ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO · numa relação permanente de subordinação e de...
Transcript of ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO · numa relação permanente de subordinação e de...
O QUE VOCÊ PRECISA SABER SOBRE O
ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO
CLÁUDIO ROBERTO CARNEIRO DE CASTROPós-graduado (lato sensu) em Direito do Trabalho pelas Universidades de Lisboa (UL) e
Católica Portuguesa (UCP); Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade Católica Portuguesa (UCP) — título revalidado no Brasil pela Universidade de São Paulo (USP); Coordenador didático em cursos jurídicos
e palestrante nos Tribunais Regionais do Trabalho; Ex-assistente de Desembargadores do TRT da 1ª Região;Juiz Federal do Trabalho da 3ª Região-titular.
O QUE VOCÊ PRECISA SABER SOBRE O
ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO
2ª edição
EDITORA LTDA.
© Todos os direitos reservados
Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.br
Abril, 2014
Produção Gráfica e Editoração Eletrônica: GRAPHIEN DIAGRAMAÇÃO E ARTEProjeto de Capa: FABIO GIGLIOImpressão: COMETA GRÁFICA
Contatos com o autor: [email protected] www.assediomoral.com.br
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Castro, Cláudio Roberto Carneiro de
O que você precisa saber sobre o assédio moral nas relações de emprego / Cláudio Roberto Carneiro de Castro. — 2. ed. — São Paulo : LTr, 2014.
Bibliografia.
1. Ambiente de trabalho 2. Assédio moral 3. Dano moral 4. Medicina do trabalho 5. Direito do trabalho I. Título.
14-01146 CDU-34:331.101.37
Índices para catálogo sistemático:
1. Ambiente de trabalho : Assédio moral :Direito do trabalho 34:331.101.37
2. Assédio moral : Ambiente do trabalho :Direito do trabalho 34:331.101.37
Versão impressa - LTr 5015.2 - ISBN 978-85-361-2907-5Versão digital - LTr 7812.6 - ISBN 978-85-361-3026-2
O homem que trabalha tem direitos, como pessoa, como cidadão e como trabalhador, direitos que — condicionados embora pela implicação pessoal
numa relação permanente de subordinação e de intercâmbio — haverão de ser reconhecidos num plano de concordância prática.
Bernardo da Gama Lobo Xavier
— 7 —
SUMÁRIO
NotA À SEguNDA EDIÇÃo .................................................................... 15
INtRoDuÇÃo .............................................................................................. 17
1. O MOBBING ........................................................................................... 191.1. Breve relato histórico sobre a origem da palavra mobbing e os
primeiros estudos a seu respeito .................................................. 191.2. Quando surgiu o mobbing no local de trabalho? .......................... 21
2. DISTINÇÃO ENTRE ASSÉDIO MORAL LABORAL E FIGURAS AFINS 232.1. O assédio moral visto como gênero do qual são espécies o assé-
dio discriminatório e o assédio sexual ......................................... 232.2. Existem outras espécies do assédio moral? .................................. 252.3. Abuso de prerrogativas inerentes à hierarquia ............................. 262.4. Estresse ......................................................................................... 27
2.4.1. Aspectos sanitários do estresse ....................................... 272.4.2. Aspectos jurídicos: o estresse e o assédio moral ............ 29
2.5. Conflito ........................................................................................ 292.5.1. Enfoque extrajurídico ..................................................... 292.5.2. Enfoque jurídico ............................................................. 30
3. PROPOSTA DE ATRIBUIÇÃO DO MESMO SIGNIFICADO ÀS VÁRIAS DENOMINAÇÕES COMUMENTE ADOTADAS PARA DESIGNAR O FENôMENO DO ASSÉDIO MORAL LABORAL ................................... 323.1. Mobbing ........................................................................................ 333.2. Assédio moral ou acoso moral ..................................................... 343.3. Bullying ......................................................................................... 353.4. Harassement .................................................................................. 363.5. Ijime .............................................................................................. 363.6. Defesa da postura flexível ............................................................. 37
— 8 —
4. DADOS ESTATÍSTICOS, CUSTOS E PROVÁVEIS CAUSAS DO MOBBING NO LOCAL DE TRABALHO .................................................................. 384.1. Dados estatísticos e custos ........................................................... 384.2. Prováveis causas ........................................................................... 40
5. AGENTES RELEVANTES DO ASSÉDIO MORAL LABORAL ................ 445.1. Agentes causadores ....................................................................... 44
