Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o...

65

Transcript of Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o...

Page 1: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.
Page 2: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

2

NeuroAtual Volume 2, número 6, 2006

NEUROLOGIA GERAL Dr. Osvaldo M. Takayanagui

Psychotropic effects of antiepileptic drugs. Ettinger AB. Neurology, 67: 1916, 2006.

Os pacientes com epilepsia apresentam, com freqüência, distúrbios do humor, tais como

depressão, ansiedade, sintomas bipolares e comportamento agressivo. Como as drogas

antiepilépticas (DAE) podem afetar esses sintomas, é fundamental o conhecimento sobre

suas propriedades psicotrópicas.

Os autores analisaram os trabalhos publicados na literatura sobre o assunto, procurando

identificar relatos relevantes do efeito das DAE sobre os distúrbios do humor.

Benzodiazepínicos

Os benzodiazepínicos são comumente usados no tratamento agudo da exacerbação de

crises ou do estado de mal, mas não de forma contínua, por causa de reações colaterais,

tolerância e disponibilidade. Embora sejam prescritos por suas propriedades sedativas e

ansiolíticas, os benzodiazepínicos podem acarretar uma síndrome paradoxal de desinibição

caracterizada por agitação, agressividade, irritabilidade e hiperatividade.

Fenitoína

Um estudo antigo alertava para a noção da relação entre a fenitoína e sintomas depressivos.

Adicionalmente, a fenitoína poderia desencadear os desastrosos efeitos cosméticos. Têm

sido também relatadas outras reações como sedação e delírio, encefalopatia crônica e

psicose. O uso de fenitoína no tratamento de doença bipolar foi avaliado apenas

recentemente, em especial em ensaios controlados na fase aguda de mania bipolar, no

tratamento de manutenção de doenças bipolares e mesmo na depressão maior ou agressão

impulsiva. Embora alguns estudos randomizados sugiram possível estabilização do humor,

os dados são por demais preliminares para que a fenitoína possa ser recomendada para esse

fim.

Barbitúricos

Page 3: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

3

A escolha de um barbitúrico como medicamento de primeira escolha, simplesmente porque

o clínico está familiarizado com seu uso, deve ser desencorajada, pois esse medicamento

está associado a uma taxa elevada de depressão ou mesmo de ideação suicida

(principalmente nos indivíduos com história familiar de depressão). Embora os barbitúricos

sejam freqüentemente considerados sedativos, podem causar uma síndrome de desinibição,

caracterizada por hiperatividade, comportamento agressivo e impulsividade, mesmo em

baixas doses.

Carbamazepina

Esta substância é tida como estabilizador do humor em pacientes com epilepsia, mas não é

considerada um antidepressivo, apesar de sua semelhança estrutural com os antidepressivos

tricíclicos. O atributo de estabilizador do humor é baseado na observação habitual da

mudança do humor com a suspensão do medicamento nos pacientes com epilepsia, nos

relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu

efeito antimaníaco na doença bipolar. Entretanto, inexistem avaliações sistematizadas da

carbamazepina nos pacientes com epilepsia e distúrbios do humor. Os estudos deste

medicamento na população psiquiátrica sugerem uma genuína propriedade de estabilização

do humor, que pode ter implicações também para os pacientes com epilepsia. Contudo, não

parece haver um efeito antidepressivo direto.

Valproato

Embora a literatura psiquiátrica esteja repleta de estudos das propriedades psicotrópicas do

valproato (divalproex), são escassos os ensaios controlados sobre seus efeitos psicotrópicos

nos pacientes com epilepsia. É considerado um agente de primeira linha para o tratamento

de mania aguda. Há dados apontando um potencial benefício como estabilizador do humor.

Gabapentina

Têm sido relatos os efeitos de melhora do humor com gabapentina. Entretanto, têm sido

descritos casos de comportamentos aberrantes e agressivos em crianças e em pacientes

incapacitados.

Embora a gabapentina tenha sido considerada potencialmente útil no tratamento de

distúrbio bipolar, os estudos randomizados não confirmaram sua utilidade nessa condição.

Portanto, é improvável que a gabapentina exerça qualquer ação antidepressiva ou de

estabilizador do humor na epilepsia. Entretanto, suas características ansiolíticas podem ser

úteis nos pacientes com epilepsia com acentuada ansiedade.

Page 4: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

4

Lamotrigina

Numa meta-análise de 2005, a avaliação da qualidade de vida através de escalas validadas,

particularmente as relacionadas com humor e cognição, foi melhor com a lamotrigina do

que com outras DAE ou placebo.

A lamotrigina é uma das novas drogas bem estudadas no tratamento de distúrbio bipolar.

As evidências sugerem efeitos de estabilização do humor e possivelmente antidepressivos

na população com epilepsia. Estas propriedades tornam a lamotrigina especialmente útil

nos casos freqüentes de co-morbidades psiquiátricas.

Levetiracetam

Levetiracetam é geralmente bem tolerado. Entretanto, deve ser empregado com cautela em

pacientes com depressão subjacente ou ansiedade pois estas podem ser fortemente

exacerbadas. Os dados existentes sobre possíveis efeitos antimaníacos ou ansiolíticos são

inadequados para qualquer tipo de recomendação.

Oxcarbazepina

A oxcarbazepina, por sua relação estrutural com a carbamazepina, poderia apresentar

propriedades psicotrópicas positivas. Entretanto, há escassez de estudos específicos quer na

epilepsia quer na doença psiquiátrica. Pode ter ação de estabilizador do humor em

pacientes com epilepsia, mas os dados são insuficientes para qualquer conclusão.

Pregabalin

Considerando a similaridade da estrutura química, é provável que pregabalin tenha ação

psicotrópica semelhante a gabapentina nos pacientes com epilepsia, com efeito nos

sintomas ansiolíticos.

Topiramato

É uma DAE com características positivas como eficácia de amplo espectro e redutor de

peso. Entretanto, tem obtido notoriedade por induzir lentidão psicomotora, dificuldade na

expressão de palavras ou de pensamentos, sintomas depressivos com ou sem déficit

cognitivo. Têm sido relatados casos de desencadeamento de sintomas psicóticos (intensa

agitação psicomotora, agressividade, alucinações visuais e auditivas, ilusões místicas) em

alguns pacientes com epilepsia.

Tiagabina

Há muitos poucos estudos sobre os efeitos psicotrópicos da tiagabina e seu potencial efeito

ansiolítico requer estudos futuros.

Page 5: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

5

Zonisamide

Há escassez de informações sobre os efeitos psicotrópicos de zonisamide em pacientes

com epilepsia, embora haja alguns relatos anedóticos da ocorrência de reações adversas no

comportamento e no humor, com descrição de casos esporádicos de psicose.

Conclusões

O conhecimento dos efeitos psicotrópicos das DAE é fundamental mas ainda muito restrito

na população epiléptica, necessitando de ensaios duplo-cegos, randomizados.

Carbamazepina, valproato, lamotrigina e, possivelmente, oxcarbazepina podem atuar como

estabilizadores do humor. Gabapentina, pregabalin e tiagabalina podem ser benéficos como

ansiolíticos. Há riscos de depressão com barbitúricos e topiramato, e possivelmente,

fenitoína. A depressão subjacente e sintomas de ansiedade podem ser exacerbados com

levetiracetam e sintomas psicóticos têm sido descritos com topiramato, levetiracetam e

zonisamide.

The HTLV-1 neurological complex. Araújo AQC et al. Lancet Neurol, 5: 1068, 2006.

Estima-se que 20 milhões de pessoas estejam infectadas pelo HTLV-1. Embora a

maioria desses indivíduos permaneça assintomática, cerca de 2% a 5% irão desenvolver

uma encefalomielopatia crônica ou Mielopatia Associada ao HTLV-1/Paraparesia

Espástica Tropical (HAM/TSP). Neste artigo, os autores destacam que uma diversidade de

síndromes neurológicas pode estar relacionada ao HTLV, constituindo um verdadeiro

complexo neurológico associado ao HTLV-1.

HAM/TSP

HAM/TSP é a manifestação neurológica mais freqüente da infecção pelo HTLV-1.

É caracterizada clinicamente por paraparesia espástica lentamente progressiva, distúrbios

vesicais neurogênicos e discreta sintomatologia sensitiva. O desenvolvimento da

incapacidade neurológica ocorre tipicamente durante o primeiro ou segundo ano da

evolução, o que sugere um possível período inflamatório inicial, seguido de um estágio

degenerativo. A progressão é mais acelerada na mulher que no homem; esta diferença é

mais marcante naquela cujo quadro tenha surgido antes da menopausa. A explicação não

Page 6: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

6

está clara, mas resulta possivelmente do fator hormonal. A carga proviral é outro fator que

parece afetar a velocidade de progressão.

Em cerca de 60% dos pacientes com HAM/TSP o primeiro sintoma é a diminuição

de força dos membros inferiores. Durante a evolução, a disfunção vesical é freqüente, com

urgência, incontinência ou retenção urinária. Em alguns casos, os distúrbios urinários

precedem a instalação da paraparesia, até por vários anos. Outras queixas freqüentemente

encontradas são: constipação intestinal, dor lombar, parestesias nos membros inferiores e

síndrome de Sjögren. O exame neurológico revela paraparesia crural espástica,

hiperreflexia e resposta plantar em extensão. Embora a força muscular esteja preservada

nos membros superiores, os reflexos profundos tendem a ser exacerbados.

HAM/TSP pode também estar associada a outras manifestações sistêmicas como

alveolite pulmonar, uveíte, artrite, dermatite, síndrome de Sjögren, doença de Behçet,

distúrbio tireoidiano, entre outras. A concomitância de leucemia ou linfoma de células T do

adulto com HAM/TSP num mesmo indivíduo tem sido relatada de forma crescente.

As principais doenças neurológicas que podem ser confundidas com HAM/TSP

são: a forma medular da esclerose múltipla, mielopatia vacuolar da aids, paraparesia

espástica familial, esclerose lateral primária, compressões medulares, deficiência de

vitamina B12, latirismo, neuroesquistossomose, doença de Lyme e sífilis.

São observadas diversas alterações laboratoriais sistêmicas nos pacientes com

HAM/TSP, tais como a presença de linfócitos atípicos no sangue periférico, as assim

denominadas “flower cells”, hipergamaglobulinemia, aumento de β2-microglobulina e da

proporção de células CD4+. As principais anormalidades do LCR são pleocitose moderada

e hiperproteinorraquia, tipicamente observadas nos primeiros anos da doença, com

tendência ao desaparecimento. Têm sido descritos também bandas oligoclonais, elevação

da concentração de citocinas, como neopterina, TNF-α, IL-6, IL-γ e síntese intratecal de

anticorpos específicos contra HTLV-1. Alguns pesquisadores ressaltam que a

quantificação simultânea da carga proviral de HTLV-1 no sangue e no LCR possa auxiliar

na distinção entre portadores assintomáticos e pacientes com HAM/TSP.

Tem sido descrita a presença de lesões na substância branca cerebral e de

anormalidades na medula espinhal nos pacientes com HAM/TSP. Há também relatos da

presença de edema da medula nas fases iniciais da doença, indicando um processo

inflamatório em atividade.

Page 7: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

7

Tratamento

Até o momento inexiste um tratamento definitivo de HAM/TSP. A maioria dos

estudos avaliando a terapêutica não segue uma metodologia adequada do tipo duplo cego e

controlado com placebo. De fato, o interferon-α foi a única droga avaliada através de

ensaio randomizado, duplo-cego e controlado e que se mostrou eficaz na dose de 3 milhões

de unidade ao dia, por via subcutânea. Entretanto, este estudo apresenta a limitação do

curto período de seguimento (apenas 4 semanas). Inúmeros outros tratamentos têm sido

testados: esteróides, azatioprina, vitamina C, pentoxifilina, danazol, plasmaferese, entre

outros. Contudo, seus benefícios são especulativos pelo fato dos estudos não terem sido

controlados. No momento, os esteróides são ainda os medicamentos mais comumente

utilizados. Considerando o possível mecanismo imunopatogênico envolvido em

HAM/TSP, poder-se-ia supor que os tratamentos imunomoduladores sejam úteis,

particularmente se empregados precocemente. Assim, os medicamentos anti-inflamatórios

ou imunomoduladores, tais como esteróides, interferon-α, ciclosporina e azatioprina,

podem ser utilizados em pacientes selecionados. Estas drogas podem ser benéficas

particularmente nos pacientes nos 2 primeiros anos da doença, ou naqueles com sinais

evidentes de inflamação em atividade no LCR ou na Ressonância Magnética.

As inúmeras investigações de drogas antiretrovirais não demonstraram efeito

benéfico, mesmo com o emprego de inibidores da protease (indinavir, saquinavir, ritonavir

e nelfinavir).

O tratamento sintomático é ainda a principal conduta nos pacientes com HAM/TSP.

Medicamentos antiespásticos, analgésicos, drogas para bexiga neurogênica e laxantes,

além de um bom programa de reabilitação são opções úteis no tratamento.

As maiores complicações nos pacientes confinados à cadeira de rodas são aquelas

associadas com o distúrbio vesical (infecção do trato urinário, hidronefrose), constipação

crônica, úlceras de decúbito e trombose venosa. O HTLV-1 pode comprometer

seletivamente a resposta imunológica no controle de estrongiloidíase, o que pode explicar a

ocorrência de sua forma disseminada nos pacientes com HAM/TSP.

A co-infecção HIV-HTLV pode também aumentar o risco do desenvolvimento de

HAM/TSP.

Miopatia pelo HTLV-1

Page 8: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

8

Embora haja descrição de algumas miopatias com HTLV-1, a maioria dos casos é

associada com HAM/TSP. Assim, o diagnóstico de miopatia inflamatória deve ser

considerado caso um paciente com HAM/TSP comece a apresentar um novo padrão de

fraqueza muscular (mais proximal), mialgias e elevada concentração de creatina quinase. A

biopsia muscular pode revelar um infiltrato inflamatório mononuclear, variação de

dimensão de fibras e evidências de regeneração.

Polineuropatia pelo HTLV-1

As neuropatias periféricas têm sido consistentemente descritas com HAM/TSP. Num

estudo caso-controle de doadores sanguíneos, a polineuropatia foi constatada em 8,6% dos

indivíduos soropositivos e em apenas 2,6% dos soronegativos. A polineuropatia é

caracterizada por parestesias, sensações de queimação e hipoestesia distal com distribuição

em luva e em bota, geralmente com abolição do reflexo aquiliano.

Doença do Neurônio Motor pelo HTLV-1

Tem sido descrito um quadro de síndrome similar à esclerose lateral amiotrófica em alguns

pacientes com infecção pelo HTLV-1.

Déficit cognitivo

Os autores do presente artigo constataram déficit cognitivo em pacientes com HAM/TSP

mas também em indivíduos assintomáticos infectados pelo HTLV-1 em relação a sujeitos

não infectados.

Disautonomia

A disautonomia é um achado freqüente nos pacientes com HAM/TSP, predominantemente

com comprometimento do sistema nervoso simpático. Essas alterações são caracterizadas

principalmente pelo envolvimento cardiovascular e controle da sudorese. A hipotensão

postural é uma anormalidade freqüente e deve ser sempre investigada e tratada.

Outras manifestações neurológicas

Podem surgir algumas anormalidades oftalmológicas como uveíte, neurite e atrofia óptica,

queratite intersticial, queratoconjutivite seca, entre outras.

Há uma série de outras doenças neurológicas descritas em associação à infecção pelo

HTLV-1, embora seja por vezes difícil o estabelecimento causal pois essas condições

poderiam ser fortuitas. Isto é provavelmente o caso de algumas descrições de

encefalomielite disseminada aguda ou de leucoencefalite. De qualquer modo, a prevalência

de anormalidades da substância branca na Ressonância Magnética é significativamente

Page 9: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

9

superior nos pacientes com HAM/TSP (66%) que nos controles normais (23%) e naqueles

com paraparesia espástica soronegativos para HTLV-1 (11%). Outra associação de difícil

comprovação é a ataxia cerebelar, descrita mais comumente em pacientes infectados pelo

HTLV-1.

Conclusão

Os autores propõem que o complexo neurológico do HTLV-1 possa ser comparado a um

iceberg em que HAM/TSP seria apenas a parte mais visível do complexo, havendo um

amplo espectro de manifestações neurológicas menos perceptíveis.

Natural history of Human T-Lymphotropic Vírus 1-Associated Myelopathy. A 14-

year follow-up study. Olindo S et al. Arch Neurol, 63: 1560, 2006.

Acredita-se que o risco cumulativo de um portador de HTLV-1 desenvolver HAM/TSP

seja de 2%. Entretanto, a progressão da incapacidade neurológica é pobremente

compreendida e permanece indefinida, havendo a idéia de que a evolução neurológica

ocorra principalmente no primeiro ano da doença, passando a ser então estável. Os autores

realizaram este estudo com a finalidade de avaliar a incapacidade motora nos pacientes

com HAM/TSP numa coorte de 123 pacientes seguidos de 1990 a 2004. Os autores

analisaram o período de tempo decorrido entre o início da doença e os 4 desfechos

estabelecidos na escala de Kurtzke (DSS): os escores 6 (assistência unilateral), 6,5

(assistência bilateral), 8 ( confinamento a cadeira de rodas) e 10 (morte em decorrência da

doença), empregando o método de Kaplan-Meier, as análises uni e multivariada para

identificar as variáveis relacionadas à velocidade de progressão para atingir o escore 8 da

DSS e determinação da carga proviral de HTLV-1.

