AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE 25-HIDROXIVITAMINA D SÉRICA EM ...

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FACULDADE EVANGÉLICA MACKENZIE DO PARANÁ CLARISSA PAIVA COLLING AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE 25-HIDROXIVITAMINA D SÉRICA EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA CURITIBA 2020

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FACULDADE EVANGÉLICA MACKENZIE DO PARANÁ

CLARISSA PAIVA COLLING

AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE 25-HIDROXIVITAMINA D SÉRICA EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA

CURITIBA 2020

CLARISSA PAIVA COLLING

AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE 25-HIDROXIVITAMINA D SÉRICA EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA

Trabalho Científico de Curso (TCC) apresentado à Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná, como requisito parcial à obtenção do Título de Médico. Orientador: Prof. Dr. Marcos Seefeld

CURITIBA

2020

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Biblioteca da Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná)

C711 Colling, Clarissa Paiva.

Avaliação do nível 25-hidroxivitamina D sérica em pacientes com esclerose múltipla / Clarissa Paiva Colling. — Curitiba, 2020.

Orientador : Prof. Dr. Marcos Seefeld. Trabalho de Conclusão de Curso – Instituto Presbiteriano

Mackenzie, Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná, Curso de Medicina, 2020.

1. Esclerose múltipla. 2. Vitamina D. 3. Encefalomielite autoimune

experimental. I. Título.

CDD

616.834

FACULDADE EVANGÉLICA MACKENZIE DO PARANÁ

CLARISSA PAIVA COLLING

AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE 25-HIDROXIVITAMINA D SÉRICA EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA

Trabalho Científico de Curso (TCC)

apresentado à Faculdade Evangélica Mackenzie do

Paraná, como requisito parcial à obtenção do Título

de Médico.

Orientador: Prof. Dr. Marcos Seefeld

Aprovado em: __/__/____

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________________________

Professor 1 (titulação e nome completo)

______________________________________________________

Professor 2 (titulação e nome completo)

Aos meus pais, Mauro e Adriana, pelo apoio e por me proporcionarem a

oportunidade de realizar a graduação em medicina.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Marcos Seefeld, pela excelente orientação me fornecida

durante a elaboração desse trabalho.

Aos residentes dos serviços de Neurologia e Neurocirurgia do Hospital

Universitário Evangélico Mackenzie, por voluntariamente me auxiliarem na coleta de

dados em prontuários.

À Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná e Hospital Universitário

Evangélico Mackenzie, origens do conhecimento necessário à concepção do

trabalho.

A Israel, a maior fonte de incentivo, suporte e conhecimento no decorrer da

confecção desse trabalho.

A João Antonio, pela habilidade de transformar minhas frustrações em risos.

A medicina é como a lenta construção de uma parede (...) temos sorte se,

durante uma vida inteira, conseguimos colocar um tijolo. Se pudermos explicar a

doença, alguém que ainda não nasceu pode descobrir a cura.

Noah Gordon, O Físico

RESUMO

A esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune crônica, desmielinizante

e incapacitante do sistema nervoso central (SNC). Apresenta distribuição geográfica

caracterizada por incidência e prevalência aumentadas em maiores latitudes;

aponta-se que a hipovitaminose D, consequente à menor exposição à radiação

ultravioleta B (UV-B) nessas regiões, pode explicar tal fato, sugerindo que níveis

elevados de vitamina D podem reduzir o risco de desenvolvimento de EM.

Experimentos com a indução de encefalomielite autoimune experimental (EAE) em

animais evidenciam que a suplementação de vitamina D pode prevenir ou reduzir a

velocidade de progressão da doença. A avaliação do nível de vitamina D no

organismo se dá pela mensuração da 25-hidroxivitamina D [25(OH)D] sérica.

Objetivo. Mensurar os níveis séricos de 25(OH)D em pacientes com diagnóstico de

EM no Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, estabelecendo a prevalência de

hipovitaminose D nessa população. Métodos. Estudo transversal retrospectivo

observacional, por meio de revisão de prontuários eletrônicos de pacientes com EM

atendidos no hospital da pesquisa no período de janeiro de 2014 a fevereiro de

2020, levantando as variáveis: sexo, idade, nível sérico de 25(OH)D, idade de início

dos sintomas da doença, tempo de atividade da doença e padrão clínico.

