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1 Audiência Pública n o 034/2009 Contribuição da AES Eletropaulo 15 de outubro de 2009

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Audiência Pública no 034/2009

Contribuição da AES Eletropaulo

15 de outubro de 2009

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1. INTRODUÇÃO

Em 16/09/09, a ANEEL instaurou a Audiência Pública 034/2009 para o fim de “Obter subsídios e informações para o aprimoramento da Minuta de Resolução Normativa referente à proposta de metodologia de cálculo do repasse final da Energia Livre após o encerramento do prazo máximo de cobrança da Recomposição Tarifária Extraordinária - RTE nas tarifas de fornecimento de energia”. Em 15/10/09, a ABRADEE enviou contribuição que aborda, principalmente, a inviabilidade jurídica da própria proposição que motiva a referida Audiência Pública, ou seja, do repasse final da Energia Livre após o encerramento do prazo máximo de cobrança da Recomposição Tarifária Extraordinária - RTE nas tarifas de fornecimento de energia. Embora corroborando a contribuição da ABRADEE, a presente contribuição objetiva apresentar considerações restritas aos aspectos operacionais constantes da Nota Técnica 306/09-SRE/ANEEL, de 09/09/09, e respectiva minuta de resolução, ambos disponibilizados pela AP 034/09.

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2. INADIMPLÊNCIA

De acordo com a Nota Técnica 306/09-SRE/ANEEL, de 09/09/09, a metodologia desenvolvida para o “repasse final da Energia Livre” considerou as conclusões a respeito da inadimplência, constantes da Nota Técnica 296/07-SFF/ANEEL, de 02/07/07: �

“47. Nos casos em que o prazo máximo de recolhimento da RTE fixado para a distribuidora não for suficiente para a amortização total dos saldos de Perda de Receita e/ou Energia Livre, deverão ser recalculados o valores dos repasses da Energia Livre, considerando: (...) c) a amortização dos saldos de Energia Livre e Perda de Receita, A PARTIR DOS VALORES MENSAIS FATURADOS PELAS CONCESSIONÁRIAS A TÍTULO DE RTE, de janeiro de 2002 até o mês do encerramento do seu prazo máximo de cobrança nas tarifas de fornecimento; (...) 52. Por fim, destaca-se que a metodologia desenvolvida nesta Nota Técnica para o ajuste final da RTE considera as conclusões da SFF a respeito das deduções de tributos e encargos e da inadimplência, que constam da Nota Técnica n.º 296/2007-SFF/ANEEL, de 02/07/2007. 53. Dessa forma, as distribuidoras que conseguiram amortizar os saldos da Perda de Receita e da Energia Livre dentro do prazo máximo estipulado para a cobrança da RTE, deverão efetuar os repasses finais da Energia Livre relativos às DIFERENÇAS ENTRE OS VALORES FATURADOS E ARRECADADOS DA RTE.”

Sobre a questão, a análise da Nota Técnica 296/07-SFF/ANEEL teve como pressuposto um aparente conflito entre as disposições constantes da Cláusula 5ª, item III, e da Cláusula 9ª, § 2º, do Acordo de Reembolso de Energia Livre, concluindo que: “não resta dúvida de que o compromisso dos Distribuidores é o de pagar às Geradoras toda a Energia Livre que foi objeto de faturamento dentro do prazo de aplicação da RTE, independentemente da efetiva arrecadação.” Entretanto, observa-se que não há incompatibilidade entre o disposto na Cláusula 5ª, item III, e o disposto na Cláusula 9ª, § 2º, do Acordo de Reembolso da Energia Livre. Isso porque a Cláusula 5ª, item III, do referido Acordo é expressa ao afirmar que o reembolso da Energia Livre será feito por meio do repasse pelas distribuidoras dos recursos arrecadados: �

“Capítulo IV – Das Regras do Reembolso de Energia Livre ..................................................omissis.................................................................... Seção II – Do Período com Racionamento Cláusula 5ª. Durante o período com RACIONAMENTO, as seguintes regras serão aplicadas às transações envolvendo ENERGIA LIVRE no âmbito do MAE, conforme metodologia estabelecida pela ANEEL:

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I – o GERADOR efetuará, no âmbito do MAE, o pagamento integral da ENERGIA LIVRE a ele alocada, valorada ao PMAE; II – o DISTRIBUIDOR alcançado pela RECOMPOSIÇÃO TARIFÁRIA EXTRAORDINÁRIA reembolsará o GERADOR pela diferença, se positiva, entre (i) e (ii), sendo: (i) o valor efetivamente pago pelo GERADOR em conformidade com o inciso I; e (ii) o valor de R$ 49,26 multiplicado pelo número de MWh de ENERGIA LIVRE pago pelo GERADOR. III – O REEMBOLSO MENCIONADO NO INCISO II SERÁ FEITO POR MEIO DO REPASSE PELO DISTRIBUIDOR DOS RECURSOS ARRECADADOS relativos ao percentual tarifário indicado no art. 6º da Resolução GCE nº 91, de 21 de dezembro de 2001, PERCENTUAL ESTE ESPECIFICAMENTE DESTINADO À COBERTURA DOS CUSTOS RELATIVOS A TAL REEMBOLSO E DOS CORRESPONDENTES ÔNUS TRIBUTÁRIOS, DA TAXA DE FISCALIZAÇÃO DEVIDA À ANEEL, DO ENCARGO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO (P&D) E DA RESERVA GLOBAL DE REVERSÃO (RGR), DEVIDO PELOS DISTRIBUIDORES, QUANDO A BASE DE CÁLCULO FOR A ARRECADAÇÃO, segundo disciplina a ser fixada pela ANEEL.”

Por sua vez, o § 2º da Cláusula 9ª do Acordo de Reembolso da Energia Livre regula situação distinta, referente às Condições Resolutivas:

“Capítulo VI – Das Condições Resolutivas .................................................omissis..................................................................... Cláusula 9ª. O presente ACORDO DE ENERGIA LIVRE está condicionado à .................................................omissis..................................................................... II – fixação pela ANEEL de prazo para a realização das receitas decorrentes da RECOMPOSIÇÃO TARIFÁRIA EXTRAORDINÁRIA ao final do período de recuperação tarifária fixado, respeitado o disposto no § 16 do art. 4º da Lei nº 10.438/2002. Parágrafo primeiro. Caso se opere a condição resolutiva prevista nesta Cláusula, serão restituídos todos os valores percebidos ou despendidos em decorrência dos atos normativos pertinentes ao assunto. Parágrafo segundo. Riscos relativos à efetiva arrecadação dos valores faturados correm por conta do DISTRIBUIDOR e não interferem na verificação da plena realização das receitas acima referidas.”

A finalidade do § 2º da Cláusula 9ª do Acordo de Reembolso da Energia Livre é, portanto, assegurar que as distribuidoras não pleiteariam quaisquer diferenças relacionadas à inadimplência, sob o argumento de não realização das receitas decorrentes da RTE. Sendo assim, na medida em que o item III da Cláusula 5ª e o § 2º da Cláusula 9ª do Acordo de Reembolso da Energia Livre referem-se a situações distintas, não há incompatibilidade. Adicionalmente, mesmo diante de uma aparente contrariedade entre duas regras, é necessário que o intérprete integre o sistema jurídico, de forma a descobrir a relação existente entre as regras supostamente antinômicas. Não é outro o entendimento de CARLOS MAXIMILIANO:

“140 – Não se presumem antinomias ou incompatibilidades nos repositórios jurídicos: se alguém alega a existência de disposições inconciliáveis, deve demonstrá-la até a evidência. Supõe-se que o legislador, e também o escritor do Direito, exprimiram o seu pensamento com o necessário método, cautela, segurança; de sorte que haja