As medianas de progressão do início da doença até os escores 6, 6,5 e 8 foram 6, 13 e 21

anos, respectivamente. A mediana para progressão do escore 6 para o 8 foi de 8 anos. O

escore 10 (morte) ocorreu em ¼ dos casos dentro de 20 anos. A idade de início igual ou

superior a 50 anos e carga proviral de HTLV-1 elevada foram associadas com um intervalo

mais curto de tempo para atingir o escore 8. Uma progressão mais rápida para atingir o

escore 6 esteve relacionada com confinamento mais precoce à cadeira de rodas (escore 8).

Este achado não confirma a idéia existente de uma progressão mais rápida na fase inicial

Page 10: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

10

da doença; pelo contrário, indica que o déficit motor progride durante todo o período

evolutivo.

Pitfalls in the diagnosis of brain tumors. Omuro AMP et al. Lancet Neurol, 5: 937, 2006.

O estabelecimento do diagnóstico de tumor cerebral nem sempre é um processo simples.

Muitas doenças neurológicas não neoplásicas podem mimetizar tumores do SNC nos

exames de neuroimagem ou mesmo na avaliação histológica, incluindo esclerose múltipla,

AVC, abscesso piogênico, toxoplasmose, tuberculose, cisticercose, infecções fúngicas,

sífilis, sarcoidose, doença de Behçet e outras.

Elementos que podem sugerir um diagnóstico não neoplásico

Início em adultos jovens (aids e outras doenças inflamatórias)

Viagem a países endêmicos em doenças infecciosas (cisticercose, hidatidose, amebíase)

Comportamento sexual de risco (aids, sífilis)

Dependência de drogas EV (aids, sífilis, abscesso cerebral)

Antecedentes de contato com tuberculose

Antecedentes pessoais ou familiares de doenças autoimunes/inflamatórias (esclerose

múltipla, Behçet, sarcoidose)

Febre crônica, intervenção dentária recente ou infecção ouvido/nariz/garganta (abscesso

cerebral)

Imunosupressão, incluindo diabete (infecções oportunistas)

História de déficits neurológicos tênues ou transitórios, incluindo sintomas visuais

transitórios (esclerose múltipla)

Presença ou história de úlceras orais ou genitais (Behçet, sífilis) e uveíte (Behçet)

Abscesso dentário (abscesso cerebral); candidíase oral (aids, imunosupressão)

Rash cutâneo (Behçet, sarcoidose, aids)

Anormalidades na tomografia de outros órgãos (sarcoidose, tuberculose, infecções

fúngicas, cisticercose)

Bom controle da câncer sistêmico e ausência de metástase pulmonar (fala contra metástase

cerebral em pacientes com história de câncer)

Page 11: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

11

O primeiro passo para se evitar erros diagnósticos é a revisão cuidadosa de todas as

seqüências de Ressonância Magnética, eventualmente complementada com métodos

alternativos, tais como a espectroscopia, além de SPECT e PET.

A biopsia ou a ressecção cirúrgica é indicada sempre que o diagnóstico de neoplasia

cerebral não puder ser excluído com segurança. Em contrapartida, é perfeitamente

aceitável o início do tratamento específico anti-cancer com base nos achados de

neuroimagem mesmo sem confirmação histológica naqueles pacientes em que há contra-

indicação de cirurgia, como nos idosos com múltiplas comorbidades ou naqueles em que o

tumor apresenta localização de difícil acesso, como no tronco encefálico.

A obtenção do tecido nem sempre representa uma garantia de esclarecimento diagnóstico,

pois podem ocorrer erros na coleta ou interpretação incorreta dos achados. Por exemplo, a

biopsia estereotáxica fornece material em quantidade exígua e, por vezes, a análise

histológica evidencia apenas anormalidades inespecíficas, como gliose ou necrose. A

análise de todo o bloco de parafina poderia revelar aspectos histológicos importantes mas,

mesmo assim, os achados podem ser insuficientes para preencher todos os critérios

diagnósticos de uma determinada doença. Nessa situação, o patologista terá de optar entre

a liberação de um relato sem definição ou de um diagnóstico meramente provável, apesar

da ausência de todos os critérios. Portanto, é recomendável que o médico assistente leia

atentamente toda a descrição do relatório e não fique restrito apenas às conclusões.

EFNS guideline on neuroimaging in acute stroke, Report of an EFNS task force.

Masdeu JC et al. Eur J Neurol, 13: 1271, 2006.

Os exames de neuroimagem são necessários para a avaliação de acidente cerebrovascular,

umas das principais causas de letalidade e de incapacidade neurológica. A multiplicidade

de técnicas disponíveis tem aumentado a complexidade na tomada de decisão pelos

médicos. Os autores apresentam uma revisão da literatura no período de 1965 a 2005

avaliando criticamente as publicações relevantes. Os membros da força tarefa da European

Federation of Neurological Societies (EFNS) debateram objetivando um consenso de

recomendações estratificadas. A tomografia computadorizada sem contraste foi

estabelecida como o procedimento de imagem para a avaliação inicial de pacientes com

Page 12: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

12

acidente vascular cerebral. Entretanto, a ressonância magnética apresenta maior

sensibilidade que a tomografia na demonstração de áreas infartadas ou isquemiadas e

mostra bem hemorragia intracerebral aguda ou crônica. A ressonância por difusão ou

perfusão e a angiorressonância são muito úteis na avaliação de pacientes com acidente

vascular isquêmico agudo. A ressonância e a angiorressonância são as técnicas

recomendadas para a investigação de aneurisma cerebral e para o diagnóstico de trombose

venosa cerebral e dissecção arterial. Para o estudo não invasivo de vasos extracranianos a

angiorressonância é menos portátil e mais oneroso que a ultrassonografia, mas apresenta

maior sensibilidade e especificidade para estenose carotídea. O doppler transcraniano é

muito útil para monitorar a reperfusão arterial após trombólise, para o diagnóstico de

estenose intracraniana e de shunt direito-esquerdo e para monitorar o vasoespasmo após

hemorragia subaracnóide. No momento, o SPECT e o PET têm papel mais limitado na

avaliação de pacientes com acidente vascular cerebral agudo.

Imaging of acute stroke. Muir KW et al. Lancet Neurol, 5: 755, 2006.

É um excelente artigo de revisão sobre os achados de neuroimagem nas primeiras horas da

isquemia cerebral, discutindo as vantagens e limitações da tomografia computadorizada em

relação à ressonância magnética, particularmente por difusão. Os autores debatem o papel

dos exames na detecção de anormalidades precoces da isquemia, de hemorragia, o sinal de

hipendensidade da artéria cerebral média e a área de penumbra, focalizando o tratamento

trombolítico.

Prevention of deep venous thrombosis and pulmonary embolism following stroke: a

systematic review of published articles. André C. et al. Eur J Neurol, in press.

É uma revisão sistemática sobre a profilaxia de tromboembolismo venoso após acidente

vascular cerebral (AVC) isquêmico ou hemorrágico. Analisando as principais publicações,

concluem os autores que a heparina não fracionada e a de baixo peso molecular são ambas

parcialmente eficazes na profilaxia de tromboembolismo após AVC isquêmico e devem ser

Page 13: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

13

rotineiramente utilizadas nos pacientes com déficit motor e mobilidade reduzida e que não

tenham contra-indicações. A redução de trombose venosa profunda está melhor

estabelecida que o efeito sobre a embolia pulmonar. Não há evidências apontando

benefícios de métodos mecânicos ou do uso de dextran. A aspirina pode ter um efeito

protetor leve. Não é possível definir recomendações no AVC hemorrágico, mas a

compressão pneumática intermitente merece investigação futura. Há sérias limitações das

estratégias atuais na prevenção de tromboembolismo venoso após AVC e inúmeras

questões permanecem ainda sem esclarecimento.

The mystery of motor asymmetry in Parkinson’s disease. Djaldetti R et al. Lancet

Neurol, 5: 796, 2006.

O quadro clínico da doença de Parkinson é caracterizado por substancial assimetria com

surgimento unilateral de tremor, rigidez e bradicinesia. De fato, uma das definições do

estágio inicial da doença é a unilateralidade, com ou sem envolvimento axial. Esta

característica unilateral é tão evidente que serve de parâmetro clínico na diferenciação da

doença com outras síndromes parkinsonianas neurodegenerativas. Na atrofia de múltiplos

sistemas, na doença de corpos de Lewy e na paralisia supranuclear progressiva não há

predominância lateral do comprometimento, embora possa ocasionalmente haver

apresentação unilateral. Apesar do amplo reconhecimento da assimetria na doença de

Parkinson, são escassas as tentativas de explicação do fenômeno.

Possíveis explicações

Os sinais e sintomas motores surgem após perda de 50% a 70% dos neurônios nigrais.

Entretanto, apenas um estudo necroscópico de 21 pacientes com doença de Parkinson

avaliou a assimetria de extensão da degeneração da substância nigra, mostrando maior

perda neuronal contralateral ao lado inicialmente mais afetado, fornecendo uma

confirmação patológica para a predominância lateralizada das manifestações motoras.

Uma possível explicação é que haveria variações inatas no número de neurônios

dopaminérgicos nigrais. Por conseqüência, o número de neurônios nigrais de um lado seria

menor de um lado em relação ao outro. O processo degenerativo de uma doença afetando

igualmente ambos os lados faria com que o lado com menor número de neurônios atinja o

Page 14: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

14

ponto crítico de vulnerabilidade mais precocemente. Os trabalhos de contagem celular de

neurônios dopaminérgicos em ambos os lados de indivíduos normais poderiam confirmar

ou excluir essa possibilidade. Entretanto, não há dados adequados na literatura para tal

esclarecimento.

A segunda possibilidade teórica envolve a idéia de que, por alguma razão, a substância

negra de um lado seria mais vulnerável que o outro a um processo degenerativo. Não há,

contudo, qualquer evidência patológica consistente para apoiar essa hipótese.

O comprometimento nigral na doença de Parkinson é acompanhado pelo envolvimento de

outras estruturas no tronco encefálico e no neocórtex. A ampla patologia extra-nigral

poderia sugerir que, ao invés da vulnerabilidade nigral, haveria variações nos outros

compartimentos do SNC, tais como no número de receptores dopaminérgicos pós-

sinápticos estriatais ou conecções corticais. Faltam, no entanto, provas a favor dessa

possibilidade.

Os estudos em gêmeos univitelinos afetados pela doença de Parkinson mostram que nem

sempre há concordância do lado afetado e que a distribuição é mais ao acaso e não

geneticamente determinada. Da mesma forma, os exercícios, a dominância na lateralidade

das mãos e os fatores ambientais não são suficientes como explicações alternativas.

Em conclusão, a assimetria da doença de Parkinson é meramente fortuita e não é

determinada por fatores genéticos, ambientais, estruturais ou neuroquímicos.

Dexamethasone and long-term outcome in adults with bacterial meningitis. Weisfelt

M et al. Ann Neurol, 60: 456, 2006.

O estudo anterior randomizado, controlado com placebo envolvendo 301 adultos com

suspeita de meningite bacteriana mostrou que a administração de dexametasona

concomitantemente com a primeira dose de antibióticos reduziu o risco de desfecho

desfavorável de 25% para 15% e da mortalidade de 15% para 7%. Desde então, a

corticoterapia tem sido rotineiramente associada aos antibióticos no tratamento de

meningite bacteriana em adultos. Entretanto, como os corticosteróides podem prejudicar a

capacidade cognitiva, como mostram alguns trabalhos experimentais, este estudo objetivou

a investigação de potenciais efeitos danosos da dexametasona nos pacientes que tiveram

Page 15: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

15

meningite pneumocócica ou meningocócica, através dos exames neurológico, audiológico

e psicológico.

Foram incluídos 87 pacientes, 46 deles tratados com dexametasona e 41 com placebo. A

avaliação foi realizada com uma mediana de 99 meses após a meningite.

A avaliação neuropsicológica não mostrou diferenças significativas entre os pacientes

tratados com dexametasona ou placebo. A proporção de pacientes com persistência de

seqüelas neurológicas e de perda auditiva foi similar em ambos os grupos. O total de

disfunção cognitiva não diferiu significativamente nos 2 grupos, embora os pacientes que

tiveram meningite pneumocócica apresentassem maior grau de comprometimento

cognitivo e das atividades diárias do que aqueles com meningite meningocócica.

Concluem os autores que o tratamento associado de corticosteróides não resulta em maior

risco de comprometimento cognitivo a longo prazo.

Clinical value of botulinum toxin in neurological indications. Ward AB et al. Eur J

Neurol, 13 (suppl. 4): 20, 2006.

A toxina botulínica do tipo A evita a liberação de acetilcolina nas junções colinérgicas

acarretando fraqueza muscular transitória por 3 a 4 meses. É amplamente utilizada no

tratamento de uma grande variedade de doenças clínicas caracterizadas por hiperatividade

muscular. A toxina botulínica é eficaz na terapêutica de várias condições neurológicas, em

particular os distúrbios do movimento (por exemplo blefaroespamo, distonia cervical,

distonia laríngea, espasmo hemifacial, tiques focais, tremor e outras doenças

hipercinéticas). Na espasticidade, a toxina botulínica pode melhorar a mobilidade e

destreza, assim como prevenir o desenvolvimento de complicações secundárias. Na

paralisia cerebral, a toxina botulínica pode postergar ou mesmo dispensar procedimentos

cirúrgicos até que o padrão de movimentos esteja estabilizado.

Post-traumatic epilepsy: an overview. Agrawal A et al. Clin Neurol Neurosurg, 108:

433, 2006.

Page 16: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

16

A epilepsia pós-traumática é uma doença com crises recorrentes secundária a agressão

cerebral por trauma craniano. Não é uma condição homogênea e pode surgir vários anos

após o trauma crânio-encefálico. O mecanismo pelo qual a agressão tecidual cerebral

resulta em crises recorrentes é desconhecido. As lesões corticais parecem ser importantes

na gênese da atividade epiléptica e as crises precoces provavelmente têm um mecanismo

patogênico distinto das crises tardias. Os medicamentos disponíveis são fenitoína,

valproato de sódio e carbamazepina. Os dados atuais apontam que o tratamento das crises

pós-traumáticas precoces não influi na incidência da epilepsia pós-traumática. Não está

indicada a administração rotineira de antiepilépticos nos pacientes com trauma crânio-

encefálico e o tratamento na fase aguda não reduz as taxas de letalidade ou de

incapacidade.

Panic disorder. Katon WJ. N Engl J Med, 354: 2360, 2006.

Panic disorder. Roy-Byrne PP et al. Lancet, 368: 1023, 2006.

A doença do pânico é um distúrbio mental muito freqüente, afetando até 5% da população.

É altamente incapacitante especialmente quando complicada com agorafobia e é associada

a uma substancial morbidade funcional e redução da qualidade de vida. Resulta em elevado

custo para o indivíduo e para a comunidade por causa dos atendimentos, absenteísmo e

produtividade reduzida no trabalho.

É caracterizada por episódios recorrentes e súbitos de pânico, definido como um período

de intenso medo e desconforto em que 4 ou mais dos seguintes sintomas surgem

abruptamente e alcançam um pico dentro de 10 minutos:

- Palpitações, batedeira cardíaca

- Sudorese

- Tremor ou abalos

- Falta de ar

- Sensação de sufocamento

- Dor ou desconforto no peito

- Náusea e desconforto abdominal

- Sensação de tontura ou de desmaio

Page 17: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

17

- Despersonalização

- Medo de perder o controle ou de ficar louco

- Medo de morrer

- Calafrios ou ondas de calor

- Parestesias

Pelo menos um dos seguintes fenômenos durante um mês (ou mais):

- Preocupação persistente sobre a possibilidade de voltar a ter novos episódios

- Preocupação sobre as implicações dos ataques ou suas conseqüências

- Uma alteração significativa no comportamento relacionada aos ataques

Surgimento de ataques de pânico independente de efeitos diretos de alguma substância

ilícita (ou medicamentosa) ou de doença (p. ex. hipertireoidismo)

Não caracterização de algum outro distúrbio mental, como fobia social ou fobia específica

(p. ex. aranha, cobra, altura), stress pós-traumático, ansiedade por separação.

O diagnóstico diferencial deve incluir: hipertireoidismo ou hipotireoidismo, epilepsia do

lobo temporal, asma, arritmia cardíaca, feocromocitoma, ingestão excessiva de cafeína ou

outros estimulantes, abstinência de álcool e corticoterapia.

O tratamento envolve a farmacoterapia (os inibidores seletivos da recaptação de serotonia

são os medicamentos de primeira escolha) e a psicoterapia.

Comentários: Embora não seja propriamente de nossa especialidade, devemos ser capazes

de identificar corretamente a doença do pânico, excluindo causas orgânicas, para que o

paciente possa receber um tratamento adequado de um psiquiatra especializado.

Evidence-based model for hand transmission during patient care and the role of

improved practices. Pittet D et al. Lancet Infect, 6: 641, 2006.

A lavagem das mãos é uma atividade imprescindível para reduzir a taxa de infecção

associada aos profissionais de saúde e a transmissão cruzada de patógenos resistentes a

antimicrobianos. Este trabalho é uma revisão das evidências atuais das várias etapas e

meios de transmissão de microorganismos através das mãos dos profissionais de saúde,

propondo um modelo dinâmico de pesquisas sobre a higienização das mãos e estratégias de

educação.

