Feenberg), both

    analyze the exercise of that power, that is, its potential, its limits, its risks, the consequences of their

    activities and the theoretical and ethical requirements of their use. It is, therefore, to understand

    the technique as a power and at the same time, to ask about how much power it has, or in other

    words, how much power have man (individually or collectively) to determine it ethically and po-

    litically. The power thus will be the thread of reflection in order to demonstrate how Jonas thinks

    the exercise of ethical responsibility as technical power control, to the time when Feenberg think

    the democratization of technique as intervention measure and as an alternative to technocracy,

    in view of a transformation of interests that guide the technical choices. [#][K]

    Keywords: Technology. Hans Jonas. Andrew Feenberg. Technocracy. Responsibility.

    Introduo

    Se Napoleo dizia: A poltica o destino,

    hoje bem se pode dizer: A tcnica o destino.(Hans Jonas).

    A citao acima no s comprova o interesse de Jonas sobre ofenmeno da tcnica como demonstra o quanto sua interpretao no

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    perde de vista o contedo poltico que fez deste um campo de toma-da de decises e de realizao de escolhas que dizem respeito com-preenso e ao exerccio da tcnica como umpoder. Pretendemos neste

    texto, formular algumas aproximaes dessa posio com as teoriasde Andrew Feenberg. Mesmo que partam de perspectivas loscasdistintas e que cheguem a concluses tambm diferentes (ainda queno divergentes, como pretendemos demonstrar), ambos os autoresconcordam entre si pelo menos em quatro aspectos fundamentais: 1)a tcnica um fenmeno losco de extrema relevncia no mundo

    contemporneo; 2) a tcnica se torna um assunto ou uma questo lo-sca porque diz respeito aopoderde interveno do ser humano sobre

    mundo e sobre si mesmo; 3) a losoa da tecnologia torna-se, diante detal relevncia temtica, ao mesmo tempo, oportuna e urgente; 4) cabe losoa da tecnologia formular a possibilidade de um poder sobre o

    poder, seja do ponto de vista tico (mais salientado por Jonas) seja doponto de vista poltico (fortemente desenvolvido por Feenberg). Taisteorias seriam, nesse caso, no conitantes, mas complementares, j

    que nem Jonas exclui o elemento poltico de sua tese, nem Feenberg otico, ainda que seus destaques tericos sejam distintos.

    Aluno de Heidegger, Hans Jonas manteve-se na mesma balizainterpretativa da teoria substantiva da tcnica, ainda que tenha recu-sado a premissa da neutralidadee tentado reinterpretar criticamente aideia de tcnica como destino. Como um pensador do ps-guerra, elecircunscreveu sua argumentao s preocupaes relativas ao avan-o da biotecnologia e s inquietaes ticas associadas ameaa am-

    biental, principalmente ante o poder desvelado pelo horror blico da

    bomba atmica lanada contra Hiroshima e Nagasaki em 19452. Nuncana histria, o poder humano tinha se mostrado to grandioso em suasconcretizaes, to infalvel em suas potencialidades, to perigoso emsuas promessas, to apocalptico em suas realizaes, to maldoso emsuas consequncias. A realidade desse fato comprova que o poder da

    2 Jonas provavelmente concordaria com as palavras do filsofo norte-americano Langdon Winner (1986, p. 20), em seu artigo

    Do artifacts have politicsquando afirma que a bomba atmica um exemplo extremo de um artefato inerentemente

    poltico (comandado de forma centralizada, hierrquica, previsvel e, por fim, tambm hegemnica).

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    Se em Hans Jonas a anlise tica ganha relevncia, em Feenberg a perspectiva poltica que se sobressai, portanto. Do ponto de vistada anlise losca, tal posicionamento terico faz com que Feenberg

    eleja o conceito de tecnocracia como um dos pontos centrais de suateoria, o que signica que o conceito depoderse torna tambm centralpara interpretar os resultados das escolhas tcnicas como produtosde interesses prprios de determinados grupos que se utilizam datecnologia para sustentar seus prprios modos de vida. Aquilo queFeenberg chama de tendncias tecnocrticas das sociedades moder-nas (TC, 97) deve ser interpretado como uma tentativa das classesinuentes de restringir o poder de interveno das classes menos fa-

    vorecidas nas decises tcnicas, sempre em benefcio dos interessesdas elites tcnicas e polticas.

    importante notar, de forma antecipatria, que Feenberg lis-tado entre os autores da chamada virada emprica4da losoa datecnologia, da qual Jonas participa apenas de forma parcial, j que seuinteresse permaneceu terico e crtico, salvo quando se empenha naanlise das biotecnologias e suas demandas ticas. Feenberg parecemesmo ter encontrado, com o desenvolvimento de sua obra, confor-me sugere Archterhuis (2001, p. 75), um caminho alternativo he-rana distpica que ele mesmo manteve no seu primeiro livro sobreo tema. Jonas, alm disso, por no ter vivido os eventos tecnolgicosmais recentes no que diz respeito ao avano da ciberntica, da cinciada computao e da tecnologia de informao, principalmente aquelassurgidas a partir da segunda metade da dcada de noventa do sculopassado, permanece associado a uma viso distpica que delimita sua

    interpretao em relao problemtica do poder da prpria tcnicasobretudo ao campo tico, sem acentuar a importncia poltica de queo homem transforme a prpria tcnica algo que se torna uma ques-to central na losoa de Feenberg, principalmente quando ope a al-ternativa de democratizao da tcnica ideia de tecnocracia.

    4 Cf. ARCHTERHUIS, 2001. Feenberg estaria posicionado ao lado de outros autores americanos como Albert Borgmann, Hubert

    Dreyfus, Donna Haraway, Don Ihde e Langdon Winner.

