AS RESPOSTAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL … JEANINE GAMA SÁ CABRAL RESUMO A velocidade alarmante da...

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VOLUME 3 – ANO II – 2007 Julho – Setembro www.cebri.org.br AS RESPOSTAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL AOS PROBLEMAS AMBIENTAIS GLOBAIS: O DIREITO E A GOVERNANÇA INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE. JEANINE GAMA SÁ CABRAL com a contribuição de SANDRINE MALJEAN-DUBOIS

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AS RESPOSTAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

AOS PROBLEMAS AMBIENTAIS GLOBAIS: O DIREITO E A

GOVERNANÇA INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE.

JEANINE GAMA SÁ CABRAL

com a contribuição deSANDRINE MALJEAN-DUBOIS

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JEANINE GAMA SÁ CABRAL

AS RESPOSTAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

AOS PROBLEMAS AMBIENTAIS GLOBAIS: O DIREITO E A GOVERNANÇA

INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE.

JEANINE GAMA SÁ CABRAL1

com a contribuição deSANDRINE MALJEAN-DUBOIS2

1 Doutoranda em Direito Internacional no Centre d’Études et de Recherches Internationales et Communau-taires (CERIC) da Universidade Aix-Marseille III, Aix-en-Provence, França.2 Pesquisadora do Centre National de Recherche Scientifi que (CNRS) e diretora-adjunta do CERIC.Este texto, escrito por Jeanine Gama Sá Cabral e sob sua responsabilidade, se apóia, em parte, nos trabalhos de Sandrine Maljean-Dubois.

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INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE.

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RESUMO

A velocidade alarmante da degradação ambiental do planeta coloca em xeque o modelo de crescimento econômico tradicional e desafi a a capacidade de mobilização da sociedade internacional. O objetivo deste trabalho é fornecer um panorama das respostas aos problemas ambientais formuladas em âmbito internacional: no plano jurídico, apresentando os aportes, limites e desafi os do direito ambiental internacional; e, no plano institucional, revelando os debates de forma e de fundo relacionados à governança internacional do meio ambiente.

ABSTRACT

The alarming pace of the planet’s environmental degradation puts at stake the traditional model of economic growth and defi es the capacity of international society to react. This article aims to provide an overview of the responses to the environmental problems built in the international arena: in the legal fi eld, by presenting the contributions, limitations and challenges of international environmental law; and in the institutional fi eld, by addressing the debate on the form and content of international environmental governance.

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1. Introdução

São crescentes e alarmantes as ameaças ao meio ambiente global, consubs-tanciadas em perda de biodiversidade, mudanças climáticas, desertifi cação, des-matamento, contaminação por lixo tóxico, poluição do ar e da água, entre muitas outras. Os resultados danosos provocados pela degradação contínua dos ecos-sistemas têm sido demonstrados de forma consistente por relatórios científi cos provenientes das mais variadas fontes, como o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o Worldwatch Institute, a Organização para a Coo-peração e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e, no domínio das mudanças cli-máticas, o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática da Organização das Nações Unidas (IPCC/ONU)3.

Entre as diversas causas, cinco fatores contribuem de forma determinante para o atual estado de coisas: o modelo de produção e de consumo nos países desenvolvidos, cujo funcionamento das economias demanda a utilização de elevadas quantidades de energia e de matérias-primas e gera grandes volumes de lixo e de poluentes; a pobreza em que vive a maior parte dos habitantes do planeta; o rápido crescimento demográfi co; o processo de industrialização poluente freqüentemente adotado nos países em desenvolvimento; e os confl itos bélicos, que devastam territórios e provocam o deslocamento de grandes parcelas das populações locais4.

Para a reversão do atual quadro, é necessário considerar que os problemas ambientais possuem uma característica peculiar: a interdependência dos ecossistemas a nível mundial é incompatível com a gestão isolada dos recursos naturais por cada Estado. O reconhecimento do caráter transfronteiriço de alguns dos problemas que afetam a sociedade internacional e a necessidade de resolvê-los por meio de ações concertadas remetem à discussão sobre a emergência de uma “comunidade internacional”5, de “interesses comuns”6 ou de “bens públicos globais”7.

A proteção do meio ambiente, como interesse comum da comunidade

3 Mais conhecido pela sigla IPCC, proveniente da denominação em inglês Intergovernmental Panel on Cli-mate Change.4 Lavieille, J.M. Droit International de l’Environnement. Paris: Ellipses, 2004, p. 10.5 Uma comunidade formada não apenas por Estados soberanos, mas por organizações sociais e por seres humanos. Simma, B. “From bilateralism to community interest”. Recueil des Cours de l’Académie de Droit Internationale de la Haye, Tome 250, 1994, pp. 233-234.6 De acordo com Bruno Simma, uma tentativa inicial de defi nição do termo “community interest” seria “a consensus according to which respect for certain fundamental values is not to be left to the free disposition of the States individually or’ inter se’ but is recognized and sanctioned by international law as a matter of concern to all States”. Simma, B. Op. cit., p. 233.7 Os bens públicos globais podem ser defi nidos como “commodities, resources, services – and also systems of rules or policy regimes with substantial cross-border externalities – that are important for the development and poverty reduction, and that can be produced in suffi cient supply only through co-operation and collec-tive action to achieve them”. Banco Mundial. Poverty reduction and global public goods. Apud Boisson de Chazournes, L. “The Global Environment Facility: lessons learned and looking ahead”. GEF Working Paper no 19, 2003, p. 1.

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internacional8, possui duas dimensões. A primeira, espacial, não limita a noção de interesse comum aos problemas considerados globais (como as mudanças climáticas ou a poluição dos oceanos, por exemplo), referindo-se também às ameaças que atingem determinadas regiões, ecossistemas ou espécies de animais. A segunda dimensão, temporal, importa na obrigação de não destruir ou exaurir os recursos naturais para satisfação das necessidades presentes, ignorando as necessidades das gerações futuras9.

A crescente preocupação internacional com questões de interesse comum, como a proteção do meio ambiente, a paz e a segurança internacionais, a solidariedade entre países desenvolvidos e em desenvolvimento ou o respeito aos direitos humanos, revelou a necessidade de alteração do paradigma tradicional do sistema internacional, baseado na primazia dos Estados, em favor de um novo modelo que preconizasse a comunidade internacional como um todo. Ou seja, o imperativo de cooperação interestatal em um crescente número de áreas passou a ser considerado um importante limitador ao exercício da soberania dos Estados no plano internacional10.

Por conseguinte, o maior desafi o enfrentado pela sociedade internacional em relação à crise ambiental consiste na tentativa de obter o melhor compromisso entre o ímpeto de soberania dos Estados, acostumados a agir em busca da satisfação de interesses individuais, e a cooperação internacional, necessária à apropriada gestão dos interesses comuns. Ou seja, é imperioso superar-se o impasse resumido na afi rmativa de Prue Taylor: “the Earth is one, but the world we live is not”11.

O objetivo deste artigo consiste, pois, em apresentar um panorama da mobilização da sociedade internacional em torno da adoção das diretrizes e das normas jurídicas que compõem o Direito Ambiental Internacional (item 2), examinando as questões relacionadas à sua efetiva implementação (item 3) que, por sua vez, constitui um dos principais elementos do debate sobre a governança internacional do meio ambiente (item 4).

8 É importante não confundir a noção de “interesse comum” com o conceito de “patrimônio comum da hu-manidade”, utilizado para fazer referência a três situações jurídicas distintas: (i) aos elementos que perten-cem juridicamente à humanidade, como o fundo do mar, a lua e o genoma humano (em sentido simbólico); (ii) a alguns espaços considerados de domínio público internacional, como o espaço extra-atmosférico e a Antártida; e (iii) a alguns bens culturais, naturais ou mistos, que, embora permaneçam dentro da esfera de soberania dos Estados em que se localizam, integram o patrimônio mundial da humanidade. Lavieille, J.M. Op. cit., pp. 20-21.9 Kiss, A. “The protection of environmental interests of the world community trough international envi-ronmental law”. In: Wolfrum, R. (ed.). Enforcing environmental standards: economic mechanisms as viable means. Berlin/Heidelberg/New York: Springer, 1996, p. 2.10 Kiss, A. “The implications of global change for the international legal system”. In: Brown-Weiss, E. (ed.). Environmental change and international law: new challenges and dimensions. Tokyo: United Nations Uni-versity Press, 1992, p. 333.11 Taylor, P. An ecological approach to International Law: responding to challenges of climate change. New York: Routledge, 1998, p.1. Ou, nas palavras de Philip Allott: “the need to reconcile the inherent and funda-mental interdependence of the world environment with the sovereign world of independent states”. Allott, P. Eunomia: new order for a new world. New York: Oxford University Press, 1990, para. 17.52.

