Atividades Experimentais: Buscando a Construção do ... · sala de aula, no pátio da escola e na...

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1 Atividades Experimentais: Buscando a Construção do Conhecimento Sobre o Solo TURATTI, Nilza Volpato 1 MOREIRA, Ana Lúcia Olivo Rosas² RESUMO Este artigo relata os resultados do Projeto de Implementação Pedagógica realizado como conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, do Estado do Paraná no ano de 2009, com uma turma de 5ª série do Ensino Fundamental, na disciplina de Ciências do Colégio Estadual Marechal Costa e Silva, do núcleo regional de Cianorte. Seu objetivo principal foi conhecer a importância das aulas práticas no processo ensino e aprendizagem. Este trabalho busca desenvolver no aluno o conhecimento básico sobre o tema solo, realizando atividades experimentais e de campo, numa abordagem motivadora, com a consideração do conhecimento prévio do aluno com questões problematizadoras e contextualizadas. As práticas foram abordadas seguindo uma sequência de conteúdos e realizadas em grupos, como forma de socialização do conhecimento e, em diversos ambientes como na sala de aula, no pátio da escola e na zona rural, utilizando materiais alternativos para a sua execução. Embora muitas dificuldades tenham surgido no decorrer do processo, a motivação, o envolvimento, a aprendizagem de conceitos e a compreensão de fenômenos demonstrados pelos alunos, confirmam a importância dessa modalidade de ensino. Palavras-chave: Atividades experimentais. Processos ensino e aprendizagem. Atividades sobre solos. Metodologia de ensino. RESUMEN Este artigo relata los resultados del proyecto de implementación pedagógica realizado como conclusión del Programa de Desenvolvimiento Educacional – PDE, del Estado del Paraná en el año de 2009, con una pandilla de 5ª serie del Enseñanza Fundamental, en la disciplina de Ciencias del Colegio Estadual Marechal Costa y Silva, del núcleo regional de Cianorte. Su objetivo principal fue conocer la importancia de las clases prácticas en el proceso enseñanza y aprendizaje. Este trabajo busca desenvolver en el alumno el conocimiento básico sobre el tema suelo, realizando actividades experimentáis y de campo, en una abordaje motivadora, con la consideración del conocimiento previo del alumno con cuestión problematiza doras y contextualizadas. Las prácticas fueron abordadas siguiendo una secuencia de contenidos y realizadas en grupo, como forma de socialización del conocimiento y, en diversos ambientes como en la clase de aula, en el patio de la escuela y en la zona rural, utilizando materiales alternativos para su ejecución. Aunque muchas 1 Professora de Ciências da Rede Estadual de Ensino do Paraná. [email protected] ² Professora Orientadora do Projeto, Departamento de Biologia – UEM. [email protected]

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Atividades Experimentais: Buscando a Construção do Conhecimento Sobre o Solo

TURATTI, Nilza Volpato1

MOREIRA, Ana Lúcia Olivo Rosas²

RESUMOEste artigo relata os resultados do Projeto de Implementação Pedagógica realizado como conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, do Estado do Paraná no ano de 2009, com uma turma de 5ª série do Ensino Fundamental, na disciplina de Ciências do Colégio Estadual Marechal Costa e Silva, do núcleo regional de Cianorte. Seu objetivo principal foi conhecer a importância das aulas práticas no processo ensino e aprendizagem. Este trabalho busca desenvolver no aluno o conhecimento básico sobre o tema solo, realizando atividades experimentais e de campo, numa abordagem motivadora, com a consideração do conhecimento prévio do aluno com questões problematizadoras e contextualizadas. As práticas foram abordadas seguindo uma sequência de conteúdos e realizadas em grupos, como forma de socialização do conhecimento e, em diversos ambientes como na sala de aula, no pátio da escola e na zona rural, utilizando materiais alternativos para a sua execução. Embora muitas dificuldades tenham surgido no decorrer do processo, a motivação, o envolvimento, a aprendizagem de conceitos e a compreensão de fenômenos demonstrados pelos alunos, confirmam a importância dessa modalidade de ensino.

Palavras-chave: Atividades experimentais. Processos ensino e aprendizagem. Atividades sobre solos. Metodologia de ensino.

RESUMENEste artigo relata los resultados del proyecto de implementación pedagógica realizado como conclusión del Programa de Desenvolvimiento Educacional – PDE, del Estado del Paraná en el año de 2009, con una pandilla de 5ª serie del Enseñanza Fundamental, en la disciplina de Ciencias del Colegio Estadual Marechal Costa y Silva, del núcleo regional de Cianorte. Su objetivo principal fue conocer la importancia de las clases prácticas en el proceso enseñanza y aprendizaje. Este trabajo busca desenvolver en el alumno el conocimiento básico sobre el tema suelo, realizando actividades experimentáis y de campo, en una abordaje motivadora, con la consideración del conocimiento previo del alumno con cuestión problematiza doras y contextualizadas. Las prácticas fueron abordadas siguiendo una secuencia de contenidos y realizadas en grupo, como forma de socialización del conocimiento y, en diversos ambientes como en la clase de aula, en el patio de la escuela y en la zona rural, utilizando materiales alternativos para su ejecución. Aunque muchas 1 Professora de Ciências da Rede Estadual de Ensino do Paraná[email protected]² Professora Orientadora do Projeto, Departamento de Biologia – [email protected]

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dificultades tengan surgido en el decorrer del proceso, la motivación, el envolvimiento, el aprendizaje de conceptos y la comprensión de fenómenosdemostrados por los alumnos, confirman la importancia de esa modalidad de enseñanza.

Palabras-llave: Actividades experimentales. Proceso enseñanza y aprendizaje. Actividades sobre suelos. Metodología de enseñanza.

INTRODUÇÃO

O modelo atual de ensino nas nossas escolas, tem se caracterizado, muitas

vezes, por atividades pedagógicas desarticuladas e distanciadas da realidade do

educando e, principalmente, baseado na memorização das informações. Saber este,

que se torna abstrato, caracterizando um aluno como ser receptivo e passivo,

realizando tarefas sem questionamentos (BEHRENS, 2000). Este contexto favorece

que o aluno apresente dificuldades em relacionar a teoria desenvolvida na sala de

aula com a realidade a sua volta, impedindo uma aproximação mais efetiva com a

aprendizagem das Ciências. De acordo com Krasilchik (1987), para muitos alunos,

aprender Ciências, é decorar nomes, fórmulas, descrições de instrumentos ou

substâncias, enunciados de leis, resultando num processo doloroso que chega até

causar aversão.

