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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X ARTISTAS FEMINISTAS E GALERIAS VIRTUAIS: ESPAÇOS ALTERNATIVOS PARA A EXPOSIÇÃO E EXPERIMENTAÇÃO Isadora Maríllia de Moreira Almeida 1 Resumo: Este artigo tem como objetivo investigar como as mulheres artistas jovens e feministas podem fazer uso da internet, seja para expor suas obras ou experimentar novas possibilidades de criação. Pensando na relação entre a forma com que as imagens circulam e o mundo cibernético, será analisado o trabalho de Petra Collins, jovem fotógrafa que faz uso deste espaço. Palavras-chave: mulheres artistas, feminismo, arte, internet Introdução Quando se pensa sobre os direitos e as conquistas das mulheres nos últimos séculos, não se pode negar que foram muitas as mudanças que ocorreram. Entretanto, no que diz respeito ao campo artístico, poucas transformações podem ser percebidas ao que se denomina como história da arte feita por mulheres. Sobre essa participação das mulheres nas artes não só como objeto e tema, mas como criadoras, Nochlin (1973) já questionava os motivos pelos quais nunca houve grandes mulheres artistas. A autora, após uma análise de argumentos e da própria construção da história da arte e conceito de artista, chega na conclusão de que “fazer arte, tanto no desenvolvimento do artista como na natureza e qualidade do trabalho como arte, acontece em um contexto social, são elementos integrais dessa estrutura social e são mediados e determinados por instituições sociais específicas e definidas” (NOCHLIN, 2016, p.20). E, quando se estuda os contextos sociais pelos quais as mulheres durante todo o período de estudo que a história da arte abrange, é fácil perceber que o papel da mulher nas sociedades quase sempre enfrentou barreiras para produzir e expor obras de arte. A partir da década de 1970, algumas mulheres iniciam as pesquisas e questionamentos sobre arte e gênero no meio acadêmico, para tentar compreender o porquê de enxergar a história da arte de uma maneira diferente da que já estava escrita, em que o homem é sempre o protagonista. Simioni (2011) afirma que Pode-se dizer que tais debates tiveram início nos anos de 1970, com o célebre artigo de Linda Nochlin (1973), Why there been no greatest women artists, no qual a autora indagava-se sobre as causas da aparente inexistência das mulheres artistas na história. Ao demonstrar que tais lacunas em nada derivariam da ausência “natural” de talentos, mas sim da exclusão feminina das principais instâncias de formação de carreiras artísticas ao longo dos séculos XVIII e XIX as academias de arte , a autora ensejou um importante 1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Artes, Cultura e Linguagens pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Brasil

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

ARTISTAS FEMINISTAS E GALERIAS VIRTUAIS: ESPAÇOS ALTERNATIVOS PARA

A EXPOSIÇÃO E EXPERIMENTAÇÃO

Isadora Maríllia de Moreira Almeida1

Resumo: Este artigo tem como objetivo investigar como as mulheres artistas jovens e feministas podem fazer uso da

internet, seja para expor suas obras ou experimentar novas possibilidades de criação. Pensando na relação entre a forma

com que as imagens circulam e o mundo cibernético, será analisado o trabalho de Petra Collins, jovem fotógrafa que faz

uso deste espaço.

Palavras-chave: mulheres artistas, feminismo, arte, internet

Introdução

Quando se pensa sobre os direitos e as conquistas das mulheres nos últimos séculos, não se

pode negar que foram muitas as mudanças que ocorreram. Entretanto, no que diz respeito ao campo

artístico, poucas transformações podem ser percebidas ao que se denomina como história da arte

feita por mulheres. Sobre essa participação das mulheres nas artes não só como objeto e tema, mas

como criadoras, Nochlin (1973) já questionava os motivos pelos quais nunca houve grandes

mulheres artistas.

A autora, após uma análise de argumentos e da própria construção da história da arte e

conceito de artista, chega na conclusão de que “fazer arte, tanto no desenvolvimento do artista como

na natureza e qualidade do trabalho como arte, acontece em um contexto social, são elementos

integrais dessa estrutura social e são mediados e determinados por instituições sociais específicas e

definidas” (NOCHLIN, 2016, p.20).