Page 18: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

18

Apology in medical practice. An emerging clinical skill. Lazare A. JAMA, 296: 1401,

2006.

A idéia de o médico admitir a seus pacientes os erros praticados tem assumido importância

crescente desde no final da década de 80. O próximo passo será inevitavelmente o pedido

de desculpas, pois de que vale a admissão do erro sem o reconhecimento da

responsabilidade, a expressão do remorso e discussão de reparações, isto é, todos os

componentes de um pedido de desculpas?

Embora o objetivo principal da admissão do erro e do pedido de desculpas seja a garantia

da segurança do paciente e o fortalecimento do compromisso ético, o resultado inesperado

foi a redução do número e do custo de processos jurídicos.

O pedido de desculpas é o reconhecimento da responsabilidade por uma transgressão,

acompanhado da expressão de remorso. Uma transgressão refere-se a um dano físico ou

psicológico causado por um indivíduo ou por um grupo, que poderia ou deveria ter sido

evitado pelos padrões habituais de comportamento. Um procedimento ou ato médico

incorreto resultado de decisão inadequada do médico, assim considerada pela comunidade

médica em geral, seria uma transgressão. Por outro lado, um desfecho infeliz, tal como o

insucesso de uma difícil cirurgia ou de qualquer tipo de tratamento arriscado não seria

considerado uma transgressão. Nessa situação caberia apenas um comentário de consolo e

de apoio, mas não propriamente um pedido de desculpas.

Montado na definição de uma desculpa – transgressão e remorso – a estrutura de qualquer

pedido de desculpa pode ser organizado em 4 partes:

1- reconhecimento da transgressão

2- explicação da característica da transgressão

3- expressão de remorso, arrependimento e humildade

4- reparação do dano, variando desde a antecipação da reavaliação clínica até o

cancelamento de honorários.

Um pedido efetivo de desculpas é um dos processos mais reparadores entre indivíduos,

grupos ou nações. Pode recuperar relações comprometidas ou mesmo fortalecer laços

previamente satisfatórios. Para o transgressor, o pedido de desculpas pode diminuir sua

sensação de culpa, vergonha e medo de retaliação. Para a vítima, receber tal pedido pode

remover sentimentos de rancor, facilitando o perdão e a reconciliação. Considerando tais

qualidades, o pedido de desculpas deve ser considerado como um dos comportamentos

Page 19: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

19

mais profundos do ser humano. Assim, não constitui qualquer surpresa que a prática

médica, com sua nobre relação entre o médico e o paciente, reconheça e valorize a prática

do pedido de desculpas na atividade profissional.

History of the Cushing reflex. Fodstad H et al. Neurosurgery, 59: 1132, 2006.

Hipertensão aterial, bradicardia e irregularidade respiratória são sinais de hipertensão

intracraniana levando a herniação cerebral e compressão fatal do tronco encefálico. Este

fenômeno, conhecido como reflexo de Cushing, é baseado nos trabalhos experimentais de

Harvey Cushing em 1901 e 1902. Entretanto, experimentos similares tinham sido efetuados

algumas décadas antes por outros pesquisadores, tais como Paul Cramer, Ernst von

Bergmann, Ernst von Leyden, Georg Althann, Friedrich Jolly, Friedrich Pagentecher,

Henri Duret, Bernard Naunyn e Julius Schreiber. Deve-se ressaltar, no entanto, que

Cushing estudou a reação do SNC à compressão de forma mais cuidadosa que seus

predecessores, além de fornecer melhor explicação do mecanismo fisiopatológico do

fenômeno que leva seu nome.

How do I perform a lumbar puncture and analyse the results to diagnose bacterial

meningitis? Straus SE et al. JAMA, 296: 1012, 2006.

Excelente artigo de revisão sobre punção do LCR, abordando o procedimento técnico,

(posicionamento do paciente, escolha da agulha, re-inserção do mandril), contra-

indicações, complicações, validade do repouso pós-punção, parâmetros de utilidade no

diagnóstico de meningite bacteriana (pleocitose, tipo celular, relação glicose LCR/sangue,

lactato, Gram).

Apresenta descrição detalhada da técnica de punção lombar e ilustrações de alto nível.

Page 20: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

20

Lumbar puncture. - VÍDEO - Ellenby MS et al. N Engl J Med, 355:13, 2006.

Embora esteja aqui apresentado sob a forma de um artigo, incluindo indicações, contra-

indicações e o procedimento da punção lombar, há um VÍDEO de excepcional qualidade

sobre cada passo da punção liquórica. Este video é altamente recomendável aos nossos

residentes e a todos aqueles interessados na correta execução da punção.

O número da revista contendo o vídeo é o de 28 de Setembro de 2006.

Page 21: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

21

MOLÉSTIAS NEUROMUSCULARES Dra. Márcia Cruz

Intravenous immunoglobulins in neurological diseases. Zettl UK et al. J Neurol, 253

(suppl. 5), 2006.

Trata-se na verdade, não de um artigo, mas de um suplemento deste periódico, jornal

oficial da European Neurological Society, inteiramente dedicado à revisão do uso da

imunoglobulina em Neurologia.

Nos primeiros artigos os autores fazem uma revisão dos princípios do tratamento com

imunoglobulina endovenosa (Ig EV).

A seguir, tratam do seu emprego em desordens do sistema nervoso central tais como a

síndrome do homem rígido, doença de Alzheimer, síndrome pós pólio, dor, narcolepsia e

catalepsia.

Os vários capítulos que se seguem fazem revisão sobre suas indicações em: Síndromes

paraneoplásicas neurológicas tais como a S. de Eaton – Lambert, dermatomiosite e a

encefalite límbica;

Nas vasculites (doença de Kawasaki, granulomatose de Wegener), e desordens do tecido

conjuntivo;

Na esclerose múltipla;

Nas neuropatias imunomediadas tais como s S. de Guillain Barré e o CIDP, além da

neuropatia multifocal motora, e a neuropatia associada à gamopatia monoclonal.

Nas miopatias inflamatórias (dermatomiosite, polimiosite, miosite por corpos de inclusão);

Os capítulos finais tratam do uso durante a gravidez, na criança, e dos colaterais e do

impacto sócio econômico deste tratamento.

Em cada capítulo os autores estabelecem o estado da arte do tratamento de cada condição,

não abordando exclusivamente o tratamento com imunoglobulina EV, o que torna este

suplemento um guia importante e prático, pois tratam-se de pequenos capítulos de fácil e

rápida leitura com menção aos artigos mais importantes correlacionáveis.

Muito embora não se trate exclusivamente de desordem neuromuscular, a maioria dos

temas tratados corresponde a moléstias deste território.

Page 22: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

22

Neuromuscular disorders in pregnancy. Sax TW et al. Muscle & Nerve 34:559, 2006.

Este é um recente artigo de revisão sobre as desordens neuromusculares no contexto da

gravidez, dando ênfase aos aspectos peculiares destas doenças neste contexto, bem como

aos cuidados especiais no tratamento, durante o parto, na anestesia, além da repercussão

para a criança em fase neonatal ou posteriormente, e seu tratamento.

Portanto, todos os aspectos materno-infantis são revistos com base nos mais recentes

artigos que estão à disposição para consulta.

Primeiramente revêem as desordens adquiridas durante a gravidez. Elas são divididas em

compressivas, tais como:

Síndrome do túnel do carpo, radiculopatia lombossacra, meralgia parestésica, neuropatia

femural, neuropatia do obturador e do fibular, além da paralisia de Bell, neuralgia

intercostal e radial.

Inflamatórias: Polineuropatias inflamatórias desmielinizantes aguda e crônica, miastenia

gravis, miopatias inflamatórias (polimiosite e dermatomiosite, miosite focal).

A partir deste ponto descrevem as principais desordens hereditárias musculares e

neuropáticas que complicam o período de gestação:

Neuropatias hereditárias motoras e sensitivas (Charcot- Marie- Tooth);

Miotonias nas miotonia congênita e na distrofia muscular de Steinert, congênita ou não;

Distrofias musculares, principalmente a forma de cinturas e fácio escápulo humeral;

Miopatias congênitas, chamando a atenção para o risco de hipertermia maligna durante

anestesia na miopatia com multi minicore;

Miopatias metabólicas como a paralisia periódica;

Miopatias mitocondriais (deficiência em carnitina palmitoil transferase, e na deficiência

primária de carnitina).

Concluem por citarem que a pesar destas complicações não serem sérias na maioria das

vezes e haverem apenas relatos na literatura para embasarem a revisão, o conhecimento

destas desordens e o acompanhamento multidisciplinar condicionam favoravelmente o

prognóstico da mãe e da criança.

Este artigo torna-se bastante útil para consulta nos casos de dúvida quanto ao manuseio

clínico e orientação da mãe, para os neurologistas que lidam com pacientes com doenças

neuromusculares, que são condições que causam fraqueza, podem ser hereditárias, e

causam, portanto, preocupação.

Page 23: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

23

NEUROLOGIA COGNITIVA E DO ENVELHECIMENTODr. Paulo Caramelli

Clinical phenotype of Parkinson disease dementia [Fenótipo clínico da demência

associada à doença de Parkinson]. Galvin JE et al. Neurology, 67: 1605, 2006.

Objetivos: Determinar quais aspectos clínicos são mais característicos da demência

associada à doença de Parkinson (DDP), em comparação com a doença de Alzheimer (DA)

e com a demência com corpos de Lewy (DCL).

Métodos: Foram examinados 103 indivíduos que participaram de um estudo longitudinal

(controles sem demência = 10, doença de Parkinson ou DP = 42, DCL = 20, DA = 31),

avaliados por meio de protocolos padronizados e que foram seguidos até a autópsia. As

características clínicas da DDP foram definidas utilizando-se, como base, critérios

diagnósticos publicados de DA e de DCL. Análise estatística foi realizada por meio do

teste de qui-quadrado e teste exato de Fisher, além de curvas de Kaplan-Meyer e modelos

de regressão logística.

Resultados: A média de idade da amostra foi de 74,0 anos (variando de 53 a 91 anos) e os

indivíduos foram submetidos, em média, a 3,4 avaliações (variando de 1 a 12 visitas).

Durante o seguimento, 83% dos casos com DP desenvolveram demência, definida por

escore maior ou igual a 0,5 na escala CDR. Os achados clínicos que distinguiram DDP de

DA foram: flutuações cognitivas (p = 0,001), alucinações visuais (p < 0,001) e auditivas (p

= 0,006), depressão (p = 0,003) e alterações do sono (p = 0,003). Estes achados foram

idênticos àqueles observados nos casos de DCL. Os substratos neuropatológicos

observados nos casos de DDP incluíram DCL (38%), DA (32%) e corpos de Lewy restritos

à substância negra (24%). As variáveis clínicas preditivas do diagnóstico de DDP foram

alucinações visuais (odds ratio [OR] ou razão de chance = 21,3; IC 95%: 1,5 - 309,6) e

sexo masculino (OR = 9,6; IC 95%: 1,3 – 71,4).

Conclusões: A DDP apresenta características clínicas idênticas à DCL; as duas entidades

podem ser diferenciadas da DA. A presença de sinais e sintomas sugestivos de DDP/DCL

em qualquer momento da evolução da DP é altamente preditiva de demência e da presença

de corpos de Lewy à autópsia. O sexo masculino e presença de alucinações visuais em

casos de DP predizem demência.

Page 24: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

24

Comentários

Muita discussão tem havido na literatura a respeito da diferenciação entre DDP e DCL,

bem como destas duas em relação à DA.

Segundo os critérios diagnósticos clínicos de DCL, cuja última revisão foi publicada em

dezembro de 2005, a diferenciação clínica entre DDP e DCL se baseia na chamada “regra

de um ano”: quando a demência se instala antes ou até um ano após o início das

manifestações motoras (síndrome parkinsoniana), o diagnóstico é de DCL; por outro lado,

quando as manifestações motoras precedem a síndrome demencial e esta última surge mais

de um ano após a instalação da síndrome parkinsoniana, o diagnóstico provável é de DDP.

No estudo apresentado, os casos de DDP foram clinicamente indistinguíveis dos casos de

DCL, sugerindo – como vários outros trabalhos recentes também já fizeram – que

constituem a mesma doença, com formas diferentes de instalação dos sintomas. Além

disso, o estudo indica que a DDP e a DCL apresentam, mais freqüentemente que na DA,

flutuações cognitivas e alucinações visuais (ambas fazendo parte dos critérios diagnósticos

clínicos de DCL), alucinações auditivas, depressão e alterações do sono (principalmente

transtorno comportamental do sono REM). Assim, o neurologista pode se valer de tais

informações para realizar o diagnóstico diferencial entre DDP/DCL e DA. Finalmente, os

resultados do estudo sugerem que homens com doença de Parkinson que apresentam

alucinações visuais devem ser acompanhados de forma mais cuidadosa, pois têm alto risco

de desenvolverem demência no seguimento.

Mini-Mental State Examination: psychometric characteristics in elderly outpatients.

[Mini-Exame do Estado Mental: características psicométricas em idosos

ambulatoriais]. Lourenço RA, Veras RP. Rev Saúde Pública, 40: 712, 2006.

Objetivos: Avaliar as características psicométricas do Mini-Exame do Estado Mental

(MEEM) em idosos ambulatoriais que buscaram atendimento primário.

Métodos: No total, 303 indivíduos (≥ 65 anos) foram submetidos à avaliação geriátrica

ampla por meio de escalas funcionais e também com o MEEM. Os valores de

sensibilidade, especificidade, valores preditivos positivo e negativo, e a área sob a curva

ROC, foram calculados para o MEEM.

Page 25: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

25

Resultados: A sensibilidade, especificidade, valores preditivos positivo e negativo, e a área

sob a curva ROC foram, respectivamente: 80,8%, 65,3%, 44,7%, 90,7% e 0,807 (para nota

de corte = 23/24). A melhor nota de corte para o diagnóstico de demência em analfabetos

foi de 18/19 pontos (sensibilidade = 73,5%; especificidade = 73,9%); para alfabetizados foi

de 24/25 pontos (sensibilidade =75%; especificidade = 69,7%).

Conclusões: No rastreio de demência em idosos ambulatoriais a escolaridade deve ser

considerada para a seleção da melhor nota de corte do MEEM.

Comentários

O MEEM é certamente o teste de rastreio cognitivo mais utilizado em todo o mundo,

incluindo o Brasil, para o diagnóstico de demência. Nesse sentido, o Departamento

Científico de Neurologia Cognitiva e do Envelhecimento da ABN publicou em Arquivos

de Neuro-Psiquiatria, em dezembro de 2005, recomendações para o diagnóstico de doença

de Alzheimer no Brasil, entre as quais indica o MEEM como um dos instrumentos

adequados para a avaliação cognitiva global. No entanto, normas ou notas de corte

definitivas para uso na população brasileira ainda não são disponíveis.

No estudo citado, os autores avaliaram 303 indivíduos com idade igual ou superior a 65

anos, dos quais 78 receberam diagnóstico de demência. Este diagnóstico foi feito sem levar

em consideração a pontuação no MEEM (com base no desempenho em outras

escalas/instrumentos de avaliação) e o pesquisador que aplicou o Mini-Exame não

conhecia os diagnósticos. Este cuidado metodológico confere maior validade aos

resultados encontrados.

Uma limitação do estudo, no entanto, reconhecida pelos próprios autores, é que não foi

possível uma maior estratificação em relação à escolaridade. Isto ocorreu porque o número

de pacientes com demência com escolaridade acima de 4 anos foi muito baixo. Assim, foi

possível definir apenas dois grupos para análise em função do nível educacional:

analfabetos e alfabetizados. O estudo confirma a forte influência da escolaridade sofrida

pelo MEEM, o que implica na necessidade de se utilizar pontuações de corte diferenciadas.

Pontuações < 19 no MEEM foram as melhores para o diagnóstico de demência em

analfabetos; para alfabetizados, < 25. Embora a sensibilidade e especificidade obtidas não

tenham sido ideais, a utilização do MEEM em conjunto com outros instrumentos (por

Page 26: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

26

exemplo, uma escala de avaliação funcional) tem se mostrado um método bastante útil para

o rastreio de demência na prática clínica ou mesmo em estudos epidemiológicos.

Treatment of dementia: anything new? [Tratamento de demência: algo de novo?].

Machado JC, Caramelli P. Curr Opin Psychiatry, 19: 575, 2006.

Objetivo: Discutir novos dados a respeito das drogas atualmente aprovadas para o

tratamento de demência, como inibidores da colinesterase (IChE) e memantina, e

preocupações com o uso de antipsicóticos para o tratamento de sintomas

neuropsiquiátricos. Além disso, o artigo também faz uma revisão dos principais estudos

recentemente publicados a respeito de tratamentos farmacológicos com potencial

modificador da velocidade de progressão da doença de Alzheimer.

Resultados: Os focos de interesse principais dos ensaios clínicos mais recentes com IChE e

memantina foram a eficácia e a segurança na fase de extensão aberta dos estudos

controlados com placebo, a avaliação dos efeitos de tratamentos combinados e a

comparação da eficácia de dois agentes, além da investigação de potenciais efeitos

neuroprotetores e a busca de novas indicações terapêuticas. Outras publicações avaliaram

as evidências de eficácia e o risco aumentado de eventos cerebrovasculares, declínio

cognitivo rápido e de mortalidade com o uso de antipsicóticos em demência, oferecendo

informações importantes relacionadas ao seu uso. Embora mais estudos sejam necessários,

uma vasta literatura a respeito de novas opções terapêuticas, ainda em fase de pesquisa, já

se encontra disponível, sendo as mesmas um resultado da melhor compreensão da

patogenia das demências.

