Astreria. Passando por Vaticunia

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Os dias naquela cidade sempre carregavam um ar de cansaço. Todos corriam para trabalhar, alguns simplesmente para manterem o emprego, mas todos gri tar iam em uníssono o tamanho de sua preguiça em se levant ar . Deixando a manhã mais cansativa do que o fm da tarde. Era um sistema inverso ao normal. am trabalhar cansados, aos poucos ganhavam !orças e por fm, saiam tão animados qu e ia para al gum bar beber ou pr ostibulo comemorar. "ada que manchasse a imagem dos homens ou mulheres que se entr egavam a esses dese#os, era uma atividade tão comum que se um amigo gritasse para seu colega do outro alto da rua que iria $!oder umas putas da %asconcelo&, os que escutassem, homens ou mulheres, correriam a chance de pensarem $eu tamb'm&. "ada era mais alegre do que a noite daquela cidades. (s lu)es dos bordeis piscavam cintilantes e as m*sicas que saiam das boates ao abrir de porta continuou poderia iniciar uma pequena dança de casais no meio da rua.  T ão libertinos e tão $saud+veis& são os seus habitantes que mal percebem o voou continuo de aves de !ogo sobre si. "ão eram !nix, longe disso, ao inv's de criarem da morte a vi da, elas criavam na vida, a morte. E aqueles habitantes eram os seus libert+rios, sem sentir a vida esvair de seus peitos, enquanto descia vibrante para o meio de suas pernas. - existia um *nico lugar que poderia chegar perto do silencio naquelas tão agitadas noites, e este lugar era o chamado $retiro de descanso&, locali)ado na /imia a esquerda do maior e mais caro 0ordel que poderia existir. Tão cara que as putas e putos s !altavam se embebedarem em ouro, não que não tivessem tentado... Essa mesmíssima passagem não tinha nada de descanso, os descansos eram tirados nos trabalhos, a noite ' para ser curtida. E assim mos tr avam as apa ixonados que gemiam descuidadamente de den tr o dos quartos. 1areciam querer mostrar para todo mundo at' onde ia seus go)os de paixão, o quais eram con!undidos por um amor condicional de uma noite,2 quem sabe duas. 1or'm, não seria #usto generali)ar todos os seus habitantes atuais, principalmente pela chegada de um #ovem cavalheiro que trocara a armadura relu)ente por um sobretudo que ocultava o atraente rosto. -eus passos eram silenciosos, quase mais do que os de um bichano. -eus olhos ftavam a tudo, com cautela e ameaça, cada movimento das sombras ou das aves eram dignos de atenção, pois não poderia ser pego naquele lugar ne!asto. 3hegando ao fm da rua avistou o que seria o ponto de encontro combinado. 1arou por um momento diante as lu)es e acompanhou andar por andar do pr'dio amarelo com seus olhos lupinos, at' não poder mais ver os andares. Tão impossível parecia aquele lugar, que sua altura dava a impressão de tocar o infnito. Era essa a sensação que seu criador queria passar. O #ovem ftou a porta roxa e !oi abrindo devagar, preparando2se para qualquer eventual surpr esa, ou mulher es nuas que assustador amente sempre cons eguiam encantar.

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Os dias naquela cidade sempre carregavam um ar de cansaço. Todoscorriam para trabalhar, alguns simplesmente para manterem o emprego, mastodos gritariam em uníssono o tamanho de sua preguiça em se levantar.

Deixando a manhã mais cansativa do que o fm da tarde. Era um sistemainverso ao normal. am trabalhar cansados, aos poucos ganhavam !orças e porfm, saiam tão animados que ia para algum bar beber ou prostibulocomemorar. "ada que manchasse a imagem dos homens ou mulheres que seentregavam a esses dese#os, era uma atividade tão comum que se um amigogritasse para seu colega do outro alto da rua que iria $!oder umas putas da%asconcelo&, os que escutassem, homens ou mulheres, correriam a chance depensarem $eu tamb'm&.

"ada era mais alegre do que a noite daquela cidades. (s lu)es dosbordeis piscavam cintilantes e as m*sicas que saiam das boates ao abrir deporta continuou poderia iniciar uma pequena dança de casais no meio da rua. Tão libertinos e tão $saud+veis& são os seus habitantes que mal percebem ovoou continuo de aves de !ogo sobre si. "ão eram !nix, longe disso, ao inv'sde criarem da morte a vida, elas criavam na vida, a morte. E aqueleshabitantes eram os seus libert+rios, sem sentir a vida esvair de seus peitos,enquanto descia vibrante para o meio de suas pernas.