E, quando se estuda os contextos sociais pelos quais as mulheres durante todo o período de

estudo que a história da arte abrange, é fácil perceber que o papel da mulher nas sociedades quase

sempre enfrentou barreiras para produzir e expor obras de arte. A partir da década de 1970, algumas

mulheres iniciam as pesquisas e questionamentos sobre arte e gênero no meio acadêmico, para

tentar compreender o porquê de enxergar a história da arte de uma maneira diferente da que já

estava escrita, em que o homem é sempre o protagonista. Simioni (2011) afirma que

Pode-se dizer que tais debates tiveram início nos anos de 1970, com o célebre artigo de

Linda Nochlin (1973), Why there been no greatest women artists, no qual a autora

indagava-se sobre as causas da aparente inexistência das mulheres artistas na história. Ao

demonstrar que tais lacunas em nada derivariam da ausência “natural” de talentos, mas sim

da exclusão feminina das principais instâncias de formação de carreiras artísticas ao longo

dos séculos XVIII e XIX – as academias de arte –, a autora ensejou um importante

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Artes, Cultura e Linguagens pela Universidade Federal de Juiz de Fora

(UFJF), Brasil

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deslocamento explicativo, inaugurando o que se pode denominar como uma perspectiva

feminista na história da arte. (SIMIONI, 2011, p.2)

Desde então, muito se tem publicado e discutido a partir dos estudos sobre a arte feita por

mulheres nos últimos anos, como por exemplo os temas e a representação nas obras femininas, sua

participação em movimentos artísticos e sua presença em museus (SIMIONI, 2011). Segundo o

National Museum of Women in the Arts, atualmente 51% dos artistas visuais são mulheres, mas

apenas 28% de exposições solo em oito museus selecionados foram femininas durante os anos

20002. E de acordo com as Guerrilla Girls3, menos de 4% dos artistas na seção de Arte Moderna no

Metropolitan Museum of Art, em Nova York, são mulheres, em contrapartida aos 76% de pinturas

que têm como nus o corpo feminino.

Assim como nos museus, a imagem do corpo feminino e de certa forma das mulheres,

invade a vida das pessoas frequentemente (LOPONTE, 2008). Anúncios na televisão, internet e

outdoors são exemplos onde as mulheres aparecem vendendo produtos, e talvez de certa forma

também sendo vendidas.

Pode-se dizer que a circulação de imagens e a maneira como são criadas, compartilhadas e

interagem com os expectadores é algo característico do tempo em que se vive. Hoje em dia, o

mundo é permeado por imagens que não se limitam apenas às fotografias e pinturas físicas, e o

universo digital proporciona espaços essenciais para a visualização de conteúdo como vídeos,

fotografias, gifs, pinturas, ilustrações, dentre outros. Mirzoeff aponta que:

A vida moderna toma lugar na tela. A vida nos países industrializados é cada vez mais

vivida sob vigilância contínua por câmeras em ônibus e shoppings, rodovias e pontes, e ao

lado de caixas eletrônicos. Mais e mais pessoas olham para trás, usando dispositivos que

2 FONTE: Did you know? Get the facts about gender disparity in the arts, and see what the Guerrilla Girls have to say.

Disponível em: https://nmwa.org/advocate/get-facts. Acesso em 16/08/2016 3 As Guerrilla Girls são um grupo ativista feminista, que se denomina como “Nós somos vingadores feministas

mascarados na tradição de bem feitores anônimos como Robin Hood, Mulher Maravilha e Batman. Como expor o

sexismo, o racismo e a corrupção na política, na arte, no cinema e na cultura pop? Com fatos, humor e visuais

ultrajantes. Revelamos a história por trás das coisas, o subtexto, o negligenciado, e o francamente injusto. Nosso

trabalho foi passado ao redor do mundo por nossos apoiantes incansáveis. Apenas nos últimos anos, temos aparecido

em mais de 90 universidades e museus, bem como The New York Times, Interview, The Washington Post, The New

Yorker, Bitch e Artforum; Na NPR, na BBC e na CBC; E em muitos textos artísticos e feministas. Nós somos autoras de

adesivos, outdoors, muitos, muitos cartazes e projetos de rua, e vários livros, incluindo The Guerrilla Girls's Bedside

Companion para a História da Arte Ocidental e Bitches, Bimbos e Ballbreakers: The Guerrilla Girls 'Guide to Female

