Avaliação Formativa – Representações e Práticas de...
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Universidade do MinhoInstituto de Educao e Psicologia
Outubro de 2009
Maria Pereira Barreiro
Avaliao Formativa Representaes e Prticas de Professores de Lnguas Estrangeiras
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Trabalho realizado sob a orientao da
Doutora Maria Alfredo Moreira
Universidade do MinhoInstituto de Educao e Psicologia
Outubro de 2009
Maria Pereira Barreiro
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AUTORIZADA A REPRODUO PARCIAL DESTA TESE APENAS PARA EFEITOSDE INVESTIGAO, MEDIANTE DECLARAO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SECOMPROMETE;
Universidade do Minho, ___/___/______
Assinatura: ________________________________________________
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Agradecimentos
Doutora Maria Alfredo Moreira, pelo desafio contnuo e rigoroso neste processo de
aprendizagem com que sempre me cativou. Sempre disponvel, sempre atenta e delicada, sempre
de sorriso a transmitir uma grande lio de humildade, sabedoria e respeito pelos meus desacertos
e as minhas desfocagens nesta investigao. A minha gratido, sempre.
Doutora Flvia Vieira, pelas palavras e actos de Professora e me solidria, por no me ter
deixado morrer neste trajecto, no momento da minha vida em que parte de mim morreu.
Doutora Marlne Silva e Silva e ao Doutor Jacques Silva por me terem feito acreditar que
no passei despercebida, pelos espaos de saber e de afectos solidrios no pior momento da minha
vida.
minha colega de trabalho e de formao, Manuela da Costa, pelo vivido em investigao,
pelas provocaes mtuas ao longo deste caminho e de um outro que percorremos juntas h 19
anos. Sempre em prol do bom nome da nossa escola, do sucesso educativo e de alunos mais
felizes.
Ao meu colega e amigo Paulo Lima, pelo exemplo de brilhantismo profissional e dedicao
aos colegas e aos alunos, pelo apoio incondicional com que sempre me acudiu nos abalos de
desesperana, desencanto e de solido na profisso.
minha amiga educadora, Zaida Garcez, pelas rosas do seu jardim em manhs de luto
escuro, pela forma como me reeducou a ver a luz da vida, pela certeza de laos profundos que
construmos em momentos de cenrios indefinveis.
s colegas de Departamento, pelo interesse, disponibilidade e participao neste estudo, por
partilharem comigo os seus dilemas profissionais, as suas experincias e o seu tempo.
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minha Escola, casa de 20 anos de trabalho e de afectos, e ao seu Director, Lus Braga,
pela confiana na minha actuao e autonomia profissional, pela agilidade intelectual com que me
provoca todos os dias. A todos os meus Alunos: os que passaram, os que so e os que sero
Ao Z Lus, aos meus pais e aos meus filhos em quem sustento tudo que fao, tudo que
desejo fazer, tudo que ainda sou.
memria do meu Filho, em todo o lugar celeste, entre a noite e a aurora. PERDO.
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AVALIAO FORMATIVA REPRESENTAES E PRTICAS DE PROFESSORES DE LNGUAS ESTRANGEIRAS
Maria Pereira Barreiro
Resumo
O estudo que aqui se descreve incide sobre representaes e prticas de avaliao
formativa dos professores de Lnguas Estrangeiras (LE) de uma Escola Bsica 2 e 3 do distrito de
Viana do Castelo, realizado no ano lectivo 2008/2009.
Apresenta uma dimenso colaborativa e sustenta-se nos princpios da (auto)superviso,
reflexividade e autonomia, como processos que se interpenetram num mesmo contexto didctico
que vise a emancipao do aluno e do professor,. A dupla vertente de formao, a da investigadora
e a das participantes no estudo visando uma meta comum - a reconstruo das prticas de
avaliao com reflexos na melhoria das aprendizagens dos alunos, decorre da investigao sobre e
para a aco como estratgia de desenvolvimento pessoal e profissional.
Optou-se por um estudo de caso descritivo e interventivo, ancorado no paradigma
naturalista, defendendo-se prticas de avaliao formativa desprovidas de qualquer tentativa de
classificao e de seleco, cuja preocupao central reside na recolha de informao para regular
o ensino e a aprendizagem. Uma avaliao formativa assente nos princpios da diferenciao
pedaggica, da responsabilidade partilhada entre os seus intervenientes, da diversidade de
enfoques comunicativos e de aprendizagem, com recurso a variedades de tarefas/ instrumentos de
avaliao.
Os dados recolhidos atravs dos questionrios, sesses de formao, anlise de
instrumentos de avaliao formativa aplicados e, ainda, dos instrumentos produzidos na formao,
parecem confirmar a centralidade da avaliao formativa nos resultados da aprendizagem e prticas
que so largamente informadas por representaes, assumindo-se como contributo para o
desenvolvimento profissional das professoras envolvidas.
Um estudo desta natureza sofre, por inerncia, de limitaes que no permitem qualquer
tentativa de generalizao nem de transferabilidade para outros contextos educativos. No entanto,
no impedem que se reforce a sua validade ecolgica, esperando-se que possa contribuir para a
construo de conhecimento til a outros professores de lnguas.
Palavras-chave: avaliao formativa, diferenciao e superviso.
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EVALUATION FORMATIVE REPRESENTATIONS ET PRATIQUES DE PROFESSEURS DE LANGUES ETRANGERES
Maria Pereira Barreiro
Resume Cette tude a pour sujet les reprsentations et les pratiques des enseignants de langues
trangres sur lvaluation formative des apprentissages, dans un tablissement du 2me et 3me
cicles, ralis pendant lanne scolaire 2008/09.
En sappuyant sur les principes de la supervision, rflexivit et autonomie, comme
processus qui simbriquent dans un mme contexte didactique dont le but est lmancipation de
lapprenant et de lenseignant, cette tude prsente une dimension collaborative. La double
perspective de formation, celle de la chercheuse et celle des participantes de ltude visant un
aboutissement commun la reconstruction des pratiques dvaluation, pour amliorer les
apprentissages des lves, sinscrit dans la recherche sur laction et pour laction comme stratgie
de dveloppement personnel et professionnel.
Il sagit dune recherche descriptive et dintervention, encadre dans le paradigme
naturaliste, pour mettre laccent sur des pratiques dvaluation formative sans aucune tentation de
classification et de slection, dont la proccupation centrale rside dans la collecte dinformation
pour entraner la rgulation des interventions et des apprentissages. Une valuation formative qui
simpose par les principes dune pdagogie diffrencie, de la responsabilit partage entre les
intervenants, axe sur les composantes des comptences communicatives et dapprentissage, en
employant une varit dinstruments dvaluation.
Linformation recueillie travers les questionnaires, le programme de formation, lanalyse
des instruments dvaluation formative utiliss et, encore, des instruments produits dans la
formation, viennent confirmer la centralit de lvaluation formative sur les rsultats de
lapprentissage ainsi que des pratiques largement informes par des reprsentations.
Cette tude de cas, souffre, par inhrence, de limitations qui ne permettent pas de tentatives
de gnralisations ni dapplication dautres contextes ducatifs. Cependant, on peut renforcer sa
validit cologique et souhaiter quelle puisse tre utile dautres enseignants de langues
trangres.
Mots-cls: valuation formative, diffrentiation et supervision.