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2. O Direito Ambiental Internacional

O Direito Internacional Público pode ser defi nido como o conjunto de normas que regem as relações internacionais, constituindo-se, ao mesmo tempo, em “ordem normativa” e em “fator de organização social12. Tradicionalmente, entende-se que o direito ambiental internacional integra esse ramo do direito, podendo ser classifi cado como o direito internacional público aplicado às questões ambientais13. Contudo, alguns autores vêm defendendo seu status de ramo autônomo do direito internacional, argumentando que a disciplina representa um corpo distinto e específi co de normas e princípios com o propósito de gerir e proteger o meio ambiente14. Relaciona-se de forma estreita com a proteção internacional dos direitos humanos – uma vez que a sobrevivência do homem depende da qualidade do meio ambiente em que está inserido15 – e com o direito do desenvolvimento – permitindo a participação dos países em desenvolvimento na construção jurídica de uma ordem ambiental internacional16.

O direito internacional do meio ambiente é enunciado em uma série de convenções internacionais que se destinam à conservação de recursos naturais específi cos ou ao combate a determinadas formas de poluição. As primeiras con-venções foram celebradas em âmbito bilateral, mas migraram progressivamente para as esferas regional e universal17, consideradas mais efi cazes para lidar com a

12 Weil, P. “Vers une normativité relative en droit international?”. Revue Générale de Droit International Pu-blic, Tome LXXXVI. Paris: Pedone, 1982, p. 6. Ou, de acordo com a defi nição original de Philip Allott: “the minimal law necessary to enable state-societies to act as closed systems internally and to act as territory-ow-ners in relation to each other”. Allott, P. Op. cit., p. 324.13 Dupuy, P.M. “Où en est le droit international de l’environnement à la fi n du siècle?”. Revue Générale de Droit International Public, Tome CI. Paris: Pedone, 1997, pp. 899-900.14 Rei, F. “A peculiar dinâmica do direito internacional do meio ambiente”. In: Nasser, S.H.; Rei, F. (org.). Direito internacional do meio ambiente. Ensaios em homenagem ao Prof. Guido Fernando Silva Soares. São Paulo: Atlas, 2006, p. 5. 15 Alexandre Kiss entende que o direito do meio ambiente está claramente relacionado aos direitos humanos, afi rmando que ambos derivam do conceito de interesse comum da humanidade. Kiss, A. “An introductory note on a human right to environment”. In: Bown-Weiss, E. (ed.), Environmental change and international law: new challenges and dimensions. Tokyo: United Nations University Press, 1992, p. 199. Cançado Trin-dade também identifi ca uma raiz comum nos dois direitos que, em última análise, se prestariam à defesa da própria humanidade e de sua herança comum. Cançado Trindade, A. A. “The contribution of international human rights law to environmental protection, with special reference to global environmental change”. In: Bown-Weiss, E. (ed.), Op. cit., p. 29516 Segundo Marcelo Dias Varella, o direito ambiental internacional seria o palco sobre o qual se perpetua o di-reito do desenvolvimento, que, enfraquecido pela lógica liberal dominante no direito internacional econômi-co, tenta se expressar por meio daquele direito, mediante o aperfeiçoamento do conceito de desenvolvimento sustentável. Varella, M.D. Direito internacional econômico ambiental. Belo Horizonte: Del-Rey, 2003, p. 39.17 Em relação às convenções de caráter universal, merecem destaque aquelas celebradas no âmbito das Na-ções Unidas: zonas úmidas de importância internacional – Ramsar (1971); proteção do patrimônio mundial, cultural e natural – Paris (1972); comércio internacional de espécies selvagens ameaçadas da fauna e da fl ora – Washington (1973); conservação das espécies selvagens migratórias – Bonn (1979); lei do mar – Montego Bay (1982); proteção da camada de ozônio – Viena (1985) e respectivo Protocolo – Montreal (1987); controle de movimentos transfronteiriços de resíduos perigosos e seu depósito – Basiléia (1989); mudanças climáticas – Nova Iorque (1992) e respectivo Protocolo – Quioto (2004); diversidade biológica – Nairobi (1992); luta con-tra a desertifi cação – Paris (1994); e poluentes orgânicos persistentes – Estocolmo (2001).

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natureza transfronteiriça dos problemas ambientais. Atualmente, ultrapassam a marca de quinhentos textos normativos, a maior parte em nível regional, abran-gendo um número crescente de setores e ameaças ao meio ambiente18.

Além de sua profusão e de sua progressiva “multilateralização”, as con-venções ambientais revelam outros aspectos que merecem destaque. Cada vez mais, exercem a vocação de harmonizar as legislações nacionais dos Estados Par-tes, penetrando em seus ordenamentos jurídicos internos e impulsionando-os para aumentar as exigências ligadas à proteção ambiental19. Também se desta-cam pelo signifi cativo papel desempenhado pelas ciências (naturais e exatas) na obtenção da cooperação internacional necessária à sua celebração, uma vez que compete aos cientistas atestar a existência e a gravidade das ameaças ambientais e delimitar suas principais causas e efeitos20. Algumas convenções ambientais se destacam pela adoção da técnica de convenções-quadro (ou tratados-quadro), que permite que os Estados Partes da convenção principal escolham os adita-mentos e protocolos aos quais pretendem aderir21. Por um lado, a adoção dessa técnica pode criar uma teia complexa com diferentes níveis de obrigações entre as partes. Por outro lado, contudo, admite a adoção progressiva de compromissos mais avançados, mesmo diante da ausência de consenso entre todas as partes da convenção principal22.

As convenções ambientais fazem parte do conjunto denominado hard law, que reúne as normas internacionais vinculantes, criadoras de direitos e obrigações precisas23. Contudo, o sistema normativo de direito internacional comporta cada vez mais normas consideradas “fracas” ou “frágeis”, vagas e pouco vinculantes, que formam o conjunto chamado soft law24. O direito internacional do meio

18 Maljean-Dubois, S. “La ‘gouvernance internationale des questions environnementales’. Les ONG dans le fonctionnement structurel des conventions internationales de protection de l’environnement”. In: Boisson de Chazournes, L.; Mehdi, R. (coord.). Une société internationale en mutation: quels acteurs pour une nouvelle gouvernance. Bruxelles: Bruylant, 2005, p. 85.19 Maljean-Dubois, S. “La ‘gouvernance internationale des questions environnementales’. Les ONG dans le fonctionnement structurel des conventions internationales de protection de l’environnement”. Op. cit., p. 86.20 Bochmer-Christiansen, S.; Kellow, A. International environmental policy interests and the failure of the Kyoto Protocol. Cheltenham/Northampton: Edward Elgar, 2002, pp. 4-5. O Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática da Organização das Nações Unidas é um exemplo emblemático.21 Kiss, A. “Les Traités-cadres: une technique juridique caractéristique du droit international de l’environnement”. Annuaire Français de Droit International XXXIX. CNRS Editions: Paris, 1993, p. 793.22 Para os puristas, cada novo aditamento ou protocolo cria um tratado distinto que gera obrigações apenas para os Estados que o adotaram. Os pragmáticos, no entanto, acreditam que os diferentes níveis de obriga-ção podem ser considerados anomalias temporárias, uma vez que, apesar de não estarem conectados por obrigações idênticas, os Estados compartilham o interesse legítimo no desenvolvimento futuro do tratado como um todo. Werksman, J. “Consolidating governance of the global commons: insights from the Global Environment Facility”. Yearbook of International Environmental Law, Volume 6. Oxford University Press: 1995, p. 31. 23 Em virtude da consagração do princípio pacta sunt servanda pela Convenção de Viena sobre o direito dos tratados (artigo 26).24 Weil, P. Op. cit., p. 7. De acordo com Salem H. Nasser, entende-se por soft law: “as normas moles, fl exíveis, ambíguas, desprovidas de precisão e de sanção, de um lado, e os instrumentos normativos, que, por não serem tratados celebrados em boa e devida forma, entre os Estados, a rigor, não criam direito, de outro”. Nas-ser, S.H. “Direito internacional do meio ambiente, direito transformado, jus cogens e soft law”. In: Nasser, S.H.; Rei, F. (org.). Op. cit., p. 25.

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ambiente é particularmente profícuo na formulação desse tipo de regra. Em razão da difi culdade de se alcançar consenso em torno do conteúdo de normas internacionais precisas e obrigatórias, a adoção de princípios gerais e de normas não-vinculantes, cuja concretização poderá ocorrer de forma progressiva, emerge como alternativa viável. A observância continuada dos preceitos contidos nas referidas regras e princípios constitui um importante indicador das tendências na arena ambiental internacional e serve para “preparar o caminho” para a evolução e adoção de normas do tipo hard law25.