Na interpretação de Moura e Vale (2001) o estudante recebe a ciência pronta

e acabada, ficando a dimensão investigativa eliminada do ensino e o aluno torna-se

passivo e reprodutor de um sistema cristalizado, desfavorecendo qualquer tentativa

de formar um ser crítico, pensante e atuante na sociedade.

Os professores de Ciências, assim como os de outras disciplinas, vivem no

dilema entre quantidade e qualidade de informação, que o aluno também, tem

acesso. Diante deste cenário, cabe ao professor selecionar conteúdos específicos

para o ensino de Ciências e metodologias adequadas ao desenvolvimento cognitivo

dos estudantes, para que estes se apropriem dos conhecimentos científicos de

forma mais significativa.

A inserção de atividades experimentais na prática docente apresenta-se como

uma importante estratégia de ensino e aprendizagem, quando mediada pelo

professor de forma a desenvolver o interesse nos estudantes e criar situações de

investigação para a formação de conceitos. Tais atividades não têm como único

espaço possível, o laboratório escolar, visto que podem ser realizadas em outros

espaços pedagógicos, como a sala de aula, o pátio da escola e outros ambientes

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urbanos e rurais, utilizando materiais alternativos aos convencionais. No entanto,

muitas escolas dispõem de laboratório e alguns equipamentos que, por várias

razões raramente são utilizados como, falta de recursos para aquisição e

manutenção de materiais; a grande quantidade de alunos por turma; falta de um

professor auxiliar, durante a realização de atividades práticas no laboratório, para

atender a outra metade da turma em sala de aula e falta de um laboratorista para a

preparação de materiais e limpeza dos mesmos. O laboratório não é um espaço

onde só acontecem coisas mágicas, com experimentos que provocam determinados

efeitos especiais. Ele é considerado como um recurso para estimular o aluno na

atividade prática, que segundo Gonçalves e Galiazzi (2004) apud PARANÁ (2008),

cabe ao professor aproveitar esse momento para problematizar e transcender na

direção da construção de conhecimentos mais consistentes. No entanto, o professor

deve estar atento para que a atividade prática não perca a sua essência, correndo o

risco de ser muito mais atraente do que necessariamente deveria ser ensinado

(CAMPOS; NIGRO, 1999). Entretanto, é importante que essas práticas

proporcionem discussões, interpretações e se coadunem com os conteúdos

trabalhados em sala, não sendo realizadas apenas, como comprovação de leis e

teorias, ou meras ilustrações das aulas teóricas (PARANÁ, 2008).

As atividades experimentais podem contribuir para a superação de obstáculos

na aprendizagem de conceitos científicos, não somente por propiciar interpretações,

discussões e confrontos de idéias entre os estudantes, mas também pela natureza

investigativa. Nesse sentido, utilizar atividades investigativas como ponto de partida

para desenvolver a compreensão de conceitos é uma forma de levar o aluno a

participar de seu processo de aprendizagem, sair de uma postura passiva, deixar de

ser apenas um observador de aulas, muitas vezes expositivas, passando a ter

grande influência sobre ela, precisando argumentar, pensar, agir, interferir,

questionar, fazer parte da construção de seu conhecimento. Com isso, deixa de ser

apenas um conhecedor de conteúdos, passando, também a desenvolver atitudes e

habilidades como argumentação, interpretação, análise, entre outras (CARVALHO,

2006). É importante ressaltar que, os experimentos investigativos são atividades

práticas que exigem muito do aluno durante a sua execução. Cabe ao professor

propor desafios aos alunos, ou seja, situações problemáticas com nível de

dificuldade adequado, fazendo com que estes deixem de encará-las apenas pelo

senso comum. Considerando o ensino de ciências, essas questões quando

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encaminhadas pelo método científico, possibilitam aos alunos a elaboração de

hipóteses, sua experimentação com a organização dos resultados obtidos, a

reflexão sobre o significado dos mesmos, sejam os esperados e, sobretudo, dos

inesperados. Assim, com a construção do conceito científico trabalhado, chega a

uma conclusão e aplicação em demais situações ligadas à realidade do educando.

Nestes termos, para uma atividade experimental a contextualização do

conteúdo específico de Ciências e das possíveis relações conceituais e

interdisciplinares, são importantes estarem presentes na proposta pedagógica do

professor.

O solo, por ser um tema do contexto do aluno e do currículo escolar,

apresenta uma importância significativa ao processo educativo, além de caracterizar

um problema ambiental do município de Cidade Gaúcha da região Noroeste do

Paraná, local de desenvolvimento do presente trabalho, cujo objetivo principal foi

utilizar atividades experimentais e de campo, buscando tornar o estudante um ser

mais crítico e participativo, sendo capaz de relacionar a teoria desenvolvida na sala

de aula com a realidade a sua volta.

METODOLOGIA

A importância da experimentação e investigação na sala de aula faz com que

muitas questões sejam formuladas, quanto ao modo de inseri-la, na prática docente.

É preciso restringir conteúdos e embasar com teoria para que o aluno consiga

analisar e formular suas conclusões. Para o desenvolvimento do presente trabalho,

realizado no município de Cidade Gaúcha, da região noroeste do Paraná, foi

selecionado o tema solo, conteúdo desenvolvido com uma turma de 5ª série do

Ensino Fundamental com 36 alunos durante o período de abril a junho, totalizando

30 horas/aulas.

A abordagem adotada para o desenvolvimento desse trabalho foi qualitativa,

seguindo os referenciais de Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (1999), utilizando

como instrumento de pesquisa e trabalho uma experimentoteca sobre solos,

constituída de roteiros de atividades experimentais construídos por questões

planejadas e interligadas, de maneira que favoreça a construção do conhecimento.