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unidade de pensamento, coerência de idéias; todas as expressões se combinem e harmonizem. Militam as probabilidades lógicas no sentido de não existirem, sobre o mesmo objeto, disposições contraditórias ou entre si incompatíveis, em repositório, lei, tratado, ou sistema jurídico. Não raro, à primeira vista duas expressões se contradizem; porém, se as examinarmos atentamente (subtili animo), descobrimos o nexo oculto que as concilia. É quase sempre possível integrar o sistema jurídico; descobrir a correlação entre as regras aparentemente antinômicas. Sempre que descobre uma contradição, deve o hermeneuta desconfiar de si; presumir que não compreendeu bem o sentido de cada um dos trechos ao parecer inconciliáveis, sobretudo se ambos se acham no mesmo repositório. (...)”.(Hermenêutica e Aplicação do Direito. 19ª ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 2008, p. 110.)

Para harmonizar os textos aparentemente contraditórios e incongruentes entre si, o autor enumera várias diretrizes, dentre as quais se destacam as aplicáveis ao presente caso:

“141 – Inspire-se o intérprete em alguns preceitos diretores, formulados pela doutrina: a) Tome como ponto de partida o fato de não ser lícito aplicar uma norma jurídica senão à ordem de coisas para qual foi feita. Se existe antinomia entre a regra geral e a peculiar, específica, esta no caso particular, tem a supremacia. Preferem-se as disposições que se relacionam mais direta e especialmente com o assunto de que se trata: In toto jure generi per speciem derogatur; et illud potissimimum habetur quod ad speciem directum est – ‘em toda disposição de Direito, o gênero é derrogado pela espécie, e considera-se de importância preponderante o que respeita diretamente à espécie’. b) Verifique se os dois trechos não se referem a hipóteses diferentes, espécies diversas. Cessa, nesse caso, o conflito; porque tem ‘cada um a sua esfera de ação especial, distinta, cujos limites o aplicador arguto fixará precisamente’ (...) d) Procure-se encarar as duas expressões de Direito como partes de um só todo, destinadas a completarem-se mutuamente; de sorte que a generalidade aparente de uma seja restringida e precisada pela outra. (...) f) Prefere-se o trecho mais claro, lógico, verossímil, de maior utilidade prática e mais em harmonia com a lei em conjunto, os usos, o sistema do Direito vigente e as condições normais de coexistência humana. Sem embargo da diferença de data, origem e escopo, deve a legislação de um Estado ser considerada como um todo orgânico, exeqüível, útil, ligado por uma correlação natural(...)”.(Hermenêutica e Aplicação do Direito. 19ª ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 2008, pp. 110-111.) (Grifou-se.)

Desse modo, de acordo com as referidas regras de interpretação, a contrariedade entre o disposto na Cláusula 5ª, item III, e na Cláusula 9ª, § 2º, do Acordo de Reembolso de Energia Livre é apenas aparente, pois:

(i) a regra da Cláusula 5ª, item III, aplica-se especificamente ao repasse da energia livre, enquanto a regra da Cláusula 9ª, § 2º, refere-se às condições resolutivas aplicáveis ao Acordo Geral do Setor Elétrico, em geral, e, em particular, ao Acordo de Reembolso de Energia Livre; (ii) tanto a Cláusula 9ª, § 2º do Acordo de Reembolso de Energia Livre refere-se à generalidade dos atos e contratos celebrados sob o Acordo Geral do Setor Elétrico que tal condição resolutiva também consta da Declaração das Distribuidoras (v. Cláusula 2ª, item XI ), do Acordo de Compra de Sobras Líquidas Contratuais (v.

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Cláusula 14, § 2º ); e do Termo Aditivo ao Contrato Inicial de Compra e Venda de Energia Elétrica (v. Cláusula 8ª, § 2º ); e (iii) diante da clareza da redação do item III da Cláusula 5ª, “o reembolso mencionado no inciso II será feito por meio do repasse pelo distribuidor dos RECURSOS ARRECADADOS”, deve-se preferir tal regra à regra contida no § 2º da Cláusula 9ª do Acordo de Reembolso de Energia Livre.