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    Isso no signica, contudo, que Jonas tenha se recusado a pen-sar a perspectiva poltica da tcnica. De fato, esse no o caso: umarpida leitura dos captulos cinco e seis dO princpio responsabilidade

    d prova das preocupaes polticas que envolvem a anlise da ques-to e a formulao da tica do futuro, que contrape a responsabili-dade esperana no apenas no mbito tico pessoal mas tambm

    no mbito poltico, que inclui uma reexo sobre o prprio papel do

    governante nas sociedades ameaadas pela crise ambiental. Jonas, as-sim, recusa uma viso fatalista que anularia qualquer possibilidadede atuao sobre o poder da tcnica. Ao contrrio: se Feenberg formu-la sua anlise especialmente a partir do campo poltico, Jonas o faz a

    partir do campo tico para evidenciar a importncia de que indivdu-os e governos assumam sua responsabilidade diante dos perigos quese avizinham. Ora, onde h responsabilidade, h poder. Por isso, aevidncia dessa posio se encontra na base da proposta de uma ticada responsabilidade compreendida como um poder sobre o poder(TME, 48): para Jonas a interveno humana sobre a tcnica se dariasob a gide do pensamento tico enquanto para Feenberg ela sedaria essencialmente no jogo poltico, que contrape democracia atecnocracia. Ao dar preferncia ao prognstico negativo (formuladopor meio do polmico conceito de heurstica do temor), Jonas noassume nem uma posio fatalista e nem uma posio tecnofbica,mas tambm no formula uma teoria que tematize ou incentive resis-tncias polticas tal qual encontramos em Feenberg.

    Ambos os autores, assim, pensam (1) a tcnica como um poder,e tambm reetem sobre (2) o poder humano de intervir no fenmeno

    tcnico,a m de evitar tanto a viso de neutralidade quanto a de fata-lidade. Um poder que no somente uma macroestrutura social, masque se dilui nas relaes de foras difusas cotidianas que orientam asescolhas tcnicas. Jonas deu maior relevncia ao campo tico, falandoem humanizao da tcnica; Feenberg ao poltico, falando em demo-cratizao. Os dois alimentam uma mesma pretenso: destacar a ne-cessidade de um poder controlado por mos humanas capaz de sub-meter o poder da tcnica. Trata-se de colocar os interesses humanos,

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    e de todo o reino da vida, como orientadores das escolhas tcnicas.Analisemos essas duas posies.

    Hans Jonas: a tica comopoder sobre o poderda tcnica

    Nos dois primeiros captulos da obra Tcnica, medicina e tica(1985)Hans Jonas esboa um projeto e d pistas do que seria, para ele, uma lo-soa da tecnologia, dado que a tcnica teria se transformado em um pro-

    blema tanto central quanto premente de toda a existncia humana sobrea terra, avanando sobre quase tudo o que diz respeito aos homens

    (TME, 25). Para o lsofo alemo, a tcnica teria se transformado em umassunto de losoa e, sendo assim, seria preciso que existisse alguma

    coisa como uma losoa da tecnologia, algo que, poca da elaborao

    desses textos (1979 e 1982, respectivamente), ainda era bastante incipien-te, demandando bastante trabalho. O projeto jonasiano partiria (1) deuma anlise descritiva capaz de (2) obter analiticamente os aspectos par-ciais de dignidade losca com os quais h de se continuar trabalhando

    na interpretao de conjunto (TME, 25) do fenmeno tcnico, para ento(3) perguntar sobre a especicidade da nova tecnologia, ou seja, sobre sua

    forma contempornea de manifestao, marcada por uma promessa, aomesmo tempo, utpica, apocalptica e escatolgica.

    Para comear, Jonas prope uma distino entre forma e conte-do na anlise do fenmeno tcnico: a tecnologia teria uma dinmica

    formal e um contedo substancial. A primeira expresso denotaria o as-pecto abstrato de um movimento coletivo e continuado da tcnica: ela

    seria uma empresa coletiva continuada que avana conforme leis demovimento prprias (TME, 26). A segunda ideia colocaria em relevotudo aquilo que tal empresa aportaria para o uso humano, o patri-mnio e os poderes que confere, os novos objetivos que abre ou dita eas prprias novas formas de atuao e conduta humanas (TME, 26)que ela gera e representa. Para o autor, o primeiro aspecto faria dalosoa da tecnologia uma reexo sobre as condies do proces-so, ou seja, sobre os modos de atuao da tcnica, cujo resultado

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    abrir continuamente passagem para si mesma, segundo a lgica deuma retroalimentao nascida da nfase moderna na necessidade deinovao algo que, ademais, teria sido transformado num epteto

    recomendatrio5

    orientador de todas as aes humanas. O segundoaspecto, por sua vez, destaca a novidade mesma, ou seja, os produ-tos e os efeitos, bem como as alteraes provocadas no mundo peloavano de um tal poder. Uma losoa da tecnologia, nessa segunda

    perspectiva, deveria ser capaz de situar tais novidades numa espciede taxonomia que fornecesse uma viso da substncia nal daquele

    movimento contnuo.O projeto de Jonas ainda inclui um terceiro aspecto, que assumi-

    ria grande relevncia no contexto geral de sua produo losca: aface tica da tecnologia como exigncia responsabilidade humana

    (TME, 26). Tal perspectiva, reconhecida pelo autor como a mais im-portante, de cunho valorativo, enquanto as duas primeiras seriamanalticas e descritivas, respectivamente.

    A losoa da tecnologia partiria, portanto, para Jonas, de uma

    constatao (a tcnica, em sentido geral, um poder; a tcnica moderna um poder cuja magnitude no tem antecedentes na histria humana)e de trs perguntas fundantes: qual a formada tecnologia (enquantopergunta sobre o prprio estatuto do movimento tcnico), qual o seucontedo(ou seja, quais os efeitos e implicaes prticas desse processono mundo e nos modos de vida) e quais as suas postulaes ticas(asconsequncias de tais resultados do ponto de vista da avaliao sobreo bem e o mal que eles contm ou, mais especicamente, sobre a ambi-guidade valorativa que eles encerram).

