AUTOESTIMA Afetividade e Transformacao Existencial

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1 AUTOESTIMA AFETIVIDADE E TRANSFORMAÇÃO EXISTENCIAL Dedicatória Dedico esta obra aos meus pais adotivos, Rosa e José (em memória) que, principalmente no breve tempo de convivência em criança, me nutriram com valores virtuosos, exemplos profícuos, amor e afeto, motivando minha autoestima e minha capacidade de superação. Às minhas amadas filhas, Danielle e Carolline, por existirem e enriquecerem minha vida afetiva, contribuindo para que eu me instituísse uma pessoa melhor.

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    AUTOESTIMA

    AFETIVIDADE E TRANSFORMAO EXISTENCIAL

    Dedicatria

    Dedico esta obra aos meus pais adotivos, Rosa e Jos (em

    memria) que, principalmente no breve tempo de convivncia

    em criana, me nutriram com valores virtuosos, exemplos

    profcuos, amor e afeto, motivando minha autoestima e

    minha capacidade de superao. s minhas amadas filhas,

    Danielle e Carolline, por existirem e enriquecerem minha vida

    afetiva, contribuindo para que eu me institusse uma pessoa

    melhor.

  • 2

    Agradecimento

    A todas as pessoas da minha famlia universal que, de algum

    modo, me influenciaram positivamente e que fizeram e fazem

    parte da minha histria, em todas as suas dimenses.

    Antepassados, familiares, minha ex-esposa, Rita que me

    auxiliou com comentrios e reviso , professores,

    educadores, mentores, Anny Meiry minha companheira e

    incentivadora , clientes, companheiros e companheiras de

    trabalhos voluntrios, colegas, amigos e amigas de todos os

    tempos e lugares.

  • 3

    Como se Fosse um Prefcio

    Ou nos amamos, ou nos aniquilamos. Todos juntos. Jos ngelo Gaiarsa

    A minha pretenso era que o prefcio desta obra fosse escrito pelo o Dr. Jos

    ngelo Gaiarsa1, pela admirao que sempre nutri por este, querido, mestre um Rechiano

    e humanista convicto , em razo de sua coerncia, arrebatadora, demonstrada no seu

    programa da TV Bandeirantes, nos anos 1980 e 1990, ao qual eu assistia quase que

    religiosamente. Em essncia, por afinidades e identificao de longa data, que vieram a

    influenciar mudanas em minha vida.

    Estive com Dr. Jos ngelo, pessoalmente, uma nica vez durante um seminrio

    em So Paulo , quando uma conversa, breve, foi suficientemente marcante para que eu

    pudesse sorver, com prazer, uma rara frao da sua sabedoria, humildade, desprendimento e

    amor pelo seu ofcio. Enfim, porque foi dele a inspirao mais incisiva, para vir a tornar-me

    psicoterapeuta. Anos depois, autorizou-me a divulgar seus textos em meu site, com um e-

    mail muito carinhoso.

    1 Jos ngelo Gaiarsa (1920/2010). Mdico psiquiatra, introdutor das tcnicas corporais em psicoterapia no Brasil. Alm da obra j

    citada, escreveu inmeros livros, entre eles: Couraa Muscular e Carter, Educao Familiar e Escolar Para o Terceiro Milnio, Tratado Geral sobre a Fofoca, Sexo Tudo que Ningum Fala Sobre o Tema .

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    Resumindo, como ele passou para a dimenso espiritual em outubro de 2010

    tempo em que eu ainda escrevia esta obra , no foi possvel solicitar o prefcio. Sendo

    assim, resolvi homenage- lo, neste breve espao, compartilhando alguns valiosos

    fragmentos de uma das suas reflexes:

    preciso comear a trocar carcias, a proporcionar prazer, a fazer com o

    outro todas as coisas boas que a gente tem vontade de fazer e no faz, porque

    "no fica bem" mostrar bons sentimentos! No nosso mundo negociante e

    competitivo, mostrar amor um mau negcio. O outro vai se aproveitar, explorar,

    cobrar... Chega de negociar com sentimentos e sensaes. Vamos nos reforar

    positivamente. o jeito o nico jeito de comearmos um novo tipo de convvio social, uma nova estrutura, um mundo melhor.

    Freud ajudou a atrapalhar mostrando o quanto ns escondemos de ruim;

    mas fcil ver que ns escondemos tambm tudo que bom em ns: a ternura, o

    encantamento, o agrado em ver, em acariciar, em cooperar, a gentileza, a alegria,

    o romantismo, a poesia, sobretudo o brincar com o outro. Tudo tem que ser srio,

    respeitvel, comedido - fnebre, chato, restrit ivo, contido... Proponho um tema

    para meditao profunda; a lio mais fundamental de toda a Psicologia

    Dinmica:

    S sabemos fazer o que foi feito conosco.

    S conseguimos tratar bem os demais se fomos bem tratados.

    S sabemos nos tratar bem se fomos bem tratados.

    Se s fomos ignorados, s sabemos ignorar.

    Se s fomos odiados, s sabemos odiar.

    Se fomos malt ratados, s sabemos maltratar.

    No h como fugir desta engrenagem de ao:

    Ningum feliz sozinho.

    Ou o mundo melhora para todos ou ele acaba.

    Amar o prximo no mais idealis mo " mstico" de alguns.

    Ou aprendemos a nos amar ou liquidaremos com a nossa espcie.

    Ou aprendemos a nos tratar bem a nos acariciar ou nos destruiremos.

    Carcias a prpria palavra bonita. Carcias... Olhar de encantamento descobrindo a divindade do outro meu espelho!

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    Apresentao

    Quem acende uma luz

    o primeiro a beneficiar-se da claridade. Gilbert Chesterton

    Este um livro sobre autoestima e transformao existencial. Sobre mudana

    aprendida, vivenciada e compartilhada ao longo do tempo. No o classifico como um livro

    de autoajuda porque, em sua gnese, ele no se prope a dar respostas, regras ou verdades

    definitivas. Pretende, apenas, provocar reflexes, mesmo quando sugere aes. Muito do

    saber nele contido, foi de algum modo experimentado em minha jornada de superao, o

    que no significa que devo ter aprendido tudo, uma vez que, a vida, um contnuo

    aprendizado.

    Quando escrevi meu primeiro livro: Cidadania, O Direito de Ser Feliz, o fiz de

    modo bastante incisivo, atribuindo s minhas superaes, principalmente, os valores

    apreendidos na breve convivncia, de dois a sete anos de idade, com meus pais adotivos,

    Rosa e Jos, responsveis por avivarem, em mim, a existncia, e por moldarem o meu

    carter e a base da minha personalidade. Isso, somado s minhas vivncias, ao

    conhecimento adquirido com muito empenho por muitas e mltiplas leituras desde a

    mais tenra idade (aprendi a ler entre trs e quatro anos), e, por fim, aos estudos e s

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    observaes constantes da vida. Elementos que, alm de motivar toda minha trajetria para

    instituir-me cidado dotado de autoestima, me transformou em uma pessoa inquieta,

    inquiridora e reativa a situaes limitadoras.

    Este livro, de certo modo, segue a mesma vertente da obra citada, j que a ideia de

    escrev- lo nasceu ao mesmo tempo, porquanto, em um dos seus captulos, fiz meno sobre

    a importncia da autoestima para o exerccio qualificado da cidadania, o que me leva a

    afirmar que: como se fora uma semente, h mais de uma dcada, este livro vinha

    germinando.

    Apesar de utilizar de alguns conceitos que so de uso corrente na rea teraputica e

    comportamental, cuidei para que esta obra no fosse, apenas, uma mera repetio deles. Por

    isso, imprimi caractersticas prprias que, normalmente, esto presentes em artigos que

    escrevo, tais como, o hbito de sintetizar ideias para torn- las mais inteligveis aos olhos do

    leitor e o uso de um tom, que eu denomino de mais coloquial. Isto pela convico de que,

    seja qual for a verdade, ela simples, no havendo razo para complic-la, apenas, para

    demonstrar erudio.

    Mesmo em cenrios diferentes como a rua, abrigos e educandrios para menores

    onde vivi enquanto criana e adolescente ou na minha lida como boia fria, trabalhador

    braal e outros tantos labores ou, ainda, quando, mais frente, estudei filosofia, direito,

    psicanlise e outras incontveis abordagens comportamentais, sociolgicas, religiosas e

    espiritualistas. Nunca me contentei em ser mero expectador da histria, pelo contrrio,

    sempre busquei intervir como sujeito de sua transformao, sem perder de vista minha

    prpria mudana. Em razo disso, no pense voc, leitor, que vai encontrar nestes escritos

    um tratado intelectualizado sobre o tema proposto, apenas encontrar um depoimento,

    ntido e genuno, do que descobri na realidade provada em todos os seus sabores e nas mais

    diversas fontes.

    Em sntese, a base desse labor est relacionada ao fato de que, ao assumir ser

    observador de mim mesmo e do ambiente minha volta, deixei de acreditar em verdades

    absolutas, por entender que a capacidade de angariar conhecimento, pensar e aprender deve

    ter, como fim, uma reflexo racional, realista e propositiva, contribuindo, de modo

    significativo, para que formemos nossa prpria concepo do contexto em que estamos

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    inseridos e o papel que queremos ou devemos desempenhar nele. Os tolos acreditam no que

    dizem os outros; os sbios no que veem e compreendem.

    Escrevo e falo sobre autoestima em artigos e palestras motivacionais, a princpio,

    como autodidata, precisamente, desde o ano de 1985. Portanto, so tambm esses saberes,

    adquiridos ao longo dessa jornada, que amparam e qualificam a minha pretenso ao ousar

    escrever esta obra e trat-la, no s teoricamente, mas, principalmente, sob o prisma do

    aprendizado vivido no decorrer da minha trajetria, at os tempos atuais, onde, por vias

    muitas vezes tortuosas, doloridas e outras nem tanto , acabei por descobrir que: o que me

    moveu at aqui foi uma noo, em determinadas ocasies no muito clara, mas profunda,

    do poder da autoestima.

    Observem que o ousar, neste contexto, no significa apresentar algo

    absolutamente novo, mas, apresentar um enfoque diferenciado, inteligvel e verificvel

    de tudo quanto foi meu aprendizado at agora, estabelecendo novas conexes, dando uma

    diferente amplitude a conceitos j existentes, ou reescrevendo-os e repensando-os sob a

    tica singular da valorizao da criatura humana, em todas as suas mltiplas dimenses. E

    mesmo que, em determinadas ocasies, alguns enfoques ou citaes possam soar

    repetitivos, adianto que isto proposital, dado que, em certas circunstncias, a

    recorrncia parte integrante da comunicao e do prprio exerccio de aprender.

