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Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M. 491 AVALIAÇÃO DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE/PB: a efetividade da ação estatal no atendimento às demandas sociais Lizandra Kelly de Araújo Santana 1 Gêuda Anazile da Costa Gonçalves 2 Julio Vitor Menezes dos Santos 2 RESUMO Para legitimar sua atuação e promover o desenvolvimento da sociedade o Estado se utiliza de Políticas Públicas, a efetividade dessas está diretamente relacionada ao atendimento das demandas sociais. O Programa Bolsa Família - PBF, foco deste trabalho, caracteriza-se como uma política pública de transferência de renda, implantada em 2003, pelo governo brasileiro, com o objetivo de combater a pobreza e a fome, e promover inovações no padrão histórico de intervenção pública na área social. Assim sendo, avaliar a efetividade da política pública, em questão, pode viabilizar o entendimento do nível das ações do governo, o que, em tese, possibilita a prevenção e a melhoria continua da gestão. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo avaliar o impacto do PBF no município de Campina Grande-PB. Para tanto, foram coletados dados através da pesquisa de campo e da pesquisa documental, os dados primários foram acessados através de entrevistas com os atores institucionais e sociais, envolvidos com o PBF, no período de janeiro e fevereiro de 2016, já os dados secundários foram coletados em documentos oficiais do governo. Os resultados indicam que apesar da necessidade de ajustes, o PBF tem gerado um impacto positivo na vida dos beneficiários, em especial no que se refere às ações de educação e saúde no município de Campina Grande, PB. Palavras Chave: Políticas Públicas. Avaliação de Políticas Públicas. Programa Bolsa Família. 1 Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). 2 Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

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AVALIAÇÃO DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO

MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE/PB:

a efetividade da ação estatal no atendimento

às demandas sociais

Lizandra Kelly de Araújo Santana1 Gêuda Anazile da Costa Gonçalves2

Julio Vitor Menezes dos Santos2

RESUMO Para legitimar sua atuação e promover o desenvolvimento da sociedade o Estado se utiliza de Políticas Públicas, a efetividade dessas está diretamente relacionada ao atendimento das demandas sociais. O Programa Bolsa Família - PBF, foco deste trabalho, caracteriza-se como uma política pública de transferência de renda, implantada em 2003, pelo governo brasileiro, com o objetivo de combater a pobreza e a fome, e promover inovações no padrão histórico de intervenção pública na área social. Assim sendo, avaliar a efetividade da política pública, em questão, pode viabilizar o entendimento do nível das ações do governo, o que, em tese, possibilita a prevenção e a melhoria continua da gestão. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo avaliar o impacto do PBF no município de Campina Grande-PB. Para tanto, foram coletados dados através da pesquisa de campo e da pesquisa documental, os dados primários foram acessados através de entrevistas com os atores institucionais e sociais, envolvidos com o PBF, no período de janeiro e fevereiro de 2016, já os dados secundários foram coletados em documentos oficiais do governo. Os resultados indicam que apesar da necessidade de ajustes, o PBF tem gerado um impacto positivo na vida dos beneficiários, em especial no que se refere às ações de educação e saúde no município de Campina Grande, PB. Palavras Chave: Políticas Públicas. Avaliação de Políticas Públicas. Programa Bolsa Família.

1 Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

2 Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

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1 INTRODUÇÃO

O presente estudo se insere nas abordagens teóricas que tratam da avaliação

de políticas públicas tendo como pano de fundo a concepção do Estado. O Estado

tem como principal função a promoção do bem estar social, o que, em tese,

concretiza-se a partir de políticas públicas alinhadas as demandas sociais. O Estado

democrático de direito tem envidado esforços no sentido de equacionar, via

formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, velhas e novas

questões sociais (CALDAS, 2008). O Estado brasileiro, a partir do processo de

redemocratização, vem passando por transformações que tendem a redirecionar a

forma de gerir políticas públicas.

Pereira (2008) afirma que as Políticas Públicas abrangem um conjunto de

ações que buscam solucionar os impasses da alocação de bens e recursos públicos,

direcionados a uma camada da sociedade. Sendo assim, podemos afirmar que as

políticas públicas sociais são ações que determinam um padrão de proteção social,

voltadas para a redistribuição dos benefícios sociais, visando à diminuição das

desigualdades estruturais.

A gestão de políticas públicas é um processo dinâmico, composto pelas

seguintes fases sequenciais: Diagnóstico, Formulação, Implementação e, Avaliação.

O monitoramento contínuo desse ciclo, por parte de atores institucionais e sociais,

minimiza o risco iminente de ―desvio de rota‖ na ação do Estado.

Uma política pública é considerada efetiva quando impacta positivamente seu

público-alvo. Para Faleiros (2000) as orientações que norteiam a formulação e

execução dos programas de natureza social têm apontado muito mais para o

desenvolvimento de ações que objetivam minimizar os efeitos dos problemas já

instalados do que, propriamente, em intervenções que busquem ações mais

resolutivas. Sendo assim, ao avaliar a efetividade das políticas públicas pode-se

contribuir para melhoria contínua das ações dos governos, para legitimação da ação

do Estado e, quiçá para a promoção de uma nova relação Estado-sociedade.

Uma metodologia de avaliação de políticas públicas envolve a escolha de

critérios e indicadores consistentes, que permitam julgar o impacto tendo como

parâmetro os padrões de desempenho anteriormente estabelecidos. O processo de

avaliação será facilitado se baseado em um bom planejamento, onde será possível

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estabelecer as relações causais entre atividades, produtos e resultados, que

permitam atingir as metas visadas e os impactos pretendidos (COSTA e

CASTANHAR, 2003).

De acordo com o Censo 2010, 40% da população do município de Campina

Grande, PB, encontrava-se em situação de vulnerabilidade a pobreza, o que leva o

município a ser potencial demandante de políticas públicas sociais. Atualmente,

aproximadamente, 33.813 famílias estão cadastrados no Programa Bolsa Família.