Foram aplicadas metodologias, de acordo com a Teoria Histórico-Cultural, cuja

apropriação de conhecimentos se dá pela interação do sujeito com o meio, além da

caracterização da zona de desenvolvimento proximal, na qual a criança não

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consegue realizar tarefas, necessitando da ajuda de adultos ou de companheiros

mais capazes para fazê-las (Vygotsky, 2001). Destacam-se, assim, atividades

desenvolvidas nesse trabalho como, o intercâmbio entre os alunos com trocas de

saberes, realização de experiências em grupos, pesquisa de campo, registros dos

dados e socialização de conclusões.

Os resultados qualitativos foram analisados conforme os significados dos

conceitos trabalhados, iniciados pela aplicação de um pré-teste, realização das

atividades práticas e finalizados com um pós-teste.

O pré-teste constituiu por questões abertas relacionadas ao tema solo, com o

objetivo de obter o conhecimento prévio sobre a temática específica e de despertar o

interesse do aluno, além de possibilitar ao docente, reflexões sobre ações mais

efetivas em relação ao desenvolvimento do trabalho. Gasparin (2007) caracteriza

essa etapa como uma preparação e mobilização do aluno para a construção do

conhecimento escolar. Enquanto, Bizzo (2001) relata que a facilidade de acesso ao

conhecimento do cotidiano pelos alunos, por serem informações provenientes de

fatos históricos, religião, cultura, mitos, lendas, saberes populares, ou mesmo de

experiência de vida. Estes conhecimentos continuam presentes, mesmo quando o

aluno freqüenta a escola, porém essa instituição possibilita o acesso a outras formas

de conhecimento, como o artístico, o cultural e o científico.

As atividades práticas seguiram roteiros, conforme a temática abordada,

partindo de uma questão problematizadora e cotidiana, provocando no aluno

reflexões, pesquisa e soluções das questões levantadas. Enquanto que, o pós-teste

permitiu avaliar a apropriação do conteúdo científico desenvolvido.

Foram priorizados experimentação com trabalhos em grupo compostos por

seis elementos ficando sob a responsabilidade do professor o preparo e a

organização dos materiais. Porém, em algumas atividades foram realizadas

demonstrações práticas, pela indisponibilidade de material para todos.

Totalizaram-se seis atividades práticas sobre solo, desenvolvidas na sala de

aula, no pátio da escola e no ambiente rural, intituladas: observação e descrição de

diferentes tipos de solos; separando os componentes dos solos e a sua

classificação; testando a permeabilidade do solo arenoso e argiloso; relação da

vegetação com a erosão do solo; tipos de solos e desenvolvimento de rabanetes e

trabalho de campo: observação de uma erosão rural.

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RESULTADOS E DISCUSSÕES

1º- Analisando o Pré-Teste:

Conforme a metodologia descrita, aplicou-se um pré-teste, onde os alunos

responderam as questões sobre o solo baseado em seus conhecimentos cotidianos

os quais são construídos durante o convívio social.

Destacam-se, as seguintes questões:

1. A discussão sobre as culturas agrícolas destaca a importância do solo. O

que você entende por solo, ou seja, o que é o solo para você?

2. Existem diferentes tipos de solo? Justifique sua resposta.

3. O solo pode apresentar problemas? Que tipos de problemas?

Após análise das respostas apresentadas para as questões acima, foram

elaboradas categorias com a finalidade de organizar a multiplicidade de idéias

apresentadas.

O aluno demonstrou ter conhecimento superficial sobre o solo:

- É um objeto que se dá para plantar frutos, verduras, etc.- Solo é o que faz parte do vulcanismo.- Solo para mim é uma coisa que a gente fica pisando e se acabar nós não vamos ter lugar para pisar.- Um monte de coisas que antes era rochas.- O solo é a terra onde andamos, plantamos coisas.- Sim, tem três tipos de solos diferentes. - Sim, de várias cores, de vários tipos como duro, úmido, seco.- Sim, o solo tem terra, barro, argila e pequenas pedras.- Sim, existem solos arenosos, duros.- Sim, porque em muitos lugares o solo é muito arenoso e não dápara plantar nada. - Sim, desmoronamento.- Pode causar erosão, contaminação.- Sim. Quando, por exemplo, um gato vai e faz cocô no solo e, as crianças vão e brincam, podem ficar doentes.- Sim, rachaduras, buracos, etc.- Sim, o solo pode ter rachaduras, não ser fértil, estar doente, etc.

O aluno associou a palavra solo com conceitos astronômicos:

- Solo para mim é uma luz feita pelo Sol.- Sim. Porque existe bastante planeta. - Queimar algumas coisas ou aquecer demais o planeta.- Não, faz tanto tempo que o Sol está dando raios solares para nós.- Sim, o câncer de pele.- Não, porque o Sol ilumina as plantas.

O aluno relacionou a palavra solo com gás e poeira:

- Solo para mim é um vapor.

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- É uma bola de ar. - O solo é poeira que nela existem nutrientes, então nele hápossibilidade de nascerem coisas e plantas. - Pode ter fraquezas de gases, os gases vão sumindo e o solo vai enfraquecendo.- Sim, pode faltar camada de ozônio.

Ao analisar os resultados, observou-se que, na maioria das vezes, o aluno

demonstrou ter um conhecimento superficial sobre o conceito de solo, seus

diferentes tipos e sua degradação. Provavelmente, este conhecimento foi adquirido

na escola em anos anteriores, na família, com os amigos ou através da mídia, ou

seja, pelo convívio social, demonstrando que “essa construção não é realizada a

partir do zero” (MIRAS, 1996, p.58). Alguns, porém, associaram a palavra “solo” com

conceitos astronômicos, como por exemplo, o Sol e outros com nuvem de gás e

poeira. Estas concepções podem estar ligadas as similaridades da ortografia e a

proximidade temporal com o conteúdo sobre astronomia trabalhado em sala de aula,

além de uma falta de integração com significados de conceitos científicos,

apresentando apenas palavras desconexas. O Sincretismo aparece em algumas

respostas que definem o conceito pela palavra em si, não apresentando associações

com outros aspectos, sendo apenas palavras soltas (VYGOTSKY, 2001). De acordo

com Salvador (1994), constroem-se significados integrando ou assimilando o

material de aprendizagem aos esquemas que já se possui de compreensão da

realidade, ou seja, integrando o conhecimento cientifico adquirido na escola, ao

conhecimento prévio adquirido no cotidiano.