Resultados. Entre 27 pacientes, a maioria (74%) apresentou concentração sérica de

25(OH)D abaixo do valor recomendado, enquanto 25,9% apresentaram níveis

ideais. De acordo com tal classificação, dividiu-se a amostra em dois grupos para as

demais comparações. Pacientes com nível ideal de vitamina D tiveram concentração

média de 25(OH)D sérica de 35,5 ng/mL; pacientes com hipovitaminose D, de 22,1

ng/mL. Entre os pacientes com hipovitaminose D, 90% apresentavam o padrão

remitente-recorrente (EMRR), enquanto entre os pacientes com nível ideal a

proporção foi de apenas 42,9%. As demais comparações não foram significativas.

Conclusão. Verificou-se alta prevalência de hipovitaminose D na população em

estudo, além de que essa é mais prevalente em portadores de EMRR.

Palavras-chave: Esclerose múltipla. Vitamina D. Encefalomielite autoimune

experimental.

ABSTRACT

Multiple sclerosis (MS) is a chronic, demyelinating and disabling central

nervous system (CNS) autoimmune disease. It has a geographic distribution

characterized by increased incidence and prevalence at higher latitudes; it is pointed

out that hypovitaminosis D, resulting from less exposure to ultraviolet B (UV-B)

radiation in these regions, would explain that fact, suggesting that high levels of

vitamin D may reduce the risk of developing MS. Studies with experimental

autoimmune encephalomyelitis (EAE) induction in animals show that vitamin D

supplementation can prevent or slow the rate of the disease’s progression. The

assessment of the level of vitamin D in the body is done by measuring 25-

hydroxyvitamin D [25(OH)D] serum levels. Objectives. Measure 25(OH)D serum

levels in patients diagnosed with MS in Hospital Universitário Evangélico Mackenzie,

in order to establish the prevalence of hypovitaminosis D in this population.

Methods. Retrospective observational cross-sectional study, by the review of

electronic medical records of patients with MS treated at the hospital in the study

from January of 2014 to February of 2020, raising the variables: sex, age, serum

level of 25(OH)D, age of onset, duration of disease activity and clinical pattern.

Results. In 27 patients, the majority (74%) had a serum level of 25(OH)D below the

recommended value, while 25.9% had ideal levels. According to that classification,

the sample was divided into two groups for other comparisons. Patients with ideal

vitamin D levels had an average serum 25(OH)D level of 35.5 ng/mL, while patients

with hypovitaminosis D had an average level of 22.1 ng/mL. Among patients with

hypovitaminosis D, 90% had a remitting-recurrent (RRMS) pattern, while among

patients with an ideal level, the proportion was only 42.9%. The other comparisons

were not significant. Conclusion. A high prevalence of hypovitaminosis D was found

in the population studied, in addition to it being more prevalent in patients with

RRMS.

Keywords: Multiple sclerosis. Vitamin D. Experimental autoimmune

encephalomyelitis.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Representação esquemática da sequência de eventos envolvidos na

síntese da 1,25(OH)2D ............................................................................. 22

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Classificação do nível de vitamina D de acordo com a concentração

sérica de 25-hidroxivitamina D (ng/mL) .................................................. 30

Gráfico 2 – Relação entre nível sérico de vitamina D e padrão clínico da doença .... 31

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Intervalos de referência da 25-hidroxivitamina D para a população de

acordo com idade e características clínicas individuais ......................... 24

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Características do nível sérico de 25-hidroxivitamina D da amostra ....... 28

Tabela 2 – Classificação da amostra de acordo com o nível sérico de 25-

hidroxivitamina D .................................................................................... 28

Tabela 3 – Relação entre concentração sérica de 25-hidroxivitamina D e demais

variáveis ................................................................................................. 29

LISTA DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

EM – Esclerose Múltipla

SNC – Sistema Nervoso Central

25(OH)D – 25-hidroxivitamina D

UV-B – Ultravioleta B

EAE – Encefalomielite Autoimune Experimental

7-DHC – 7-deidrocolesterol

1,25(OH)2D3 – 1,25-diidroxivitamina D

PTH – Paratormônio

EMRR – Esclerose Múltipla Remitente-Recorrente

EMSP – Esclerose Múltipla Secundária Progressiva

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 16

1.1 OBJETIVOS ........................................................................................................ 17

2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................. 18

2.1 ESCLEROSE MÚLTIPLA .................................................................................... 18

2.1.1 Fisiopatologia e sintomatologia da doença ....................................................... 18

2.1.2 Padrões clínicos e diagnóstico ......................................................................... 19

2.1.3 Epidemiologia ................................................................................................... 20

2.1.4 Distribuição geográfica, radiação ultravioleta B e esclerose múltipla ............... 20

2.2 VITAMINA D ........................................................................................................ 21

