As Teorias Pedagógicas de Wilhelm Von Humboldt Na Historiografia Da Educação Alemã

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As teorias pedagógicas de Wilhelm von Humboldt na historiografia da educação alemã. Fabiano de Lemos Britto - PUC-Rio CAPES/ MEC RESUMO: A importância de Wilhelm von Humboldt na constituição do modelo moderno de universidade e de sistema educacional – sobretudo a partir de seu papel na fundação da Universidade de Berlim – é incompatível com a quase ausência de material bibliográfico em língua portuguesa a seu respeito. Este trabalho pretende redefinir o horizonte conceitual e institucional em que Humboldt se inscreveu em sua época, discutindo como sua posição teórica esteve associada, fundamentalmente, a uma série de estratégias pragmáticas que tornaram seu projeto efetivamente bem-sucedido. Na história da moderna pedagogia alemã – ou, de uma maneira um pouco mais ampla, mas não menos importante, da pedagogia moderna em geral – tornou-se um lugar comum associar o nome de Wilhelm von Humboldt ao início de uma nova era, com todos os signos e promessas que essa aurora, ao mesmo tempo institucional e filosófica, pôde carregar consigo. Pode-se dizer que, especialmente ao longo do tumultuado século XIX alemão, e mais ainda na região definida pela Prússia, ele ocupou uma função análoga àquela que o culto às personalidades, próprio da atmosfera européia nacionalista no final do século XVIII, já reservara a nomes como Napoleão, Goethe e Schiller. No imaginário germânico, a elaboração filosófica das reformas pedagógicas neo-humanistas empreendida por Humboldt acabou por transformar sua figura em uma síntese ideal das dimensões

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As teorias pedaggicas de Wilhelm von Humboldt na historiografia da educao alem.

Fabiano de Lemos Britto - PUC-Rio

CAPES/ MEC

RESUMO: A importncia de Wilhelm von Humboldt na constituio do modelo moderno de universidade e de sistema educacional sobretudo a partir de seu papel na fundao da Universidade de Berlim incompatvel com a quase ausncia de material bibliogrfico em lngua portuguesa a seu respeito. Este trabalho pretende redefinir o horizonte conceitual e institucional em que Humboldt se inscreveu em sua poca, discutindo como sua posio terica esteve associada, fundamentalmente, a uma srie de estratgias pragmticas que tornaram seu projeto efetivamente bem-sucedido.

Na histria da moderna pedagogia alem ou, de uma maneira um pouco mais ampla, mas no menos importante, da pedagogia moderna em geral tornou-se um lugar comum associar o nome de Wilhelm von Humboldt ao incio de uma nova era, com todos os signos e promessas que essa aurora, ao mesmo tempo institucional e filosfica, pde carregar consigo. Pode-se dizer que, especialmente ao longo do tumultuado sculo XIX alemo, e mais ainda na regio definida pela Prssia, ele ocupou uma funo anloga quela que o culto s personalidades, prprio da atmosfera europia nacionalista no final do sculo XVIII, j reservara a nomes como Napoleo, Goethe e Schiller. No imaginrio germnico, a elaborao filosfica das reformas pedaggicas neo-humanistas empreendida por Humboldt acabou por transformar sua figura em uma sntese ideal das dimenses espirituais que cada membro da politicamente fragmentada comunidade alem projetava como resposta aos seus anseios por um Reich, enfim, unificado. Assim, no sculo em que a reunificao de 1871 trouxe para o centro do poder a mo de ferro do general Otto von Bismarck, prenunciando sombriamente a tendncia poltica do sculo seguinte, ou seja, no longo perodo em que os intelectuais parecem ter perdido, aos poucos, o prestgio social de que desfrutavam antes, Humboldt tornou-se, no horizonte simblico da histria alem, o representante de uma mudana, sob o custo de tambm tornar-se um personagem de si mesmo.