5.1.1. “Perfil” do assediador ..................................................... 445.1.1.1 Abordagem extrajurídica ................................. 445.1.1.2 Irrelevância do perfil do causador do AML sob
o ponto de vista judicial ou do Direito ............ 465.1.2. AML efetuado por um indivíduo ou por vários indivíduos 475.1.3. AML efetuado por terceiro estranho à hierarquia empre-
sarial ............................................................................... 475.1.3.1 Ordenamento jurídico brasileiro ..................... 475.1.3.2 Ordenamento jurídico português .................... 475.1.3.3 Ordenamento jurídico espanhol ...................... 485.1.3.4 Ordenamento jurídico belga ............................ 49
5.2. Vítimas ......................................................................................... 495.2.1. “Perfil” da vítima ............................................................ 49
5.2.1.1 Abordagem extrajurídica ................................. 495.2.2. AML efetuado contra uma ou várias vítimas .................. 51
5.2.2.1 Contexto do ordenamento jurídico brasileiro . 515.2.2.2 Contexto do ordenamento jurídico português 52
6. PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES DO ASSÉDIO MORAL LABORAL ..... 536.1. Conforme o grau hierárquico dos agentes que protagonizam o
AML .............................................................................................. 536.1.1. AML “vertical descendente” ........................................... 53
6.1.1.1 Características ................................................. 536.1.1.2 Motivação ........................................................ 556.1.1.3 Jurisprudência ................................................. 55
6.1.2. AML “vertical ascendente” ............................................. 566.1.2.1 Características ................................................. 566.1.2.2 Motivação ........................................................ 57
6.1.3. AML “horizontal” ........................................................... 576.1.3.1 Características ................................................. 576.1.3.2 Motivação ........................................................ 58
6.1.4. AML “misto” (“vertical e horizontal”) ........................... 596.1.4.1 Características ................................................. 596.1.4.2 Jurisprudência ................................................. 59
6.2. Outras classificações ..................................................................... 606.2.1. Classificação que se faz em razão do grau do dano pes-
soal da vítima.................................................................. 60
— 9 —
6.2.2. Classificação que se faz a partir da motivação da conduta 606.2.3. Figuras apontadas como espécies do assédio moral ....... 61
7. CONDUTAS E FASES DO ASSÉDIO MORAL LABORAL ...................... 627.1. Condutas ...................................................................................... 62
7.1.1. Condutas na ótica da doutrina ....................................... 627.1.2. Condutas na ótica da legislação ..................................... 647.1.3. Condutas na ótica da jurisprudência .............................. 64
7.2. Fases ............................................................................................. 667.3. Mobbing decorrente de conduta simulada ou falso mobbing ........ 68
8. MOBBING: AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS E A UNIÃO EUROPEIA ............................................................................................. 708.1. Organizações Internacionais do Trabalho .................................... 70
8.1.1. Organização Internacional do Trabalho (OIT) ............... 708.1.2. Organização Mundial de Saúde (OMS) .......................... 73
8.2. União Europeia ............................................................................. 73
9. O ASSÉDIO MORAL LABORAL E O TRATAMENTO JURÍDICO DA SAÚDE DO TRABALHADOR NO BRASIL ............................................. 779.1. Proteção jurídica à saúde física e mental do trabalhador ............. 779.2. Danos causados à saúde do trabalhador pelo AML e o enquadra-
mento legal segundo as normas previdenciárias .......................... 799.3. O mobbing pode causar acidente do trabalho típico ou somente
acidente do trabalho por extensão ou equiparação (e.g., doença ocupacional)? A questão da estabilidade no emprego. Um olhar sobre a Lei n. 8.213/1991 ............................................................. 80
10. DISCUSSÕES EM TORNO DA COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE A SAÚDE DO TRABALHADOR NO BRASIL, DE ACORDO COM O DIREITO POSTO EM NÍVEL CONSTITUCIONAL ................. 8310.1. Problematização ........................................................................... 8310.2. A saúde do trabalhador é ou não matéria regulada pela legislação