2.2.1 Fontes e metabolismo da vitamina D ............................................................... 21

2.2.2 Atuação da vitamina D ..................................................................................... 23

2.2.3 Avaliação da vitamina D sérica ........................................................................ 23

2.3 VITAMINA D NA ESCLEROSE MÚLTIPLA ......................................................... 24

2.3.1 Radiação ultravioleta B e distribuição geográfica da doença ........................... 24

2.3.2 Encefalomielite Autoimune Experimental (EAE) e suplementação terapêutica 25

3 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 26

3.1 DELINEAMENTO ................................................................................................ 26

3.2 LOCAL DO ESTUDO .......................................................................................... 26

3.3 PERÍODO DO ESTUDO ...................................................................................... 26

3.4 VARIÁVEIS ......................................................................................................... 26

3.5 CLASSIFICAÇÃO ................................................................................................ 26

3.6 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO ................................................................................ 26

3.7 CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO .............................................................................. 27

3.8 ANÁLISE ESTATÍSTICA ..................................................................................... 27

3.9 ASPECTOS ÉTICOS........................................................................................... 27

4 RESULTADOS ....................................................................................................... 28

5 DISCUSSÃO .......................................................................................................... 32

6 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 34

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 35

ANEXOS ................................................................................................................... 39

16

1 INTRODUÇÃO

A esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune crônica, desmielinizante

e incapacitante do sistema nervoso central (SNC). Segundo Marques et al. (2018),

“afeta principalmente pacientes jovens, resultando em enormes consequências para

seus domínios físico e cognitivo, e impactando sua qualidade de vida e

empregabilidade”.

Apresenta distribuição geográfica bem definida, sendo que áreas de maior

latitude em ambos os hemisférios possuem maiores incidência, prevalência e

mortalidade (SIMPSON et al., 2011). A exposição à radiação ultravioleta B (UV-B) é

maior nos trópicos, sugerindo que a luz solar e o consequente aumento da vitamina

D têm um efeito protetor sobre o risco de desenvolvimento de EM. (HAYES, 2000;

MUNGER et al., 2004; BRUM et al., 2014).

Estudos recentes corroboram essa teoria. O calcitriol, ou vitamina D3 [1,25-

(OH)2D3], forma ativa da vitamina D, possui, além da função de promover a

homeostase do cálcio e fósforo e, assim, a mineralização óssea adequada,

propriedades imunomoduladoras, reduzindo a resposta inflamatória. (SIMPSON JR

et al., 2010).

Segundo Hayes (2000)

Contudo, a evidência mais clara de que a vitamina D pode ser um inibidor natural da EM provém de experimentos com encefalomielite autoimune experimental (EAE), um modelo de EM. Tratamento de camundongos com 1,25-(OH)2D3 inibiu completamente a indução e progressão de EAE.

O Consenso Brasileiro para o Tratamento da EM da Academia Brasileira de

Neurologia e do Comitê Brasileiro de Tratamento e Pesquisa em Esclerose Múltipla,

estabelecido em 2018, recomenda “dosar a 25-hidróxi-vitamina D em todos os

pacientes com EM; e considerar suplementação de vitamina D individualmente, em

doses fisiológicas, ou seja, suficiente para atingir níveis séricos entre 40 e 100

ng/mL (100-150 nmol/L)”. (MARQUES et al., 2018).

Mesmo com a ampla disponibilidade de luz solar no Brasil, a hipovitaminose

D se tornou comum. Contudo, há poucos estudos que verificaram a concentração

sérica de vitamina D na população brasileira e a prevalência de hipovitaminose D em

pacientes com EM. (ARANTES et al., 2013; BRUM et al., 2014).

17

Tendo em vista o grande impacto da doença na qualidade de vida de seus

portadores e a falta de estudos brasileiros acerca da deficiência de vitamina D nesse

grupo, torna-se relevante contribuir para as pesquisas que relacionam a EM a tal

variável.

1.1 OBJETIVOS

Avaliar os níveis séricos de 25(OH)D em pacientes portadores de EM

atendidos no Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, estabelecendo a

prevalência da sua deficiência nessa população.

18

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 ESCLEROSE MÚLTIPLA

2.1.1 Fisiopatologia e sintomatologia da doença

A EM é uma doença desmielinizante inflamatória crônica do SNC. Sua

etiologia é desconhecida, contudo, sugere-se que está relacionada a uma interação

entre fatores genéticos e ambientais (WINGERCHUK e CARTER, 2014;

NEGREIROS et al., 2015).

É caracterizada pela presença de lesões desmielinizantes focais nas

substâncias branca e cinzenta do SNC, denominadas placas, circundadas por tecido

sadio. Há destruição de oligodendrócitos e os axônios são, em grande parte,

preservados. As lesões atingem o córtex cerebral, medula espinhal e nervos ópticos.