Isso se explica, em grande parte, em funo do fato de sua posio intelectual ter conseguido se mostrar operante, e, portanto, tangvel, no horizonte das mudanas sociais e culturais em que ela se inseria. Ao aproximar o pensamento terico da realidade concreta, institucional, do Estado prussiano e estabelecer entre estes dois universos nexos de interdependncia reais, seu trabalho filosfico conseguia, pela primeira vez, aps inmeras tentativas por parte dos acadmicos, desde o sculo XVII, justificar de forma satisfatria, e diante de um pblico de no-eruditos, a funo social do professor e do homem de cincia em geral enquanto educadores da humanidade, e, mais especificamente, dos alemes. Assim, a reforma educacional de Humboldt marca uma das poucas instncias em que uma antropologia filosfica formou a base explcita para um programa de mudana social bem sucedido (Thomas, 1973, p. 219). O que nos resta compreender, portanto, sob que condies histricas e socioculturais este programa pde assumir uma dimenso filosfica to explcita e se mostrar, ao mesmo tempo, bem-sucedido do ponto de vista institucional. Em outras palavras, compreender a importncia do neo-humanismo humboldtiano significa questionar que caminhos polticos puderam encontrar suas premissas tericas para que elas, ao contrrio das reflexes pedaggicas que lhe antecederam na Alemanha, como, por exemplo, as de Lessing, Herder ou Basedow, pudessem se realizar concretamente.

Alm de seus textos tericos, entretanto, existe um outro corpus, formado pelo conjunto de escritos dirigidos a seus superiores, redigidos por Humboldt na qualidade de diretor do Departamento de Ensino do governo. Esse conjunto de textos surge como um continente documental extremamente relevante, j que ele responde ao desafio enfrentado pelo autor de compatibilizar sua posio ideolgica com as demandas institucionais, prticas, de sua poca. Como possvel, ento, que estes escritos, de linguagem a um s tempo rigidamente reverente e telegrfica, com pouca ou nenhuma elaborao filosfica explcita, atravessada por nomes e estatsticas, ttulos e nmeros j soterrados pelo peso do tempo, constitua uma parte relevante do corpus terico de Humboldt e da historiografia da moderna pedagogia alem? Se considerarmos, no entanto, o texto a seguir como um documento, um pouco maneira como Michel Foucault articulava o material de sua arqueologia do saber, a resposta a essa questo pode ser dada em dois nveis.

Em primeiro lugar, do ponto de vista historiogrfico, estes documentos nos do um importante testemunho no apenas das estranhas de um modelo administrativo extremamente complexo e singular, que o modelo prussiano, onde Humboldt se encontrava em uma posio notvel, mas de sua prpria dinmica interna, de seus impasses e desafios, de sua forma narrativa e de suas intenes subtextuais e isso no exato momento de sua gnese. O que este conjunto nos permite , justamente, atender essa demanda e medir o alinhamento das teses de Humboldt a essa reforma administrativa mais ampla, empreendida, sobretudo, por Heinrich Friedrich Karl vom und zum Stein e Karl August von Hardenberg, a quem muitas cartas oficiais so dirigidas. Ambos, enquanto ministros da Prssia no incio do sculo XIX, promoveram, simultaneamente, importantes reformas na burocracia do Estado, acreditando que a identidade nacional e cultural a que se almejava s seria possvel segundo uma modernizao da cultura e das instituies que a representavam. Estrategicamente, a ligao poltica de ambos com os filsofos e artistas, especialmente do crculo neo-humanista, deu a tnica do tratamento relativamente privilegiado que o Estado reservou a estes ao longo das dcadas seguintes. Durante sua administrao, Humboldt, convidado a integrar o quadro dos funcionrios do planejamento educacional da Prssia como diretor do recm-criado Departamento de Ensino Pblico do Ministrio do Interior, redigiu inmeros relatrios e propostas de carter oficial entre eles, uma srie de projetos organizacionais e conceituais para a Universidade de Berlim, que, sob sua gide, foi fundada em 1810 (Humboldt, 2002).

Em segundo lugar, da perspectiva da histria da filosofia e das idias pedaggicas, estes escritos nos informam em que medida os conceitos humboldtianos de educao e cultura procuraram se adequar s exigncias burocrticas da poltica prussiana de ento, e, o que talvez seja o mais importante, como o contrrio tambm pde se dar. Isso significa se perguntar at que ponto Humboldt, na qualidade de intelectual, conhecia e participava de tais estruturas, ou seja, colocado o problema em uma perspectiva mais geral: at que ponto as reformas pedaggicas na Alemanha do incio do sculo XIX solicitaram efetivamente o envolvimento dos intelectuais ao longo de seu processo de implementao, e, portanto, puderam tambm se caracterizar como uma reforma filosfica da educao. Este segundo nvel nos permite avaliar, ainda, sob que condies a permanncia de um modelo de reestruturao oficial vertical operando desde as elites se modificou, no no sentido de sua horizontalizao, mas da economia do poder burocrtico, ento redistribudo por novas classes sociais j que a elite intelectual, o Kulturkreis, passa a ocupar, desde ento, um espao importante na esfera do poder legislativo e, ocasionalmente, executivo do Estado prussiano.