À medida que o PBF é concedido às famílias em forma de benefício, com um

valor médio de R$180,00, os beneficiários do PBF estão sujeitos ao

cumprimento das condicionalidades em áreas estratégicas. Na área de

educação, saúde e assistência social. As condicionalidades são tratadas como

compromissos assumidos pelas famílias beneficiárias e pelo poder público, com o

objetivo de favorecer a estruturação das famílias beneficiárias e ampliar seu acesso

aos direitos sociais básicos.

Neste contexto, questiona-se: Qual o impacto que o Programa Bolsa Família

tem causado no município de Campina Grande, estado da Paraíba? Esta pesquisa

tem como objetivo avaliar o impacto do Programa Bolsa Família no município de

Campina Grande, estado da Paraíba.

2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 Políticas Públicas de Transferência de Renda: Da primeira proposta

nacional ao Programa Bolsa Família

De acordo com Soares e Sátyro (2009), no Brasil, o primeiro passo em

direção a um paradigma inclusivo veio com a criação da previdência rural, em 1971,

e a consequente quebra da relação entre contribuição e benefício. Entretanto, foi a

partir da Constituição de 1988 que se consolidaram novos e importantes aspectos

para a construção de um novo sistema brasileiro de proteção social.. Para os

autores, o seguinte passo ocorreu nos anos 1990, com a aprovação pelo Senado,

em dezembro de 1991, de autoria do senador Eduardo Suplicy, propondo a

instituição de um Programa de Garantia de Renda Mínima (PGRM). O projeto do

senador propunha a adoção de um programa de imposto de renda negativo, que

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beneficiaria todas as pessoas residentes no país e maiores de 25 anos e de baixa

renda. A proposta previa ainda a implantação gradual do programa, começando

pelas pessoas com mais de 60 anos (em 1995) e finalizando em 2002, quando se

atingiria todo o universo previsto, isto é, todos os indivíduos maiores de 25 anos.

(DINIZ, 2007).

O ano de 1995 é o marco inicial da concretização de um debate sobre

Programas de Transferência de Renda, que no Brasil, iniciou em 1991. Foram

implantados quatro programas locais de renda mínima simultaneamente no Brasil. O

Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima, da prefeitura municipal de

Campinas, iniciado em março de 1995; o Programa Bolsa Familiar para a Educação

(Bolsa Escola) e o Programa Poupança-Escola do Governo de Brasília/DF, com

inicio em maio de 1995; o Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima, da

prefeitura municipal de Ribeirão Preto, iniciado em dezembro de 1995; e o Programa

‗‘Nossa Família‘‘ da prefeitura municipal de Santos/SP (SILVA, GIOVANNI e

YASBECK, 2011).

Foi a partir de 2001, mais precisamente, que o Governo Federal se propôs a

desenvolver o que passou a denominar Rede de Proteção Social direcionada à

população pobre do país. Nivelando a assistência social às politicas de educação,

saúde e previdência. Destaca-se a criação do Benefício de Prestação Continuada –

BPC, destinados a idosos e deficientes físicos em situação de extrema pobreza; o

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, uma iniciativa que visa

proteger crianças e adolescentes, menores de 16 anos, garantindo que frequentem

a escola; o Programa Agente Jovem que buscou definir uma proposta de ocupação

destinada a jovens em situação de risco e vulnerabilidade social. Além desses,

foram criados o Programa de Renda Mínima, vinculado à Educação, o Programa

Bolsa Alimentação, o Auxílio-Gás e o Programa Cartão-Alimentação. Vale ressaltar

que os Programas Bolsa-Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e Cartão

Alimentação foram unificados, dando origem ao Programa Bolsa Família,

considerada a maior política pública de transferência de renda do Brasil.

O Programa Bolsa Família (PBF) é, atualmente, a principal política pública de

transferência de renda do Brasil, o referido programa foi instituído pela Medida

Provisória nº 132, em outubro de 2003, transformada na Lei 10.836, em 9 janeiro de

2004. O PBF foi criado no governo de Luís Inácio Lula da Silva através da unificação

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de quatro programas sociais já existentes, cujo objetivo era garantir uma cobertura

nacional.

De acordo com Campello (2013), o Programa Bolsa Família busca contribuir

para a inclusão social de milhões de famílias brasileiras premidas pela miséria, com

alívio imediato de sua situação de pobreza e da fome. Além disso, também almejava

estimular um melhor acompanhamento do atendimento do público-alvo pelos

serviços de saúde e ajudar a superar indicadores ainda dramáticos, que marcavam

as trajetórias educacionais das crianças mais pobres: altos índices de evasão,

repetência e defasagem idade-série. Pretendia, assim, contribuir para a interrupção

do ciclo intergerencial de reprodução da pobreza.

A gestão do PBF, depende da atuação conjunta e articulada dos governos

federal, estadual e municipal, de forma a criar uma rede estratégica de serviços

capazes de combater a pobreza através do acesso a bens e serviços. Cabe a

gestão federal o gerenciamento, a operacionalização, o acompanhamento e a

fiscalização do programa, enquanto os Estados e o distrito federal são responsáveis

pelo apoio aos municípios na implementação. Por fim, são os municípios que são

responsáveis pela gestão local, devendo identificar e cadastrar as famílias. (MDS,

2016)

Segundo o Ministério de Desenvolvimento Social e Agrário - MDS, o PBF

complementa a renda de 14 milhões de famílias brasileiras, composto por um

benefício básico no valor de R$ 77, concedido às famílias extremamente pobres, e por

quatro benefícios :

• Benefício Básico (pagos apenas a famílias extremamente pobres, com renda per capita igual ou inferior a R$ 77);

• Benefício Variável (R$ 35, cada um, até cinco por família); • Benefício Variável Vinculado ao Adolescente (BVJ) (é concedido

valor de R$ 42,00 a todas as famílias que tenham adolescentes de 16 e 17 anos frequentando a escola. Cada família pode receber até dois BVJs.);

• Benefício Variável Vinculado à Nutriz (Pago às famílias com renda mensal de até R$ 154,00 por pessoa e que tenham crianças com idade entre 0 e 6 meses em sua composição, para reforçar a alimentação do bebê, mesmo nos casos em que o bebê não more com a mãe.)