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NDICE
INTRODUO OU RAZO DE SER DESTE PROJECTO 12
CAPTULO I 20
ENQUADRAMENTO TERICO 20
1. Avaliao das aprendizagens: breve contextualizao 20
1.1. Aprendizagem e avaliao em Lnguas Estrangeiras (LE) 25
2. Modalidades de avaliao 30
2.1 Avaliao sumativa 31
2.2 Avaliao diagnstica 32
2.3 Avaliao Formativa (AF) 33
3. Avaliao formativa: a funo reguladora ao servio de uma pedagogia para a autonomia (PA)
36
4. Regulao e diferenciao: funes indissociveis da AF numa pedagogia para autonomia
41
5. O papel dos intervenientes num contexto de autonomia 49
6. Instrumentos da AF: a importncia da diversidade numa PA 51
7. (Auto)superviso, reflexividade e autonomia nas prticas de AF 54
CAPTULO II 62
METODOLOGIA DE INVESTIGAO/FORMAO 62
1. Tipo de estudo 62
2. Contextualizao do estudo 64
3. Questes de investigao e objectivos do estudo 65
4. Caracterizao das participantes no estudo 68
5. Procedimentos de recolha e anlise de informao 70
5.1. O questionrio 70
5.2. Os instrumentos de avaliao formativa facultados pelas participantes 76
5.3 As sesses de formao 76
5.3.1 Os instrumentos de avaliao formativa produzidos pelas participantes 79
5.3.2 Questionrio de avaliao da formao 79
CAPTULO III 81
APRESENTAO DOS RESULTADOS 81
1. Apresentao dos resultados relativos s representaes 81
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1.1. Finalidades da avaliao formativa 82
1.1.1. Diferenciao pedaggica 82
1.1.2 Regulao e feedback formativo 86
1.1.3 Diagnstico 90
1.1.4 Co-responsabilizao e consistncia 92
1.2. Instrumentos 94
1.3. Intervenientes 97
2. Apresentao dos resultados relativos s prticas 101
2.1. Competncia comunicativa: enfoques e momentos 104
2.2. Competncia de aprendizagem: enfoques e momentos 108
2.3. Instrumentos produzidos 113
3. Avaliao da formao 118
CAPTULO IV 122
CONCLUSES DO ESTUDO 122
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 134
ANEXOS 142
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ANEXOS
NDICE DE ANEXOS
Anexo 1: Questionrio sobre representaes e prticas de avaliao no ensino de lnguas estrangeiras 143
Anexo 2: Documento orientador da 1 sesso de formao 148
Anexo 3: Documento orientador da 3 sesso de formao 151
Anexo 4: Documento orientador da 5 sesso de formao 156
Anexo 5: Instrumentos de avaliao formativa facultados pelas participantes 161
Anexo 6: Instrumentos de avaliao formativa produzidos na formao 226
Anexo 7: Questionrio de avaliao sobre o impacto da formao 251
Anexo 8: Transcrio da gravao da sesso de formao 253
NDICE DE FIGURAS
Figura 1 - Natureza da avaliao 28
Figura 2 Componentes da CA e da CC 28
Figura 3 Etapas da AF 36
Figura 4 - Formas de regulao da AF 38
Figura 5 Tipos de regulao e momentos de recolha de informao da AF 40
Figura 6 - Modos de diferenciar prticas pedaggicas 46
Figura 7 - Objectos de diferenciao pedaggica 47
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NDICE DE QUADROS
Quadro 1: Desenho global do estudo 67
Quadro 2: Caracterizao das participantes do estudo 69
Quadro 3: Dimenses e sub-dimenses do questionrio sobre representaes das prticas de avaliao formativa - Seco B.1. 73
Quadro 4: Dimenses e subdimenses do questionrio sobre percepes das prticas de avaliao formativa - Seco C.1. 75
Quadro 5: Grelha para anlise de contedo dos instrumentos de AF facultados pelas participantes 76
Quadro 6: Desenho do programa de formao/interveno 77
Quadro 7: Estrutura, objectivos e itens do questionrio da avaliao 80
Quadro 8: Anlise dos instrumentos de AF facultados pelas participantes 102
Quadro 9: Anlise dos Instrumentos de AF produzidos pelas participantes do estudo na fase interventiva 114
NDICE DE GRFICOS
Grfico 1: Distribuio das respostas s afirmaes/questes das finalidades de diferenciao da avaliao formativa 83
Grfico 2: Distribuio das respostas s afirmaes/questes das finalidades de regulao e feedback formativo 87
Grfico 3: Distribuio das respostas s afirmaes/questes das finalidades de diagnstico da avaliao formativa 90
Grfico 4: Distribuio das respostas s afirmaes/questes de co-responsabilizao e consistncia da avaliao formativa 92
Grfico 5: Distribuio das respostas s afirmaes/questes sobre os instrumentos de avaliao 94
Grfico 6: Distribuio das respostas s afirmaes/questes sobre os intervenientes da avaliao formativa 98
Grfico 7: Distribuio das respostas sobre os momentos de avaliao da competncia comunicativa 104
Grfico 8: Distribuio das respostas sobre os momentos de avaliao da competncia de aprendizagem 108
Grfico 9: Distribuio das respostas sobre representaes, prticas e produo de materiais 118
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NDICE DE ABREVIATURAS:
AF- Avaliao formativa
CA Competncia de Aprendizagem
CC Competncia Comunicativa
CE Conselho da Europa
CNEB Currculo Nacional do Ensino Bsico
CNEB LE - Currculo Nacional do Ensino Bsico- Lnguas Estrangeiras
CNEB-CE - Currculo Nacional do Ensino Bsico competncias essenciais
DGEBS Direco Geral do Ensino Bsico e Secundrio
LBSE Lei de Bases do Sistema Educativo
LE Lnguas Estrangeiras
ME Ministrio da Educao
PA- Pedagogia para Autonomia
PEA Projecto Educativo do Agrupamento
PI Programas de Ingls
QECRL Quadro Europeu Comum de referncia para as lnguas
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Introduo ou razo de ser deste projecto
INTRODUO
ou
Razo de ser deste projecto
Apesar das recomendaes resultantes da investigao educacional nesta rea e do que se preconiza nos normativos legais, o que parece predominar nas salas de aula so avaliaes cujo principal propsito o de recolher informaes para classificar os alunos e no para os ajudar a melhorar e a superar as suas dificuldades. Consequentemente, os testes de papel e lpis so os instrumentos mais utilizados na avaliao interna (Fernandes, 2007).
Do desejo de contribuir para a mudana destas prticas avaliativas convencionais,
focalizadas nos produtos de aprendizagem, que sobrevalorizam a avaliao com fins classificativos e
de carcter marcadamente selectivo e discriminatrio (Vieira e Moreira 1993: 46), se perspectivou
este estudo, ciente de que o primeiro passo para abrir caminho reconstruo das prticas implica
conhecer conscientemente o que fazemos e como o fazemos.
Partilhando da perspectiva de que preciso mudar a mira da avaliao (Crahay, 1996:
311), defende-se uma avaliao formativa no selectiva, entendida como um processo sistemtico
e deliberado de recolha de informao relativa ao que os alunos sabem e so capazes de fazer e
essencialmente destinado a regular e a melhorar o ensino e a aprendizagem (Fernandes, 2006:
32).
Se pensarmos nas teorias do insucesso que, inicialmente, se centravam no aluno e
apontavam como causas as aptides de cada um (uns so capazes e outros no); que, nos anos
sessenta, passaram a indicar o handicap scio-cultural (o sistema reproduzia as desigualdades
sociais e culturais) e que, actualmente, apontam o handicap scio-institucional, (a escola gera o
insucesso tratando de forma igual as diferenas), torna-se necessrio assumir que cada professor,
como responsvel educativo, procure e experimente continuamente, no seu campo de aco, novas
prticas no desejo de sucesso para todos.
neste sentido que se chama ateno para a complementaridade e articulao das
diferentes modalidades de avaliao, bem como para princpios e procedimentos a observar na
avaliao das aprendizagens, que no se compadece com a insuficincia das prticas mais
Maria Pereira Barreiro
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Introduo ou razo de ser deste projecto
convencionais, ou seja, com uma avaliao realizada quase s atravs de testes e focalizada em
produtos parcelares da aprendizagem de domnio cognitivo (Vieira e Moreira, 1993: 9), e trazem
discusso a necessidade de recorrer a uma variedade de modos e instrumentos de avaliao. De
facto, os testes tradicionais podem fornecer indicaes teis sobre aspectos de algumas
aprendizagens, mas so insuficientes para avaliar a competncia comunicativa em lngua, nas suas
vertentes lingustica, sociolingustica, pragmtica, estratgica e intercultural e no fornecem
informaes sobre os processos de aprendizagem que estas componentes integram. A este
propsito, retomamos Fernandes (2006: 30) para sublinhar que a correco e classificao de
testes e de quaisquer outras tarefas avaliativas do, em geral, poucas ou nenhumas orientaes aos
alunos para melhorar, reforando as suas baixas expectativas e o baixo nvel das aprendizagens.
Contrariamente, a avaliao formativa factor integrante e regulador da prtica educativa;
formativa para todos se for transparente, participada e negociada de forma crtica no processo de
ensino e aprendizagem, no tem por fim classificar mas contribuir para a melhoria das
aprendizagens, da motivao e auto-estima, passando necessariamente pelo feedback em tempo
til e pelo papel activo do aluno, numa perspectiva de progresso e/ou redireccionamento da sua
aprendizagem (Hadji, 1992: 59). Praticar uma avaliao formativa no selectiva passa por
medidas de diferenciao pedaggica adequadas s caractersticas dos alunos e s aprendizagens
e competncias a desenvolver (Despacho Normativo 1/2005), pois cada aluno um ser nico,
oriundo de um determinado contexto, com necessidades e um perfil de aprendizagem prprio, que
deve ser respeitado, tratado e apoiado de forma diferenciada; passa por partilhar o poder de avaliar
(Despacho Normativo 30/2001), provocando uma participao activa do aluno, pais/encarregados
de educao; passa por fomentar uma cultura de sucesso no princpio de que todos podem
aprender, num ambiente em que a confiana, a transparncia e a clareza imperem; passa por
promover experincias de aprendizagem ricas que geram uma comunicao realisticamente
motivada, permitindo aos alunos falar sobre si mesmos, criar textos autnticos e encontrar solues
para problemas relevantes (Raya et al., 2007: 8).
Mas mudar e melhorar prticas de avaliao implica conhecer as representaes daqueles
que avaliam, de modo que o seu significado seja claro para os professores, tanto mais que so
muito fortes e complexas as suas relaes com os processos de ensino e de aprendizagem
(Fernandes, 2006: 22). Razo pela qual se defende a perspectiva de que a desocultao, anlise e
elaborao dos pressupostos prticos, conceptuais e ticos que subjazem [ aco do professor]
(Vieira, 2006: 21) contribuem para a transformao da sua prtica. Transformao que implica a
Maria Pereira Barreiro
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Introduo ou razo de ser deste projecto
assuno da (auto)superviso com uma funo crtica de formao e aprendizagem, uma
aprendizagem sempre imperfeita e inacabada que se vai (re)construindo num continuum dinmico
de observao-reflexo-aco.
Assim se entende que este estudo tenha emergido da necessidade de buscar respostas
para dilemas pessoais e profissionais, no mbito da avaliao das aprendizagens em lnguas
estrangeiras, e se inscreva num paradigma reflexivo do desenvolvimento profissional, assente nos
princpios da (auto)superviso, reflexividade e autonomia.
Tal como advoga Vieira (1995: 241),
Numa pedagogia para a autonomia, o professor deve estar predisposto a questionar e a problematizar as ideias feitas, a experimentar novas abordagens, a colocar interrogaes perante a experincia; em suma, deve ser capaz de gerir a sua prpria actuao profissional () no no sentido de auto-suficiente ou solitrio, mas sim no sentido de ser capaz de aprender a ensinar cada vez melhor.
Esta indissociabilidade entre a reflexividade profissional e o desenvolvimento de uma
pedagogia para a autonomia conduz ao pressuposto de que agir para a mudana exige da parte do
professor entusiasmo e empenho para encarar a actividade profissional com curiosidade; exige
tambm capacidade de renovao e de luta (contrria ao sentimento de incapacidade e resignao)
contra a rotina da sala de aula; mas exige, sobretudo, uma atitude permanente e dinmica de
reflexo na e sobre as prticas de avaliao, fundamental para a tomada de conscincia e
reconfigurao de uma interveno pedaggica mais ajustada variedade de perfis de
aprendizagem. Trata-se de assumir a (auto)superviso, como uma actuao de monitorizao
sistemtica da prtica pedaggica, pelos processos da reflexo e da experimentao (Vieira, 1993:
28).