do trabalho segundo o direito posto no Brasil? É apenas da União a competência legislativa e fiscalizatória quanto aos aspectos sanitários do mobbing? Ou também dos Estados e Municípios? .. 84
11. FONTES HETERôNOMAS E AUTôNOMAS SOBRE O ASSÉDIO MORAL LABORAL ................................................................................. 8811.1. Fontes heterônomas ..................................................................... 88
11.1.1. Inexistência de legislação brasileira específica para carac-terizar e sancionar as práticas assediantes nas relações de emprego privadas............................................................. 88
11.1.2. Leis federais que fazem remissão ao AML ...................... 8811.1.3. Projetos de lei federais .................................................... 89
— 10 —
11.1.4. Leis estaduais (restritas ao âmbito da Administração Pú-blica) ............................................................................... 89
11.1.5. Leis municipais (restritas ao âmbito da Administração Pública) .......................................................................... 90
11.2. Normas autônomas (acordos e convenções coletivas de trabalho) 91
12. O ASSÉDIO MORAL COMO REPROVÁVEL CONDUTA VIOLADORA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ........................................................ 9512.1. O mobbing fere os direitos fundamentais ...................................... 9512.2. Terminologias adotadas para designar os direitos fundamentais . 9612.3. Alguns direitos fundamentais sempre invocados como tutela em
face do mobbing: cidadania, dignidade do ser humano e valores sociais do trabalho (princípios imutáveis e cláusulas pétreas na Constituição brasileira de 1988) .................................................. 98
12.4. Dirigismo contratual e proteção legal da parte contratualmente mais fraca ..................................................................................... 99
12.5. Direito do Trabalho visto como direito de proteção jurídica ao trabalhador, o que deve ser fielmente observando pela Justiça do Trabalho ao julgar demandas sobre o mobbing ............................. 101
12.6. Subordinação jurídica do trabalhador como perigo iminente aos direitos fundamentais. É a propósito desta situação de inferiori-dade jurídica que se constata estatisticamente o maior número de casos de mobbing, denominados “verticais descedentes” ........ 103
12.7. Cidadania na empresa: compreendida como direitos fundamentais não especificamente laborais ........................................................ 106
12.8. Eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre particulares 10712.9. Eficácia direta ou imediata dos direitos fundamentais nas rela-
ções trabalhistas ........................................................................... 109
13. A LESÃO MORAL É UM DOS VÁRIOS REQUISITOS INTEGRANTES DA CONCEITUAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL. SEM DANO MORAL À PESSOA, NÃO HÁ MOBBING. Relevante, pois, o estudo da evolução do reconhecimento e abrangência do dano moral no Brasil .................. 11113.1. Há verdadeira mixórdia na jurisprudência ao considerar que o
assédio moral é espécie do gênero dano moral ............................ 11113.2. Problemática da denominação: dano moral, dano não patrimo-
nial ou dano à pessoa ................................................................... 11413.3. Evolução do reconhecimento e abrangência do dano moral no
Direito brasileiro ........................................................................... 11513.3.1. Primeiro período: nega-se a reparação do dano moral ... 11513.3.2. Segundo período: indeniza-se o dano moral, desde que
repercuta no patrimônio da vítima ................................. 117
— 11 —
13.3.3. Terceiro período: indeniza-se o dano moral inflingido à pessoa física ou natural .................................................. 118
13.3.4. Quarto período: indeniza-se o dano moral perpetrado em face da pessoa física/natural ou da pessoa jurídica/pessoa coletiva ................................................................ 119
13.3.5. Quinto período: indeniza-se o dano moral coletivo ....... 12013.4. Dano moral como lesão a determinada categoria de direitos: os
direitos da personalidade.............................................................. 12213.5. Distinções entre os direitos da personalidade e os direitos funda-
mentais ......................................................................................... 123
14. CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL LABORAL ...................................... 12514.1. O problema da fluidez e da imprecisão do conceito do AML.