Uma parcela signifi cativa da soft law produzida no direito internacional do meio ambiente é constituída pelos princípios e regras afi rmados nos documen-tos produzidos nas conferências da Organização das Nações Unidas (ONU) so-bre a temática ambiental26. Por exemplo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo em 1972, que serviu como divisor de águas no tratamento da questão ambiental em nível internacional, resultou na adoção de uma declaração de princípios e de um plano de ação. Vinte anos mais tarde, no Rio de Janeiro, foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento27 (Rio 92), resultando na adoção, inter alia, de nova declaração de princípios e de um programa de ações para o século XXI (Agenda 21). Em 1997, uma sessão extraordinária da Assembléia-Geral das Na-ções Unidas (conhecida por Rio + 5) dedicou-se a avaliar os progressos obtidos após a Rio 92 e adotou um programa com vistas a otimizar a implementação dos objetivos previstos na Agenda 21. Em 2002, o Encontro Mundial para o Desen-volvimento Durável28, realizado em Joanesburgo, resultou na adoção de uma declaração sobre os objetivos de desenvolvimento sustentável, acompanhada de um plano de aplicação.

Constatamos, pois, que o direito ambiental internacional repousa sobre um certo número de princípios, afi rmados em declarações e programas de ação e inscritos em numerosas convenções. Parece-nos, então, que o conteúdo do referido direito pode ser revelado, em linhas gerais, por meio do exame desses princípios, que passamos a enumerar abaixo, de forma não exaustiva. Salienta-mos, contudo, que eles não são excludentes, mas complementam e relativizam uns aos outros. Além disso, ramifi cam-se em um conjunto de subprincípios que têm por objetivo precisar os contornos de sua aplicação.

Em uma sociedade internacional na qual o papel preponderante é tradi-

25 Pathak, R.S. “The human rights system as a conceptual framework for environmental law”. In: Brown-Weiss, E. (ed.). Op. cit., pp. 238-239.26 A lista não exaustiva de soft law compreende os atos unilaterais dos Estados e das Organizações Internacio-nais (recomendações, declarações, programas, decisões etc.), os atos produzidos em conferências diplomáti-cas e os atos concertados sem natureza jurídica de convenção internacional. Maljean-Dubois, S. “La mise en oeuvre du droit international de l´environnement”. Les notes de l’Iddri, no 4. Paris: Institut du Développe-ment Durable et des Relations Internationales, 2003, p. 13.27 Destaque para a consagração, no cenário internacional, do entendimento de que meio ambiente e desenvol-vimento são questões relacionadas e devem ser abordadas em conjunto.28 Destaque para a consolidação do princípio do desenvolvimento sustentável, que combina os imperativos de proteção ambiental e desenvolvimento econômico.

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cionalmente exercido pelos Estados, era de se esperar que um dos princípios norteadores do direito internacional do meio ambiente estivesse relacionado ao reconhecimento do poder estatal de dispor livremente dos recursos naturais localizados em seu território – de acordo com sua política interna de meio am-biente. No entanto, o chamado princípio da soberania sobre os recursos naturais encontra importantes limitações em outros princípios consagrados pelo mes-mo direito, como o da boa vizinhança29 e o da cooperação internacional. Assim, compete aos Estados zelar para que as atividades realizadas em seu território, ou sob o seu controle, não provoquem danos ambientais em outros Estados ou em zonas não submetidas a nenhuma jurisdição nacional30. Adicionalmente, os Estados devem adotar práticas relacionadas ao compartilhamento de informa-ções, notifi cações, consultas, participação em determinadas decisões, realização de estudos de impacto ambiental e estabelecimento de procedimentos comuns em caso de emergências31.

Outro destacado princípio do direito internacional do meio ambiente é o do desenvolvimento sustentável32. Sua utilização em instrumentos internacionais sugere quatro objetivos diferentes – embora relacionados entre si: o compromisso de preservar os recursos naturais em benefício das gerações atuais e futuras; o estabelecimento de práticas de exploração prudentes e racionais; o uso eqüitativo dos recursos naturais, considerando as necessidades de outros Estados e popula-ções; e a integração entre as preocupações ambientais e os planos, programas e projetos de desenvolvimento33. De todo modo, é certo que esse princípio traz em seu bojo a necessidade de conciliação entre dois conceitos aparentemente con-traditórios: desenvolvimento e preservação ambiental. O desafi o inerente à sua aplicação consiste, pois, em escolher o aspecto a ser priorizado.

O princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, deriva da aplicação do princípio da eqüidade no direito internacional e baseia-se em duas considerações para o estabelecimento de obrigações individualizadas: o grau de

29 Tradução da expressão “good neighborliness” adotada por Philippe Sands. Sands, P. “Environmental pro-tection in the twenty-fi rst century: sustainable development and international law”. In: Revesz, R.; Sands, P.; Stewart, R.B. Environmental law, the economy and sustainable development. Cambridge: Cambridge University Press, 2000, p. 374.30 Esse princípio foi afi rmado na setença arbitral do caso Fonderie de Trail (1941), na opinião consultiva da Corte Internacional de Justiça (CIJ) sobre a licitude da ameaça ou emprego de armas nucleares (1996) e na decisão da CIJ no caso do projeto Gabcikovo-Nagymaros (1997). Lavieille, J.M. Op. cit., p. 89.31 Sands, P. Op. cit., p. 374. Segundo Pierre-Marie Dupuy, na célebre controvérsia entre Brasil e Argentina sobre a barragem de Itaipu, os argumentos argentinos referiam-se justamente ao dever de informação e de realização de consultas prévias ao início do empreendimento. Dupuy, P.M. “Responsabilité internationale des Etats”. Recueil des Cours de l’Académie de Droit International de la Haie. Tome 188, 1984, p. 69.32 Introduzido principalmente pelo relatório da Comissão Brundtland (1987), encarregada pela Assembléia Geral da ONU de examinar a situação do meio ambiente e do desenvolvimento e de propor estratégias de longo prazo, o princípio foi popularizado após a Conferência Rio 92.33 Sands, P. Op. cit., p. 374. Na decisão da CIJ sobre o caso do projeto Gabcikovo-Nagymaros, o Vice-Pre-sidente da Corte, Juiz Weeramantry, em voto separado, manifestou-se sobre o status jurídico do princípio do desenvolvimento sustentável, defendendo que o referido princípio teria por bases jurídicas o direito ao desenvolvimento e o direito ao meio ambiente saudável, e integraria o direito das gentes. Miniuci, G. “O direito e a cooperação internacional em matéria ambiental: a estrutura de um diálogo”. In: Nasser, S.H.; Rei, F. (org.). Op. cit., pp. 36-37.

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responsabilidade do Estado em relação a determinado problema ambiental e o seu nível de desenvolvimento, que indicará sua capacidade de contribuir para a gestão do problema34. Permite a participação de todos os Estados na adoção de medidas de combate à degradação do meio ambiente, estabelecendo compromis-sos diferenciados, como no caso das metas quantitativas de redução das emissões de gases de efeito estufa previstas no Protocolo de Quioto, aplicáveis em percen-tuais individualizados apenas aos países industrializados e em transição35.

Outro princípio relevante é o do poluidor-pagador. Trata-se de um princí-pio de natureza econômica que visa à internalização dos custos da poluição, por meio da atribuição de responsabilidade aos poluidores pelos danos ambientais a que deram origem, obrigando-os à reparação e/ou à mitigação das conseqüências nefastas e ao pagamento de multas e indenizações. Também serve de base para a criação de instrumentos econômicos de proteção do meio ambiente, como as taxas ambientais e os certifi cados de emissão negociáveis (relacionados aos gases de efeito estufa)36. A adoção do princípio poluidor-pagador recebe duas críticas bastante díspares: por um lado, entende-se que a responsabilização por danos ambientais pode servir de entrave às iniciativas empreendedoras e aos projetos de desenvolvimento e, por outro, argumenta-se que o princípio pode servir como incitação à poluição, uma vez que, computados os valores referentes à reparação do dano e ao pagamento de multas e indenizações, as atividades poluidoras, em permanecendo lucrativas, estariam “autorizadas”37.