    5 No captulo intitulado O impacto do sculo XVII. A significao da revoluo cientfica e tecnolgica(EF, 75), Jonas escreve:

    A grande virada marcada pelo uso sempre mais frequente do epteto laudatrio novo para uma variedade sempre maior

    de iniciativas humanas na arte, na ao e no pensamento. Essa moda lingustica seria grave ou ftil dependendo do

    caso, nos diz uma srie de coisas. A elevao do termo a atributo laudatrio denuncia certo cansao, at mesmo certa

    impacincia com as formas de pensar e de viver at ento dominantes. O respeito pela sabedoria do passado substitudo

    pela suspeita de um erro inveterado e pela desconfiana de uma autoridade inerte. Isso vem acompanhado de um novo

    estado de autoconfiana, de uma firme convico de que ns modernos estamos mais bem equipados do que os antigos

    e certamente melhor do que nossos antecessores imediatos para descobrir a verdade e melhorar muitas coisas.

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    O primeiro tema formal contempla a tecnologia como um con-junto abstrato de um movimento; o segundo contempla seu mltiplouso concreto e seu efeito sobre nosso mundo e nossa vida. O acesso

    formal quer reconhecer as condies permanentes do processo, comas quais a moderna tecnologia rompe mediante nossa ao, natural-mente acima da novidade seguinte e superadora em cada momen-to. O acesso material quer examinar suas formas de novidade, tentarclassic-las e obter uma imagem dos aspectos do mundo equipado

    por elas (TME, 15).A obra de Jonas, assim, principalmente a parte produzida a par-

    tir do nal dos anos 1960, pode ser compreendida a partir desse proje-

    to e nela se incluiriam textos produzidos de forma esparsa e reunidosem trs livros fundamentais sobre o assunto: Ensaios loscos: do credoantigo ao homem tecnolgico (1974), O princpio responsabilidade (1979) eTcnica, medicina e tica(1985).

    Assim, a tese fundamental de Jonas sobre a tcnica poderia serresumida na perspectiva de uma reexo sobre o poder: a histria datcnica a histria da ascenso do poder humano sobre a natureza esobre si mesmo. Isso signica que a reexo jonasiana seria uma ree-xo descritiva, analtica e valorativa sobre a histria do desenvolvimento(provavelmente a palavra mais adequada fossegenealogia) desse poder,destacando seus aspectos tericos e prticos. Para tanto, o lsofo parte

    de uma diviso generalista entre a tcnica pr-moderna e a tcnica mo-derna para, em seguida, pensar sua dinmica formal em cinco estgios:o mecnico, o qumico, o eltrico, o eletrnico e o biolgico (ou biotecno-lgico). Para ele, a tcnica moderna introduziu aes de uma tal ordem

    indita de grandeza, com tais novos objetos e consequncias, que a mol-dura tica antiga no consegue mais enquadr-la (PR, 39).

    A marca do desenvolvimento desse poder estaria amparada teo-ricamente nos ideais modernos expressos no programa baconianoque unicou a tarefa de conhecimento (antes meramente terica ou

    contemplativa) com a tarefa da explorao ou modicao do mundo.

    Assim, a unidade entre teoria e prtica (BEINER, 1990, p. 349) passama comandar os avanos tcnicos, transformando a teoria em algo so-mente vivel se estiver mantida sob a gide da manipulao do mundo.

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    Muda, alm disso, a prpria ideia de natureza: em um dramtico jogode estmulos e respostas, com a crescente sutileza da investigao, a na-tureza mesma mostrou-se cada vez mais sutil (TME, 22). A tcnica, en-

    quanto poder, invade o mbito da natureza, entendida como algo inertee sem valor e, paradoxalmente, em tal movimento, ao invs de reduzira margem do que resta para ser descoberto, a cincia surpreende-se asi mesma hoje com dimenso aps dimenso de novas profundidades(TME, 22). Muda, portanto, a prpria ideia de verdade, agora nuncaalcanada, mas incessantemente buscada. Como poder, a tcnica al-tera a teoria, confundindo-se com ela. Ambas as dimenses passam apenetrar-se mutuamente. A nova relao com a teoria gera uma nova

    perspectiva de verdade no mais derivada de uma contemplao doser, mas de uma manipulao insacivel do mundo, para cuja tarefa ne-nhum saber verdadeiro poderia ser alcanado de forma satisfatria. Porisso, segundo Jonas, a ideia de um progresso potencialmente innito

    perpassa o moderno ideal do conhecimento (PV, 229) de forma alheiaa qualquer tipo de reexo sobre o valor dos objetos manipulados, visto

    que o poder de manipulao se viu defrontado com uma natureza esva-ziada de qualquer teleologia ou contedo espiritual, conforme as tesesdesenvolvidas na obra de 1966, The phenomenon of life.

    Em outras palavras, a cincia moderna teria conduzido o conhe-cimento at o mundo (ele mesmo mal interpretado, quanto aos orga-nismos vivos, reduzidos sua materialidade), na perspectiva de que

    seria preciso provocar mudanas na natureza como um meio paraconhec-la melhor (PV, 227). A ideia mesma de experimentao, por-tanto, estaria na base do novo modo de exerccio que transformou o

    saberem umpoder.