Relevância e utilidade da sua categorização jurídica .................... 12514.2. Estudo da estrutura do AML ........................................................ 127
14.2.1. Notas prévias .................................................................. 12714.2.2. Produção de dano ........................................................... 128
14.2.2.1 Abordagem clínica ......................................... 12814.2.2.2 Insuficiência da abordagem clínica na ótica
do Direito ........................................................ 12914.2.3. Dolo (ou finalidade) ....................................................... 132
14.2.3.1 Direito brasileiro ............................................ 13314.2.3.2 Direito espanhol ............................................ 13414.2.3.3 Portugal ......................................................... 13514.2.3.4 Finalidade ou efeito ....................................... 136
14.2.4. Repetição, sistematização e duração ............................... 13614.2.4.1 Brasil, Espanha e Portugal ............................. 13614.2.4.2 Colômbia e Canadá ....................................... 139
14.2.5. Contexto laboral ............................................................. 14014.2.6. Intensidade da violência ................................................. 14114.2.7. Conduta não desejada pelo ofendido ............................. 142
14.3. Nosso conceito ............................................................................. 14314.4. Conceito do AML na legislação .................................................... 144
14.4.1. Conceito nas legislações ao redor do mundo: Bélgica, Colômbia, Cabo Verde, Espanha, França, Irlanda, Por-tugal, Reino Unido e Suécia ........................................... 144
14.4.2. Conceito do AML na legislação brasileira ...................... 146
14.5. Conceito do AML na jurisprudência brasileira ............................ 146
15. ASSÉDIO MORAL LABORAL E CONSEQUÊNCIAS CIVIS: A RES-PONSABILIDADE CIVIL ....................................................................... 14815.1. Pressupostos da responsabilidade civil ......................................... 148
— 12 —
15.2. Modalidades: reparação civil in natura e reparação civil em pecúnia. Qual o modo de reparação do dano adveniente do assédio moral? ........................................................................................... 14915.2.1. Princípio norteador do direito: preferência à reparação
in natura.......................................................................... 14915.2.2. Dificuldade de se reparar in natura o dano moral .......... 15015.2.3. Reparação/compensação ................................................. 150
15.3. Possibilidade de cumulação de reparações patrimonial e moral, e, até, de cumulação de indenizações de duas ou mais categorias de dano moral, à luz do direito brasileiro. Indenizações cabíveis no AML ......................................................................................... 15115.3.1. Cumulação de indenizações ........................................... 15115.3.2. Indenizações cabíveis no AML ....................................... 152
15.4. Critérios para a quantificação do dano decorrente do assédio moral ............................................................................................ 15315.4.1. Quantificação ................................................................. 153
15.4.1.1 Sistema tarifado ............................................. 15315.4.1.2 Sistema tarifado trabalhista ........................... 15415.4.1.3 Sistema aberto ................................................ 155
15.4.2. Ao quantificar a indenização, deve-se levar em conta o escopo de punir o ofensor? Polêmicas em torno da inde-nização punitiva. Dupla função da indenização do dano moral (e, por extensão, do dano moral provocado pelo mobbing) ......................................................................... 158
15.5. A questão da compatibilidade de indenizações por assédio moral e a indenização taxada por resolução do contrato de trabalho: um problema enfrentado na Espanha e em Portugal ................... 15915.5.1. Espanha .......................................................................... 15915.5.2. Portugal .......................................................................... 160
15.6. Quanto ao fato gerador, a responsabilidade civil decorrente do assédio moral enquadra-se como contratual ou extracontratual? 16215.6.1. A responsabilidade civil do empregador em relação ao
empregado e vice-versa é contratual .............................. 16215.6.2. A responsabilidade civil do terceiro perante o empre-
gado que é vítima do mobbing é extracontratual e vice--versa .............................................................................. 16415.6.2.1 Responsabilidade civil extracontratual do
terceiro perante o empregado vítima do mob- bing e vice-versa ............................................. 16415.6.2.2 Responsabilidade civil extracontratual
do empregador perante o terceiro vítima do mobbing, se entre ambos não havia relação
jurídica preexistente ...................................... 165
— 13 —
15.7. Responsabilidade quanto ao fundamento: subjetiva e objetiva .... 16515.7.1. Introdução ...................................................................... 16515.7.2. Não há no direito brasileiro responsabilidade civil
decorrente dos danos provocados por mobbing sem a demonstração da culpa ou dolo do autor material, apesar do avanço da teoria objetivista ............................ 166
15.7.3. Decantação da responsabilidade civil objetiva do em-pregador diante do trabalhador vitimado em razão do mobbing provocado por terceiros representantes ime-diatos da empresa ou prepostos/empregados ................. 16715.7.3.1. Breves comentários a respeito da esfera de risco