Conclusões. Até o momento não há nenhum método estabelecido para predizer a

ocorrência de melhor resposta sintomática ou mesmo de benefícios de longo prazo com as

drogas atualmente aprovadas para o tratamento das demências. No entanto, revisões

sistemáticas recentes bem como novas pesquisas sobre tratamentos atuais oferecem

informações relevantes para os clínicos e drogas em investigação revelam potencial

promissor como estratégias terapêuticas no futuro.

Comentários

Page 27: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

27

O artigo de revisão tem como base a literatura pertinente ao tema que foi publicada

principalmente no ano de 2005 (ano anterior à data da publicação do fascículo). Os tópicos

principais são os IChE, a memantina e agentes farmacológicos em investigação para o

tratamento da doença de Alzheimer, estudos avaliando a eficácia e a segurança dos IChEs

na demência associada à doença de Parkinson, e as controvérsias relacionadas ao emprego

de antipsicóticos típicos e atípicos em pacientes idosos com demência. Ao final, 67 artigos

são citados, sendo ressaltados os de maior interesse como sugestão de leitura adicional.

Page 28: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

28

NEUROIMUNOLOGIA Dr. Marcos Moreira

Dr. Aílton Melo

Dr. Paulo Diniz da Gama

Dr. Carlos Augusto de Albuquerque Damasceno

Revised diagnostic criteria for neuromyelitis optica. Wingerchuk DM et al. Neurology,

66: 1485, 2006.

Neuromielite óptica (NMO; síndrome de Devic) é uma síndrome desmielinizante

grave do sistema nervoso central (SNC), clinicamente definida, caracterizada por neurite

óptica (NO) e mielite aguda. Até recentemente, a presença de sintomas além do

acometimento dos nervos ópticos e medula excluía o diagnóstico de NMO.

Tradicionalmente, o termo NMO era utilizado em pacientes que experimentavam um

evento monofásico caracterizado por neurite óptica bilateral simultânea e mielite aguda. O

espectro da NMO é hoje reconhecido por tipicamente envolver um distúrbio recorrente que

inclui pacientes com NO unilateral e mielite, sendo que estes eventos podem estar

separados por meses e até anos.

Diagnóstico precoce e correto é importante porque a NMO carreia um pior

prognóstico que a esclerose múltipla (EM) e geralmente sua abordagem terapêutica é

diferente. Em 1999, Wingerchuk e cols publicaram critérios diagnósticos com três

requisitos absolutos: NO, mielite aguda e nenhum sintoma implicando outras regiões do

SNC. No entanto, estes critérios apresentaram limitações. Eles falhavam em capturar

pacientes com um curso de doença altamente compatível com NMO e que apresentavam

sinais ou sintomas que implicavam outras regiões do SNC fora dos nervos ópticos e

medula ou também pacientes com imagem por ressonância magnética (IRM) com lesões

compatíveis com EM. Além disso, o espectro completo da doença poderia estar sendo mal

avaliado.

Por outro lado, alguns pacientes com EM que cursam com NO e mielite incompleta

podem apresentar um exame de IRM inicial negativo preenchendo critérios para NMO

numa fase precoce do curso clínico. Fortes evidências, incluindo dados imunopatológicos,

Page 29: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

29

clínicos, laboratoriais e de neuroimagem, mostram que a NMO é distinta da EM. Contudo,

nenhum exame diagnóstico gold standard ainda foi estabelecido. Um marcador biológico

objetivo poderia dar certeza ao diagnóstico e uma melhor definição do espectro de doença

da NMO. O anticorpo sérico NMO-IgG, direcionado contra a aquaporina-4, é um bom

candidato devido sua especificidade de > 90% para NMO em pacientes com uma síndrome

óptica-espinhal e que não é detectado em pacientes com EM clássica. Soropositividade

para NMO-IgG também prediz surtos e conversão para NMO em pacientes que apresentam

um único ataque de mielite extensa.

Os autores discutem que componentes individuais dos atuais critérios diagnósticos

para NMO diferem em suas propriedades diagnósticas e que uma avaliação quantitativa

destes critérios, com a incorporação do marcador NMO-IgG poderia permitir a formulação

de critérios ótimos para discriminar NMO da EM.

Novos critérios diagnósticos propostos para neuromielite óptica

NMO definida

- Neurite óptica

- Mielite aguda

- Pelo menos dois dos seguintes critérios:

1. Lesão na IRM contígua estendendo-se por três ou mais segmentos

vertebrais.

2. IRM encefálica que não preenche critérios diagnósticos para esclerose

múltipla.

3. Soropositividade para NMO-IgG

Os autores acreditam que estes critérios diagnósticos revisados representam um avanço

importante na pesquisa e prática clínica da NMO. Os critérios para NMO definida ficaram

simples, práticos e com excelente acurácia diagnóstica. Eles discriminam NMO da EM que

se inicia com neurite óptica e mielite, um cenário no qual a NMO é uma razoável

consideração diagnóstica inicial. Validação futura e refinamento destes critérios, aplicação

em indivíduos com diferentes backgrounds raciais e étnicos em diferentes países e a

continuada avaliação do NMO-IgG com desenvolvimento de novos marcadores são os

próximos desafios no estudo deste distúrbio neurológico grave.

Page 30: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

30

Are initial demyelinating event recovery and time to second event under differential

control? West T et al. Neurology, 67:809, 2006.

Neste artigo, os autores têm como objetivo determinar variáveis clínicas e

demográficas preditoras de recuperação do primeiro surto de esclerose múltipla (EM) e de

um segundo evento. Os autores especulam que estes fatores prognósticos estariam sob

diferentes controles genéticos ou imunológicos e justificam o estudo com a premissa de

que preditores precoces de mau prognóstico poderiam ajudar no desenvolvimento de novos

alvos terapêuticos e incentivar ensaios clínicos com medicamentos mais agressivos para

tratamento de grupos com pior prognóstico.

Os autores utilizaram o banco de dados dos pacientes acompanhados no centro de

referência da Universidade da Califórnia inseridos entre janeiro de 2000 e janeiro de 2005.

Os pacientes alocados tinham seus dados inseridos até 12 meses do primeiro surto e as

consultas eram feitas a cada seis meses. Durante cada consulta o tempo para um segundo

evento e o EDSS eram anotados e as lesões classificadas como mono ou poliregionais.

Foram identificados 186 pacientes (127 mulheres, 59 homens) com média etária de

34 anos. Houve pelo menos um ano de seguimento em 60,8% e dois anos em 32,8% dos

pacientes. A maioria teve início da EM com lesão em uma região (86%). Idade, gênero e

grupo ético tiveram porcentagens similares para início mono ou polirregional dos sintomas.

Esteróides foram prescritos em 40% no surto inicial e estava associado à gravidade do

evento. Terapia imunomoduladora foi prescrita em 55% dos pacientes em algum período

do seguimento. Recuperação completa do primeiro surto foi observada em 41,4%,

moderada em 39,8% e discreta em 18,8% de todos os pacientes. O modelo de regressão

logística utilizado pelos autores para determinar a associação entre fatores de risco para

recuperação do primeiro surto mostrou que o início grave do quadro reduzia a chance de

recuperação em 84% comparado com o início leve. Início grave do quadro foi associado

com recuperação discreta em 42,3%, moderada em 34,6% e completa em 23,1%

comparado com o início leve (5,1%; 38,5%, 56,4%). Início poliregional foi associado a

recuperação discreta em 46,2%, moderada em 19,2% e completa em em 34,6%, enquanto o

início monoregional apresentou 14,4%, 43,1%, 42,5%, respectivamente (OR:0,36,

p=0,010). Em conclusão, os dados desse estudo sugerem que a recuperação e tempo para

um segundo surto devem estar relacionados a diferentes fatores.

Page 31: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

31

Is late-onset multiple sclerosis associated with a worse outcome? Tremlett H et al.

Neurology, 67: 954, 2006.

O presente artigo compara as características da esclerose múltipla de início tardio (EMIT),

ou seja, pacientes com idade de início da doença maior ou igual a 50 anos com aquelas de

pacientes com esclerose múltipla de início no adulto (idade entre 11 e 49 anos). O estudo

analisa também prognóstico e fatores de risco associados. Os autores analisaram pacientes

da British Columbian Multiple Sclerosis com esclerose múltipla (EM) definida com pelo

menos um ponto no EDSS (escala para medir incapacidade física). As características

clínicas e demográficas foram comparadas entre pacientes com EMIT e de início no

adulto. A progressão foi medida como o tempo em anos para atingir o EDSS 6,0 e os

fatores de risco analisados foram gênero, curso da doença (primariamente progressivo ou

recorrente) e início dos sintomas. Foram selecionados 2837 pacientes. 132 pacientes

(4,7%) apresentavam EMIT. Nestes pacientes com EMIT predominou o curso

primariamente progressivo (54,5%). Por outro lado, somente 10,6% dos pacientes com EM

de início no adulto apresentaram curso primariamente progressivo (p< 0,0005). Os

sintomas motores foram mais freqüentes nos pacientes com EMIT, enquanto sintomas

sensoriais e neuropatia óptica predominaram nos pacientes com EM de início no adulto

(p<0,0005). Pacientes com EM de início no adulto apresentaram média de 27,7 anos para

atingir o EDSS 6,0 (pacientes que necessitam de apoio unilateral para deambular) enquanto

os pacientes com EMIT obtiveram uma média de 16,9 anos (p<0,0005). A incidência em

mulheres foi menor no grupo de início tardio do que no grupo de início no adulto. O

detalhamento das informações referentes ao tratamento foi limitado nos pacientes com

EMIT devido ao baixo uso de imunomoduladores nesta faixa etária. Atualmente a maioria

dos trabalhos recomenda o uso de imunomoduladores em pacientes com menos de 45 anos,

contudo, existe uma tendência para eleição de pacientes até 65 anos. Os autores não

recomendam a diferenciação do tratamento entre os pacientes dos dois grupos. Tremlett e

cols recomendam analisar especificamente cada caso com especial atenção ao curso da

doença (primariamente progressivo ou recorrente). O estudo não deixa claro se os

pacientes com EMIT apresentarão curso da doença mais rápido do que os pacientes de

início no adulto. Os autores concluem que a EM não está necessariamente associada com

pior prognóstico nos pacientes com EMIT. O perfil da progressão,seja durante o curso

recorrente ou primariamente progressivo, difere pouco entre os dois grupos. Pacientes com

Page 32: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

32

EMIT atingiram o EDSS de 6,0 numa idade mais tardia (71,2 anos) do que a EM de início

no adulto (58,4 anos). O curso da doença (primariamente progressivo ou recorrente) teve

maior implicação no prognóstico do que a idade de início da doença após os 50 anos. Os

autores recomendam novos estudos prospectivos para melhor definição prognóstica, dos

fatores de risco e da resposta terapêutica de pacientes com EMIT.

Clinical and epidemiological profile of multiple sclerosis in a reference center in the

State of Bahia, Brazil. Cardoso E et al. Arq Neuropsiquiatr, 64: 727, 2006.

Trata-se de um estudo que tem como objetivo descrever as características da

esclerose múltipla (EM) em um centro de referência na região Nordeste do Brasil. Os

autores inicialmente chamam a atenção de peculiaridades da doença como o acometimento

maior em adultos jovens, mulheres e indivíduos brancos. Em um quadro no qual compara

estudos realizados em diversos estados brasileiros, é demonstrado que a forma surto-

remissão variou de 70 a 91%, enquanto a variação da forma secundariamente progressiva

foi de 1 a 23,7% e da forma primariamente progressiva de 4,5 a 30%. Todos os estudos

listados no artigo mostram que a doença foi sempre menos prevalente em negros, embora

os autores enfatizem que na população de negros da Bahia, à semelhança da população

norte-americana, o prognóstico em negros, medido pelo EDSS, é pior do que em brancos.

Apesar de estudos de regressão logística terem sido realizados para minimizar potenciais

vieses como acesso a serviço médico e grau de escolaridade, é possível que fatores sociais

relacionados às populações negras das regiões estudadas possam influenciar o prognóstico.

No entanto, os autores acreditam que fatores genéticos possam ser os responsáveis. Um

aspecto já salientado por vários estudos no Brasil é a grande frequência da forma óptico-

espinhal na população negra brasileira. Este estudo serviu como piloto para análises mais

aprofundadas sobre a real situação das doenças desmielinizantes do sistema nervoso central

em populações negras e mestiças. Assim, é necessário determinar os fatores de risco ou

protetores para a doença, que podem ser genéticos ou ambientais. A resolução destas

questões permitirá um tratamento mais adequado e individualizado da esclerose múltipla

nas diversas populações brasileiras.

Page 33: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

33

Relapses and subsequent worsening of disability in relapsing-remitting multiple

sclerosis. Young PJ et al. Neurology, 67:804,2006.

A maioria dos pacientes com esclerose múltipla (EM) inicia a doença com uma forma

recorrente-remitente, ou seja, caracterizada por surtos e remissões. Cerca de 80% destes

pacientes evoluirão para a forma secundariamente progressiva (com ou sem surtos)

caracterizada por um implacável aumento da incapacidade. Estudos recentes sugerem que

os surtos não apresentam impacto a longo prazo sobre a progressão da incapacidade (isto

seria melhor observado a partir de um certo grau de incapacidade adquirida). Entretanto, há

um grande debate sobre a hipótese de que os surtos que ocorrem durante a fase recorrente-

remitente estariam associados a uma piora mais rápida da disfunção neurológica

persistente. Este estudo objetiva investigar se os surtos contribuem no desenvolvimento

futuro de um aumento sustentado da incapacidade de pacientes com EM. Em uma amostra

inicial randomizada de 256 pacientes com EM recorrente-remitente registrados no Sylvia

Lawry Centre for Multiple Sclerosis Research, seguidos por um período médio de 2,66

anos, os autores analisaram se o tempo gasto para atingir um aumento do EDSS,

confirmado depois de seis meses, esteve relacionado à ocorrência de surtos prévios.

Inicialmente, utilizou-se um período para calcular o índice de surto do estudo. O início da

progressão pelo EDSS não foi considerado nesse período. A ocorrência de surtos nos

primeiros quatro meses pareceu ser o melhor preditor de curto tempo para subseqüente

aumento sustentado do EDSS. No entanto, esse achado não se confirmou na validação dos

dados. Os autores concluíram que apesar dos surtos potencialmente causarem danos

permanentes e progressão do EDSS, não houve um efeito consistente dos surtos no

desenvolvimento de aumento sustentado do EDSS durante o período clínico de

observação. Outros estudos são necessários para se determinar o impacto a longo prazo dos

surtos na progressão da incapacidade.

Oligoclonal bands in multiple sclerosis cerebrospinal fluid: An update on

methodology and clinical usefulness. Link H e Huang YM. J Neuroimmunol, 180: 17,

2006.

Esta revisão realizada por Link e Huang, pesquisadores com inúmeros trabalhos

publicados sobre a análise adequada de bandas oligoclonais no líquido cefalorraquidiano

Page 34: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

34

(LCR) de pacientes com esclerose múltipla (EM) chegou em boa hora. Inúmeras dúvidas

rodeiam a rotina de neurologistas clínicos, pouco afeitos à solicitação deste exame na

prática diária. Além disso, associa-se ao fato de que a revisão dos critérios diagnósticos

para EM de 2005 deu pouca ênfase para a análise de bandas oligoclonais no LCR.

Principais conclusões:

1. Duas ou mais bandas oligoclonais (BO) de IgG detectadas pela separação de

proteínas do LCR, não detectadas na amostra de soro pareada, demonstra resposta

local de células B refletindo processo inflamatório no sistema nervoso central

(SNC).

2. Utilizando metodologia apropriada, preferencialmente a separação das proteínas

pela focalização isoelétrica acompanhada pelo immunoblotting, mais que 95% dos

pacientes com EM possuem BO de IgG no LCR não detectadas no soro,

promovendo forte evidência para o diagnóstico da EM.

3. Quando presentes, as BO persistem nos pacientes independentemente do curso

clínico ou da terapia.

4. Devido à alta sensibilidade das BO na EM, além de sua alta especificidade quando

associada à clínica apropriada, o exame do LCR pode ser fortemente recomendado

para se obter suporte para o diagnóstico da EM e identificar pacientes com

síndrome clínica isolada (CIS) com alto risco de conversão para a EM.

5. O índice de IgG está elevado em 70% dos pacientes com EM sendo mais raramente

observado em pacientes com BO negativas. Devido à sua baixa sensibilidade, o

índice de IgG não pode ser recomendado como substituto da análise de BO para o

diagnóstico da EM. Contudo, se o índice de IgG estiver elevado significa forte

evidência adicional para o diagnóstico da EM.

6. Embora os aspectos clínicos e de imagem sejam essenciais para o diagnóstico da

EM, os mesmos devem ser reavaliados em pacientes com BO negativas devido a

presença de inúmeras doenças que mimetizam a EM.

7. Os critérios diagnósticos recomendados para EM devem incluir definições

específicas e claras da rotina de investigação do LCR, incluindo técnica adequada

para análise de BO por focalização isoelétrica seguida de immunoblotting conforme

Page 35: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

35

orientação de Painel Internacional em 2005. Os autores citam que somente 10% dos

laboratórios americanos realizam a pesquisa por esta técnica.