Karl August von Hardenberg, Freiherr (baro) e primeiro ministro da Prssia durante o governo de Frederico Guilherme III, exerceu um papel fundamental no processo de modernizao e descentralizao da poltica administrativa prussiana. Essa nova e emergente reformulao do papel do Estado na sociedade tinha como horizonte a crise poltica que havia acabado por submeter a Prssia ao poder da Frana, aps a invaso de Napoleo e a derrota da batalha de Jena em 1806 (Holborn, 1964, pp. 386-395). Para enfrentar essa crise que, na verdade, pode ser lida como o ponto culminante de um j longo processo de deteriorao da identidade poltica e educacional da Alemanha e para resgatar tanto a imagem dos Estados germnicos diante da comunidade europia, quanto a prpria identidade nacional interna, Frederico Guilherme III tentava, desde sua subida ao trono, em 1797, implementar uma poltica mais slida e liberal. Assim, retomou os ideais de Frederico, o Grande, como emblema de seu governo, e acompanhou, de to perto quanto possvel, o destino do modelo administrativo francs, que havia sido recebido com simpatia por seus sditos. Com uma freqncia sem precedentes, telogos, filsofos, cientistas, enfim, homens de letras, assumiam cargos importantes na administrao das escolas que eles mesmos haviam discutido conceitualmente. Que filsofos e telogos como Hegel, Schleiermacher, Fichte e August Wolf tenham sido reitores de universidades importantes extremamente sintomtico dessa nova funo social do intelectual no quadro das reformas pedaggicas neo-humanistas e da poltica alem que lhe foi contempornea.O prprio Humboldt talvez tenha sido o caso mais extremo e notrio desta renovao. Tendo ocupado vrios cargos ligados ao governo da Prssia, participou de muito perto da formulao conceitual desta nova organizao hierrquica no interior das instituies de ensino. Esta nova organizao, literalmente citada em uma de suas cartas a Hardenberg (Humboldt, 1903, p. 299), demarca com preciso o lugar de onde ela redigida, ou seja, circunscreve o espao de sua origem. Na verdade, entre os trabalhos mais influentes de Humboldt, nem seus escritos sobre lingstica, nem seus esforos em torno do complexo conceito de formao cultural (Bildung) podem ser adequadamente compreendidos se no levarmos em conta a base poltica da qual eles surgem como instncias mais tericas. De certa forma, sua importncia no contexto histrico e historiogrfico da Alemanha moderna s pode ser compreendida como o resultado da ntima associao entre estes trs eixos: linguagem (como forma de acessar o contedo espiritual do povo e resgatar sua identidade), educao (como projeto de afirmao e construo desta identidade especfica) e poltica (como esforo de efetivao deste projeto). A atuao poltica, portanto, conjuga tanto o projeto de uma nova educao, quanto as conceitualizaes espirituais da lingstica, a uma realidade concreta que lhes d sua espessura.