Segundo Vygotsky (2001), o conhecimento científico repousa em sistemas

culturais que são transmitidos através da escolaridade formal. Em contraste, os

conceitos de todos os dias adquirem-se através da participação em atividades da

vida cotidiana, e começam por ser uma compreensão concreta de eventos e de

fenômenos, que vão tornando cada vez mais abstratos à medida que vão sendo

integrados em sistemas do conhecimento formal. Os conceitos científicos, por sua

vez, adquirem-se por exposição verbal, e vão se tornando mais significativos à

medida que entram em contato com os objetos e eventos de todos os dias.

2º- Experimentoteca de solos

Os experimentos foram trabalhados conforme a seqüência dos conteúdos,

tais como: observação e descrição de diferentes tipos de solos; separando os

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componentes dos solos e a sua classificação; testando a permeabilidade do solo

arenoso e argiloso; relação da vegetação com a erosão do solo; tipos de solos e

desenvolvimento de rabanetes.

Os experimentos foram realizados tanto no pátio da escola, como em classe,

pois o laboratório estava sendo utilizado como sala de aula para atender a demanda

escolar. Os alunos realizaram os experimentos em grupos seguindo um roteiro de

atividades que valorizavam a sua contextualização a partir de uma questão

problematizadora. As atividades propostas não foram realizadas para comprovar

uma teoria, mas para que os alunos pudessem construir os conhecimentos

científicos de maneira significativa, e que desenvolvessem uma capacidade crítica e

participativa em relação ao seu contexto social.

A- Observação e descrição de diferentes tipos de solos

A atividade prática abordou diferentes tipos de solos coletados pelos alunos

em diferentes locais como, solo da beira do rio, do interior da mata e de um local

sem cobertura vegetal. Em grupos, durante a etapa de observação, os alunos foram

estimulados a fazerem uma análise a olho nu, com auxílio de uma lupa e através do

tato, levando em consideração à textura, o cheiro, a coloração, a umidade, a

presença de matéria orgânica decomposta, seres vivos, entre outros. Nesta etapa,

os estudantes identificavam e registravam as características de cada amostra, tais

como: “O solo sem cobertura vegetal é mais seco e solto, tem bastante areia e não

tem seres vivos”; “O solo da mata é úmido e ajuda os seres vivos a pisar num solo

muito macio. Outro aluno utilizando uma lupa relatou: “Eu vi um grão brilhante”.

Houve, nesse momento, intervenção do professor, após questionamento a respeito

da origem do grão observado, o quartzo, que é um dos componentes resultante da

decomposição das rochas. Portanto, é papel do docente provocar avanços nos

alunos e isso se torna possível com sua interferência na zona proximal (VYGOTSKY,

2001). Enquanto manuseavam o solo da mata, os alunos perceberam que o cheiro

era agradável “cheiro de mato”, também notaram a presença de matéria orgânica

em grande quantidade “tem bichinho morto”; “pedaço de pau”; “muitas raízes e

folhas” e a presença de seres vivos “tem muitas minhocas”, “achei formigas”. Quanto

à coloração perceberam as diferenças entre o solo da mata “cor marrom escuro” e

sem cobertura vegetal “a cor dele é marrom bem claro”. Após esse primeiro contato

com os tipos de solo, realizou-se uma discussão das respostas de cada grupo e,

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finalmente, uma sistematização coletiva da classe. Esse momento foi importante

para confrontar as diferenças em relação às amostras de solo e as novas

descobertas dos alunos. A seguir, os estudantes montaram um painel, colocando as

amostras de solos em saquinhos de plástico transparente, com as descrições das

respectivas características encontradas. Este recurso ficou em exposição na classe

para maior divulgação e utilização nas atividades posteriores.

Essa atividade foi considerada como suporte para as demais propostas por

este trabalho, pois a partir do diagnóstico das amostras de solo, novos

conhecimentos foram trabalhados pelo método investigativo e participativo entre os

grupos formados.

Os resultados foram valorosos e surpreendentes, pois despertaram interesse

e curiosidade sobre o assunto, principalmente quando utilizaram a lupa, pela

observação mais rica em detalhes. A curiosidade é um sentimento fundamental para

que os alunos tenham interesse e vontade de aprender coisas diferentes. Para

Harlan e Rivkin (2002, p. 22), “a maior parte das teorias que existem sobre

curiosidade apresentam-na não como uma emoção em si, mas como um afeto:

estado mental que influencia as emoções.”

B: Separando os componentes do solo / Classificação dos solos

Iniciou-se a prática com uma problematizaçao: “O solo da mata tem os

mesmos componentes que o solo sem cobertura vegetal ou da beira do rio?” As

primeiras hipóteses que os alunos formularam foram: “Não tem os mesmos

componentes, porque um solo é diferente do outro”. Essa primeira concepção

baseou-se nas observações que fizeram na prática anterior, relacionaram a palavra

“componente” com as diferentes características dos tipos de solos analisados. Para

o teste das hipóteses, cada grupo recebeu três vidros transparentes, que foram

preenchidos com um copo de cada amostra de solo, ou seja, o solo da mata, da

beira do rio e sem cobertura vegetal. Depois, completaram com água e misturaram

todos os elementos. Anotaram as primeiras observações, que nas amostras

formavam camadas, mas sem defini-las. Os experimentos ficaram em repouso

durante sete dias, período em que ocorreu a separação de seus constituintes. Após

esse período, notaram que as camadas ficaram mais nítidas e a partir de uma

interação discursiva os alunos relatavam sua observação, auxiliado pelas

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indagações do professor, como: “O que há de semelhança e diferença entre as três

amostras?”. Citam-se algumas anotações dos alunos:

Nos três vidros têm areia, barro e sujeira contendo ciscos, raízes e folhas; têm água barrenta e divisões em camadas. A diferença é que o solo da mata tem mais restos de folhas e raízes que os outros dois, o solo da beira do rio tem bastante barro e pouco cisco e o solo sem cobertura vegetal tem mais areia do que nos outros dois vidros.A cor da água também é diferente, do solo da mata é marrom escuro, da beira do rio é barrenta e do solo sem cobertura vegetal é mais clarinha.