• Benefício Variável Vinculado à Gestante (Pago às famílias com renda mensal de até R$ 154,00 por pessoa e que tenham grávidas em sua composição);

• Benefício para Superação da Extrema Pobreza -- Pago às famílias que continuem com renda mensal por pessoa inferior a R$ 77,00,

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mesmo após receberem os outros tipos de benefícios do Programa (MDS, 2014).

Em contrapartida, os beneficiários do PBF estão sujeitos a condicionalidades

em áreas estratégicas. Na área de educação a condicionalidade é a manutenção

dos filhos na escola, com frequência mínima mensal de 85%, para a faixa etária de

até 15 anos e de 75%, para os que se encontram entre 16 e 17 anos. Na saúde, o

acompanhamento do calendário de vacinação das crianças menores de 07 anos e a

realização do pré-natal de mulheres entre 14 a 44 anos. Já na área de assistência

social, o PBF exige que as crianças e adolescentes, com no máximo 15 anos,

participem do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI).

Diversos estudos têm confirmado efeitos positivos do PBF, especialmente no

que se refere à diminuição da pobreza e da desigualdade de renda e melhorias nas

áreas de saúde e educação.

Na área da saúde, Rasella (2013) discute que PBF tem desempenhado um

papel significativo na redução da mortalidade infantil, geral e por causas

relacionadas com a pobreza, como desnutrição e diarreia, nos municípios brasileiros

nos últimos anos. Além disso, o PBF contribuiu para reduzir substancialmente as

taxas de hospitalização em menores de cinco anos e aumentou a cobertura vacinal

e as consultas pré-natais.

Já em relação à área da educação, Feijó e Pires (2015) traz uma discussão

quanto à percepção dos beneficiários sobre a frequência escolar e a escola. Os seus

achados mostram que para as mães beneficiárias a exigência da frequência é o

mínimo que o governo pode fazer e que é muito importante, exigir a presença das

crianças na escola é fundamental e nada difícil de cumprir. Além disso as

beneficiarias destacaram não ter dificuldades de acesso à escola para seus filhos,

por outro lado, afirmaram que quanto mais velhos os filhos se tornam mais árdua é

a tarefa de cumprir a condicionalidade da educação.

O estudo de Barbosa e Corseuil (2011) buscou analisar uma possível

influência do PBF em relação ao trabalho informal, tendo em vista que o programa é

uma política pública auto declaratória e se tratando de monitoramento,

remunerações oriundas de trabalho informal podem ser mais restritas, não visíveis

quanto à remuneração com carteira assinada, o que facilitaria a permanência no

perfil de beneficiário. Os resultados do estudo indicam que o programa PBF tende a

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gerar, de fato, alguma distorção na escolha ocupacional somente do trabalho principal

do chefe da família, mas não na escolha ocupacional de nenhum outro trabalho do

domicílio. Outros resultados referem-se aos impactos do dessas iniciativas, estaria

uma redução da taxa de informalidade do público-alvo do programa.

Por fim, Silva (2007) argumenta que embora os resultados e impactos

decorrentes dos Programas de Transferência de Renda sejam muito modestos para

superar a fome e a pobreza no Brasil, o significado real que esses programas

representam para as famílias beneficiárias deve ser considerado, por permitir a

elevação ou mesmo o único acesso a uma renda monetária por parte de um número

elevado de famílias que se encontra à margem da sociedade, considerando o nível

de destituição em que sobrevivem.

No entanto, a autora compreende que para que o quadro de pobreza possa

ser progressivamente superado, é necessário que esses programas possam não só

distribuir, mas sejam capazes de redistribuir renda entre a população brasileira, de

modo a alterar o nível de concentração da riqueza socialmente produzida. Considera

também a potencialidade desses programas para a criação de condições

progressivas, mesmo que, em longo prazo, para inclusão de futuras gerações de

crianças e adolescentes das famílias beneficiárias que passam a frequentar escola,

postos de saúde, sair da rua ou do trabalho precoce, penoso e degradante. (SILVA,

2007). Portanto, o Programa Bolsa Família amplia o acesso dos cidadãos, que se

encontra em situação de vulnerabilidade econômica e social, a equipamentos e

serviços públicos essenciais à promoção de melhoria em suas condições de vida.

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS

O presente estudo é de cunho qualitativo e a relação com a realidade se dá

por meio do paradigma interpretativo de investigação social. O paradigma

interpretativista parte do princípio que a realidade social não existe em termos

concretos, mas é um produto de experiências subjetivas e intersubjetivas dos

indivíduos. Ou seja, a realidade é socialmente construída, estabelecendo a interação

entre pesquisador e objeto pesquisado (DENZIN; LINCOLN, 2005; SILVA; NETO,

2006).

