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AS REFORMAS FISCAIS E DIVISÃO DO ESFORÇO TRIBUTÁRIO PERSPECTIVAS INTERNACIONAIS Elsa Rodrigues Tema desenvolvido no 1.º Ciclo de Conferências no âmbito da Reforma Fiscal Angolana em Curso ENAD – Escola Nacional de Administração de Angola PERT – Projecto Executivo para a Reforma Tributária Março de 2012

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AS REFORMAS FISCAIS E DIVISÃO DO ESFORÇO TRIBUTÁRIO

PERSPECTIVAS INTERNACIONAIS

Elsa Rodrigues

Tema desenvolvido no 1.º Ciclo de Conferências no âmbito da Reforma Fiscal

Angolana em Curso

ENAD – Escola Nacional de Administração de Angola

PERT – Projecto Executivo para a Reforma Tributária

Março de 2012

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Índice

1. Enquadramento do tema ........................................................................................ 3

1.1. Fazer uma reforma fiscal: políticas fiscais, objectivos e factores a ter em consideração .... 3

1.2. Análise quantitativa – os índices de Nível de Fiscalidade, Esforço Fiscal e Estrutura Fiscal. 5

2. Tendência nos países da OCDE. ............................................................................. 7

2.1. Evolução das tendências nas receitas fiscais e divisão do esforço tributário. ................... 7

2.2. Tendências nas estruturas fiscais. .............................................................................. 10

2.2.1. As tendências das reformas nos Impostos sobre o Rendimento. ................................... 12

2.2.2. As tendências das reformas nos impostos indirectos. ................................................... 14

3. A União Europeia. ................................................................................................. 16

3.1. Estruturas e tendências nas receitas fiscais na UE. ...................................................... 16

3.1.1. O nível de fiscalidade na UE. ..................................................................................... 16

3.1.2. Decomposição por tipo de imposto. ........................................................................... 16

3.1.3. Decomposição por função económica. ........................................................................ 17

3.2. As Reformas Fiscais na UE. ....................................................................................... 18

3.2.1. Enquadramento geral – as tendências das estruturas fiscais no seio da UE. ................... 18

3.2.2. Os impostos sobre o rendimento e segurança social. ................................................... 19

3.2.3. Os impostos indirectos. ............................................................................................. 21

4. O caso português .................................................................................................. 23

4.1. Enquadramento geral: considerações e objectivos. ...................................................... 23

4.2. Principais índices de tributação. ................................................................................. 25

4.3. Grandes linhas das reformas fiscais em Portugal. ........................................................ 26

4.3.1. A introdução do IVA (1986). ...................................................................................... 26

4.3.2. A reforma fiscal dos impostos sobre o rendimento (reforma de 1988/89). ..................... 27

4.3.3. A reforma fiscal do património (Reforma de 2003/2004). ............................................. 30

4.3.4. Outras reformas essenciais. ...................................................................................... 30

5. Considerações finais: Questões, opções e desafios ............................................. 31

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1. Enquadramento do tema.

1.1. Fazer uma reforma fiscal: políticas fiscais, objectivos e factores a ter

em consideração.

Actualmente, e tendo em vista a realização dos fins dos Estado (Segurança, Defesa,

Justiça, etc.), a maioria dos Estados ditos desenvolvidos propõe-se às seguintes

funções:

• Função de afectação de recursos, através da obtenção de receitas para

financiamento das despesas públicas;

• Função de redistribuição do rendimento e da riqueza;

• Intervenção através de políticas económicas e sociais, conjunturais ou estruturais

(políticas de emprego, fixação de preços, apoios sob a forma de benefícios fiscais

ou subsídios, entre muitas outras).

As políticas fiscais são um dos instrumentos dessa intervenção dos Estados e um meio

de financiamento dessas finalidades.

Normalmente, associa-se a uma reforma fiscal um grande e quase inquestionável

objectivo: uma melhor e mais eficiente arrecadação da receita fiscal como forma de

financiamento das despesas públicas. Sem contestar este desiderato, muitos outros

objectivos podem presidir, e normalmente presidem, à decisão política de introdução

de uma reforma fiscal num determinado território ou Estado.

Falamos aqui de objectivos de política e técnica fiscal como, entre muitos outros, a

modernização do sistema tributário, o acompanhamento da concorrência fiscal

internacional, a obtenção de uma maior neutralidade fiscal, uma maior justiça tributária

e uma maior equidade tributária, e a criação de um sistema fiscal mais competitivo a

nível internacional.

Podemos, ainda, falar de objectivos extrafiscais, como a redistribuição da riqueza, a

estabilização económica 1 ou a influência na decisão de afectação dos recursos,

designadamente nas politicas de emprego, de apoio social, de desenvolvimento local

ou regional, de saúde, de competitividade empresarial, promoção da cultura ou, mais

recentemente, politicas ambientais.

Sejam quais forem os motivos (políticos, económicos, sociais) ou objectivos (fiscais ou

extrafiscais) de uma Reforma Fiscal, uma coisa é certa: sempre que se pretenda

introduzir alterações de regime fiscal, os decisores e legisladores tributários deverão ter

1 Por diversas vezes, as politicas fiscais são utilizadas como um instrumento de estabilização económica, servindo para estimular ou refrear as economias, designadamente promovendo ou limitando o consumo, o investimento, a poupança, etc, consoante se está num contexto de recessão ou de expansão económica, de pleno emprego ou de desemprego crónico, de inflação ou deflação.

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em consideração um conjunto de factores que podem contribuir para a adopção do

sistema ou modelo fiscal mais adequado à realidade local e dimensão internacional de

cada país. Vejamos, sucintamente, alguns desses factores:

(a) Equidade fiscal

A equidade fiscal assenta no princípio de que os impostos sejam estabelecidos de uma

forma justa. A equidade assume duas dimensões: equidade horizontal e equidade

vertical. A equidade horizontal impõe que se tributem de forma idêntica as pessoas que

têm igual capacidade contributiva. A equidade vertical impõe que as pessoas com

diferente capacidade contributiva sejam tributadas de forma desigual. O princípio da

equidade vertical está intimamente ligado à progressividade das taxas de imposto2.

Quanto à equidade vertical a questão que se coloca será sempre qual o nível correcto e

adequado dessa progressividade.

(b) Eficiência fiscal

Poderemos analisar o conceito de eficiência sob duas perspectivas ou significados. Um

primeiro, o de eficiência económica, considerada como a ausência de distorções na

afectação de recursos por via dos impostos. Com efeito, um imposto pode influenciar

de diferentes formas a eficiência económica de um Estado, designadamente na

afectação de recursos, nos índices de emprego/desemprego, na poupança, no

investimento ou no consumo.

Um outro, o de racionalização dos meios utilizados pelos Estados. Neste caso, os

objectivos fiscais prosseguidos pelos Estados devem ser equilibrados com os

respectivos custos suportados para a prossecução desses objectivos, pois uma maior

eficiência dos gastos, com maior fiscalização e transparência dos impostos pagos,

significa normalmente uma redução da carga tributária.

(c) Simplificação dos sistemas – Os custos administrativos e os custos de

cumprimento

Uma condição essencial ao bom funcionamento de um sistema fiscal é a sua

simplicidade. Para além de maior segurança e certeza para os contribuintes, a

simplicidade dos sistemas fiscais traduz-se, normalmente e do lado das Administrações

Fiscais, em menores custos administrativos de implementação e monitorização das

políticas fiscais desenvolvidas, bem como em menores custos na gestão do sistema 2 Em termos de estruturas das taxas, os impostos podem distinguir-se entre progressivos, regressivos e proporcionais. Um imposto progressivo caracteriza-se pelo facto de a taxa efectiva de imposto aumentar à medida que o montante a que a taxa é aplicada aumenta. A progressividade pode ser global ou por escalões. Na progressividade global, a taxa que corresponde ao maior escalão que a base tributável aplicar-se-á à totalidade desse montante. Na progressividade por escalões, a base tributável é repartida em tantos escalões quantos os existentes e a cada um desses montantes se aplicará a taxa correspondente. O inverso de um imposto progressivo é um imposto regressivo, onde a taxa efectiva de imposto diminui à medida que o montante a que a taxa é aplicada aumenta. Finalmente, o imposto proporcional caracteriza-se pelo facto de a taxa efectiva de imposto ser fixa, enquanto o montante ao qual a taxa é aplicada aumenta.