Assim, por meio da observação, cada grupo complementava o que o outro

não havia relatado como a espessura das camadas, diferenças na coloração da

água, tipo de material depositado e após vários questionamentos possibilitou-se a

elaboração dos conceitos científicos. Referem, por exemplo, que o barro é formado

principalmente de argila, componente do solo resultante da fragmentação das

rochas, a sujeira contendo restos de vegetais é formada pela matéria orgânica

decomposta pela ação dos microrganismos, chamada húmus, que tem importante

função no desenvolvimento vegetal. Esse experimento oportunizou-se trabalhar o

conceito de densidade, pois os grãos de areia por serem maiores e mais pesados

decantaram formando a camada inferior; os grãos de argila por serem menores que

os da areia, são menos densos, portanto, desceram mais lentamente formando uma

segunda camada e, finalmente, as partículas de húmus, por terem densidade menor

que a areia e argila, uma parte ficou em suspensão na água e a outra foi depositada

por cima da argila formando uma terceira camada. Neste sentido, o professor deixa

de ser um mero transmissor de conhecimento, passa a ser um mediador do

processo de ensino, agindo como um guia. Ainda, ele precisa ter o cuidado de não

utilizar respostas definitivas ou sugerir um conhecimento pronto ou elaborado aos

alunos (CARVALHO, 2006).

Finalizando-se a atividade, retornaram a questão problematizadora e

concluíram que os solos, apesar de possuírem diferentes características,

apresentam os mesmos componentes, como: areia, argila e húmus, porém, em

proporções diferentes, podendo ser classificados em arenoso, argiloso e humífero.

Dessa forma, os alunos construíram os conceitos científicos de maneira significativa,

não recebendo um conhecimento pronto e acabado para decorar e depois esquecer,

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pois, na maioria das vezes, estas palavras não possuem significado algum para os

alunos, ou seja, não possui ligação com o real, com a sua realidade.

Em Vygotsky (2001) é possível compreender a importância da significação

dos conceitos, visto que é na interação, mediada pela linguagem, que se formam os

conceitos do cotidiano, que reelaborados na mente dos indivíduos irão refletir as

vivências do meio cultural. Nesse caso, o aluno não é simples receptor, mas faz

parte de um processo de construção dos conceitos que, inclusive, valoriza os

conhecimentos do cotidiano e parte deles para a construção de saberes mais

sistematizados. Logo, saber Ciências corresponde, a saber, empregar instrumentos

conceituais para dialogar com o mundo em vários níveis do seu contexto. A leitura

permite a compreensão do processo do conhecimento, principalmente pela relação

dialética da constituição da consciência pelos conceitos cotidianos e os conceitos

que são sistematizados pela escola (VYGOTSKY, 2001). A estrutura é reconstruída

através da prática social dialógica (mediada pela palavra) e pedagógica (mediada

pelo outro). O significado da palavra transforma-se ao longo do desenvolvimento do

sujeito que, por sua vez, busca novos sentidos e novas compreensões.

C: Testando a permeabilidade dos diferentes tipos de solos

A atividade prática iniciou-se com uma questão problematizadora não muito

específica, para gerar uma ampla discussão. “Por que após uma chuva, muitos

terrenos secam rapidamente e outros formam poças de água?” Seguem algumas

das primeiras hipóteses dos alunos:

O primeiro terreno é um solo arenoso e o segundo é barrento. O solo seco absorve melhor a água e o outro tipo de solo que já é úmido não absorve tão bem.

Analisando as primeiras hipóteses os alunos demonstraram ter como

conhecimento prévio que um tipo de solo é muito seco, no caso o arenoso, e o outro,

por conter barro, está sempre molhado. Mesmo após vários questionamentos eles

ainda não tinham a percepção dos espaços entre as partículas do solo, nem do

tamanho das mesmas. Para testarem as hipóteses, cada grupo recebeu o material

necessário para desenvolver a atividade, como dois equipos formados por potes

acoplados com funis contendo solo arenoso e o argiloso, previamente seco e

triturado, livre de torrões que poderiam interferir nos resultados. Despejou-se a

mesma quantidade de água nos dois funis ao mesmo tempo e, observaram a

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drenagem. Nessa fase do trabalho o professor percorre os grupos, verificando a

execução do experimento. Em relação à drenagem observaram que no solo

arenoso, sendo “a areia mais solta a água passou mais rápida” e, no solo argiloso

“demorou mais para passar porque formou um bolo ou uma pelota”, nesse momento

os alunos não possuíam, ainda, um conceito formado sobre a porosidade. Após

vários questionamentos, perceberam que os grãos de areia por serem maiores que

os da argila “deixam maior espaço entre eles”, e devido a estes espaços,

denominados poros, que a água pode “passar com certa facilidade ou não”. Além

disso, notaram que a argila funciona como um filtro, pois apesar da cor avermelhada

do solo argiloso, neste experimento, a água recolhida nos potes após a drenagem,

estava mais clara do que a do arenoso.

Para finalizar, retornaram a questão problematizadora, e concluíram que o

solo não é um meio maciço, é extremamente poroso, que a sua composição pode

influir na capacidade de infiltração e retenção da água. Os poros são necessários

para o crescimento das raízes e outros organismos do solo, além de servir para o

movimento de água e ar. Também relacionaram este fenômeno com a formação do

lençol freático. Portanto na conclusão, “deve-se formalizar uma resposta ao

problema inicial discutindo a validade ou não das hipóteses iniciais e as

conseqüências delas derivadas” (AZEVEDO, 2006, p. 29).

Segundo Freire (1997), para compreender a teoria é preciso experienciá-la. A

realização de experimentos, em Ciências, representa uma excelente forma para que

o aluno faça a experimentação do conteúdo e possa estabelecer a dinâmica

indissociável entre teoria e prática. Para isso, é fundamental que o professor

apresente um problema sobre o que está sendo estudado, para que o aluno possa

refletir, buscar explicações e participar das etapas de um processo que leve à

resolução do problema proposto. No entanto, é necessário desafiá-los com proble-

mas reais; motivá-los e ajudá-los a superar aqueles que parecem intransponíveis;

permitir a cooperação e o trabalho em grupo; avaliar não numa perspectiva de

apenas dar uma nota, mas na intenção de criar ações que intervenham na

aprendizagem (HOFFMANN, 2001; PERRENOUD, 1999; LUCKESI, 2003).