A preocupao de Humboldt com o destino do Departamento de Ensino que ele dirigiu em 1809-1810 bastante representativa desta conjugao. O vocabulrio utilizado ao longo de sua correspondncia oficial no deixa dvidas quanto justificativa dada ao projeto de reforma das escolas e universidades e sua gerncia. Ao aproximarem os termos formao cultural nacional [Nationalbildung] e educao popular [Volksunterricht] (Humboldt, 1903, p. 299), os relatrios a Hardenberg assinalam a diferena do neo-humanismo em relao ao projeto pedaggico dos filsofos esclarecidos em especial, Lessing, Kant e Herder. J no se trata mais, como era o caso destes, de idealizar a poltica como uma fora homognea e inerte, anterior cultura, Bildung, que no diria respeito especificamente ao povo alemo, mas a essa comunidade pouco tangvel chamada humanidade. Era preciso torn-la imediatamente acessvel.Esta divergncia ideolgica e institucional entre o neo-humanismo e as polticas educacionais que lhe antecederam se torna ainda mais ntida se compararmos os documentos redigidos por Humboldt poca em que ocupava o cargo de diretor do Departamento de Ensino a outros relatrios e documentos oficiais referentes aos estabelecimentos de ensino no sculo XVIII. Um bom exemplo o dos estatutos universitrios elaborados pelo Prncipe-eleitor Karl Theodor, do palatinado do Reno, regio no sudoeste da Alemanha. Em um deles, o que determina novas bases administrativas para a Universidade de Heidelberg, todo o projeto pedaggico parece mais vinculado a uma poltica imperial muito intrusiva e geral poderamos dizer, europia que a uma poltica nacional. a manuteno da posio dinstica desta elite imperial que ele visa sustentar, o que fica claro, desde o incio, quando as primeiras linhas do texto anunciam a quem ele se dirige no a um representante do povo, como Hardenberg aparece para Humboldt, mas, antes, aos prncipes-eleitores e aos condes palatinos, aos seus filhos e herdeiros. Alm disso e este , certamente, o ponto mais importante aqui o que justifica, no estatuto de Karl Theodor, a incluso e a propagao das cincias [Wissenschaften] nas escolas que ele pretende regulamentar justamente o fato de que elas so as disciplinas atravs das quais o Estado e a Igreja formam homens oficiosos e funcionrios teis [ntzliche Diener], alm de bons cidados [gute Brger] (Thorbecke, 1891, p. 301). Ora, estes Brger ainda desenham uma figura sem espessura, excessivamente annima, intercambivel na ideologia poltica que sustenta o estatuto do prncipe Karl Theodor um cidado, afinal, o mesmo personagem sem rosto e sem lngua, seja em Heidelberg ou Paris, na Prssia ou em qualquer outro lugar da Europa. Na verdade, nos escritos dos filsofos e pedagogos do final do sculo XVIII alemo, ainda h uma clara tendncia em fazer fundir o Brger, o cidado, e o Weltbrger, o cidado-do-mundo, cosmopolita sendo este ltimo a tal ponto a imagem ideal daquele primeiro que tais escritos procuram quase sempre usar, politicamente, ambos os termos como sinnimos, como o caso dos textos Kant.Contrariamente, a reforma neo-humanista, em sua origem, s adquire seu sentido mais concreto nos limites das questes polticas da Alemanha, e, mais especificamente, da Prssia. Ainda que Humboldt tivesse aprendido com Kant e outros intelectuais da Aufklrung que havia uma disposio universal inata no homem que o distinguia enquanto espcie, suas investigaes tericas e a proximidade com o romantismo como tendncia filosfico-literria o tornaram infinitamente mais sensvel, tanto para a diversidade cultural entre os povos, quanto para a necessidade de um projeto poltico mais especfico para a Prssia. Ao contrrio de Herder, por exemplo, Humboldt utiliza a expresso humanidade no como um ideal esttico no horizonte das aes humanas, mas como uma sntese dinmica e poderamos mesmo dizer tensa entre uma forma interna universal (o homem como cidado-do-mundo) e uma forma externa contingente (o homem dotado de uma lngua determinada e inserido em um universo pedaggico determinado). O prprio conceito de formao cultural, de Bildung, tal como definido por Humnboldt em sua reforma escolar, traduz, sinteticamente e pela primeira vez a necessidade desta formao especfica. por isso que, ao menos idealmente, um funcionrio do Departamento de Ensino no serve nem a uma classe de aristocratas, cujos largos limites ideolgicos so determinados apenas pelo alcance de sua fortuna, nem a essa figura demasiadamente abstrata e annima, presente nos escritos de Kant e seus contemporneos sob o nome de Menschheit, humanidade. Ele serve ao Esprito, fora viva que estreita, incondicionalmente, os laos entre os que partilham a mesma lngua e a mesma geografia, e, somente secundariamente, ao Estado enquanto extenso deste esprito. No isso, afinal, que Humboldt sublinha ao dirigir-se a Hardenberg em uma carta, quando assinala a diferena da nova poltica, que este palpvel novo entusiasmo pelo sistema escolar e de ensino em geral, e que despertou e se tornou vivo? Afinal, o que cada deciso administrativa desta poltica fomenta no nada seno, tambm, um novo e melhor esprito [Geist] (Humboldt, 1903, pp. 299-300) para o povo alemo.A atuao poltica, assim, no surge como o avesso mundano do ideal de educao, e quando Humboldt defende a diminuio da interferncia do poder pblico no contedo curricular das universidades, ele est criticando duramente este modelo que ope cultura e poltica, presente nas instituies de ensino naquele momento. O modelo poltico-administrativo que ele procurou encarnar , ao contrrio, a extenso natural do esprito e da Bildung alem. Obviamente, a implementao desta naturalizao de uma poltica educacional no foi isenta de impasses, e o nacionalismo ressentido que comeou a emergir nos estados prussianos, principalmente nos meios intelectuais, na segunda metade do sculo XIX, parece mostrar que ela nunca ocorreu completamente ou de forma definitiva e ampla. De fato, a repercusso do modelo educacional alemo na Europa sempre esteve dividida entre sua origem romntica e seu destino exclusivamente nacionalista. A longa carreira de Humboldt no servio oficial j aponta para tais dificuldades. Embora sua ligao direta com os departamentos responsveis pela reforma do ensino efetivada pelo Ministrio do Interior da Prssia tenha sido relativamente breve (entre 1809 e 1810), sua atuao precisou se estender sobre muitos outros domnios da esfera poltica da Alemanha, a fim de influenciar esta reforma, ainda que indiretamente: Humboldt foi, assim, embaixador em Viena, em 1810, representante da Prssia no Congresso de Praga de 1813, duas vezes delegado da comisso prussiana de questes territoriais e embaixador na Inglaterra em 1817. Quando, em 1819, Hardenberg parece ter se deixado influenciar pela ideologia relativamente mais reacionria do prncipe austraco Metternich e dado um passo atrs no projeto pedaggico neo-humanista, Humboldt rompe com o ministro, mas sua participao no quadro administrativo do governo , ainda, bastante intensa e variada: ministro das questes governamentais em 1819, presidente da comisso de regulamentao dos museus estatais em 1829 e integrante do Conselho do Estado em 1830. Somente entre 1830 e 1835, ano de sua morte, Humboldt dedicou-se exclusivamente aos seus trabalhos tericos, especialmente sua obra de lingstica comparada. Obviamente, o conhecimento histrico destas inmeras datas e destes pouco interessantes ttulos no tem por funo aqui atestar um coeficiente de erudio qualquer, mas importante notar que justamente a contraposio entre a variedade de cargos e a extenso dos anos que os cobre que nos indica o esforo poltico de Humboldt para assegurar a eficiente implementao de sua reforma pedaggica.