Finalmente, cumpre mencionar os princípios da prevenção e da precaução. O primeiro38 recomenda a adequada gestão dos riscos conhecidos, mediante a adoção de ações preventivas com a utilização das melhores técnicas disponíveis39. Enquanto esse princípio indica a adoção de medidas antecipatórias com vistas a evitar riscos conhecidos, o princípio da precaução, por sua vez, enfrenta “a incerteza dos saberes científi cos em si mesmos”40. Na verdade, é justamente o grau de certeza em relação à existência cientifi camente comprovada do risco que diferencia a abordagem preven-tiva do princípio precaucionista. Embora algumas enunciações do princípio da pre-caução tenham sido incorporadas em uma série de textos internacionais41, sua aplica-

34 Voinov Kohler, J. Le mécanaisme de contrôle du respect du Protocole de Kyoto sur les changements clima-tiques: entre diplomatie et droit. Genève/Zurich/Bâle: Schultess Medias Juridiques, 2006, p. XVI.35 Além de resultar no não estabelecimento de metas para os países em desenvolvimento, a estratégia do trata-mento diferenciado permitiu solucionar uma série de divergências entre os países desenvolvidos e em transição durante as negociações das metas de redução de emissões do Protocolo de Quioto. Boisson de Chazournes, L. “La gestion de l’intérêt commun à l’épreuve des enjeux économiques: le Protocole de Kyoto sur les change-ments climatiques”. Annuaire Français de Droit International XL III. CNRS Editions: Paris, 1997, p. 705. 36 Romi, R. Droit International de l’Environnement. Paris: Montchrestien, 2005, pp. 65-67.37 Lavieille, J.M. Op. cit., p. 95.38 O princípio da prevenção foi evocado pela CIJ na decisão do caso do projeto Gabcikovo-Nagymaros. La-vieille, J.M. Op. cit., p. 90.39 Romi, R. Op. cit., pp. 39-47.40 Setzer, J. “Diretrizes para aplicação do princípio da precaução no direito internacional do meio ambiente”. In: Nasser, S.H.; Rei, F. (org.). Op. cit., p. 56. 41 Carta Mundial da Natureza (1982); Conferências Internacionais sobre Proteção do Mar do Norte (1984, 1987 e 1990); Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Declaração do Rio); Convenção sobre a Diversidade Biológica (1992); Convenção sobre Mudanças Climáticas (1992); Convenção de Paris para a Proteção do Meio Marinho do Atlântico Nordeste (1992) e a Carta da Terra, redigida na Con-venção Rio + 5 (1997). Setzer, J. Op. cit.. In: Nasser, S.H.; Rei, F. (org.). Op. cit., pp. 53-55.

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ção gera muitas controvérsias e ainda não foi objeto de nenhuma “formulation faisant autorité” no âmbito das jurisdições internacionais42. Mais uma vez, constata-se que a aplicação de um princípio requer a conciliação de interesses divergentes. Nesse caso, o imperativo da segurança, de um lado, e, do outro, a perspectiva de super-regulação das atividades humanas43.

As normas convencionais, regras e princípios a que se fez referência aci-ma, dotadas de maior ou menor poder vinculante, constituem os chamados ins-trumentos normativos de proteção ambiental. Trata-se do quadro regulamentar tradicional, composto de normas do tipo command and control. Ao seu lado, fi guram os instrumentos econômicos de proteção do meio ambiente, consubs-tanciados em mecanismos de mercado, cujo objetivo é conciliar os interesses econômicos com as exigências de conservação ambiental44. De modo geral, é lícito afi rmar que “visam a encorajar os produtores e os consumidores, agindo sobre os preços e a informação, a adotar práticas ou fazer escolhas que levem em conta o custo ambiental da produção e consumo dos produtos”45. Comple-mentam a abordagem clássica das questões ambientais, baseando-se na utiliza-ção de diversas ferramentas incitativas, como os direitos de propriedade (certi-fi cados negociáveis, direitos de propriedade intelectual, quotas), instrumentos fi scais (taxas ecológicas), certifi cações ambientais de produtos e métodos de produção, ajudas fi nanceiras, entre outros46.

No plano internacional, o Protocolo de Quioto fornece o melhor exemplo da utilização desses instrumentos, posto que os certifi cados de emissão negociáveis constituem uma importante ferramenta para que os Estados alcancem as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa a que se obrigaram.

Embora esses instrumentos se caracterizem pela fl exibilidade e pela capa-cidade de auto-implementação47, é inegável que o controle efi caz da regulari-dade das transações e a possibilidade de aplicação de sanções em caso de frau-des constituem condições imperativas para o bom funcionamento do sistema.

42 Ver Romi, R. Op. cit., pp. 47-64. Sobre os casos de segurança alimentar e sanitária (carne com hormônios e organismos geneticamente modifi cados) e a posição da Organização Mundial do Comércio (OMC), ver Co-hen, E. L’ordre économique mondial: essai sur les autorités de régulation. Paris: Fayard, 2001, pp. 95-101.43 Utilizando a expressão adotada por Philippe Sands. Sands, P. Op. cit., p. 376. 44 “Deux approches théoriques semblent s’opposer aujourd’hui quant à la gestion des bien communs, des commons selon le terme des anglo-saxons (…). Elles émanent de deux cultures différentes: l’une anglo-sa-xonne, est individualiste et jurisprudentielle, confi ante des outils économiques pour gérer avec la souplesse nécessaire les rapports entre les êtres humains; l’autre issue notamment du droit romain, est communautaris-te et réglementaire, délimitant à priori droits et interdits le plus fi nement possible, par des règles collectives expresses”. Dron, D. “Environnement: les enjeux du prochain siècle”. In: De Montbrial, Y.; Jacquet, P. Rapport annuel mondial sur le système économique et les stratégies. Dunod, 2001, p. 107.45 Comissão Européia. Évaluation globale. L’environnement en Europe: quelles orientations pour l’avenir? 2000, p. 19 (tradução nossa).46 Maljean-Dubois S. “Le recours à l’outil économique: un habit neuf pour les politiques environnementales?” In: Maljean-Dubois S. (dir.). L’outil économique en droit international de l’environnement. Paris: CERIC – La Documentation Française, 2002, pp. 19-20.47 Segundo R. Wolfrum, “it is appropriate to distinguish between compliance instruments of command and control and incentive-based instruments, the latter being, by their very nature, self-implementing”. Wolfrum, R. “Means of ensuring compliance with and enforcement of international environmental law”. Recueil des Cours de l’Académie de Droit Internationale de la Haye. Tome 272, 1998, p. 151.

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INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE.

Então, assim como os instrumentos normativos tradicionais, os instrumentos econômicos de proteção do meio ambiente também são largamente afetados pelas questões relativas ao controle de sua implementação48.

3. A questão da implementação

A implementação do direito internacional do meio ambiente esbarra em dois obstáculos: o primeiro, decorrente das limitações do direito internacional tout court49, refere-se ao primado do voluntarismo e do consentimento dos Es-tados nos processos de formação50 e execução do direito. O segundo, próprio à esfera ambiental internacional, compreende uma série de fatores: a “fraqueza” das normas (abundância de soft law e de obrigações gerais, pouco vinculantes e não auto-executáveis); a difi culdade de interpretação de convenções nem sempre claras e/ou precisas; e a difi culdade de se promover a evolução das convenções, adaptando-as a novas circunstâncias e descobertas científi cas. Outra fonte de di-fi culdades consiste na necessidade de articulação interna entre os corpos de nor-mas que compõem o direito ambiental internacional, assim como na sua interação com outros sistemas normativos – comércio, investimentos, direitos humanos etc. Finalmente, cumpre mencionar a difi culdade de adoção de obrigações internacio-nais comportando elevados custos econômicos e sociais – nesse caso, contudo, a análise jurídica deve ser complementada pela análise econômica e sociológica51.

Com vistas a suplantar tais obstáculos, o direito internacional do meio am-biente desenvolveu uma série de mecanismos de implementação e controle, que têm por objetivo prevenir os casos de não-cumprimento das obrigações interna-cionais assumidas pelos Estados, incentivar sua adequada implementação, forne-cer assistência em caso de não-cumprimento, além de prever sistemas de solução de disputas e medidas de execução forçada52. Três categorias de mecanismos são previstas: acompanhamento, incitação e sanção53.

A implementação das obrigações internacionais dos Estados é acompanhada por procedimentos de controle e verifi cação (implementation review mechanisms). O procedimento de controle tem por objetivo recolher informações precisas sobre as modalidades práticas de implementação das convenções nos territórios dos Estados Partes e acompanhá-las regularmente. Para tanto, diferentes técnicas são utilizadas. A mais comum consiste no envio periódico de relatórios, permitindo a troca de informações entre os Estados. Em alguns casos, são criados modelos

48 Maljean-Dubois, S.; Richard V. “Mécanismes internationaux de suivi et mise en oeuvre des conventions internationales de protection de l´environnement”. Institut du Développement Durable et des Relations In-ternationales. Paris: Iddri, 2004, p. 10.49 Valemo-nos do galicismo empregado por Salem Hikmat Nasser. Nasser, S.H. Op. cit. In: Nasser, S.H.; Rei, F. (org.). Op. cit., p. 24.50 Pelo menos no que se refere às fontes clássicas de direito internacional.51 Maljean-Dubois, S.; Richard V. Op. cit., pp. 14-15.52 Lang, W. “Compliance control in international environmental law: institutional necessities”. ZaoRV, 56, 5/1996.53 Para maiores detalhes, consultar Maljean-Dubois, S.; Richard V. Op. cit., pp. 16-29.