D: Relação da vegetação com a erosão do solo

Essa atividade prática foi demonstrativa. O material necessário foi preparado

pelo professor com quinze dias de antecedência, formado por duas garrafas tipo

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PET cortadas no sentido longitudinal contendo o mesmo tipo de solo. Em uma

garrafa deixou o solo sem vegetação, enquanto que em outra, semeou-se alpiste, e

aguardou o tempo determinado para o seu crescimento. As demonstrações, de

maneira geral, sempre iniciam de um problema, que por meio de questões procura

detectarem que tipo de pensamento os alunos possuem sobre o assunto, seja ele

intuitivo ou de senso comum. Como por exemplo, “Imaginem dois terrenos inclinados

um está com vegetação e o outro nu, após uma chuva qual dos dois perderá mais

solo pela força da enxurrada?” As primeiras hipóteses foram realizadas por alunos

que residem ou que têm família com propriedade na área rural:

O terreno que está sem vegetação, porque no outro com vegetação as raízes vão deixar a terra mais firme.As raízes seguram mais a terra.

Para alguns alunos, muitas vezes a solução para o problema proposto

parece ser simples, isso porque se trabalha diretamente com questões relacionadas

ao seu cotidiano. O papel do professor é o de provocar em seus alunos a construção

do conhecimento marcada pela passagem do saber cotidiano para o saber cientifico,

por meio da investigação e do próprio questionamento feito acerca do fenômeno. A

partir da formulação do problema e de uma discussão com a classe, a demonstração

foi realizada, sendo que um grupo de alunos derramou água simulando uma chuva

sobre cada garrafa levemente inclinada, uma com a planta já crescida e a outra sem

vegetação. A água escorrida foi coletada em potes para comparação e análise da

quantidade de material removido de cada amostra. Iniciava-se, então, uma

discussão sobre o que havia sido observado e também sobre quais seriam as

explicações científicas acerca do fenômeno. Como por exemplo: “Após regar com

água as amostras do experimento, compare as características da água escorrida.

Tente explicar o que houve. Qual a relação entre a cobertura vegetal e o processo

de erosão?” A diferença da quantidade do material removido das garrafas ficou

evidente e os alunos não tiveram dificuldades para relatar o ocorrido, tais como:

O pote que coletou a água que escorreu da garrafa sem vegetação tem maior quantidade de solo removido do que da outra garrafa. As raízes das plantas são importantes para segurar as partículas do solo.No solo sem vegetação formaram buracos.

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Porém, nenhum aluno associou as partes aéreas do vegetal como folhas e

galhos na interferência do resultado, que amortecem o impacto das gotas da chuva,

evitando que o solo seja desagregado e carregado pelas águas superficiais. Houve a

intervenção do professor para esse detalhe, “Será que é somente as raízes das

plantas que diminuem a remoção do solo pela força da enxurrada? E as partes

aéreas, como galhos e folhas, também não interferiram nos resultados?” Após as

discussões e as reflexões, o professor sistematizou as explicações dadas ao

fenômeno.

Uma das atividades investigativas, que o professor pode fazer uso é a

demonstração prática, que apresenta vantagens em certas circunstâncias, como por

exemplo, quando o material não é suficiente para o trabalho individual ou em grupo,

por requerer apenas o material do demonstrador, como no experimento

apresentado.

E: Desenvolvimento de rabanetes em solo arenoso e solo humífero

Iniciou-se a prática com a semeadura das sementes de rabanete em potes de

plástico contendo os tipos de solo, arenoso e humífero. O problema foi proposto

para que estimulasse a curiosidade científica dos alunos. A resposta a questão

inicial será o objetivo principal do experimento. Por exemplo: “Como vocês acham

que o rabanete irá se desenvolver nos diferentes tipos de solo?” Os alunos

levantaram as primeiras hipóteses, como:

Eu acho que no solo humífero o crescimento será maior, porque contém restos orgânicos e é um pouco úmido e o solo arenoso tem poucos nutrientes para a planta crescer.No solo humífero a planta desenvolverá mais rápido e no solo arenoso eu acho que as sementes vão morrer.

Pelos registros dos alunos nota-se que eles têm um conhecimento sobre a

importância da matéria orgânica para o desenvolvimento das plantas, que foi

adquirido provavelmente nas práticas anteriores. Levantadas as hipóteses, discuti-se

como será encaminhado o experimento, portanto, após a semeadura levaram os

potes para casa e ficaram cuidando durante três semanas. Nesse intervalo de

tempo, acompanharam o experimento fazendo observações e registrando o

crescimento e desenvolvimento das plantas colocando os dados numa tabela. Após

esse período levaram os experimentos à escola para finalizar o trabalho, ou seja,

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fazer uma análise dos dados, fornecendo informações sobre a questão-problema.

Os alunos observaram os diferentes resultados do desenvolvimento dos rabanetes

nos dois tipos de solos, conforme relatos:

Eu observei que no solo humífero se desenvolveu melhor, cresceu mais, têm mais folhas, o talo é mais grosso e no solo arenoso nasceu, mas não se desenvolveu como o outro. Eu pude observar que no solo humífero o desenvolvimento foi melhor, pois este contém mais nutriente que o solo arenoso.

Alguns deram até nomes as plantinhas “O nome da minha planta é Sol”; “A

história da Lua”; também verificaram que alguns experimentos pelo fato de ficarem

num local com muita sombra “as plantas não desenvolveram muito bem, as folhas

ficaram finas, tortas e amareladas” e aqueles que deixaram os experimentos sob a

luz do Sol “as folhas ficaram com uma coloração verde mais escura”, concluíram,

assim, que a luz solar é de extrema importância para o desenvolvimento das

plantas. Alguns experimentos, porém, foram atacados pelas formigas e outros

insetos “a minha planta foi crescendo e eu fui ficando alegre até que um dia eu vi

que a lagarta mordeu a folha”. Essa atividade prática forneceu muitas informações

aos alunos, que além da matéria orgânica as plantas necessitam de água, luz e de

certos cuidados, principalmente contra os predadores e, que não existe experimento

que não dê certo, os resultados é que podem ser diferentes. Assim, a experiência

não é uma atividade monolítica, mas uma atividade que envolve muitas idéias,

muitos tipos de compreensão, bem como muitas capacidades, tem vida própria

(HACKING, 1992).