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fiscal em geral e dos impostos em especial, designadamente na sua cobrança. Já do

lado dos contribuintes, sistemas fiscais mais simples significam menores custos de

cumprimento, em contraponto com a vasta panóplia de obrigações declarativas,

obrigações contabilísticas, obrigações de certificações legais de contas, entre outras,

que os impostos mais complexos importam.

Esta simplificação dos sistemas fiscais traduz, por vezes, vantagens ao nível dos

ajustamentos e alterações nos próprios sistemas. Com efeito, um sistema fiscal em

constante mutação significa normalmente um acréscimo significativo dos custos

administrativos, que vão desde os necessários custos com formação dos funcionários

da Administrações Tributárias, alterações dos formulários, alterações dos sistemas

informáticos, etc. Do lado dos contribuintes, as constantes alterações nos sistemas

fiscais traduzem-se num maior grau de incerteza e insegurança jurídica, que vendo as

suas expectativas alteradas e tendo que adaptar em conformidade as suas decisões de

gestão.

(d) Equilíbrio entre a receita e o esforço tributário

Um dos factores a ter, igualmente, em consideração é o correcto equilíbrio entre a

receita e o esforço tributário, este medido pela capacidade contributiva dos cidadãos.

Este equilíbrio será tanto mais importante quanto pelo facto de um nível de tributação

acima da capacidade tributária dos contribuintes, poder conduzir a comportamentos de

incumprimento fiscal por parte desses contribuintes – o que, por sua vez, poderá

impactar negativamente no nível das receitas.

(e) Efeitos da concorrência fiscal internacional

Nas últimas décadas assistimos a um fenómeno irreversível de globalização, com uma

maior abertura das economias e um incremento na circulação de pessoas, bens e

capitais. Este fenómeno de “livre circulação” veio alargar o espaço de planeamento

fiscal das pessoas e das empresas na sua busca por uma melhor optimização fiscal.

Neste contexto, a nenhum país é permitido definir a sua política fiscal sem atender às

políticas fiscais dos outros países. A concorrência fiscal tornou-se, assim, uma

preocupação dos diferentes países e um factor a ter em consideração quando se

pretende fazer uma reforma do sistema tributário.

1.2. Análise quantitativa – os índices de Nível de Fiscalidade, Esforço Fiscal

e Estrutura Fiscal.

Quando falamos de análises sobre a quantificação da tributação podemos fazê-lo tendo

por base três dos principais indicadores de carga fiscal mais utilizados a nível

internacional para caracterizar os sistemas fiscais:

(a) Nível de fiscalidade

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Este indicador, também designado por ratio fiscal, visa aferir a carga fiscal global,

através da determinação da percentagem de riqueza produzida pelo país que é

transferida para o Fisco. Assim, o nível de fiscalidade é-nos dado pela fórmula:

Receitas fiscais (Impostos + Contribuições para Segurança Social)

Produto Interno Bruto (a preços de mercado)

(b) Esforço fiscal

O esforço fiscal é-nos dado pela relação entre o nível de fiscalidade efectivo e o nível

de fiscalidade potencial. O nível de fiscalidade efectivo, que já vimos supra,

corresponde à carga fiscal global dada pelo rácio receitas fiscais / % PIB a preços de

mercado.

Já o nível de fiscalidade potencial é-nos dado pela capacidade tributária de um

determinado Estado, i.é., o nível de fiscalidade que se poderia obter tendo em

consideração o nível de tributação que um Estado pode afectar ao financiamento da

despesa pública.

Assim, se o nível de fiscalidade efectivo for maior que o nível de fiscalidade potencial,

diz-se que há um esforço fiscal exigido aos contribuintes, pois a capacidade tributária

está a ser sobreutilizada. Pelo contrário, se o nível de fiscalidade efectiva for inferior ao

nível de capacidade potencial, não se pode falar de esforço fiscal, sendo que a

capacidade tributária está subutilizada.

Há vários modelos de determinação do esforço fiscal. As primeiras abordagens a este

índice devem-se a Frank (1959) e Bird (1964), e foram os seus estudos que deram

mais tarde lugar aos modelos econométricos de Lotz e Morss (1967), ao Modelo de

Bahl (1971), ao Modelo de Tanzi (1968) ou ao Modelo de Shin (1969).

Em países mais desenvolvidos, tendem a ser considerados modelos em que apenas é

considerada como variável explicativa da capacidade tributária o nível de

desenvolvimento económico, este traduzido pelo rendimento per capita. Mas pode

haver outros índices que possam explicar as diferenças entre os níveis de fiscalidade

nos vários países, tais como o desenvolvimento sócio-cultural, maior ou menor

confiança no Estado e/ou nos mercados.

(c) Estrutura Fiscal

Este indicador traduz a repartição da receita fiscal total entre os principais impostos. É

este rácio que permite determinar a contribuição de cada tributo para as receitas

tributárias.

Mais recentemente surgiu ainda um outro indicador, o da Taxa de Tributação Implícita.

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Este indicador resulta do rácio entre a receita fiscal dos impostos incidentes sobre uma

determinada actividade ou base económica e o seu valor. Através deste indicador

podemos apurar a taxa de tributação implícita no consumo, no capital, no trabalho,

energias, entre outras.

2. Tendência nos países da OCDE.

2.1. Evolução das tendências nas receitas fiscais e divisão do esforço

tributário.

De acordo com alguns estudos e dados publicados recentemente pela Organização

para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE)3, nas últimas três décadas a

generalidade dos países membros da OCDE introduziram mudanças estruturais nos

seus sistemas fiscais. Sendo certo que em alguns países, tais como os da Europa de

Leste (em muito por razões de Adesão ao Tratado da União Europeia), algumas dessas

alterações foram estruturadas e implementadas em períodos de tempo muito curtos, a

maioria foi, contudo, levada a cabo através de processos graduais e contínuos de

adaptação e actualização.

De uma maneira geral, e comparativamente com a década de oitenta, as reformas

levadas a cabo não representaram uma descida no nível de fiscalidade global (i.é,

carga fiscal global calculada pelo rácio receitas fiscais/PIB).

Conforme resulta do Quadro 1 infra, entre 1965 e 2000 verificou-se uma tendência

crescente e sucessiva da carga fiscal global na generalidade dos países da OCDE. Esta

tendência generalizada de crescente aumento da carga fiscal veio a alterar-se, em

particular a partir de 2005, com uma descida (embora não significativa) da carga fiscal.

Esta tendência manteve-se em 20084, eventualmente explicada pela crise económica e

financeira global que fez surgir algumas políticas de baixa fiscalidade de forma a

incentivar o consumo e o investimento.

3 Mathew, Stephen (2011), Trends in Top Incomes and Their Tax Policy Implications, OECD Taxation Working Papers n.º 4; Brys, Bert (2011) Wage Income Tax Reforms and Changes in Tax Burdens: 2000-2009, OECD Taxation Working Papers n.º 10; 4 Média não ponderada da OCDE em 2005 era de 35,0%, em 2008 desceu para 34,6%, reduzindo-se ainda em 2009 para 33,8%.

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Quadro 1 – Evolução das receitas fiscais totais na área OCDE 1965-2010 em %PIB5

1965 1975 1985 1995 2000 2005 2008 2009 2010 provisional

Australia 20,4 25,1 27,5 28,1 30,3 29,8 27,0 25,9 n.a.