do empregador ................................................ 16715.7.3.2. Responsabilidade civil objetiva do empregador
pelo mobbing efetuado por representantes imediatos da empresa ..................................... 169
15.7.3.3. Responsabilidade civil objetiva do empregador pelo mobbing efetuado por seus prepostos ou empregados ..................................................... 170
15.7.4. Responsabilização civil subjetiva do empregador pelo mobbing de terceiros não vinculados formalmente à hie-rarquia da empresa ......................................................... 171
15.8. Responsabilidade civil e AML nas fases pré-contratual e pós-con-tratual ........................................................................................... 171
15.9. Seguro de responsabilidade civil por práticas trabalhistas indevidas, incluindo o mobbing ..................................................................... 174
16. ASSÉDIO MORAL LABORAL E CONSEQUÊNCIAS NO CONTRATO DE EMPREGO ........................................................................................ 17516.1. AML e interrupção do contrato de emprego ................................ 17616.2. AML e extinção do contrato de emprego ..................................... 177
16.2.1. Rescisão indireta do contrato de emprego por justa causa do empregador ................................................................ 177
16.2.2. Demissão por justa causa do empregado ........................ 182
17. ASSÉDIO MORAL LABORAL E CONSEQUÊNCIAS PENAIS ............... 18517.1. Projetos de lei ............................................................................... 18517.2. Figuras penais já existentes relacionadas ao assédio moral ......... 187
18. POLÊMICAS QUE O ASSÉDIO MORAL LABORAL SUSCITA EM TERMOS PRESCRICIONAIS ................................................................................. 189
18.1. O prazo de prescrição da pretensão do trabalhador de reparação decorrente do AML é o previsto no art. 7º, XXIX, da Constituição ou no art. 206, V, § 3º, do Código Civil? ...................................... 189
— 14 —
18.2. O problema da fixação do termo inicial da contagem do prazo prescricional da pretensão judicial de natureza trabalhista rela-cionada ao mobbing ...................................................................... 191
19. TUTELA JUDICIAL DO ASSÉDIO MORAL LABORAL ......................... 19419.1. Petição inicial ............................................................................... 195
19.1.1. Os fatos ........................................................................... 19519.1.2. O Direito ......................................................................... 196
19.1.2.1 Questões processuais ..................................... 19619.1.2.2 Questões de direito material .......................... 197
19.1.3. O pedido ......................................................................... 19919.1.3.1 Julgamento extra petita ................................ 19919.1.3.2 Valor do pedido (e da causa) ......................... 199
19.2. Postura da defesa .......................................................................... 20019.3. Provas ........................................................................................... 201
19.3.1. Exige-se a prova judicial indiciária do quadro fático do AML? Ou bastam meras alegações do autor na petição inicial? É da vítima o ônus da prova dos fatos constitu-tivos do mobbing? ........................................................... 20119.3.1.1 Direito brasileiro ............................................ 20119.3.1.2 Direito francês ............................................... 20319.3.1.3 Direito espanhol ............................................ 203
19.3.2. Inversão do ônus da prova ............................................. 20419.3.2.1 Direito brasileiro ............................................ 20419.3.2.2 Direito comparado português ........................ 206
20. PRINCIPAIS CONCLUSÕES JURÍDICAS .............................................. 210
REFERÊNCIAS BIBlIogRáFICAS .............................................................. 223
ANExo .......................................................................................................... 239
— 15 —
NOTA À SEGUNDA EDIÇÃO
O tema “Assédio moral” é de desenvolvimento recente na literatura jurídica, revestindo-se, ainda hoje, de evidente atualidade doutrinária e jurisprudencial, o que me leva a apresentar esta nova edição com o mesmo entusiasmo da primeira edição.
A conscientização sobre o mobbing laboral como atentado aos direitos fun-damentais do trabalhador tem provocado a reação de atores coletivos e a eclosão de normas autônomas privadas produzidas em convenções e acordos coletivos de trabalho, inclusive com a previsão de mecanismos de prevenção à malsinada con-duta. Destarte, esta nova edição contém um item sobre tais normas decorrentes de fontes extraestatais, que são cuidadas em novo tópico, 11.2.
Apesar de não ter havido avanço legislativo significativo, nesta edição criei um anexo referente aos projetos de leis federais sobre o assédio moral laboral, em ordem cronológica, com menção às respectivas justificativas apresentadas pelos congressistas, para que o leitor possa se familiarizar com o tratamento que vem sendo dado à questão no Congresso Nacional.
No mais, sem a pretensão de esgotar o tema, o conteúdo do livro continua o mesmo.
Não poderia encerrar esta nota sem deixar de agradecer às manifestações de apreço e apoio dos leitores da primeira edição deste livro, que me tocaram profun-damente. Para facilitar o contato e o intercâmbio de informações, forneço meus contatos: e-mail: [email protected] ou através do sítio <http://www.assediomoral.com.br>.