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Para a presente pesquisa adotamos o estudo de caso como estratégia

metodológica. Os estudos de casos são especialmente indicados na exploração de

processos e comportamentos dos quais se tem uma compreensão limitada. Além

disso, podem trazer uma importante contribuição quando a intenção do pesquisador

não é explorar casos típicos, mas examinar casos extremos ou poucos usuais, os

quais podem ser especialmente reveladores. Utiliza-se o estudo de caso quando o

foco de interesse é sobre fenômenos atuais, que só poderão ser analisados dentro

de algum contexto de vida real. (GODOY, 1995; 2006)

As técnicas de coleta de dados utilizadas foram: pesquisa documental,

observação participante, entrevista semiestruturada e anotações de campo. Na

primeira etapa da construção da pesquisa, a base fundamental foram entrevistas

semiestruturadas, realizadas no período de janeiro e fevereiro no ano de 2016, feitas

com os atores institucionais e sociais envolvidos com o PBF, sendo eles: 3 (três)

coordenadores do Programa ligados a área da Assistência Social (entrevistado 1),

Saúde (entrevistada 2) e Educação (entrevistada 3), além de 6 (seis) mulheres

beneficiárias do PBF (entrevistadas 4,5,6,7,8,9). Por se tratar de uma pesquisa

qualitativa, selecionamos os entrevistados pelos critérios de representatividade e

saturação. As entrevistas duraram em média 20 minutos, foram gravadas e depois

transcritas.

Assim como a coleta dos dados, a fase de análise também foi subdivida em

duas etapas, na primeira os dados extraídos das entrevistas foram submetidos à

técnica qualitativa denominada análise de conteúdo, respeitando as etapas

propostas por Bardin, (2009): Pré-análise: exploração do material, tratamento dos

resultados e, interpretação; em seguida a etapa de exploração do material, onde se

buscou alcançar a compreensão do texto e por fim, realizou-se a interpretação dos

depoimentos, por meio da distribuição das categorias temáticas encontradas,

interpretação e discussão dos resultados.

As categorias adotadas para o estudo são fechadas, por serem relacionadas

às condicionalidades do Programa Bolsa Família, já as subcategorias são abertas

por terem sido produzidas a partir da reavaliação das entrevistas, como pode ser

visto na tabela abaixo:

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Quadro 01: Categorias e Subcategorias

Assistência Social

Inclusão das famílias ao Programa Bolsa Família

Atualização Cadastral

Renda e temporização do Programa Bolsa Família

Educação Acompanhamento da educação: avanços, desafios

e possibilidades de acompanhamento

Saúde Acompanhamento da saúde: avanços, desafios

e possibilidades de acompanhamento

Fonte: Elaboração Própria, 2016.

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1. Caracterização do Lócus do Estudo

No município de Campina Grande, PB, de acordo com o Ministério do

Desenvolvimento Social e Combate à Fome, aproximadamente 33.813 famílias são

cadastradas no PBF, o que corresponde a um investimento de R$ 4.400.382,00 para

pagamento de benefícios às famílias. Os tipos de benefícios variam de acordo com a

composição e a renda da família beneficiária.

Em termos de impacto social, a pobreza e a desigualdade vêm diminuindo no

Brasil de forma sustentada desde 2004, o que indica que as transferências de renda

assistenciais, em geral, e o PBF, em particular, têm contribuído para esta evolução

favorável. De acordo com os dados do Censo 2010 é possível identificar uma

redução considerável da pobreza no município estudado, entre a década de 2000 e

2010. A população extremamente pobre (com renda per capita até 70,00)

apresentou uma redução de 12,07% para 5,02% e, em relação à população pobre

(com renda per capita igual ou inferior a 140,00), verifica-se uma redução de 33,44%

para 16,34%. Esses dados refletem o impacto das políticas públicas de transferência

de renda, em especial o Programa Bolsa Família, na dinâmica econômica local.

4.2. Análise das Categorias e Subcategorias

Categoria 1: Assistência Social

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Esta categoria retrata como se dá a inserção das famílias ao Programa Bolsa

Família (PBF) e a atualização cadastral.

Subcategoria 1.1: Inclusão das famílias ao Programa Bolsa Família

De acordo com Campello (2013), o objetivo do Programa Bolsa Família é

contribuir para a inclusão social de milhões de famílias brasileiras premidas pela

miséria, com alívio imediato de sua situação de pobreza e de fome. O primeiro passo

para o acesso ao PBF é o cadastro no CadÚnico – Cadastro Único. De acordo com

o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário – MDS, este é o principal

instrumento do Estado brasileiro para a seleção e a inclusão de famílias de baixa

renda em programas federais. Nesse instrumento são registradas informações

como: características da residência, identificação de cada pessoa, escolaridade,

situação de trabalho e renda. Os dados informados no ato do cadastramento serão

analisados para que os candidatos sejam incluídos ou não como beneficiários do

PBF. A gestão do CadÚnico é de responsabilidade compartilhada - governos federal,

estadual, municipal e, Distrito Federal.

O bolsa família faz uma verificação da família, de pobreza ou extrema pobreza, isso aí é um calculo matemático, ele vai avaliar a renda familiar, essa renda pode ser formal, através de carteira assinada ou informal se ela é autônoma [...] enfim, trabalhos autônomos, sem necessitar uma declaração formal, um decore, ele diz que realiza uma atividade autônoma e aí ele declara uma renda, fica numa situação declaratória. (Entrevistado 1) Se a pessoa recebe R$ 1.000,00 e mora com 5 pessoas, dividindo por 5, dá 200,00 de renda per capita, nesse caso ele não teria direito ao benefício. O ‗bolsa família‘‘ diz o seguinte: a família está em situação de pobreza quando esta contabilidade dá um resultado de até R$ 154,00 de renda per capita, se der R$ 155,00 não consegue se inserir no programa. [...] Infelizmente, apesar de ser para uma política social, o sistema faz um calculo exato, ou é até R$ 77,00 ou até R$ 154,00, se não tiver dentro desse cálculo, de renda per capita, não consegue se inserir no programa. ‘‘ (Entrevistado 1)

Percebe-se com o discurso acima que há uma limitação na gestão do PBF no

que tange a seleção dos beneficiários. Sendo o cadastro único autodeclaratório, o

controle sobre a inserção no programa de pessoas que, de fato, atendam os critérios

de pobreza ou extrema pobreza, é dificultado, já que não tem como checar a

veracidade das informações repassadas pelos que não estão no mercado formal.