Austria 33,9 36,6 40,8 41,4 43,0 42,1 42,8 42,7 42,0

Belgium 31,1 39,5 44,3 43,5 44,7 44,6 44,1 43,2 43,8

Canada 25,7 32,0 32,5 35,6 35,6 33,4 32,2 32,0 31,0

Chile .. .. .. 19,0 19,4 21,6 22,5 18,4 20,9

Czech Republic

.. .. .. 37,6 35,2 37,5 36,0 34,7 34,9

Denmark 30,0 38,4 46,1 48,8 49,4 50,8 48,1 48,1 48,2

Estonia .. .. .. 36,3 31,0 30,6 31,7 35,9 34,0

Finland 30,4 36,6 39,8 45,7 47,2 43,9 42,9 42,6 42,1

France 34,2 35,5 42,8 42,9 44,4 44,1 43,5 42,4 42,9

Germany 31,6 34,3 36,1 37,2 37,5 35,0 36,4 37,3 36,3

Greece 17,8 19,4 25,5 28,9 34,0 31,9 31,5 30,0 30,9

Hungary .. .. .. 41,5 39,3 37,3 40,1 39,9 37,6

Iceland 26,2 30,0 28,2 31,2 37,2 40,7 36,7 33,9 36,3

Ireland 24,9 28,7 34,6 32,5 31,2 30,3 29,1 27,8 28,0

Israel .. .. .. 37,0 36,8 35,6 33,8 31,4 32,4

Italy 25,5 25,4 33,6 40,1 42,2 40,8 43,3 43,4 43,0

Japan 18,0 20,7 27,1 26,8 27,0 27,4 28,3 26,9 n.a.

Korea .. 14,9 16,1 20,0 22,6 24,0 26,5 25,5 25,1

Luxembourg 27,7 32,8 39,5 37,1 39,1 37,6 35,5 37,6 36,7

Mexico .. .. 15,5 15,2 16,9 18,1 20,9 17,4 18,7

Netherlands 32,8 40,7 42,4 41,5 39,6 38,4 39,1 38,2 n.a.

New Zealand 23,9 28,4 30,9 36,2 33,1 36,7 33,6 31,5 31,3

Norway 29,6 39,2 42,6 40,9 42,6 43,5 42,9 42,9 42,8

Poland .. .. .. 36,2 32,8 33,0 34,2 31,8 n.a.

Portugal 15,9 19,1 24,5 29,3 30,9 31,2 32,5 30,6 31,3

Slovak Republic

.. .. .. 40,3 34,1 31,5 29,4 29,0 28,4

Slovenia .. .. .. 39,0 37,3 38,6 37,0 37,4 37,7

Spain 14,7 18,4 27,6 32,1 34,2 35,7 33,3 30,6 31,7

Sweden 33,3 41,3 47,4 47,5 51,4 48,9 46,4 46,7 45,8

Switzerland 17,5 24,4 25,8 27,7 30,0 29,2 29,1 29,7 29,8

Turkey 10,6 11,9 11,5 16,8 24,2 24,3 24,2 24,6 26,0

United Kingdom

30,4 34,9 37,0 34,0 36,3 35,7 35,7 34,3 35,0

United States 24,7 25,6 25,6 27,8 29,5 27,1 26,3 24,1 24,8

Média não ponderada

OECD Total 25,4 29,3 32,5 34,6 35,3 35,0 34,6 33,8 n.a.

Fonte: OCDE

Apesar desta tendência de diminuição do nível de tributação em percentagem PIB,

teremos que aguardar se esta se irá manter.

5 Fonte: OCDE (2011)

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Gráfico 1 – Evolução das receitas fiscais totais em % PIB – Países EU (antes do alargamento a

Leste)

Fonte: OCDE

No caso dos países que compõem a UE (incluindo ainda a Noruega e Islândia que

fazem parte do Espaço Económico Europeu – EEE) (Gráfico 1), vemos igualmente uma

evolução ascendente do nível de fiscalidade desde 1965 (que se situava, em média,

entre 15% e os 35% do PIB) até meados de 2005 e uma ligeira retracção a partir de

2008, estabilizando-se, actualmente, a carga fiscal no universo destes países entre os

30% e 50% do PIB.

Entre 2000 e 2009, alguns países da UE tiveram reduções substanciais ao nível da sua

carga fiscal. É o caso da Irlanda, que desceu de 31% para 28%, da Finlândia, que

desceu de 47% para 42,6%, e da Suécia, que desceu de 51% para 45%.

No caso da Austrália, do Canadá, do Japão e dos EUA (Gráfico 2) assistimos,

igualmente, a uma evolução ascendente do nível de fiscalidade desde 1965 até meados

de 2000 e uma sucessiva retracção a partir daquela data.

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Gráfico 2 - Evolução das receitas fiscais totais em % PIB – Austrália, Canadá, Japão e EUA

Fonte: OCDE

Austrália – Em 1965, situava-se em 27,5%, fixou-se num máximo de 29,8% em 2005,

diminuindo para 25,9% em 2009

Canadá – Em 1965, situava-se em 32,5%, atingiu o máximo de 33,4% em 2005, diminuindo

para 32% em 2009

EUA – Em 1965, situava-se em 25,6%, atingiu o máximo de 29,5% em 2000, voltando a

diminuir para 24,1% em 2009

Japão - Em 1965, situava-se em 27,1%, atingiu o máximo de 28,3% em 2008, voltando a

diminuir para 26,9% em 2009

2.2. Tendências nas estruturas fiscais.

Independentemente das opções de política fiscal, dos diferentes estudos realizados

pela OCDE retira-se, desde logo, a conclusão de que, não obstante as diferenças

concretas de cada ordenamento tributário e do peso relativo que cada imposto assume,

a receita fiscal na generalidade dos Estados membros deriva de três fontes

fundamentais: (i) dos impostos sobre o rendimento; (ii) dos impostos sobre o consumo;

e, finalmente, (iii) das contribuições para a Segurança Social.

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Gráfico 3 - Evolução do nível de fiscalidade por imposto OCDE

Fonte: OCDE

No Gráfico 3 constatamos que os impostos sobre o rendimento (pessoal e sobre os

lucros das empresas) e as contribuições para a Segurança Social representam sempre

entre 50% a 60% da carga fiscal em percentagem PIB.

Curiosamente, quase todas as reformas fiscais ao nível dos impostos sobre o

rendimento (em particular sobre o rendimento pessoal) caracterizaram-se por uma

redução das taxas. No início da década de oitenta era comum na generalidade dos

países da OCDE encontrarmos taxas marginais máximas de impostos sobre o

rendimento de 70%, enquanto que, actualmente, se situam (em média) abaixo dos

50%.

E no que respeita a tributação das empresas esta tendência de redução das taxas de

imposto é ainda mais acentuada, tendo a maioria dos países da OCDE descido a sua

taxa normal de IRC entre 5 p.p. e 8 p.p. entre 2000 e 2005. A incongruência entre a

progressiva redução de taxas e o aumento das receitas quanto a estes impostos deve-

se ao sucessivo alargamento da base de incidência.

Pelo contrário, e no que respeita às contribuições para a Segurança Social, o que se

tem assistido desde 1965 é um aumento sucessivo e paulatino da carga fiscal destes

tributos na generalidade dos países da OCDE.

Conforme se constata melhor pelo Gráfico 4 abaixo, entre 1965 e 2000 os impostos

sobre o rendimento pessoal preponderavam, sendo que esta tendência inverteu-se a

partir de 2005, passando as contribuições para a segurança social a representar, em

média, a maior fatia das receitas sobre o nível de fiscalidade.

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Gráfico 4 – Impostos sobre o rendimento e segurança social OECD em %PIB

Fonte: OCDE

2.2.1. As tendências das reformas nos Impostos sobre o Rendimento.

(a) A tributação do rendimento pessoal

Um dos debates a que se tem assistido a nível internacional é o que se refere à

abordagem à tributação do rendimento pessoal. Nesta matéria há, essencialmente, três

sistemas principais de tributação.