Por fim, deve-se ressaltar que no Termo de Adesão ao Acordo Geral do Setor Elétrico já estava previsto que o tratamento a ser dado à Energia Livre observaria a neutralidade para as distribuidoras do reembolso da Energia Livre, de forma a garantir, além do pagamento da Energia Livre, a cobertura dos ônus de inadimplência:

“3. O tratamento a ser dado à energia livre e à recompra das sobras de contratos iniciais e equivalentes, bem como o novo mecanismo contratual para situação hidrológica crítica o racionamento observarão os seguintes princípios: .................................................omissis...................................................................... e) energia livre no período do racionamento: geradores efetuarão pagamento integral da energia livre a eles alocada valorada ao PMAE. Distribuidores com recomposição tarifária extraordinária pagarão aos geradores o montante da energia livre valorado pela diferença entre PMAE e o valor de R$ 49,26 (quarenta e nove Reais e vinte e seis centavos) por MWh, equivalente à média ponderada nacional das tarifas dos contratos iniciais do sistema interligado vigentes em 30.12.2001, por meio de acordo de reembolso de pagamento de energia livre, a ser quitado com recebíveis provenientes da parcela de recomposição tarifária extraordinária especificamente destinada a tal reembolso em período flexível, sendo os recursos provenientes dos consumidores na forma da recomposição tarifária extraordinária, de forma a garantir, além do pagamento, a cobertura dos ônus tributários e de INADIMPLÊNCIA;”

Deste modo, propõe-se limitar o repasse de Energia Livre aos valores arrecadados, como previsto no AGSE, de forma que o efeito da inadimplência sobre a respectiva parcela da RTE seja neutro para as distribuidoras.

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3. DESCONTO PELA TAXA SELIC

A Tabela 1 – Participação da Energia Livre no total da RTE, da Nota Técnica 306/09-SRE/ANEEL, mostra percentuais de Participação EL/RTE obtidos a partir dos valores homologados de Perda de Receita e Energia Livre, por empresa, “referenciados a 31 de dezembro de 2001, utilizando a Taxa Selic como desconto intertemporal”.

Para obtenção dos valores a preços de 31/12/2001, os valores homologados com data base 28/02/02, de Perda de Receita (REH 481/02) e de Energia Livre (REH 483/02 alterada pela REN 001/04), foram descontados pela Taxa Selic acumulada de 31/12/01 a 28/02/02.

No entanto, no que se refere à Energia Livre, este procedimento não está levando em conta que, financeiramente, os valores foram pagos pelos geradores, sem incidência de correção, sendo: (i) 50% do valor constante da REH 483/02 pagos em 30/12/02, como atesta a carta do MAE, CT-048/03, de 14/01/03, e (ii) o valor restante para completar o valor constante da REN 001/04, em 03/07/03, como atesta a carta do MAE, CT-584/03, de 07/07/03. Os documentos referidos encontram-se no processo 48500.003843/02, respectivamente, vol. 2, páginas 36 a 38, e no vol. 3, páginas 10 a 13.

Com efeito, inicialmente a ANEEL previu correção pelo IGPM, na Resolução 552/02, de 14/10/02, artigo 11, inciso III. Mas, após vários esclarecimentos prestados pelos geradores, inclusive justificando que a aplicação de correção monetária “causaria impactos no que determina o Acordo Geral do Setor Elétrico – AGSE (aumentado os custos para quem paga a energia livre), podendo causar desequilíbrios para uma das partes”, conforme parágrafo 6 da Nota Técnica 039/02-SEM/ANEEL, de 04/11/02, a ANEEL editou a Resolução 610/02, de 06/11/02, que, no seu artigo 2º, revoga o inciso III do artigo 11 da Resolução 552/02.