— 17 —
INTRODUÇÃO
O Direito do Trabalho, geneticamente de forte feição protecionista do tra-balhador, teve como primeira e mais importante tarefa limitar os inconvenientes resultantes da dependência jurídica (e, porventura, econômica) do laborista ao dador de trabalho.
É, ainda, admitindo essa situação débil do trabalhador, que o coloca nomea-damente em condições imperfeitas de desenvolvimento da personsalidade, que atualmente o Direito do Trabalho tem como um dos seus principais objetivos protencionistas assegurar e potenciar o princípio do respeito pela dignidade do trabalhador.
O princípio da dignidade está expressso na Constituição (art. 1º, III), segundo a qual a República Federativa do Brasil tem como fundamento a “dignidade da pessoa humana”. Esse direito ao trato digno é genericamente atribuído a qualquer cidadão. Não é um direito constitucional e fundamental especificamente de corte laboral. Hoje há uma atenção antropocêntrica e crescente à chamada “cidadania na empresa”, significando que um contrato de trabalho não implica, de modo algum, a privação de direitos do trabalhador, ou seja, como se costuma dizer no jargão figurado juslaboral, o trabalhador não perde a cidadania quando atravessa os portões da fábrica.
Por ser mais uma faceta da aludida importância exponencial que hoje se atribui aos direitos fundamentais, à tutela da personalidade e também à cidadania na empresa, o mobbing laboral tem despertado atenção mundial no marco laboral.
O assédio moral, tal qual o assédio sexual, apresenta-se como um assunto que, neste momento, em todo o mundo, é manchete nos jornais impressos e nas capas de revistas, além de estar em artigos na internet e de ser tema de programas de televisão e de filmes. Enfim, está na pauta do dia em todos os meios de comunicação e é um fenômeno, ao menos no Brasil, bem conhecido pelos protagonistas das relações de trabalho, além de ser bastante discutido nos tribunais trabalhistas.
O fenômeno do assédio moral que se cuidará nesta obra é concebido pelo autor Cláudio Castro como a conduta de violência moral intensa praticada por
— 18 —
um agente (ou mais), em regra, o empregador ou superior hierárquico (assédio moral “vertical descendente”); porém, pode ser efetuada por subordinado (assé-dio moral “ascendente”), por colega de trabalho (assédio moral “horizontal”) ou por terceiro não vinculado à hierarquia empresarial. Os atos ofensivos devem ser dolosos ou simplesmente ter por efeito provocar um dano, não desejado, à dignidade ou integridade moral de uma ou de muitas vítimas no trabalho e ocorrem por meio de uma série de ações — em que cada uma das quais aparece isoladamente como lícita ou ilícita, embora na realidade seja simples fração da atuação total — unidas entre si pela sistematização das circunstâncias que se repetem durante um período (normalmente de duração longa, lenta e gradual), que, no conjunto, constituem por ficção, fato unitário e unidade jurídica, para todos os efeitos de Direito.
— 19 —
1O Mobbing
1.1 Breve reLato histórico soBre a oriGem da paLavra moBBINg e os primeiros estudos a seu respeito
Do que se historiará a seguir, será possível perceber que, à medida que os estudos foram avançando ao longo do tempo, a definição de mobbing foi sendo alargada: eis que primariamente a palavra foi utilizada para descrever certos com-portamentos entre bichos; hoje em dia, o correlato estudo do mobbing no gênero humano comporta múltiplas facetas, designadamente: “mobbing laboral”, “mobbing escolar”, “mobbing familiar”, “mobbing imobiliário”(1) etc., todos tendo como característica comum a intimidação moral.
O mobbing é um fenômeno que se dá em coletividades e até o momento é o assédio moral na coletividade laboral que vem ensejando quantitativamente mais jurisprudência nos tribunais.
Mas o mobbing não se limita ao entorno laboral, frise-se. Apenas por questão metodológica de delimitação temática do presente livro, restringe-se aqui à análise do “mobbing laboral” nas relações de emprego privadas.
A palavra mobbing deriva originalmente da etologia (ciência que estuda os hábitos dos animais e da sua acomodação às condições do ambiente).(2) Ini-cialmente, a palavra mobbing é empregada para “descrever comportamentos de bandos ou manadas que, frequentemente, cercam e hostilizam um dos seus
(1) Há registro de um caso de “mobbing imobiliário” produzido na Espanha. Um empresário alugou a uma família seu andar em um edifício pelo preço de um euro ao mês. A condição acrescentada era que acossassem os vizinhos, já que o empresário pretendia comprar todos os andares, coisa que os confinantes não queriam.