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de relatórios padronizados, visando a otimizar a qualidade das informações em circulação. As instituições convencionais – normalmente as secretarias – também podem se encarregar de gerenciar o recebimento dos relatórios encaminhados pelos Estados, analisando seu conteúdo e preparando documentos com informa-ções consolidadas. Além disso, em determinados espaços convencionais, o envio obrigatório de relatórios é complementado pela realização de inspeções regu-lares, de caráter preventivo. Raramente, o controle também pode compreender o apoio de mecanismos independentes encarregados de recolher dados sobre o meio ambiente. É o caso, excepcional, do sistema EMEP (Programa Comum de Vigilância Contínua e de Avaliação do Transporte a Longa Distância dos Poluen-tes Atmosféricos na Europa).

Caso os mecanismos de controle suspeitem ou evidenciem o não-cumpri-mento de obrigações pelos Estados, os órgãos convencionais competentes podem adotar ações de verifi cação, mediante a condução de investigações e/ou inspe-ções – desde que autorizadas no âmbito da convenção em questão. As investiga-ções consistem na solicitação de informações complementares e/ou na realização de análises comparativas com informações provenientes de outras fontes (como as organizações não-governamentais – ONGs54) com vistas a identifi car fraudes e violações. As inspeções, embora nem sempre ostentem essa denominação, são realizadas por especialistas independentes, acompanhados de membros da estru-tura administrativa convencional. Na esfera do direito ambiental internacional, a autorização prévia e a cooperação do Estado investigado constituem requisitos essenciais à realização da inspeção, ao contrário de outros setores da cooperação internacional, como o desarmamento, por exemplo.

Identifi cadas difi culdades e/ou irregularidades no cumprimento das obri-gações internacionais dos Estados, os órgãos de controle buscam combinar, em sua reação, dois tipos de medidas: de incitação (carrots) e de sanção (sticks)55.

As medidas incitativas agrupam essencialmente a assistência fi nanceira e técnica. A primeira dá-se mediante a implementação de fundos convencionais e decorre, sobretudo, da constatação de que os países em desenvolvimento não estão aptos ou dispostos a priorizar a proteção do meio ambiente e a conservação da natureza em detrimento de seu desenvolvimento econômico. Assim, a adesão desses países a padrões mais elevados de proteção ambiental precisa ser “subsi-diada” pelos países industrializados56. Nesse contexto, destaca-se a criação, em 1991, do Fundo para o Meio Ambiente Mundial (conhecido pela denominação

54 O fornecimento de informações pelas ONGs aumenta a efi cácia dos mecanismos de controle, além de revelar uma importante tendência de participação de atores não estatais no controle do cumprimento das obrigações in-ternacionais dos Estados. Boisson de Chazournes, L. “La mise en oeuvre du droit international dans le domaine de la protection de l’environnement: enjeux et défi s”. Revue Générale de Droit International Public. Tome IC. Paris: Pedone, 1995, pp. 68-69. 55 Os autores de língua inglesa utilizam as expressões “compliance by carrots” e “compliance by sticks” para se referirem, respectivamente, às medidas de incitação e de sanção.56 Bothe, M. “The evaluation of enforcement mechanisms in international environmental law: an overview”. In: Wolfrum, R. (ed.). Enforcing environmental standards: economic mechanisms as viable means. Berlin/Heidel-berg/New York: Springer, 1996, p. 33.

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original Global Environment Facility – GEF)57, que se tornou o mecanismo fi nan-ceiro ofi cial das Convenções de Diversidade Biológica, Mudanças Climáticas, Poluentes Orgânicos Persistentes e Combate à Desertifi cação, além de fi nanciar ações no âmbito da Convenção para Proteção da Camada de Ozônio, dos acordos regionais e internacionais sobre águas internacionais e das atividades previstas na Agenda 2158.

Em se tratando da assistência técnica, apesar da multiplicação dos centros convencionais de tecnologia da informação (clearing houses de tecnologia), os me-canismos convencionais permanecem muito limitados. Na verdade, ambos os ti-pos de assistência, técnica e fi nanceira, sofrem a carência de recursos. Os fundos implementados pelas convenções são alimentados por contribuições voluntárias, essencialmente variáveis e pouco previsíveis, sobretudo em períodos de crise. Os mecanismos incitativos na esfera ambiental compartilham, portanto, as difi culda-des classicamente enfrentadas no âmbito da ajuda pública ao desenvolvimento, em que os países desenvolvidos nem sempre concretizam o volume de ajuda fi -nanceira anunciado59.

Ao lado dos mecanismos incitativos fi guram os mecanismos de sanção. De maneira geral, o direito internacional admite, no âmbito dos tratados multilate-rais, que um Estado responda à violação de uma obrigação convencional por parte de outro Estado mediante a suspensão parcial ou total da aplicação do tratado60. No entanto, esse tipo de retaliação revela-se inadequada na esfera do direito inter-nacional do meio ambiente, uma vez que as obrigações contidas em suas conven-ções constituem compromissos unilaterais isentos de reciprocidade61, fundados na noção de interesse comum. Assim, embora o tradicional recurso à esfera juris-dicional também seja possível, o direito ambiental internacional freqüentemente faz uso de mecanismos adaptados de sanção, destinados a promover a execução

57 Instituído em um contexto de profusão normativa no âmbito do direito ambiental internacional e de ausência de consenso quanto à criação de novas organizações internacionais, o GEF foi constituído por meio de um arranjo ins-titucional sui generis. Trata-se de um trust fund sem personalidade jurídica de direito internacional, dotado de estru-tura organizacional independente de suas agências de implementação (a saber: os Programas das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD e para o Meio Ambiente – PNUMA, além do Banco Mundial, que também atua como trustee). O GEF trouxe uma série de inovações importantes na gestão dos bens públicos globais. Seu modelo institucional serviu para erguer uma ponte entre os sistemas de Bretton Woods e das Nações Unidas e também permitiu a concentração, em um só mecanismo, do fi nanciamento dos principais regimes ambientais globais. Além disso, constitui um importante instrumento de fi nanciamento do desenvolvimento, posto que seus recursos são providos pelos países desenvolvidos e destinados ao fi nanciamento de projetos e programas nos países em desen-volvimento e em transição. Para maiores detalhes, consultar: Boisson de Chazournes, L. “The Global Environment Facility: lessons learned and looking ahead”. GEF Working Paper no 19. Novembro de 2003.58 Entre os mecanismos de fi nanciamento do meio ambiente também podem ser citados o World Wildlife Fund, o World Heritage Fund (UNESCO), os fundos convencionais do PNUMA, o fundo do Protocolo de Montreal, o Rainforest Trust Fund (programa piloto destinado a fi nanciar a preservação da fl oresta amazôni-ca e mata atlântica brasileiras). Dowdeswell, E. “Sustainable development: the contribution of international law”. In: Lang W. (ed.). Sustainable development and international law. London/Dordrecht/Boston: Graham & Trotman /Martinus Nijhoff, 1995, pp. 169-182. Cumpre mencionar também o fundo para conservação das zonas úmidas da Convenção Ramsar.59 Sand, P.H. “Carrots without sticks? New fi nancial mechanisms for global environmental agreements”. In: Fro-wein, J.A.; Wolfrum, R. (eds.). Max Planck Yearbook of United Nations Law, Volume 3. The Hague/London/Bos-ton: Kluwer Law International, 1999, p. 216.60 Artigo 60 da Convenção de Viena (de 23 de maio de 1969) sobre o direito dos tratados.61 Kiss, A. “Un nouveau défi pour le droit international”. Projet, Vol. 226, 1991.

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das obrigações internacionais dos Estados ainda em sede não-jurisdicional.

Cumpre mencionar, no entanto, que o papel exercido pelo controle juris-dicional, tradicionalmente subsidiário, tem crescido ao longo dos últimos anos. A Corte Internacional de Justiça (CIJ) tem sido chamada a se manifestar sobre questões envolvendo o direito ambiental; uma grande parte da jurisprudência do Tribunal Internacional do Direito do Mar relaciona-se com o meio ambiente; os órgãos de solução de controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC) também têm sido instados a resolver disputas comerciais envolvendo questões ambientais; a Corte Européia de Direitos Humanos (CEDH) tem tratado uma sé-rie de casos revestidos de aspectos ambientais; e o Tribunal Penal Internacional (TPI) recebeu competência para julgar crimes de guerra com dimensões ambien-tais. Por fi m, a Corte Permanente de Arbitragem (CPA) concluiu, em 2001, um regulamento facultativo para a arbitragem de disputas relativas aos recursos na-turais e ao meio ambiente.