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O discurso ainda revela que as famílias que se encontram no mercado formal

e, portanto, precisam apresentar comprovantes de rendimento para o cadastro do

PBF, podem ser prejudicadas no acesso ao referido programa, tendo em vista que a

renda per capita, comprovada, via carteira de trabalho, não pode ultrapassar o limite

de até R$ 154,00.

Na visão de Silva (2007) esse critério único da renda para dimensionar a

pobreza é insuficiente para perceber a pobreza enquanto fenômeno complexo e

multidimensional. Essa focalização fragmenta mais que focaliza na população pobre

por ser incapaz de alcançar a totalidade dos segmentos populacionais que estão

demandando atenção especial

As falhas nos critérios de acesso ao PBF, assim como a baixa capacidade de

monitoramento da realidade socioeconômica das famílias já cadastradas impactam

negativamente a gestão do PBF.

[...] talvez se o programa, em nível nacional, fosse melhor estruturado ...

com uma triagem mais rigorosa, contemplando famílias que de fato

precisam, não fosse um programa tão vulnerável (Entrevistado 1).

Como pode ser observado, a inquietação exposta pelo entrevistado acima, vai

de encontro ao que Silva (2007) argumenta, ela compreende que essa situação –

limitação no processo de inclusão das famílias elegíveis - pode ser minimizada com

o aperfeiçoamento do Cadastro Único, que já vem incluindo somente famílias com

renda per capita familiar de até meio salário mínimo e com o cruzamento de dados

com outros bancos de dados existentes no país, o que certamente permitirá reduzir

em grande parte dualidades e inclusões indevidas de famílias nos programas.

Cabe o ressalve que unificação dos Programas de Transferência de Renda

(Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Vale Gás e Cartão Alimentação, integrando,

posteriormente, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) que deu origem ao

PBF não deve ser tratada apenas como um mecanismo de gestão. Além de permitir

a distribuição de renda, deve proporcionar uma articulação com outros programas

sociais, principalmente no âmbito da saúde e educação.

Em termos da prática, Silva, Yasbek e Giovanni (2011) afirma que em estudos

empíricos sob a sua coordenação indicam que não vem ocorrendo a unificação dos

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valores referentes às transferências monetárias consideradas para elegibilidade das

famílias ao programa, mantendo-se duas categorias de famílias: as extremamente

pobres e as famílias pobres, além de se constituir num valor muito baixo, permitindo

deixar de fora do atendimento um contingente de famílias significativo, mas que vive

em situação de comprovada pobreza, além de a pobreza ser dimensionada somente

pelo critério da renda declarada.

Subcategoria 1.2: Atualização Cadastral

Manter o cadastro atualizado é uma das obrigações dos beneficiários do PBF,

desta depende o monitoramento da situação socioeconômica das famílias, o que

implica na permanência ou desligamento do programa. A frase a seguir indica que

parte, significativa, dos beneficiários não cumpre a obrigação de manter o cadastro

atualizado, o que dificulta a identificação de pessoas que não estejam atendendo

aos critérios do PBF, o que consequentemente inviabiliza a sua gestão.

Infelizmente é frequente o fato de muitas famílias não atualizarem seus dados [...] por conta desse prazo de até dois anos, deixam para alimentar o sistema tão somente no findar do prazo, muitas vezes provocando o bloqueio do benefício, pela sua própria omissão, negligenciam em não vir fazer a atualização cadastral. (Entrevistado 1)

Em casos de descumprimentos das condicionalidades dos beneficiários do

PBF, a gestão federal do programa, através da Secretaria Nacional de Renda e

Cidadania – SENARC em parceria com a gestão municipal devem: advertir as

famílias; bloquear; suspender o benefício; e, até, cancelar o benefício.

O processo de desligamento de um beneficiário é longo. Os efeitos dos

descumprimentos iniciam com advertência, a família é comunicada de que algum

integrante deixou de cumprir condicionalidades, mas não deixa de receber o

benefício; caso o beneficiário não compareça para atualização dos dados cadastrais

há o bloqueio do por um mês, mas pode ser sacado no mês seguinte junto com a

nova parcela. Permanecendo o descumprimento, ocorre a suspensão do benefício

por dois meses, e a família não poderá receber os valores referentes a esse período,

por fim, não cumprindo com nenhuma das chamadas o benefício é cancelado e a

família deixa do participar do PBF.

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É importante destacar que o cumprimento das condicionalidades do PBF está

diretamente relacionado ao nível de responsabilidade e comprometimento das

famílias cadastradas.

Eu perdi o prazo agora, porque vim tirar mês passado e não tirei, porque era para eu cadastrar e não me lembre (Entrevistada 4). Minha filha, eu moro distante, acho que por isso que eu acabo não vindo aqui, só recadastro quando está perto de completar os dois anos mesmo (Entrevistada 6). Todo ano eu atualizo, de 6 em 6 meses eu vou no posto, e a cada dois anos eu recadastro. Já cheguei a perder uma vez porque meu filho ficou de maior e estava trabalhando de carteira assinada, na época ele ainda morava comigo, não era casado, aí perdemos o bolsa família. Mas por conta de outro menino de 16 anos que eu tenho, fui lá, atualizei o cadastro e voltei a receber. (Entrevistada 4). Sempre atualizo meu cadastro, nunca deixei de atualizar, graças a Deus, todo ano venho aqui, porque no final eu sei que o dinheirinho vai me ajudar a comprar as coisas para dentro de casa. (Entrevistada 5).

Como pode ser visto nos relatos das beneficiárias, há aquelas em que

atualizar o cadastro é uma garantia em continuar recebendo seu auxílio, por outro

lado, percebe-se em outros relatos pouca atenção para essa prática, ‗‘só recadastro

quando está perto de completar os dois anos mesmo‘‘, o que infere não estar

havendo uma mobilização pessoal, em alguns casos, dos deveres que lhes cabe, ou

seja, o cumprimento de suas contrapartidas.