Há inflamação nas placas e áreas a seu redor em todas as fases da doença, com

envolvimento de linfócitos T, linfócitos B e células plasmáticas (CREE, 2010;

LASSMANN, 2018).

A interação entre processos inflamatórios e neurodegenerativos gera

incapacidade progressivamente (SAWCER et al., 2011). As manifestações iniciais

da doença podem ser agudas ou insidiosas, além de variar em gravidade (CREE,

2010). Os pacientes apresentam, mais comumente, distúrbios motores, distúrbios

sensitivos e fadiga (KÁTIA NOGUEIRA et al., 2010); podendo haver também ataxia,

fraqueza, perda visual, diplopia, vertigem e disfunção esfincteriana (CREE, 2010).

Também está associada a transtornos mentais, como depressão e ansiedade

(FASSBENDER et al., 1998); transtorno bipolar, síndrome pseudobulbar e

disfunções cognitivas (FEINSTEIN, 2006).

Tipicamente, acomete indivíduos jovens em sua fase mais produtiva, sendo

a principal causa de incapacidade neurológica nesses (CREE, 2010). Acarreta

grandes consequências aos domínios físico e cognitivo dos pacientes e afeta

substancialmente sua qualidade de vida, relacionamentos interpessoais e

empregabilidade, além de ocasionar dependência de prestadores de cuidados de

saúde (WINGERCHUK e CARTER, 2014; MARQUES et al., 2018). A restrição na

capacidade de gerar renda do indivíduo resulta em grandes encargos financeiros ao

paciente, a sua família e ao governo (NACI et al., 2010).

19

2.1.2 Padrões clínicos e diagnóstico

A doença é classificada de acordo com suas manifestações clínicas e

progressão.

A EM remitente-recorrente (EMRR) é caracterizada por início súbito de

sintomas neurológicos secundários à formação de placas desmielinizantes. Os

surtos duram, usualmente, dias ou semanas, havendo recuperação funcional

gradual com a resolução da inflamação, período denominado de remissão. Pode

haver recuperação neurológica total ou permanência de déficits. A frequência com

que os surtos ocorrem é de, em média, um a cada dois anos. Aproximadamente

85% dos pacientes apresenta esse curso clínico, ao menos inicialmente (CREE,

2010).

Em 10 anos, aproximadamente 60 a 85% dos pacientes com EMRR evolui

para a forma secundária progressiva (EMSP) da doença, com o desenvolvimento de

déficits neurológicos permanentes. Ainda podem ocorrer surtos; esses, no entanto,

geralmente diminuem em frequência e a maioria dos pacientes deixa de apresentá-

los, sofrendo, então, agravamento contínuo (CONFAVREUX et al., 2000). Em alguns

casos, os pacientes atingem um platô com deficiências moderadas a graves (CREE,

2010).

Em aproximadamente 10% dos casos, os pacientes apresentam progressão

contínua do grau de incapacidade desde o início da doença, podendo haver platôs e

leves melhoras do quadro, mas sem recidivas distintas, caracterizando a EM

primária progressiva (EMPP) (VUKUSIC e CONFAVREUX, 2003). A idade média de

início dos sintomas é de 40 anos e os pacientes desenvolvem déficits mais

rapidamente do que na EMRR, apesar de a velocidade de progressão da doença ser

próxima à da EMSP (CREE, 2010).

Na EM primária recidivante, há progressão contínua do grau de

incapacidade desde o início da doença, com recidivas sobrepostas e progressão

contínua entre as recidivas (VUKUSIC e CONFAVREUX, 2003).

A Síndrome Clinicamente Isolada corresponde ao primeiro evento

desmielinizante sugestivo em EM. Alguns pacientes poderão apresentar novos

surtos e desenvolver a EMRR, enquanto outros não apresentarão novas evidências

de doença desmielinizante (MILLER et al., 2005).

20

A forma pseudotumoral é uma apresentação rara da doença, de prevalência

estimada de 1-2 a cada 1000 casos de EM (MEDEIROS et al., 2014). À ressonância

magnética, há presença de lesão única com mais de 2 cm de diâmetro, de aspecto

similar ao de tumores cerebrais. Geralmente apresenta início súbito e rápida

progressão. Cefaleia persistente é um sintoma frequente (COMI, 2004).

O diagnóstico da EM geralmente é feito com base nos critérios de

McDonald, revisados em 2017, considerando o número de surtos, número de lesões

em ressonância magnética e exame do líquor (THOMPSON et al., 2018).