F: Atividade de campo- Observação de uma erosão rural

As atividades de campo podem ser utilizadas como importante estratégia de

ensino, uma vez que o contato com o ambiente permite a sensibilização acerca dos

problemas ambientais. Além disso, surgem oportunidades de reflexão sobre valores,

imprescindíveis às mudanças comportamentais e, sobretudo, atitudinais

(CARVALHO, 1998). Para Sato (2004), o processo de sensibilização das pessoas

ocorre, sobretudo, pela observação, contato e “imersão” na natureza. As aulas de

campo favorecem também uma abordagem ao mesmo tempo mais complexa e

menos abstrata dos fenômenos estudados.

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Para realizar esta atividade, primeiramente fez-se o reconhecimento do local,

pois é importante que o professor conheça o ambiente a ser visitado, para que este

não seja limitado, no sentido espacial e físico, de forma que possa atender os

objetivos da aula. Como a turma era numerosa e, para segurança de todos, além do

professor, duas pessoas adultas acompanharam a visita, sendo uma delas, técnico

do meio ambiente, para atender as possíveis dúvidas dos alunos no local

determinado. Segundo SANTOS (2002), as contribuições da aula de campo podem

ser positivas na aprendizagem dos conceitos à medida que é um estímulo para os

professores, que veem uma possibilidade de inovação para seus trabalhos e

empenhando-se mais na orientação dos alunos.

No local determinado fizeram as observações e registros de acordo com o

roteiro preparado previamente pelo professor, tais como:

Observe a topografia do terreno próximo à erosão e a descreva,

conforme suas características, como: se o terreno é muito inclinado,

com ou sem cobertura vegetal, tipo de vegetação, técnicas de

conservação como curvas de nível, entre outros.

Aponte as possíveis causas do surgimento da erosão do terreno.

Observe a erosão quanto ao comprimento e profundidade. Utilize

como instrumento de medida um barbante com pedaço de madeira

preso nas suas extremidades. Anote a profundidade estimada da

erosão, pelo comprimento do barbante.

Descreva o que você pode observar dentro da erosão.

Localize na erosão se em algum ponto pode observar o perfil do solo.

Escreva as características de cada camada (horizonte) observada.

Verifique que tipos de medidas de controle da erosão estão sendo

realizadas. Em sua opinião, a medida é viável ou não?

Para você, onde foi parar o material erodido? Observe e descreva.

Quais as conseqüências da erosão ao meio ambiente?

Para desvendar algum fenômeno, não basta olhar despretensiosamente, sem

procurar nada, como costumamos fazer. É necessário olhar com atenção, com

curiosidade, com olhos críticos, procurando os detalhes e o que pode ser mais

importante. Diante disso, os alunos foram instigados durante toda a caminhada do

local de estudo, a observar a paisagem identificando os aspectos relacionados ao

solo.

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Em relação à topografia do terreno, relataram de acordo com suas

características: “Eu vi pasto, capim, o terreno era inclinado, observei curvas de nível

para segurar a enxurrada, solo muito solto e arenoso”. Apontaram as possíveis

causas do surgimento da erosão do terreno e observaram a sua extensão. Seguem

alguns comentários feitos por alunos:

Tudo começou com a água da chuva que carregou parte do solo, hoje ela tem mais ou menos seis metros de profundidade e aproximadamente um quilômetro de extensão.O nosso solo por ser derivado do Arenito Caiuá é bastante solto e fácil de ser carregado pela água da chuva, outra causa, é que parte da água coletada da cidade cai nesse ponto.

Enquanto caminhavam ao lado da erosão, faziam observações e relavam o

que viam dentro dela, como apontam os alunos:

Observando o perfil do solo vimos o horizonte A, que é a camada mais escura por causa da matéria orgânica e com muitas raízes e abaixo o horizonte B que é menos escuro e com menos raízes.Dentro dela tem muito lixo.Eu vi a rocha-mãe.

Por ser uma erosão antiga havia vários braços em toda a sua extensão em

alguns pontos verificaram até o surgimento do lençol freático de tão profundo que

era, conforme o relato de um aluno: ”Andamos cada vez mais passando por pastos,

lixos até que chegamos a um ponto que tinha água que saía do lençol freático”.

Quanto às medidas de controle relataram que “Havia cerca em algumas partes em

torno da erosão para que naturalmente a vegetação pudesse crescer e não ser

comida ou pisoteada pelos animais, as raízes das plantas seguram para não

desbarrancar”; “colocaram tubulações no seu interior para canalizar a água, mas

essa medida não deu certo”. Finalizando-se as atividades de observação relataram

as conseqüências para o meio ambiente:

A erosão tem conseqüências graves para o meio ambiente, solo pobre, buracos, rachaduras, vegetação pobre.Todo material erodido foi parar no córrego Ipiranga, provocando seu assoreamento e prejudicando a vida aquática.

Após a visita, realizou-se em classe o trabalho de organização dos dados em

forma de relatório. Nesta atividade alguns alunos tiveram dificuldades em organizar

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as informações, pois não responderam devidamente o roteiro durante a visita.

Apesar de o professor estar sempre atento e tomando cuidado para que prestassem

atenção nas explicações e principalmente, com o ambiente que era perigoso, alguns

se dispersaram. Outros, porém, escreveram textos bem elaborados e com

informações ricas em detalhes do ambiente visitado, conforme alguns relatos feitos

anteriormente.

Na pesquisa de campo o contato direto com o ambiente tornou o aprendizado

mais fácil, uma vez que o estudante envolveu-se em situações reais, e estes

compreenderam, de maneira mais rápida, à medida que visualizavam o conteúdo

que estava sendo tratado (FRACALANZA; AMARAL; GOUVEIA, 1986). Fizeram

muitos questionamentos, principalmente em relação ao tamanho da erosão e as

suas conseqüências ao meio ambiente.