No contexto não-jurisdicional, as sanções mais brandas são aquelas de caráter “moral” ou “psicológico” (efeito name and shame), consubstanciadas na divulga-ção da situação do Estado faltoso por meio da publicação de relatórios, adoção de resoluções ou nos debates e discussões promovidos por ocasião das conferências das partes – que contam com a presença de ONGs, atuando como representantes da opinião pública. Também podem ser aplicadas sanções disciplinares, como a suspensão do direito de voto ou mesmo a suspensão de todos os direitos e privi-légios relacionados à condição de Estado Parte. Sanções de natureza econômica também são previstas, consistindo principalmente na supressão de benefícios ad-quiridos pelos Estados no âmbito da convenção: perda da classifi cação de uma região (sítio) em uma lista internacional; suspensão de missões de assistência; re-tirada de subsídios fi nanceiros etc. Algumas convenções comportam a adoção de medidas comerciais, como a suspensão temporária do comércio de determinados produtos entre os Estados Partes e o Estado faltoso.

Em resumo, podemos afi rmar que, embora a invocação das instituições clás-sicas do direito internacional seja possível, tais mecanismos se revelam menos adequados do que os métodos ad hoc de controle não-jurisdicional previstos nas convenções62. O controle não-jurisdicional possui algumas características distinti-vas. Em primeiro lugar, trata-se de um controle institucionalizado, exercido pelos órgãos criados pelas próprias convenções (conferências das partes, comitês, secre-tarias). Além disso, é realizado de forma contínua, possuindo natureza essencial-mente preventiva. Por fi m, não visa à condenação dos Estados faltosos, mas à im-plementação de mecanismos de assistência fi nanceira, técnica, jurídica ou outra. Prioriza a cooperação em detrimento da punição, prevalecendo o entendimento de que a melhor maneira de alcançar os objetivos inscritos nas convenções consis-te em estimular e monitorar o cumprimento das obrigações pelos Estados Partes,

62 Laurence Boisson de Chazournes salienta que, embora as instituições clássicas do direito internacional, qual sejam, a responsabilidade internacional e os sistemas de solução de controvérsias, permitam a reação a violações de direitos, sua implementação no domínio da proteção ambiental encontra certos obstáculos. Boisson de Chazournes, L. “La mise en oeuvre du droit international dans le domaine de la protection de l’environnement: enjeux et défi s”. Op. cit., p. 39.

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aplicando, em caso de repetido descumprimento, sanções diretas e efi cazes, como a suspensão de ajudas fi nanceiras ou a imposição de barreiras comerciais.

O Protocolo de Quioto fornece um excelente exemplo de mecanismo ino-vador de implementação e controle, encarregado de aplicar um policy mix de medidas de acompanhamento, incitação e sanção. Consiste em um comitê de controle composto por dois grupos. O primeiro, chamado grupo da facilitação, pluridisciplinar, tem por objetivo prestar consultoria e fornecer assistência eco-nômica aos Estados com difi culdades em cumprir suas obrigações. O grupo da execução, por sua vez, é composto por juristas e possui natureza quase jurisdi-cional. Constatado o não-cumprimento de obrigações por determinado Estado, este pode impor sanções de natureza moral, disciplinar e/ou econômica. A du-alidade do comitê refl ete justamente a natureza do procedimento, que combina aspectos de prevenção e de reação63.

O mecanismo do Protocolo de Quioto é um dos mais avançados no uni-verso do direito internacional do meio ambiente, no qual cada espaço conven-cional constrói procedimentos próprios, de acordo com uma série de fatores: o tempo de vigência da convenção, seu caráter regional ou universal; a presença de instrumentos econômicos ou das regras clássicas do tipo command and control; a prevalência de ferramentas de cooperação ou de solução de confl itos; o objeto da convenção; a presença ou não de uma dimensão comercial etc. Nesse contexto de fragmentação e descentralização, emergem alguns questionamentos importantes. Os arranjos institucionais em vigor são os mais adequados à promoção da efeti-vidade do direito internacional do meio ambiente? Que tipo de governança se impõe às questões ambientais na esfera internacional?

4. A governança internacional do meio ambiente

As instituições internacionais competentes em matéria de meio ambiente são muito numerosas e, entre elas, a ONU desempenha um papel essencial. Em seu âmbito, destaca-se o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), criado após a Conferência de Estocolmo em 1972. Embora dotado de recursos humanos e fi nanceiros limitados, o PNUMA participa na imple-mentação de uma gama variada de atividades, incluindo o estímulo à pesquisa, à coleta e à organização de informações; a publicação de material técnico; a realização de programas educacionais; a promoção de negociações de tratados internacionais; a criação de órgãos ambientais especializados; além da produção de guidelines e outros tipos de soft law64.

63 Maljean-Dubois, S. “Les premiers pas des mécanismes d’observance”. Participação no Colóquio Le Protocole de Kyoto : quel bilan un an après? CEDRIE, Montréal, abril de 2006, pp. 4-7.64 Szasz, P.C. “Restructuring the international organizational framework”. In: Brown-Weiss, E. (ed.). Envi-ronmental change and international law: new challenges and dimensions. Tokyo: United Nations University Press, 1992, pp. 340-342.

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Além do PNUMA, quase todos os órgãos principais da ONU (com desta-que para a Assembléia-Geral, o Conselho Econômico e Social e o Secretariado Geral) executam, em maior ou menor escala, atividades relacionadas ao tema ambiental, assim como várias de suas agências especializadas (ou relacionadas): Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO); Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO); Organização Mun-dial da Saúde (OMS); Organização Meteorológica Mundial (OMM); Organiza-ção Marítima Internacional (OMI); Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA), entre outras65.

Por certo, nem todas as instituições internacionais na área ambiental en-contram-se sob a égide das Nações Unidas. Uma série de organizações indepen-dentes, com atribuições ambientais importantes ou exclusivas, atua em nível internacional e regional, bem como inter-regional, como é o caso do Comitê de Meio Ambiente da OCDE66.

As convenções ambientais, por sua vez, além de estabelecerem e defi ni-rem obrigações para os Estados Partes, passaram a criar estruturas institucio-nais ad hoc, cuja organização parece convergir para um modelo apoiado em três bases: uma instância decisória composta por um ou mais órgãos diretores de natureza política; uma instância consultiva integrada por cientistas (experts); além de uma estrutura administrativa com atribuições de secretaria67.

Em relação ao desenvolvimento sustentável, cumpre mencionar a atuação da Comissão de Desenvolvimento Durável (CDD), instituída por ocasião da Rio-92, encarregada de conduzir ações com vistas à implementação da Agen-da 21 e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Aliás, no contexto do desenvolvimento sustentável, não é possível dissociar a governança internacional do meio ambiente da governança econômica in-ternacional68, sendo importante considerar o papel desempenhado pelo Banco Mundial, pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pela OMC.

O Banco Mundial passou a adotar políticas relacionadas à conservação do meio ambiente na década de 1980. Em 1991, começou a estabelecer cri-térios ambientais como condições para a outorga de empréstimos, além de atuar como trustee e como agência de implementação do GEF69. O FMI tem um importante papel a desempenhar na promoção do desenvolvimento sus-tentável. Contudo, os impactos dos programas de ajuste estrutural promovi-dos pelo Fundo são controversos, sobretudo se considerarmos que, embora necessária, a estabilidade econômica por si só não é suficiente para assegurar

65 Szasz, P.C. Op. cit., pp. 342-346.66 Szasz, P.C. Op. cit., p. 351.67 Maljean-Dubois, S. “Environnement, développement durable et droit international. De Rio à Johannesburg: et au-delà ?” Annuaire Français de Droit International XVIII. Paris: CNRS Editions, 2002, p. 608.68 Moltke, K. “Quelle gouvernance pour le développement durable?” In: Biermann, F.; Rolland-Piègue, E.; Moltke, K. “Créer une Organisation Mondiale de l´Environnement: éléments pour le débat”. Les notes de l’Iddri, no 5. Paris: Institut du Développement Durable et des Relations Internationales, 2004, p. 26.69 Lavieille, J.M. Op. cit., p. 79.

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os objetivos de desenvolvimento sustentável70.

Em relação à OMC, cada vez mais seu mecanismo de solução de contro-vérsias tem sido instado a apreciar litígios em que o imperativo da liberalização comercial é posto em xeque por questões de natureza ambiental. Destacamos as principais possibilidades: a aplicação de barreiras não tarifárias em nome da pro-teção do meio ambiente (que pode ser caracterizada como “protecionismo ver-de”); a utilização de medidas comerciais por um Estado com o objetivo de impor a aplicação de suas próprias leis nacionais de proteção ambiental a outros Estados; a imposição de barreiras comerciais utilizando critérios ligados aos procedimen-tos e métodos de produção (PMP) de determinado produto (por exemplo, no caso em que o método de pesca de determinado crustáceo provoca a captura acidental de tartarugas marinhas); e a aplicação de medidas de sanção comercial previstas em determinada convenção ambiental contra um Estado não signatário da referi-da convenção, mas que seja membro da OMC71.