(i) O sistema de tributação global do rendimento (comprehensive income

tax)

Este sistema caracteriza-se, essencialmente, pelo facto de todo e qualquer rendimento

líquido, independentemente da sua fonte ou natureza, ser englobado e sujeito a

tributação através de taxas progressivas de imposto. Isto significa que os rendimentos

do trabalho são tributados nos mesmos termos e de acordo com as mesmas taxas dos

rendimentos de capitais.

Relativamente a este sistema de tributação podemos salientar os seguintes aspectos

positivos:

• Este sistema assegura uma maior equidade horizontal, promovendo uma tributação

idêntica as pessoas que têm igual capacidade contributiva;

• A agregação dos rendimentos torna mais fácil a aplicação de taxas progressivas de

imposto, obtendo-se uma maior equidade vertical;

• Deixa de haver a tentação de descaracterização dos diferentes rendimentos por

meras razões fiscais.

Como aspectos negativos, podemos assinalar os seguintes:

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• Não tem em consideração o facto de o capital circular mais facilmente que o factor

trabalho e, por isso, escapar mais facilmente às taxas mais elevadas, através da

transferência de investimentos e de poupanças para o estrangeiro;

• Assenta essencialmente no princípio da realização e não do rendimento-acréscimo;

• Por regra as remunerações acessórias e os rendimentos das opções de compra de

acções (stock options), embora sendo tributados na maioria dos países, são-no a

taxas mais baixas do que as aplicadas aos rendimentos de salários.

(ii) O sistema de tributação dual do rendimento (dual income tax)

Este sistema pretende combinar a tributação progressiva do rendimento do trabalho

com a aplicação de uma taxa única ao rendimento empresarial e de capital, com uma

base de imposto mais alargada e uma taxa de imposto muito baixa. Estes sistemas são

simples no sentido em que existe uma taxa de imposto sobre o rendimento líquido,

com relativamente muito poucas deduções e abatimentos fiscais6.

Relativamente a este sistema de tributação podemos salientar os seguintes aspectos

positivos:

• Este sistema assegura um mesmo nível de equidade horizontal aos contribuintes

com rendimentos de natureza similar (trabalho e/ou capital);

• A tributação baixa do factor capital, claramente mais volátil e circulante, limita a

tentação da sua deslocalização para outros sistemas mais apetecíveis.

Este sistema tem alguns problemas que nenhum dos países que o aplica (embora

nenhum na sua forma mais pura) conseguiu ultrapassar, sendo o principal a maior

apetência para a tentativa de descaracterização do rendimento do trabalho e

transformação do mesmo em rendimento de capitais, designadamente através da

constituição de sociedades.

(iii) O sistema de tributação proporcional do rendimento (flat income tax)

Nos últimos anos este sistema de tributação tem estado nas agendas reformadoras de

vários Estados-membros da OCDE.

Existem várias formas possíveis de tributação proporcional:

• Taxa única, sem qualquer dedução na base, pelo que todo o rendimento é

tributado a uma taxa fixa (a chamada Flat Tax proporcional);

6 Este sistema foi introduzido inicialmente na Finlândia, Noruega e Suécia. A Noruega foi quem introduziu este sistema na sua forma mais pura com a aplicação de uma taxa fixa de imposto sobre o rendimento pessoal líquido e uma tributação progressiva do rendimentos de salários e pensões.

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• Taxa única com um montante mínimo de dedução na base em que todo o

rendimento acima desse montante mínimo é tributado a uma taxa fixa (chamada

Flat Tax com dedução fixa na base);

• Taxa única com um montante mínimo de dedução na base em que todo o

rendimento acima desse montante mínimo é tributado a uma taxa fixa, excepto o

rendimento da poupança e investimento que não são tributados a nível pessoal,

mas a nível empresarial;

• Taxa única sobre o rendimento com crédito de imposto reembolsável. O crédito de

imposto é de montante igual para todos os contribuintes.

Este sistema de tributação proporcional é o que melhor respeita o principio de

equidade horizontal, na medida em que tributa de forma igual os rendimentos iguais.

Ao nível da simplificação fiscal, também é o sistema que menores custos

administrativos comporta em comparação com os sistemas duais ou de tributação

global e, como têm, normalmente, uma única taxa fixa, revelam-se claramente mais

simples.

2.2.2. As tendências das reformas nos impostos indirectos.

(a) O Imposto sobre o Valor Acrescentado.

O Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) é o imposto geral sobre o consumo mais

difundido a nível mundial, sendo que já se encontra em vigor em todos os Estados

membros da OCDE, com excepção dos EUA que mantém um imposto sobre as vendas.

Para além do facto de a adopção deste imposto ser uma condição de integração na EU

(abrangendo 27 Estados-membros), a difusão mundial do IVA deve-se a várias ordens

de factores, das quais se destacam:

(i) A eliminação do efeito cumulativo7 que os impostos sobre as transações não

conseguiam impedir;

(ii) Ser um imposto plurifásico, i.é, que conduz a pagamentos fraccionados ao longo

da cadeia económica, por contraposição com os impostos monofásicos em que o

imposto é liquidado e pago uma única vez no circuito económico (imposto no

produtor, imposto no grossista ou imposto no retalhista);

(iii) Maior neutralidade nas transacções internas, trazida pelo mecanismo do direito à

dedução no IVA suportado nos inputs;

7 Também denominado por “efeito cascata”, i.é, o imposto ao incidir sobre o valor bruto de todas as transacções efectuadas nos circuitos económicos dos bens (e não sobre o valor acrescentado em cada fase do circuito), produzirá imposto sobre imposto e aumento subsequente das próprias margens que poderão incorporar o próprio imposto suportado nos inputs e, consequentemente, ampliar este efeito cascata.

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(iv) Maior neutralidade nas transacções externas, decorrente do princípio da

tributação no destino (ou taxa 0%) nas exportações, com direito a dedução do

IVA nos inputs;

(v) Ampla base de incidência, pois incide não apenas nas transacções de

mercadorias, mas também nas prestações de serviços;

(vi) Custos de cobrança mais baixos, em particular nos países em que o IVA tem uma

estrutura simplificada, com uma taxa única e regimes de isenção mais simples.

Em 2011, e de acordo com os dados divulgados pela OCDE, as taxas normais de IVA

variavam entre os 5%, como é o caso do Japão, e 25%, como é o caso da Dinamarca,

Hungria, Islândia, Noruega e Suécia. Há, contudo, alguns países (essencialmente os

Estados-membros da UE) que mantém, para além da taxa normal de IVA, uma taxa

reduzida e uma taxa intermédia.

Em termos de análise das receitas globais, temos assistido a um aumento do peso

relativo dos impostos gerais sobre o consumo nas receitas fiscais globais.

Conforme se constata do Gráfico 5 abaixo, em 2005 o peso relativo do IVA (em termos

de percentagem da carga fiscal) situou-se, em 2009, em 20% e, cerca de 11%, para

os demais impostos sobre o consumo no mesmo período.

Gráfico 5 – Peso relativo dos impostos sobre o consumo em % (médias não ponderadas)

Fonte: OCDE

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Página/Page: 16/32 Elsa Rodrigues

3. A União Europeia.8

3.1. Estruturas e tendências nas receitas fiscais na UE.

3.1.1. O nível de fiscalidade na UE.

Há algumas diferenças no nível de fiscalidade no seio da União Europeia ao nível dos

27 Estados-Membros. Enquanto a média do nível de fiscalidade da Europa a 15

membros era de 39% do PIB, após a abertura a Leste em 2004, esta média baixou

consideravelmente para 32% do PIB. O país com maior carga fiscal no seio da UE é a

Dinamarca, com cerca de 48% do PIB, sendo a Letónia o país com menor carga fiscal,

situada em 26,6% do PIB (Gráfico 6).