Neste sentido, reflexividade, autonomia e superviso no so componentes de campos
pedaggicos distintos, mas processos que se interpenetram num mesmo contexto didctico que
vise a emancipao do aluno e do professor. Assim, a busca de respostas para debilidades
didcticas, metodolgicas e epistemolgicas foi o caminho a percorrer para (re)construir
conhecimentos que permitam uma (auto)superviso para observar, compreender e agir de forma
crtica quer nas prticas da sala de aula, quer nas prticas de coordenao e avaliao de outros
professores, pois como pessoa que se questiona e que questiona o que o rodeia no seu dia-a-dia
profissional, o supervisor tambm um exemplo de prtico reflexivo, que deve encorajar () uma
postura reflexiva (op.cit.: 33). Assim sendo, a capacidade de avaliar identifica-se com a capacidade
de reflectir sobre a prpria prtica e incentivar, enquanto coordenadora de um grupo de docentes,
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Introduo ou razo de ser deste projecto
para a reflexo colaborativa de saberes, assumindo um papel catalisador para a renovao das
prticas avaliativas. Rejeita-se assim a concepo tradicional de uma pedagogia centrada na
reproduo de conhecimentos, onde o aluno assume um papel acrtico e o professor um papel de
transmissor, pois saber ensinar no transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a
sua prpria produo ou a sua construo (Freire, 2003: 47).
No se concebe, portanto, aqui uma formao para a (auto)superviso e o
(auto)questionamento, no sentido de aces auto-suficientes ou solitrias; defende-se uma formao
em que o professor deve abrir-se a diferentes perspectivas, confrontar as suas teorias prticas com
outras alternativas, procurando respostas para os seus dilemas e angstias, propsitos educativos e
ticos da sua conduta docente, num compromisso de mudana e de aperfeioamento
intersubjectivo que requer a construo colaborativa de saberes, assente na negociao entre todos
os parceiros.
O desenvolvimento da autonomia, da cooperao e da criticidade tornam-se princpios
fundamentais para o professor ser capaz de aprende a ensinar cada vez melhor e levar o aluno a
aprender a aprender ao longo da vida.
r
pois nesta atitude de agente activo da sua formao e profissional crtico (Moreira,
2005: 50/1) que se privilegia uma viso de educao assente no postulado de que um profissional
autnomo forma sujeitos autnomos (Vieira, 2006: 18) e se aliceram as razes de ser deste
estudo, decorrentes dos seguintes dilemas pessoais e profissionais que presidiram escolha do
tema:
1. Ao longo do Curso de Mestrado, fui aprendendo a duvidar das minhas percepes e da
minha prtica numa atitude crtica reflexiva e a ver o conhecimento como um espao de
esperana. Acredito que agir para a mudana implica, antes de mais, conhecer quem
somos, o que fazemos e como o fazemos, e tambm acredito que Ns somos a nossa
inteno de ser. Somos as nossas aspiraes (Guerra, 2002: 255/6);
2. Por outro lado, no se apresentavam suficientemente claras as vrias conceptualizaes
tericas sobre avaliao, e to-pouco amadurecidos os contributos da investigao nos
quais a minha actuao enquanto docente de lnguas estrangeiras, coordenadora de
departamento e avaliadora do desempenho docente se pudesse apoiar;
3. Consciente da minha funo como professora e como membro de um Agrupamento de
Escolas, no podia ignorar as recomendaes da Inspeco Geral de Educao, em 2006,
nomeadamente aos departamentos curriculares, para Reforar a reflexo em torno das
Maria Pereira Barreiro
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Introduo ou razo de ser deste projecto
diferentes modalidades de avaliao dos alunos, bem como a identificao, no Projecto
Educativo do Agrupamento, de fragilidade no aperfeioamento da prtica de avaliao
pedaggica de forma sistemtica e reguladora das aprendizagens, como um dos
problemas da aco educativa (PEA, 2007: 60/1);
4. O desempenho do cargo de coordenadora de um departamento curricular, cujas funes
esto consubstanciadas no Decreto Regulamentar n10/99 de 21 de Julho, passa, entre
outras, por assegurar a coo denao de procedimentos e formas de actuao nos domnios
da avaliao das aprendizagens. Coordenar procedimentos e formas de actuao nos
domnios da avaliao das aprendizagens exige, antes de mais, um posicionamento de
(auto)superviso, isto , a tarefa de (auto)observar o que se passa na aco profissional e
na escola, no sentido de recolher dados para caracterizar e criticar as concepes e
prticas e, consequentemente, conduzir reflexo de forma crtica e colaborativa, numa
perspectiva proactiva de aperfeioamento da aco pedaggica.
r
Para alm destas preocupaes, das quais emerge a escolha do tema, apontam tambm
para a relevncia do mesmo, no contexto do sistema educativo portugus, as recomendaes dos
normativos legais (nomeadamente, o Despacho Normativo N 30/2001 de 19 de Julho e o N. 1/
2005 de 5 de Janeiro), que consagram as principais orientaes e disposies relativas avaliao
das aprendizagens no ensino bsico, ao definir a avaliao como elemento regulador da prtica
educativa e estabelecer a primazia da avaliao formativa. Num campo mais alargado do
desenvolvimento das didcticas das Lnguas Vivas, no domnio do trabalho do Conselho da Europa,
o Quadro Europeu Comum de Referncia para as Lnguas (CE, 2001: 254) destaca A avaliao
formativa como um processo contnuo de recolha de informao sobre o mbito da aprendizagem,
sobre os seus pontos fortes e fracos, que deve reflectir-se no planeamento das aulas feito pelo
professor.
Reforam ainda a escolha do tema, as recomendaes decorrentes da investigao
educacional, para a absoluta necessidade de repensar prticas uniformes e pobres de avaliao
que no esto de acordo com a actual formulao do currculo nacional (Abrantes et al., 2002:
11). Tambm o estudo de Fernandes (2007: 587) sobre a avaliao das aprendizagens no Sistema
Educativo Portugus conclui que os professores continuam a revelar dificuldades em concretizar
prticas de ensino e de avaliao () Continua a prevalecer uma avaliao pouco integrada no
ensino e na aprendizagem, mais orientada para a atribuio de classificaes do que para a anlise
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Introduo ou razo de ser deste projecto
cuidada do que os alunos sabem e so capazes de fazer ou para compreender as suas eventuais
dificuldades, ajudando-os a super-las.
Ambiciona-se assim contribuir para prticas de avaliao formativa no selectiva, cuja
preocupao central reside na recolha de informao para regular o ensino e a aprendizagem, isto
, uma avaliao que ajuda o aluno a progredir ao seu ritmo e o professor a adequar a sua
interveno pedaggica, desprovida de qualquer tentativa de classificao e de seleco. Defende-se
uma avaliao formativa mais democrtica, que (i) assente na responsabilidade partilhada entre
aluno, professor, pais/encarregados de educao; (ii) nos princpios da diferenciao pedaggica
em respeito pela individualidade do aluno; (iii) na diversidade de enfoques comunicativos e de
aprendizagem, com recurso a variedades de tarefas e instrumentos de avaliao.
nesta perspectiva de avaliao para ajustar o ensino e para regular a aprendizagem, em
que o aluno no avaliado comparativamente com outros, mas consigo mesmo, contrria crena
de que a finalidade maior da avaliao seleccionar e hierarquizar, que se sustenta a
fundamentao deste estudo.
No se depreenda, contudo, daqui um posicionamento radical contra a avaliao sumativa,
enquanto apreciao concentrada de resultados obtidos numa situao educativa concretizada
em momentos especficos, pois esta modalidade de avaliao no irreconcilivel com a avaliao
formativa; pelo contrrio, evidencia-se a necessidade de estabelecer uma relao de
complementaridade entre ambas atravs da recolha, anlise e interpretao dos dados, para que se
verifique maior transparncia, consistncia e credibilidade na converso para o nvel a atribuir ao
aluno, de modo que este no resulte da mdia de um ou dois testes por perodo.
Questes de investigao
Perante o exposto, levantaram-se as seguintes questes de investigao:
1. Que representaes perfilham os professores de lnguas estrangeiras sobre prticas de
avaliao formativa?
2. Que prticas de avaliao formativa operam estes professores em sala de aula?
3. Como incentivar para prticas de avaliao formativa no selectiva?
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Introduo ou razo de ser deste projecto
Objectivos do estudo
Numa tentativa de dar resposta s questes de investigao, delinearam-se os seguintes
objectivos:
1. Conhecer as representaes e percepes das prticas de um grupo de professores sobre a
avaliao das aprendizagens em lnguas estrangeiras no ensino bsico (2 e 3 ciclos)
2. Caracterizar indirectamente as suas prticas de avaliao das aprendizagens confrontando-
as com as suas representaes;
3. Reconstruir as representaes e prticas de avaliao formativa dos professores.
4. Produzir, de forma colaborativa, instrumentos de avaliao formativa das aprendizagens em
lnguas estrangeiras.
Desenvolvimento do estudo
Este estudo desenvolveu-se em duas fases distintas no ano lectivo de 2008/09, numa
escola bsica 2 e 3 do distrito de Viana do Castelo, na qual a investigadora lecciona e envolveu 11
participantes do departamento de lnguas estrangeiras que a mesma, concomitantemente,
coordena. A primeira fase de natureza descritiva/interpretativa teve uma funo de diagnose, sendo
a segunda de natureza interventiva/avaliativa com funo de reconstruir as prticas.
Optou-se por um estudo de caso descritivo e interventivo, ancorado no paradigma
naturalista e recorreu-se ao inqurito por questionrio, anlise de contedo e entrevista semi-
estruturada com audiogravao para anlise selectiva do discurso das participantes, como
procedimentos de recolha e anlise de dados.
No trmino desta introduo, resta apresentar os 4 captulos subsequentes que estruturam
este relatrio de investigao:
O captulo I, respeitante ao enquadramento terico no qual se fundamenta o estudo
realizado, apresenta-se subdividido em sete seces.
O captulo II, dedicado metodologia de investigao e de formao, incide sobre o tipo de
estudo e seu contexto, questes de investigao e respectivos objectivos, fases do desenvolvimento
do estudo, caracterizao das participantes, procedimentos de recolha e anlise de informao.
O captulo III reporta-se apresentao e triangulao dos dados respeitantes s
representaes e prticas de avaliao, provenientes dos questionrios aplicados s participantes,
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Introduo ou razo de ser deste projecto
da anlise de contedo dos instrumentos de avaliao formativa e da anlise selectiva do discurso
das participantes nas sesses de formao.
No captulo IV retomam-se os objectivos delineados para aferir da sua consecuo,
apresentam-se as concluses mais significativas, limitaes do estudo e sugestes para
investigaes futuras.
Passemos ento para o captulo I, que se reporta reviso de literatura na qual se
enquadra o desenvolvimento do estudo em questo.