2.1.3 Epidemiologia

De acordo com a Multiple Sclerosis International Federation (2013), a

prevalência média global de EM é de 33/100.000 habitantes e estima-se que há 2,3

milhões de portadores da doença no mundo. No Brasil, a prevalência média é de 11

a 16 casos/100.000 habitantes. A proporção global mulher/homem é de 2:1, em

média; no Brasil, aproxima-se de 2,45 a 2,65 mulheres para cada homem. A idade

média de início dos sintomas é de 30 anos. Há grande variação em ambas a

prevalência e a incidência da EM nas regiões do mundo, confirmando a já bem

estabelecida distribuição geográfica da doença, sendo mais frequente em regiões de

maior latitude em ambos os hemisférios.

2.1.4 Distribuição geográfica, radiação ultravioleta B e esclerose múltipla

Diversos estudos corroboram a associação entre prevalência de EM e

latitude, sendo que há maior incidência e prevalência da doença com o aumento da

latitude em ambos os hemisférios norte e sul (KURTZKE, 1977; MUNGER et al.,

2004; MUNGER et al., 2006; SIMPSON et al., 2011; BRUM et al., 2014). Pesquisas

sobre variáveis como fatores étnicos e genéticos, migração (MARRIE, 2004;

VANAMERONGEN et al., 2004; SAWCER et al., 2011) e dieta (MUNGER et al.,

2004; KOCH-HENRIKSEN e SØRENSEN, 2010) procuram explicar tal distribuição

geográfica.

Latitude e estação afetam a quantidade de radiação solar que atinge a

superfície terrestre. Acheson (1960) demonstrou haver correlação negativa entre a

prevalência de EM e a média anual de horas de sol e a radiação solar diária média

21

de dezembro, sugerindo que a exposição solar e o consequente aumento do nível

de vitamina D é um fator protetor sobre o risco de desenvolvimento de EM. Em áreas

de alta latitude, no inverno, a maior parte da radiação UV-B é absorvida pela

ozonosfera e, visto ser essa a principal fonte de vitamina D, é impossibilitada a

produção suficiente dessa vitamina, tornando a hipovitaminose D sazonal comum

nesses locais (WEBB et al., 1988).

2.2 VITAMINA D

2.2.1 Fontes e metabolismo da vitamina D

O termo “vitamina D” se refere a um grupo de moléculas secosteroides

derivadas do 7-deidrocolesterol (7-DHC). Nos seres humanos, suas fontes são

ingestão alimentar e síntese endógena, a qual depende da exposição à luz solar. Da

dieta, responsável por prover de 10 a 20% da vitamina necessária ao corpo, pode-se

obter a vitamina D2, ou ergosterol, de origem vegetal, presente em fungos

comestíveis; e a vitamina D3, ou colecalciferol, de origem animal, presente em

peixes gordurosos; sendo ambas precursoras da vitamina D. Na síntese endógena

da vitamina, a radiação UV-B (comprimento de onda entre 290 e 315 nm), ao

penetrar na pele, promove a fotólise do 7-DHC em pré-vitamina D3. A pré-vitamina

D3, por sua vez, sofre uma isomerização induzida por calor e é convertida em

vitamina D3. As vitaminas D2 e D3, transportadas pela proteína ligadora de vitamina

D (DBP), sofrem hidroxilação no fígado, sob ação da enzima CYP2R1, originando o

metabólito 25(OH)D ou calcidiol, forma circulante da vitamina em maior quantidade.

A 25(OH)D sofre hidroxilação nos rins, sob ação da enzima 1-α-hidroxilase,

transformando-se em 1,25-diidroxivitamina D (1,25(OH)2D3), ou calcitriol, forma

metabolicamente ativa da vitamina (HOLICK, 2007; CASTRO, 2011; WACKER e

HOLICK, 2013).

A atividade da 1-α-hidroxilase é regulada pelos níveis plasmáticos de

paratormônio (PTH), fosfato (PEDROSA e CASTRO, 2005), cálcio e dos metabólitos

da 1,25(OH)2D3 (MARQUES et al., 2010).

Há, também, a hidroxilação extrarrenal da vitamina D. Exerce funções

autócrinas e parácrinas em diversos tecidos. Essa via é regulada principalmente por

fatores locais específicos, como a produção de citocinas e de fatores de

22

crescimento; níveis de 25(OH)D; interferon gama e interleucina 1. É mais sensível à

deficiência de vitamina D (MARQUES et al., 2010; CASTRO, 2011).

A sequência de eventos envolvidos na síntese da 1,25(OH)2D3 está

representada na figura 1.