(2) FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio eletrônico séc. XXI. Versão 3.0. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
— 20 —
membros, de modo a expulsá-lo do seio do grupo”. A palavra, na gênese, designa um fenômeno coletivo.(3)
Neste contexto etológico, assinalam Liliana Andolpho Magalhães Guimarães e Adriana Odalia Rimoli que se pode definir o comportamento do mobbing como “ataque coletivo” visando a um alvo considerado perigoso, por exemplo, um pre-dador. Ressaltam que esse “ataque” envolve vários indivíduos, da mesma espécie ou de espécies diferentes, que tentam confundir o intruso com muitas vocalizações e ameaças a distância, afligindo o visado com ataques sucessivos, apenas ocasio-nalmente podendo ocorrer contato físico. As autoras afirmam, outrossim, que o mobbing pode, em certas circunstâncias, ser considerado “adaptativo”, já que há possibilidade de trazer “consequências positivas” para seus atores, nomeadamente, a prole contra predadores.(4)
O conceito de mobbing, provavelmente, foi proposto pela primeira vez pelo etólogo Konrad Lorenz, em 1963, em sua obra Sobre la agressión: el pretendido mal.(5)
Mais à frente, já na década de 1970, o médico sueco Peter Paul Heinemann tomou emprestado da etologia a denominação mobbing para descrever a atitude hostil de um grupo de crianças na escola em direção (na maioria dos casos) a uma única criança.(6)
Foi somente a partir de 1980 que essa denominação mobbing passou a ser em-pregada para se referir a situações no âmbito laboral, por Heinz Leymann, doutor em psicologia do trabalho, alemão, radicado na Suécia, onde assumiu uma cadeira na Universidade de Estolcomo, dedicando-se à pesquisa sobre ambiente laboral e
(3) GOMES, Júlio Manuel Vieira. Direito do trabalho. Relações individuais de trabalho. Coimbra: Coimbra, 2007. v. I, p. 426-427.
(4) GUIMARÃES, Liliana Andolpho Magalhães; RIMOLI, Adriana Odalia. Uma síndrome psicossocial multidimensional. Universidade Católica Dom Bosco. Revista Psicologia: teoria e pesquisa, Brasília, v. 22, n. 2, maio/ago. 2006. p. 183-192. Ainda sobre as consequências positivas ou negativas do mobbing, as autoras aduzem: “Apesar do comportamento de mobbing estar fortemente relacionado, principal-mente nas aves, à estação reprodutiva, indicando sua importância para a defesa dos ovos e dos filhotes recém-nascidos, outros benefícios deste comportamento foram sugeridos: avisar os indivíduos (da mesma espécie ou não) da presença de um predador, familiarizar os jovens e ensiná-los a identidade, o comportamento e a localização de seus possíveis inimigos e se ‘autopromover’, mostrando a sua coragem, seu bom estado de saúde e suas capacidades reprodutivas. O comportamento de mobbing tem sido considerado parcialmente aprendido e parcialmente ‘instintivo’. Estudos comparando várias populações da mesma espécie e espécies diferentes ocupando habitats semelhantes indicam que as condições ecológicas do ambiente podem afetar a existência e as características do mobbing. [...] Não obstante, os indivíduos ao atacarem um predador estão sujeitos a serem predados ou sofrerem algum tipo de ferimento ou mesmo gastarem tempo e energia que poderiam ser utilizados em outras atividades. Assim, para ser considerado um comportamento adaptativo, deve haver um benefício mínimo (ganho em aptidão) que exceda seus custos (perda de aptidão)”.
(5) LORENZ, Konrad. Sobre la agresión: el pretendido mal. 2. ed. Madrid: Siglo XXI, 1963. p. 34 e ss.
(6) Cfr. PACHECO, Mago Graciano de Rocha. O assédio moral no trabalho — o elo mais fraco. Coimbra: Almedina, 2007. p. 167.