    O leitor encontrar, tambm, nesta obra, algumas referncias a conceitos, tanto da

    psicanlise, quanto de abordagens comportamentais diferenciadas, tais como, a Anlise

    Transacional, Programao Neurolingustica, Gestalt terapia, Logoterapia, Psicologia

    Transpessoal e Humanista, entre outras. Isto por fora de que, como estudioso

    comportamental, psicoterapeuta, consultor e conferencista motivacional, me considero

    aberto a tudo quanto possa ser acrescentado para a compreenso da pessoa humana em

    sua integralidade. Vale ressaltar, ainda, que a busca pelo conhecimento tal qual a

    formao de um imenso quebra-cabea, onde, a cada dia, a cada saber adquirido, vamos

    colocando novas peas, buscando dar nitidez quilo que, antes obscuro e no aparente,

    queremos demonstrar ou, simplesmente, compreender.

    Por fim, a verdade que o objetivo primeiro desta obra o de partilhar o saber

    adquirido nesse aprendizado contnuo, que foi, e continua sendo, a minha existncia, pois, a

    meu ver, todo conhecimento no experimentado e compartilhado intil, posto que,

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    quando ele apenas serve ao ego de quem o detm, acaba por diluir-se em si mesmo e

    perecendo sem transformar-se em sabedoria. Assim, como toda semente tem como fim

    germinar, crescer e frutificar, ns, criaturas humanas, temos como tarefa algo que, para

    mim, vai alm do vo determinismo do nascer, crescer, envelhecer e morrer. Porquanto

    creio que o nosso propsito superior o de aprender, amadurecer, evoluir e produzir bons

    valores e exemplos.

    A voc, que me d o prazer dessa leitura, desejo, apenas, que sinta e aceite este

    escrito como um convite a uma reflexo construtiva e transformadora. Como uma boa,

    simples e saborosa prosa de pessoa para pessoa, sem a pretenso da verdade absoluta.

    Apenas a verdade em construo, deste que lhe escreve, uma vez que, como bem afirmou

    Wilhelm Reich2, no livro Escuta, Z Ningum: A verdade que todo o mdico, sapateiro,

    mecnico ou educador, que queira trabalhar e ganhar o seu po, deve reconhecer as suas

    limitaes.

    Creio que foi o historiador e ensasta escocs, Thomas Carlyle, que viveu na era

    vitoriana, quem disse: O melhor efeito de qualquer livro quando ele impele o leitor

    atividade. Eu acredito nisso, porque li muitos bons livros que me remeteram ao.

    Sendo assim, espero que este livro cumpra tambm esse papel. Que o leitor encontre em

    seu texto, ou subtexto, algo que possa gerar, no mnimo, uma boa reflexo. Desvend-lo,

    ento, fundamental. Cada palavra contm mais que letras. Possui sons e setas.

    2 Wilhelm Reich, (1897/1957), austro-americano, discpulo dissidente de Sigmund Freud, psiquiatra e psicanalista, que

    muito contribuiu para o entendimento da psique humana. sua a frase: Amor, conhecimento e trabalho so as fontes da nossa vida. Deveriam tambm govern-la. Entre outras obras, destacam-se: Anlise do Carter; A Revoluo Sexual, A Funo do Orgasmo, O Assassinato de Cristo e Escuta Z Ningum.

  • 9

    Introduo

    A autoestima a chave para entendermos

    a ns mesmos e os outros. Nathaniel Branden

    A autoestima uma necessidade essencial para a vida humana, que se quer saudvel

    e equilibrada. Por isso, independentemente do estgio existencial de cada indivduo,

    imprescindvel aprender sempre mais sobre ela, para desenvolv- la e aperfeio-la,

    constantemente. Em sendo assim, o que sugiro, no decorrer deste livro, uma leitura sem

    pressa e reflexiva para que esta tarefa torne-se motivadora e frutfera. Isto porque, para

    mudar, melhorar ou equilibrar a autoestima, necessrio ter claro que essa mudana

    acontece, primeiramente, no plano interno de cada indivduo, de dentro para fora, para,

    depois, transformar-se em novos hbitos e condutas com repercusses externas. O que, em

    outras palavras, significa dizer que, para apurar a autoestima, antes preciso investir no

    autoconhecimento e no uso apropriado dos mecanismos mentais e de inteligncia, para,

    assim, adotar novas e saudveis posturas diante da vida e do universo que a contm.

    Na primeira parte, alm de chamar a ateno para fenmenos comportamentais

    que nos afetam sobremaneira , como a cultura da autodesvalorizao e a banalizao

    recorrente em voga na atualidade, trato tambm de elementos que considero como

    predisposies para a ausncia de autoestima ou para que ela seja baixa situaes a que

    todos, em algum grau, estiveram ou esto sujeitos desde o incio da sua vida.

    Na segunda parte, alm da definio de autoestima e dos seus principais

    componentes, discorro sobre o aprimoramento deles e das prticas que, se levadas a um

    bom termo, podero resultar numa autoestima sadia e equilibrada.

    Na terceira parte, reforo alguns princpios da autoestima, estabelecendo algumas

    pontes para o seu aprimoramento, conectando-a, objetivamente, a situaes onde ela serve

    de referncia e estmulo para condutas existenciais, saudveis e evolutivas.

    De modo geral, cada assunto retratado nesta obra est aberto a um aprofundamento

    maior. E mesmo aqueles conceitos que, por ventura, o leitor j tenha tido contato em outras

    leituras sobre o tema, so aqui tratados sob a tica vivencial, ou seja, como os tenho

    experimentado em minha existncia, assim como venho observando, profissionalmente, na

    vida de um nmero bastante significativo de clientes, nestes mais de 17 anos de prtica

    teraputica e motivacional.

  • 10

    Particularmente, j comprovei que a obteno do conhecimento, por si s, no

    suscita, automaticamente, uma prtica que corresponda a ele, ou seja, inegvel a distncia

    que separa a teoria da prtica. Da que, em meu processo de aprendizado que, de certo

    modo, embasa este livro , muitas vezes, inverti esse caminho porque, primeiro, vivenciei

    para depois vir a reconhecer a teoria que validava a minha prtica. Alis, em se tratando de

    ideias, creio ser notrio que ningum dono delas. Principalmente quando se referem a

    assuntos comportamentais, educacionais ou humansticos.

    Tudo bem! As ideias esto a para serem divulgadas e compartilhadas. Nem tudo o que

    pensamos verdadeiramente novo. possvel, at, que, neste preciso instante, em algum

    outro lugar do universo, algum esteja pensando o mesmo que penso agora, tendo uma

    ideia absolutamente similar minha. Desta forma, seria muita prepotncia algum acreditar

    que s ele pensa desta ou daquela forma, j que, no plano superior das ideias, h um

    inesgotvel e constante vir a ser. Logo, viver bastante simples. O complicado, talvez,

    seja compreender o ser humano e a viso desvirtuada que ele, em geral, tem de si mesmo e

    do universo ao qual faz parte. Algo como diz a cano de Renato Teixeira 3:

    O maior mistrio haver mistrios.

    Ai de mim, senhora natureza humana.

    Olhar as coisas como so, quem dera!

    E apreciar o simples que de tudo emana....

    Alm dos captulos relacionados diretamente com o tema central, aqui abordado, o

    leitor tambm encontrar, concomitantemente, abordagens sobre educao de filhos. Tema

    que acredito ser importante, no s para provocar uma reflexo analtica sobre o modo

    como a pessoa adulta foi educada, mas, para, igualmente, servir como elemento de reflexo,

    tanto para aqueles que pretendem ser pais, quanto os que j esto na fase de educar seus

    filhos. Isto porque entendo que extremamente importante dar ateno qualidade da

    educao que repassada aos filhos, principalmente em seu aspecto afetivo-emocional,

    3 Renato Teixeira, compositor e msico brasileiro, com uma vasta obra musical dedicada, por razes bvias, ao resgate

    da autntica msica, caipira, denominada de raiz.

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    uma vez que esse um elemento chave na formao da autoestima deles e definidor dos

    sucessos ou fracassos que viro a experimentar em suas vidas.

    Essa abordagem tambm visa contribuir para a melhoria da prtica educativa de

    professores e educadores, em geral, em funo de que estes tambm intervm na educao

    de crianas, adolescentes e jovens.

    Dedico tambm, na parte final desta obra, um breve captulo para informar sobre o

    Renascimento. Para muitos, apenas uma tcnica respiratria, mas, que, em minha

    experincia teraputica, acoplado a uma metodologia prpria, tem demonstrado uma

    significativa amplitude na obteno de resultados eficientes, no cuidado de estados

    depressivos, ansiedade, stress, traumas, bloqueios emocionais e fobias, como a sndrome do

    pnico e outros tantos desconfortos.

    Principalmente a partir da segunda parte deste livro, apesar dos captulos

    obedecerem a certa ordem sequencial, alguns deles, s vezes, trazem um tema, em si

    mesmos, podendo ser lidos e analisados, de modo destacado e singular, como se fossem

    artigos. Que este livro lhe inspire aes transformadoras...

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    Desconstruir para Construir

    Caminhos bons existem.

    Mas, s vezes, preferimos os atalhos,

    na esperana de chegar mais depressa. Willes

    Na vida exterior, s vezes, necessrio pr a casa abaixo para reconstru- la em

    bases mais fortes, para suportar as intempries. Feito isso, abrigamo-nos com mais

    segurana e desfrutamos de maior conforto. Assim tambm com a nossa casa interior. Se

    nos sentimos inseguros dentro dela, se somos alvo do medo, da apreenso, da frustrao,

    enfim, se nos sentimos desconfortveis conosco sinal de que algo no est bem em nossa

    estrutura, naquilo que nos mantm ou fortalece. Ento, nesse momento que necessitamos

    parar e avaliar como, verdadeiramente, estamos interiormente. chegada a hora de

    fazermos, a ns mesmos, determinadas indagaes acerca dos valores, princpios ou

    crenas que tm norteado a nossa jornada existencial.

    Caminhos bons existem. Mas, s vezes, preferimos os atalhos na esperana de

    chegarmos mais depressa. Porm, ante o inesperado da desconhecida trilha, so esses

    mesmos atalhos que, muitas vezes, fazem com que nos percamos de ns e da prpria vida,

    algumas vezes, numa passagem de ida sem volta. fcil culpar o imprevisvel ou aos

    outros pelas nossas quedas e fracassos. O mais difcil talvez seja responsabilizarmo-nos

    pelas nossas prprias escolhas ou, no mnimo, termos a humildade de reconhecermos

    nossos desacertos.

    Desconstruir-se, ento, significa revelar-se, por inteiro, a si mesmo para,

    conscientemente e com presteza, iniciar um processo de eliminao e desapego de tudo

    quanto foi apreendido de negativo, em seu modelo vivencial e comportamental. Para

    muitos, pode at ser penoso desligar-se de antigas crenas, vcios, deficincias, medos,

    iluses e valores inapropriados, mas no h outro caminho, que no seja este, para pr fim

    ao que causa sofrimento, inadequao ou frustraes, que comprometam o equilbrio e o

    bem-estar desejado. O verdadeiro e profundo transformar-se passa, decisivamente, por

    esta singular e extraordinria vivncia interior de superao de si mesmo, j que nesse

    alojamento particular que reside a base de conduta de toda criatura.