Figura 1 – Representação esquemática da sequência de eventos envolvidos na síntese da 1,25(OH)2D

Fonte: Pedrosa e Castro (2005)

23

2.2.2 Atuação da vitamina D

Os efeitos biológicos da 1,25(OH)2D3 são mediados pela ligação ao seu

receptor VDR, expresso em diversos tecidos, como ossos, pele, intestino, rins,

cérebro, olhos, coração, células β pancreáticas, células do sistema imunológico,

músculos, tecido adiposo, tireoide, paratireoide e adrenais (BAEKE et al., 2010).

A vitamina D atua, principalmente, no metabolismo do cálcio e, por

conseguinte, na mineralização óssea. Promove aumento da absorção intestinal de

cálcio; mobilização do cálcio ósseo, em conjunto com o PTH; e aumento da

reabsorção renal de cálcio no túbulo distal (MARQUES et al., 2010). Além disso,

controla, direta ou indiretamente, mais de 200 genes, alguns deles responsáveis

pela regulação da proliferação e diferenciação celular, apoptose e angiogênese

(HOLICK, 2007).

A vitamina D também tem importante papel na imunomodulação. Os

receptores VDR são expressos por quase todas as células imunes, como linfócitos

TCD4 e TCD8, linfócitos B, neutrófilos, monócitos, macrófagos e células dendríticas.

De maneira geral, sua ação ocasiona aumento da imunidade inata e modulação da

imunidade adquirida. (BAEKE et al., 2010; MARQUES et al., 2010). Diversos

estudos correlacionam a deficiência de vitamina D à maior prevalência de doenças

autoimunes, como doença inflamatória intestinal, artrite reumatoide, lúpus

eritematoso sistêmico, diabetes tipo 1 e esclerose múltipla (HOLICK, 2007; BAEKE

et al., 2010; CANTORNA, 2010; MARQUES et al., 2010).

2.2.3 Avaliação da vitamina D sérica

A avaliação da reserva de vitamina D de um indivíduo é realizada pela

mensuração da concentração de 25(OH)D sérica, forma circulante da vitamina em

maior quantidade. Embora a 1,25(OH)2D3 seja o metabólito ativo, sua concentração

é 1.000 vezes menor do que a de 25(OH)D, e sua meia vida é de 4 a 6 horas, já a

da 25(OH)D, 2 a 3 semanas. Além disso, em casos de hipovitaminose D e queda do

nível sérico de 25(OH)D, há aumento na síntese de PTH, o qual estimula a produção

de 1,25(OH)2D3. Assim, os níveis de 1,25(OH)2D3 se mantêm normais ou até

elevados quando há deficiência de vitamina D (MARQUES et al., 2010; CASTRO,

2011).

24

Ferreira et al (2018), no Posicionamento Oficial da Sociedade Brasileira de

Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e da Sociedade Brasileira de

Endocrinologia e Metabologia (SBEM), definem os valores de referência da 25(OH)D

de acordo com a faixa etária e presença ou não de doenças crônicas (Quadro 1).

Quadro 1 - Intervalos de referência da 25-hidroxivitamina D para a população de acordo com idade e características clínicas individuais

Valor recomendado Grupo

Acima de 20 ng/mL População saudável (até 60 anos)

Entre 30 e 60 ng/mL Grupos de risco: idosos; indivíduos com

fraturas ou quedas recorrentes,

osteoporose (primária e secundária),

doenças osteometabólicas, doença renal

crônica, síndromes de má-absorção,

neoplasias malignas, sarcopenia,

diabetes; gestantes; lactantes; uso de

medicações que possam interferir com a

formação e degradação da vitamina D

Acima de 100 ng/mL Risco de toxicidade e hipercalcemia

Fonte: Adaptado de Ferreira et al (2018, p. 7)

2.3 VITAMINA D NA ESCLEROSE MÚLTIPLA

2.3.1 Radiação ultravioleta B e distribuição geográfica da doença

Com o aumento da latitude e mudança de angulação terrestre durante as

estações, a quantidade e qualidade de radiação UV-B, essencial à síntese vitamina

D, que atinge a superfície terrestre é reduzida. Em altas latitudes (42º), isso é

suficiente para impedir completamente a produção de vitamina D3 durante o inverno

(WEBB et al., 1988). Assim, a hipovitaminose D foi elencada como possível fator

ambiental relacionado à maior prevalência de EM em áreas de maior latitude

(ACHESON et al., 1960; HAYES, 2000; MUNGER et al., 2006; SLOKA et al., 2008)

25

2.3.2 Encefalomielite Autoimune Experimental (EAE) e suplementação terapêutica

A EAE é um modelo animal de inflamação do sistema nervoso central. Nele,

a micróglia realiza um ataque imunomediado aos oligodendrócitos responsáveis por

produzir proteína básica de mielina e outras proteínas do SNC, ocasionando

desmielinização e simulando a EM. Experimentos com indução de EAE evidenciam

que a suplementação de vitamina D previne o desenvolvimento da doença e,

similarmente, que a deficiência de vitamina D acelera o início da doença

(CANTORNA et al., 1996; MUNGER et al., 2004; MOWRY, 2011). A administração

de 1,25(OH2)D3 após o estabelecimento da EAE demonstrou redução na velocidade

de progressão da doença (NATAF et al., 1996). A vitamina também favorece a

recuperação dos animais e reduz a inflamação meníngea e da substância branca

(MOWRY, 2011).