O trabalho filosfico mais representativo da ideologia que orientou a atuao pblica de Humboldt e que pode ser lido como a propedutica poltica de sua filosofia da educao, j que ali que o conceito de Bildung aparece desenvolvido de forma mais extensa pela primeira vez foi publicado, como boa parte de sua produo intelectual, apenas postumamente. Suas Idias para uma tentativa de determinar os limites da ao do Estado, escritas em 1792, s puderam ser lidas pelo grande pblico em 1851, para, logo aps esta data, tornar-se parte do cnone do pensamento liberal alemo (Sweet, 1973, p. 470). Operando uma distino entre a relao antiga e a moderna entre indivduo e Estado, influenciada sobretudo, pelo romantismo de autores como Hegel e Schelling, e de poetas como Novalis e Hlderlin, o texto inverte o fundamento do poder estatal, o equilbrio entre liberdade pessoal e desenvolvimento social, tal como aparecia nas teorias contratualistas clssicas de tipo hobbesiano. O que os gregos devem ensinar aos alemes que buscam um novo modelo de cultura, um novo modelo de ensino, precisamente essa inverso: ao invs de uma natureza individual que encontra seus limites na fora representativa do Estado, uma reforma da poltica, capaz de fornecer um critrio de unidade eficiente ao povo, deve dispor dessa natureza como objetivo ltimo, e condicionar a representatividade do Estado e seus bens coletivos a ela. o Estado que serve Bildung, e no o contrrio. Uma reforma pedaggica deve, assim, ser precedida de uma reforma do papel do Estado na formao cultural dos indivduos.

A preocupao com a interferncia negativa do poder governamental no processo de formao dos indivduos e na manuteno do horizonte cultural de uma sociedade j era um tema bem antigo poca de Humboldt, mas sua insistente atualizao em torno dos problemas prprios da Prssia se justifica pela situao do sistema de ensino naquela regio. Desde a segunda metade do sculo XVIII, a nica teoria pedaggica realmente discutida e aceita pelos administradores das instituies de ensino na Alemanha era o Philantropismus. Inspirados nos princpios cosmopolitas e universalizantes da Aufklrung, do Esclarecimento, os filantropistas entre eles, Basedow e Pestalozzi procuraram definir a educao como uma atividade disciplinar cujo fim ltimo deveria ser a transformao do homem em cidado, ou seja, em um indivduo til sua espcie. Em 1782, por exemplo, Pestalozzi elaborava, em um artigo chamado Da educao, a seguinte mxima: Viver de forma feliz em sua classe [Stand], ser e se tornar til em seu crculo, esta a destinao do homem e o fim da educao [Ziel der Auserziehung] das crianas (Pestalozzi, 1905, p. 284). Este pragmatismo nivelador foi a tal ponto benfico para as elites aristocratas prussianas, na medida em que homogeneizava as diferenas sociais e encarava o aluno como um corpo a ser domesticado na maquinaria do poder imperial, que a instituio de ensino fundamental mais difundida at a poca de Humboldt era o Philantropinum, estabelecimento projetado por Basedow originalmente em Dessau, em 1774. Seus conceitos-chave eram, no por acaso, os de disciplina e domesticao, e a cultura fsica atravs de exerccios constitua quase a totalidade do currculo.