Adicionalmente, após várias manifestações dos Agentes (processo 48500.003843/02, vol. 1, páginas 122 a 162) e do próprio do Governo Federal, através do Termo de Acordo, de 19/12/02 (processo 48500.003843/02, vol. 1, página 163), “pleiteando a liquidação parcial dos montantes contabilizados de setembro de 2000 a setembro de 2002, sendo 50% do montante para pagamento imediatamente e os 50% do restante condicionados à auditoria prevista na Convenção de Mercado” e “tendo em vista que os próprios credores estariam abrindo mão de eventuais encargos financeiros e moratórios previstos nas Resoluções 552/02 e 610/02”, conforme consta da Nota Técnica 056/02-SEM/ANEEL, de 20/12/02, a ANEEL editou a Resolução 763/02, de 20/12/02, contemplando o referido parcelamento, sem incidência de correção monetária, a não ser no caso de inadimplemento.

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Como pode ser visto, tratar os valores da Energia Livre como se tivessem sido pagos em 28/02/02, considerando ainda que os geradores argumentaram que a correção monetária causaria impacto no AGSE e que os credores abriram mão da correção, no caso do parcelamento 50%/50%, seria causar um desequilíbrio financeiro às avessas, beneficiando indevidamente os geradores e, conceitualmente, à custa do consumidor pagante da RTE.

Neste sentido, o entendimento exposto no item E do Ofício Circular 074/06-SFF/SRE/ANEEL, 23/01/06, também merece ser revisto, pois, em virtude da determinação de iniciar a remuneração de 100% do saldo da Energia Livre desde o início do período de apuração, i.e. a partir de Jan/03, tal remuneração foi paga pelos consumidores já a partir dessa data (particularmente no caso das empresas que amortizaram 100% dos saldos), embora os geradores tivessem desembolsado apenas metade desses valores em Dez/02 e a outra metade somente em Jul/03, sem correção monetária.

Portanto, a partir da implementação do exposto no ofício supracitado, houve superestimação do saldo de Energia Livre, acarretando em ganhos indevidos para as geradoras, no caso das distribuidoras que amortizaram seus saldos antes do prazo máximo definido pelo regulador, às custas dos consumidores. Para aquelas distribuidoras que não conseguiram amortizar os seus saldos dentro do prazo máximo, não se pode afirmar com segurança que os consumidores pagaram valores indevidos aos geradores, pois cada caso deve ser analisado individualmente.

No entanto, para as distribuidoras que não amortizaram os saldos dentro dos prazos máximos, a aplicação da proposta na Minuta de Resolução da AP 034/09, implicará em arcar com a remuneração da Energia Livre referente ao período de Janeiro de 2002 a Dezembro de 2002, o que, além de indevido, acarretará em tratamento desigual entre as distribuidoras, pois aquelas que amortizaram seus saldos antes do prazo não incorrerão neste custo.

Deste modo, propõe-se que a apuração do saldo inicial de Energia Livre referenciado a 31/12/01, se dê através do desconto pela Taxa Selic acumulada de 31/12/01 a: (i) 30/12/02, para 50% do valor constante da REH 483/02 e (ii) 03/07/03, para o valor complementar do montante constante da REN 001/04.

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4. COLIGAÇÃO CONTRATUAL ENTRE OS ACORDOS DE REEMBOLSO DE ENERGIA LIVRE E DE COMPRA DE SOBRA LÍQUIDA

Considerando que a ANEEL entende ser aplicável o princípio da repartição equânime dos prejuízos sofridos pelas geradoras – vide parágrafo 6 da Nota Técnica 306/2009-SRE-SFF/ANEEL – e pelas distribuidoras no âmbito do Acordo Geral do Setor Elétrico, então, cabe analisar (i) qual a abrangência da expressão ‘Acordo Geral do Setor Elétrico’, para, em seguida, (ii) verificar-se se tal princípio está sendo efetivamente observado pela Agência na implementação das regras constantes do referido acordo.

Sabe-se que: (i) o Acordo de Reembolso de Energia Livre; (ii) a RTE; (iii) o repasse às tarifas de fornecimento das variações de valores de itens da “Parcela A” dos contratos de concessão de distribuição de energia elétrica verificadas no exercício de 2001 (“Repasse da Parcela A”); (iv) o Acordo de Compra de Sobras Líquidas Contratuais (“ACSLC”); (v) o aditamento aos Contratos Iniciais; e (vi) as Declarações de Renúncia firmadas pelas concessionárias de distribuição e geração de energia elétrica integram, em seu conjunto, o Acordo Geral do Setor Elétrico.