    Feito isto, inicia-se uma nova construo da vida, baseada em posturas

    seletivamente conscientes, produtivas e saudveis, onde a humildade em aprender a cada

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    dia e a perseverana devem direcionar os fazeres de forma progressiva e constante. E, nesse

    construir de novo, h de existir espao, no s para as realizaes do corpo e da

    materialidade, posto que haja de se pensar em alimentar o esprito e tudo quanto seja

    igualmente proveitoso e motivador para aqueles que se encontram sua volta, s vezes,

    esperanosos por uma luz, que tambm os despertem para um novo, saudvel e prazeroso

    modo de viver.

    Em sntese, este texto de abertura como se fosse uma prvia definio da

    destinao deste livro, que , ao mesmo tempo, um convite e uma contribuio para aquelas

    pessoas que, com muita coragem e persistncia, desejam edificar conscientemente sua

    nova casa, sua nova vida.

  • 14

    SUMRIO

    Pginas

    Dedicatria

    02

    Agradecimentos 03

    Como se Fosse um Prefcio 04 Apresentao 06

    Introduo 10 Desconstruir para Construir 13 Prefcio 15

    Parte 1 O Que Influencia a Autoestima 17

    Captulo I A cultura da Autodesvalorizao 18 Captulo II A Banalizao da Autoestima 23

    Captulo III Causas da Baixa Autoestima 25 Captulo IV O Trauma do Nascimento 28

    Captulo V A Rejeio Parental 33 Captulo VI A Influncia da Educao 36 Captulo VII Educao Crtica 38

    Captulo VIII Consideraes Sobre Pais Crticos 49 Captulo IX Educao Nutritiva 51

    Captulo X Consideraes Sobre Pais Nutritivos 55 Captulo XI Educando Filhos com Autoestima 56 Captulo XII Sistema de Crenas Limitadoras 59

    Parte 2 O Foco na Autoestima

    Captulo I A Essncia do Amor por si Mesmo 63 Captulo II Um Sentimento Interior 65 Captulo III O Valor da Autoestima 68 Captulo IV A Manifestao da Autoestima 70

    Captulo V O Princpio da Auto Aceitao 72 Captulo VI Autovalorizao 75 Captulo VII Autoconfiana 79

    Captulo VIII O Respeito por Si Mesmo 83 Captulo IX Ser Auto Responsvel 87

    Captulo X Afetividade e Autoestima 90 Captulo XI A Repercusso da Autoestima 100

    Parte 3 A Teia da Transformao Existencial 107

    Captulo I Desaprender para Aprender 108 Captulo II Observar a Si Mesmo 110

  • 15

    Captulo III Autoconhecimento 113

    Captulo IV Autoconscincia e Conscincia 115 Captulo V Escolhas Conscientes 119

    Captulo VI Tempo e Vida 123 Captulo VII Automerecimento 127 Captulo VIII Proatividade e Autoestima 129

    Captulo IX Autoestima e Cidadania 133 Captulo X Vcios e Autoestima 137

    Captulo XI Autoestima e Espiritualidade 144 Captulo XII Terapia do Renascimento 147

    Eplogo A Essencialidade da Autoestima 156 Uma Histria Para No Esquecer 158

    Como se Fosse um Glossrio 163

    Bibliografia 167

  • 16

    Parte 1

    O Que Influencia a Autoestima

    Na busca por uma autoestima saudvel e elevada, antes de procurarmos o novo, que

    devemos aprender, faz-se necessrio que compreendamos o velho, que devemos

    desaprender.

  • 17

    CAPTULO I

    A Cultura da Autodesvalorizao

    O homem o nico animal a sentir pena de si mesmo.

    D. H. Lawrence

    Depois de muito observar a realidade, nua e crua, do modo de viver dominante,

    sinto-me vontade para dizer que grande parte dos indivduos foi, ou educada dentro de

    um formato que no prepara para se viver com autonomia e ser bem sucedido, plenamente,

    na vida. Sob a influncia desse padro limitador, registrado em nvel de subconsciente ou

    de inconsciente, o sucesso, a realizao pessoal e outras conquistas de igual ou maior

    quilate inclusive as coletivas , tornam-se, praticamente, inatingveis para uma grande

    gama de pessoas. E o que resulta disso, entre outras dificuldades, o conformismo, a falta

    de reatividade diante dos desafios, que so inerentes prpria existncia humana.

    Em minha infncia e adolescncia, ouvi, e hoje ainda ouo de pais que, a priori,

    deveriam estimular positivamente seus filhos, frases do tipo: viver bem no pra gente

    como ns; filho de pobre nasce pobre e morre pobre; s consegue um bom emprego quem

    apadrinhado; vida boa para poucos; s vence quem tem sorte na vida etc. Escutei,

    tambm, quando adolescente, que estudar numa universidade era s para filhos de pais

    ricos: ...e depois, vai estudar muito pra qu? Para ser operrio, no precisa estudo. Num

    abrigo de menores, no qual passei muitos anos, ouvi de um inspetor: pobre s fica rico se

    roubar. Dizia meu padrasto: esse nunca vai ser algum na vida... ainda vai virar bandido.

    Em sntese, aprende-se, praticamente, desde o nascimento, que a vida sofrimento, que

    tudo difcil e que os obstculos so, praticamente, intransponveis; que no vale a pena

    tentar mudar nada, que sempre foi assim e sempre ser. Desde tempos imemoriais, so

    tantos os preconceitos a regerem a vida das pessoas, que a maioria s consegue v-la como

    um labirinto, farto em dificuldades.

    esse processo deseducativo, com nuanas manipulativas e incapacitantes, o

    gerador de muitos medos, registrados na mente subconsciente do indivduo. Desde o medo,

    aparentemente infantil, do bicho-papo, passando, entre outros, pelo medo do castigo

  • 18

    divino, pelo medo de ousar, de adoecer ou de morrer. A pessoa levada a crer que vale

    muito pouco e que est fadada, inevitavelmente, infelicidade, salvo se tiver alguma sorte

    na vida. Ento, sob a influncia de toda essa bagagem negativa, torna-se fcil, para ela,

    acreditar e moldar sua existncia, de forma que essas sentenas contraproducentes e

    limitadoras se concretizem.

    Em razo disso, minha constatao de que, salvo raras excees, essa herana,

    indelvel e perversa, contribuiu, em muito, no passado e contribui, ainda, no presente, para

    que um nmero considervel de pessoas no saiba demonstrar amor por si mesmo e nem

    pelos outros. Essa influncia serve- lhes, do mesmo modo, para que se vejam destitudos de

    qualidades e sintam-se fracos, inseguros, acomodados, pouco criativos e sem a coragem

    necessria para superar dificuldades. E o que resta, ento, na maioria das vezes, o

    sentimento ou a sensao de que no h muito a fazer para mudar a sua trajetria. Sendo

    assim, amparada nessa crena autodesmotivadora, s resta a essa grande massa cumprir,

    como dizem alguns, o seu destino, carregar a sua cruz, o seu fardo.

    Nos dias atuais, o panorama narrado no mudou muito, pois so poucos os pais

    que educam seus filhos estimulando-os para uma vida de autorrealizao, para uma

    existncia onde a habilidade de ser feliz possa ser exercitada sem medo ou preconceitos.

    Talvez, porque eles mesmos, os pais, tenham acumulado mais frustraes que sucessos

    durante a vida, ou porque, conservadoramente (ou irresponsavelmente), prefiram apenas

    transmitir o modelo defeituoso, tal como herdaram, ou, ainda, porque no se permitem

    admitir a necessidade, urgente, de reverem seus valores e condutas, assumindo um novo

    modo de viver e educar os filhos.

    algo para pensar e agir. Infelizmente o jogo da manipulao continua... Alm

    dos castigos morais ou fsicos e dos medos, por vezes, traumticos, usados,

    inadequadamente, para impor limites, foram acrescentados, a esse perverso cabedal, outros

    dispositivos deseducativos, tais como a televiso com suas programaes pseudo-

    educativas , usada, tambm, como instrumento de substituio presena dos pais. Um

    aparato de novidades tecnolgicas, como: os vdeo games, jogos de computadores, telefone

    celular, internet e outras bugigangas, tem servido, tambm, como moeda de troca para

    performances escolares duvidosas ou falsas mscaras de obedincia e aceitao.

  • 19

    Uma educao de plstico, sem valores ticos que proporcionem, pelo menos,

    algum estmulo marcante para uma vida mais inclusiva e equilibrada. E o que resulta dessa

    prtica que, alm da baixa autoestima, cuja consequncia o empecilho em sentirem-se

    competentes para realizarem-se de modo satisfatrio, os indivduos criados sob ela tm,

    ainda, dificuldade em relacionar-se, afetivamente, e de entender e aceitar o sucesso ou

    realizao dos outros.

    Nesse ltimo aspecto, o que observamos, por exemplo, que, quando algum

    consegue se superar e conquistar algo melhor ou alguma posio de destaque em sua vida,

    logo o seu carter, a sua competncia e honestidade so colocadas em dvida. A concluso

    que, num universo onde a baixa autoestima impera, o sucesso alheio incomoda aqueles

    que no tm ou no tiveram capacidade para conquist- lo. mais fcil invejar e

    desqualificar o outro, do que perseguir os seus sonhos, do que perseverar na busca de um

    objetivo mais elevado. E isso se deve falta de valor que a prpria pessoa dispensa a si

    mesmo.

    A maioria adota, cegamente, as sentenas assimiladas, s vezes desde a infncia,

    como j mencionei. Sem lutar para vencer suas limitaes, por entenderem que no vale a

    pena faz- lo, concluem alguns, lamentosamente, que a vida assim mesmo, como a

    querer justificar seus fracassos. Outros preferem agarrar-se ideia de que so azarados: s

    vence, na vida, quem tem sorte. At algumas ideias religiosas so interpretadas de maneira

    equivocada, na busca de amparar esse fatalismo negativo: Deus quem quer assim.

    possvel, ainda, que essa cultura da autodesvalorizao esteja entranhada nas premissas

    da ideologia de dominao social. Posto que, historicamente, as chamadas elites ou

    oligarquias econmicas, sociais e, at mesmo, religiosas, trataram de disseminar e manter

    a ideia de que alguns no so to iguais quanto aos outros, perpetuando, assim, o

    entendimento de que sempre existiram os superiores e os inferiores; os que mandam e os

    que obedecem.

    Diante desse quadro, a boa notcia a de que possvel reagir e desaprender esse

    modelo de autodesvalorizao e, a partir da, redefinir e desenvolver uma nova postura

    diante da vida e de tudo quanto lhe seja complexo e desafiador. Prova disso, sem nenhuma

    nuana de vaidade, o meu exemplo pessoal. Nasci sob o efeito da rejeio paterna e,

    logo a seguir, com um ano e meio de idade, fui abandonado, tambm, pela minha me.

  • 20

    Adotado, vivi com uma famlia de poucos recursos at os sete anos de idade, ocasio em

    que minha me biolgica reapareceu e levou-me com ela, colocando-me merc de um

    padrasto que me crivou de maus tratos e espancamentos, durante quase um ano. Por fora

    disso, fugi inmeras vezes da casa materna e, por consequncia, vivi de 8 at quase 18 anos

    de idade, entre a rua e instituies para crianas rfs ou abandonadas.