8. Há necessidade de avaliar estudos seqüenciais mais prolongados de pacientes com

EM e BO negativas, com ênfase no prognóstico e padrões imunológicos. Estudos

têm demonstrado que o curso clínico de pacientes com BO negativas é mais

favorável.

9. Para a inclusão de pacientes em trials clínicos de drogas imunomoduladoras é

recomendável que pacientes com EM ou CIS sejam selecionados de acordo com a

presença ou não de BO, preferencialmente aqueles com presença de BO.

Esta revisão explicita a grande importância da análise do LCR para o diagnóstico adequado

da EM. Além disso, o estudo sinaliza para a utilização de técnica adequada para análise de

BO no LCR, pouco utilizada nos grandes centros do Brasil. A tendência atual para menor

uso desta técnica na prática clínica diária causa limitação no uso desta boa ferramenta

diagnóstica de alta sensibilidade e especificidade quando associada aos aspectos clínicos e

de imagem. Concluindo, a presença de BO no LCR sem correspondência no soro evidencia

a existência de um processo inflamatório imunomediado dentro do SNC.

Page 36: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

36

NEUROLOGIA INFANTIL Dra. Umbertina Conti Reed

Paroxysmal nonepileptic events of childhood. DiMario Jr FJ. Semin Pediat Neurol, 13:

208, 2006.

O autor realiza uma ampla revisão sobre o diagnóstico diferencial dos eventos

paroxísticos não epilépticos que, devido à periodicidade de repetição e à semiologia

estereotipada, constituem um desafio para os neurologistas e pediatras no sentido de

distinguí-los da epilepsia. Embora, ocasionalmente, seja necessária a realização de vídeo-

EEG para definir claramente o tipo de evento, o autor enfatiza a importância da história e

da descrição clínica, as quais devem incluir dados gerais tais como idade de início, história

familiar, freqüência, duração, pródromos ou fatores desencadeantes, bem como dados

específicos sobre postura, tônus, padrão respiratório, alterações autonômicas e

possibilidade de induzir a interrupção do evento, entre outros. Estes detalhes descritivos

dependem muito da perspicácia dos pais e têm sido facilitados pela filmagem doméstica, já

que muito raramente o médico presencia o evento. O autor considera que uma subdivisão

inicial de caráter prático inclui duas categorias, dependendo de existir ou não alteração do

estado de consciência ou ocorrência durante o sono.

À primeira categoria pertencem os episódios de perda de fôlego (cianótica ou

pálida), as síncopes, cujos mecanismos são discutidos, a síndrome de hiperventilação e um

grande número de distúrbios paroxísticos relacionados ao sono, entre os quais mioclonias

de diferentes tipos de acordo com a fase do sono, terror noturno, sonambulismo, jactatio

capitis noturna, pesadelos, sonilóquio, distonia paroxística noturna, enurese, narcolepsia,

catalepsia, bruxismo, paralisia do sono, apnéia e parasonias mais raras, das quais o autor

fornece a descrição clínica e a base bibliográfica para cada uma. Ainda neste tópico, o

autor menciona as pseudocrises que aparentemente se manifestam com alteração da

consciência, embora na realidade se trate de somatização que pode co-existir com crises

epilépticas reais; as pseudocrises incidem preferencialmente em crianças de bom nível

sócio-cultural, submetidas a estresse ou que apresentam distúrbios de comportamento, tais

Page 37: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

37

como ansiedade e depressão. Na mesma linha, também aborda aspectos da síndrome de

Munchausen.

A lista de eventos paroxísticos não epilépticos não associados a distúrbios da

consciência ou do sono é ainda mais extensa, pois o autor inclui aqui não somente

episódios recorrentes de natureza idiopática, como também afecções neurológicas de

etiopatogenia definida, porém de caráter “benigno”, que se manifestam através de

movimentos involuntários, tais como distonias, tremores, mioclonias e tiques, ou ainda

ataxias. Particularmente em relação às distonias, descreve uma série de situações de

distonias focais ou generalizadas e a importância de investigar eventuais efeitos colaterais

de medicamentos. Também menciona as diferentes formas de variantes enxaquecosas,

principalmente vertigem paroxística, torcicolo paroxístico, enxaqueca hemiplégica e a

entidade independente hemiplegia alterna da infância, esta última de caráter evolutivo.

Entre os episódios paroxísticos não associados a entidades definidas, porém,

eventualmente, de caráter genético discute a hiperekplexia e a síndrome da dor retal

familiar, ambas de sintomatologia alarmante pela intensidade do fenômeno tônico e das

alterações cárdio-respiratórias, de início nos primeiros meses e evolução variável.

Situações menos alarmantes também discutidas são os distúrbios da gratificação

(masturbação), os movimentos estereotipados recorrentes, que são mais encontrados em

crianças com deficiência mental ou autismo, as posturas tônicas em extensão da cabeça e

do pescoço, associadas ao refluxo gastro-esofágico ou nasofaríngeo (síndrome de Sandifer

ou distonia dispéptica), o “flutter” diafragmático, que consiste de surtos irregulares de

contraçoes diafragmáticas e os distúrbios comportamentais paroxísticos, entre os quais as

birras comuns ou ataques de pânico. Finalmente, considera os distúrbios paroxísticos extra-

oculares de desvio do olhar, que são situações possíveis nos primeiros três a quatro anos de

vida, caracterizados por desvio tônico do olhar para cima, para baixo, em convergência,

com ou sem opsoclonus ou nistagmo, de duração variável.

Para todas estas diferentes situações, idiopáticas ou definidas, benignas ou

evolutivas, o autor aponta os indicadores para realizar o diagnóstico diferencial e expõe

extensa bibliografia (109 referências).

Page 38: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

38

The child with cerebral palsy: diagnosis and beyond. Wood E. Semin Pediat Neurol, 13:

286, 2006.

A autora revê, reportando-se a 99 referências bibliográficas, os dados mais atuais

sobre a Paralisia Cerebral (PC), cuja incidência na atualidade é de 1.5 a 2.5/1000 nascidos

vivos. Considera que, além do diagnóstico, deve-se investigar a etiologia e definir os

distúrbios associados, a fim de poder responder adequadamente às questões dos pais

relativas ao prognóstico e orientar a reabilitação ideal que permita à criança atingir o seu

potencial de desenvolvimento. Quanto ao diagnóstico da PC, que freqüentemente se define

somente após os dois primeiros anos de vida, a autora enfatiza que devem ser consideradas

duas situações distintas, dependendo de existirem ou não fatores de risco já conhecidos.

Os principais fatores de risco perinatais reconhecidamente associados à PC são: no

prematuro, ultrassonografia anormal (leucomalácia periventricular, hemorragia peri ou

intraventricular); no recém-nascido (RN) a termo, a ocorrência de encefalopatia hipóxico-

isquêmica, crises neonatais e infarto arterial cortical. Relativamente a cada fator de risco, a

autora discute as particularidades que permitem determinar o provável desenvolvimento de

PC, dando ênfase à persistência de anormalidades eletrencefalográficas ou de

neuroimagem em exames seriados, à ocorrência de exame neurológico alterado no RN e

por ocasião da alta, bem como à presença de cório-amnionite, trombofilias com alterações

dos fatores de coagulação e aumento da relação lactato/colina na espectroscopia associada

à ressonância magnética. A investigação etiológica é recomendada mesmo naqueles casos

com fatores de risco conhecidos, pois em 15 a 20% se observa associação de dois ou mais

fatores, pré ou perinatais, principalmente a combinação de disgenesias cerebrais com

asfixia, sendo que infecções e fatores tóxicos são menos encontrados.

Por outro lado, nos casos em que não existem fatores de risco identificáveis a

investigação etiológica é essencial, embora estudos genéticos ou metabólicos possam ser

reservados para os casos em que haja história de consangüinidade ou recorrência familiar.

A autora menciona também os possíveis fatores pós-natais, em geral não valorizados;

numa casuística européia recente foram esclarecidos em 99% dos casos, correspondendo

em sua grande maioria a infecções e incluindo também causas vasculares, traumatismos e

reanimação pós-parada cardíaca ou afogamento.

Page 39: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

39

As cifras indicativas de outros comprometimentos associados à seqüela motora são

variáveis, sendo os mais encontrados: epilepsia (25 a 40%), déficit cognitivo (até 65%) e

alterações de visão (9 a 34%), bem como de audição (8%).

Em relação ao estabelecimento do prognóstico, sobretudo quanto à possibilidade de

adquirir marcha independente, a autora indica a adoção de escalas de classificação

funcional, no caso a “Gross Motor Function Classification System (GMFCS)”, que não

somente auxiliam a compreensão do grau de comprometimento por parte dos pais, como

também facilitam a adaptação ao ambiente escolar e a seleção dos métodos de reabilitação.

Outros aspectos da abordagem atual da PC, que a autora enfatiza como sendo muito

positivos para o prognóstico, são o treinamento do “cuidador”, ou seja, os cuidados

centrados na família, e a revisão periódica do progresso do paciente a nível doméstico,

escolar e comunitário.

Em relação aos aspectos específicos do tratamento, é feita uma extensa revisão

sobre a abordagem da espasticidade: sua relação com o estado funcional e com

deformidades da coluna e da articulação coxofemural , os resultados do emprego da toxina

botulínica em casos de espasticidade localizada e, nos casos de espasticidade difusa, o

tratamento oral (benzodiazepínicos, baclofen, tizanidina, dantrolene, modafinil), que ainda

deixa muito a desejar e induz efeitos colaterais. Também é salientado o tratamento

medicamentoso dos diferentes tipos de movimentos involuntários (l-dopa/carbidopa,

trihexyphenidyl, clonazepam, haloperidol, levetiracetam), sendo que os detalhes quanto à

administração das diferentes drogas encontram-se discriminados em uma tabela. São

também recomendados os cuidados de prevenção ou controle das deformidades

esqueléticas em associação com a equipe de reabilitação e com o ortopedista.

Outro aspecto interessante desta revisão é relativo às terapias alternativas: a autora

salienta a importância de que a equipe médica se mantenha atualizada quanto a eventuais

novidades que realmente possam trazer algum benefício neste campo, pois a multiplicidade

de sites na Internet relativos ao assunto gera ansiedade nos pais e pode interferir com os

resultados do tratamento.

Finalmente, a autora analisa o papel fundamental da equipe médica no

acompanhamento do paciente em sua transição para a vida adulta, a fim de apoiá-lo, e à

família, no tipo de inserção social/profissional que está de acordo com o desenvolvimento

alcançado e com a sua potencialidade e grau de adaptação.

Page 40: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

40

DOENÇAS DO NEURÔNIO MOTOR/ ELA Dr. Mário Emílio Teixeira Dourado Júnior

135th ENMC International Workshop: Nutrition in Amyotrophic Lateral Sclerosis.

Ludolph AC et al. Neuromuscular Disorders, 16:530, 2006.

Na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) as principais causas de desnutrição são a

paralisia bulbar associada com disfagia, o aumento das necessidades nutricionais devido ao

gasto respiratório, a diminuição da ingestão alimentar e a desidratação. A desnutrição é um

fator independente predito de expectativa de vida nos portadores de ELA. O risco relativo

de morte é 7,7 vezes maior no paciente desnutrido. Há necessidade de conhecermos como

as intervenções nutricionais devem ser aplicadas nos portadores de ELA e se há

justificativa de intervenções de alto custo.

Na fase inicial, a disfagia pode ser tratada com orientações dietéticas, mudança na

consistência dos alimentos e dos líquidos, prescrição de suplementos hiperprotéicos e

hipercalóricos e educação do paciente e cuidador durante alimentação (técnicas de

compensação e posições, por exemplo, flexão do pescoço durante a deglutição, técnicas

para melhorar a destreza manual). Pacientes com disfagia espástica que apresentam

dificuldade para beber líquidos, podem beneficiar-se com água gelada. Uma boa ingesta

diária de líquidos é importante para melhorar a articulação, manter boa higiene oral e

diminuir a constipação. A participação de fonoaudiólogos é fundamental para a obtenção

de uma deglutição mais eficiente.

Com a evolução da doença essas medidas tornam-se insuficientes e a alimentação

deve ser feita por sondas. Três procedimentos são utilizados: alimentação enteral por sonda

nasoenteral, gastrostomia endoscópica percutânea (GEP) ou gastrostomia radiológica

percutânea. Os benefícios imediatos são: correção da desnutrição, estabilização do peso e

via alternativa para administração de medicamentos.

A GEP tornou-se o procedimento standard para a nutrição enteral nos portadores de

ELA e está facialmente disponível. O procedimento requer sedação moderada, portanto

torna-se de risco em pacientes com insuficiência ventilatória avançada.

Page 41: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

41

Recentemente, um grupo de estudiosos, Europeus e Norte-americanos, realizou um

workshop sobre desnutrição nos pacientes com ELA com a finalidade de definir um

protocolo para otimizar a nutrição.

Foram revisadas as publicações sobre ELA e GEP. Os autores não identificaram

estudos randomizados controlados de GEP nos portadores de ELA. Os resultados foram

variados quanto à sobrevida, mas a sobrevivência média não variou entre os indivíduos que

utilizaram ou não a GEP. A mortalidade após a GEP era elevada em todos os estudos.

Alguns fatores de maior risco do procedimento foram identificados: indivíduos com rápida

deterioração da função pulmonar, aspiração, idade superior a 75 anos.

Os participantes do workshop relataram que a realização da GEP é consenso na

Europa, sendo realizada em 95% dos centros. O objetivo principal da GEP, para muitos

autores, é de melhorar o estado nutricional e não prolongar a vida.

Não existe um consenso de qual é o melhor momento de colocar sonda por GEP ou

se sua implantação aumentará a sobrevida e influenciará na qualidade de vida. Também,

não há evidência que previna a pneumonia aspirativa. Em dois trabalhos analisados pelos

participantes do workshop, o de Ersek e col (J Hospice Palliat Nurs 2003;5:221–30) e o de

Mistsumoto e col (ALS and other motor neuron disorders, 2003;4:177–185), a implantação

da GEP não ofereceu conforto e nem melhora da qualidade de vida.

A recomendação da Academia Americana de Neurologia (Neurology,

1999;52:1311-1323)) é que a sonda por GPE seja colocada nos indivíduos com disfagia

sintomática, antes que a capacidade vital forçada (CVF) esteja abaixo de 50% do predito.

Outro consenso, realizado na Europa (European Jornal of Neurology, 2005;12:921-938),

recomenda a realização da GPE nos pacientes com sintomas de disfagia e sinais de

desnutrição (perda de peso de > de 10%). Segundo a experiência inglesa e italiana, a

gastrostomia pode ser realizada também numa fase avançada da doença especialmente

utilizando a técnica por radiologia. A maior vantagem desse novo método é que não requer

sedação.

A desnutrição é um fator negativo na sobrevida. Aproximadamente 15 a 55% estão

desnutridos em todo o estágio da doença.

Avaliações antoprométricas, medida da bioimpedância e calorimetria indireta,

procedimentos utilizados para avaliação do estado nutricional, foram discutidos no

workshop. Um dos participantes revisou a utilização da bioimpedância em ELA. Esse

Page 42: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

42

método utiliza um aparelho que mede a gordura corporal através de uma corrente elétrica

de baixa intensidade. A técnica é fácil realização e não invasiva. A quantidade de gordura

diminui proporcionalmente com a piora da disfagia e incrementa com a utilização de

alimentação enteral. A bioimpedância pode estar alterada numa fase precoce da doença

quando os outros parâmetros nutricionais ainda estão normais. Trata-se de um novo

método para avaliar o estado nutricional global dos portadores de ELA.

O uso de medicamentos antioxidantes, em especial as vitaminas E e C, também foi

discutido, assim como a relação entre a insuficiência respiratória e a nutrição. Durante

alimentação há um aumento na produção de CO2. A desnutrição provoca efeito negativo

na função respiratória causando alterações anatomofuncionais nos pulmões e nos músculos

respiratórios. Os pacientes sob ventilação mecânica estão hipermetabólicos.

Os autores recomendam monitorar o estado nutricional durante toda a evolução da

doença, já que a suplementação alimentar será guiada segundo as necessidades do

indivíduo. Por exemplo, numa fase de descompensação de uma insuficiência ventilatória

crônica, a reposição de calorias, de eletrólitos e de líquidos deve ser calculada e

administrada com presição para evitar o estresse metabólico.

Por último, foi mostrado um estudo americano sobre intervenção precoce

nutricional e respiratória nos indivíduos com ELA. A hipótese é que os indivíduos com

ELA tratados precocemente com ventilação não invasiva (CVF 80% do predito) mais

intervenção nutricional (manter o balanço energético), ambas as modalidades atuando

sinergicamente, apresentam melhora na qualidade de vida e aumento na sobrevida. Um

outro trabalho foi mostrado pelo grupo holandês. Trata-se de um estudo randomizado para

determinar o melhor tempo de indicar a GPE. Os critérios de seleção são disfagia leve e

CVF acima ou igual a 65%. Serão randomizados com GPE precoce ou não. Selecionarão

120 indivíduos, sendo 60 de cada grupo. A sobrevida será o ponto principal a ser analisado.

Page 43: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

43

Artificial nutrition and hydration at the end of life: Ethics and evidence. Ganzinil L.

Palliative and Supportive Care, 4:135, 2006.