Gráfico 6 – Nível de fiscalidade na UE 2008/2009 em %PIB

3.1.2. Decomposição por tipo de imposto.

Verificam-se diferenças significativas nos diferentes Estados-membros no que respeita

ao peso relativo dos impostos sobre o consumo, sobre o rendimento e contribuições

para a Segurança Social. Em 2009, os impostos indirectos representavam menos de

30% da tributação global na Bélgica e em Espanha, e mais de 50% na Bulgária. A

percentagem dos impostos sobre o rendimento representava cerca de 20% na

Eslováquia e quase 63% na Dinamarca. No que se refere às contribuições para a

Segurança Social, estas representavam apenas cerca de 2% na Dinamarca, cerca de

20% na Suécia, Malta e Reino Unido, mas atingiam quase 45% na República Checa.

8 No que diz respeito à União Europeia, cumpre desde logo fazer uma ressalva salientando que, ao contrário do IVA, ao nível da demais tributação não existe harmonização fiscal, pelo que a análise será feita sempre em termos individuais de cada Estado-membro. Efectivamente, a harmonização fiscal em sede de impostos sobre o rendimento é muito parcelar, decorrendo apenas da aplicação da Directiva mães e Filhas, da Directiva da Poupança, da Directiva dos juros e royalties e da Directiva das fusões, cisões, permutas de acções e entradas de activos.

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Gráfico 7 – Composição por imposto nos diferentes Estados-membros 2009

3.1.3. Decomposição por função económica.

Se analisarmos estes dados numa perspectiva, não de divisão por impostos, mas por

função económica, poderemos alcançar as seguintes conclusões:

Há uma grande disparidade quer no nível, quer na composição da carga fiscal nos

diferentes Estados-membros. Os Estados membros que entraram na UE em 2004

incidem mais o seu sistema nos impostos sobre o consumo, enquanto que os sistemas

fiscais dos restantes Estados-membros da Europa a 15 fixam a sua base de receita nos

impostos sobre o trabalho.

Embora ao nível da UE exista uma harmonização fiscal ao nível do IVA verificamos,

contudo, uma enorme variedade de taxas de IVA que justificam estas disparidades.

Já ao nível dos impostos sobre os rendimentos do trabalho e de capitais, e

considerando a inexistência de harmonização fiscal, as disparidades entre os Estados-

membros são ainda maiores.

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Página/Page: 18/32 Elsa Rodrigues

Gráfico 8 – Nível de fiscalidade decomposição por função económica 2009

3.2. As Reformas Fiscais na UE.

3.2.1. Enquadramento geral – as tendências das estruturas fiscais no seio

da UE.

Quando a crise financeira e económica de 2008 eclodiu, alguns dos Estados-membros,

nos quais se incluiu Portugal, apostaram em aplicar medidas de desagravamento ou

incentivos fiscais, de forma a relançarem as suas economias. No entanto, com o

colapso das Finanças Públicas, os diferentes Estados-membros tiveram que tomar

medidas fiscais mais gravosas, de forma a suportar as suas Finanças Públicas na actual

conjuntura.

Em 2010 e 2011, a maioria das reformas implementadas pelos Estados-membros

focaram-se em aumentar as receitas. As principais medidas levadas a cabo foram ao

nível dos impostos sobre o rendimento de base pessoal, aumentando as suas taxas

e/ou a base tributável. Neste grupo incluiu-se, designadamente a Grécia, França,

Irlanda, Letónia, Luxemburgo, Portugal, Espanha e o Reino Unido.

Para além do imposto sobre o rendimento pessoal, o IVA e os impostos especiais sobre

o consumo (álcool, tabaco, produtos petrolíferos e energéticos) também sofreram

alterações ao nível das taxas e da base tributável em vários países como Portugal,

Espanha, Hungria, Polónia, Reino Unido.

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Quadro 2 – Alterações nos diferentes tributos em 2010 e 2011

3.2.2. Os impostos sobre o rendimento e segurança social.

(a) Imposto sobre o Rendimento Pessoal

Entre 2010 e 2011, a maioria dos Estados-membros implementaram algumas medidas

substanciais em sede do imposto sobre o rendimento pessoal.

Sendo certo que alguns países como a Hungria, Bulgária, Finlândia, Holanda, Alemanha,

Suécia e Lituânia diminuíram os impostos sobre o rendimento pessoal, a restante

maioria dos países aumentou a carga fiscal sobre este tipo de imposto. Este aumento

verificou-se, não apenas pelo aumento efectivo das taxas, mas também pelo

alargamento da base tributável.

A França, por exemplo, aumentou as suas taxas marginais mais elevadas, ao mesmo

tempo que aumentou a taxa fixa aplicada aos rendimentos de capitais. A Espanha, por

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outro lado, introduziu no seu sistema fiscal duas taxas marginais adicionais, de 46% e

47%, nos escalões mais altos. A Áustria implementou, em 2011, um sistema de

tributação dual, aplicando aos rendimentos de capitais e às mais-valias mobiliárias uma

taxa fixa de 25%. O mesmo sucedeu com Portugal que aumentou todas as taxas sobre

os rendimentos tributados a título liberatório, designadamente os rendimentos de

capitais aos quais passaram a aplicar-se uma flat rate de 25%.

Para além do aumento das taxas progressiva e/ou fixas, a maioria dos países procedeu

ao alargamento da base tributável. Esta medida, na sua maioria, fez-se com a retirada

ou cessação de muitos benefícios fiscais, diminuição de deduções à colecta ou

abatimentos ao rendimento tributável ou, ainda, de anteriores rendimentos excluídos

que passaram a ser sujeitos. Em Portugal, por exemplo, as mais-valias mobiliárias de

acções detidas há mais de 12 meses, historicamente excluídas de tributação, passaram

a ser sujeitas a IRS a uma flat rate de 25%. Por outro lado, as deduções à colecta

foram muito limitadas. A Dinamarca aumentou a sua base tributável por força da

redução de deduções sobre o trabalho ou mesmo sobre juros suportados. Em Espanha,

a dedução existente sobre os custos com investimento imobiliário foi retirada

relativamente a sujeitos passivos que auferiam rendimento acima de €24.170. Já a

Roménia aumentou a sua base tributável ao passar a incluir no âmbito de incidência

deste imposto os rendimentos de mais-valias e juros de depósitos bancários.

(b) Impostos sobre o rendimento de pessoas colectivas

No caso dos impostos sobre os lucros das empresas, e de acordo com os dados obtidos

relativos a 2011, tem-se mantido a tendência da descida da carga fiscal na maioria dos

países de UE. Esta descida resulta não apenas das reduções sucessivas das taxas

normais de imposto, mas igualmente na criação de alguns regimes especiais de

tributação para contribuintes de pequena ou média dimensão, contribuintes de

sectores de actividade considerados chave ou mesmo derivada da introdução de

políticas de incentivos fiscais locais ou regionais.

Quanto a países que reduziram as suas taxas normais de imposto sobre o rendimento,

e a título de exemplo, referimos a Hungria que introduziu uma taxa mais baixa de 10%

sobre rendimentos até HUF 250M, e que, até 2013, irá gradualmente substituir a taxa

normal aplicável em 2010 de 19% por esta de 10%. O Reino Unido baixou as duas

taxas de imposto sobre o rendimento sobre os lucros em 1p.p., fixando-as em 27% e

20%, estabelecendo a descida anual da taxa normal deste imposto em 1p.p. nos

próximos anos até atingir um mínimo de 24%.

Portugal foi o único país a aumentar a taxa normal deste imposto, através da fixação

de uma derrama estadual entre os 3% e os 5%, a incidir sobre rendimentos acima de

1,5M €.

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(c) Contribuições para a Segurança Social

Em 2010 e 2011, as contribuições para a Segurança Social mantiveram-se

praticamente inalteradas na maioria dos países da UE, embora tendo sofrido aumentos

na Irlanda, Letónia e na República Checa.