    Sob dois aspectos a cincia moderna est ligada ao modicar ativo dascoisas: na pequena escala do experimento ela provoca a variao, comomeio necessrio para o conhecimento da natureza, isto , usa a prticapara os ns da teoria; e a teoria assim adquirida est habilitada s mo-dicaes de larga escala de sua aplicao tcnica e a ela convida.A aplicao tcnica, por sua vez, passa a ser uma fonte de conhecimentostericos, que no poderiam ter sido alcanados em escala laboratorial abstraindo-se do fato de que ela fornece os instrumentos para um

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    trabalho laboratorial mais eciente, que por sua vez fornece tambm

    novos acrscimos cincia, e assim por diante, em um crculo contnuo(PV, 227).

    A simbiose dos dois aspectos (teoria e prtica) seria a marca cen-tral da tcnica moderna cuja consequncia tem sido um aumento dopoder humano, entendido como capacidade de modicao do mundo

    e do prprio ser humano. Mais do que isso: a prpria ideia de exercciodesse poder (ou seja, a potencialidade da fora despertada no exerc-cio dessa capacidade de modicao) tornou-se a prpria nalidade

    do poder: poder sempre exerccio de poder. E enquanto tal, poder

    acmulo de mais poder, algo que ser cada vez maior medida quemais experimentaes (entendidas como modicaes provocadas in-tencionalmente a m de conhecer por meio das alteraes) forem leva-das a cabo. O campo desse exerccio, obviamente, precisou tambm seraumentado: no mais apenas o laboratrio, mas todo o cenrio natural,compreendido como campo de existncia ou espao sobre o qual de-senvolve-se o fenmeno da vida, passa a ser includo como panoramae objeto do poder. O tal crculo contnuo (PV, 227) traduz, assim,a ideia de uma dinmica formal do exerccio desse poder que , elemesmo, transformado em meio e m da ao tcnica e que marca a

    diferena entre a tcnica moderna, j que esta se distingueformalmentedas anteriores (TME, 16), o que signica reconhecer que h, a partir do

    sculo XVII, uma nova dinmica de exerccio de poder. Agora,

    cada inovao tcnica est segura de difundir-se com rapidez pela co-

    munidade tecnolgica, como ocorre tambm com os descobrimentostericos nas cincias. A difuso tecnolgica se produz, com escassa di-ferena temporal, tanto no plano do conhecimento quanto no da apro-priao prtica: o primeiro vem se garantindo pela intercomunicaouniversal, por sua vez conquista complexo tecnolgico; [por sua vez

    conquista complexo tecnolgico] o segundo, forado pela presso dacompetio (TME, 18).

    A tcnica, nesse caso, transforma-se em tecnologia, ou seja, dei-xa-se conduzir por um incessante dinamismo (PV, 230), que est,

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    de um lado, pleno de uma atitude em direo ao futuro e, de outro,esvaziado da pergunta sobre o para onde desse futuro: ao dilurem--se as antigas barreiras que separavam as nalidades dos meios, dis-

    solvem-se tambm as perspectivas da orientao tcnica e recai-se naarmao paradoxal de um presente absoluto no prprio movimentodo vir-a-ser: valoriza-se a mudana pela mudana, o innito avan-o da vida para o sempre novo e desconhecido, o dinamismo em si(PV, 230). Eis a nova forma de apresentao do poder: autofgico, elealimenta-se de si mesmo, de seu prprio ir alm, transformado em suaprpria nalidade, em benefcio de um esforo acionado constante-mente em nome doprogresso:

    O progresso no um enfeite da tcnica moderna, nem to pouco umamera opo oferecida por ela, que podemos exercer se queremos, mas um impulso inserido nela mesma, alm da nossa vontade, repercuteno automatismo formal de seu modus operandi; e sua oposio com asociedade que o desfruta (TME, 19).

    Diferentemente do que acontecia no perodo pr-moderno, ago-ra a tcnica no alcana mais aquele anterior equilbrio entre necessi-dade e realizao, o que legitima a ideia de um progresso ad innitum.Em sua nova dinmica, a tcnica marcada por uma negao da ade-quao dos meios aos objetivos pr-xados (TME, 18) e por um im-pulso insacivel em todas as direes, sempre com novos xitos e coma diluio mesma dos objetivos que a motivam. A rpida difuso dosconhecimentos e a imediata aceitao pela comunidade cientca e pela

    sociedade em geral fazem com que esse sistema se retroalimente in-

    nitamente pela busca constante da novidade. disso, justamente, quenasce a ideia de progresso, compreendido no como um adorno damoderna tecnologia nem tampouco [como] uma mera opo oferecida

    por ela, como algo que podemos exercer se queremos, mas como umimpulso incerto nela mesma, muito alm de nossa vontade (TME, 19).

    Ao apresentar-se por meio dessa nova dinmica formal a partirda modernidade, a tecnologia no pode mais ser explicada segundo oantigo conceito de tcnica, marcado pela ideia de vocao:

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    o conceito de tcnica,grosso modo, denomina o uso de ferramentas edispositivos articiais para o negcio da vida, junto com sua invenooriginria, fabricao repetitiva, contnua melhora e ocasionalmentetambm adio ao arsenal existente, to tranquila descrio serve para

    a maior parte da tcnica ao longo da histria da humanidade (que tema mesma idade que ela), mas no para a moderna tecnologia (TME, 16).

    A novidade do cenrio est ligada transformao da tcnica

    em um destino, no no sentido de algo determinista, mas de algo quese retroalimenta e se esgota em sua prpria efetivao, reduzida aoautomatismo do seu uso (PV, 231). Nesse caso, a habilidade toma

    posse do que a possui (PV, 232), ou seja, a verso do homo faber reduzas possibilidades humanas ao exerccio do poder tcnico, encolhendocom isso a prpria condio de autenticidade da vida e restringindoo destino humano ao prprio desgnio do exerccio do poder. Nessecaso, destino menos destinao e mais orientao e propsito de umpoder que se esgota em si mesmo. Essa a insistncia de Jonas ao for-mular uma tica para a tcnica: ele reconhece que o destino humanono poderia se reduzir a esse vcuo de um poder brio de si mesmo(PSD, 142) e que tambm seria tarefa da losoa da tecnologia formu-lar uma tica, entendida como um poder sobre o poder (TME, 48).