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Enquadramento terico
CAPTULO I
ENQUADRAMENTO TERICO
1. Avaliao das aprendizagens: breve contextualizao
A avaliao considerada, actualmente, como ponto de partida privilegiado para o estudo do processo de ensino-aprendizagem. Abordar o problema da avaliao , necessariamente, tocar em todos os problemas fundamentais da pedagogia (Cardinet, 1986: 11).
Estes pensamentos remetem-nos para a complexidade da avaliao e tornam evidente a sua
centralidade em todas as dimenses do processo educativo. O desenvolvimento das teorias da
aprendizagem, o desenvolvimento das teorias do currculo e a democratizao da escola pblica
vieram confirmar a centralidade e as implicaes da avaliao nos sistemas educativos.
No , contudo, objectivo deste captulo apresentar uma descrio diacrnica detalhada da
avaliao educacional e to-pouco abord-la em todas as suas multiplicidades, nomeadamente, as
vrias mudanas conceptuais operadas ao longo dos tempos, mas apresentar resumidamente os
dois paradigmas de avaliao que, alternados ou conjugados, esto associados s prticas de
avaliao nas salas de aula (Allal, 1986: 179; Fernandes, 2004: 11; 2005: 25; 2007: 587;
Perrenoud, 1999: 16).
Segundo Corteso (2002: 40), as formas de avaliao a que se recorre constituem
indicadores bastante seguros da filosofia que orienta os processos de ensino-aprendizagem, o que
nos leva a pressupor que, por detrs das prticas de avaliao dos professores se esconde uma
viso de educao, cujas representaes do papel da escola e dos seus intervenientes afectam,
com maior ou menor incidncia, o fenmeno do insucesso ou do xito escolar. Tambm para
Fernandes (2005: 24/5)
A forma como a avaliao se organiza e se desenvolve nas salas de aula, nas escolas ou nos sistemas educativos no independente das concepes que se sustentam acerca da aprendizagem. Pelo contrrio, h quase uma relao de causa-efeito entre o que pensamos, ou o que sabemos, acerca das formas como os alunos aprendem e as formas como avaliamos as suas aprendizagens.
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Enquadramento terico
Neste sentido, e de modo a melhor compreender estes pressupostos, abordamos o
paradigma positivista/behaviorista, dominante no sculo XIX at aos anos 70/80 do sculo XX (e
ainda presente nos dias de hoje), que concebe a avaliao como medida das capacidades e do
produto, realizado atravs de uma bateria de testes cujas perguntas se centralizam na memorizao
de rotinas, com exerccios de completamento de espaos, de correspondncia e de mltipla
escolha. Este instrumento de avaliao (o teste), muito valorizado, porque utilizado com frequncia,
serve para medir com preciso os objectivos e capacidades alcanadas, antes da prossecuo para
o objectivo seguinte, no permitindo aferir outras competncias. Da a formulao de listas
detalhadas de objectivos, porque as perguntas dos testes deveriam enunciar um objectivo
comportamental de cada vez; a discriminao e hierarquizao dos alunos de acordo com as suas
capacidades, na crena de que a inteligncia era inata e a motivao como factor externo ao
indivduo, resultando do reforo positivo de pequenos passos (Fernandes, 2005: 24/5; Teiga Vieira,
2007: 14/5).
Subjaz a esta concepo de avaliao a ideia de que as aprendizagens acontecem de forma
sequencial e hierrquica, ou seja, as aprendizagens complexas so a soma de aprendizagens mais
simples, concebendo-se, portanto, a aprendizagem como acumulao de associaes estmulo-
resposta.
Tambm Allal (1986: 180-182) remete para a incidncia deste paradigma na recolha de
informao sobre os resultados da aprendizagem atravs de instrumentos de boas qualidades
psicomtricas, como testes escritos e grelhas de observao que permitam um registo muito
preciso do comportamento do aluno. A interpretao das informaes recai sobre aspectos como:
ausncia dos pr-requisitos (aspas da autora) necessrios, insuficincia do tempo concedido para
a aprendizagem, programao inadequada, desrespeito pelo princpio da hierarquizao das
tarefas, frequncia e momento do feedback pouco eficientes, pelo que, na sequncia deste
diagnstico, o professor colocaria o aluno perante actividades de recuperao e remediao.
Fernandes (2004:14) designa este paradigma de psicomtrico, sustentando ser o que mais
prevalece nos sistemas educativos e demonstra que a sua lgica est presente nas trs primeiras
geraes de avaliao, tal como definidas por Guba & Lincoln em 1989.
A primeira gerao, conhecida como a gerao de medida, em que a avaliao
fundamentalmente tecnicista e visa medir para classificar e seleccionar, parece, segundo Fernandes
(2005: 57), resistir ainda no sistema educativo portugus, j que a classificao deriva, em termos
prticos, da aplicao de um ou dois testes por perodo, ou seja, resiste ainda a perspectiva de que
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Enquadramento terico
classificar e certificar so as funes da avaliao por excelncia; os conhecimentos so o nico objecto da avaliao, os alunos no participam no processo de avaliao, a avaliao , em geral, descontextualizada; se privilegia a quantificao de resultados em busca da objectividade, procurando-se garantir a neutralidade do professor (avaliador); a avaliao referida a uma norma ou padro (por exemplo, a mdia) e, por isso, os resultados de cada aluno so comparados com os de outros grupos de alunos (ibidem).
A segunda gerao, designada pela gerao da descrio, para ultrapassar as limitaes da
gerao de medida, vai mais alm e passa a descrever padres de pontos fortes e fracos. A medida
deixou de ser um fim para passar a ser um meio de avaliao. A terceira gerao nomeada como a
gerao da formulao de juzos ou julgamentos, tal como a anterior, surge da necessidade de
superar lacunas e, mantendo as funes tcnica e descritiva das anteriores, os avaliadores
deveriam tambm formular juzos de valor.
Se por um lado estas trs geraes merecem ainda crticas pelas suas limitaes,
porquanto os professores detm todo o poder no processo de avaliao interna, no abarcam a
pluralidade de valores e de culturas e so ainda muito influenciadas pelo paradigma positivista da
investigao cientfica, por outro, elas evidenciam a complexidade do processo de avaliao e o seu
evoluir para concepes mais sofisticadas.
assim que durante a terceira gerao surge, em 1967, com Scriven, a distino entre a
avaliao sumativa e avaliao formativa e os ideais de que a avaliao
deve induzir e/ou facilitar a tomada de decises que regulem o ensino e as aprendizagens; a recolha de informao deve ir para alm dos resultados que os alunos obtm nos testes; a avaliao tem de envolver os professores, os pais, os alunos e outros intervenientes; os contextos de ensino e de aprendizagem devem ser tidos em conta no processo de avaliao; a definio de critrios essencial para que se possa apreciar o mrito e o valor de um dado objecto de avaliao (Fernandes 2005: 58-60).
O paradigma cognitivista/construtivista rompe com o paradigma anterior e resulta de
mudanas a nvel epistemolgico e das teorias de investigao assente nos princpios de que
As aprendizagens so um processo activo de construo mental e de atribuio de significados. As aprendizagens so processos marcadamente sociais e, como tal, o que se aprende determinado social e culturalmente. As interaces sociais apoiam o desenvolvimento das competncias cognitivas. A metacognio, o autocontrolo e a auto-regulao das competncias so indispensveis para o desenvolvimeto do pensamento inteligente. Novas aprendizagens so determinadas pelos conhecimentos prvios e pelas perspectivas culturais que se sustentam. (op. cit.: 26/7).
Assim, a investigao no domnio das cincias cognitivas veio demonstrar que a
aprendizagem no um processo linear e mecnico, que os alunos no podem ser encarados
como simples receptores de prticas e procedimentos rotineiros descontextualizados, de que as
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Enquadramento terico
aprendizagens significativas resultam de um processo activo na interaco do sujeito com a sua
realidade e os outros. Veio ainda demonstrar que as competncias metacognitivas e socioafectivas
so fundamentais no desenvolvimento das aprendizagens, ou seja, valorizam-se procedimentos de
regulao da aprendizagem, pois o aluno aprende pela aco, reflecte sobre o que faz e como faz.
Estamos perante um paradigma que valoriza o sujeito na construo de conhecimento, e este como
um processo que envolve, simultaneamente, aspectos mentais, culturais e sociais.
De um paradigma de fragmentao mecnica evolui-se para um paradigma de
multidimensionalidade do processo de construo de conhecimento, cuja interdependncia e
interactividade das relaes do sujeito em contexto, traz para a educao uma nova maneira de
pensar com implicaes, nomeadamente a nvel da organizao curricular que deixou de ser
apenas disciplinar para incluir reas curriculares no disciplinares, cuja operacionalizao
pressupe uma gesto articulada em princpios de inter e transdisciplinaridade.
Ainda segundo Fernandes (2005: 62/3), grande parte da avaliao de quarta gerao
apresentada por Guba & Lincoln j de referncia construtivista, porque sugere uma viso
sistmica assenta em princpios como: 1. Os professores devem partilhar o poder de avaliar com os
alunos e outros intervenientes e devem utilizar uma variedade de estratgias, tcnicas e
instrumentos de avaliao. 2. A avaliao deve estar integrada no processo de ensino e
aprendizagem. 3. A avaliao formativa deve ser a modalidade privilegiada de avaliao, com a
funo principal de melhorar e de regular as aprendizagens. 4. O feedback, nas suas mais variadas
formas, frequncias e distribuies, um processo indispensvel para que a avaliao se integre
plenamente no processo de ensino-aprendizagem. 5. A avaliao deve servir mais para ajudar as
pessoas a desenvolver as suas aprendizagens do que para julgar ou classificar numa escala. 6. A
avaliao uma construo social em que so tidos em conta os contextos, a negociao, o
envolvimento dos participantes, a construo social do conhecimento e os processos cognitivos,
sociais e culturais na sala de aula. 7. A avaliao deve utilizar mtodos predominantemente
qualitativos, no se pondo de parte a utilizao de mtodos quantitativos.
Em Portugal, a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) consagra princpios orientadores
sobre o modelo de avaliao a adoptar, quando define o ensino bsico como universal e obrigatrio
e garante o direito igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares. Em consonncia
com a mesma lei, o Decreto-Lei n 286/89, que estabelece os planos curriculares dos ensino
bsicos e secundrio, atribui ao sistema de avaliao as funes de estimular o sucesso educativo
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Enquadramento terico
de todos os alunos, favorecer a confiana prpria e contemplar os vrios ritmos de desenvolvimento
e progresso.