Em outras palavras, entende-se que o Acordo Geral do Setor Elétrico não deve ser tratado como sinônimo de um ou outro item acima isoladamente, pois os diversos agentes do setor elétrico que aderiram ao Acordo Geral do Setor Elétrico e a própria União Federal que com esse consentiu, apenas o quiseram como um todo.

As características do Acordo Geral do Setor Elétrico, acima apontadas, podem ser atreladas à definição de contratos coligados, conforme se verifica pela leitura da lição de FRANCISCO PAULO DE CRESCENZO MARINO abaixo transcrita:

“Contratos coligados podem ser conceituados como contratos que, por força de disposição legal, da natureza acessória de um desde ou do conteúdo contratual (expresso ou implícito), encontram-se em relação de dependência unilateral ou recíproca. Da noção apresentada podem-se deduzir os dois ‘elementos essenciais’ da coligação contratual juridicamente relevante: (i) pluralidade de contratos, não necessariamente celebrados entre as mesmas partes; (ii) vínculo de dependência unilateral ou recíproca”. (Contratos Coligados do Direito Brasileiro. Tese de Doutoramento apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Orientados: Professor Antonio Junqueira de Azevedo. São Paulo, 2007. p. 120)

Note-se que, de acordo com a definição acima, a coligação entre contratos pode resultar de disposição legal, entendimento esse também pactuado por ORLANDO GOMES:

“Os contratos coligados são queridos pelas partes contratantes como um todo. Um depende do outro de tal modo que cada qual, isoladamente, seria desinteressante. (...) A coligação dos contratos pode ser necessária ou voluntária. A coligação necessária, também chamada genética, é imposta pela lei, como a que existe entre o

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contrato de transporte aéreo e do de seguro do passageiro”. (Contratos. 26ª ed.Rio de Janeiro : Forense, 2007. pp.121-122)

No caso ora em análise, a coligação entre o conjunto de contratos que integra o Acordo Geral do Setor Elétrico provém da lei, tendo sua disciplina prevista no artigo 4º da Lei nº 10.438/2002 (anteriormente artigo 4º da Medida Provisória nº 14/2001).

De fato, ao vincular a homologação da RTE a que fazem jus as concessionárias de distribuição de energia elétrica às diversas condições abaixo descritas, inclusive à adesão, pela maioria qualificada das distribuidoras e geradoras sujeitas aos contratos iniciais e equivalentes, aos acordos firmados entre os agentes do setor elétrico (i.e. ao Acordo Geral do Setor Elétrico), a Lei nº 10.438/2002, em seu artigo 4º, acabou por estabelecer uma relação de dependência recíproca, característica dos contratos coligados, entre a RTE, de um lado, e, de outro lado: (i) o Acordo de Reembolso de Energia Livre; (ii) o Repasse da Parcela A; (iv) o Acordo de Compra de Sobras Líquidas Contratuais; (v) o aditamento aos Contratos Iniciais; e (vi) as Declarações de Renúncia.

A seguir são elencadas as condições estipuladas sob o artigo 4º da Lei nº 10.438/2002 que estabelecem a relação de dependência recíproca entre os diversos itens acima que, em seu conjunto, compuseram o Acordo Geral do Setor Elétrico:

(i) adesão aos acordos firmados entre os agentes do setor elétrico, pela maioria qualificada das distribuidoras e geradoras sujeitas aos contratos iniciais e equivalentes, nos termos de resolução da ANEEL (artigo 4º, § 5º, inciso VII);

(ii) declarações, compromissos, termos aditivos e transações entre

as partes, em relação a estipulações contratuais, em especial no que concerne à parcela das despesas de que cuida o artigo 2º da Lei nº 10.438/2002 (i.e. disciplinadas no Acordo de Reembolso de Energia Livre) não alcançada por repasse aos consumidores e aos excedentes dos contratos iniciais e equivalentes (i.e. disciplinados sob o Acordo de Compra de Sobras Líquidas Contratuais) (artigo 4º, § 5º, inciso IV);