    Jonas recusa, portanto, a destinao para reorientar o propsito: ogalope tecnolgico deve ser colocado sob controle extratecnolgico,sob o risco de reduzirmos a nossa capacidade de atuao livre. Ouseja, a questo central seria o uso autnomo desse poder, a m de que

    nos possuamos a ns mesmos e no nos deixemos possuir por nossa

    mquina (TME, 39).

    Feenberg: democratizar a tecnologia, um desafio poltico

    Para Feenberg, o mote central da losoa da tecnologia a

    pergunta sobre a posio do ser humano no mundo e, consequen-temente, sobre a forma de seus instrumentos (CT, 2), ou seja, sobre

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    os processos de planejamento, execuo e desenvolvimento dasescolhas tcnicas, tanto do ponto de vista privado quanto pblico.Compreendida dessa forma, a tcnica tem a ver com a constituio

    ntima da vida humana: tratar da tcnica tratar do homem, dosseus modos de vida, das escolhas individuais e coletivas que o cons-tituem. S assim formulada, a pergunta sobre a tcnica nos condu-ziria para um maior controle sobre nossa prpria humanidade(CT, 2), ou seja, resgataramos o nossopoder sobre aquele outropoderrepresentando pela ao tecnolgica (que o autor entende tambmcomo nosso: controlvel, orientvel, regulamentvel). Em outras pa-lavras, o tom poltico do argumento favorece a ideia de que se trata

    de encontrar um caminho no qual o ser humano retome o controle datcnica a partir da pergunta sobre os processos que fundam seu de-senvolvimento, o que implica, obviamente, uma recusa das teses quedefendem a neutralidade da tcnica e, consequentemente, apoiam-seem uma espcie de determinismo tecnolgico:

    O determinismo se baseia na suposio de que as tecnologias tmuma lgica funcional autnoma, que pode ser explicada sem se fa-zer referncia sociedade. Presumivelmente a tecnologia s socialapenas em relao ao propsito ao qual serve, e propsitos esto namente do observador. A tecnologia se assemelharia, assim, cinciae matemtica em funo de sua intrnsica independncia do mun -do social.No entanto, diferentemente, da cincia e da matemtica, a tecnologiatem impactos sociais imediatos e poderosos. Poderia parecer que o des-tino da sociedade , pelo menos parcialmente, dependente de um fatorno social que inuencia isso sem, no entanto, sofrer uma inunciarecproca. Isso o que signica determinismo tecnolgico.

    As vises distpicas da modernidade que eu tenho descrito so deter-ministas. Se ns quisermos armar as potencialidades democrticas daindstria moderna, ento teremos que desaar as premissas do seu de-terminismo (RS, 3).

    Isso signica que, para Feeneberg, os designs tcnicos sobre avida, sade e dignidade dos seres humanos, no teriam sua origem naessncia da tcnica, como diz Heidegger, mas seriam determinados

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    por um projeto civilizacional que depende da capacidade de inuen-ciar nos designs da tecnologia. Uma sociedade democrtica seria, es-tritamente falando, uma sociedade baseada na auto-organizao de-

    mocrtica na prpria esfera tcnica (CT, 2), medida que as escolhastecnolgicas respeitassem os diferentes interesses dos sujeitos humanose mesmo da natureza em geral. Democratizar a tcnica, nesse sentido,seria abrir as escolhas tcnicas para os interesses de classes e grupos so-ciais que tradicionalmente no participam dos espaos polticos ondetais decises so tomadas, evitando com isso o domnio tecnocrticoque marca, segundo o lsofo, as sociedades modernas.

    Feenberg enftico ao armar que

    [a] tecnologia uma das maiores fontes de poder nas sociedades mo-dernas. Quando as decises que afetam nosso dia a dia so discutidas,a democracia poltica inteiramente obscurecida pelo enorme poderexercido pelos senhores dos sistemas tcnicos: lderes de corporaes,militares e associaes prossionais de grupos, como mdicos e enge-nheiros. Eles possuem muito mais controle sobre os padres de cresci-mento urbano, o desenho das habitaes e dos sistemas de transporte, aseleo das inovaes, nossa experincia como empregados, pacientes econsumidores do que o conjunto de todas as instituies governamen-tais de nossa sociedade (RS, 1).

    Por isso, ao tentar reconstruir a ideia de socialismo6 a partirdas formulaes da teoria crtica, Feenberg analisa o confronto en-tre democracia e organizao tecnocrtica e capitalista da tecnologia,com o objetivo de comprovar a viabilidade e urgncia de insero

    de controles mais democrticos no mbito tecnolgico e, com isso,reformular a prpria tecnologia. Trata-se de submeter a tecnologiaao poder ( ao e aos interesses) dos seres humanos concretos e

    6 Feenberg (2012, p. 15) fala de sua obra como uma reviso utpica da ideia de socialismo, um modelo que pense uma

    ideologia democrtica que se contraponha tanto tecnocracia capitalista quanto burocracia comunista, vindo a incluir

    elementos novos da cultura moderna, como a igualdade racial e de gnero, a questo ambiental e a humanizao do

    processo de trabalho. Um socialismo, em todo caso, bastante distinto da experincia comunista da ex-Unio sovitica e de

    alguma forma mais prximo das teses marxianas (ainda que seja necessrio acrescentar que, tambm em relao a Marx,

    Feenberg parece manter uma atitude crtica).