Embora esta aparente estabilidade da carga fiscal das contribuições para a Segurança

Social, a verdade é que estas contribuições continuam a ter um peso significativo na

arrecadação da receita por comparação com outros impostos, designadamente

impostos sobre o rendimento e IVA.

3.2.3. Os impostos indirectos.

(a) IVA

A maioria dos países da EU aumentou as taxas normais de IVA praticadas, sendo que

nalguns casos esse aumento foi significativo, conforme podemos verificar das Figs. 1 e

2 abaixo.

Fig. 1 – Taxas normais de IVA em 2009

Fonte: UE

Em 2009, a Irlanda aumentou a sua taxa normal de IVA para 21,5%, a Estónia

aumentou para 20%, a Letónia para 21%, a Lituânia para 19% e a Hungria para 25%.

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Fig. 2 – Taxas normais de IVA em 2011

Fonte: EU

Em 2011, vemos que Portugal, a Grécia e a Polónia aumentaram as suas taxas normais

de IVA para 23%, a Espanha de 16% para 18% e o Reino Unido de 17,5% para 20%.

A Hungria aumentou de 20% para 25% e a Roménia de 19% para 24%.

No caso de Portugal, para além deste aumento da taxa normal, foram aumentadas a

taxa intermédia de 12% para 13% e a taxa reduzida de 5% para 6%.

(b) Impostos Especiais sobre o Consumo (tabaco, álcool, energia e produtos

petrolíferos e outros)

De acordo com dados oficiais da UE (www.ec.europa.eu/trends), em 2009 e 2010, na

generalidade dos países da UE houve um aumento significativo das taxas aplicáveis e

do âmbito de incidência nestes impostos (e, consequentemente, do nível de

fiscalidade).

A Alemanha introduziu um imposto especial sobre a energia nuclear. Áustria e

Alemanha introduziram um imposto especial sobre os bilhetes de avião relativo a voos

de saída dos seus aeroportos. Áustria, Bélgica, Finlândia e Holanda introduziram

impostos especiais sobre a circulação de veículos e emissão de CO2.

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Página/Page: 23/32 Elsa Rodrigues

Uma novidade a assinalar prende-se com a criação, na maioria dos países membros, de

alguns impostos especiais sobre produtos alimentares com impacto nas políticas de

saúde pública. A Áustria, Bulgária, Chipre, República Checa, Dinamarca, Estónia,

Finlândia, Grécia, Letónia, Polónia, Roménia, Eslováquia, Eslovénia e Espanha

introduziram um imposto sobre “gorduras saturadas” em produtos alimentares (Fat

Tax). A Finlândia introduziu um imposto especial sobre os doces e os gelados.

Quadro 3 – Quadro comparativo da evolução dos impostos especiais sobre o consumo em 2009

e 2010

4. O caso português.

4.1. Enquadramento geral: considerações e objectivos.

Não poderia terminar a minha apresentação sem falar do caso Português. Por um lado,

realizando uma análise da evolução económica da tributação em Portugal no que

respeita ao nível da fiscalidade e à estrutura fiscal. E, por outro, em termos das

grandes linhas do sistema fiscal português, o qual resultou de algumas importantes

reformas fiscais ocorridas no último quartel do século XX em Portugal, quer ao nível

dos impostos indirectos (com a introdução do IVA em 1986), posteriormente, ao nível

dos impostos directos com a denominada grande Reforma sobre o Rendimento de

1988/89 e, finalmente, ao nível do património, com a Reforma do Património de

2003/2004.

Quando as reformas fiscais começaram a ser discutidas, ainda na década de 80, vivia-

se em Portugal uma grande instabilidade política com sucessivos Governos, com

alternância de partidos (recordo aqui a dissolução da Assembleia da República em

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1987 com necessidade de eleições legislativas e posse de novo Governo em Julho de

1987, um ano após a adesão à CEE e um ano antes da Reforma de 88/89). Esta

instabilidade política marcou muito o processo reformador, pois embora houvesse uma

linha condutora já definida9, diferentes facções políticas têm concepções distintas do

que deve ser o sistema fiscal.

Além desta instabilidade política, era ainda recente o apego aos princípios da

Revolução de Abril e, nesta lógica, à constituição económica de 1976 – a Constituição

fazia prevalecer a perspectiva da equidade vertical, com relevo dado ao carácter

progressivo da tributação, com preocupação ideológica de igualização do rendimento e

da fortuna.

Numa perspectiva internacional, nos impostos sobre o rendimento a adesão à

Comunidade Europeia teve influência directa na reforma nos impostos indirectos, em

particular com a introdução do IVA, mas a nível dos impostos directos, dada a

inexistência de harmonização fiscal, não existiam sérias restrições ou imposições.

Não obstante, e em particular nos impostos sobre o rendimento (o IVA decorreu de

imposição externa, com as grandes linhas já definidas), os decisores tinham assentes

como principais objectivos (gerais e específicos) a atingir com a reforma fiscal os

seguintes:

• Não agravamento da carga fiscal. O que foi de certa forma conseguido com o

alargamento da base tributável e o corte de benefícios fiscais (nesta área procedeu-

se à eliminação de um vasto leque de isenções, deduções à matéria colectável,

reduções de taxas, entre outros);

• Equilíbrio entre os desejos de maior justiça fiscal e social e os impulsos

liberalizantes de uma tributação neutra, introduzindo factores de maior

racionalidade, modernidade e justiça que, no essencial, se tem mantido;

• Estabilidade legislativa, de forma a testar, monitorar e avaliar as soluções

preconizadas - embora este objectivo inicial não tenha sido, de facto, alcançado,

pois foram introduzidas sucessivas alterações legislativas que desvirtuaram de certa

forma a Reforma de 88/89;

• Tributação ampla do rendimento na perspectiva do acréscimo patrimonial

(conhecido pelo Modelo de Schanz/Simons), quer no que se refere aos rendimentos

pessoais/individuais, quer no que se refere à tributação das empresas.

9 Como exemplo das divergências entre a Comissão da Reforma de 88 e o Governo de então, recorde-se a tributação das mais-valias mobiliárias e dos rendimentos de capitais, em que a Comissão defendia que deveriam integrar a base tributável 8de acordo com a perspectiva de tributação global) e o Governo propôs que esses rendimentos fossem retirados da base tributável e sujeitos a uma tributação autónoma (sistemas dualista). Esgrimidos argumentos

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4.2. Principais índices de tributação.

De acordo com os estudos da OCDE, em 2009 o nível de fiscalidade em Portugal, em

termos de percentagem do PIB, situava-se em cerca de 31%. Com excepção da Grécia

(que, em 2009, era de 30%) e da Irlanda (27,8%), é o mais baixo da Europa a 15.

Relativamente aos países de Leste que aderiram em 2004, fica ainda atrás da Hungria

e da República Checa e, embora muito próximo, da Polónia (31,8%).

Embora esta posição se situe aparentemente dentro da média da OCDE (e Europeia), a

verdade é que Portugal, desde 1965, tem assistido a um sucessivo aumento da sua

carga fiscal, em regra superior aos demais países da OCDE.

Gráfico 9 – Comparação nível fiscalidade Portugal vs Média OCDE

Fonte: OCDE

E, se era assim em 2009 10 , com a recente crise económica e financeira em que

Portugal se encontra e a necessidade da aplicação de medidas sérias de austeridade

que, entre outras, incluiu um grave aumento de taxas e alargamento da base tributária,

os índices da OCDE e UE quanto ao nível de fiscalidade em Portugal terão, sem sombra

de dúvida, aumentado.

Este nível de carga fiscal torna-se mais preocupante quando medimos o nível de

fiscalidade potencial. De facto, o esforço fiscal de Portugal (com dados a 2006) era de

1,008, ou seja, a capacidade tributária dos portugueses encontrava-se sobre utilizada.