    Desde ento, minha trajetria foi marcada por muitas lutas. Em primeiro lugar, pela

    sobrevivncia propriamente dita, depois, pela conquista do meu espao no mundo e da

    conquista de uma vida com a dignidade, o que minha autoestima sempre me fez acreditar

    que eu merecia. Passei fome, frio, e tantas outras intempries, mas soube aprender com

    essas experincias. E, mesmo quando percorri o quase que inevitvel descaminho dos

    vcios, como lcool e outras drogas, o que prevaleceu foi minha autodeterminao e a

    vontade de superar esses obstculos e retomar o que chamo de minha rota evolutiva.

    Se no fui amado, o suficiente, pelos meus pais, no transformei essa ocorrncia

    em justificativa para todos os meus fracassos, pelo contrrio, criei a certeza de que poderia

    superar essa amarga carncia, demonstrando mais amor por mim mesmo, a cada instante e a

    cada novo confronto existencial. Se, tambm, durante um largo perodo, driblei a

    delinquncia, devo isso aos bons valores aprendidos na convivncia com a minha famlia

    adotiva e a alguns preceitos assimilados no educandrio religioso, onde permaneci

    internado de 8 a 13 anos de idade, em Curitiba, cidade onde passei minha infncia,

    adolescncia e parte da minha vida adulta. Persistncia e determinao foram e continuam

    sendo minhas mais poderosas armas, ante a qualquer desafio nesse que classifico como o

    bom combate da vida.

    Sei que outras pessoas, em circunstncias diferenciadas e, s vezes, mais dramticas

    que as minhas, tambm conseguiram e tm conseguido superar esse modelo que classifico

    como cruel. E independentemente do nome que tenham dado quilo que as motivou a

    tornarem-se vencedoras, tenho a certeza de que a esteve presente um qu de autoestima,

    pois, se trata de um recurso ou ferramenta imprescindvel para a sobrevivncia humana.

    Voltando cultura da autodesvalorizao, creio que no cabem, aqui, anlises

    sociolgicas ou antropolgicas para embasar essa minha concepo, porque a realidade

    nossa volta, com toda a sua crueza, demonstra, a todo tempo, o quanto isto verdadeiro. A

    questo fundamental que proponho uma reflexo que colabore para a construo de um

  • 21

    paradigma de autovalorizao pessoal, partindo do princpio de que todos tm qualidades,

    competncias e aptides, no, apenas, deficincias ou limites. Portanto, independentemente

    de que o modo aplicado educao do indivduo no tenha sido o mais adequado, vale

    saber que as possibilidades para aprender a confrontar seus medos, inseguranas,

    deficincias, desconfortos, inadequaes ou propenses negativas, esto disponveis para

    serem acessadas. Sabendo, previamente, que tudo depender do grau de motivao de cada

    um, em investir no desenvolvimento contnuo da sua autoestima e, assim, abrir-se, sem

    reservas, a um viver consciente e s oportunidades, admirveis, nele contida.

  • 22

    Captulo II

    A Banalizao da Autoestima

    O grande engano do homem

    acreditar que pode encontrar

    bem-estar e felicidade,

    fora de si mesmo. Willes

    Creio que o leitor j deve ter percebido que a superficialidade, a banalidade e a

    vulgaridade tm sido determinantes nos tempos atuais. Banaliza-se a violncia, a fome, a

    misria, a explorao humana, as desigualdades e diferenas, em todos os seus quadrantes;

    a guerra, a educao, a cultura, o amor, a sexualidade, a espiritualidade ou religiosidade,

    enfim, a vida em todos os seus mltiplos valores e aspectos. Raros so os assuntos a

    merecer tratamento com maior profundidade, principalmente quando se trata de temas

    relacionados ao comportamento humano e s relaes interpessoais.

    s vezes, neste setor, ocorre algo que classifico de paradoxal ou deveras curioso. Se

    por um lado proliferam as publicaes conhecidas como de autoajuda, cada uma trazendo

    em seu bojo receitas e mais receitas para vencer isso ou aquilo, ou de como encontrar a paz

    interior, ser feliz, etc., por outro lado, multiplicam-se aquelas com rtulos chamativos e

    exticos, mas, devido aos seus complexos enunciados, ningum entende nada. Talvez, por

    ironia, alguns autores destas proezas, quando indagados sobre a prtica daquilo que

    escreveram, no tenham conseguido convencer nem a si prprios, sobre a sua eficcia, uma

    vez que no vivenciaram suas prprias receitas. Ento, salvo raras excees, a maioria peca

    pela subjetividade, pelo modo confuso de suas frmulas ou, ainda, pelo modo fragmentado

    de ver e analisar a criatura humana e as suas mltiplas facetas.

    Em se tratando da autoestima tema principal deste livro , a banalizao ainda

    maior, pois seguindo uma lgica de desinformao e manipulao do conhecimento e de

    menosprezo pela inteligncia popular, a chamada mdia (o conjunto dos meios de

    comunicao) tem conseguido, principalmente na televiso e nas revistas ditas femininas,

    difundir ideias, distorcidas, do real significado da autoestima para a vida do ser humano.

  • 23

    Tem sido comum, igualmente, que artistas ou pseudoartistas de efmera fama,

    desfiem conhecimentos rudimentares e suas receitas sobre como aumentar a autoestima,

    associando-a a esttica corporal e outras futilidades. Campanhas publicitrias, feitas de

    maneira irresponsvel e apelativa, tm vinculado a autoestima compra de um determinado

    modelo de carro, celular, computador e seus assemelhados; ao uso de cosmticos, cirurgias

    corretivas, roupas de grife, etc. Tudo pura balela imbecilizante e manipulativa! Um grande

    engodo que nada tem a ver com a importncia e a profundidade da autoestima.

    Vale alertar que so inmeras as dificuldades que enfrentamos em nossa rota

    evolutiva, existencial e, entre elas, se destacam a ignorncia e o comodismo. quase que

    imensurvel o nmero de pessoas vivendo sob a gide destes dois elementos. E o que elas

    tm em comum a esperana de que alguma mgica ou milagre acontea e mude suas

    vidas, sem que precisem despender o mnimo esforo.

    Existe, ainda, um tipo de ignorncia que alimentado pela arrogncia. So pessoas

    com algum tipo de conhecimento intelectual, mas, que, pelo ceticismo ou criticismo

    exacerbado, se propem a desqualificar toda e qualquer opinio, que no comungue com a

    sua. No caso da autoestima, convm estar com a mente aberta para compreender e separar

    aquilo que mera banalizao, daquilo que verossmil e vivenciado. No existe mgica na

    autoestima e nem , ela, a resoluo para todos os imbrglios humanos. Porm, com o seu

    claro entendimento e o esforo necessrio para desenvolver novas condutas e aes, com

    certeza, ela passar a ser um elemento de suma importncia na vida de toda pessoa e, at,

    mesmo, na vida de coletividades interessadas em evoluir, de modo equilibrado e sustentvel

    emocionalmente.

    A autoestima, a princpio, funciona de dentro para fora e seus elementos e prticas

    associam-se, de modo objetivo, muito mais a valores e condutas comportamentais, do que a

    quaisquer outros fatores externos que, em ltima anlise, podem, apenas, caracterizar a sua

    expresso, servir sua alavancagem ou impedi- la de vicejar, mas, nunca defini- la em seu

    contedo, como vou esclarecer no decorrer deste livro.

    A autoestima pode no ser tudo, pode no ser a soluo para todos os problemas

    pessoais ou do mundo, mas, em termos existenciais, tudo que se pretenda saudvel,

    harmnico e justo, no existe sem ela.

  • 24

    Captulo III

    Causas da Baixa Autoestima

    Conhece-te a ti mesmo,

    torna-te consciente de tua ignorncia

    e sers sbio. Scrates

    Saber o porqu de cada fenmeno que ocorre em nossa existncia fundamental,

    para que aprendamos a viver de maneira consciente e equilibrada, emocionalmente. Talvez

    isso explique o motivo pelo qual, ao abordar a autoestima em minhas atividades

    motivacionais e teraputicas, a pergunta que mais tenho ouvido seja a seguinte: por que

    minha autoestima baixa? Vem da, ento, a razo de escrever este e outros captulos que

    se desdobram para sem determinismos vos ou reducionismos estreitos , dar resposta a

    esta questo, que reconheo ser importante para um nmero considervel de pessoas, que

    procuram a transformao pessoal.

    Assim como propor uma definio substantiva e exata da autoestima uma tarefa

    que demanda esmero, definir as causas da sua ausncia ou do seu desequilbrio, tambm,

    requer muito estudo, observao e acuidade. E isso ocorre por no haver um consenso entre

    os estudiosos do assunto que, a meu ver, tm preferido no se ater s suas fontes e explic-

    la de maneira reducionista, apenas pelos seus efeitos ou por algum dos elementos que a

    compem.

    De minha parte, amparado em minha ampla experincia e saberes, creio que o termo

    mais coerente, a ser usado para tratar dessa questo, o de predisposies, pois, sem

    sombra de dvida, elas influenciam, sobremaneira, a autoestima em sua origem e tudo o

    que dela procede. Deste modo, tanto ao que se relaciona com a autoestima em si, quanto a

    outros variados desconfortos existenciais e emocionais, agravados ou originados pela sua

    falta, no h como ignorar a existncia de um nexo causal, psquico, antecedente. Isto ,

    que haja um ou mais elementos que atuam, a priori, na sua formao. possvel, ainda,

    que predisposies de carter gentico, hereditrio ou bioqumico, tambm tenham

    influncia em seu contedo, mas, como no estou categorizado para falar do assunto, sob

    esse prisma, fixo-me, apenas, nos seus aspectos psicoemocionais.

  • 25

    Um dado que tambm deve ser considerado no contexto desta abordagem o fato

    de que alguns profissionais e estudiosos do comportamento humano ou da rea mdica tm

    dado um enfoque secundrio autoestima, colocando-a num patamar de sintoma,

    principalmente, quando se referem, por exemplo, a ocorrncias, tais como: depresso,

    stress ou ansiedade. O que, a meu ver, traz, em si, um equvoco, pois, no exerccio da

    prtica analtico-teraputica, tenho observado que, em diversas situaes, a falta de

    autoestima um estado que, em muito, contribui para a origem ou potencializao desses

    desconfortos.

    Para melhor esclarecer a opinio, acima descrita, cito, sucintamente, um singular

    exemplo: Carlos, desde o seu nascimento, foi rejeitado pelo pai em virtude deste ter

    desejado uma filha mulher. Em razo dessa falta afetiva, ele desenvolveu uma viso

    negativa de si mesmo, nunca se achando em condies de realizar algo que fosse mais

    elevado e prazeroso, principalmente, porque temia o julgamento alheio. Pesava sobre ele a

    desaprovao paterna e, por consequncia, a dos demais. Era como se ele raciocinasse da

    seguinte forma:

    Se no sou aceito por meu pai, como vou ser aceito pelos outros?