Das atividades propostas durante o projeto, essa foi a que mais gostaram,

conforme depoimentos de alguns alunos da turma:

Os experimentos revelam curiosidades legais e o trabalho de campo deu conhecimento e novas descobertas, pois desde que nasci moro nesse município e nunca tinha visitado esse local.Das atividades práticas realizadas, eu gostei mais do trabalho de campo por causa da erosão, do lençol freático, também os horizontes A, B e C e a rocha-mãe que virou solo.O trabalho de campo porque eu não sabia o que era erosão e eu conheci.Eu achei mais interessante o tamanho da erosão.

A aula de campo possibilitou aos alunos observarem os fenômenos como eles

ocorrem na natureza e, portanto, na realidade, além de permitir a elaboração de

conhecimentos mais complexos e o confronto entre a teoria e a prática (SENICIATO,

2002).

3º: Aplicação do pós-teste

Finalizando-se as atividades práticas os alunos realizaram os mesmos

questionamentos do pré-teste feito no início do projeto, como forma de avaliação do

conteúdo desenvolvido. Responderam as questões aplicando os conhecimentos

sobre o solo que adquiriram no decorrer do processo ou que complementaram

baseados em seus conhecimentos cotidianos, porém, de forma mais sistematizada,

como segue alguns relatos:

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O solo para mim é formado por matéria, tanto orgânica quanto inorgânica. É a parte da superfície terrestre formada pela decomposição das rochas.É a camada superficial da Terra, composta de materiais orgânicos (fezes, restos de animais e plantas) e materiais inorgânicos (areia, silte e argila). Existem muitos tipos de solos como o arenoso, argiloso e o humífero.O solo para mim é muito importante porque quando plantamos alguma fruta ou verdura, elas crescem e a gente pode comer.O solo pode apresentar problemas, se não tiver cobertura vegetal a água da chuva pode levar parte dele e, ainda faz buracos que podem virar erosões enormes.

Porém, nenhum aluno associou a palavra solo com conceitos astronômicos

ou com nuvem de gás e poeira, como no início de pré-teste. De acordo com

Vygotsky (2001), na interação entre professor e aluno dá-se o confronto entre os

conceitos espontâneos e os conceitos científicos. Enquanto que, os conceitos

científicos descem à realidade empírica, os espontâneos ascendem buscando

sistematização, abstração, generalização. Conforme descrito anteriormente, alguns

alunos relacionaram a palavra solo com conceitos astronômicos, eis o relato de uma

aluna “Antes eu entendia que o solo era o sistema solar e agora eu entendo que é o

lugar onde pisamos”. Dessa forma, a apropriação dos conceitos científicos no

ambiente escolar, implica na reconstrução dos conceitos espontâneos numa

articulação e transformação recíprocas, mediados pela ação pedagógica do

professor.

CONCLUSÃO

Com a realização desse trabalho, pude constatar que a experimentação é

uma estratégia eficiente no ensino de ciências para a criação e reflexão de

problemas reais que permitam a sua contextualização e, que realmente é possível,

ministrar aulas mais significativas e agradáveis, em que o aluno possa participar e

expor opiniões sem repressão e sem precisar decorar conceitos. Também, a falta de

um laboratório não pode ser considerada empecilho para o desenvolvimento de tais

atividades. Pode-se fazer uso de materiais de sucata, construídos junto com os

alunos, como também explorar o meio, como aula de campo ou extraclasse.

No entanto, a metodologia de aulas experimentais não deve ser pautada no

tipo “receita de bolo”, em que os aprendizes recebem um roteiro para seguir e obter

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os resultados que o professor espera tampouco almejar que o conhecimento seja

construído pela mera observação. Ao ensinar ciência, no âmbito escolar, deve-se

levar em consideração que toda observação não é feita num vazio conceitual, mas a

partir de um corpo teórico que orienta a observação (GUIMARÃES, 2009).

Em todas as etapas do projeto houve um acompanhamento do

desenvolvimento dos trabalhos dos alunos, mediando por questionamento,

auxiliando nas suas dificuldades, verificando como concluíram os experimentos,

promovendo a socialização de conhecimentos, complementando ideias, motivando-

os.

Dentre as dificuldades encontradas destacam a falta de responsabilidade na

entrega dos relatórios por alguns alunos, a dificuldade na escrita com erros

ortográficos e de concordância, que em momento oportuno contavam com o auxílio

do professor, e a excitação, por parte de certos alunos, nas atividades

experimentais. Em relação ao trabalho em grupo, apesar da agitação que é própria

neste tipo de atividade, permitiu a troca de informações, o confronto de idéias, o

desenvolvimento no aluno do espírito de equipe e atitude colaborativa, o que

enriqueceu ainda mais o trabalho, principalmente daqueles com maiores

dificuldades, por receberem ajuda de seus colegas.

Para que as atividades experimentais tenham um resultado satisfatório,

necessita de uma organização por parte do professor, principalmente quando a

escola não possui um laboratorista para auxiliar nas atividades, como no preparo e

limpeza dos materiais. Para execução de algumas atividades, o tempo planejado,

não foi suficiente, necessitando priorizar aquelas consideradas mais relevantes para

o processo ensino e aprendizagem, pois não é a quantidade de conteúdos que

garante a aprendizagem do aluno e sim a qualidade como estes são desenvolvidos.

Contudo, os resultados alcançados foram relevantes. As experiências e

demonstrações desenvolvidas revelaram-se uma ferramenta útil, permitindo abordar

a temática solo de maneira didática e interessante, além de vinculá-la à questão

ambiental e ao cotidiano do aluno do ensino fundamental. O estudo científico do

solo, a aquisição e disseminação de informações sobre o seu papel e sua

importância na vida do homem são condições primordiais para sua proteção e

conservação e a garantia da manutenção de um ambiente sadio e sustentável

(LIMA; LIMA, 2004).

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Portanto, através da experimentação, ou seja, de um ensino que leve o aluno

a participar ativamente, permitindo-lhe fazer reflexões e conclusões e mais ainda,

que leve em consideração o seu cotidiano, poderia ser a solução para um dos

problemas enfrentados na educação como o predomínio de um ensino tradicional,

fundamentado na transmissão, recepção e memorização de informações. Dessa

forma, com a experimentação possibilitaria o desenvolvimento de um aluno

autônomo, capaz de compreender e atuar no mundo, visando às transformações

para o seu próprio meio.

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