Se actualizarmos este índice para a presente conjuntura económica e financeira,

podemos afirmar que a capacidade tributária dos contribuintes portugueses está em

esforço.

10 Aliás, em 2009 e 2010, no pós-inicio da crise financeira mundial em 2008, Portugal fez uma tentativa de relançamento da economia através da introdução de medidas de redução da carga fiscal. Como os factos não desmentem, sem terem adicionado a estas medidas outras (tais como o corte de despesas), a redução dos impostos foi, para não a adjectivar noutros termos, efémera e redutora.

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Página/Page: 26/32 Elsa Rodrigues

Em 2012, o nível das taxas aplicadas em Portugal relativamente aos principais tributos

é o seguinte:

Tributo Taxas

Imposto sobre Rendimentos das Pessoas

Singulares - IRS

Taxas progressivas…………..…...…… entre 11,5% e 46,5%

Em 2012, foi introduzida uma taxa adicional de 2,5%

aplicável a rendimentos superiores a €153.300.

Rendimentos de capitais………………………….……………25%

Imposto sobre o Rendimento das Pessoas

Colectivas - IRC

Taxa normal…………………………………….………..………. 25%

Derrama municipal………………………………………………1,5%

Derrama estadual………….……………………. entre 3% e 5%

Imposto sobre o Valor Acrescentado - IVA

Taxa normal…………………………………….………..………. 23%

Taxa intermédia……………………………….…….…….……. 13%

Taxa reduzida……………………………….…………….…,…… 6%

Contribuições para a Segurança social

Regime normal:

Trabalhador………………………………………………..……… 11%

Empregador……………………………..………………...… 23,75%

4.3. Grandes linhas das reformas fiscais em Portugal.

4.3.1. A introdução do IVA (1986).

Em 1980, e de forma a preparar a entrada de Portugal na Comunidade Económica

Europeia (hoje UE), foi constituída a Comissão do Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Após 4 anos de árduo trabalho desta Comissão, pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26

de Dezembro, foi aprovado o Código do IVA, que viria a entrar em vigor em 01 de

Janeiro de 1986, data que coincidiu com a adesão de Portugal à, então designada, CEE.

Anteriormente a 1986 vigorava em Portugal o Impostos de Transacções, que se

caracterizava essencialmente por ser um imposto com uma reduzida base tributável

(não incluía, entre outras, as prestações de serviços), monofásico no grossista e em

cascata.

O IVA pode caracterizar-se como um imposto indirecto, plurifásico e que opera sobre o

consumo em geral através do método subtractivo indirecto. Quer isto dizer que o IVA

incide sobre todas as fases do processo produtivo (do produtor ao retalhista), através

de uma técnica de liquidação de imposto nos outputs e dedução de imposto nos inputs.

Este método subtractivo indirecto permite atingir em simultâneo vários objectivos, dos

quais destacamos os seguintes:

(i) Tributação apenas do valor acrescentado em cada fase da cadeia produtiva;

(ii) Repartição do encargo fiscal pelos diversos sujeitos passivos nessa cadeia

produtiva (sendo que quem o suporta a final é o consumidor final);

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Página/Page: 27/32 Elsa Rodrigues

(iii) Considerando que o IVA funciona por liquidação/dedução, e este direito à

dedução apenas pode ser exercido com base em factura ou documento

equivalente devidamente emitido, há um controlo cruzado entre sujeitos passivos;

(iv) Neutralidade do imposto, eliminando-se os efeitos cumulativos ou em cascata de

imposto sobre imposto.

Tem sido comummente aceite pela doutrina que a introdução do IVA em 1986 foi um

caso de sucesso, não apenas em termos de estrutura de impostos, pois assegura de

facto uma maior neutralidade na tributação, mas também e principalmente em termos

do aumento de arrecadação de receita.

São de assinalar, contudo, algumas situações que correm menos bem, mas que se

prendem não com o imposto propriamente dito, mas com a estrutura empresarial e

económica de Portugal. Falamos aqui, a título de exemplo a proliferação de regimes

especiais e o peso elevado dos contribuintes sujeitos a estes regimes. De acordo com

dados oficiais, cerca de 40% dos contribuintes de IVA estão abrangidos pelo regime

especial de isenção, previsto nos artigos 53.º e seguintes do Código do IVA (regime

especial dos Pequenos Retalhistas e dos prestadores de serviços. Outra questão tem a

ver com o peso excessivo da receita deste imposto concentrado num pequeno núcleo

de grandes contribuintes.

Nesta sede, não podemos deixar de assinalar as situações de fraude em sede de IVA

sendo a mais conhecida a “Fraude Carrossel” que representa entre 2% e 10% da do

PIB da União Europeia. Só em Portugal, no ano de 2010, representou cerca de 6.113M

de euros de perda de receita.

4.3.2. A reforma fiscal dos impostos sobre o rendimento (reforma de

1988/89).

(a) Em sede de impostos sobre o rendimento das pessoas singulares

Todos os fiscalistas portugueses são unânimes a considerar a grande Reforma dos

Impostos sobre o rendimento como uma viragem histórica na fiscalidade portuguesa,

na qual se procedeu à substituição de um sistema cedular-misto (vários impostos

espartilhados: imposto complementar (introduzido pela reforma de 1962/65), imposto

profissional, contribuição industrial, etc.) por um sistema de tributação

tendencialmente11 unitária do rendimento global (este com uma maior preocupação de

equidade horizontal) e progressivo (visando uma maior equidade vertical) – aliás, já

consagrado na Constituição da República Portuguesa de 1976.

11 O adjectivo tendencialmente é aqui aplicado, dado que os rendimentos de capitais podem ser tributados a um taxa fixa (flat rate), actualmente, de 25%, caso não se opte pelo seu englobamento.

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Página/Page: 28/32 Elsa Rodrigues

Para além desta alteração estrutural, algumas outras foram introduzidas e que aqui

resumimos nos seguintes termos:

• A base de incidência assente numa concepção de rendimento-acréscimo

(comprehensive tax base). Um conceito alargado de rendimento que abrange todos

os acréscimos patrimoniais de rendimento, independentemente da sua fonte, com

excepção das aquisições a título gratuito;

• Delimitação dos rendimentos por categorias. Em 1989, existiam as seguintes

categorias de rendimentos:

Categoria A – Rendimentos de trabalho dependente;

Categoria B – Rendimentos de Trabalho Independente;

Categoria C – Rendimentos Comerciais e industriais;

Categoria D – Rendimentos Agrícolas;

Categoria E – Rendimentos de Capitais;

Categoria F – Rendimentos Prediais;

Categoria G – Rendimentos de Mais-Valias

Categoria H – Rendimentos de Pensões

Categoria I – Rendimentos do Jogo

• Tributação conjunta do agregado familiar com aplicação de uma regra de quociente

conjugal (spliting);

• Englobamento dos rendimentos, embora este englobamento seja opcional nos casos

de rendimentos de capitais, normalmente tributados a uma flat rate (hoje) de 25%,

a título liberatório;

• Integração do imposto pessoal com o imposto sobre os lucros, com uma atenuação

parcial da dupla tributação económica de imposto, através da atribuição de um

crédito de imposto. Esse crédito de imposto, inicialmente era de 20%, sendo

sucessivamente aumentado até atingir os 60%. Posteriormente, o sistema de

crédito de imposto foi substituído por um sistema de englobamento parcial de 50%

desse rendimento;

• Existência de um sistema de abatimentos e deduções à colecta.

Embora, actualmente, já sem expressão, o sistema de abatimentos caracterizava-se

por uma subtracção ao rendimento global líquido de uma série de despesas

(educação, saúde, assistência a idosos dependentes, encargos financeiros com

aquisição de habitação própria), com limites máximos ou não, de forma a obter-se a

matéria colectável.

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Este sistema veio a ser substituído, com a Lei do Orçamento de Estado para 1999,

por deduções à colecta de imposto. Estas deduções são igualmente subtracções,

desta feita não ao rendimento, mas à colecta do imposto.