    Na verdade, sempre que ele tinha de confrontar algum obstculo, que lhe exigia

    maior grau de autoconfiana ou arrojo, sentia-se sem coragem e ficava deprimido. A

    interpretao inicial dada por profissionais mdicos e psiclogos, que o atenderam por

    algum tempo, foi de que a depresso era o que lhe causava a baixa autoestima. Eu, quando

    o caso me foi entregue, fiz uma leitura inversa: a falta de autoestima, oriunda das causas j

    mencionadas, que suscitava nele o sentimento de incapacidade, que o levava depresso.

    E, assim, passei a focar a reconstruo da sua autoestima, como objeto da terapia e, por

    meio de um trabalho de reparentalizao feito, principalmente, em relao ao pai que o

    havia rejeitado, foi possvel nutrir e dar qualidade ao seu padro afetivo, resgatando,

    gradativamente, sua autoestima e, consequentemente, solucionando sua depresso.

    Ento, sob a perspectiva de que a autoestima, em desequilbrio, pode ser geradora

    de desconfortos ou transtornos emocionais, ao invs de sintomas deles, me proponho a

    discorrer, a seguir, sobre alguns elementos que considero como predisposies para a baixa

    autoestima ou para a sua ausncia, propriamente dita. Alguns, por influenciarem-na

  • 26

    diretamente, condicionando a base de sua formao ou sustentao, outros por,

    circunstancialmente, gerarem situaes que interferem, negativamente, em sua dinmica.

    Entre eles destaco o Trauma do Nascimento, a Rejeio Parental, a Educao e o Sistema

    de Crenas Limitadoras (SCL).

  • 27

    CAPTULO IV

    O Trauma do Nascimento

    A criana sabe de tudo.

    Sente tudo. V at o fundo do corao. F. Leboyer

    Na busca de explicaes, plausveis, para as causas da baixa ou falta de autoestima,

    tenho observado que, pessoas que tiveram uma gestao ou um parto difcil, ou que, ainda

    no tero materno, sofreram algum tipo de rejeio, tm maior predisposio para sentirem-

    se desconfortveis na vida. Por possurem baixa autoestima, adoecem e deprimem-se com

    maior facilidade; so ansiosas, e esto propensas a desenvolverem fobias, como transtorno

    do medo e outras ocorrncias assemelhadas. quase inegvel que a maneira como a pessoa

    foi gerada, nasceu e foi criada, afeta a sua existncia e o modo como se relaciona consigo

    mesmo, com os outros ou com o mundo ao seu redor.

    Um exemplo foi o caso de um cliente, de nome Jos, cujo pai era alcolatra e

    maltratava sua me. Segundo seu relato, a me contou- lhe que, por fora do ambiente

    tempestuoso em que vivia, durante sua gestao, por muitas vezes ela desejou abortar lhe,

    pois, entendia que: sofrimento, por sofrimento, j bastava o dela. Assim, ele foi gestado

    num clima de insegurana e sua vida intrauterina foi marcada pe lo desconforto, o mesmo

    acontecendo durante o seu parto, que foi muito difcil e traumtico. Devido a estes fatores,

    Jos cresceu e viveu at os 25 anos, tendo muita dificuldade para situar-se na vida. Tinha

    constantes sensaes de medo e, quando tinha que enfrentar alguma dificuldade, como, por

    exemplo, uma prova na escola, alternava entre momentos de grande ansiedade e outros de

    profunda depresso. Contou-me que, nesses momentos, tinha sempre a sensao de que iria

    morrer, faltava- lhe a respirao e a angstia era muito grande.

    Submetido a sesses de Renascimento4, trouxe tona a memria de quando

    estava no tero de sua me. L, segundo sua narrativa, sentia muito medo e, quando

    visualizou seu nascimento, esse medo aumentou, assustadoramente. Era como se eu

    preferisse ficar quietinho, no tero da minha me, para sempre, contou ele. Depois de

    vrias sesses, onde venceu o medo de nascer, foi verificando que, no seu dia a dia,

    sentia-se com mais coragem para viver. Passou a valorizar, sobremaneira, cada instante da

    4 Ler na parte 3, captulo XII, sobre a teraputica do Renascimento.

  • 28

    sua vida, tornando-se uma pessoa alegre, bem humorada e extrovertida. Sentiu aumentar a

    sua autoconfiana e, com algum, esforo voltou a estudar. Hoje, aps um processo de

    reconstruo da sua autoestima, redefiniu sua relao com o pai, tornou-se um profissional,

    bem sucedido, no campo da informtica, casou-se, tem um filho e vive bem.

    Como no h mecanismos para descrever com preciso , o que sente uma

    criana, enquanto habita o tero materno, numa situao de rejeio, s nos resta imaginar,

    vivenciando a situao e os tipos de pensamentos que poderamos vir a ter, como, por

    exemplo: no sou amado pelos meus pais; melhor seria no nascer; tenho medo de

    viver; viver sofrer.

    Ao analisar o nascimento sob a tica da criatura que nasce, entendo que, mesmo que

    ele ocorra em condies consideradas adequadas, ainda assim, produz uma alta dose de

    desconforto. Para ampliar a ideia desse fenmeno, chamo ateno para o que diz Frdrick

    Leboyer5, mdico obstetra francs, em sua obra Nascer Sorrindo:

    O que faz o horror do nascimento a intensidade, a amplitude da

    experincia, sua variedade, sua riqueza sufocante. J dissemos que se acredita

    que um recm-nascido no sente nada. Ele sente tudo. Tudo totalmente, sem

    escolha, sem filtro, sem discriminao. A quantidade de sensaes que assola o

    nascimento ultrapassa tudo o que podemos imaginar. uma experincia

    sensorial to vasta que no podemos nem mesmo conceb-la. (1974, p.30-31).

    Ento, nesse contexto, quando classifico o trauma do nascimento como uma

    ocorrncia geradora de predisposio para a baixa autoestima, fao-o pela compreenso de

    que o trauma adquirido ao nascer, quando no desintegrado, permanece no inconsciente do

    indivduo, influenciando o seu modo de interagir com mundo sua volta. Essa concluso,

    inclusive, respaldada por Otto Rank6, psicanalista contemporneo de Freud, que afirmou

    serem, as circunstncias do nascimento, profundamente, gravadas na psique do beb e

    suscetveis de reaparecerem, mesmo que de forma simblica, em pacientes com distrbios

    psquicos.

    5 Frdrick Leboyer, mdico obstetra francs, nascido em 1918, criador do mtodo denominado Parto sem Dor, autor do livro

    Nascer Sorrindo, o ttulo traduzido, literalmente, do francs Por Um Nascimento Sem Violncia. 6 Otto Rank(1884/1939), austraco, psicanalista, professor e escritor. Foi colaborador muito prximo de Freud por mais de 20 anos.

    Estudioso da psicanlise contribuiu em muito para a sua expanso. Entre as suas obras est o livro Trauma do Nascimento, publicado em ingls em 1929. Para Rank o trauma do nascimento era elemento muito mais importante do que o conflito edipiano de Freud, dai o rompimento entre eles.

  • 29

    Abordagem assemelhada tem Leonard Orr, psicoterapeuta norteamericano,

    percussor do Renascimento, que, ao abordar o trauma do nascimento como um dos fatores

    dominantes do inconsciente, que causam infelicidade, no livro de sua autoria Rebirthing in

    the New Age (Renascimento na Nova Era), afirma:

    Algumas pessoas cujas dores do nascimento foram bastante pronunciadas,

    literalmente vivem o resto de suas vidas se desculpando pela prpria existncia.

    Provavelmente 90 por cento dos nossos medos so originados do trauma do

    nascimento. Impacincia, hostilidade e suscetibilidade para doenas e acidentes

    podem s vezes ser traadas com o trauma do nascimento (1997, p.102).

    Portanto, no causa espanto que, devido s impresses negativas adquiridas sob os

    efeitos desse trauma, muitos indivduos se autocondicionem a um sistema de auto

    depreciao que, por vezes, se traduzem em sentenas de conduta do tipo: a vida um

    eterno sofrimento; nunca alcanarei aquilo que sonho; existe algo de errado comigo;

    ningum me ama de verdade; no h prazer sem sofrimento; mudar difcil e

    perigoso, etc.

    Sob a luz do bom senso, no h como desqualificar o trauma do nascimento como

    fato gerador de predisposies, de toda ordem, na existncia de qualquer indivduo. O que

    falta, no entanto, um estudo mais abalizado deste que considero um momento de grande

    significado no existir humano. Pensemos no que diz Leboyer, na obra j citada:

    Os sentidos do recm-nascido funcionam, e como! Possuem toda a

    acuidade e o frescor da juventude. O que so nossos sentidos e sensaes

    comparados aos da criana? E as sensaes do nascimento tornam-se ainda

    mais fortes pelo contraste com o que foi vivido antes. Os sentidos funcionavam

    bem antes de a criana estar entre ns, no nosso mundo. Sem dvida, as

    sensaes ainda no so organizadas em percepes ligadas umas s outras,

    equilibradas. O que as faz ainda mais fortes, intolerveis e aflitivas (Brasiliense,

    1974, p.31).

  • 30

    Breves Consideraes Sobre Gestao e Parto Considerando a gestao e o nascimento como elementos definidores de diversos

    traos da vida do indivduo, creio que ambas as situaes devam ser tratadas de modo mais qualificado do que o habitual, nos tempos de hoje.

    Cada vez mais, a preocupao esttica da me, antes e depois do parto, tem merecido maior ateno do que o evento em si. Alm do que, a forma do parto, na maioria

    das vezes, tem sido decidida mais por aspectos puramente tcnicos, econmicos ou outros desprovidos de sentido lgico , do que pelas condies que seriam menos traumatizantes e mais prazerosas para o nascituro.

    O parto visto pelo lado da medicina tradicional traz em seu contedo todo um acervo de recomendaes e tcnicas, que eu diria serem puramente frias e destitudas de

    sensibilidade. Tal como a cesariana, que nada mais do que um procedimento tcnico-cirrgico, propriamente dito, onde o centro da ateno, quase que exclusivamente, a parturiente, quando, a meu ver, em nenhum momento deveriam ser ignorados os efeitos

    psicoemocionais deste procedimento para com a criatura que est por nascer, ou seja, o foco do parto deveria ser igualmente voltado, tanto para a me quanto para o filho.

    Houve um tempo em que o parto natural era, por assim dizer, a regra. A cesariana era uma exceo. Atualmente, o quadro inverso: o parto natural que a exceo. O Brasil, segundo pesquisas, o campeo do mundo em cesarianas. O ndice de cesarianas

    quase trs vezes maior que o recomendado pela Organizao Mundial de Sade (OMS). De acordo com os dados da ltima pesquisa efetuada no pas, na rede pblica 43% dos partos

    cesariana; na rede particular, esse nmero chega a 80%, enquanto que o recomendado pela OMS deveria, no geral, situar-se entre 5 a 15%, j includos os de alto risco. Esse quadro deve-se falta de conhecimento e preparo da gestante para decidir o seu parto, aos mdicos

    e ao sistema hospitalar. O mdico, obstetra, Carlos Eduardo Czeresnia, do Hospital Albert Einstein So

    Paulo , em declarao feita Revista Super Interessante, j h algum tempo, falou que os mdicos indicam a cirurgia por medo de processos, ou seja, a cesrea tornaria o obstetra mais defensvel se algo desse errado , por ele se ater a rgidos procedimentos

    operatrios: Por isso, o mdico comea a criar medos na cabea da gestante, dar razes esdrxulas pra fazer uma cesrea, afirmou. Alm disso, existem convenincias

    imprprias e interesses de ordem econmica a reger os partos. Como se v, no momento mais impactante da vida do indivduo seja em sua

    dimenso fsica ou extrafsica , que o seu nascimento, nem sempre pais e obstetras esto

    conscientes dos efeitos que esse pequeno lapso de tempo significa ou vir a significar para a totalidade dessa nova existncia. Esto mais ensimesmados, egoisticamente, em suas prprias contradies existenciais, em seus medos e desejos, do que preparados para

    celebrar esse augusto momento com amor e afeto, resultando, da, muitas sequelas emocionais, que s o tempo dir quais sero as suas consequncias.