— 21 —
sanitário do trabalho, vindo então a ser considerado por muitos estudiosos como o “pai do mobbing”. Quanto a suas obras, Maria Ester de Freitas, Roberto Heloani e Margarida Barreto narram que ao longo da década de 1980 as pesquisas de Leymann foram amplamente divulgadas no meio acadêmico. Em 1993, ele lançou o livro em que utilizou os termos em inglês mobbing e psicoterror (terror psicológico), no ambiente de trabalho, e a saúde psíquica. Leymann faleceu em 1999.(7)
Ainda no domínio dos exordiais estudos do mobbing laboral, a psicanalista e vitimóloga francesa Marie-France Hirigoyen lançou, em 1998, na França, o livro Harcèlement moral: démêler le vrai du faux (Paris: Editions Syros), que se tornou rapidamente um best-seller e ensejou debates na sociedade (universidades, sindi-cados, empresas etc.).(8)
No mesmo ano (1998), também na França, foi lançado o livro do psicanalista e professor Christophe Dejours, Soufrance en France: la banalisation de l’injustice sociale, obra que analisa os efeitos da organização do trabalho na saúde mental dos trabalhadores.(9)
E como se verá na lista de citação bibliográfica deste livro, atualmente, já exis-tem inúmeras obras jurídicas sobre esse tema, tão desconhecido até pouquíssimo tempo atrás.
1.2 Quando surGiu o moBBINg no LocaL de traBaLho?
O assédio moral é um fenômeno antigo, porque a violência moral no trabalho sempre existiu. Mas só recentemente, sobretudo a partir da década de 1980, é que se identificou o problema. Concederam-se palavras às vítimas e passou-se a tratar o fenômeno como um problema laboral específico.
A doutrina identifica frequentemente o surgimento do assédio moral com o próprio trabalho. Mas seria esta afirmação verdadeira? Acredita-se que não, se for tomado como exemplo o período da escravidão na sociedade pré-industrial, que fez do trabalhador simplesmente uma coisa, sem possibilidade sequer de equiparar-se a sujeito de direito. Considerando que o Direito do Trabalho nasce com a sociedade industrial e com o trabalho assalariado e que só então os trabalhadores são vistos como portadores de valores e de direitos, pode-se entender que o mobbing surgiu apenas depois do nascimento deste ramo especializado.
E mais além: deve-se sublinhar que somente no fim do século passado a juris-prudência brasileira passou a compensar a vítima da lesão moral.
(7) FREITAS, Maria Ester; HELOANI, Roberto; BARRETO, Margarida. Assédio moral no trabalho. São Paulo: Cegage Learning Edições, 2008. p. 18-21.
(8) No Brasil existem dois livros da autora, traduzidos por Maria Helena Kuhner: Assédio moral: a violência perversa no cotidiano (6. ed., 2003) e Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral (2002), ambos da editora Bertrand Brasil (Rio de Janeiro).
(9) Cfr. FREITAS; HELOANI; BARRETO. Assédio moral no trabalho. p. 23.
— 22 —
Luis José Escudero Alonso raciocina que se até o surgimento do Direito do Trabalho existia total liberdade para as empresas se livrarem dos trabalhadores, competindo a estas organizarem-se para cobrir as suas necessidades (confrarias, grêmios etc.), o AML só se origina quando passa a ser proibido, na medida em que o seu objetivo é expulsar o trabalhador do posto de trabalho.(10) Critica-se, ao menos em parte, a assertiva, pois nem sempre o mobbing tem como propósito a exclusão do trabalhador do ambiente laboral, tal como se demonstra no tópico 14.2.3.4.
Na realidade, se o mobbing, da mesma forma que o dano moral, como se verá no tópico 13.4, tem como referência uma categoria especial de direito, que é o direito da personalidade, e se o escravo era objeto de direito, e não sujeito de direito, então não havia o assédio moral. Pelo menos tal qual o identificamos hoje.
Dito isso, objurga-se, pois, a doutrina jurídica de Fernando Antonio Marques Júnior quando aduz que o assédio moral “iniciou-se na escravidão, quando o escravo era apenas um bem de propriedade de seu senhor, sujeitando-se a todo o tipo de humilhação, tanto física quanto psicológica”.(11)
(10) ALONSO, Luis José Escudero. El acoso moral en el trabajo — ¿una nueva forma de discriminación? Revista de Derecho Social, Albacete, Bomarzo, 1998. p. 69-70.
(11) MARQUES JÚNIOR, Fernando Antonio. Assédio moral no ambiente de trabalho. Questões socio-jurídicas. São Paulo: LTr, 2009. p. 11.