- existia um *nico lugar que poderia chegar perto do silencio naquelastão agitadas noites, e este lugar era o chamado $retiro de descanso&, locali)adona /imia a esquerda do maior e mais caro 0ordel que poderia existir. Tão cara

que as putas e putos s !altavam se embebedarem em ouro, não que nãotivessem tentado... Essa mesmíssima passagem não tinha nada de descanso,os descansos eram tirados nos trabalhos, a noite ' para ser curtida. E assimmostravam as apaixonados que gemiam descuidadamente de dentro dosquartos. 1areciam querer mostrar para todo mundo at' onde ia seus go)os depaixão, o quais eram con!undidos por um amor condicional de uma noite,2quem sabe duas.

1or'm, não seria #usto generali)ar todos os seus habitantes atuais,principalmente pela chegada de um #ovem cavalheiro que trocara a armadura

relu)ente por um sobretudo que ocultava o atraente rosto. -eus passos eramsilenciosos, quase mais do que os de um bichano. -eus olhos ftavam a tudo,com cautela e ameaça, cada movimento das sombras ou das aves eram dignosde atenção, pois não poderia ser pego naquele lugar ne!asto.

3hegando ao fm da rua avistou o que seria o ponto de encontrocombinado. 1arou por um momento diante as lu)es e acompanhou andar porandar do pr'dio amarelo com seus olhos lupinos, at' não poder mais ver osandares. Tão impossível parecia aquele lugar, que sua altura dava a impressãode tocar o infnito. Era essa a sensação que seu criador queria passar. O #ovemftou a porta roxa e !oi abrindo devagar, preparando2se para qualquer eventual

surpresa, ou mulheres nuas que assustadoramente sempre conseguiamencantar.

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2 4ual o segredo desse lugar5 6 1erguntou sem mesmo se preocupar, poiss tinha uma certe)a7 "ão se deixar ser pego.

(#eitou mais o sobretudo ao adentrar no breu do lugar. -em queestivesse com o coração preparado, !oi surpreendido por trs grandes holo!ote

direcionados para ele. 8ma mulher o dava as boas vindas nos alto2!alantes ev+rias outras seminuas iam sedutoras em sua direção. 1or um momento sesentiu um gatinho que logo seria abatido, mas como *ltimo recurso ergueu umdedo e apontou para uma mulher que estava no meio, sem conseguir v2la porcausa da lu) intensa. Os holo!ote se dispersão, revelando e incrível e enormesalão a meia lu), com as mais variadas putas e putos sentados e tendo umaconversa apaixonante com seus clientes.

O #ovem olha con!uso para todas as mulheres que se dispersavam eperguntava2se continuamente7 $4uem eu escolhi5&, temendo que !osse a maisbela dentre as outras. E isso certamente seria um suicídio não intencional.

-uavi)ou a expressão ao ver a mulher que se aproximava. Era baixa edelicada. 1ele quase tão clara quanto as !olhas de %itin que carregava nacarteira. 3abelos ondulados e castanhos beirando o ruivo. E a armadilha !atal7olhos verdes e um corpo sem muitos volumes, mas com curvas per!eitas quedeixariam qualquer um tentado a explorar cada detalhe com a palma dasmãos, ou at' com as costas da língua.

2 O que dese#a meu garanhão5 6 1erguntou a puta com tom macio e olevando em direção a uma mesa.

2 %im ver algu'm. 1recisa mesmo me acompanhar5 6 1erguntou aoretomar a compostura e lutando !ero)mente para não deixar os olhosdesli)arem mais outra ve) pelo corpo da mulher, que vestia apenas roupasintimas, coberta por um vestido transparente.

2 1reciso sim. 3ada cliente, no mínimo um acompanhante. 9egras dacasa. 6 :alou alegremente enquanto o segurava pelo braço. 6 4uem veio ver5 61erguntou com um sorriso simp+tico e baixando as argolas que escondiam orosto do rapa).

2 Don galante... 6 :alou sem muita confança se aquele nome revelaria

alguma coisa ; puta.

2 Oh, claro. 3omo não5 Tem o mesmo emblema que ele. 6 ( garota riuenquanto apontava para o peito esquerdo do #ovem. 4ue de sobressalto olhouna direção e nada viu entalhado no sobretudo.

$-eria possível5 8ma puta deste lugar pode ver tal coisa5&, perguntou2seempalidecido enquanto a acompanhava para o quarto reservado de seu velhoamigo.

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2 (qui est+ ele. O nobre Don <alante. 6 Disse com n!ase abrindo a portado quarto e adentrando sem rodeios, ou temendo pegar algu'm no ato. "ãoque o #ovem duvidasse da fdelidade do amigo para com a esposa.

(o entrar nos aposentos, logo ftou, seu conhecido com uma alta e

curvilínea mulher ruiva sentada ao colo. De !rente para uma mesa com cartasde baralho espalhadas, algumas caídas ao piso.

2 Oh... "obre5 6 1erguntou com certo desd'm, enquanto sentava2secon!ort+vel na poltrona vermelha a !rente do homem que o chamou at' ali. (prostituta que o acompanhava sentou2se em seu colo.