    Em terapia, so inmeros os casos, comprovados, de pessoas que tiveram problemas em sua gestao, ou ao nascer, e que vieram a desenvolver alguma patologia ou desconforto emocional, entre eles: baixa autoestima, depresso, fobias e baixa imunidade corporal.

    Observo que, em algumas ocasies, instituies mdicas ou assemelhadas tm promovido cursos ou seminrios destinados a mes gestantes, o que considero louvvel.

    Porm, percebo que o centro de tais eventos so apenas as gestantes, faltando dar a devida

  • 31

    ateno criatura que est sendo gestada. Atm-se muito sobre os aspectos biofsicos, e

    esquecem-se do preparo psicolgico de pais e mes, quanto ao nascituro: como trat- lo e estimul- lo, no que se refere necessidade da qualidade da ateno afetiva , que deve ser

    suprida por eles. Ento, diante dessa perspectiva, creio serem necessrios cuidados e prticas, tais como, ensinar s mes a trabalharem suas ansiedades e tenses de modo natural, por meio da meditao, do relaxamento ou yoga, por exemplo. Buscar a harmonia

    no lar, conversar com suavidade com quem est para nascer, ainda no tero , tecendo-lhe palavras amorosas, elogiosas e de boa aceitao. E, depois de nascido, aprimorar cuidados,

    que vo alm dos bsicos necessrios, como toques, massagens, etc. Uma tcnica de massagem para bebs, muito recomendada, a Shantala7, que foi

    muito difundida no ocidente pelo mdico, obstetra, francs, Frdrick Leboyer, que a

    descobriu em Calcut, numa das suas viagens ndia. Enfim, para encerrar este captulo, recomendo principalmente s mes, o livro sobre esta que Leboyer chama de Arte

    Tradicional de Massagens para Bebs, onde ele declara, com muito mpeto:

    Sim, os bebs tm necessidade de leite. Mas muito mais de serem

    amados [...] Serem levados, embalados, acariciados, pegos, massageados,

    constitui para os bebs, alimentos to indispensveis, seno mais do que

    vitaminas, sais minerais e protenas (Ground,1995, p.23).

    7 Shantala foi o nome dado a essa Arte Tradicional de Massagem para Bebs, em homenagem a mulher paraltica que Frdrick

    Leboyer viu, pela primeira vez, em Calcut, na ndia, massageando o seu beb. Nome tambm dado ao livro escrito e ilustrado por ele. No Brasil, editado pela Editora Ground.

  • 32

    CAPTULO V

    Rejeio Parental

    Nossos pais so apenas

    os pais possveis... Willes

    A rejeio parental outra ocorrncia que considero como elemento de

    predisposio para a baixa autoestima, bem como, de outros desconfortos existenciais, j

    citados, como: medo, ansiedade, depresso, etc. O adjetivo parental deve ser entendido,

    aqui, como referente a pais ou seus substitutos, ou seja, alm dos pais, pessoas que,

    principalmente durante a infncia e adolescncia, ocupem o lugar deles, tanto nos cuidados,

    quanto na educao.

    Nesse rol cabem, entre outros, os avs, tios, padrinhos, babs, professores e, at

    mesmo, pessoas responsveis pelo ensino religioso. Alis, vale chamar a ateno dos pais

    para a escolha de babs ou empregadas, que venham a cuidar da criana, nos primeiros

    anos da infncia, uma vez que, a depender do tempo que passam com a criana, podem vir

    a influir, cabalmente, em seu desenvolvimento psicoemocional. Na verdade, qualquer

    pessoa que venha a substituir os pais, nesse perodo que vai de zero a oito anos,

    aproximadamente, pode vir a influenciar a formao da personalidade da criana, de modo

    positivo ou negativo. Todo cuidado pouco, inclusive com a televiso, comumente

    denominada de a bab eletrnica.

    A princpio, a rejeio parental poder ter sua origem no perodo gestacional,

    mas, ela s ser sentida, em toda a sua extenso, aps o nascimento, pois, a partir da que

    a criana ir vivenci-la de modo objetivo e sofrer seus efeitos. Inicialmente, poder sentir

    a rejeio por meio da interpretao subliminar de diversas aes dos pais ou substitutos

    ou, como descreve a Anlise Transacional8, por meio de mandatos verbais ou no verbais,

    que so interpretados pela criana como ordem de conduta. Por exemplo: quando eles,

    8 Anlise Transacional (AT) uma teoria da personalidade, criada pelo psiquiatra Dr. Eric Berne, de origem

    canadense e residente nos EUA, no final da dcada de 1950. De acordo com a definio da International Transactional Analysis Association (ITAA), a Anlise Transacional uma teoria da personalidade e uma psicoterapia sistemtica, para o crescimento e a mudana pessoal; estuda a forma como as pessoas sentem, pensam, agem e se relacionam. Possui um conjunto de tcnicas de mudana positiva, que possibilita uma tomada de posio do ser humano, diante da vida. de

    Eric Berne a frase: Todos ns nascemos prncipes e princesas, mas, s vezes, nossa infncia nos transforma em sapos.

  • 33

    pais ou substitutos, deixam a criana sozinha, constantemente ou no atendem suas

    necessidades bsicas, como alimentao e higiene, etc. , ela poder sentir e interpretar esse

    abandono como:

    Eles no gostam de mim, eles no me querem.

    Quando a criana ridicularizada ou desqualificada, quando exterioriza suas

    emoes:

    Eles no querem que eu sinta, eu no posso expressar minhas emoes.

    Desse modo, o sentimento de no ser aceito ou de no poder expressar-se,

    emocionalmente, ir integrar a formao do seu roteiro ou argumento de vida, o que,

    conforme definio de Eric Berne, precursor da Anlise Transacional, uma programao

    concebida na infncia, baseada nas influncias parentais, e logo esquecida ou reprimida,

    mas que continuar com seus efeitos a influenciar a vida da pessoa.

    Alm do abandono, propriamente dito, muitas outras atitudes, no s dos pais,

    podem ser interpretadas pela criana como elemento de rejeio, seja no contexto da

    educao familiar, escolar, religiosa ou social. Entre estas aes, destaco, apenas, duas para

    tornar claro essa ocorrncia e alertar para os danos que elas podem causar formao da

    autoestima da criana:

    a) falta de ateno Crianas que, em sua infncia, no obtm a ateno. Nos

    momentos que mais necessitam da presena dos pais, sentem-se rejeitadas ou

    desqualificadas, da, o sentimento de que no so aceitas e nem so importantes para os

    pais. Em razo disso, estaro propensas a buscar a ateno que lhes falta por meio de

    atitudes, contraproducentes, de rebeldia, agressividade, ou, por exemplo, por feitos

    autodestrutivos, como, ferirem-se ou, at mesmo, simularem doenas. O que, feito

    frequentemente, poder tornar-se um comportamento contumaz, com graves consequncias

    na adolescncia e na vida adulta, onde elas podero, com facilidade, enveredar pelos

    descaminhos de outras condutas, inadequadas, dos vcios e da prpria delinquncia.

    Nesse contexto, a ttulo de exemplo, convm citar um hbito muito em voga nos

    dias de hoje, seja para remediar a tal da falta de tempo, usada pelos pais como desculpa

    para justificar a ausncia na vida dos filhos, ou para livrar-se deles, mesmo.

    Principalmente a partir de famlias de classe mdia, instituiu-se o que, na falta de um nome

    mais adequado, chamo de abandono domstico, onde os pais, para desencargo de

  • 34

    conscincia, destinam um quarto para o filho e, l, instalam todo tipo de parafernlia

    eletrnica, tais como, videogame, computador com acesso internet, televiso, etc. E o que

    acontece que, mesmo em casa, ele passa mais tempo sozinho do que na companhia dos

    pais.

    O quarto passa a ser o seu abrigo, seu isolamento e, dali, ele estabelece sua rede de

    contatos via internet ou celular , e os pais, na maioria das vezes, desconhecem seus

    amigos ou com quem ele se relaciona. Da, a surpresa quando o descobrem praticando

    delitos na escola ou em outro local. O trgico e irresponsvel nessa conduta que, muitos

    pais, quando livres para se ensimesmarem frente televiso ou outros afazeres e

    distraes, ainda se vangloriam deste feito. E quando se referem ao filho, em abandono no

    quarto, costumam dizer:

    Ele no nos incomoda. Nem parece que temos criana em casa!

    b) comparao Pais, familiares e professores*, s vezes acreditam que comparar uma

    criana a outra uma forma de motivao. Ledo engano. Aquela que comparada,

    negativamente, sente-se rejeitada por no cumprir as expectativas que esperam dela e,

    com base nessa frustrao, igualmente, poder desenvolver, entre outros sentimentos, o de

    inferioridade ou inadequao. E mais: com a finalidade de obter o afeto e a aceitao que

    necessita, poder sentir-se na obrigao de ser perfeita, o que, com o tempo, lhe

    acarretar outros desconfortos.

    No caso de comparao entre irmos, por exemplo, ela provoca danos psicolgicos

    para os dois: um por sentir-se rejeitado, inferiorizado e outro por ter que se desdobrar,

    compulsivamente, para no decepcionar os pais. Inmeros exemplos desse tipo de

    problema ilustram meu arquivo de clientes. Lembro at que, em um desses casos, um

    homem na faixa dos quarenta e cinco anos, certa vez, num momento de raiva, desabafou:

    Essa maldita comparao arruinou minha vida, por muito tempo.

    De acordo com o pensamento de Eric Berne, a forma de pensar, sentir e agir,

    ensinada, conscientemente ou no, s crianas, pelos pais ou substitutos, desde a mais tenra

    idade. E, em se tratando da rejeio parental, esta, por no possuir qualquer trao de

    afetividade, influi cabalmente na qualidade da autoestima do indivduo. Na verdade, muitos

    pais, por no analisarem, conscientemente, o modo como foram educados, repetem com os

  • 35

    filhos as mesmas aes desqualificadoras que sofreram dos seus pais. Criando, de tal modo,

    um ciclo vicioso que se perpetua gerao ps-gerao, como se fosse uma espcie de

    padro que no pode ser alterado, apenas seguido.