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    histricos e de reconhecer a sua ambivalncia7do ponto de vista po-ltico (a depender das foras que a controlam) e de evitar, com isso,o determinismo tecnolgico que pretensamente medram nas leituras

    ontolgicas tanto de Heidegger quanto de Marcuse. A proposta deFeenberg seria, ento, chamada, por seu parentesco com a Escola deFrankfurt, de teoria crtica da tecnologia e tentaria reetir sobre no-vas teorias do desenho, ambivalncia e polticas da tcnica (TT, 108),partindo do pressuposto de que as tecnologias condensam funes

    tcnicas e sociais (TT, 108).Os arranjos tcnicos, assim, constituiriam um mundo que, ao

    evitar a neutralidade da pergunta sobre a essncia da tcnica, constri

    a possibilidade de pensar em mundos no plural, criados sob deter-minados interesses, dentro dos quais uem alguns aspectos e entre os

    quais nascem certas divergncias. Em resumo, o que Feenberg preten-de enfatizar a natureza essencialmente hierrquica da ao tcnica,a relao assimtrica entre ator e objeto que, quando alcanam grandesespaos das relaes humanas, tendem a criar um sistema distpico(CT, 4). Como resultado, temos um olhar sobre a tcnica a partir daposio do homem (enquanto seu produtor e gerente) no mundo. Issoporque, para o autor, os seres humanos s podem agir num sistemaa que eles mesmos pertenam (CT, 5) e no qual suas aes provocamrespostas contrrias. Mas a tcnica lida com a desproporo dessa rea-o e se congura de modo a reproduzir o domnio de poucos sobre

    muitos (CT, 5), o que signica que, ao pensar no apenas a tcnica

    7 A chamada teoria da ambivalncia em Feenberg difere do conceito que encontramos em Jonas. Se neste ltimo, ela est

    ligada ao problema tico da definio do bem e do mal dos instrumentos tcnicos, em Feenberg, ela compreendida doponto de vista poltico como uma possibilidade de se pensar esses instrumentos sempre em relao aos interesses que

    os controlam: ao identificar as matrias primas do socialismo entre as heranas do capitalismo, a teoria da ambivalncia

    resolve o dilema que ope realismo poltico e utopia. Reafirma a possibilidade de transitar do capitalismo ao socialismo

    (TT, 92). Em outras palavras, a teoria da ambivalncia possibilita a Feenberg pensar a tecnologia a partir dos interesses que

    a controlam e, sobretudo, pensar a possibilidade de que a mudana desses interesses no significa que a tecnologia, em

    si mesma, devesse ser negada. A tecnologia, em outras palavras, pode ser tanto capitalista quanto socialista. Tecnocracia

    ou democracia: depende de quem controla. O conceito, ento, aparece como fundamental para que Feenberg pense a

    possibilidade de uma transformao da tecnologia: dado que, no socialismo, so os trabalhadores os que mandam, estes

    podem mudar a natureza mesma da tecnologia, que, pela primeira vez na histria, compete a uma classe dominante

    interessada pela democracia em lugar do trabalho (TT, 92).

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    como poder, mas o poder da tcnica, Feenberg se confronta com ofato de que o poder da tcnica depende do poder dos gestores tc-nicos, os tecnocratas. Entendendo a tcnica como uma relao entre

    o operador e o objeto, Feenberg detecta o nascimento do poder nofato de que ambos sejam seres humanos, fazendo com que o podertecnolgico se torne, por essa relao, a forma bsica de poder nasociedade (CT, 5) uma concluso, alis, bastante aproximada da-quela expressa na citao de Hans Jonas que serviu de epgrafe a estetexto. Como relao de poder, a tcnica tambm evocaria resistnciasque seriam as vias de transformao democrtica a partir de baixo,capazes de reorientar radicalmente a tcnica, em benefcio das vidas

    humanas e da natureza em geral. A tecnologia seria, assim, social-mente relativa j que o resultado das escolhas tcnicas um mundoque sustenta a maneira de vida de um ou de outro inuente grupo

    social (CT, 8) e que se apresentariam na forma das chamadas ten-dncias tecnocrticas das sociedades modernas, ligadas inteno de

    limitar ou aprimorar a interferncia de grupos no designjunto aos pe-ritos tcnicos e s elites corporativas e polticas a que servem (CT, 8).

    Trata-se de compreender o poder da tcnica no mais a partir da suapretensa hegemonia8, mas do seu potencial democrtico.

    Ora, para Feenberg, pensar o desenho reconhecer que mqui-nas e artefatos envolvem valores (TT, 109), ou seja, so feitas a partirdaquilo que se deseja (no mbito psicolgico) ou se tem como bom (doponto de vista tico). Feenberg acentua esse aspecto que liga o desenhos escolhas humanas, citando Winograd e Flores: quando desenha-mos ferramentas, estamos desenhando modos de ser (apudTT, 170).

    Trata-se de uma perspectiva que v o desenho da mquina como umdesenho ontolgico que no s parte da escolha de coisas que nsqueremos ou podemos construir enquanto seres humanos, mas daqui-lo que ns queremos fazer e ser enquanto tais. A tecnologia se faz, as-sim, um assunto losco a respeito do eu.

    8 A hegemonia, de acordo com o modo como usaremos o termo, uma forma de dominao to profundamente arraigada na

    vida social que parece natural para aqueles a quem domina. Pode-se tambm defini-la como a configurao de poder social

    que tem a fora da cultura em sua base (RS, 9).