Subjaz a esta concepo de avaliao o respeita pela individualidade de cada aluno, pois nem
todos tm os mesmos interesses e as mesmas habilidades, nem todos aprendem da mesma
maneira, devendo a prtica pedaggica adequar-se s necessidades de cada um, o que requer
uma avaliao individualizada, que fixe as metas que o aluno dever alcanar, a partir de critrios
estabelecidos em funo da sua situao no incio de cada etapa. (ME, 1991: 33/4).
Em 1991, com a Reforma Curricular, e em 1992 e 1993, com o Novo Sistema de Avaliao
(Despacho Normativo n 98A/92 de 19 de Junho), em consonncia com o disposto na LBSE,
introduziu-se um conjunto de orientaes para a avaliao, coerentes com as alteraes curriculares
baseadas em princpios cognitivistas e construtivistas das aprendizagens. O Despacho Normativo
supracitado patenteia estes princpios ao concretizar que avaliao dos alunos do ensino bsico
um elemento essencial para uma prtica educativa integrada, permitindo a recolha de informaes
e a tomada de decises adequadas s necessidades e capacidades do aluno (ponto 7), assumindo
um carcter sistemtico e contnuo (ponto 8).
Mais tarde, com a Reorganizao Curricular do Ensino Bsico, manifesta-se expressamente
que currculo e avaliao so componentes integradas de um mesmo sistema e considera-se que
a avaliao envolve interpretao, reflexo, informao e deciso sobre os processos de ensino e
aprendizagem, tendo como principal funo ajudar a promover ou melhorar a formao dos alunos
(Abrantes, 2002: 10).
Por sua vez, o Despacho Normativo n 30/2001 de 19 de Julho define a avaliao como um
elemento integrante e regulador da prtica educativa, permitindo uma recolha sistemtica de
informaes que, uma vez analisadas, apoiam a tomada de decises adequadas promoo da
qualidade das aprendizagens. Estabelece nos seus princpios a Primazia da avaliao formativa,
com valorizao dos processos de auto-avaliao regulada1, e sua articulao com os momentos de
avaliao sumativa; aponta como objecto da avaliao as aprendizagens e competncias
definidas no currculo nacional para as diversas reas e disciplinas de cada ciclo, considerando a
1Dado este estudo ter uma vertente colaborativa (veja-se nota 5, captulo II) com outra investigadora que incide sobre a auto-avaliao das
aprendizagens, optou-se por no versar especial destaque auto-regulao enquanto funo formadora da avaliao formativa (Nunzati, 1990)
considerando-se que toda avaliao formadora formativa e, portanto, inerente avaliao formativa. Assim, as estratgias de regulao asseguradas
pelo aluno e as estratgias de regulao utilizadas pelo professor so aqui consideradas como interdependentes na funo reguladora do processo
ensino-aprendizagem.
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Enquadramento terico
concretizao das mesmas no projecto curricular de escola e no projecto curricular de turma por
ano de escolaridade.
1.1 Aprendizagem e avaliao em Lnguas Estrangeiras (LE)
No que respeita s lnguas estrangeiras, os Programas de Ingls (ME, 1997: 5-145) apontam
para uma mudana de viso behaviorista da aprendizagem e da avaliao para uma viso
cognitivista/construtivista que configura aprendizagem de uma lngua como processo determinante
de socializao e valorizao pessoal, na medida em que permite ao indivduo desenvolver a
conscincia de si prprio e dos outros, traduzir atitudes e valores, aceder ao conhecimento e
demonstrar capacidades. Privilegiam uma avaliao formativa como parte integrante do processo de
aprendizagem em que os alunos so intervenientes crticos e activos (op.cit.: 144).
O Currculo Nacional do Ensino Bsico Competncias Essenciais (ME, 2001: 20) sustenta
estes princpios e estabelece como uma das suas competncias gerais Usar lnguas estrangeiras
para comunicar adequadamente em situaes do quotidiano e para apropriao de informao e
perspectiva como objectos de avaliao a competncia de comunicao e a competncia do saber
aprender.
Para se apropriar de informao e comunicar adequadamente em situaes do quotidiano
necessrio que o aluno desenvolva um saber lingustico (ME, 1997: 99) que lhe permita agir em
conformidade com os diversos contextos sociais e as suas intenes comunicativas. Quer isto dizer,
que no basta ao aluno ter conhecimentos lingusticos sobre a estrutura e lxico da lngua;
tambm necessrio que saiba usar esses conhecimentos em diferentes situaes comunicativas,
produzindo discursos adequados s interaces e convenes sociais e culturais. Assim, o
desenvolvimento de competncias comunicativas em lnguas exige que o aluno domine no s as
competncias lingusticas, mas tambm as competncias sociolingustica e pragmtica2 (CE, 2001:
34/5).
2 Entende-se por competncias lingusticas os conhecimentos e as capacidades lexicais, fonolgicas e sintcticas, bem como outras dimenses da lngua enquanto sistema, independentemente do valor sociolingustico da sua variao e das funes pragmticas e suas realizaes (). As competncias sociolingusticasreferem-se s condies socioculturais do uso da lngua. Sensvel s convenes sociais (regras de boa educao, normas que regem as relaes entre geraes, sexo, classes e grupos sociais, codificao lingustica de certos rituais fundamentais para o funcionamento de uma comunidade) afecta fortemente toda a comunicao lingustica entre representantes de culturas diferentes. As competncias pragmticas dizem respeito ao uso funcional dos recursos lingusticos (produo de funes lingusticas, actos de fala) e criam um argumento ou um guio de trocas interaccionais. Diz tambm respeito ao domnio do discurso, da coeso e da coerncia, identificao de tipos de formas de texto, ironia e pardia (QECRL, 2001:34/5). Maria Pereira Barreiro
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Enquadramento terico
Por outro lado, o uso e a aprendizagem das lnguas envolvem a realizao de tarefas que
requerem conhecimentos e capacidades relacionados com a resoluo criativa de problemas de
comunicao, pelo uso estratgico de recursos verbais e no verbais disponveis, em funo de
objectivos comunicativos, ou seja, uma competncia estratgica (Vieira e Moreira, 1993: 23).
Mas tornar-se competente em lnguas exige ainda o conhecimento, a conscincia e a
compreenso da relao entre a cultura-alvo e a cultura-me, isto , uma competncia intercultural3
que permita no s o reconhecimento de traos caractersticos da sociedade e da cultura das
comunidades que usam a lngua mas tambm o reconhecimento de afinidades/ diferenas entre
a cultura de origem e a cultura estrangeira (ME, 2001: 47). Deve ainda permitir identificar e usar
estratgias variadas para estabelecer o contacto com gentes de outras culturas, () desempenhar o
papel de intermedirio cultural entre a sua prpria cultura e a cultura estrangeira, () ultrapassar as
relaes estereotipadas (CE, 2001: 151).
Com efeito, partindo da sua prpria lngua e cultura, medida que o aluno vai aprendendo a
lngua estrangeira, vai interiorizando diferenas e semelhanas, sendo que a aprendizagem da
lngua se faz pela cultura e a cultura pela lngua, uma e outra intrnseca e reciprocamente
associadas. Esta competncia intercultural advm das teorias do multiculturalismo, que tanta
influncia tiveram nos ltimos vinte anos e que
no han surgido unicamente como respuesta a la constitucin del sujeto pedaggico en las escuelas o a la interaccion entre el sujeto pedaggico y el sujeto poltico en sociedades democrticas, sino tambin como una forma de identificar la importncia de las diferentes identidades en la educacin y la cultura (Torres, 2007: 8).
Da que esta competncia intercultural assuma, nos dias de hoje, uma importncia crescente
e inegvel na aprendizagem das lnguas estrangeiras, pois como objecto de estudo e instrumento
de comunicao e de relao, a lngua estrangeira contribui, decisivamente, para a formao global
do aluno enquanto indivduo e cidado do mundo (Frade e Bringel, 2001:99), promovendo atitudes
e valores como a compreenso, o respeito e a interdependncia democrtica entre alunos de
quaisquer origem (Cardoso, 2001: 14).
Relativamente competncia do saber aprender, o CNEB, nas competncias especficas das
lnguas estrangeiras, define um conjunto de estratgias e procedimentos, que remetem para as
componentes da planificao, monitorizao e avaliao da dimenso processual da aprendizagem
da lngua.
3 Adoptmos esta designao com base no conceito de educao intercultural, para referir conhecimentos, capacidades, atitudes e valores que expressem a diversidade de culturas e estilos de vida (), e visem promover a compreenso, o respeito e a interdependncia democrtica entre alunos de quaisquer origens (Cardoso, 2001: 14). Maria Pereira Barreiro
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Enquadramento terico
Assim, na componente da planificao as prticas de avaliao devem incidir na tomada de
decises, em tarefas de planificao e identificao das finalidades das tarefas a executar. Na
componente de monitorizao, as prticas de avaliao devem recair sobre a identificao de
dvidas e dificuldades; organizao e utilizao adequada dos materiais; mobilizao, de entre os
recursos disponveis, aqueles que num determinado contexto permitem a resoluo dos problemas
de comunicao imprevistos; cooperao produtiva na realizao de tarefas; contribuio para a
criao de um clima trabalho favorvel; estilos de aprendizagem/hbitos de estudo. Na componente
da avaliao, os enfoques apontados recaem sobre avaliao da justeza dos processos utilizados;
reviso das hipteses formuladas, se necessrio (ME, 2001: 53).
Neste sentido, nas suas prticas de avaliao, o professor deve adoptar metodologias
centradas no aluno, que o tornem agente activo e consciente da sua prpria aprendizagem, isto ,
que considere antes de tudo o utilizador e o aprendente de uma lngua como actores sociais (CE,
2001: 29), reconhecendo o direito diferena, no o penalizando pela condio social e pelo seu
potencial de aprendizagem, porque se a escolaridade obrigatria no faz sentido excluir ou
segregar aqueles que, por razes vrias, se apresentam como menos aptos e como diferentes
(Baptista, 1999: 46).