O desinteresse poltico em investir em um sistema de ensino elementar mais abrangente, tanto no que se refere qualificao de professores, quanto cultura dos alunos, atravessou, portanto, boa parte do sculo XVIII alemo. Se este modelo parecia til ou, em princpio, menos arriscado aos olhos dos prncipes e seus ministros, colateralmente, ele acabou dando lugar a uma estrutura administrativa totalmente arbitrria e ineficiente. O fato de que o professor deveria ser, antes de tudo, apenas um disciplinador, desonerava-o de uma formao cultural mais ampla e rigorosa. Alm disso, o que era considerado til para o poder pblico variava consideravelmente de Estado para Estado na Prssia. Mesmo as rarssimas tentativas de regulamentar, em mbito mais geral, o funcionamento das instituies de ensino acabaram por fracassar diante da resistncia dos administradores destas instituies e da ausncia de uma filosofia capaz de sustent-la entre os intelectuais e entre os prprios professores. Assim, fato que o Generallandschulreglement foi redigido e assinado por Johann Julius Hecker em12 de agosto de 1763, funcionando como a primeira tentativa de estabelecer, para alm das ordens rgias eventualmente promulgadas atravs de editos, um cdigo definitivo e universal para a circunscrio programtica e administrativa das escolas (faixa etria das turmas, iseno de pagamento para os pobres, requisitos burocrticos e tipos de exame para admisso de professores etc.). As propostas deste regulamento, no entanto, raramente foram implantadas de forma global, ao ponto de um relatrio oficial elaborado j em 1802 afirmar que a situao dos estabelecimentos de ensino no havia se alterado desde sua elaborao (Cf. Neugebauer, 1985, pp. 185-187; Bruford, 1965, pp. 122 e ss., e Mainka, 2005, passim). Tudo isso deu lugar a uma situao onde o descrdito era a principal atitude geral para com a figura do professor. O prprio Goethe, que participou ativamente como membro do conselho da Universidade de Jena onde tinha uma atuao muito influente compartilhou desta atmosfera anti-utilitarista da pedagogia alem. Sua rejeio s premissas filosficas do Philantropismus se traduz em um de seus fragmentos publicados em Mximas e reflexes: Como quer algum aparecer como mestre em sua matria quando no ensina nada de intil? (Goethe, 1982/1983, 445). Na verdade, a posio crtica de Goethe em relao s escolas e universidades de seu tempo adianta, e, at certo ponto, inspira a dimenso espacial da concepo romntica de ensino, que considerava que o processo de formao deveria se dar para alm dos muros das instituies, buscando uma sntese entre seu interior e o mundo externo. Uma das passagens mais representativas desta atitude aparece na primeira parte do Fausto, publicada em 1808, na rplica do personagem do Estudante a Mefistfeles, quando, referindo-se universidade, ele diz (versos 1882-1887):Estas paredes, aulas, salas,

No sei como hei de suport-las.

to restrito e angusto o espao,

De verde no se v pedao,

E ficam-me nas aulas, bancos,

Pensar, ouvido e vista estancos. (Goethe, 2004, pp.182-185.)Paradoxalmente, portanto, foi justamente a partir de uma nfase utilitarista que, no fundo, escamoteava um poderoso dispositivo de manuteno do poder dinstico que o Philantropismus resultou em um cenrio social onde o professor era imaginado como um indivduo parasitrio e as instituies de ensino como grandes estabelecimentos sem propsito cultural. O que, de certa forma, no parece estar muito longe da verdade. O historiador Thomas Alexander nos desenha o quadro geral desta situao: Se ele [o professor] pudesse ler um pouco mais que rudimentarmente, cantar os hinos da Igreja mais conhecidos, repetir os cinco artigos do Catecismo Menor, de Lutero, e se podia escrever, ento ele j possua todas as qualidades necessrias de um bom professor, e nada alm era exigido dele (citado em Thomas, 1973, p. 273).No , portanto, absolutamente estranho que o mais importante critrio social das reformas propostas pelos intelectuais neo-humanistas tenha sido, justamente, a adoo de medidas burocrticas capazes de consolidar os limites do Estado diante da cultura, insistindo na importncia poltica dos eruditos, os Gelehrten, especialmente atravs de sua reaproximao com a classe instvel da burguesia que os enxergava, desde o final do sculo XVIII, como uma populao parasitria e intil. Essa crtica burguesa antiintelectualista assumiu um vulto realmente ameaador para toda a casta de professores acadmicos que, em uma economia ainda pouco desenvolvida, dependia da legitimidade estrita desses espaos como nica forma de prestgio social. Um de seus representantes mais radicais foi Joachim Heinrich Campe, que, na qualidade de pedagogo de renome internacional, chegou a defender, em 1792, o absoluto fim das universidades, que, para ele, quela altura, haviam se reduzido a um aglomerado moralmente inadmissvel de parasitas supostamente intelectuais.