Por outro lado, Soares e Sátyro (2009) problematizam que sendo obrigatório

ou não, o cumprimento dessas contrapartidas por parte das famílias que vivem em

situação de extrema vulnerabilidade social e de renda não é tão simples quanto o é

para as famílias menos vulneráveis. Para eles são famílias cujo vínculo com a

formalidade e a institucionalidade é mais frágil. Vivem longe das escolas e dos

postos de saúde.. Supõe-se, portanto, que o Estado deva entrar cumprindo seu

dever constitucional de criar condições para que as famílias façam a parte que lhes

cabe.

Outros motivos podem levar os beneficiários a não manterem seus cadastros

atualizados, impactando negativamente a gestão do PBF. As frases modais abaixo

indicam tal percepção.

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

504

[...] Há aquelas (beneficiárias) ainda que no decorrer desses dois anos, saem do perfil do Bolsa Família, porque começam a trabalhar com carteira assinada, não vem fazer a atualização devida no cadastro, porque sabem que vão perder o benefício, porque a renda aumentou‖ (Entrevistado 1). Eu trabalhava antes, aí eu pedi pra sair porque eu não tava aguentando, eu já tenho 41 anos. Pedi as minhas contas, eu não aguentava mais trabalhar o dia todo em pé. E para você ver, eu ainda recebia o Bolsa Família mesmo trabalhando. Coisa de Deus, né? (Entrevistada 8).

Diante do exposto, pode-se inferir que a forma como se dá o monitoramento

atualmente é ineficaz, o que compromete a gestão do PBF. Os municípios devem

adotar medidas que facilitem o acesso aos beneficiários de forma a manter o

Cadastro Único atualizado.

Subcategoria 1.3: Renda e temporização do Programa Bolsa Família

A transferência de renda e a temporização do PBF têm sido tema recorrente

de debates acadêmicos, políticos e empresariais. Esta subcategoria diz respeito à

percepção de atores institucionais e sociais quanto à capacidade do beneficiário

transferido possibilitar o alcance dos objetivos do PBF. Nesse sentido, têm-se as

seguintes frases modais.

É relativo dizer que a renda do Bolsa Família é suficiente para ajudar a família carente [...] não sei se é suficiente para tirar a pessoa da situação de pobreza mas de fato para quem precisa, qualquer ajuda chega em boa hora (Entrevistado 1). É se desse mais era melhor, né? Recebo 186,00. O Bolsa Família é uma coisa boa que Deus mandou para os pobres. Porque tem mulher que sobrevive só do Bolsa Família. Eu guardo a minha Bolsa Família para pagar o aluguel, só que eu completo (Entrevistada 8).

A análise dessa subcategoria indica que a renda transferida pelo PBF, tanto

os atores institucionais quanto os atores sociais, consideram os valores do benefício

como necessário, mas insuficiente para atender os objetivos do PBF, ou seja,

acabar com a fome e romper o ciclo da pobreza.

Este fator tem se enquadrado no campo das limitações do Programa,

segundo Silva (2007), onde ela destaca que é um valor monetário muito baixo

transferido às famílias, permitindo tão somente manter as famílias beneficiárias num

nível de mera reprodução biológica, sendo insuficiente para produzir impacto efetivo

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

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na redução da pobreza. Embora os impactos dos Programas de Transferência de

Renda tenham sido bastante modestos para superar a fome a pobreza no Brasil, ela

ainda destaca que no campo das potencialidades, esses programas possam

melhorar, mesmo que temporariamente, a renda das famílias assistidas, visto que

essas famílias se encontram num nível econômico de mera subsistência. Além disso

o significado real que esses programas representam para as famílias beneficiárias

deve ser considerado, por permitir a elevação ou mesmo o único acesso a uma

renda monetária por parte de um número elevado de famílias que se encontra à

margem da sociedade

A temporização conhecida popularmente por ‗‘porta de saída‘‘ do programa é

outro fator que estimula criticas quanto à efetividade do PBF. As frases modais a

seguir tratam dessa questão.

[...] tem pessoas que recebem há 10 anos o benefício, quando a gente identifica é algo que deve ter ajudado bastante essa família, mas esse benefício de repente pode emperrar a família. (Entrevistado 1). Faz uns 7 anos que recebo, minha menina tem 7 anos. Eu pretendo receber pro resto da minha vida. Não trabalho, sou viúva. Você não sabe o quanto isso me ajudou. (Entrevistada 6). Recebo há muito tempo, muito, desde que meu filho morava comigo, hoje ele é de maior e já casado. (Entrevistado 7).

Os dados indicam que a permanência das famílias no PBF supera 10 (dez)

anos, o que pode caracterizar a baixa efetividade do mesmo, já que os beneficiários

não são preparados para sair do PBF e, passam a entendê-lo como renda. A

intenção de permanecer recebendo um benefício do governo, em tese, pode estar

relacionada à falta de perspectiva de futuro dessas famílias aliada a falta de

programas e projetos de capacitação e qualificação profissional que possam inseri-

los no mercado de trabalho. A geração de emprego e renda em nível local, pode, em

médio e longo prazo, modificar tal realidade.

O benefício poderia estar condicionado a atualizar cadastro com saúde, educação, como temos, mas acrescentar também cursos profissionalizantes para os pais, cursos que contemplassem as necessidades locais e o talento e aptidão dessas pessoas [...] poderiam estudar, quem sabe, se reunirem em cooperativas ou até mesmo entrarem no mercado formal de trabalho para poder deixar o benefício para outras pessoas que precisem. (Entrevistado 1).

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

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[...] É aí que a gente destaca uma iniciativa de Campina Grande, que é um programa municipal, verba municipal, Programa Capacitar, que tem referenciado pessoas de baixa renda para um processo de capacitação profissional, tivemos uma formatura de mil pessoas, mulheres em sua maioria, diversos cursos, muitas delas já reunidas em cooperativas e o município vai entrar com financiamento através da AMDE, que é a Agencia Municipal de Desenvolvimento. (Entrevistado 1).