Entende-se assim que os discursos oficiais alinhados com os princpios da LBSE e o QECRL
estabelecem a nfase na funo pedaggica da avaliao e consubstanciam a avaliao formativa
em princpios conceptuais que se baseiam no desenvolvimento das teorias da aprendizagem
cognitivista/construtivista, no desenvolvimento das teorias do currculo e na funo de
democratizao da escola.
Preconizam uma avaliao que se distancia da avaliao behaviorista, porque mais centrada
nos contextos educativos, nas necessidades e no respeito pela individualidade do aluno, que no se
quer passivo, mas activo na construo do seu conhecimento. Uma avaliao mais negociada com
alunos, pais, professores e outros profissionais, sendo funo do professor ajudar o aluno a
aprender e a envolver-se nos processos de interpretao e regulao da sua prpria
aprendizagem (Vieira, 1998: 45).
A figura 1 remete-nos para esta perspectiva cognitivista/construtivista de uma avaliao
integrada no currculo, individualizada, reguladora, orientadora e sistemtica, eminentemente
formativa que expressa uma nova atitude perante o erro e que ultrapassa a mera funo de
classificao.
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Enquadramento terico
Figura 1 - Natureza da avaliao (adaptada de Vieira e Moreira, 1993)
O professor, alicerado nestes princpios, deve recolher informaes sobre o desempenho do
aluno nas componentes lingustica, sociolingustica, pragmtica e intercultural, articulando-as, de
forma complementar, com as informaes recolhidas nas componentes de planificao,
monitorizao e avaliao.
Na figura 2, so evidenciadas as componentes sobre as quais deve recair a avaliao em
lnguas estrangeiras, uma avaliao reguladora da prtica, centrada no aluno como sujeito activo,
capaz de identificar as suas dificuldades e necessidades, reflectir sobre elas e (re)estruturar as suas
estratgias como aluno e como falante da lngua, potenciando a regulao do prprio processo de
aprendizagem (Monereo, 2007: 111).
Figura 2 Componentes da CA e da CC
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Enquadramento terico
Assim, para que a avaliao esteja ao servio do ensino-aprendizagem em lnguas
estrangeiras, necessrio que a recolha de informao se faa sobre todos os domnios da
competncia de aprendizagem e da competncia comunicativa, pois para alm de aprender a
lngua, de realizar as tarefas comunicativas, o aluno deve ser chamado a intervir, a negociar, a
tomar decises, a compreender o que faz, como faz e porque faz, isto , a decidir conscientemente
os actos a realizar, () a modificar conscientemente a sua actuao, ao orientar-se para o objectivo
pretendido, () a avaliar conscientemente o processo de aprendizagem ou de resoluo seguido
(op.cit.: 10).
Segundo Weiss (1986: 272), a avaliao formativa interactiva , por inerncia, factor
integrante no desenvolvimento da oralidade em lnguas estrangeiras, quer na interaco aluno-
professor, quer aluno-aluno, pois no momento de uma comunicao, o receptor do enunciado
avalia espontaneamente o contedo da mensagem produzida, pelo simples facto de a compreender
ou no
Da que tarefas interactivas como simulaes, dilogos em pequeno ou grande grupo sejam
fundamentais para a aprendizagem quer da forma quer do contedo da lngua, pois atravs destas,
o professor vai diferenciando a sua interveno e o aluno vai ajustando o enunciado s situaes de
comunicao. A lngua , assim, motor de comunicao e participa na regulao das
aprendizagens. A este propsito, Perrenoud (1998: 96) evidencia o papel do professor para
construir uma regulao de base, isto , para
renunciar a fazer como se todo o mundo estivesse mesma distncia do objectivo e, ao contrrio, partir dos conhecimentos efectivos de cada um e dos recursos que consegue mobilizar para investir em funo do caminho que lhe resta percorrer, dos obstculos que vai encontrar () H, ento, espao para uma avaliao formativa proactiva, ou seja, para uma atribuio diferenciada a situaes didcticas adequadas.
Em sntese, aprender uma lngua e aprender a aprender uma lngua so processos
complementares e indissociveis (Vieira, 1999: 22), o que nos remete para a importncia de
promover aprendizagens significativas, que no se limitam ao domnio dos conhecimentos, mas ao
agir em situao, mobilizando nessa aco, de forma integrada e equilibrada, conhecimentos,
capacidades, atitudes e valores, visando o gosto e a autonomia no processo de aprendizagem, pois
o desenvolvimento de competncias no se confunde com o que se sabe fazer para o teste e que
se esquece completamente depois das frias (Perrenoud, 2001: 7).
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Enquadramento terico
O professor, enquanto facilitador e orientador da aprendizagem, deve assegurar os meios que
desenvolvam, gradualmente no aluno, a capacidade de organizar, controlar e avaliar a sua prpria
aprendizagem, de modo que este se torne cada vez mais autnomo e responsvel. (ME, 1997: 61).
Avaliar a competncia comunicativa e a competncia de aprendizagem, remete, portanto, para uma
avaliao multidimensional, que s uma avaliao formativa, entendida como parte integrante do
processo de ensino-aprendizagem com recurso a uma variedade de tcnicas e instrumentos de
recolha e interpretao de informao, permite, o que no se coaduna com o recurso sistemtico e
restrito aos testes sumativos ou s ditas fichas formativas tradicionais.
2. Modalidades de avaliao
O prembulo do Decreto-Lei n6/2001 sublinha a relevncia da avaliao entendida como um
processo regulador das aprendizagens, orientador do percurso escolar e certificador das diversas
aquisies realizadas pelos alunos ao longo do ensino bsico, remetendo, assim, para as trs
modalidades de avaliao (formativa, diagnstica e sumativa), s quais so, consensualmente,
associadas trs fases do sistema de ensino-aprendizagem: a avaliao formativa fase de
execuo; a avaliao diagnstica fase de planificao; a avaliao sumativa fase de avaliao.
Segundo Hadji (1992: 59), fase de execuo corresponde a aco de formao, isto , o
processo de aprendizagem, e o objectivo recolher informao sobre estratgias, progressos e
dificuldades do aluno para o orientar rumo ao sucesso; a fase de planificao ocorre antes da aco
de formao e recai sobre as atitudes, os interesses e as capacidades e competncias consideradas
como pr-requisitos para orientar futuras aprendizagens; a fase de avaliao acontece depois da
aco de formao e o objectivo verificar e certificar a aprendizagem. Podemos verificar que a
primeira incide nos processos e nas actividades de produo, a segunda est centrada no aluno
como forma de identificar as suas caractersticas e a terceira recai nos produtos apresentados pelos
alunos.
Estas trs fases do sistema de ensino-aprendizagem remetem, no dizer de Cardinet (1986:
299), para a importncia de o avaliador definir claramente se a sua finalidade formativa ou
sumativa. Fernandes (2005: 74) vai mais longe ao sublinhar que fundamental que esteja claro
para os professores, alunos, encarregados de educao e outros intervenientes que os propsitos,
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Enquadramento terico
os mtodos e os contedos de cada uma daquelas modalidades de avaliao so substancialmente
diferentes.
Importa ento, ainda que de modo breve, colocar um olhar sobre os traos distintivos destas 3
modalidades de avaliao. Comecemos pela avaliao sumativa, seguida da avaliao diagnstica
para nos determos com mais profundidade na avaliao formativa.
2.1 Avaliao sumativa
Para Pacheco (1995: 76), a avaliao sumativa est ligada medio e classificao do
grau de consecuo do aluno no final de um processo (trimestre, semestre, ano), tendo a finalidade
de certificar mediante a determinao de nveis de rendimento, aparecendo, assim, associada a
um produto final, em geral, resultado de provas ou de testes realizados em determinados
momentos, caracterizando-se por ser pontual e externa ao aluno.
Nesta linha se posiciona tambm Rosales (1992: 93) ao entender avaliao sumativa como
modalidade que tem por finalidades medidas selectivas, de promoo e certificao, contrastando
com a diagnstica e formativa, que visam adaptar o ensino s caractersticas dos alunos.
Neves et al. (1994: Folha C/1) associam, de igual modo, a avaliao sumativa a conceitos
de resultado ou produtos de aprendizagem, funcionando como um balano, em momentos
especficos, para determinar a tomada de decises. Assim, na perspectiva destes autores, a
avaliao sumativa pode ser utilizada com funo formativa se decorre ao longo do processo de
ensino-aprendizagem e conduz adequao do ensino conforme as necessidades do aluno; com
funo de reorientao do percurso escolar, no final de perodo e no final de ciclo; com funo de
reteno ou progresso no final de ciclo; com funo de certificao no final do terceiro ciclo.
Considerada a mais praticada e a mais conhecida desde sempre (Rosales, 1992: 36)
traduz-se, no ensino bsico, numa escala de nveis de 1 a 5 no final de cada perodo por referncia
a critrios predeterminados, da responsabilidade do Conselho Pedaggico e operacionalizados pelo
professor de cada disciplina.
O Quadro Europeu Comum de Referncia para as Lnguas (CE, 2001: 255), para alm de
associar a avaliao sumativa aos resultados obtidos de acordo com uma norma ou uma meta
estabelecida, sublinha que esta no constitui necessariamente uma avaliao de proficincia. Da
a importncia de no restringir a avaliao sumativa aos resultados dos testes ditos tradicionais,
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Enquadramento terico
mas globalidade de informaes sobre produtos e processos, obtidas atravs de
tarefas/instrumentos diversificados, ao longo do desenvolvimento das aprendizagens, porquanto
permitem maior transparncia, consistncia e credibilidade na converso para o nvel a atribuir ao
aluno.
esta a filosofia que se subentende do Despacho n30/2001 de 19 de Julho no seu Artigo
22, ao referir que a avaliao sumativa consiste na formulao de uma sntese das informaes
recolhidas sobre o desenvolvimento das aprendizagens e competncias definidas para cada rea
curricular e disciplina. O Decreto-Lei n 6/2001 de 18 de Janeiro, no Artigo 13, ponto 4, remete,
igualmente, para o carcter globalizante da avaliao sumativa e estabelece que se realiza no final
de cada perodo, utiliza a informao recolhida no mbito da avaliao formativa e traduz-se na
formulao de um juzo globalizante sobre as aprendizagens realizadas pelos alunos.