Em 2000, foi introduzida uma “mini reforma fiscal”, cujas alterações se destacam:

• Fusão das categorias B, C e D, numa única categoria de rendimentos empresariais e

profissionais; e as categorias G e H numa única de Incrementos patrimoniais, onde

se incluem as mais-valias, indemnizações, importâncias obtidas em virtude de

assunção de obrigações de não concorrência, entre outros;

• Criação de um sistema simplificado de tributação dos rendimentos empresariais;

• Transformação de abatimentos em deduções à colecta;

• Alteração do sistema de crédito de imposto para um sistema de englobamento

parcial para os rendimentos de lucros distribuídos;

• Reconhecimento fiscal das uniões de facto.

(b) Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas

Considerando a complexidade do sistema de tributação das pessoas colectivas,

salientam-se aqui as principais regras aplicáveis em sede de imposto sobre o

rendimento das pessoas colectiva:

• Tributação pelo lucro real, em detrimento do lucro presumido com base em

métodos indirectos de apuramento da matéria colectável, este apenas aplicável

quando o contribuinte não apresenta declarações de rendimentos ou as mesmas

não mereçam credibilidade;

• O Resultado Líquido do Exercício (RLE) apurado na contabilidade passou a constituir

a base inicial de apuramento da matéria colectável;

• Esse RLE é, posteriormente, corrigido fiscalmente na declaração anual de

rendimentos, acrescendo ou deduzindo proveitos ou custos não aceites fiscalmente;

• Uma taxa normal de IRC, inicialmente de 36,5%, que veio a ser reduzida ao longo

destes 21 anos, situando-se actualmente em 25%;

• Aplicação de uma sobretaxa de IRC (a derrama municipal);

• Existência de 3 pagamentos antecipados por conta do imposto;

• Introdução em 1998, de um Pagamento Especial por conta, apenas dedutível à

colecta (surge assim uma colecta mínima para as sociedades que não apresentam

lucros);

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• Introdução de um sistema simplificado de determinação da matéria colectável, em

2000, mas que veio a ser suspenso em 2010;

• Introdução de tributações autónomas de despesas (não dedutíveis), tais como

despesas confidenciais, ajudas de custo, despesas de representação, entre outras.

4.3.3. A reforma fiscal do património (Reforma de 2003/2004).

Em finais de 2003 foi publicada, pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, a

Reforma do Património.

Com esta reforma do património foi introduzido o Imposto Municipal sobre Imóveis que

veio suceder à Contribuição Autárquica, o Imposto Municipal sobre as Transmissões

Onerosas de Imóveis que veio substituir o imposto Municipal de Sisa e, bem assim, foi

substancialmente alterado o Imposto do Selo, que passou a abranger as operações

gratuitas anteriormente reguladas no Imposto sobre as Sucessões e Doações.

A principal alteração nesta matéria resulta do estabelecimento de um regime especial

de avaliação dos prédios urbanos de forma a determinar o respectivo valor patrimonial

tributário, com base em critérios objectivos e pré-definidos.

A determinação do valor patrimonial tributário baseia-se na seguinte fórmula:

Vpt = Vc x A x Ca x Cl x Cq x Cv

Em que:

Vpt = Valor patrimonial tributário

Vc = Valor base dos prédios edificados

A = Área bruta de construção mais a área excedente de implantação

Ca = Coeficiente de afectação (habitação, comércio, serviços, armazéns, etc)

Cl = Coeficiente de localização

Cq = Coeficiente de qualidade e conforto

Cv = Coeficiente de vetustez

Este Vpt servirá de base de incidência para tributação em sede de imposto municipal

sobre imóveis e, sendo superior ao preço acordado, servirá igualmente de base de

incidência para tributação nas transmissões onerosas de imóveis. O Vpt também

poderá ter impacto no apuramento dos resultados em sede de IRC se o preço

acordado na compra e venda de um imóvel for inferior àquele.

4.3.4. Outras reformas essenciais.

• Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 01 de

Julho;

• Lei Geral Tributária (LGT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de

Dezembro;

• Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), aprovado pelo Decreto-Lei

n.º 433/99, de 26 de Outubro;

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• Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2011, de

5 de Junho;

• Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social,

aprovado pela Lei 110/2009, de 16 de Setembro.

Uma nota final para referir que, mais do que uma reforma jurídico-fiscal, a principal

reforma verificada em Portugal já no século XXI, deu-se ao nível do aproveitamento

das novas tecnologias, pela implementação de um sistema integrado informatizado.

Grande exemplo disso foi o desenvolvimento de uma plataforma online

(http://www.portaldasfinancas.gov.pt). Esta plataforma mantém actualizada toda a

situação fiscal dos contribuintes, possibilitando a entrega de todas as declarações via

portal das finanças (esta possibilidade constitui para todos os sujeitos passivos de IRC

e de IVA uma obrigação), possibilidade de obtenção de toda a informação fiscal, desde

a sua situação contributiva e financeira relativamente a todos os impostos de gestão da

Autoridade Tributária, o cadastro de bens imóveis de propriedade de cada contribuinte,

até à apresentação de reclamações e seu seguimento, pedidos de certidões. Em 2012

está a ser implementado um sistema de notificações electrónicas.

5. Considerações finais: Questões, opções e desafios.

Uma reforma fiscal tem que ser vista como um processo contínuo, o qual os dirigentes

e responsáveis pela sua concepção e implementação devem monitorizar e acompanhar,

desenvolvendo, integrando e adaptando os sistemas fiscais às mudanças sociais,

económicas, tecnológicas e internacionais.

Diferentes países e diferentes continentes terão certamente desafios e preocupações

muito distintas.

A Europa, apenas a título de exemplo, enfrenta neste século dois desafios estruturais

que têm impacto directo e significativo nas contas públicas e, subsequentemente, na

fiscalidade: a baixa demografia e o crescente envelhecimento populacional.

A baixa demografia e o envelhecimento da população irão colocar uma enorme pressão

sobre as despesas públicas, designadamente ao nível do financiamento dos sistemas

públicos de saúde e dos sistemas de Segurança Social.

A tendência óbvia, nestes casos, será de pressionar as receitas e a eficiência da

máquina administrativa.

Do lado das receitas, poderemos assistir a um desvio de tributação dos impostos sobre

o rendimento, em particular sobre o rendimento do trabalho dependente, para outro

tipo de impostos como os que incidem sobre o consumo e o património imobiliário. De

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igual sorte, poderemos assistir a um aumento da carga fiscal sobre as contribuições

para a Segurança Social, quer pelo aumento das taxas, quer pelo aumento da base

contributiva.

Por outro lado, a pressão sobre a máquina fiscal visará tendencialmente uma maior e

melhor eficiência na arrecadação da receita, seja de forma passiva, pela introdução de

mecanismos simplificados de liquidação e cobrança, seja pela introdução de um maior

rigor de fiscalização e cumprimento das obrigações fiscais e menor tolerância sobre

práticas fiscais evasivas ou de planeamento fiscal agressivo.

Aos desafios seguem-se, normalmente, as opções de política fiscal: a opção entre a

tributação do rendimento ou do consumo; os limites da progressividade do imposto

sobre o rendimento de base pessoal; a opção pela adopção de novas formas de

tributação como a das “energias verdes”, entre muitas outras.

Às opções seguem-se as decisões e, logo atrás destas, a actuação com implementação

dos sistemas tributários. Segue-se a avaliação. E o ciclo não termina, mas renova-se a

cada desafio e salto económico, social, histórico, tecnológico, mantendo a reforma

fiscal como processo contínuo e renovável.

Citando o nosso saudoso Professor Saldanha Sanches: “No momento da publicação da

Reforma Fiscal inicia-se o movimento da contra-reforma.”

Concluo, assim, esta minha preleção com duas boas notícias: a reforma em curso é

uma oportunidade e é também o início de um processo de contínua renovação.

21 de Março de 2012