O periódico Palliative and Supportive Care, na edição do mês de junho de 2006,

publicou a conferência, organizada e realizada no Baystate Medical Center, Springfield,

Massachusetts-EUA, sobre aspectos éticos e legais dos cuidados paliativos tomando como

exemplo o caso de Terri Schiavo.

O Caso Terri Schiavo provocou grandes discussões nos Estados Unidos, assim

como em outros países, quanto ao uso de nutrição enteral e hidratação (NEH) em

indivíduos com doenças severas.

Theresa Marie (Terri) Schindler-Schiavo, de 41 anos, teve uma parada cardíaca, em

1990. Desde então, devido a anoxia cerebral, ficou em estado vegetativo permanente. O

esposo, Michael Schiavo, desejava que a sonda de alimentação fosse retirada, enquanto

que os pais de Terri, Mary e Bob Schindler, lutaram para que a alimentação e hidratação

fossem mantidas. Após longa disputa familiar, judicial e política, teve retirada a sonda que

a alimentava e hidratava, no dia 19 de março de 2005, vindo a falecer em 31 de março de

2005.

A Dra Linda Ganzinil, no seu artigo, revisa as evidências do benefício da NEH em

Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), Estado Vegetativo Permanente, Demência e Câncer

e os princípios éticos que servem de base para cessar essa forma de tratamento.

Os princípios de autonomia, beneficência e não maleficência foram recordados pela

autora. Considerando a NEH como tratamento médico, um indivíduo autônomo pode

recusar tal tratamento. É recomendado um termo de consentimento para a realização da

gastrostomia endoscópica percutânea (GEP).

Não há diferença ética e legal entre não colocar ou remover o tubo para NEH.

Entretanto, para muitos médicos essas decisões são diferentes. Removendo a GEP, quando

é a única fonte de alimento e hidratação, muitos clínicos acham que estão “matando” o

paciente. Alternativamente, não indicar a colocação do tubo para NEH é percebido como

uma permissão para uma morte natural. Para muitos médicos a suspensão da ventilação

mecânica ou diálise é permitida, mas cessar a NEH não é aceitável.

Os benefícios da GEP são: tratamento paliativo (melhora do estado nutricional,

mais conforto, via de acesso para medicamentos) e aumento na sobrevida.

Page 44: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

44

No Estado Vegetativo Permanente a GEP claramente aumenta a sobrevida,

entretanto não há evidências de aumento nas outras enfermidades.

Diferentes das outras doenças, na ELA o paciente mantém a autonomia de decidir

até uma fase avançada da enfermidade. Os trabalhos realizados em ELA são conflitantes

quanto ao benefício de aumentar a sobrevida com a GEP, na verdade, para alguns autores,

o que acontece é uma conduta paliativa melhorando o estado nutricional, diminuindo o

medo de sufocamento e reduzindo o esforço para comer e o tempo gasto em administrar

comidas ou medicamentos.

No mesmo volume dessa revista há outros artigos de grande interesse. Recomendo

a leitura do artigo escrito pelo Teólogo John J Paris (Palliative and Supportive Care

2006:4,117–120) sobre a visão da tradição católica aos pacientes no fim da vida. É

discutido se a NEH é uma medida natural ou ato médico, se é extraordinária ou ordinária.

Page 45: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

45

NEUROGENÉTICA Dr. Renato Puppi Munhoz

Frequency of LRRK2 mutations in early- and late-onset Parkinson disease. Clark LN

et al. Neurology, 67: 1786, 2006.

Mutações no gene LRRK2 (leucine-rich repeat kinase-2, antigo PARK8), que

codifica a proteína dardarina, estão relacionadas à doença de Parkinson (DP). A mutação

mais comum, G2019S, localizada no exon 41 de LRRK2, esta relacionada tanto a casos

familiares (2.8 a 6.6%) quanto esporádicos (1.6%) de DP, com freqüência

excepcionalmente alta em Árabes Norte Africanos (39%) e judeus Ashkenazi (18.3%).

O objetivo deste estudo foi o de avaliar a freqüência de mutações em LRRK2 em

pacientes com DP de início precoce (<50 anos de idade) e tardio.

Quinhentos e quatro pacientes com DP e 314 controles foram genotipados. Vinte e

oito pacientes com DP (5.6%) e 2 controles (0.6%) apresentaram a mutação G2019S

heterozigota (p < 0.01). Pacientes com a mutação tinham idade de início de DP entre 31 e

78 anos, com proporção semelhante de indivíduos com início precoce e tardio (4.9% vs

6.2%, p = 0.56). A mutação foi mais freqüente entre judeus (9.9% vs. 3.1% p < 0.01) e

entre aqueles com história familiar de primeiro grau de DP (11.5% vs. 4.6%), chegando a

26.1% nos judeus com história familiar. Não houve diferença clinica entre aqueles com e

sem a mutação.

Este estudo foi o primeiro a comparar a presença de mutações em LRRK2 em

pacientes com DP de início precoce e tardio, demonstrando que casos de DP precoce e

tardio têm 7.7 e 10 vezes respectivamente mais chances de ter esta mutação que controles.

Desta forma o estudo sugere que mutações em LRRK2 são um fator de risco significativo

para a DP com idade de início ampla e confirma a impressão já descrita de uma freqüência

maior em judeus.

Page 46: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

46

Fragile X premutation with atypical symptoms at onset. Cellini E et al. Arch Neurol,

63: 1135, 2006.

A síndrome do X frágil com fenótipo de retardo mental e estigmas físicos clássicos

resulta da expansão do trinucleotídeo CGG no gene FMR1. Normalmente, este gene tem 6

a 40 repetições de CGG, enquanto que a mutação completa é observada naqueles com mais

de 200 repetições. Indivíduos com expansões intermediárias são chamados de portadores

da pré-mutação do X frágil (FXP) que recentemente foi associada à síndrome de

tremor/ataxia ligada ao X frágil (FXTAS). A FXTAS geralmente se manifesta mais

comumente em homens na sexta década com ataxia de marcha, tremor de ação, déficit

executivo, vários graus de neuropatia periférica e parkinsonismo leve ocasional. A

freqüência de portadores de FXP é estimada em 1 para cada 260 mulheres e 1 para cada

760 homens com uma penetrância para FXTAS ao redor de 50% na idade de 60 anos e

100% em indivíduos acima dos 80 anos de idade.

Este estudo avaliou a presença de FXP entre 142 indivíduos do sexo masculino com

ataxia esporádica de início entre os 30 e 84 anos de idade e estudos negativos para os genes

conhecidos de ataxia espinocerebelar. Alelos com FMR1 expandidos na faixa de pré-

mutação foram detectados em 3 (2.1%) indivíduos. Dois deles apresentavam o fenótipo

típico de FXTAS. O terceiro curiosamente apresentava paraparesia espástica sem sintomas

ou sinais evidentes de ataxia.

O estudo demonstra que mesmo sendo a FXP relativamente rara em pacientes com

ataxia esporádica de início tardio, deve ser lembrada como diagnóstico diferencial. Além

disso, apesar da pendência de casuísticas maiores que confirmem apresentações atípicas, o

estudo amplia o fenótipo desta doença, podendo incluir paraparesia.

Page 47: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

47

LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO Dr. Luís dos Ramos Machado

The role of antibody affinity for specific antigens in the differential diagnosis of

inflammatory nervous system disorders. Giovanonni G, Chapman MD, Thompson EJ.

J Neuroimmunol 2006; 180: 29-32.

Com a elegância habitual, neste artigo de revisão dedicado à memória do Dr. Don

Paty, Edward Thompson e sua equipe estudam um tema intrigante e de grande atualidade.

Frequentemente, o achado de anticorpos no líquido cefalorraquidiano (LCR)

apresenta dificuldades de interpretação. Uma delas é saber se o processo patológico que

originou esses anticorpos (específicos ou inespecíficos) está em atividade ou não. Por

exemplo: numa amostra de LCR de um doente com diagnóstico de esclerose múltipla (EM)

podem ser encontrados anticorpos para herpes simples tipo 1 (HSV-1) juntamente com

aumento de globulinas gama. Qual o significado disso?

Thompson e sua equipe acreditam que o estudo da afinidade desses anticorpos em

relação a seus antígenos pode ajudar de modo muito importante a responder a esta questão.

Sabe-se que: (a) as pontes que “seguram” o antígeno na “chave” do anticorpo são

primariamente pontes de hidrogênio; (b) existem moléculas que podem quelar essas

pontes, como o NaI (iodeto de sódio) e o NaSCN (isotiocianato de sódio); (c) a ação desses

quelantes aumenta com a sua concentração.

Inicialmente, os autores consideram a fisiopatologia normal em contraposição à

fisiopatologia anormal da reação antígeno-anticorpo.

1. a fisiopatologia normal

Durante a exposição a um determinado antígeno, existe uma espécie de

“darwinismo molecular” mediante o qual só alguns anticorpos, geralmente os mais jovens

(mais recentes), conseguem proliferar e “sobreviver”, aumentando seus títulos. À medida

que aumentam os títulos, aumenta também a sua afinidade, com uma aderência mais forte

entre antígeno e anticorpo. Com a decorrer do tempo, essa afinidade diminui.

Page 48: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

48

Portanto, utilizando concentrações progressivamente maiores dos quelantes,

especialmente o NaSCN, é possível distinguir populações de anticorpos com diferentes

afinidades. Com baixas concentrações, são eliminados os clones que constituem o

“background policlonal” de anticorpos no LCR. Com as concentrações mais elevadas,

persistem apenas os clones de IgG de maior afinidade.

2. a fisiopatologia anormal

Fazendo a “titulação” da afinidade de anticorpos, é possível determinar se a

exposição do anticorpo ao antígeno é recente ou não.

Provavelmente o exemplo mais estudado seja o da toxoplasmose. No soro da

criança com suspeita da doença podem coexistir: (1) os anticorpos herdados passivamente

da mãe; (2) aqueles produzidos pela criança realmente infectada, mais jovens e, portanto,

com maior afinidade.

Algo semelhante ocorre em relação à esclerose múltipla: os anticorpos contra os

mais variados antígenos que têm sido detectados no LCR (sarampo, herpesvírus, Clamydia,

HTLV-I e outros) são, invariavelmente, anticorpos de baixa afinidade e, portanto, não

relacionados etiologicamente à doença.

Sabe-se também que, em doenças infecciosas conhecidas, como a

meningoencefalite herpética (MNE), é frequente o achado de outros anticorpos, como do

sarampo, por exemplo. Neste caso, também esses anticorpos são de baixa afinidade.

Por outro lado, é intrigante que, na panencefalite esclerosante subaguda, os

anticorpos detectados no LCR permaneçam com alta afinidade contra o vírus do sarampo,

como acontece invariavelmente.

3. maturação da afinidade em um paciente com MNE: perspectiva para o futuro?

Foram estudadas amostras pareadas de soro e de LCR (dias 1, 6 e 15) de um doente

com MNE comprovada por PCR.

No LCR: (a) a amostra do dia 1 apresentava apenas padrão policlonal de IgG, de

baixa afinidade; (b) as amostras do dia 6 e do dia 15 apresentavam bandas oligoclonais de

alta afinidade; (c) a IgG específica aumentou do dia 1 ao dia 15, mas a IgG total diminuiu

do dia 6 ao dia 15, indicando que ocorreu maturação da afinidade no sistema nervoso.

Page 49: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

49

No soro, o padrão oligoclonal apareceu fracamente contra o padrão policlonal de

fundo, indicando uma passagem de anticorpos específicos do LCR para o soro ou,

possivelmente, também uma resposta sistêmica de pequena monta.

4. conclusão

O estudo da afinidade dos anticorpos em relação a seus antígenos constitui um

passo adicional aparentemente importante: (a) para caracterizar anticorpos “inocentes”

relacionados a antígenos não envolvidos na doença; (b) para determinar se os anticorpos

encontrados podem caracterizar a fase ativa da doença ou se são apenas anticorpos de

memória.

Page 50: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

50

CEFALÉIA Drª. Célia Aparecida de Paula Roesler

Repression of stimulated calcitonin gene-related peptide secretion by topiramate.

Durham PL et al. Headache, 46: 1291, 2006.

O objetivo deste estudo era determinar os efeitos do topiramato na liberação de CGRP,

importante neurotransmissor trigeminal, a partir de neurônios cultivados do gânglio de

Gasser de ratos. Muitos estudos evidenciaram que o topiramato, uma droga antiepilética,

pode ser muito eficaz na prevenção de migrânea. Em diversos estudos, o topiramato exibiu

altas taxas de resposta, boa tolerabilidade e não apresentou a maioria das contra-

indicações. Dados de estudos anteriores sugerem que o topiramato pode modular a

atividade dos neurônios trigeminais.

Neste artigo, foram mostradas evidências de que o topiramato pode inibir a secreção de

neurônios trigeminais ativados. No modelo de migrânea atual, a ativação dos aferentes

trigeminovasculares causa a liberação de CGRP e outros neuropeptídeos, o que contribui

para a dor, sensibilização central e alodina. Baseado nesses dados, foi proposto que o

topiramato diminui a freqüência e severidade das crises de migrânea devido a sua

habilidade de inibir a liberação de CGRP.

Tryptophan depletion increases nausea, headache and photophobia in migrane

suffers. Drummond PD. Cephalgia, 26: 1225, 2006.

Neste estudo foi investigada a sensibilidade à luz 5 e 8 horas após o consumo de

uma bebida protéica que continha L-triptofano ou que produzia uma redução em curto

tempo na síntese de serotonina no cérebro pela omissão de L-triptofano. Foram também

reportados os efeitos da depleção de triptofano nos participantes com sintomas decorrentes

da estimulação opticocinétca.

Indução da dor por exposição à luz foi maior em condições de depleção de

triptofano do que numa condição balanceada de proteínas, tanto em sofredores de migrânea

Page 51: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

51

como no grupo controle. Depleção de triptofano aumentou a dor de cabeça somente em

sofredores de migrânea e em ambos os grupos de estudo agravou a náusea.

Os resultados sugerem que a redução de síntese de serotonina no cérebro intensifica

fotofobia e outros sintomas de migrânea e, portanto, pode contribuir para a patogênese da

migrânea. A correção dessa deficiência poderia prevenir esses sintomas antes e durante as

crises e, como efeito prolongado, reduziria a vulnerabilidade à migrânea. A depleção de

triptofano pode ser uma útil ferramenta para a investigação de novos tratamentos em que o

alvo central seria a sobrecarga de serotonina ou em que o objetivo seria o bloqueio dos

sintomas da migrânea.

Page 52: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

52

HOMENAGEM ESPECIAL

Quem foi Edgard Raffaelli Jr.

Dr. Raimundo Pereira da Silva Neto

O SONHO DE SER PILOTO

Edgard Raffaelli Jr., o criador da teoria límbica que revolucionou a fisiopatologia

da enxaqueca, nasceu na cidade de São Paulo no dia 02 de março de 1930. Este

descendente de italianos deixa um legado no campo da cefaliatria que permanecerá por

várias gerações, pois expressões como “migrânea”, “cefaléia em salvas”, “sálvico”,

“cefalêico” e “cefaliatria”, foram todas criadas por este gênio.

Quando criança manifestou uma disfunção límbica com cefaléia. Inicialmente, era

uma cefaléia do tipo tensional episódica (CTTE), mas que aos 19 anos passou a ser uma

cefaléia do tipo tensional crônica (CTTC). Somente aos 29 anos veio a ter a primeira crise

de migrânea sem aura; lembra-se de três crises isoladas de cefaléia em salvas em uma

semana, aos 34 anos, e que nunca mais se repetiram; aos 43 anos teve uma cefaléia

cervicogênica às custas do nervo occipital menor direito após um “whiplash” e a partir

também dessa idade começou sentir cefaléia idiopática em facada. Não esquece que desde

a adolescência tem uma migrânea cardíaca que ainda, às vezes, o incomoda – só ela, por

que todas as outras ele resolveu uma a uma.

Ainda na infância sonhava em ser piloto de avião. Sempre teve uma paixão pelo

Spitfire e como aeromodelista vivia construindo pequenos Spitfires. Na era de 1945,

quando a 2ª Guerra Mundial ainda rugia na Europa, saía no Jornal A Gazeta o seguinte

anúncio: “A Real Força Aérea Canadense tem mais Spitfires do que pilotos e está

aceitando voluntários. Idade mínima: 18 anos”.

Naquele ano, Raffaelli ainda não estava na maioridade, mas não teve dúvidas,

alterou sua certidão de nascimento para 18 anos (possuía corpo e aparência de 20 anos) e

procurou o Ministério da Aeronáutica onde aceitavam inscrições para a Real Força Aérea

Page 53: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

53

Canadense. Foi submetido a vários testes, incluindo acrobacias aéreas no Aeródromo

Campo de Marte, em São Paulo. Foi aprovado em todos, com exceção do exame

oftalmológico. A miopia o reprovou.

Tiveram razão aqueles examinadores. Se Raffaelli tivesse sido piloto,

provavelmente, a cefaliatria brasileira não teria alcançado tão alto vôo.

No início da adolescência despertou o interesse pelas línguas estrangeiras, dentre

elas o italiano, o francês e o inglês. Este último estudou na Cultura Inglesa de São Paulo

durante sete anos e, após seu término, foi avaliado através de prova escrita e oral por

professores da “University of Cambridge” da Inglaterra, em 1949, recebendo o “Certificate

of Proficiency in English”. Graças ao seu domínio nas línguas pôde lecionar inglês durante

todo o curso de medicina, para a sua sobrevivência, como também desbravar o mundo.