2 %e#o que tem bons olhos. 6 (frmou o velho amigo apontando a mulherque o rapa) escolhera. 6 8ma bela e puritana, at' o momento... 6 Ele ri #untocom a ruiva. 6 %irgem.

O #ovem lupino levantou as sobrancelhas, incr'dulo.

2 O que uma virgem est+ !a)endo em %aticunia5 6 1erguntou alto.

2 Ora... Ela precisa pagar suas contas. 6 9espondeu com um sorrisodebochado.

2 3ontas5 6 1erguntou olhando para a mulher que confrmou com umaceno. 6 /as que diabos, =orge. %oc !ala isso como se não !osse absurdo. "ãoh+ como virgens entrarem em %aticunia, por mais endividadas que !orem. 6(frmou erguendo as mãos, para enaltecer as prprias palavras.

2 %oc conseguiu entrar (ur'lio, por que ela não5 6 1erguntou com umlargo sorriso.

2 =orge... 1are de absurdos. %oc sabe o peso da loucura que est+di)endo5 6 1erguntou tentando se recompor enquanto baixava as mãos e semquerer apalpava o seio esquerdo da sua acompanhante. -eguiu sem esboçarreaç>es, fngindo não ter percebido e pousando2as sobre os braços da poltrona.

2 -ei. 6 9espondeu com um largo e empolgado sorriso. 6 ? por isso que tichamei aqui, precioso (ur'lio.

2 O que quer di)er com isso5

 =orge passa a mão por seu poucos fos de cabelo enquanto apalpava aruiva com a outra. Em seguida p>e a mão no bolso e tira uma carta selada apondo com cuidado sobre a mesa.

2 Estou di)endo que7 %amos explodir esse lugar. 6 Disse com um sorrisodiablico que pareceu, por um momento, rasgar suas bochechas gordas e deuum soco na mesa. O brasão que ardia em seu peito como um símbolo de !ogose apaga, restando apenas uma densa !umaça.

2 O que voc pensa que est+ !a)endo, =orge5 6 @evantou2se assustado,

derrubando a mulher em seu colo que estava tão atordoada com a conversaquanto a ruiva.

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2 Diga a minha mulher que eu a amo. 6 :alou com um sorriso sincero eindicou a carta para que o amigo a pegasse.

(ssim que estirou a mão, uma explosão estremeceu todo o lugar,!a)endo as putas e putos gritarem horrori)ados e as coisas do quarto caírem. (

mesa vira, mas não antes de (ur'lio segurar frme a carta. Ele olha surpresopara o peito esquerdo da puta que lhe servira de acompanhante.

2 (s duas Aechas, a da esquerda para o alto e da direita para baixo, secru)ando no alto a um Bngulo de CC graus, com uma ave de duas cabeças nocentro rodeada por um aro dourado, e uma coroa que mais se assemelhava auma !ogueira a)ul. 6 (nalisou o símbolo que relu)ia de dentro da virgem. Eleolha p+lido para =orge. 6 mpossível. 6 (frmou com um misto de assombro eraiva.

Outra explosão ocorre, dessa ve) do outro lado. (lgu'm do lado de !ora

estava decidido a derrubar o pr'dio. (ur'lio encara =orge uma *ltima ve), oamigo sorri e !a) sinal para o #ovem levar a acompanhante com ele.

(ur'lio, sem entender mais do que havia tentado, segurou a carta comuma mão e com outra puxou sem o menor cuidado a virgem, saindo correndocom toda a mente !ocada em prever onde iria acontecer a prxima explosão,que para a sua sorte !oi pouco ; !rente de onde estava, abrindo uma saídaprec+ria que ameaçava se !echar. -em pensar duas ve)es saiu por ela com amulher, e s parou de correr quando #+ estava !ora dos limites da cidade.O!egante !oi ao chão, sobre um gramado p+lido, derrubando consigo a mulherque deu um grito agudo.

2 /as que droga est+ acontecendo. 4uem diabos são vocs, e o quef)eram comigo5 6 1erguntou enraivecida enquanto olhava para o brasão noprprio peito, perdendo totalmente o aspecto meigo e submisso que seapresentara.

2 Oh... 6 O rapa) riu, quase sem conseguir por causa da respiraçãopesada. 6 %oc ainda estava ai5 6 1erguntou com um sorriso sonolento, e nomesmo instante a *ltima explosão se seguiu e o enorme edi!ício !oi desabandopara a esquerda, como uma +rvore com o tronco cerrado.

2 -e esse lugar ' mesmo infnito. Então alcançar+ o fm do mundo. 6Debochou =orge no micro!one, que ecoou pelos holo!ote de toda a cidade de%aticunia, e depois gargalhou, at' não poder mais.