Mulheres que realizaram suplementação de vitamina D, principalmente na

forma de multivitamínicos, apresentaram risco de desenvolvimento de EM 40%

menor do que o de mulheres que não utilizaram suplementos (MUNGER et al.,

2004). Níveis séricos elevados de vitamina D reduzem o risco de desenvolvimento

de EM (MUNGER et al., 2006) e o risco de recorrência de surtos de EM (SIMPSON

JR et al., 2010).

26

3 MATERIAL E MÉTODOS

3.1 DELINEAMENTO

Realizou-se um estudo transversal retrospectivo observacional, por meio de

revisão de prontuários eletrônicos de pacientes com diagnóstico de EM.

3.2 LOCAL DO ESTUDO

Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, localizado em Curitiba, Paraná.

3.3 PERÍODO DO ESTUDO

A análise retrospectiva foi realizada de agosto de 2019 a fevereiro de 2020

em prontuários de pacientes internados no período de janeiro de 2014 a fevereiro de

2020.

3.4 VARIÁVEIS

Foram analisadas as seguintes variáveis: sexo, idade, nível sérico de

25(OH)D, idade de início dos sintomas da doença, tempo de atividade da doença e

padrão clínico.

3.5 CLASSIFICAÇÃO

Foram utilizados os intervalos de referência da 25(OH)D descritos no

Posicionamento Oficial da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina

Laboratorial (SBPC/ML) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia

(SBEM) de 2018 para classificar os níveis de vitamina D dos pacientes em abaixo do

recomendado (hipovitaminose D), dentro do recomendado (ideal) e acima do

recomendado.

3.6 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO

27

Pacientes atendidos no Hospital Evangélico Mackenzie, no período

determinado para a análise, com diagnóstico de EM de acordo com a revisão de

2017 dos critérios de McDonald, com registro do nível de 25(OH)D em prontuário e

de valor inferior a 100 ng/mL.

3.7 CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO

Ausência de registro nível sérico de 25(OH)D em prontuário; nível de

25(OH)D superior a 100 ng/mL; dos pacientes realizaram a mensuração da 25(OH)D

duas ou mais vezes, foram excluídas as menores concentrações dessa.

3.8 ANÁLISE ESTATÍSTICA

Os dados obtidos foram tabulados em planilha do Microsoft Excel® e

submetidos a análise estatística adequada. Variáveis quantitativas foram

representadas pela média (desvio padrão) e comparadas entre grupos utilizando o

teste t de Student. Variáveis qualitativas foram representadas pelas frequências

absolutas e relativas, e comparadas utilizando o teste exato de Fisher. Para as

comparações, foi considerado sempre o nível de 5% de significância.

3.9 ASPECTOS ÉTICOS

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade

Evangélica Mackenzie do Paraná (CEP/FEMPAR), sob o número de parecer

3.713.719 (Anexo 1).

28

4 RESULTADOS

No hospital em que foi realizado o estudo, havia o registro de 141 pacientes

com o diagnóstico de EM. Desses, 114 foram excluídos da pesquisa devido a falta

de dados em prontuário. A amostra final consiste em 27 pacientes que possuíam

registro da mensuração do nível sérico de 25(OH)D.

Os valores mínimos e máximos da concentração sérica de 25(OH)D dos

pacientes foram, respectivamente, 10,8 ng/mL e 40 ng/mL (Tabela 1), com

concentração média de 25,6 ng/mL.

Tabela 1 – Características do nível sérico de 25-hidroxivitamina D da amostra

25(OH)D (ng/mL)

Extremos de concentração 10,8 – 48

Concentração média 25,6

Fonte: O autor.

A maioria dos pacientes (74%) apresentou concentração de 25(OH)D abaixo

do valor recomendado, enquanto 25,9% apresentaram níveis ideais. Não houve

pacientes com nível de 25(OH)D acima do valor recomendado (Tabela 2). Assim, a

amostra foi dividida em dois grupos: um, cujo valor sérico de 25(OH)D era ideal, e

outro, cujos pacientes apresentavam hipovitaminose D.