Viajou por vários países sempre em busca de conhecimentos.

Quando viu seu sonho de piloto desmoronar-se partiu em busca de novos

horizontes. O sonho havia acabado, mas a paixão pelo Spitfire permaneceria por toda a sua

vida. Uma prova disso é que hoje guarda como recordação na sua cabeceira um quadro de

40x90cm mostrando um Spitfire em pleno vôo.

O INGRESSO NA FACULDADE

Decidiu que iria ser médico para estudar o cérebro. Somente aos 24 anos (em 1954)

ingressou na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Naquele

tempo, a maioria dos formandos da USP estava concluindo o curso médico com essa idade.

Inicialmente, pensou em ser psiquiatra, mas no decorrer da faculdade optou por neurologia.

Em 1956, no 3o ano da Faculdade, resolveu consultar aquele que lhe disseram ser

um dos melhores neurologistas do Hospital das Clínicas (HC) para tratar a sua cefaléia (na

época era uma CTTC), e ele, após perguntar o que tinha, pediu-lhe um líquor suboccipital.

Quando lhe levou o resultado, ele disse: “A pressão está meio alta. Vá colher outro líquor”.

Obedientemente submeteu-se a outra punção e quando lhe levou o resultado, ele disse: “O

líquor está normal, nem sífilis tem! Vá tratar sua cefaléia na Psiquiatria”. Saiu da sala dele

dizendo a si mesmo que se os melhores neurologistas do HC não conheciam cefaléia, ele

iria estudá-la – e por isso faz 50 anos que se dedica ao assunto.

Page 54: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

54

A VIDA PROFISSIONAL

Formou-se em medicina em 1959 e, imediatamente, resolveu especializar-se em

Neurocirurgia. Concluiu a Residência Médica no Hospital das Clínicas da USP, em 1962.

A partir daí exerceu suas atividades em diversos hospitais de São Paulo. Foi médico

auxiliar, por concurso público, da Clínica Neurológica do HC-USP, até 1965; Neurologista

e Neurocirurgião do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, no período de

1963 a 1970; Professor Auxiliar de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da

Santa Casa de Misericórdia de São Paulo de 1966 a 1969; Chefe do Serviço de Neurologia

e Neurocirurgia do Hospital e Maternidade Brasil de Santo André de 1970 a 1976.

O Doutoramento em medicina ocorreu em 1973 pelo Departamento de

Neuropsiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com a tese:

“Aneurismas Infecciosos”.

Fundou a primeira clínica especializada no tratamento das cefaléias na América

Latina, em 1975 em São Paulo e que mantém ligações internacionais com o Migraine Trust

de Londres (Dra. Márcia Wilkinson), Centro de Cefalee de Florença (Prof. Federigo

Sicuteri), Centro de Cefalee de Turim (Prof. Giovani Nattero), Headache Clinic of The

Faulkner Hospital, Boston (Dr. John Graham), Headache Clinic of Chicago (Dr. Seymour

Diamond), Headche Clinic of Hospital Mount Sinai, New York (Dr. David Coddon),

Headache Clinic of Surrey County Hospital, Guildford, Inglaterra (Dr. J. Desmond

Carroll), Headache Clinic Encino, Califórnia (Dr. Lee Kudrow), Grupo Australiano,

liderado por Dr. James Lance e o Grupo Escandinavo (Noruega), liderado por Ottar

Sjaastad.

A sua clínica tornou-se referência no tratamento de pacientes com cefaléia. Ele foi,

seguramente, o primeiro médico na América Latina a usar o propranolol como droga

preventiva da migrânea, com início em 1968. Esta medicação ele usou em si próprio até

1976, quando teve a última crise de cefaléia, de curta duração e de fraca intensidade.

Enquanto Raffaelli usava propranolol no Brasil, John Graham também usava com a

mesma finalidade nos EUA, mas que logo abandonou porque naquele país não se pode

prescreveu uma medicação que não é aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA)

para aquele uso.

Raffaelli passou a enfrentar problemas com a prescrição de propranolol porque na

sua bula não havia nenhuma referência de sua indicação para cefaléia. Alguns pacientes se

Page 55: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

55

recusavam a usá-lo por não terem hipertensão arterial ou alguma doença cardíaca. A partir

de 1970, tal problema foi solucionado ao formular todas as suas prescrições. Naquele

tempo, as farmácias de manipulação de São Paulo só preparavam fórmulas magistrais

(aquelas que apareciam nos livros de medicina). Raffaelli foi o primeiro médico brasileiro

a criar fórmulas não magistrais.

A partir de 1973 já não conseguia mais progredir no estudo das cefaléias aqui no

Brasil. Desde então começou a participar de todos os congressos de cefaléia na Europa e

nos Estados Unidos (em média quatro ao ano), sem jamais encontrar outro brasileiro (e isso

continuou assim até 1983), e só duas ou três vezes encontrando outro latino-americano, o

Prof. Gustavo Poch, catedrático de Neurologia na Universidade Ramos Mejia, de Buenos

Aires.

Naquele ano saiu do Brasil pela primeira vez para participar do Congresso

Panamericano de Otoneurologia, em Santiago (Chile), com apresentação de um trabalho.

Em seguida foi à Europa participar do Meeting de Cefaléia durante o X Congresso

Internacional de Neurologia, em Barcelona, onde apresentou dois trabalhos, num deles,

“Evolutive clinical picture of chronic headache”, pela primeira vez lançou sua teoria de

que a migrânea tem sua origem no sistema límbico. Neste congresso de Barcelona não

existiam mais do que 30 médicos interessados por cefaléia no mundo e desse pequeno

grupo pioneiro, do qual se orgulha de pertencer, é que existe a plêiade de 2.000 a 3.000

participantes nos congressos atuais. Também foi em Barcelona que conheceu o norueguês

Ottar Sjaastad, do qual é amigo pessoal há 33 anos, o australiano James Lance e o italiano

Federigo Sicuteri. Estes dois últimos foram “chairman” quando da apresentação dos seus

trabalhos.

Dentre os inúmeros congressos que participou vale a pena destacar o XVI Annual

Meeting da American Association for the Study of Headache na cidade de Chicago, em

1974, quando ministrou a conferência “Migraine and the limbic system”, a convite de John

R. Graham, que era o secretário dessa importante associação fundada em 1960. Nessa

ocasião, foi proposto e aceito para membro da American Association for the Study of

Headache. Enquanto que no Joint Meeting da American Association for the Study of

Headache, realizado em Bergen (Noruega), em 1975, foi proposto e aceito para membro da

Scandinavian Migraine Society.

Page 56: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

56

A sua última viagem ao exterior foi para participar do XI Congresso Internacional

de Cefaléia, que aconteceu em Roma (Itália), em setembro de 2003. E nesses 30 anos

participou de mais de 60 congressos sobre cefaléia na Europa e nos Estados Unidos e em

inúmeros congressos e cursos no Brasil e na América Latina.

A ORGANIZAÇÃO DA SBCe

Cansado de procurar outro brasileiro que se interessasse por cefaléia, pediu a um

amigo seu ortopedista, Júlio Casoy, que era médico do Laboratório Sandoz, que lhe

ajudasse. O Casoy com dificuldade encontrou dois colegas no Brasil que estavam também

trabalhando com cefaléia: o Wilson Farias da Silva, em Recife e o Gilberto Rebello de

Mattos, em Salvador. Isto ocorreu em 1976 quando marcaram um encontro com os dois em

Salvador e nesse encontro combinaram em montar uma Sociedade Brasileira de Cefaléia.

Naquela época já existiam no mundo outras sociedades para o estudo da cefaléia,

dentre as quais se destacam a americana (American Association for the Study of Headache

– AASH, fundada em 1959), a britânica (British Migraine Society, fundada em 1965) e

escandinava, a italiana e a canadense fundadas entre 1965 a 1978.

Não foi uma tarefa fácil; só em 1978 Raffaelli conseguiu reunir 14 colegas (alguns

muitos, outros poucos) interessados em cefaléia, e no dia 19 de maio de 1978 criou a

Sociedade Brasileira de Cefaléia e Enxaqueca (SBCe). A adenda “e Enxaqueca” foi para

evitar que algum outro grupo inventasse criar uma Sociedade Brasileira de Enxaqueca,

omitindo a cefaléia. Somente em 1992, não mais temendo que se fundasse outra Sociedade

no Brasil, mudou-se o nome para Sociedade Brasileira de Cefaléia.

Raffaelli foi o comandante que determinou o plano de vôo da SBCe, pois dos 14

fundadores, sete compareceram apenas à reunião de fundação da Sociedade, assinaram a

ata, mas não persistiram no assunto. A lista dos fundadores da SBCe com suas respectivas

especialidades encontra-se na Tabela 1.

Page 57: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

57

Tabela 1 – Relação dos 14 fundadores da Sociedade Brasileira de Cefaléia com suas respectivas especialidades.

Membro Cidade Especialidade

Edgard Raffaelli Jr São Paulo – SP Neurologista

Wilson Farias da Silva Recife – PE Neurologista

Roberto Melaragno Filho São Paulo – SP Neurologista

Wilson Luiz Sanvito São Paulo – SP Neurologista

Nelson Augusto Pedral Sampaio São Paulo – SP Ginecologista

Orlando J. Martins São Paulo – SP Neurologista

Reinaldo de Souza Correia São Paulo – SP Psiquiatra

Gilberto Rebello de Mattos (*) Salvador – BA Neurologista

Luís Gustavo Hummed (*) São Paulo – SP Otorrinolaringologista

Osmar Trojan (*) São Paulo – SP Ginecologista

Julio Casoy (*) São Paulo – SP Ortopedista

Ozir Scarante (*) São Paulo – SP Neurologista

José Ivan Cipoli Ribeiro (*) Londrinas – PR Neurologista

Antonio Douglas Menon (*) São Paulo – SP Otorrinolaringologista

(*) Compareceram apenas à reunião de fundação da SBCe.

Em 1979, nos dias 9 e 10 de março, organizou o 1o Congresso Brasileiro de

Cefaléia, no Hospital do Servidor Público Estadual, em São Paulo, para o qual convidou

John Graham, Federigo Sicuteri e Gustavo Poch. Teve medo de não conseguir uma platéia

adequada, mas, para sua surpresa, tiveram 126 inscrições. Entusiasmado pelo bom

resultado obtido, no mesmo ano de 79 organizou outro curso de Cefaléia que teve lugar no

Hospital Albert Einstein, em São Paulo. A partir daí, a Sociedade Brasileira de Cefaléia

passou a organizar uma reunião anual (Simpósio, Curso ou Congresso), conforme Tabela

2.

Page 58: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

58

Tabela 2 – Relação dos Simpósios, Cursos de atualização e Congressos da Sociedade Brasileira de Cefaléia.

EVENTO DATA LOCAL

I Simpósio 09 e 10/03/79 Hospital Servidor Público Estadual

I Curso 11 a 13/10/79 Hospital Albert Einstein

II Curso 17 e 18/10/80 Foz do Iguaçu

II Simpósio 20 e 21/11/81 Recife – PE

III Curso 25 e 26/11/82 Laboratório Ache

III Simpósio 25 e 26/11/83 Laboratório Ache

IV Curso 30/11 e 01/12/84 Laboratório Ache

IV Simpósio 29 e 30/11/85 Laboratório Ache

V Curso 28 e 29/11/86 Centro de Convenções Rebouças

V Simpósio 13 e 14/11/87 Centro de Convenções Rebouças

VI Curso 11 e 12/11/88 Centro de Convenções Rebouças

VI Simpósio 24 e 25/11/89 Centro de Convenções Rebouças

VII Curso 16/03/91 Ribeiro Preto – SP

VII Simpósio 08 e 09/11/91 Associação Paulista de Medicina

VIII Curso 23 e 24/03/93 Associação Paulista de Medicina

VIII Simpósio 15 e 16/04/94 Associação Paulista de Medicina

IX Congresso 31/03 e 01/04/95 Associação Paulista de Medicina

X Congresso 29 e 30/03/96 Associação Paulista de Medicina

XI Congresso 05/97 Ribeirão Preto – SP

XII Congresso 28 a 30/05/98 Ribeirão Preto – SP

XIII Congresso 13 a 15/05/99 Salvador – BA

XIV Congresso 01 a 03/06/00 São Paulo – SP

XV Congresso 27 a 29/09/01 Rio de Janeiro – RJ

XVI Congresso 25 a 27/07/02 Rio de Janeiro – RJ

XVII Congresso 21 a 23/08/03 Recife – PE

XVIII Congresso 05 a 07/08/04 Curitiba – PR

XIX Congresso 15 a 17/09/05 Fortaleza – CE

XX Congresso 19 a 21/10/06 Belo Horizonte – MG

Nota: Não houve nenhuma reunião da SBCe nos anos de 1990 e 1992; O XXI Congresso será em Florianópolis - SC,

no período de 20 a 22/09/07 e o XXII Congresso, em Natal – RN, no ano de 2008.

Foram muitos os convidados estrangeiros (Tabela 3) que conseguiu trazer para

ministrarem aulas nos congressos de cefaléia através de sua amizade pessoal, dentre eles

está o Dr. Ottar Sjaastad que veio ao Brasil seis vezes (duas vezes pagando sua própria

passagem). Além de Sjaastad, todos os outros conferencistas vieram somente pela amizade;

nenhum deles pediu qualquer “Grant” pela sua colaboração.

Ele queria trazer mais conferencistas do exterior, mas suas possibilidades

financeiras eram limitadas. O Laboratório Sandoz, que tinha sido seu aliado firme desde

1973, desinteressou-se da cefaléia assim que a Sociedade foi fundada, em 1978. Não foi

Page 59: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

59

tarefa fácil conseguir apoio de outros laboratórios farmacêuticos: simplesmente não havia

interesse comercial pelo assunto.

Tabela 3 – Relação dos convidados estrangeiros pela SBCe para ministrarem aulas nos congressos de cefaléia

Nome do convidado País de origem

Alan M. Rapoport Stamford (EUA)

André Pradalier Paris (França)

Cristina Perez Uruguai

David W. Dodick EUA

Elza Raimundi Argentina

Federigo Sicuteri Florença (Itália)

Gennaro Bussone Milão (Itália)

Giuseppe Nappi Pavia (Itália)

Gustavo Poch Buenos Aires (Argentina)

James Lance Sidney (Austrália)

Jane R. Gill EUA

John Edmeads Toronto (Canadá)

John Ruskin Graham Boston (EUA)

Jorge Alberto Leston Buenos Aires (Argentina)

José M. Pereira Monteiro Porto (Portugal)

Lee Kudrow Califórnia (EUA)

Lucas Bonamico Buenos Aires (Argentina)

Luis Carlos Sanín Posada Bogotá (Colômbia)

Marcia Wilkinson Londres (Inglaterra)

Margarida Sanchez del Rio Espanha

Maria Nicolodi Florença (Itália)

Massino Leone Pavia (Itália)

Michael Moskowitz Boston (EUA)

Mônica Diez Argentina

Ninan T. Mathew Houston (EUA)

Osvaldo Carlos Bruera Buenos Aires (Argentina)

Ottar Sjaastad (7 vezes) Trondheim (Noruega)

Raymond Maciewicz Harvard (EUA)

Vincenzo Di Monda Brescia (Itália)

Vincenzo Guidetti Roma (Itália)

Um dos maiores problemas era traduzir os nomes das cefaléias do inglês para o

português. Ele mesmo se encarregou dessa tarefa e em 1974 criou o termo “cefaléia em

salvas” para o “cluster headache”. Foi um nome que custou para “pegar”, mas que hoje

está consagrado. Em 1985 criou as palavras sálvico, migrânea, cefaliatria, cefaliatra, que

hoje estão sendo cada vez mais usadas. Publicou o nome “cefaléia em salvas”, pela

primeira vez, em 1979, na primeira monografia jamais escrita em português sobre cefaléia,

Page 60: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

60

e que ocupou quase um número inteiro da revista “ARS CVRANDI”, de São Paulo. Os

outros termos que criou foram publicados num dos anais dos congressos da SBCe, editado

pelo Laboratório Ache, em 1985. Mais tarde, em 1980, veio a escreveu a monografia

“Enxaqueca”, com 40 páginas e editada pelo Laboratório Fontoura-Wyeth, onde destaca

mais uma vez o papel do sistema límbico na gênese da migrânea.

Criou (e batizou com esse nome) a revista Migrâneas & Cefaléias, com a ajuda do

Laboratório Glaxo do Brasil S.A. Seu primeiro exemplar foi publicado em março de 1994

e tinha como redatores o próprio Edgard Raffaelli e Orlando J. Martins. Nesse número, a

matéria de capa tratava do Congresso de Cefaléia Brasil-Itália, realizado nos dia 15 e

16/04/94 e que foi presidido por Edgard Raffaelli.

Nos últimos anos participou como membro titular das seguintes bancas

examinadoras de teses de mestrado: Dr. Marco Antônio Arruda, Faculdade de Medicina de

Ribeirão Preto (21/10/1994); Dr. Jano Alves de Sousa, Faculdade de Medicina da

Universidade Federal Fluminense (14/11/1995); Dra. Carla da Cunha Jevoux, Faculdade de

Medicina da Universidade Federal Fluminense (06/11/1996); Dra. Maria Eduarda Nobre,

Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (14/12/1999) e do Dr.