(iii) solução de controvérsias contratuais e normativas e eliminação

e prevenção de eventuais litígios judiciais ou extrajudiciais, inclusive por meio de arbitragem (artigo 4º, § 5º, inciso V);

(iv) observância do disposto no artigo 2º “parágrafo único” (i.e. à

transação objeto do Acordo de Reembolso de Energia Livre), e observância do disposto no artigo 6º, §1º, da Lei nº 10.438/2002 (i.e. às renúncias relacionadas ao Repasse da Parcela A), renúncia ou desistência de qualquer pleito, judicial ou

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extrajudicial, junto ao Poder Concedente ou aos agentes do setor elétrico, relativo a fatos e normas concernentes ao PERCEE, à RTE e aos demais dispositivos da Lei nº 10.438/2002 (artigo 4º, § 5º, inciso VI); e

(v) aditamento aos contratos iniciais e equivalentes para

contemplar fórmula compulsória de solução de controvérsias, passível de instauração ex officio pela ANEEL, e arbitragem (artigo 4º, § 8º).

Assim sendo, se o Acordo Geral do Setor Elétrico (i) abrange diversos contratos coligados, dentre eles o ACSCL; e (ii) é orientado pelo princípio da repartição equânime dos prejuízos; então, tal princípio será plenamente verificado caso, considerados também os prejuízos do ACSLC, as distribuidoras e as geradoras de energia elétrica tenham sofrido prejuízos equivalentes.

Em vista do exposto, passa-se a analisar, a seguir, quais foram os prejuízos sofridos pelas distribuidoras de energia elétrica no âmbito do ACSLC.

Prejuízos do Acordo de Compra de Sobras Líquidas Contratuais

De uma forma esquemática, a partir da redução da energia gerada dada pela condição de racionamento, as Distribuidoras ficaram com sobras contratuais, que poderiam em tese ser liquidadas no MAE. No entanto o disposto do ACLC foi que este excedente fosse devolvido a custo zero para as Geradoras.

Para a apuração deste montante os volumes de contratos foram reduzidos por fatores redutores1, conforme esquema abaixo:

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1 Calculados conforme metodologia definida nas Resoluções ANEEL nos 031/2002 e 369/2002

Contratos Iniciais

Comprados

Cota de Itaipu

Geração Própria da D

Sobras Contratuais

Energia Consumida

Energia ContratadaFator de Redução

Devolução da energia para as Geradoras a custo zero

Exposição das

Geradoras

Distribuidoras pagaram para as Geradoras ao preço dos Contratos Iniciais

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Conforme apresentado no esquema anterior, as sobras líquidas contratuais correspondem à diferença positiva entre os seguintes itens:

(i) A soma, com relação a cada agente de distribuição de (a) montantes de energia elétrica dos Contratos Iniciais e equivalentes, (b) energia alocada de Itaipu; e (c) energia alocada de geração própria; e

(ii) A carga efetivamente consumida por cada concessionária de distribuição.

Note-se que estas sobras líquidas correspondem a uma virtual energia entregue que serviu de base para o cálculo da Perda de Receita da distribuidora conforme Resoluções 031/02, de 24/01/02 e 369/02, de 03/07/02.

Ou seja, estava implícita na Perda de Receita da distribuidora, uma perda de receita da geradora decorrente do racionamento, que foi integralmente paga pelas distribuidoras aos geradores.

Cabe destacar que o mecanismo apresentado acima também é retratado na Nota Técnica 306/2009-SRE/ANEEL no parágrafo 11, conforme apresentado a seguir:

A cláusula sexta do ACSLC prevê que as sobras líquidas contratuais ocorridas durante o período do racionamento não poderiam ser vendidas novamente e que os créditos pecuniários decorrentes dessas sobras

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deveriam ser divididos entre os geradores de energia elétrica, sem nenhum ônus adicional para esses agentes.