Stereotypes. Fazemos parte da Campanha Stop Violence Against Women da Amnistia Internacional no Reino Unido; e

estamos fazendo um brainstorming com o Greenpeace. Destacamos painéis publicitários anti-indústria

cinematográfica em Hollywood bem a tempo do Oscar e criamos uma instalação em grande escala para a Bienal de

Veneza, e projetos de rua para Cracóvia, Istambul, Cidade do México e Montreal. Examinamos os museus de

Washington DC em uma página inteira no Washington Post e exibimos cartazes e bandeiras em grande escala em

Londres, Atenas, Bilbao, Montreal, Roterdã, Sarajevo e Xangai.” FONTE: Guerrilla Girls. Disponível em:

http://www.guerrillagirls.com/#open. Acesso em 26/05/2017

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vão desde câmeras tradicionais para câmeras de vídeo e Webcams. Ao mesmo tempo, o

trabalho e o lazer estão cada vez mais centrados na mídia visual, desde computadores até

discos de vídeo digital. A experiência humana é agora mais visual e visualizada do que

nunca da imagem de satélite para imagens médicas do interior do corpo humano. Na era da

tela visual, seu ponto de vista é crucial. (MIRZOEFF, 1999, p. 2. Tradução nossa)

A experiência visual pode acontecer via dispositivos que tenham tela, e na atualidade,

através das telas dos computadores e aparelhos celulares, que conectados a internet possibilitam

inúmeras ações entre os usuários, entre eles as mulheres. O universo da internet vive hoje um dos

seus mais gloriosos momentos: o da criação, interação e compartilhamento; onde são poucas as

barreiras para que uma mensagem seja transmitida ao redor do mundo.

Sendo assim, este artigo investigará a forma como artistas feministas contemporâneas

podem utilizar de espaços virtuais, como a internet, partindo de conceitos como museus e galerias

virtuais, propondo alternativas que possibilitam uma experimentação distinta da academia e dos

museus. E por fim, uma breve análise do trabalho de uma fotógrafa jovem e feminista, que percorre

um caminho interessante no mundo cibernético e pode exemplificar o que é considerado uma

galeria virtual.

A internet como ponto de encontro: museu virtual e galerias virtuais

A palavra “virtual” pode trazer consigo inúmeros significados. Atualmente, quando se fala

em algo virtual, a tendência é fazer a associação com algo ligado à internet e informática,

justamente por ser algo corriqueiro desse momento atual. Contudo, o significado de virtual é algo

extenso, que vai desde algo físico a algo filosófico, como já diz Lévy (1999) e não cabe aqui a

explicação de cada uma das possibilidades de significação. Usa-se aqui então, uma definição geral

proposta por Lévy, em que o virtual é “toda entidade ‘desterritorializada’, capaz de gerar diversas

manifestações concretas em diferentes momentos e locais determinados, sem contudo estar ela

mesma presa a um lugar ou tempo em particular” (LÉVY, 1999, p. 47).

É dessa premissa que também parte o conceito de “museu virtual”, utilizado por Pollock

(2010) para definir o que seria um “museu feminista virtual”. Em seu livro Encounters in the

Virtual Feminist Museum, a autora explica o termo como uma espécie de laboratório poético

investigativo, situado na forma de livro, que nunca poderia existir, mas que cria um espaço de

encontro para a discussão de assuntos ligados à arte e o feminismo.

Este museu jamais seria real, pois segundo Pollock, ele desafiaria questões como classe,

gênero e raça em um sistema capitalista que promove o turismo e o entretenimento; em que o

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feminismo ainda é visto como algo perigoso. Pollock afirma que a sua combinação dos conceitos de

“museu” e “virtual” intervém na situação de silenciamento das mulheres e do feminismo visto como

algo do passado, já que os museus que já existem nunca contribuiriam com uma pesquisa feminista

por motivos já citados aqui anteriormente (POLLOCK, 2010).

Organizando o conteúdo desse museu virtual em salas, a autora utiliza como recurso de

organização das mesmas o mesmo utilizado por Aby Warburg em Atlas Mnemosyne (1924-1929).

Para maior entendimento, Warburg, historiador de arte alemão, organizou através de lâminas em

sua biblioteca uma coleção de imagens da história da arte de uma forma não tradicional. Ao invés

de reunir as imagens por período e movimento artístico, ele reúne as imagens por aproximação entre

formas e temas sem levar em conta a época em que foram feitas.