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    O problema em si mesmo no seria a tecnologia, portanto, maso modo como ela apropriada e usada e como seus instrumentos sodesenhados: o impacto social de uma tecnologia depende de como ela

    desenhada e usada (TT, 184). Para Feenberg a tecnologia, por si mes-ma, no determina uma forma particular de sociedade (TT, 207), masela deve ser pensada como um produto cultural, carregada de ameaase de potencialidades, dependendo dos interesses que orientam suasdecises. Como toda escolha, nesse campo tambm preciso lidar coma ambivalncia: preciso reconhecer que o bem e o mal dependem dopoder de controle. O que signica, logicamente, reconhecer a tambm

    uma positividade, j que a ambiguidade poltica da tecnologia faz ver

    que ela no apresenta um obstculo insupervel para perseguir valo-res humanistas (TT, 207). Isso signica que a tcnica, mesmo tendo

    permanecido refm dos interesses capitalistas, guarda ainda um po-tencial revolucionrio: no h nenhuma razo pela qual ela no possareconstruir-se com o m de adaptar-se aos valores de uma sociedade

    socialista (TT, 224), um sistema novo no qual no h necessidade dese trocar democracia por prosperidade (TT, 239).

    Trata-se de formular um novo cdigo tcnico9que represente aassiduidade do poder das classes menos favorecidas tradicionalmentesobre o mbito tcnico. Para Feenberg, um cdigo tcnico socialista seorientaria pela integrao dos contextos e das qualidades secundriastanto dos sujeitos como dos objetos da tcnica capitalista (TT, 285).Isso signica que o novo modelo orientador das escolhas tcnicas, se-gundo uma viso reformada do socialismo, deveria incluir aspectosecolgicos, mdicos, estticos, urbansticos e relativos democracia

    laboral, os quais so vistos pelas sociedades capitalistas e comunistascomo problemas, externalidades e crises (TT, 285). Alm disso,

    preciso incluir entre os objetivos da engenharia aspectos sanitrios e

    9 O conceito de cdigo tcnico (TT, 124) utilizado por Feenberg para relacionar as necessidades tcnicas e as necessidades

    sociais no mbito das decises tecnolgicas: trata-se de uma regra segundo a qual se fazem escolhas tcnicas com o fim de

    preservar a autonomia operacional (isto , a liberdade de realizar escolhas similares no futuro) (TT, 127). A tcnica, nesse

    caso, pensada em articulao com valores e com os argumentos ticos que vislumbram a possibilidade de uma reforma

    tecnolgica e social (CT, 8).

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    ambientais, bem como aes que favorecessem a democracia dos traba-lhadores envolvidos nos processos produtivos. Para o autor,

    isso pode ser alcanado mediante a multiplicao dos sistemas tcnicosque se pem em jogo no desenho, para levar em conta cada vez maiscaractersticas fundamentais do objeto da tecnologia, as necessidadesdos operadores, consumidores e clientes, e os requerimentos ambien-tais (TT, 285).

    Para tanto, seria necessrio abdicar da viso eciocntrica de

    poder, que vigora segundo o modelo capitalista, para incluir outrosvalores de cunho humano e ambiental. Se no modelo tecnocrtico, a

    tcnica estava limitada ao gerenciamento do sistema produtivo, quearticula produo, lucro, maquinaria e fora de trabalho, submetendo regra da tcnica o ambiente total da vida social (CT, 9), e gerando

    uma autonomia operacional, ou seja, um sistema no qual os agentesprodutivos esto plenamente livres para tomar decises independen-tes dos interesses dos agentes subordinados. A tcnica, nesse caso, nopode separar-se de uma viso de conjunto no que diz respeito aos in-teresses de todos os membros da comunidade da vida. Ao contrrio,a tecnocracia vigoraria como um espao de decises preservado daspresses pblicas, disposto ao sacrifcio de valores e ignorante quan-to s necessidades incompatveis com sua prpria reproduo e per-petuao de suas tradies tcnicas (CT, 9). Para o autor, a tecnocraciasequestra os interesses da democracia, ainda que esta ltima permane-a guardada, ainda, no mago da prpria tecnologia na forma de po-tenciais benefcios (CT, 10). Eis como a tcnica se liga diretamente ao

    poder: ao submeter os seres humanos ao controle tcnico s expensasdos modos tradicionais de vida, quando restringe grandemente a parti-cipao em seu design, a tecnocracia perpetua as estruturas de fora daelite herdadas do passado em formas tcnicas racionais (CT, 10). Umprocesso de danosa consequncia porque mutila no apenas os sereshumanos e a natureza, mas tambm a prpria tecnologia (CT, 10).

    Feenberg acredita que, diante desse cenrio, no bastariam refor-mas superciais. A tarefa mais complexa: preciso provocar mudan-as de rumo na prpria perspectiva do progresso, entendido no mais

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    como o agregado de uma na capa de tecnologia humanizada na su-perfcie de um mundo construdo, em todas as suas caractersticas fun-damentais, para a destruio do homem e da natureza (TT, 121). Isso

    signica que o projeto de democratizao da tecnologia demandaria oresgate dos valores excludos e sua concretizao em novos arranjostcnicos (CT, 10). Assim, s uma aliana tcnica constituda demo-craticamente levaria em considerao os efeitos destrutivos da tecno-logia sobre o ambiente natural, bem como sobre os seres humanos(CT, 11) e salvaria a tcnica de si mesma. Contra tais potencialidadesdestrutivas da tecnocracia capitalista preciso articular as chamadasresistncias microfsicas, que atuam no mundo ttico e prtico das

    camadas subordinadas. Um exemplo dado por Feenberg diz respeito poluio do ar10:

    Vejamos o exemplo da poluio do ar. Enquanto os responsveis porela puderam escapar das consequncias de suas aes sade em bair-ros arborizados, deixando que os pobres habitantes urbanos respiras-sem o ar sujo, houve pouco apoio para solues tcnicas ao problema.Os controles antipoluio eram vistos como custosos e improdutivos

    para os detentores do poder de implement-los. Com o tempo, um pro-cesso poltico democrtico incendiou-se pela expanso do problema,acompanhado de protestos pelas vtimas, e seus advogados legtimosderam corpo aos interesses das vtimas. Somente ento foi possvelconstituir uma temtica social que inclua tanto os ricos quanto os po-bres para fazer as necessrias reformas. Essa temtica nalmente forou

    um novo designdo automvel e de outras fontes de poluio que levas-sem a sade humana em considerao. Eis um exemplo de poltica dodesignholstico que acabar por nos conduzir a um sistema tecnolgico

    mais holstico (CT, 11).