As categorias e subcategorias analisadas indicam que a efetividade do PBF

depende diretamente de uma rede de serviços paralelos aos ofertados pelo referido

programa, de forma a viabilizar o seu objetivo promover a mudança do padrão de

vida das famílias beneficiárias.

CATEGORIA 2: Saúde

Nesta categoria foram alocadas frases modais referentes ao

acompanhamento da saúde: controle da vacinação e redução da mortalidade infantil.

Subcategoria 2.1: Acompanhamento da saúde: avanços e desafios.

Manter atualizado o calendário de vacinação das crianças é uma das

condicionalidades do PBF. Sabe-se que esta prática preventiva tem relação direta

com a redução da mortalidade infantil. As frases modais a seguir reforçam esse

entendimento.

A redução da mortalidade infantil tem acontecido cada vez mais, de maneira gradual, isso é um dado extremamente positivo. A gente tem um cuidado de vacinar essas crianças e acompanhar peso e altura através dos trabalhos que são feitos dentro da unidade de saúde, e o Bolsa Família veio para reforçar isso aí, trazer essas famílias para junto. [...] Mas é preciso dizer que a gente ainda tem muita dificuldade de captar essas famílias, muitas não procuram a unidade de saúde, o agente comunitário passa, avisa, mas às vezes a família não vai, esquece, as vezes não dá a devida importância, e a gente sabe que isso dá um impacto negativo, não só em relação a saúde daquela família como também corre o risco dessa família ter seu benefício suspenso [...] No município temos várias equipes da Secretaria de Saúde comprometidas em buscar essas melhorias, então temos conseguido impactar positivamente essa questão, trazendo mais famílias pra junto da gente. (Entrevistada 2).

Ao condicionar o recebimento do benefício ao acompanhamento da saúde

das crianças, o PBF impacta positivamente a vida dessas famílias, o que é revelado

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

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pela queda da taxa da mortalidade infantil no município de Campina Grande, PB. De

acordo com os relatos acima, apesar da resistência observada, a gestão do PBF no

município, tem tido êxito nas ações de sensibilização para com as questões relativas

ao acompanhamento da saúde das crianças. A análise de Rasella (2013) pode

comprovar o efeito positivo da gestão do município campinense, quando consideram

que a sobrevivência da criança beneficiária do PBF está associada às

condicionalidades na saúde quando incluem visitas pré-natais, cuidados pós-natais e

atividades educacionais de saúde e nutrição para as mães, bem como o respeito do

calendário de vacinação regular e de rotinas de check-up para crescimento e

desenvolvimento de crianças menores de 7 anos de idade.

Além disso, para o autor, o PBF pode afetar a sobrevivência da criança

através de diferentes mecanismos, uma renda maior pode aumentar o acesso aos

alimentos e a outros bens relacionados com a saúde, enquanto as condicionalidades

de saúde pode melhorar acesso aos serviços de saúde. Há uma forte relação entre

a desnutrição infantil e a sobrevivência das crianças, ou seja, o aumento dos níveis

de desnutrição infantil aumenta o risco de morte, especialmente por diarreia e

sarampo. Em geral, no Brasil houve uma diminuição acentuada da desnutrição

infantil na última década, principalmente entre as famílias pobres.

Embora a gestão municipal de Campina Grande, no âmbito da saúde, esteja

conseguindo alcançar estas famílias no quesito de acompanhamento nutricional,

peso, vacina, o que tem contribuído para a redução no índice de mortalidade infantil,

bem como melhores condições nutricionais, ainda assim, os gestores municipais

argumentam que o Governo Federal deveria investir no processo de conscientização

das famílias para a importância de cumprir com esta condicionalidade.

O Governo Federal deveria investir mais em mídia, voltada para a importância do acompanhamento de saúde e o acompanhamento educacional dessa criança e dessa família, a gente sente falta dessa questão da mídia mesmo, desse impacto positivo que a mídia poderia dar, divulgando a importância do acompanhamento de saúde. (Entrevistada 2).

Apesar de saber que cabe aos municípios planejar e executar o

cadastramento; manter atualizada a base de dados e prestar apoio e informações às

famílias de baixa renda sobre o cadastramento, os atores institucionais

entrevistados, indicam que ações de divulgação e sensibilização por parte do

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

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Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS), são essenciais para o êxito

do PBF.

CATEGORIA 3: Educação

Por fim, a categoria que trata dos avanços e desafios quanto à área de

educação. É contrapartida das famílias cadastradas no PBF, manter os filhos na

escola.

Subcategoria 3.1: Acompanhamento da educação: avanços e desafios.

Na área de educação o governo deve garantir o acesso a equipamentos e

serviços de educação para as crianças em idade escolar enquanto exige das

famílias beneficiárias a permanência das crianças na escola. As frases modais a

seguir, indicam os gaps identificados nessa relação:

São realizadas reuniões junto aos pais dos alunos, convocadas, tanto pelos gestores escolares quanto pela Secretaria de Educação do município, como forma de conscientizar sobre a importância da permanência dos alunos em sala de aula, mas ainda assim, acontece dos pais não darem a devida importância, só comparecendo a escola no caso da suspensão do benefício. (Entrevistado 3).

Os dados indicam os esforços do governo local para estimular a permanência

dos alunos em sala de aula e a relação direta entre recebimento do benefício e

manutenção do aluno na escola. No entanto Silva, Yasbek e Giovanni (2011)

argumentam que a obrigatoriedade à escola não é suficiente para alterar o quadro

educacional das futuras gerações e, consequentemente, alterar a pobreza. Para ela,

essa exigência implica na expansão, na democratização e na melhoria dos sistemas

educacionais estaduais e municipais.