Esse método utilizado por Pollock e criado por Warburg permite chegar a outro conceito, o

de galeria virtual, situado na internet. Esse espaço alternativo, que tomou forma graças ao advento

da cultura cibernética e da internet, pode ser visto em diferentes endereços online, como sites de

portfólios online e redes sociais.

Por ora, explora-se o sentido duplo que “galeria virtual” poderia ter, se aplicado ao caso de

artistas feministas que se utilizam desse espaço. O primeiro, é o que de assim como o museu virtual

feminista proposto por Pollock (2010), essa galeria virtual seria um lugar alternativo de encontro e

exposição do trabalho de artistas feministas, que dificilmente chegariam em um museu logo de

início. Segundo, o de uma galeria virtual situada na internet, ou seja, ela seria virtual no seu sentido

de desterritorialização, e também por sua acessibilidade se dar através da internet. Silveira (2016)

denomina uma galeria virtual (aquela que se situa no espaço cibernético) da seguinte maneira:

Entende-se a galeria virtual como ambiente que disponibiliza seu acervo digitalizado ou

obras na web para o acesso do grande público, conectado à internet, no intuito de expor,

disseminar, divulgar e comercializar arte no ciberespaço. Ela atua enquanto sistema de

natureza interativa que articula obras, artistas, discursos dos curadores, dos críticos e

demais agentes culturais. Observa-se que algumas galerias de arte apresentam ambientes

expositivos virtuais onde os curadores são também responsáveis por disponibilizar pontos

de contato entre as instituições, os agentes culturais, os artistas e o público. (SILVEIRA,

2016, p. 31-32)

Entende-se dessa forma que, as “galerias virtuais”, são espaços cibernéticos que têm

potencial para abrigar obras de arte que se tornam acessíveis para toda pessoa que possui um acesso

à internet, ou seja, são ambientes mais democráticos que qualquer outro museu. Por mais que

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existam críticas em relação à estes novos meios de expor arte, como aponta Cauquelin (2006)4, vê-

se as galerias virtuais não como substituições dos museus físicos, mas como uma nova possibilidade

de conhecer novas artistas mulheres e abrir o olhar para a arte que se transforma com o passar do

tempo. Assim como propõe Pollock (2010) com o museu feminista virtual, as galerias virtuais

utilizadas por artistas feministas seriam laboratórios poéticos para a experimentação e exposição de

arte.

Existem, no mundo cibernético, sites que têm como propósito a divulgação do trabalho de

artistas, galerias virtuais, como Behance Network, DeviantART e Cargo Collective. Há também

quem crie o seu próprio site, uma espécie de portfólio particular, para a exibição do que é produzido

e outras informações sobre o artista. Entretanto, são em redes sociais que os artistas ganham mais

visibilidade, pois seus usuários não são se limitam a artistas.

Com maior frequência artistas se inscrevem em aplicativos como estes para que

expectadores possam ver que suas obras vão além das galerias formais de exibição de arte, criando

uma espécie de galeria virtual. Também sobre as galerias virtuais, Gasparetto e Santos (2010)

dizem:

Uma galeria virtual deve ser o objeto de desejo dos artistas das mídias digitais (...) parece

que chegamos onde os artistas queriam estar, um espaço de exposições livre para o público

interagir. Chegamos ao ciberespaço. No ciberespaço a velocidade dos contatos tornou-se

quase instantânea, quanto mais informação, para um grande mailling, mais visto, mais

comentado, mais procurado, mais acessado, maior o número de seguidores e mais

valorizado. (GASPARETTO; SANTOS, 2010, p. 10)

A internet, que nos anos 2000 possuía apenas 6,5% de usuários5, hoje está presente na vida

de 3,2 bilhões de pessoas no mundo, cerca de 43% da população mundial. Não se limitando ao

acesso pelo computador, cada vez mais pessoas utilizam os serviços de internet móvel nos seus

aparelhos celulares, e no final de 2015, a expectativa era a de que 69% da população tivesse planos

de cobertura 3G6.