    * Atualmente, os pais devem estar muito atentos qualidade ou formao pedaggica dos professores que estaro presentes na vida de seus filhos, desde a infncia. Isto para alm

    dos professores das escolas formais, como, por exemplo, professores de ingls, religio, msica, natao, atletismo, esportes em geral e outros.

  • 36

    CAPTULO VI

    A Influncia da Educao

    O homem no nada alm daquilo que a educao faz dele... Emanuel Kant

    Ainda no contexto das predisposies, no poderia deixar de mencionar mesmo

    que de maneira um tanto resumida a educao como elemento de suma importncia na

    formao da autoestima. Em alguns casos, por conter as situaes j elencadas

    anteriormente, e, em outros, por possuir singularidades que so determinantes na

    constituio da personalidade do indivduo.

    Com o intuito de tornar compreensvel ao leitor caso tenha a pretenso de utilizar

    esse saber para o seu prprio autoconhecimento ou para empreg-lo em outro contexto

    educacional , esclareo que o termo educao, no mbito deste escrito, contempla a

    soma de todo aprendizado familiar, religioso, escolar e social. A educao em sua

    totalidade, cujo contedo vai moldar a formao do indivduo, desde a mais tenra idade,

    principalmente, em seus aspectos psicoemocional e comportamental, includo, a, a noo

    de valores, sentimentos, etc.

    Tomando como fonte inspiradora alguns conceitos da Anlise Transacional (mtodo

    analtico j citado), e acrescentando- lhes observaes colhidas na vivncia teraputica,

    cheguei concluso de que, a priori, so dois os modelos de educao que, positiva ou

    negativamente, esto presentes na base da autoestima de toda pessoa. So eles: a Educao

    Crtica e a Educao Nutritiva.

    Partindo do entendimento inicial de que esses dois modos educativos so decisivos

    no desenvolvimento da personalidade dos indivduos, no h como fugir realidade de que

    eles, tambm, interferem na formao e evoluo da autoestima. Outro dado a acrescentar,

    antes de discorrer com maior objetividade sobre o assunto, o de que a influncia desses

    modelos, pelo menos no tocante formao da autoestima, faz-se presente no perodo que

    vai do nascimento at a adolescncia da pessoa, impactando com maior intensidade no

    tempo compreendido de 0 a 8 anos de idade. A abrangncia ampliada desse perodo, por

    mim aqui adicionada, se explica pelo fato de que: cada criatura interioriza, de forma

  • 37

    singular e em tempo distinto, aquilo que aprende ou vivencia. Por vezes, at na vida adulta

    os pais, por meio de suas aes, continuam a nutrir, ou no, a autoestima de seus filhos.

  • 38

    CAPTULO VII

    Educao Crtica

    Todos ns nascemos prncipes

    e princesas, mas, s vezes, nossa infncia nos transforma

    em sapos.

    Eric Berne

    A Educao Crtica caracteriza-se, principalmente, por ser impositiva ou coercitiva.

    Ou seja, sob esse prisma, ela imposta pelos pais ou seus substitutos, por meio de uma

    gama variada de aes, tais como: castigos, coao fsica, chantagem emocional, crticas

    exacerbadas, represso de sentimentos, comparaes negativas, instaurao de medos e

    preconceitos.

    Em termos de contedo, podemos dizer que a Educao Crtica se faz por meio

    daquilo que se convencionou chamar em anlise transacional de mandatos verbais ou

    no verbais negativos, que so sentidos, assimilados ou interpretados pela criana como

    ordem de conduta. A distino que se faz entre estes dois tipos de mandatos (verbal e no

    verbal) que: o primeiro direto, objetivo, e o segundo subentendido, tal como se

    estivesse implcito na ao da qual feita a leitura pela criana. Exemplo: quando uma

    criana se sente ignorada pelos pais, a leitura que ela poder fazer ser: eles no me

    amam, ou, eu no sou importante para eles, ou, ainda, terei que me esforar muito para

    que eles me amem.

    Nesse sistema pode-se afirmar que a criana no educada, ela treinada para ser

    obediente, para responder a comandos, sob as mais diversas formas de mandatos. Um

    exemplo, aparentemente bobo, o uso da figura do bicho-papo como forma de ameaa

    criana que no quer comer ou dormir. No imaginrio infantil, o bicho-papo mau e a

    crena que se estabelece a de que ele vai causar- lhe algum dano, se ela no fizer o que o

    pai ou a me querem. Para a criana nada de brincadeira, o que para amedrontar,

    amedronta.

    Seja no mbito da famlia, na escola ou ensino religioso, encontramos inmeros

    exemplos de mandatos negativos, iguais ou assemelhados a estes:

    Se desobedecer, vai apanhar quando seu pai chegar.

    Se no comer, vai ficar doente.

  • 39

    Se no for bonzinho, Papai do Cu castiga.

    Quem no fizer a lio, vai ficar de castigo.

    Um exemplo, bem real: em uma aula de natao para crianas, ouvi um professor

    falar para um aluno:

    Se no bater rpido as mos, voc vai se afogar.

    So inmeros os mandatos, inapropriados, utilizados nessa maneira de tentar educar

    ou de estimular o aprendizado. Alm, claro, daqueles que trazem a ao direta de coero,

    como: surras, espancamentos, castigos corporais etc.

    Vale lembrar, ainda, que exemplos negativos, de parte dos pais, tambm podem

    soar ao educando como norma de conduta. Por exemplo: se o pai mente ou falseia a

    verdade perto do filho, isso pode ser entendido como permisso para que, em algum

    momento, ele faa o mesmo. Exemplos de pais ou substitutos tanto podem educar, quanto

    deseducar.

    Para tornar mais clara a ideia dos males que essa prtica educativa pode acarretar,

    no s no que diz respeito autoestima, mas, a outros desconfortos psicolgicos, vale,

    como exemplo, o caso de uma cliente em terapia, relatado abaixo:

    Portadora de compulso alimentar, Raquel no sabia o que fazer para combater tal

    distrbio. Tinha ido a diversos profissionais: mdicos, nutricionistas e psiclogos; tomado

    diversos medicamentos, sem resolver o problema, pois, continuava alimentando-se de

    modo inadequado e engordando. Quando veio para a terapia, estava desesperada e com o

    casamento em crise. Depois de algumas sesses analticas, ela concordou em submeter-se a

    algumas sesses de renascimento. Numa delas, eis que comeou a chorar convulsivamente.

    Perguntado sobre o porqu do choro, respondeu que, enquanto respirava, veio- lhe mente

    uma lembrana de quando, por volta dos seis anos de idade, a me lhe impunha comer,

    ameaando- lhe que, se ela no comesse, iria virar um palito adjetivo, para me, de pessoa

    extremamente magra, fraca e feia . Segundo ela, depois de apurada anlise, esse era o

    temor que, inconscientemente, fazia com que ela comesse, compulsivamente. Depois, de

    passar por um processo de reparentalizao9 com a me e perdo-la por t- la induzido, de

    9 A reparentalizao (reparenting) uma tcnica, criada por Jacqui Lee Schiff, utilizada no tratamento de psicoses,

    tambm utilizada para redefinir em pensamentos e hbitos saudveis pessoas com desconfortos emocionais creditados

    ocorrncias na primeira infncia. Eu uso o termo reparentalizao no sentido de reconciliar a pessoa com as figuras

    parentais como me, pai ou substitutos.

  • 40

    certo modo, a desenvolver tal distrbio, e, tambm, de auto-reparentalizao10, sua

    mudana teve incio. Ento, aps passar por um processo de redefinio de sua autoestima,

    que motivou, inicialmente, sua reeducao alimentar, ela voltou ao peso adequado, adotou

    novos hbitos saudveis e recuperou, segundo ela, sua alegria de viver. Fato este, tambm,

    observado pela mudana no seu modo de vestir, antes conservador com cores mais

    escuras e sbrias , depois mais jovial, com cores mais coloridas e alegres. Por fim, pode-se

    dizer que ela adquiriu novo entusiasmo pela sua vida e, num breve tempo, reequilibrou seu

    relacionamento com o esposo e os filhos.

    A Educao Crtica depreciativa, ou seja, alguns pais apelam, equivocadamente,

    para a desqualificao do filho, pensando que, assim, o motivaro para que realize alguma

    tarefa a contento ou venha a corrigir alguma postura. Alguns at argumentam que, de vez

    em quando, necessrio mexer com os brios ou nimo do filho para que ele reaja ou

    motive-se. O que um crasso engano, pois, o que conseguem com essa prtica,

    inadequada, , na maioria das vezes, ativar sentimentos de raiva, revolta, rejeio ou

    incapacidade. Inmeros so os indivduos que carregam em si as marcas desse tipo de ao

    dos seus progenitores. J ouvi, em terapia, de homens e mulheres, reclamos sobre pais e

    mes que os depreciavam. E o resultado dessas desqualificaes foi que cresceram

    alimentando sentimentos de incapacidade e inutilidade, resultando em uma autoestima

    baixa e falta de reatividade diante das oportunidades na vida. Um exemplo:

    Sandra era uma mulher trabalhadora, com valores bem definidos, esbelta e com uma

    firmeza de carter, impar. Divorciada, criou com dedicao um casal de filhos. Mesmo

    assim, no se sentia feliz, sua vida amorosa, desde o prprio casamento, nunca foi das

    melhores. Sempre nutriu por si um sentimento de inferioridade e uma quantidade

    considervel de medos. Ao falar sobre sua vida pregressa, relatou que, o que mais doa em

    sua vida era, desde criana, ter ouvido, repetidamente de seu pai, que mulher nenhuma

    prestava; que no serviam para nada. Seus irmos tambm desenvolveram o modelo

    doentiamente machista e depreciativo do pai, em relao s mulheres, resultando em uma

    convivncia difcil entre ela e eles. At os seus 43 anos ela no conseguira superar certo

    sentimento de incapacidade. Com uma autoestima baixa, vivia sem ter muito apreo por ela

    10

    A autoreparentalizao deriva da reparentalizao, mas, trata-se da reconciliao parental que a pessoa promove consigo mesmo, ou seja, trata-se da autoaceitao positiva, onde a pessoa reconhece as suas potencialidades e qualidades com a finalidade de situar-se na vida de modo afirmativo.

  • 41

    mesma, mantendo em seus relacionamentos, ora atitudes mais agressivas e revoltosas, ora

    de submisso.

    Em terapia, comeou um processo, primeiramente, para reparentalizar-se com o pai,

    e depois com a me. Segundo ela, a falta de reatividade da me, diante dos improprios que

    o pai destinava s mulheres, ajudava a reforar os seus medos. Graas sua frrea vontade

    e dedicao ao processo teraputico, foi, aos poucos, redescobrindo suas qualidades,

    aprendendo a admirar suas conquistas, alm de desenvolver seu autorrespeito. Seus medos

    foram, tambm, superados pelo resgate da sua autoestima e o fortalecimento da sua

    autoconfiana.