Em outras palavras, ocorreu uma recompra da energia excedente pelas geradoras a preço nulo.

Percebe-se, então, que (i) de um lado, as geradoras tiveram um benefício que foi o crédito pecuniário por uma energia que não foi entregue às distribuidoras; e (ii) de outro lado, as distribuidoras tiveram de pagar pela energia excedente que já havia sido contratada sob os Contratos Iniciais, apesar de não terem usufruído dessa energia.

Desta forma, propõe-se que o benefício auferido pelos geradores sem perdas, e pago de imediato pelas distribuidoras, seja considerado para fins da correção dos desequilíbrios no âmbito do Acordo Geral do Setor Elétrico.

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5. EQUILÍBRIO DOS PRAZOS MÍNIMOS DA RTE

Tendo em vista a aplicação do princípio da repartição equânime dos prejuízos sofridos pelas geradoras e pelas distribuidoras tal como pretende a ANEEL, por maioria de razão, entende-se que a ANEEL poderia rever a situação de “desequilíbrio” existente entre as concessionárias de distribuição, na medida em que as premissas adotadas pela Agência acarretaram no excesso de prazo de RTE para certas concessionárias e insuficiência de prazo para outras.

Em outras palavras, em razão de circunstâncias supervenientes distintas daquelas presumidas pela Agência para efetuar os cálculos do prazo pelo qual a RTE deveria vigorar, de um lado, certas concessionárias de distribuição recuperaram integralmente o montante de RTE calculado pela ANEEL em período inferior ao estipulado para tanto; e, de outro lado, certas concessionárias ficaram impossibilitadas de recuperar integralmente, no prazo máximo estipulado pela ANEEL, o montante de RTE a que fariam jus.

Ou seja, se a RTE, conforme sustenta a ANEEL, também tem a finalidade de assegurar a repartição equânime, i.e. isonômica, dos prejuízos impostos às concessionárias de distribuição e aos geradores no período do racionamento, então os prejuízos sofridos pelas concessionárias de distribuição entre si também devem ser equânimes.

Contudo, diferentemente das demais concessionárias de Geração as distribuidoras não tiveram tratamento equânime dos prejuízos auferidos, e a razão de tal tratamento diferenciado é originada na verificação ou não das premissas adotadas pela ANEEL para a fixação dos prazos máximos de RTE, de caráter aleatório, fugindo completamente ao controle e à administração tanto da ANEEL como da concessionária, e acarretando em tratamento não isonômico.

A fim de reverter esta situação, em observância aos princípios constitucionais da legalidade, finalidade e isonomia, sugere-se que a ANEEL edite novos atos que recalculem, para efeito de equalizar, os prazos máximos de RTE das concessionárias em relação às quais os prazos de RTE originalmente fixados se revelaram insuficientes ou excessivos, de forma a distribuir de forma equânime as perdas entre as concessionárias de distribuição.

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6. TRATAMENTO DO FLUXO DE CAIXA

O parágrafo 2º do artigo 2º da Minuta de Resolução, disponibilizada pela ANEEL no âmbito da AP 034/09, determina que o repasse final da Energia Livre corresponda à diferença entre o saldo do respectivo passivo, apurado conforme (i) REH 036/03 e REH 045/04 e (ii) o apurado conforme parágrafo 1º do mesmo artigo.

Complementarmente, o artigo 5º prevê que nos casos em que essa diferença for negativa, as distribuidoras é que serão ressarcidas pelos geradores signatários da Energia Livre.

No entanto, devido à diferença de considerações referentes ao desconto intertemporal entre as duas metodologias, principalmente no período Jan/02 a Jun/03, bem como em função da consideração do benefício dos geradores resultante das Sobras Líquidas Contratuais durante o período de racionamento, pode haver grandes distorções nos saldos finais.

Desse modo, pode ser mais adequado desenvolver outra forma de apuração, a qual, dada a complexidade do tema, deveria ser objeto de Consulta Pública específica.