    Nesse caso, os interesses gerais da comunidade da vida, expres-sados nas preocupaes ambientais e nas resistncias que elas promo-vem no mbito social provocaram uma alterao nas escolhas tcnicas.

    10 Outros exemplos usados por Feenberg so o do aparelho francs Minitel (Teletel), a prpria Internet, as leis contra o trabalho

    infantil e a participao de pacientes nos testes de drogas contra a aids. A resistncia do movimento ambiental, entretanto,

    considerada pelo autor como o mais importante domnio de interveno democrtica na tecnologia (QT, 93).

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    A tecnologia, assim, assumiu o seu papel no mundo da poltica, me-dida que se deixou transpassar pelos interesses que no so apenasaqueles da ecincia, da produo e do lucro. Com a ideia de cdigo

    tcnico, Feenberg fornece a possibilidade de pensarmos um poder ca-paz de orientar as escolhas tcnicas, negando a neutralidade e o de-terminismo e reconhecendo a existncia de potencialidades tcnicassubordinadas aos interesses humanos ou, em outras palavras, demo-cratizando a tcnica por meio de uma democratizao do poder.

    Recusando um modelo ingenuamente utpico de socialismo,Feenberg pensa esse processo sob trs aspectos: uma socializaodosmeios de produo apoiada numa substituio do planejamento em

    funo menos do mercado e mais da cultura; uma democratizaome-diante a eliminao das amplas iniquidades polticas, sociais e econ-micas; e uma inovaoque supere a diviso entre trabalho manual eintelectual e redesenhe os produtos da tecnologia. O enfoque , obvia-mente, o controle democrtico das instituies mediadas tecnicamente(TT, 234), algo considerado como a condio sine qua nonpara a mu-dana no rumo do progresso tecnolgico. Trata-se, mais uma vez, deum controle poltico do poder tcnico.

    Consideraes finais

    A aproximao de autores to distintos quanto Jonas e Feenbergpode ser uma tarefa tanto temerria quanto conveniente, na medida emque o encontro de ideias segue o requisito do enriquecimento mtuo,

    ainda mais quando as diferenas no so divergncias mas, ao contr-rio, constituem-se como suplementos de uma mesma tarefa losca.

    As preocupaes de Jonas, com forte apelo tico e rotuladas pela ideiade distopia, tentam mostrar como o empreendimento tcnico perdeuem nobreza quando se reduziu viso utilitarista do conhecimento,

    abrindo as feridas da sndrome tecnolgica que marca a sociedade oci-dental desde o sculo XVII, elevando o homo faber a modelo essencialde interpretao do ser humano e, portanto, reduzindo-o a uma fun-o da prpria tcnica. Eis o desao moral da tecnologia moderna

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    (GUCHET, 2014, p. 79), cujo principal elemento a ameaa ao mbitoda vida em geral: porque a vida frgil, a tcnica nasce como resposta

    incompletude e nitude, atingindo, nessa tarefa, uma magnitude no

    apenas por seu potencial ameaador ou catastrco, mas tambm porsua caracterstica ontolgica, ou seja, por seus benefcios em relao preservao da vida. Isso signica, como bem notou Xavier Guchet

    (2014, p. 89), que a tcnica no somente se ope vida, mas tambm

    deve ser entendida como parte da estratgia dos viventes. Para que ofenmeno seja pensado do ponto de vista tico e poltico, portanto, preciso reconhecer sua importncia ontolgica. Comopoder, a tcnica tambm um poder ontolgico e, porque assim, torna-se uma questo

    tica e poltica de primeira grandeza.Feenberg, por sua vez, ao pensar a questo da tecnologia, pro-

    longa o vis crtico da Escola de Frankfurt e, como vimos, pressupeque o projeto tecnolgico uma das marcas centrais da vida socialmoderna, cujo resultado contribui para o aumento da injustia social,dado que atende unicamente aos interesses dos tecnocratas (ou, naspalavras do autor, de uma racionalidade poltica), algo que, anal, po-deria ser evitado caso as resistncias democrticas ocorressem de for-ma mais efetiva na sociedade, como o caso de vrios movimentosculturais que modicaram aquela racionalidade tecnocrata exigindo--lhe avanos democrticos por meio da incluso de interesses e valo-res dos grupos tradicionalmente excludos para o que o movimentoambiental se apresenta como um dos exemplos mais evidentes. A lei-tura de Feenberg a respeito do fenmeno tcnico, como pretendemoster demonstrado, est amparada na convico de que ele representa a

    principal forma de poder na sociedade moderna, vindo a substituir asformas antigas de legitimidade, como o sangue, e mesmo a religio.Porque sabe que os objetos tecnolgicos so tambm objetos polticose sociais, porque sabe que eles traduzem interesses e desejos pessoaise coletivos, Feenberg tratou de esboar um cdigo tcnico que incluaaqueles interesses sociais que ultrapassam o limite da ecincia e do

    propsito monetrio.Por tratarem a tcnica como um poder e por analisarem criti-

    camente o poder da tcnica, propondo regras ticas e polticas de um

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    poder sobre o poderda tcnica, Jonas e Feenberg apresentam-se comoautores de indiscutvel relevncia para tratar esse que , sem dvida,um dos fenmenos mais caractersticos da vida moderna, para o qual a

    losoa contempornea no pode dar de ombros.

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