    Segundo ela, conhecer a razo dos seus medos, do seu sentimento de incapacidade e

    da falta de autoconfiana foi fundamental para que ela, ao despedir-se do seu passado e

    dos mandatos negativos que tanto influenciaram sua vida, resgatasse o amor por ela mesma

    aprimorando seu senso de autovalorizao. Da em diante, seus relacionamentos, de modo

    geral, ganharam qualidade e satisfao, e a relao com seus filhos foi enriquecida com

    maior afetividade. A superproteo, que antes era geradora de muitos atritos, foi substituda

    pela necessria autonomia que eles necessitavam para evolurem, de modo saudvel e

    equilibrado.

    Acrescento, ainda, a fim de dar pleno entendimento a esse tpico, que a Educao

    Crtica, tal qual aqui abordada, , tambm, um forte elemento disseminador de sentimentos

    de inadequao, uma vez que os meios coercitivos utilizados pelos pais ou seus

    substitutos para obter obedincia a qualquer custo , por serem desprovidos de afetividade,

    levam a criana a sentir-se deslocada e no aceita no meio em que vive. Alis, embora pais

    ou substitutos, quando questionados sobre esse modelo precrio com qual tentam educar

    seus filhos , repitam que tudo o que fazem para o bem da criana, ele, em si, no leva ao

    fundamental desenvolvimento da afetividade e nem colabora com o aprimoramento do

    pensamento ou da racionalidade, j que, para ser obediente, no necessrio pensar, s

    treinar. E isso que acontece com boa parte das pessoas educadas nesse padro, salvo

    quando, mais frente, a pessoa consegue se libertar dessa influncia limitadora.

  • 42

    Em sntese, pode-se afirmar que a Educao Crtica aponta, apenas, dois caminhos

    ao indivduo: ou ele vai ser extremamente obediente, ou desobediente; submisso, ou

    rebelde. E isso lhe trar, com certeza, inmeros desconfortos ou desarmonia em sua vida.

    A ttulo de breve explicao, e no de justificativa, vale registrar que a maioria dos

    pais ou substitutos comete essas aes, que deseducam, de modo inconsciente, devendo-se

    isso falta de preparo e ao desconhecimento sobre a repercusso delas na existncia dos

    filhos. Podemos dizer, inclusive, que muitos pais repassam, cegamente, apenas aquilo que

    aprenderam em seu processo educativo, sem a mnima reflexo ou autocrtica sobre o

    modelo de educao herdado ou, ainda, sobre como aperfeio- lo para que seja eficaz no

    tempo presente.

    Alm dos atos mais grosseiros utilizados nesse modelo que considero

    deseducativo e deformador da personalidade do indivduo , enumero, a seguir, algumas

    outras prticas, tambm usuais, como a superproteo, a obedincia condicionada ou

    premiada, a chantagem comparativa11 e a responsabilizao prematura.

    1. Superproteo

    A superproteo est inserida no modo de Educao Crtica, uma vez que ela, sob a

    mscara de proteger ou defender os filhos de situaes a serem superadas, traz, em seu

    cerne, transferncias de medos, inseguranas ou fracassos dos pais.

    Infelizmente, encontramos pais que por no terem superado certas inaptides,

    carncias, temores ou frustraes , transferem a seus filhos a incumbncia de serem bem

    sucedidos e no desapont-los, s vezes, at por fora de sentirem-se culpados por no

    terem correspondido ao que seus prprios pais ambicionavam para eles. Da que, sob o

    intuito de proteger os filhos, para o bem deles, acabam por impedi- los de enfrentar seus

    prprios desafios e desenvolverem-se, espontaneamente.

    Na faze da educao escolar, por exemplo, so comuns os pais que, praticamente,

    fazem os deveres de casa do filho, para que ele no se submeta a cometer erros ou tirar

    notas baixas. Alm disso, ao mesmo tempo em que o protegem, exigem, em troca,

    excelncia em tudo que ele faa. O que, em sntese, resulta na perda da sua individualidade

    e, por consequncia, em sua baixa autoestima. s vezes, mesmo que inconscientemente,

    11

    No captulo VI, h, tambm, uma referncia assemelhada a essa prtica inadequada.

  • 43

    muitos pais so os responsveis pelas dificuldades que o filho enfrenta na vida adulta, por

    fora da proteo, exacerbada, dedicada a ele. Inclusive algumas fragilidades fsicas e

    emocionais podem resultar da superproteo.

    Em terapia contumaz ouvir queixas de pessoas com baixa autoconfiana e

    insatisfeitas com o rumo de suas vidas que, segundo elas, no puderam escolher suas

    prprias profisses e, at mesmo, seus relacionamentos. Isso pelo excesso de zelo dos pais

    em determinar o que seria melhor para elas. Algumas pessoas, nunca puderam tomar

    decises importantes ou ousar, diante de alguma circunstncia, por medo de contrariar os

    pais.

    Filhos criados assim, na maioria das vezes, so portadores de um modelo de

    autodepreciao e dependentes. Por no conseguirem confiar em suas prprias ideias,

    sentem-se incompetentes perante a vida: bloqueiam suas capacidades reativas, se

    autoanulam, so ansiosos, se deprimem com facilidade e possuem propenses para vcios.

    Existem casos, dramticos, de pessoas que desenvolveram hbitos autodestrutivos e at se

    suicidaram por no suportarem a presso dos pais em suas escolhas profissionais ou

    relacionais.

    2. Obedincia Premiada ou Condicionada

    A obedincia condicionada aquela exigida por meio da concesso ou trocas de

    prmios, principalmente de natureza material, por feitos que, a priori, podiam ser

    realizados de maneira incondicional, se os pais tivessem a habilidade de explicar a

    importncia de certos afazeres para os filhos, evitando, assim, a chantagem que caracteriza,

    em termos prticos, a compra da obedincia deles. Essa atitude nada tem de pedaggica,

    uma vez que os filhos, assim educados, deixam de aprender a responsabilidade elemento

    fundamental para ter autonomia na busca da autorrealizao futura.

    Em se tratando da autoestima, essa prtica no a favorece, porquanto os filhos se

    sentiro sempre compelidos a negociar suas condutas ou a prtica de valores. Alm do que,

    isso dificultar o incremento de capacidades de superao que, em ltima instncia,

    deveriam servir- lhes de suporte para uma formao sadia e produtiva. Como na vida real,

    eles os filhos , no encontraro sempre quem lhes atenda as necessidades, propondo- lhes

    trocas satisfatrias para cumprirem com suas responsabilidades, eles, provavelmente, iro

  • 44

    acumular frustraes por faltar- lhes o devido preparo e a necessria eficincia pessoal para

    enfrentarem seus desafios existenciais e progredirem.

    3. Jogo Comparativo

    Como j comentei no captulo sobre a rejeio parental, o uso da comparao um

    procedimento danoso autoestima. Mesmo assim, no incomum encontrarmos pais e

    professores, principalmente, que atravs da comparao com outrem , busquem fazer

    com que a criana atenda s suas expectativas de aprendizado, sejam elas comportamentais

    ou no. No mbito da famlia, por exemplo, vemos, muitas vezes, pais comparando um

    irmo com o outro, ou com o filho de algum parente ou amigo mais prximo.

    Eis alguns exemplos de falas usadas, comumente, quando da prtica desse infeliz

    modelo:

    Seu irmo, sim, que inteligente.

    Aquele, ali, um doce; este, aqui, um traste.

    Voc deveria ser como seu primo: obediente, estudioso...

    Esse, a, puxou o pai.

    Aquela, ali, igualzinha me.

    Voc devia seguir o exemplo do seu colega, ele faz tudo para agradar aos pais.

    Estas so, apenas, algumas das inmeras falas negativas e usuais no processo

    comparativo, dado que elas apenas se diferenciam na forma, sendo o contedo

    manipulativo sempre o mesmo.

    Na famlia, principalmente, essa abordagem, comparativa, alm da ideia falsa de ser

    estimulante, prdiga em criar sentimentos de rejeio, raiva e rebeldia naquele que

    comparado como inferior, pois o entendimento de que os pais gostam menos dele do que

    daquele com o qual comparado. Por outro lado, aquele que comparado, positivamente,

    pode, por medo da rejeio, vir a desenvolver atitudes compulsivas de obedincia cega, e

    criar para si a ideia de que, para no desapontar seus pais ou substitutos, ele tem que ser

    perfeito e seguir, sempre, os mandatos deles. Vale destacar que estas e outras repercusses

    vo alm da infncia ou adolescncia. Vejamos, na prtica, como isso pode funcionar, em

    termos de rejeio:

  • 45

    Marta, aos 45 anos de idade, veio para terapia por sentir-se deprimida e, segundo

    ela, por no ver sentido em sua vida. Apesar de relutante, ela foi narrando alguns

    acontecimentos da sua vida pregressa: o fim do seu casamento, as dificuldades com os

    filhos, a raiva do ex-marido, seus medos, a dificuldade de entrega no novo relacionamento

    e o acomodamento, geral, da sua vida.

    Falava alto, sempre demonstrando irritao e uma revolta muito grande,

    praticamente, com tudo. Aos poucos, apesar de no entregar-se, totalmente, prtica

    respiratria do Renascimento, ela foi se soltando, mas sempre que eu perguntava- lhe sobre

    o relacionamento com a sua me ela a elogiava, vagamente, e referia-se admirao que os

    outros tinham por ela. Tudo transcorria muito lentamente, at o dia em que ela passou a

    falar da sua irm que, a julgar por sua narrativa, era o exemplo de sucesso da famlia, bem

    casada, com uma boa profisso, filhos etc.

    Em determinada sesso, perguntei- lhe, repentinamente:

    Voc no acha que sua insegurana proveniente das comparaes que a sua me fazia

    de voc, em relao a sua irm?

    Ao dizer- lhe isso, foi como se houvesse aberto as comportas de uma grande represa,

    ela chorou, convulsivamente, por mais de dez minutos. E, a, comeou a falar como se

    sentia, realmente, diante das desqualificaes que sofria da me e do pai (j falecido

    poca da terapia) que, at ento, no havia sido mencionado diretamente nas sesses.

    Aconteceu algo como se ela tivesse voltado no tempo. Vieram tona os sentimentos

    recalcados de rejeio e de desaprovao dos pais, o que rendeu mais algumas sesses,

    somente sobre esse assunto, ficando claro que se casara revelia dos pais, por pura

    rebeldia, para atingi- los, e no porque desejasse faz- lo, conscientemente. Enfim, toda a sua

    insegurana, mais o complexo de inferioridade e, sobre maneira, a sua baixa autoestima,

    estavam relacionados prtica da comparao levada a efeito pelos seus pais.

    Na sequncia do seu processo teraputico, depois de muito esforo e tempo, venceu

    o medo e conseguiu conversar com sua me a respeito das comparaes. Falou das suas

    angstias e raivas e de tudo quanto sofrera devido a elas. Segundo ela, foram mome ntos

    difceis e bastante emocionais de pedidos de perdo, de ambas as partes: da me, pelo

    tratamento inadequado dado a ela, e, da sua parte, pela raiva e outros sentimentos de igual

    teor, acumulados. Mesmo assim, por mais difcil que tenha sido ela conseguiu se

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    reparentalizar com a me, que era a parte mais entranhada daquela infeliz simbiose. No que

    se referia ao pai (j falecido), ela reconciliou-se com ele, atravs de uma prtica de perdo.

    A reparent