Foi para silenciar vozes como a de Campe e evitar o desaparecimento ou dissoluo da elite de eruditos acadmicos, que, contando com o apoio do Estado, as reformas neo-humanistas propunham uma srie de medidas institucionais que buscavam no apenas justificar a figura do professor e do homem de letras, mas torn-la mais objetivvel, concreta, e, portanto, mensurvel. Ou seja, era preciso estabelecer critrios formais para admisso de professores e alunos, para avaliar seu desempenho e controlar sua trajetria no interior da sociedade e, mais ainda, dos crculos acadmicos e cientficos, que surgiam, a partir de ento, como um reino que lhes pertencia por direito, com sua linguagem e seus protocolos institucionais prprios e suficientemente claros. Os relatrios de Humboldt a Hardenberg so uma expresso inquestionvel deste novo empreendimento. Ao fornecer dados e nmeros especficos quanto investimento seria preciso, quais as reas a serem privilegiadas, que fundos econmicos deveriam ser aplicados para a melhoria no apenas do ensino (como complexo institucional), mas da cultura (como objetivo espiritual ltimo) eles traam uma cartografia extremamente precisa dos estabelecimentos de ensino. Com isso, ele pode, a um s tempo, atestar o uso de novos dispositivos de quantificao profissional, bastante refinados, e determinar a geografia fsica da prpria idia de Bildung, e, por conseguinte, da figura neo-humanista do professor-intelectual. exatamente neste sentido que o neo-humanismo responsvel, na Alemanha, mas, em breve, em grande parte da Europa, que adotou o modelo alemo pelo surgimento do professor como categoria profissional burocraticamente organizada e das escolas e universidades como seu domnio prprio. O neo-humanismo se forma, portanto, no espao aberto entre a retomada ideolgica do modelo cultural do holismo tpico do humanismo greco-latino e o surgimento, nesta poca, da cincia da Antiguidade, a Alterthumswissenschaft , nesse caso, seu sintoma mais evidente e a humanizao burocrtica do intelectual. Estas duas dimenses no devem ser historicamente dissociadas.

Em termos polticos, o Humanismus implicava, portanto, o estabelecimento de uma aristocracia esclarecida que, ainda que resguardasse os limites pragmticos da elite intelectual, procurava aproximar, em teoria, ou idealmente, a experincia da vida acadmica da sociedade como um todo.Do ponto de vista filosfico, todas essas especificidades polticas e histricas, que contextualizam a emergncia do neo-humanismo no interior do processo de modernizao da pedagogia alem, s puderam se sustentar como unidade a partir da construo do conceito de Bildung. Na posio oposta do conceito de educao utilizado pelos filantropistas atravs do termo Erziehung (ensino) a idia de Bildung tinha como critrio reintegrar positivamente a multiplicidade dos Estados, das culturas locais, dos indivduos, de modo natural, em um processo unvoco de formao. Isso significava transformar o estado fragmentrio da identidade nacional alem de ento a partir de seu prprio interior, sem impor a ele um modelo externo, como Frederico, o Grande havia feito, bem antes, usando o modelo dos philosophes franceses. O novo conceito de cultura deve, portanto, surgir como a unidade espiritual que os homens compartilham, no apesar de suas diferenas, mas a partir delas. Nesse sentido, a Bildung, tal como definida por Humboldt e seus herdeiros ideolgicos, s se deixava deduzir segundo a difcil dialtica entre o universal e o particular, e, por isso, dizia respeito, desde sua origem, ao povo alemo e seu esprito prprio. No plano das prticas pedaggicas e das instituies de ensino, a cultura se definia em funo de sua capacidade de harmonizar os aspectos mais diversos que concorriam na formao dos indivduos e dos povos como entidades unvocas e Humboldt, ao contrrio dos disciplinadores filantropistas e dos filsofos da Aufkrung, compreendia que estes aspectos incluam, positivamente, tambm a sensibilidade, as manifestaes passionais e as inclinaes de gosto, assim como o ensino deveria incluir a poesia, a msica, a retrica:

O conjunto do aspecto, sentimento e mentalidade interiores [inneren Erscheinung, Empfindung und Gesinnung], ligado ao que se irradia para fora dele, deve deixar perceber que ele , atravessado pela influncia daquelas aspiraes individuais alargadas, revela a completa natureza humana na forma [Gestalt] mais ampliada (Humboldt, 2006a, pp.240-242).Em uma Alemanha que se ressentia profundamente de sua situao poltica catica, onde o presente, dominado pela figura estrangeira e incmoda de Napoleo, parecia confirmar o infeliz destino que havia marcado seu passado mais recente, no difcil compreender a repercusso das formulaes de Humboldt. A idia de uma harmonia que emerge de dentro do esprito e que sintetiza a cultura do povo, ao mesmo tempo em que constitui a prpria natureza dos indivduos, se apresenta extremamente atraente para um proto-nacionalismo que comea a dar sinais enfticos de vida e que teria um prolongamento trgico no sculo seguinte. Bibliografia:ALBISETTI, J. C., Secondary school reform in imperial Germany, New Jersey: Princeton University Press, 1983.ANDERSON, B., Comunidades imaginadas, So Paulo: Companhia das Letras, 2008.

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Sobre a fragmentao cultural e poltica da Alemanha nos sculos XVIII e XIX, uma copiosa bibliografia j foi publicada e a pesquisa encontra-se em estado bastante avanado. A ttulo introdutrio, ainda considero o texto de Norbert Elias, Os alemes, como uma referncia fundamental nestes estudos de carter mais sociolgico, ainda que no concorde com muitas de suas premissas metodolgicas. Cf. Elias, 1997, especialmente pp. 119-128.

Deve-se considerar, no entanto, o destino desta trplice determinao: a unio linguagem-educao-poltica foi apropriada, desde as ltimas dcadas do sculo XIX, por um crescente nacionalismo militarista, que culminou, em ltima anlise, na ideologia nacional-socialista do Deutschland ber alles e no projeto pedaggico-poltico de formao da juventude hitlerista. Embora o carter militarista tenha levado a Alemanha a uma direo muito especfica, a emergncia do nacionalismo a partir desta trplice determinao no um esquema exclusivamente germnico. Benedict Anderson mostrou como a ntima ligao entre cnones lingsticos, projetos pblicos de educao especialmente reformas nas universidades e polticas de renovao administrativa favoreceram o surgimento de outros tipos de ideologias nacionais ao longo dos sculos XVIII e XIX (Cf. Anderson, 2008, especialmente o captulo 4, Velhas lnguas, novos modelos, pp. 107-126).

O afastamento de Humboldt da vida pblica parece ter uma ligao mais clara com o falecimento de sua esposa em 1829 (Cf. a cronologia de Berglar, 1970, pp. 158-161). Sobre a polmica ideologia poltica de Metternich, cf. Sked, 2008, pp. 19-53.

Chester Parker j relativizava o sucesso do modelo de Basedow, mostrando que muitos se apropriaram deliberadamente da idia do Philantropinum em instituies que, de fato, no obedeciam aos seus princpios. Cf. Parker, 1912, pp. 216-218. Outras preciosas informaes sobre o Philantropismus, podem ser obtidas no antigo, mas til trabalho de Robert H. Quick, (Quick, 1896, especialmente pp. 273-289).

Campe propunha que as universidades fossem incorporadas s Hochschulen, escolas secundrias de ensino tcnico. Cf. Turner, 1983, p. 454.

Com isso, uma srie extensa de medidas reguladoras foi, entre 1809 e 1817, principalmente, instaurada nas instituies de ensino: procedimentos de qualificao, como o Abitur, exame que, ainda hoje, garante, na Alemanha, a entrada no ensino superior, e a Habilitation, que permitia o exerccio do professorado, assim como outros atestados de expertise profissional, alm do estebelecimento de um currculo mnimo obrigatrio, a definio dos tipos especficos de escola, do nmeros de alunos por sala, das condies de alojamento e de matrcula para estes mesmos alunos, fizeram surgir um conjunto de documentos oficiais que vieram a constituir a face mais bvia da reforma. Cf. Albisetti, 1983, p. 21-24. importante ressaltar que Albisetti, a meu ver, com razo, relativiza o sucesso da implementao destes mtodos de mensurao burocrtica.