Essas situações põem em evidência dois temas controvertidos – a compe-tência da OMC para apreciar questões relacionadas ao meio ambiente e a “hie-rarquia” entre as convenções ambientais e os acordos comerciais – e servem para estimular o debate sobre a governança internacional na área ambiental.

Não se trata de um debate recente. Na verdade, em 1972, por ocasião da Conferência de Estocolmo, a hipótese de criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente com atribuições e recursos reforçados chegou a ser considerada, mas acabou sendo afastada em favor da proposta mais modesta, consubstanciada na atual estrutura do PNUMA. O tema voltou a emergir em 1994, por ocasião das negociações para a criação da OMC. Em 1998, o secretário-geral das Nações Uni-das criou uma equipe especial72, presidida pelo PNUMA, encarregada de avaliar o tratamento institucional atribuído às questões relacionadas ao meio ambiente e aos assentamentos humanos. Foi diagnosticado um estado de fragmentação insti-tucional e de perda de coerência política decorrente do grande número de órgãos intergovernamentais envolvidos. Diferentes ajustes foram implementados, com destaque para a criação, em 1999, de um fórum mundial de ministros do meio ambiente, além da redefi nição das regras de fi nanciamento do PNUMA e da im-plementação de um grupo de gestão das questões ambientais73.

A reforma da governança do meio ambiente voltou a ser abordada na Con-

70 Moltke, K. Op. cit., p. 28. A relação entre a política de juros elevados (normalmente integrante dos programas de ajuste estrutural) e o desenvolvimento sustentável é objeto do comentário de Joseph Stiglitz: “High interest rates encourage more rapid resource depletion; but they also encourage asset stripping as opposed to wealth creation, and with more fi rms and individuals having a stake in asset stripping rather than wealth creation, there is less support for the creation of a rule of law supportive of wealth creation and sustainable development”. Stiglitz, J.E. Prefácio. In: Lopez, R.; Toman, M.A. Economic development and environmental sustainability. New York: Oxford University Press, 2006.71 Le Prestre, P. ; Martimort-Asso, B. “La réforme de la gouvernance internationale de l´environnement: les éléments du débat”. Paris, 2005, pp. 21-25 (texto em elaboração).72 UN Task Force on Environment and Human Settlements.73 Martimort-Asso, B.; Tubiana, L. “Gouvernance internationale de l´environnement: les prochaines étapes”. Les synthèses de l’Iddri, n° 6. Paris: Institut du Développement Durable et des Relations Internationales, 2005, pp.1-2.

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ferência de Joanesburgo em 2001. O fórum de ministros defendeu a necessidade de adaptação dos arranjos institucionais existentes, a fi m de responder à diversi-dade dos problemas ambientais no contexto da globalização. Assim, lançou um grupo de trabalho encarregado de avaliar as fraquezas institucionais e identifi car as necessidades e opções para reforçar a governança na área ambiental. Oito op-ções foram aventadas: a transformação e o fortalecimento do PNUMA; a utili-zação mais efetiva da Assembléia-Geral ou do Conselho Econômico e Social da ONU; a criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente; a transforma-ção do Conselho de Tutela da ONU; a integração parcial do PNUD e do PNUMA; a extensão das atribuições do GEF; o fortalecimento da CDD; e a criação de um Tribunal Internacional do Meio Ambiente. A essas opções, pode ser acrescido o clustering (agrupamento) das convenções ambientais e o fortalecimento de suas secretarias74.

Em resumo, o debate, cujo principal objetivo consiste em promover a efe-tividade do direito internacional do meio ambiente, repousa sobre uma questão fundamental: a escolha entre a criação de uma instituição centralizadora, encar-regada de administrar as questões ambientais em escala mundial – uma Organi-zação Mundial do Meio Ambiente – ou a adoção de uma opção descentralizada reforçada, por meio do aumento do apoio às instituições existentes e aos mecanis-mos de controle em vigor.

Os partidários da opção centralizadora entendem que uma instituição des-se caráter favoreceria a racionalização do sistema, o preenchimento dos espaços entre as instituições existentes e o fortalecimento da proteção do meio ambiente na esfera do direito internacional. Para eles, a Organização Mundial do Meio Am-biente seria a solução ideal para aumentar a legitimidade e a efi cácia das conven-ções ambientais e, sobretudo, para restabelecer o equilíbrio entre as normas am-bientais e comerciais75. A França e a Alemanha são os mais destacados defensores desse modelo76.

Em contrapartida, três grupos de Estados manifestaram-se contrariamente à criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente: o Reino Unido e alguns países europeus, evidenciando a heterogeneidade das posições no seio da União Européia que, sem se opor ao projeto defendido por franceses e alemães, busca reforçar as estruturas existentes; os Estados Unidos e alguns de seus aliados tradi-cionais, que preferem preservar a proeminência das iniciativas voluntárias e dos acordos bilaterais, evitando novas obrigações jurídicas, políticas ou fi nanceiras, ou que possam interferir nas negociações comerciais; e a maior parte dos países em desenvolvimento (com exceção de África do Sul, Brasil e Singapura), que te-mem a imposição de normas ambientais defi nidas pelos países industrializados que possam operar como barreiras ao seu desenvolvimento econômico e social77.

74 Martimort-Asso, B.; Tubiana, L. Op. cit., p.2.75 Rolland-Piègue, E. “Fondements théoriques et functions économiques d’une OME”. In: Biermann, F.; Rolland-Piègue, E.; Moltke, K. “Créer une Organisation Mondiale de l´Environnement: éléments pour le débat”. Les notes de l’Iddri, n° 5. Paris: Institut du Développement Durable et des Relations Internationales, 2004, pp. 9-10.76 Martimort-Asso, B.; Tubiana, L. Op. cit., p.2.77 Martimort-Asso, B.; Tubiana, L. Op. cit., p.2.

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Interesses estratégicos à parte, cumpre argumentar, em favor da descentra-lização reforçada, que a criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente não representará nenhum progresso em relação ao PNUMA se alguns erros fo-rem perpetuados, notadamente a insufi ciência de recursos e a marginalização das questões ambientais na agenda internacional. Além disso, a centralização pode servir simplesmente para aliviar a consciência dos países, sem que as decisões difí-ceis e as medidas de custo elevado sejam adotadas78. É necessário cuidar para que uma nova instituição não se superponha às existentes, sem conseguir substituí-las ou articulá-las, constituindo apenas uma “superburocracia” internacional79.

Enfi m, podemos constatar que as condições ainda não estão reunidas de modo a privilegiar alguma das opções identifi cadas. Os atores políticos demons-tram divergências tanto na análise das defi ciências do sistema quanto na solução a adotar. De modo geral, duas visões se opõem: a crítica ao multilateralismo em nome da efi cácia e da proteção dos interesses nacionais e a promoção do direito internacional e da noção de bens públicos globais80.

Assim, embora permaneça o debate quanto à forma que deverá revestir a solução institucional preconizada, é necessário trabalhar na construção do con-senso quanto às funções essenciais a serem preenchidas pela governança inter-nacional do meio ambiente. Nesse sentido, algumas pistas podem ser avançadas: a necessidade de articulação entre as esferas nacional, regional e internacional; a defi nição do papel a ser desempenhado pelo conhecimento científi co, dada a capacidade da comunidade científi ca de identifi car os problemas ambientais, hie-rarquizá-los, promover o avanço dos debates e propor políticas e soluções; a ne-cessidade de implementação de sistemas de observação e de avaliação do meio ambiente e de acompanhamento das ações adotadas em âmbito nacional e regio-nal; a governança da rede de atores não-estatais (ONGs, atores privados, coleti-vidades locais, organizações profi ssionais) e sua participação, direta ou indireta, na defi nição e na implementação das normas ambientais; o exame das iniciativas descentralizadas, públicas ou privadas, que agrupam coalizões de países ou ato-res, a fi m de identifi car os fatores que contribuem para o seu sucesso ou fracas-so; a articulação entre os instrumentos econômicos e normativos; e a articulação entre o meio ambiente e outras prioridades internacionais, levando em conta as dimensões sociais, econômicas e ambientais dos problemas81.

O debate continua, mas é importante ter em mente que os mecanismos de implementação e de controle do direito ambiental internacional comportam uma série de aperfeiçoamentos que podem ser adotados independentemente do cenário institucional em que estejam inseridos. A adaptação e a generali-zação dos mecanismos mais avançados desenvolvidos no âmbito de algumas convenções já signifi caria um enorme progresso82.

78 Maljean-Dubois, S.; Richard V. Op. cit., p. 50.79 Maljean-Dubois, S. “Environnement, développement durable et droit international. De Rio à Johannesburg: et au-delà ?” Op. cit., p. 622.80 Martimort-Asso, B.; Tubiana, L. Op. cit., p.3.81 Tubiana, L. Síntese da Conferência “Gouvernance internationale de l’environnement”. Paris, 15 e 16 de março de 2004.82 Maljean-Dubois, S.; Richard V. Op. cit., p. 30.