4 Cauquelin (2006) critica o uso do espaço cibernético para se expor arte, dizendo que “Falar de obra virtual ou de

galeria virtual quando se expõem na internet obras já realizadas é um abuso de linguagem. Aliás, a maior parte dos

museus chamados virtuais nada tem de virtual: eles apenas permitem visualizar uma sequência de fotografias e de

visões panorâmicas; nesse caso, o que se chama de "virtual" é a possibilidade que tem o visitante de escolher o que ver

clicando um nome em um menu.”(CAUQUELIN, 2006, p. 130) 5 Pesquisa realizada pela UIT (União Internacional das Telecomunicações). FONTE:

http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2015/05/mundo-tem-32-bilhoes-de-pessoas-conectadas-internet-

diz-uit.html . Acesso em 26/08/2016 6 A tecnologia 3G é a terceira geração de padrões da telefonia móvel, baseada nas normas da UIT. Pesquisa realizada

pela UIT (União Internacional das Telecomunicações).

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A internet móvel possibilita que os aparelhos celulares mais novos, os chamados

smartphones, tenham acesso a diferentes tipos de aplicativos principalmente os de redes sociais.

Uma rede social é entendida “como um conjunto de dois elementos: atores (pessoas, instituições ou

grupos; os nós da rede) e suas conexões (interações ou laços sociais)”(WASSERMAN & FAUST,

1994; DEGENNE & FORSE, 1999 apud RECUERO, 2009, p. 24). Atualmente existem inúmeras

redes sociais que investem no formato de aplicativos, para que seu usuário não tenha que se

conectar ao site da rede social toda vez que quiser acessá-la. Recuero (2009) diz que

Sites de redes sociais são os espaços utilizados para a expressão das redes sociais na

Internet. Sites de redes sociais foram definidos por Boyd & Ellison (2007) como aqueles

sistemas que permitem I) a construção de uma persona através de um perfil ou página

pessoal; II) a interação através de comentários; e III) a exposição pública da rede social de

cada ator. Os sites de redes sociais seriam uma categoria do grupo de softwares sociais, que

seriam softwares com aplicação direta para a comunicação mediada por computador.

(RECUERO, 2009, p. 102)

As redes sociais, então, permitem não só a construção de uma persona, mas sua exposição e

interação. Existem redes sociais para propósitos distintos, de publicação de textos e fotos, como o

Instagram. Criado em 2010 por Kevin Systrom e Mike Krieger, o Instagram conta com mais de 500

milhões de usuários, sendo que mais de 300 milhões o utilizam diariamente.

Uma nota publicada pela empresa em 21 de junho de 20167, trazia os seguintes dizeres: “Se

você é um ilustrador, um colecionador de tênis ou um astronauta na Estação Espacial Internacional,

cada foto e vídeo que você compartilha ajuda a aproximar as pessoas de amigos e interesses, amplia

perspectivas e inspira um sentimento de admiração”. Logo, percebe-se que os usuários do

Instagram variam entre si; artistas, marcas, figuras públicas atletas, músicos e outros também se

utilizam do serviço. Por serem aplicativos gratuitos, estes abrem espaço para que pessoas fora do

mundo publicitário como o das artes, também o utilizem como maneira de divulgar seu trabalho.

O Instagram conta com o trabalho de artistas que não são necessariamente fotógrafos, como

ilustradores, pintores, performers dentre outros. Como o aplicativo permite que seus usuários

“sigam” outros perfis, eles podem acompanhar o que os artistas postam, que variam desde seu

trabalho ao registro do processo criativo. Dessa forma cria- se uma proximidade e até uma sensação

FONTE: http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2015/05/mundo-tem-32-bilhoes-de-pessoas-conectadas-internet- diz-

uit.html. Acesso em 26/08/2016 7 FONTE: Instagram, 2016. Disponível em: http://blog.instagram.com/post/146255204757/160621-news. Acesso em

26/08/2016

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de intimidade entre usuários que utilizam o Instagram como um passatempo, e aqueles que o

transformam em um diário imagético.

Como exemplo de como artistas jovens feministas podem aproveitar das redes sociais para

uma nova forma de experimentação de visualização de arte, cita-se então o uso que a artista Petra

Collins faz desse meio, e as possibilidades de exposição que ela possa ter a partir disso.

O trabalho de Petra Collins

Segundo a matéria Men vs. Women: Who Is More Active on Social Media?8 ao contrário dos

homens que utilizam as redes sociais mais para reunir informações, as mulheres criam seus perfis

para se conectarem a familiares e amigos. A maioria dos usuários de internet móvel são mulheres,

assim como os perfis do Instagram, onde as contas de marcas e empresas também têm como

maioria dos seguidores as mesmas. Pensando nessa relação entre as mulheres e as redes sociais, foi

analisado o perfil de uma fotógrafa jovem e feminista, percebendo a maneira com que utilizava o

aplicativo Instagram e outros sites para a exposição de arte.