Abouch Valenty Krymchantowski, Faculdade de Medicina da Universidade Federal

Fluminense (16/05/2000). Participou de uma banca examinadora de tese de doutorado, a do

Dr. Marco Antônio Arruda, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (12/03/1999).

Durante o XII Congresso Brasileiro de Cefaléia (Ribeirão Preto, 1998) recebeu uma

homenagem da SBCe que criou o “PRÊMIO EDGARD RAFFAELLI JR.”: um incentivo

aos pesquisadores brasileiros no campo da cefaléia.

A FUNDAÇÃO DA SOCIEDADE INTERNACIONAL DE CEFALÉIA

Raffaelli fez parte de um seleto grupo que batalhou para a criação de um organismo

mundial que abrigasse os estudiosos de cefaléia e as suas sociedades nacionais. A idéia era

antiga e começou em 1975 com o norueguês Ottar Sjaastad que aos poucos foi

influenciando outras pessoas. Finalmente, em 1980, Federigo Sicuteri, em congresso que

estava sendo por ele organizado em Florença (Itália), criou um comitê para discutir a

fundação de uma Sociedade Internacional de Cefaléia. Esse comitê foi formado por cinco

membros, entre eles Edgard Raffaelli Jr, juntamente com Ottar Sjaastad, (Noruega),

Federigo Sicuteri (Itália), Robert Kunkle (EUA) e J. Desmond Carroll (Inglaterra). Em

Page 61: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

61

1982 o Comitê Organizador reuniu-se em Londres, fundou a International Headache

Society (IHS) e nomeou a primeira Diretoria, da qual Edgard Raffaelli fez parte até 1996.

Como membro da diretoria, Raffaelli ajudou a organizar o primeiro congresso

internacional que aconteceu na cidade de Munique, na Alemanha, em 1983, para o qual

compareceram vários brasileiros. Nesse primeiro congresso Raffaelli foi “Chairman” de

sessão e nomeado membro da Comissão de Ensino da Sociedade Internacional de Cefaléia

e membro do corpo editorial da revista “Cephalalgia” editada em Oslo, na Noruega e que

seria o órgão oficial desta sociedade.

Mais tarde veio a se tornar membro do corpo editorial da revista “Functional

Neurology” editada na Itália, desde 1986. E hoje, Raffaelli é colaborador e editor associado

de várias revistas de Cefaléia e Neurologia.

Teve participação ativa na elaboração da segunda classificação internacional das

cefaléias, em 1988, como membro do Comitê Organizador no período de 1986 a 1988.

Após o congresso de Munique, em 1983, os congressos seguintes têm sido

realizados em anos ímpares e, até hoje, já aconteceram 12 congressos, dos quais Raffaelli

participou de oito (Tabela 4). Atualmente, detém os títulos de organizador e fundador da

Sociedade Internacional de Cefaléia, além de ser seu único membro honorário vitalício na

América Latina.

Tabela 4 – Relação dos congressos realizados pela Sociedade Internacional de Cefaléia

Evento Data Local Organizador

I Congresso Internacional* 14 a 16/09/1983 Munique (Alemanha) Volker Pfaffenrath

II Congresso Internacional* 18 a 21/06/1985 Copenhague (Dinamarca) Jes Olesen

III Congresso Internacional* 23/09/1987 Florença (Itália) Federigo Sicuteri

IV Congresso Internacional 1989 Sidney (Austrália) James Waldo Lance

V Congresso Internacional 30/06 a 03/7/1991 Washington (EUA) Ninan T. Mathew

VI Congresso Internacional* 26 a 29/08/1993 Paris (França) Marie-Germaine Bousser

VII Congresso Internacional* 16 a 20/09/1995 Toronto (Canadá) Marek J. Gawel

VIII Congresso Internacional* 10 a 14/06/1997 Amsterdã (Alemanha) Michel Ferrari & Jean Schoenen

IX Congresso Internacional* 22 a 26/06/1999 Barcelona (Espanha) Felix Titus & Miguel J Láinez

X Congresso Internacional 29/06 a 03/07/2001 Nova Iorque (EUA) Richard Lipton & Frederic Sheftell

XI Congresso Internacional* 13 a 16/09/2003 Roma (Itália) Virgilio Gallai & Giuseppe Nappi

XII Congresso Internacional 09 a 12/10/2005 Kyoto (Japão) Fumihiko Sakai & KMA Welch

*Congressos em que Edgard Raffaelli participou.

**XIII Congresso será realizado em Estocolmo, na Suécia, no período de 28 de junho a 1º de julho de 2007.

Page 62: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

62

SAÍDA DA DIRETORIA DA SBCe da IHS

Durante 20 anos comandou a SBCe (esse Ce foi criado por ele para diferenciar a

Sociedade Brasileira de Cefaléia da SBC, Sociedade Brasileira de Cardiologia) ora como

Presidente ora como Secretário. Ao referir-se aos outros sócios fundadores afirma:

“Durante esses 20 anos, o Sanvito e o Farias ocuparam, às vezes, a presidência, mas

deixaram que eu tocasse a Sociedade para frente porque sabiam que ela era a menina dos

meus olhos”.

Em 1996, saiu da diretoria da SBCe e entregou-a nas mãos de gente mais jovem e

extremamente dedicada (Bordini, Arruda e Ciciarelli) que levou a Sociedade à altura em

que ela está hoje. Nesse mesmo ano, também deixou a diretoria da IHS e o Dr. Carlos

Alberto Bordini, de Ribeirão Preto (SP), que assumiu a presidência da Sociedade Brasileira

passou a ser o representante do Brasil na Sociedade Internacional.

Perguntaram-lhe mais de uma vez: “Por que, Raffaelli, você entregou a Sociedade a

outros quando ela estava pronta para decolar, se foi você quem a construiu peça por peça

até ela estar pronta para voar e na pista de decolagem?” Sua resposta: “Chega a hora em

que os velhos soldados precisam entregar o bastão aos jovens não se preocupando em

colher lucros pelo seu trabalho passado. Não me arrependo; fiz o que foi melhor para a

Sociedade, e todos são testemunhas de que eu não poderia ter melhores seguidores do que

esses rapazes de Ribeirão Preto, que transformaram nossa Sociedade numa das mais

atuantes do Brasil”.

Deixou de vez o comando da Sociedade e foi agraciado com o título de presidente

honorário da Sociedade Brasileira de Cefaléia.

Uma das características de Edgard Raffaelli é a amizade e a gratidão que sente por

muitos de seus discípulos, como é o caso do baiano José Martônio Ferreira de Almeida que

foi responsável pela divulgação da cefaléia em vários estados do Nordeste. Sabe-se que a

SBCe foi fundada em São Paulo e que ficou restrita a este estado e ao Rio de Janeiro, com

pequenas incursões pelo sul do país. Ele precisava de alguém que lhe abrisse o Norte e o

Nordeste, e há cerca de 15 anos pediu ao José Martônio, que freqüentava os cursos há

muitos anos, que organizasse cursos em Salvador e se possível nos outros estados acima

dele. E assim o fez. Além de abrir as portas de Salvador, levou a SBCe a Sergipe, Alagoas

e ao Rio Grande do Norte, emprestando ainda o seu auxílio para que a Paraíba e o Ceará

também entrassem na SBCe.

Page 63: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

63

É dessa maneira que se refere ao Martônio: “um verdadeiro pé-de-boi, um idealista,

se tivéssemos mais Martônios pelo Brasil afora, não estaríamos hoje confinados à área

litorânea, com todo o Centro-Oeste e grande parte do Norte ainda praticamente virgens no

campo da cefaléia”.

Sempre ajudou àqueles que quiseram desbravar os caminhos da cefaléia. Assim

aconteceu ao encaminhar médicos brasileiros para a Escola de Cefaléia que Sjaastad

montou em Trondheim, na Noruega. Na primeira leva de alunos o Brasil foi representado

pela Yara Dadalti Fragoso, que deixou lá a fama de trabalhadora, inteligente e incansável.

A ela seguiram-se o Deusvenir de Carvalho, o Carlos Alberto Bordini e o Maurice Vicent.

Não existiria uma SBCe sem este homem que se aventurou a ser mal falado numa

época em que cefaléia não era bem vista pela classe médica. Graças à sua seriedade e

honestidade emprestando o seu nome à SBCe, a cefaléia brasileira hoje é a 2a/3a do mundo:

somando-se o número de associados da International Headache Society (IHS) vê-se que

depois dos Estados Unidos, o Brasil e a Inglaterra estão empatados.

Raffaelli não gozava de uma boa saúde nos últimos anos. Hipertensão arterial

sistêmica, diabetes mellitus, insuficiência renal crônica e síndrome da fadiga crônica eram

algumas de suas doenças. Na primeira semana dezembro de 2006 apresentou extrema

apatia, sem condições de tomar nenhuma atitude. Foi internado no dia 08/12/06 devido os

exames laboratoriais constatarem um comprometimento acentuado de sua função renal.

Iniciou hemodiálise. Evoluiu com confusão mental e sonolência. Teve alta hospitalar após

13 dias, mas no dia seguinte (22/12/06) teve piora clinica e retornou ao hospital, desta vez

para um Centro de Terapia Intensiva. No dia 29/12/06, às 23h28min, infelizmente, Edgar

Raffaelli Júnior não resistiu à septicemia. E morre aquele que possuiu todos os os méritos

para ser considerado o pai da cefaléia na América Latina.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Raffaelli Jr E. Aneurismas Infecciosos. São Paulo, 1973. Tese (doutoramento) – Departamento de

Neuropsiquiatria, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo.

2. Raffaelli Jr. E. Evolutive clinical picture of chronic headache. In: X Congresso Internacional de

Neurologia, Barcelona (Espanha), 1973.

3. Raffaelli Jr. E. Pizotifen and chronic headache. In: X Congresso Internacional de Neurologia, Barcelona

(Espanha), 1973.

4. Raffaelli Jr E. Atualização em enxaqueca - introdução. Ars Curandi (Supl. especial), 1974;6(12):1-4.

5. Raffaelli Jr E. Atualização em enxaqueca - tratamento. Ars Curandi (Supl. especial), 1974;7(2):11-2.

Page 64: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

64

6. Raffaelli Jr E. Migraine and the limbic system. Aula ministrada no XVI Annual Meeting da American

Association for the Study of Headache, Chicago (EUA), 1974, a convite do Dr. John R. Graham.

7. Raffaelli Jr E. Menon AD. Migraine and the limbic system. Headache, 1975;15(1):69-78.

8. Raffaelli Jr E. O papel da serotonina na cefaléia vascular. A Folha Médica, 1976;72(4):377-80.

9. Raffaelli Jr E. Manifestaciones nocturnas de las jaquecas. Aula ministrada no VI Congresso Peruano de

Psiquiatria, Neurologia e Neurocirurgia e I Congresso Ibero-Americano de Neurologia, Lima (Peru),

1976, a convite do Prof. Gustavo Poch.

10. Raffaelli Jr E. Migraña y el sistema límbico, IX Simpósio Neurológico Ramos Mejía, Buenos Aires

(Argentina), 1977, a convite do Prof. Gustavo Poch.

11. Raffaelli Jr E. Controle das crises de cefaléia vascular com uma nova associação medicamentosa. A Folha

Médica 1977;74(5):557-9.

12. Raffaelli Jr E. Cefaléia crônica. In: Medina J, Salvatores CA, Bastos AC. Propedêutica Ginecológica. São

Paulo: Editora Manole Ltda, 1977, p. 519-24.

13. Raffaelli Jr E. Manifestações noturnas da enxaqueca. Neurobiol 1977;40(4):369-78.

14. Raffaelli Jr E. Migraine: an evolutive limbic dysfunction. In: Ryan & Ryan. Headache and Head Pain –

Diagnosis and Treatment., The C.V. Mosby Co., St. Louis, Missouri, 1978.

15. Raffaelli Jr E. Algias da face. Vida Odontológica, 1979;4:2.

16. Raffaelli Jr E. Cefaléias crônicas e enxaqueca: diagnóstico e terapêutica. Ars Curandi 1979;11(12):5-46.

17. Raffaelli Jr E. Enxaquecas. Edição do Programa Nacional de Atualização Médica. Fontoura-Wyeth, 1980,

n. 2, 40 p.

18. Raffaelli Jr E. Neuropatias na gestação. In: Peixoto S. Pré-natal. São Paulo: Editora Manole Ltda, 1981, p.

551-66.

19. Raffaelli Jr E. Cefaléias e sua importância em Psiquiatria. Rev Bras Med 1981;3(1):26-30.

20. Raffaelli Jr E. Cefaléia tensional e cefaléia tensovascular. In: Curso de Atualização em Cefaléia, 3. São

Paulo, Ache, 1982:22-5.

21. Raffaelli Jr E. Terapêutica da cefaléia tensional e cefaléia tensovascular. In: Curso de Atualização em

Cefaléia, 3. São Paulo, Ache, 1982:22-5.

22. Raffaelli Jr E, Martins OJ, Poça D’água Filho AS. Lisuride in cluster headache. Headache,

1983;23(3):117-21.

23. Raffaelli Jr E. Tratamento dos distúrbios autonômicos nas cefaléias e na clínica geral. In: Curso de

Atualização em Cefaléia, 4. São Paulo, Ache, 1984:55-60.

24. Raffaelli Jr E. Nomenclatura em cefaléias. In: Disfunções autonômicas das cefaléias. 48º Encontro de

Especialistas. Serviço de Informação Ache, São Paulo, 1984;61-4.

25. Raffaelli Jr E, Martins OJ, Poça D’água Filho AS. A role for anticonvulsivants in migraine. Funct Neurol

1986;1(4):495-8.

26. Raffaelli Jr E. Curso Básico de Neurotransmissão. São Paulo, 1988. 1 videocassete (60 min.), VHS, son,

col.

27. Raffaelli Jr E. Cefaléias: como diagnosticar e tratar. Rev Bras Med 1988;45(10):401-7.

Page 65: Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual · relatos isolados de efeito favorável sobre o humor, a ansiedade e agressividade, e por seu efeito antimaníaco na doença bipolar.

65

28. Raffaelli Jr E. Cefaléia cervicogênica. In: Farias da Silva W. Cefaléia: diagnóstico e tratamento. Rio de

Janeiro: Médico Científico Ltda, 1989, cap. 20, 240-1 p.

29. Raffaelli Jr E. Anatomy of the lesser occipital nerve in relation to cervicogenic headache. Clinical

Anatomy 1994;7:90-6.

30. Raffaelli Jr E. Headache and sleep: nocturnal headache, nightmares and lithium. In: The First Pan

American Headache Congress, Cancun (México), jan., 1997.

31. Raffaelli Jr E. O que você deve saber sobre cefaléia. São Paulo: Associação Paulista de Medicina [1992],

100 p.

32. Raffaelli Jr E, Martins OJ. Mitos e verdades: dor de cabeça. São Paulo: Contexto, 1997, 64 p.

33. Raffaelli Jr E, Martins OJ. Dor de cabeça – O que se diz... O que se sabe... São Paulo: Lemos Editorial,

1998, 93 p.

34. Raffaelli Jr E. Migraine awareness, treatment, and education in Brazil. Cephalalgia 1998;18(Suppl

22):67-8.

35. Raffaelli Jr E. Cefaléia e sono: migrânea noturna. In: Reimão R. Sono. São Paulo: Frontis Editorial, 1999,

p. 83-6.

36. Raffaelli Jr E. Cefalea nocturna, sueño y litio. In: Sanín Posada LC, Tan YT. Cefalea y dolor craneofacial.

37. Bogotá: McGraw Hill, 2000, cap. 26, p. 321-3.

38. Raffaelli Jr E, Martins OJ. Metisergida: um fármaco injustiçado. Migrâneas e Cefaléias 2000;3(3):97-9.

39. Raffaelli Jr E. Migrânea tem cura?. Migrâneas e Cefaléias 2003;6(3):92-4.

40. Raffaelli Jr E. A semântica das cefaléias: retrospectiva histórica. Migrâneas e Cefaléias 2004;7(2):70-2.

41. Raffaelli Jr E, Silva Neto R, Roesler CP. Dor de cabeça: um guia para entender as dores de cabeça e seus

tratamentos. Rio de Janeiro: Prestígio Editorial, 2005, 118 p.

42. Raffaelli Jr E, Roesler CP, Silva Neto R. O exame cefaliátrico. São Paulo: Segmento Farma, 2006, 32 p.

43. Raffaelli Jr E, Roesler CP, Silva Neto R. (2006). Nocturnal headache, nightmares and lithium. Trabalho

não publicado, Clínica de Cefaléia e Neurologia Dr. Edgard Raffaelli, São Paulo.

44. Raffaelli Jr E, Roesler CP, Silva Neto R. (2006). The posterior deep temporal artery. Trabalho não

publicado, Clínica de Cefaléia e Neurologia Dr. Edgard Raffaelli, São Paulo.

45. Raffaelli Jr E. (comunicação pessoal, 10 de novembro de 2006). São Paulo, Brasil.

46. Raffaelli Jr E. Paixão pelo spitfire [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por

<[email protected] > em 13 nov. 2006.

47. Raffaelli Jr E. Entrevista sobre dor de cabeça. Disponível em: <http://drauziovarella.ig.com.br/> Acesso

em: 18 nov. 2006.

48. Raffaelli Jr E. Bate-papo com Edgard Raffaelli Júnior. Disponível em:

<http://noticias.uol.com.br/uolnews/saude/entrevistas/2006/01/18/ult2748u100.jhtm> Acesso em: 18 nov.

2006.