Neste sentido, a avaliao sumativa em lngua estrangeira decorre da interpretao dos
dados recolhidos ao longo do processo de ensino-aprendizagem sobre a competncia comunicativa
e a competncia de aprendizagem, no representando apenas a medio de um dado
comportamento ou a verificao do grau de consecuo de um objectivo de aprendizagem, como
passo final de um processo (Vieira e Moreira, 1993: 10).
2.2 Avaliao diagnstica
O Despacho Normativo n1/2005, de 5 de Janeiro, no Artigo 18, acentua que A avaliao
diagnstica conduz adopo de estratgias de diferenciao pedaggica e contribui para elaborar,
adequar e reformular o projecto curricular de turma, facilitando a integrao escolar do aluno,
apoiando a orientao escolar e vocacional. Pode ocorrer em qualquer momento do ano lectivo
quando articulada com a avaliao formativa.
Considerada como vertente da avaliao formativa, aparece associada quer ao momento de
avaliao pontual quer ao momento de avaliao inicial (no incio do ano, de unidade lectiva,
trimestre, etc), consistindo no levantamento de pr-requisitos para novas aprendizagens e
funcionando como um indicador para a actuao diferenciada do professor (Pacheco, 1995: 74).
Segundo Rosales (1992: 92), se operacionalizada num momento inicial pode proporcionar
a tomada de decises no que concerne planificao do processo ensino-aprendizagem; se
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Enquadramento terico
operacionalizada de forma pontual pode permitir a adopo de procedimentos para a realizao de
actividades de remediao de dificuldades do aluno.
Uma vez que d indicaes para orientar a aco pedaggica, serve propsitos de orientao
e regulao do processo de ensino-aprendizagem, sendo assim entendida como eminentemente de
natureza formativa.
A este propsito, Heacox (2006: 32/3) compara os testes de diagnstico a pr-avaliaes,
salientando a importncia destes, principalmente quando o professor pretende diferenciar com base
no que os alunos j sabem e no que necessitam de aprender. Neste caso, segundo Perrenoud
(2001: 46), o professor poder diferenciar, individualizando a sua interveno e oferecendo
actividades/contedos de desenvolvimento ou de trabalho autnomo aos alunos mais rpidos e
actividades/contedos de remediao ou mais tempo de trabalho intensivo aos que encontraram
maiores dificuldades. Tal actuao pressupe a planificao e explicitao da aco pedaggica,
material diversificado e regras de funcionamento discutidas e negociadas com os alunos.
Mas a avaliao de diagnstico pelo professor pode passar por outras formas para alm das
fichas de lpis e papel, como por exemplo, estar atento s respostas dadas pelos alunos durante
as discusses na sala de aula, atravs da observao das actividades conduzidas em pequenos
grupos e atravs da reviso dos trabalhos individuais, enquanto estes esto a ser realizados pelos
alunos; por questes do gnero que sei sobre este tpico? Que quero saber sobre este tpico?
Que aprendi? () vamos descobrir o que sabem (Heacox, 2006: 32/3). Pode ainda passar por um
questionrio ou inventrio de interesses, pois estes permitem uma rpida recolha de informao,
embora se possa questionar a veracidade das respostas dos alunos.
2.3 Avaliao Formativa (AF)
O Despacho Normativo n1/2005, no seu Artigo 19, define a avaliao formativa como
principal modalidade de avaliao do ensino bsico, que assume carcter contnuo e sistemtico e
visa a regulao do ensino e da aprendizagem, recorrendo a uma variedade de instrumentos de
recolha de informao, de acordo com a natureza das aprendizagens e dos contextos em que
ocorrem. Por outro lado, no Artigo 20, esclarece que a avaliao formativa fornece ao professor, ao
aluno, ao encarregado de educao e aos restantes intervenientes informao sobre o
desenvolvimento das aprendizagens e competncias, de modo a permitir rever e melhorar os
processos de trabalho. Maria Pereira Barreiro
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Sendo da responsabilidade de cada professor, em dilogo com os alunos e em colaborao
com os outros professores, designadamente no mbito dos rgos colectivos que concebem e
gerem o respectivo projecto curricular e, ainda, sempre que necessrio, com os servios
especializados de apoio educativo e os encarregados de educao, devendo recorrer, quando tal se
justifique, a registos estruturados (Artigo 21), a avaliao formativa permite mobilizar e coordenar os
recursos educativos existentes na escola ou agrupamento com vista a desencadear respostas
adequadas s necessidades dos alunos (Artigo 22).
Deste despacho normativo destacamos trs dimenses da avaliao formativa que nos
interessam particularmente neste estudo: a funo reguladora da avaliao formativa, os
instrumentos/materiais para recolha de informao e os intervenientes no processo.
Voltemos, ento, avaliao formativa dos anos 60 e 70 do sculo XX para evidenciar a
concepo de avaliao formativa que defendemos neste estudo. Centrada nos objectivos
comportamentais e nos resultados dos alunos, aplicada num dado momento do ensino e de
aprendizagem, incidia sobre pequenos fragmentos da matria. Com o desenvolvimento das teorias
da aprendizagem, o desenvolvimento das teorias do currculo e da aprendizagem, aliada
democratizao da escola pblica, a avaliao formativa revelou-se um processo bem mais
complexo e mais rica do ponto de vista terico e passa a entender-se (concepo que orienta este
estudo) como
todo e qualquer processo de avaliao destinado a regular e a melhorar as aprendizagens, focado nos processos, mas sem ignorar os produtos, participado, transparente, que no seja essencialmente baseado em testes de papel e lpis e integrado nos processos de ensino e de aprendizagem (Fernandes 2006: 24).
Contudo, quando se fala em avaliao formativa, a dos anos 60 e 70 para muitos
professores, a que () est mais presente nas suas prticas e que, apesar de todos os
desenvolvimentos dos ltimos anos, continua a manter uma assinalvel predominncia nos
sistemas educativos (op.cit.: 23). Este tipo de avaliao, geralmente materializada no instrumento
dito ficha formativa, ocorre antes da avaliao sumativa, isto , antes do tradicional teste de
avaliao e tem por finalidade rever a matria dada.
Mas, tal como refere Hadji (1992: 62), avaliao formativa no se limita reviso da matria
dada; ela permite tambm consolidar a confiana do aluno, identificar as suas lacunas e
dificuldades; gui-lo e acompanh-lo nas diversas etapas da sua aprendizagem; reajustar e instaurar
uma verdadeira relao pedaggica.
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Na mesma linha se apresenta Bonboir (1976: 255), ao apontar para a natureza de
diagnstico desta modalidade de avaliao e sua funo de feedback informativo, sustentando que
a avaliao formativa
tem por nico fim reconhecer onde e em qu o aluno sente dificuldade e procurar inform-lo. Esta avaliao no se traduz em nota, nem muito menos em scores. Trata-se de um feedback para o aluno e para o professor. Em consequncia da sua natureza diagnstica, a avaliao formativa exige a aco correctiva sem a qual no existe verdadeiro ensino.
Tambm Allal (1986: 14) e Vieira e Moreira (1993: 10) remetem para esta abordagem
processual, diagnstica e reguladora da avaliao formativa ao advogarem que visa orientar o aluno,
procurando localizar as suas dificuldades para o ajudar a descobrir os processos que lhe permitiro
progredir na sua aprendizagem. Uma avaliao que deve ser realizada com diversos graus de
sistematicidade, formalizao, profundidade e negociao entre os intervenientes.
Deste modo, a identificao das dvidas e dificuldades do aluno bem como a definio dos
procedimentos a adoptar so meios essenciais para a regulao do ensino e da aprendizagem, pelo
que a avaliao formativa no se reveste de fins classificativos e, portanto, selectivos, mas de meio
de informao que sirva de retorno (feedback) para o aluno e o professor, pois tal como advoga
Cardinet (1993: 105) ajuda a compreender o ritmo do aluno e a descobrir a origem das suas
dificuldades,
o que no se consegue com a maioria das provas de avaliao de resultados, que se limitam a constatar o sucesso ou o insucesso, sem precisar as causas dum e doutro. Sem dvida que as provas de avaliao de resultados nos fornecem dados mais estveis do que as provas que pretendem, indirectamente, avaliar os esforos dos alunos. (ibidem).
Assim, a avaliao formativa no tem por finalidade une vrification de connaissances. Elle
est interrogation dun processus (Abrecht, 1991:14), o processo de ensino-aprendizagem.
Interrogao direccionada simultaneamente ao questionamento para detectar onde e em que
momento o aluno apresenta dificuldades, para o ajudar a situar essas dificuldades e a descobrir
estratgias que lhe permitam super-las de modo a progredir nas suas aprendizagens; mas tambm
ao questionamento sobre adequabilidade dos meios usados, as condies em que o ensino se
desenvolve e sua eficcia, num duplo sentido - a consciencializao do aluno e do professor do que
se faz, como se faz, para se saber o que, efectivamente, se quer fazer.
Daqui se infere que a avaliao formativa constitui o cerne do processo de ensino-
aprendizagem e dificilmente se distingue dele (Cardinet, 1993: 118). Daqui se infere tambm da
sua importncia como actividade integrada na prtica educativa com funo reguladora, de
natureza diagnstica, processual e diferenciada, quer porque permite ao professor ajustar a sua
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interveno pedaggica e regular o seu ensino, quer porque permite ao aluno rever o seu processo
de aprendizagem.
A avaliao formativa na sua funo reguladora assume-se assim como um instrumento de
adaptao constante das formas de ensino s caractersticas e necessidades dos alunos e, por
outro, um instrumento para facilitar a promoo do controlo e da responsabilidade por parte do
aluno sobre o seu prprio processo de aprendizagem (Veiga Simo, 2005: 266).
3. Avaliao formativa: a funo reguladora ao servio de uma pedagogia para a
autonomia (PA)
A funo reguladora da avaliao formativa constitui uma componente fundamental de uma
pedagogia para a autonomia, porquanto tem como inteno agir sobre os mecanismos de
aprendizagem, contribuindo para a consciencializao da forma pessoal de aprender e para o
desenvolvimento da autonomia do aluno, entendida como a capacidade de gerir a prpria
aprendizagem (Vieira, 1998: 96-119).