Hoje em dia a facilidade de se compartilhar imagens permite que artistas – principalmente

mulheres jovens, da “geração Instagram” – possam pôr à mostra o que produzem. Petra, que tem 24

anos, é canadense e se declara como artista e curadora em seu site pessoal. Ela mantém um portfolio

online com seus trabalhos, que são divididos em trabalhos mais recentes e mais antigos, que reúnem

editoriais de moda, fotos de capas de revistas e até mesmo a direção de videoclipes musicais,

fashion films e comerciais.

Petra também participa de um projeto de curadoria online de trabalhos de mulheres artistas,

o The Ardorous, um site que se denomina como “uma plataforma para artistas femininas que

apresenta projetos individuais e colaborativos entre um coletivo de profissionais criativas femininas

- todos cheios de ardor, mas cada uma com um estilo artístico e uma voz únicos”9. Ambos os sites

possuem contas no Instagram, onde seu conteúdo acaba ganhando mais destaque e repercussão nas

redes sociais.

Tema principal de seu trabalho, Petra tira fotografias de adolescentes e seus quartos, do

corpo feminino e a interação das mulheres jovens com seus celulares (como se estivessem

8 FONTE: VERMEREN, Iris. Brandwatch, 2015. Men vs. Women: Who Is More Active on Social Media?.Disponível

em: https://www.brandwatch.com/2015/01/men-vs-women-active-social-media/. Acesso em 26/08/2016

9 FONTE: The Ardorous, about. Tradução nossa. Disponível em: http://www.theardorous.com/about/. Acesso em:

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realizando selfies). De certa forma, seu olhar está voltado para garotas que assim como ela vivem

em uma época em que o celular e a internet desempenham um papel importante no convívio social.

Petra Collins, inclusive, ficou conhecida após publicar na revista online Rookie Mag

diversos ensaios fotográficos sobre a adolescência feminina e sua relação com o mundo, com um

certo ar de nostalgia. Se não fosse a internet, talvez seu trabalho não tivesse tido tanta repercussão

como tem hoje.

Em uma entrevista, ela declarou que a “visibilidade é fundamental nesta era, pois vivemos

em um mundo de imagens. Se você não se vê representado, você não se sente parte do cenário. É

como se você nem existisse”10. É essa visualidade tão fundamental que as artistas feministas sempre

procuraram ter em seus trabalhos. Talvez, as artistas mais jovens pertencentes justamente a essa era,

possam através de redes sociais como o Instagram, fazer com que seu trabalho seja conhecido e

compartilhado mundo afora.

São esses espaços, que se tornam possíveis galerias virtuais, que possuem características

capazes de chamar a atenção para arte de forma natural e não acadêmica. Petra por exemplo, conta

com 573 mil seguidores e 1.574 publicações em sua conta do Instagram11 (figura1), e ela também

mantém perfis em outras redes sociais como o Twitter e o Tumblr.

É claro que estes espaços não estão totalmente livres de críticas e censuras. Em 2013, Petra

protagonizou uma polêmica com sua conta no Instagram: após publicar uma foto em que apareciam

pelos pubianos, seu perfil foi denunciado por usuários, que assim como a foto foi retirado do ar

(figura 2).

Segundo uma matéria publicada no site da Revista Vogue americana12, o Instagram

considerou que a foto violava os termos de uso do aplicativo, só que o ocorrido apenas fez com que

Petra ganhasse ainda mais visibilidade na internet. A fotógrafa criou uma nova conta e iniciou suas

postagens novamente, tanto de seus trabalhos como de seu processo de criação e bastidores. Após o

ocorrido, o seu número de seguidores ultrapassou os de antes e mais pessoas começaram a comentar

sobre seu trabalho.

É importante ressaltar que por mais que a polêmica sobre suas fotos tenha causado a

exclusão de sua antiga conta, a artista não foi boicotada ou caiu no esquecimento pelo acontecido.