Por outro lado, ao analisarmos as frases modais que indicam a percepção das

beneficiárias, verificamos uma posição antagônica ao discurso do Entrevistado 3

sobre o mesmo tema.

Não, meus filhos já estudavam na creche antes do Bolsa Família, o dinheiro ajuda, mas eu já tinha colocado eles primeiros na escola. (Entrevistada 4).

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

509

Se fosse bloqueado eu iria sofrer um bocado, porque minha filha estuda em uma escolinha particular, ela ainda não foi pra escola pública, aí eu ia sofrer um bocado para arrumar o dinheiro e deixar ela na escola. (Entrevistada 6). Não, Deus me livre. Poderiam bloquear ‗‘500 Bolsa família‘‘ que eu não tiraria meus filhos da escola. (Entrevistada 8).

Verifica-se divergência de percepções entre os atores institucionais e sociais

no que se refere às motivações pelas quais os pais mantêm as crianças na escola.

Os discursos acima corroboram com os resultados do estudo empírico de Feijó e

Pires (2015), destacando que o valor atribuído pelas beneficiárias do PBF à

educação, bem como a crença de que a educação é um caminho para melhorias,

tanto na renda como no acesso a novas oportunidades, compartilhada por estes.

Testa et al (2013) têm o posicionamento que, como obrigatoriedade, a

simples participação dos filhos dos beneficiários na escola não pode ser considerada

um avanço na autonomia dos mesmos, pois as famílias não estariam fazendo algo

que desejam. Entretanto, reflexos positivos da presença das crianças na escola,

uma vez percebidos, começaram a ser valorizados pelas famílias. Assim, o que era

uma ação obrigatória imposta, passaria a constituir uma opção desejada,

aumentando a capacidade da família em propiciar a educação aos filhos e, portanto,

aumentando sua autonomia.

É importante destacar que todos os entrevistados expuseram em suas falas

que o benefício facilita a permanência das crianças na escola, mas nenhum ator

social afirmou que este seria decisivo.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Programa Bolsa Família – PBF tem sido alvo, desde sua criação em 2003

de debates entre os que defendem sua importância e os que questionam sua

efetividade, fato compreensível diante da dimensão e complexidade do tema

abordado pelo mesmo.

Neste sentido, este trabalho teve como objetivo analisar o impacto do

Programa Bolsa Família no município de Campina Grande-PB.

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

510

Os dados indicam falhas no processo de seleção dos beneficiários do PBF,

fato que pode permitir a entrada de famílias que não se enquadram no perfil exigido

pela referida política pública, assim como impedir a o acesso das que ultrapassam

levemente os limites exigidos, mas por encontrarem-se no mercado formal e,

portanto, serem obrigadas a declararem sua renda, através de documentos formais

serem excluídas. Ainda com relação ao Cadastro Único, os dados indicam que as

famílias não mantêm atualizados seus dados cadastrais, o que gera a

impossibilidade de monitoramento por parte do PBF, assim famílias que saem dos

critérios estabelecidos pelo programa, podem permanecer no mesmo, impedindo

que outras famílias, com perfil adequando, acessem o mesmo. No quesito Renda e

temporização do Programa Bolsa Família, foi possível verificar que a renda

transferida pelo PBF para as famílias é considerada necessária, mas não suficiente

para equacionar a situação de vulnerabilidade econômica e social na qual essas

famílias se encontram, essa é uma percepção tanto dos atores sociais quanto dos

atores institucionais pesquisados. Vale ressaltar que é consenso entre os atores

institucionais pesquisados, que PBF para ser efetivo depende de outras políticas

públicas, em especial, as relativas à capacitação e qualificação de mão de obra e

geração de emprego e renda, de acordo com os atores institucionais, a inserção dos

pais no mercado de trabalho é fator determinante para o alcance dos objetivos do

PBF.

Os dados relacionados à variável Saúde nos levam a concluir que o PBF

contribuiu para o aumento do número de crianças vacinadas, no período

pesquisado, impactando positivamente a saúde no município estudado, o que é

refletido na queda do índice de mortalidade infantil.

Quanto a variável Educação, conclui-se que o PBF influenciou a permanência

dos alunos na escola, o que em médio e longo prazo pode contribuir para o objetivo

de longo prazo do programa, ou seja, romper o ciclo da pobreza. É importante

destacar a importância que as beneficiárias deram ao fato de manter seus filhos na

escola, mesmo demonstrando a necessidade do benefício, nenhuma das

entrevistadas atrelou o benefício à permanência dos filhos na escola.

Diante do exposto, é possível afirmar que apesar da necessidade de ajustes,

em especial no que diz respeito à gestão do programa, o PBF tem impactado

positivamente o município de Campina Grande, PB, tendo em vista, especialmente,

Grupo Temático 3: SANTANA, L. K. A.; Análise de Políticas Públicas GONÇALVES, G. A. C.; SANTOS, J. V. M.

511

os resultados observados nas áreas de Educação e Saúde. Entretanto, é preciso

atentar para as falhas no processo de cadastramento e monitoramento das famílias

beneficiadas, assim como para o investimento em uma rede de serviços que possa

apoiar os beneficiários, principalmente, no que diz respeito a políticas de

capacitação e qualificação para o trabalho e, geração de emprego e renda. Nesse

sentido, a articulação das instâncias federal, estadual e municipal é fundamental

para a efetividade do PBF. Tomando como base o fato de que quanto mais impacto

positivo causa uma categoria mais esta contribui para a efetividade da política

avaliada e, considerando que, por outro lado, se a categoria impacta negativamente,

menos efetiva a política se torna. Portanto, entre as categorias analisadas,

Educação, Saúde e, Assistência Social, apenas a última, apresentou baixo

desempenho, o que pode gerar impacto negativo ao PBF, esse ligado a gestão do

cadastro único. Sendo assim, conclui-se que o PBF é efetivo no município de

Campina Grande, PB.

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