Para que a funo reguladora da avaliao formativa esteja ao servio de uma pedagogia
para a autonomia, conduzindo o aluno a reflectir sobre a sua prpria forma de aprender, ajudando-o
a identificar as causas das suas dificuldades, a consciencializar-se das operaes e decises que
realiza, o professor dever assentar a sua aco pedaggica em 3 etapas (cf. figura 3): 1. recolha
de informaes relativas aos progressos e dificuldades de aprendizagem sentidos pelos alunos; 2.
interpretao dessas informaes numa perspectiva de referncia criterial e, na medida do possvel,
diagnstico dos factores que esto na origem das dificuldades de aprendizagem observadas; 3.
adaptao das actividades de ensino e de aprendizagem de acordo com a interpretao das
informaes recolhidas (Allal, 1986: 180-188).
Figura 3 Etapas da AF (Allal, 1986)
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Numa pedagogia para a autonomia, estas 3 etapas sequenciais impem que o professor
planifique a avaliao, isto , que identifique quais os aspectos da aprendizagem que necessrio
observar, que modos ou instrumentos para a recolha de informao; que princpios devem orientar
a interpretao dessa informao; que caminhos a seguir na adaptao das actividades de ensino e
de aprendizagem, no sentido de levar o aluno a aprender (Vieira e Moreira, 1993: 12).
Assim, os dados a recolher, no descurando o produto, sero prioritariamente do domnio
processual; os erros sero teis diferenciao e os instrumentos e tcnicas para recolha de
informao, contrariamente perspectiva behaviorista, sero variados, passando pela observao
do aluno durante a execuo da tarefa, em trabalho colaborativo e na planificao das actividades a
desenvolver; pela explicitao do aluno em voz alta das etapas para chegar ao produto; pela
entrevista, por listas de verificao, entre outros instrumentos e tcnicas possveis. Por conseguinte,
a interpretao dos dados recolhidos no incidir prioritariamente sobre a correco do resultado,
mas sobre a estratgia ou processo seguido pelo aluno, o que nem sempre ser fcil, pois o
professor precisar de recorrer a referentes do domnio dos comportamentos tpicos de uma certa
idade ou estdio ou sua capacidade de observao-reflexo para agir pela experimentao. O
diagnstico das dificuldades ser formulado sobre hipteses relativas s interaces entre as
caractersticas do aluno e as caractersticas da tarefa como, por exemplo, o desenvolvimento
cognitivo em comparao com o grau de complexidade e exigncia da tarefa; a maneira como o
aluno interpreta a informao; as suas representaes sobre a tarefa; a sua capacidade para
reorientar a sua aco em funo de novas informaes. As actividades a aplicar dependero da
capacidade do professor para formular hipteses, criar situaes para testar essas hipteses e
proceder sua reformulao em funo de novas situaes.
Quer isto dizer que o professor dever agir em funo de uma dialctica constante entre
observao-reflexo-interveno nos processos de aprendizagem. Quer isto dizer que o professor
dever sustentar a recolha de informao e a sua interpretao numa base criterial que ter de ser
clarificada aos alunos para que saibam os critrios por referncia aos quais as aprendizagens so
avaliadas, pois a transparncia do processo de avaliao, nomeadamente atravs da clarificao e
da explicitao dos critrios adaptados um direito consagrado na lei e, portanto, um dever
deontolgico de todo o professor. Tal como afirmam Barbosa e Alaiz (1994: Folha A/9) a
explicitao de critrios ser tanto mais completa e mais til quanto melhor conseguir, por um lado,
indicar com clareza os actos que os alunos devem executar quando se encontram em situao de
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aprendizagem e, por outro lado, as caractersticas que o produto final dessa aprendizagem deve
apresentar.
Segundo Allal (1986: 189-191), o professor na sala de aula pode operacionalizar a avaliao
formativa em momentos distintos a que correspondem 3 formas de regulao: a regulao
retroactiva, a regulao interactiva e a regulao proactiva, como mostra a figura 4.
Figura 4: Formas de regulao da AF (Allal, 1986)
Vejamos ento em que momentos se processam as 3 etapas da avaliao formativa atrs
descritos (figura 3) e qual a funo de regulao correspondente.
O professor recolhe informao aps uma sequncia de aprendizagens mais ou menos
longa, atravs de um controlo escrito (teste, exerccio) aplicado a toda a turma (Allal, 1986: 189).
A interpretao dos dados recolhidos incidir sobre os resultados que lhe permitiro verificar quais
os objectivos pedaggicos atingidos, passando a organizar e aplicar actividades em funo dos
resultados obtidos. Neste caso, a funo de regulao assegurada pela avaliao formativa de
natureza retroactiva, pois implica um retorno aos objectivos no atingidos. Para que o aluno
ultrapasse as suas dificuldades e atinja os objectivos definidos, o professor elabora e aplica
actividades de remediao. Esta regulao pontual e, porque incide nos resultados da
aprendizagem, no permite diagnosticar os factores que esto na origem das dificuldades, dando
lugar a um tratamento indiferenciado, isto , a adaptao das actividades pedaggicas efectuada
por meios parcialmente standardizados (ibidem). Esta modalidade de aplicao da avaliao
formativa marcadamente de caractersticas behavioristas. Trata-se de verificar se o produto final
cumpriu ou no as finalidades a que se propunha para decidir sobre a sua continuidade,
prolongamento ou ampliao (Alves, 2004: 37).
Mas se a funo de regulao assegurada pela avaliao formativa de natureza proactiva,
caracterizada pela busca de novas e diferentes actividades, isto , se est orientada para a
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consolidao e aprofundamento das competncias do aluno, o professor recolhe informao no
incio de uma tarefa ou de uma situao didctica. Esta avaliao pode abranger, quer os alunos
com dificuldade a quem proposta uma actividade alternativa numa nova situao educativa em
vez de actividades de remediao; quer os que progrediram e para quem o professor apresenta
actividades de desenvolvimento das suas competncias. Esta modalidade de aplicao da avaliao
formativa
admite, entre outras, a ideia de que o professor possa ser levado a renunciar remediao dos erros, se achar que a consolidao ou o aprofundamento das competncias dos alunos se consegue melhor num novo contexto do que atravs da repetio da tarefa em que se falhou, ou voltando a estudar a matria no compreendida (Allal cit. por Abrecht, 1994: 46).
O professor pode ainda recolher informao durante a realizao das tarefas ou ao longo de
situaes didcticas. Atravs da observao, o professor procura identificar as dificuldades do
aluno, diagnosticar as causas dessas dificuldades e reorientar a sua aco. A recolha, interpretao
e interveno ocorrem em tempo real e em situao, ou seja, a avaliao est integrada nas tarefas
de ensino-aprendizagem. Portanto, todas as interaces do aluno quer sejam com o professor, os
colegas ou a tarefa constituem momentos para regulao do ensino e da aprendizagem. Neste
caso, a regulao de natureza interactiva. Esta regulao permite um acompanhamento e
interveno diferenciada mais vantajosa do que uma remediao posteriori (Allal, 1986: 191),
pois o professor pode observar diferentes alunos, identificar os que no conseguem avanar nas
tarefas propostas e, consequentemente, readaptar a sua actuao, de acordo com ritmos e
progressos, fazendo perguntas, dando sugestes personalizadas e explicitando as etapas da
realizao da tarefa, desenvolvendo formas de colaborao, de interaco e de cooperao e ajuda
mtua (Rosales, 1992: 92).
Estas duas modalidades de aplicao da avaliao formativa integram-se num quadro de
referncia cognitivista/construtivista, pois embora no descurando o produto, privilegiam as etapas
do processo; conduzem o aluno descoberta das suas estratgias de aprendizagem; permitem a
sua observao directa enquanto executa a tarefa; possibilitam identificar os pontos crticos ou
obstculos que comprometem o seu progresso; facilitam o feedback diferenciado em diferentes
formas e momentos para que cada aluno reoriente a sua prpria estratgia e, progressivamente, v
caminhando para a meta da autonomia.
Com efeito, se todos os alunos podem desenvolver a sua autonomia de acordo com as suas
aptides e propenses pessoais (Vieira, 1998: 51) o professor ter de operacionalizar as
modalidades de aplicao da avaliao formativa que melhor servem a especificidade e o
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desenvolvimento do aluno para a gesto da sua aprendizagem, pois tal como mostra a figura 5,
estas modalidades no procuram o mesmo tipo de informaes sobre a conduta da criana, no
fornecem interpretaes da mesma natureza e no conduzem, por conseguinte, ao mesmo tipo de
regulao da interveno do professor (Haramein, 1986: 222).
Figura 5 Tipos de regulao e momentos de recolha de informao da AF (Allal, 1986)
Estes trs tipos de regulao da avaliao formativa no se excluem; podem e devem ser
combinados no dia-a-dia da prtica pedaggica, pois tendo o professor detectado dificuldades
atravs de um controlo escrito pode complementar a recolha de informao com uma estratgia
de observao ou adoptar o processo inverso, de modo a diagnosticar as necessidades do aluno e a
regular a sua interveno para um tratamento individualizado, que implique o envolvimento do
aluno nas decises de aprendizagem, de modo a tornar-se responsvel face tarefa de aprender.
Cabe ao professor construir uma estratgia de avaliao formativa que seja aplicvel na
sua turma (Allal, 1986: 188), isto , uma avaliao formativa que seja parte integrante de uma
pedagogia diferenciada, que se dilua no trabalho da sala de aula, que seja regra e no excepo na
aco pedaggica, que valorize o esforo e alimente competncias de independncia face ao
professor.
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Assim, para que avaliao formativa esteja ao servio de uma pedagogia para a autonomia
imprescindvel colocar o aluno no centro do processo de ensino-aprendizagem, atravs de tarefas
que criem oportunidades de reflexo, experimentao, monitorizao e avaliao das aprendizagens
e mecanismos usados, para que se v libertando progressivamente da dependncia do professor.
Assim sendo, s uma avaliao formativa deste tipo, integradora e no discriminatria, se
pode articular com uma pedagogia para autonomia, na medida em que s ela pressupe um
envolvimento directo do aluno nos processos de interpretao e diferentes modos de regulao da
sua prpria aprendizagem (Vieira, 1998: 45).
4. Regulao e diferenciao: funes indissociveis da AF numa pedagogia para
autonomia
Segundo Abrantes (2002: 12), os princpios da diferenciao pedaggica esto
estreitamente ligados ao desenvolvimento da autonomia do aluno no seu processo de
aprendizagem. Como vimos, uma pedagogia para a autonomia pressupe o papel activo do aluno e