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5. Conclusão

Em dezembro de 2000, os cientistas anunciaram que, de acordo com seus cálculos e observações, é possível esperar que a camada de ozônio esteja reconsti-tuída no prazo de 50 anos, caso os países continuem a respeitar os compromissos estabelecidos no Protocolo de Montreal adotado em 198783. Trata-se do exemplo mais notável do sucesso do direito ambiental internacional, embora, infelizmen-te, constitua um caso isolado84. Ocorre que a camada de ozônio se benefi ciou de circunstâncias especiais difi cilmente encontradas em outros regimes ambientais85. Via de regra, a adoção e implementação do direito internacional do meio ambien-te encontra obstáculos que decorrem, em grande parte, da difi culdade de obten-ção de consenso entre os numerosos e diversifi cados Estados86. Assim, para que o êxito do Protocolo de Montreal seja reproduzido em outros setores, é imperioso que uma série de desafi os sejam superados87.

O primeiro deles refere-se à lentidão na obtenção de compromissos concre-tos e na construção de referenciais comuns em âmbito internacional. Freqüente-mente, essa lentidão é provocada pelas incertezas científi cas quanto às causas da degradação ambiental, sua relação com as atividades humanas, à intensidade de seus efeitos e às vantagens em termos de custo-benefício proporcionadas pelas medidas de combate disponíveis88. Por sua vez, a técnica de “negociação per-manente”89 das convenções-quadro, embora muito valiosa, contribui para que as discussões se prolonguem no tempo, adiando a adoção de ações concretas.

A natureza vaga e não-vinculante dos compromissos constitui outro desafi o a ser superado. Por um lado, decorre da larga utilização da soft law, cujas regras se caracterizam pelo emprego de retórica pomposa90 e pela (quase) ausência de

83 Protocolo de Montreal. Summary of the Fourteenth Meeting of the parties to the Montreal Protocol and the Sixth Conference of the parties to the Vienna Convention. ENB, vol. 19, no 24. 25-29 de novembro de 2002.84 De acordo com o relatório GEO – 2000 elaborado pelo PNUMA, os esforços promovidos com vistas a evitar a degradação do meio ambiente são pouco numerosos e muito tardios; as provas de melhora na situação ambiental são raras. (…) O meio ambiente mundial deteriora-se a uma cadência alarmante”. (grifo nosso). PNUMA. “L’avenir de l’environnement mondial”. GEO 2000. Apud Lavieille, J.M. Op. cit., p. 8.85 Faucheux, S.; Noël, J.-F. Les menaces globales sur l’environnement. Paris: Repères La Découverte, 1990.86 Maljean-Dubois, S.; Richard V. Op. cit., p. 15. A pluralidade de interesses constitui um dos fatores que difi cultam a obtenção de consenso na esfera ambiental internacional. Laurence Boisson de Chazournes cita o exemplo da ne-gociação do Protocolo de Quioto: “Dans leur grande majorité, les pays de l’OCDE étaient favorables à l’adoption d’un instrument prévoyant une limitation de l’émission de gaz à effet de serre. Les Etats-Unis, pour leur part, ne voulaient être assujettis à aucune obligation de réduction. La plupart des pays en développement ne voulaient pas pâtir d’un point de vue économique de l’adoption d’une convention qui restreindrait l’utilisation de certaines sources d’énergie. Ils revendiquaient de justes compensations en matière fi nancière et technologique. Les pays exportateurs de pétrole craignaient qu’un tel instrument ne porte préjudice à leur source de revenues, issus de l’exportation du combustible fossile qu’est le pétrole. Les petits pays insulaires ou ayant de côtes basses fi rent allian-ce pour se protéger contre la menace d’une montée des océans en faisant reconnaître leurs intérêts particuliers. Les pays à économie en transition, quant à eux, ne voulaient pas être tributaires de trop lourdes charges économiques”. Boisson de Chazournes, L. Op. cit., p. 701.87 Para mais detalhes, consultar Maljean-Dubois, S. “Environnement, développement durable et droit international. De Rio à Johannesburg : et au-delà ?”. Op. cit., pp. 592-623.88 Tubiana, L. “ La négociation internationale sur le changement climatique”. In: Petit, Y. (dir.). Le Protocole de Kyoto. Mise en oeuvre et implications. Strasbourg: Presses universitaires de Strasbourg, 2002, p. 25.89 Expressão utilizada por Alexandre Kiss. Kiss, A. Op. cit., p. 797.90 Dupuy, P.M. “Où en est le droit international de l’environnement à la fi n du siècle ?”. Op. cit., p. 878.

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obrigações quantifi cáveis, de objetivos bem delimitados e de calendários de execu-ção preestabelecidos. Além disso, muitas convenções internacionais compartilham essas características, como ocorre com as convenções-quadro. Sua técnica permite a rápida adesão dos Estados ao texto das convenções principais, em que fi guram princípios gerais e regras não vinculantes, e resulta na lenta adoção dos respecti-vos protocolos, que prevêem as obrigações precisas e quantifi cáveis, levando-nos a concluir que, na esfera ambiental internacional, a rapidez da entrada em vigor de um instrumento é inversamente proporcional ao seu grau de “obrigatoriedade”91.

O direito internacional do meio ambiente também precisa se revelar sufi -cientemente fl exível para permitir a adaptação de suas normas ao avanço dos conhecimentos científi cos e à gravidade das ameaças ambientais. Alguns textos normativos já prevêem regras especiais para sua atualização, freqüentemente dis-tinguindo entre disposições gerais e disposições técnicas e científi cas, bem como facilitando o procedimento de revisão dessas últimas92. A necessidade de fl exibili-dade também é verifi cada na possibilidade de recurso aos instrumentos econômi-cos, mas, nesse caso, o desafi o consiste justamente na imposição de limites à sua utilização, para que não sirvam como meios de substituir a obrigação principal de promover a redução da poluição93.

Cumpre, ainda, aumentar a coerência do direito internacional do meio am-biente nos planos normativo e institucional. No primeiro caso, conciliando seto-res ambientais diversos (águas, mudanças climáticas, biodiversidade etc.), setores não-ambientais (comércio, propriedade intelectual, investimentos, direitos huma-nos) e temas transversais (fi nanciamento do desenvolvimento, governança). No segundo, promovendo a necessária articulação e o fortalecimento das instituições existentes ou criando uma nova instituição centralizadora.

Além disso, é necessário envidar esforços no sentido de promover a ratifi ca-ção dos instrumentos já assinados, além de adaptar e reforçar os mecanismos de implementação dos textos em vigor, assegurando o cumprimento de compromis-sos duramente alcançados na esfera internacional94.

Por último, entendemos que o aumento da efi cácia do direito ambiental in-ternacional se encontra estreitamente relacionado ao fortalecimento da coopera-ção Norte-Sul, sobretudo no que diz respeito ao fi nanciamento do desenvolvi-mento e à gestão dos interesses comuns.

91 Nesse sentido, o exemplo mais destacado é o do Protocolo de Quioto, cuja entrada em vigor somente ocorreu sete anos após sua adoção, quando foram cumpridos os dois pré-requisitos: a ratifi cação do Pro-tocolo por 55 Estados Partes da convenção principal, representando, pelo menos, 55% das emissões de gás de efeito estufa pelos países industrializados (tomando por base as emissões em 1990). Maljean-Dubois, S. “La mise en route du Protocole de Kyoto à la Convention-Cadre des Nations Unies sur les Changements Climatiques”. Annuaire Français de Droit International, no 51, 2005, p. 435.92 O Protocolo de Montreal sobre a camada de ozônio ilustra muito bem essa dinâmica.93 Hourcade, J.C. “Le climat au risque de la négociation internationale”. Le débat, no 113, pub. Problèmes économi-ques, no 2.710, 25 de abril de 2001, p. 3.94 Segundo Pierre-Marie Dupuy, “dans une majorité des cas, la question n’est alors plus tellement de négocier des nouveaux accords que de tenter de remédier à l’insuffi sante application de ceux qui sont déjà en vigueur”. Dupuy, P.M. “Où en est le droit international de l’environnement à la fi n du siècle?” Op. cit., p. 893.

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Nesse contexto, o Brasil ocupa uma posição de destaque. Por um lado, em razão do atual estágio de inserção do País no cenário internacional, em que des-ponta como potência regional, pleiteia uma vaga permanente no Conselho de Se-gurança das Nações Unidas e atua como porta-voz dos interesses dos países em desenvolvimento em diversos foros multilaterais. Por outro lado, em virtude da sua riqueza em biodiversidade, vasta extensão territorial e abundantes reservas minerais e de água doce, o Brasil pode se tornar um dos maiores benefi ciados pelo fortalecimento das estruturas institucional e normativa internacionais relaciona-das à conservação e ao uso sustentável dos recursos naturais.

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