10 FONTE: MONTEIRO, Ariana. Selfie e a politização do corpo feminino. Revista Ponto Eletrônico, 2016.Disponível

em: http://pontoeletronico.me/2016/selfie-corpo/. Acesso em 26/08/2016 11 Dados recolhidos no dia 20/06/2017, sujeitos a alterações com o tempo. 12FONTE: BERNARD, Katherine. The Power of Instagram: Petra Collins and Kim Kardashian in the Age of the Selfie.

Vogue, 2013. Disponível em: http://www.vogue.com/872835/the-power-of-instagram-petra-collins-and-kim-

kardashian-in-the-age-of-the-selfie/. Acesso em 26/08/2016

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Sua popularidade aumentou nos últimos anos, e ela inclusive já trabalhou para grandes marcas da

moda, como a Gucci, sendo a porta-voz da mesma nas redes sociais.

A imagem que se tem de Petra, é a de uma artista feminista reconhecida, e polêmicas sobre

suas obras fazem parte do que ela propõe como alguém que questiona o feminino e o olhar que se

tem sobre a mulher. E o reconhecimento que ela tem através de suas redes sociais é fundamental

não só para ela, como artista, mas como uma jovem feminista que produz uma arte militante.

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Considerações finais

O compartilhamento das imagens nos tempos atuais, onde brilham as redes sociais, é algo

complexo, contudo relevante. A arte feminista, que sempre foi algo difícil de ser visto, publicado,

comentado e claro, compartilhado – pode conseguir, agora - através desses novos meios, espaços

possíveis para a exposição e experimentação. Se ainda permanecem os obstáculos para se expor

mulheres artistas em museus, por que não experimentar novos lugares, como os virtuais? Seja por

meio de capítulos de livros, sites de internet, aplicativos; a virtualidade permite com que a arte de

estética feminista seja desterritorializada, criando novas chances de se discutir arte pelo mesmo

viés.

As novas gerações de artistas feministas, principalmente as dos últimos dez anos, vivem em

um mundo onde a internet é fundamental em suas vidas, e seus expectadores, de certa forma,

também. O mundo cibernético, é um mundo mais democrático, mas isso não significa que estará

livre de censuras ou apagamentos. E o uso desses espaços por artistas jovens e feministas não é algo

que propõe substituir os museus, mas uma alternativa para começarem a expor e a mostrar suas

obras para o mundo.

Figura 2: Foto publicada no Instagram de

Petra Collins que foi removida do perfil da

artista após denúncias.

Figura 1: Perfil de Petra Collins no Instagram,

onde ela posta grande parte de seu trabalho como

fotógrafa.

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Os seguidores, os comentários e as outras interações que os usuários dessas redes possam

fazer são interações antes nunca vistas. A aproximação que estes espaços proporcionam entre artista

e público permitem que não existam barreiras tão definidas entre essas pessoas, e que de certa

forma, elas também participem da obra. O reconhecimento do trabalho de Petra Collins, citada neste

artigo, permitiu que artista saísse de um ambiente de arte alternativo, fora do mainstream, e pudesse

se arriscar em territórios até mesmo comerciais. Para alguém que se cria e se reinventa na internet,

Petra soube utilizá-la. Até hoje é na internet onde se encontram seus principais trabalhos, mesmo

ela já tendo participado de algumas exibições e feito a curadoria de dois livros.

Se não fosse a internet, e principalmente essas novas redes sociais, muitas meninas que estão

começando agora sua carreira no mundo das artes, jamais conheceriam o trabalho de meninas como

Petra Collins, assim como a autora desse artigo. É por meio dessa latência, que porventura a arte

feminista possa criar uma nova significação e expansão.

Referências

CAUQUELIN, Anne. Freqüentar os incorporais: contribuição a uma teoria da arte

contemporânea. São Paulo, Martins Fontes, 2006

GASPARETTO, Débora Aita; SANTOS, Nara Cristina. Galerias virtuais de arte digital no

ciberespaço: possibilidades para o sistema da arte contemporânea. 19o Encontro da Associação

Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas “Entre Territórios” – 20 a 25/09/2010 – Cachoeira –

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Women artists and virtual galleries: alternative spaces for experimentation and exposure

Abstract: This article has as purpose to investigate how feminists and women artists use the

internet, to expose their work or to experiment new possibilities of creation. Thinking about the

relationship between the images circulation and the cybernetic world, the work of a young

photographer who uses this space, Petra Collins, will be analyzed.

Keywords: women artists, feminism, art, internet