Tabela 2 – Classificação da amostra de acordo com o nível sérico de 25-hidroxivitamina D

25(OH)D N

Hipovitaminose 20 (74%)

Dentro do recomendado 7 (25,9%)

Acima do recomendado 0 (0%)

Total 27 (100%)

Fonte: O autor.

Os pacientes foram descritos e comparados de acordo com sexo, idade,

nível sérico de 25(OH)D, idade de início dos sintomas da EM, tempo de atividade da

doença e seu padrão clínico (Tabela 3).

29

Tabela 3 – Relação entre nível sérico de 25-hidroxivitamina D e demais variáveis

Variável N 25(OH)D p

Hipovitaminose Dentro do

recomendado

Sexo

Feminino 19 13 (65%) 6 (85,7%) 0,63

Masculino 8 7 (35%) 1 (14,3%)

Idade 41,7 (14,2) 41,6 (15,1) 42,3 (12,3) 0,89

25(OH)D

(ng/mL)

25,6 (8,23) 22,1 (5,7) 35,5 (6) < 0,001

Idade de início

dos sintomas

34,4 (10,7) 33,9 (11,8) 36,1 (7,1) 0,54

Tempo de

atividade da EM

(anos)

Menos de 1 7 4 (20%) 3 (42,9%)

0,78 Entre 1 e 5 7 6 (30%) 1 (14,3%)

Entre 6 e 10 6 5 (25%) 1 (14,3%)

Mais de 10 7 5 (25%) 2 (28,6%)

Padrão clínico

EMRR 21 18 (90%) 3 (42,9%)

0,02 Pseudotumoral 1 0 1 (14,3%)

Não

classificado

5 2 (10%) 3 (42,9%)

EMRR, esclerose múltipla remitente-recorrente.

Fonte: O autor.

A diferença de concentração da 25(OH)D entre os dois grupos de pacientes

foi significativa. Pacientes com nível ideal de vitamina D tiveram concentração média

de 25(OH)D sérica de 35,5 ng/mL, enquanto pacientes com hipovitaminose D

apresentaram concentração média de 22,1 ng/mL (Gráfico 1).

30

Gráfico 1 – Classificação do nível de vitamina D de acordo com a concentração sérica de 25-hidroxivitamina D (ng/mL)

Fonte: O autor.

Também foi significativa a diferença entre as proporções de cada padrão

clínico entre os dois grupos. Entre os pacientes com hipovitaminose D, 90%

apresentavam o padrão remitente-recorrente, enquanto entre os pacientes com nível

ideal a proporção foi de apenas 42,9% (Gráfico 2).

As demais comparações não foram significativas.

31

Gráfico 2 – Relação entre nível sérico de vitamina D e padrão clínico da doença

Fonte: O autor.

32

5 DISCUSSÃO

Nesse estudo, constatou-se que 74% dos pacientes com EM apresentavam

hipovitaminose D (concentração sérica de 25(OH)D < 30 ng/mL), proporção

consideravelmente maior do que a verificada em um trabalho australiano, de 50,7%

dos pacientes (VAN DER MEI et al., 2007). Já um estudo envolvendo pacientes de

três centros de referência brasileiros para o tratamento da EM, localizados em Porto

Alegre, São Paulo e Belo Horizonte, registrou hipovitaminose D em 64,2% dos

pacientes no verão e 82,5% no inverno (BECKER et al., 2016). Deve-se notar que a

sazonalidade não foi um fator analisado em nosso estudo.

A concentração média de 25(OH)D sérica encontrada nesse estudo foi 25,6

ng/mL, similar à de outros trabalhos acerca do tema. A pesquisa previamente citada

de Becker et al. (2016) verificou que os pacientes apresentavam concentração

média de 25(OH)D de 29,96 ng/mL no verão e 23,24 ng/mL no inverno. Em outra

investigação, a concentração média de 25(OH)D foi de 27,68 ng/mL (originalmente,

69,1 nmol/L) (BARNES et al., 2007). Além desses, diversos outros estudos também

demonstraram tal deficiência vitamínica (SOILU-HÄNNINEN et al., 2005; VAN DER

MEI et al., 2007; NEAU et al., 2010); contudo, deve-se esclarecer que alguns desses

classificam como hipovitaminose D valores inferiores a 20 ng/mL e, assim,

descreveram concentrações séricas de 25(OH)D entre 21 e 30 ng/mL como normais.

Constatou-se que o nível de vitamina D varia de acordo com o padrão clínico

da EM. Dentre os pacientes com hipovitaminose D, 90% (18/20) apresentavam

EMRR; os demais não foram classificados segundo a apresentação clínica. Diversos

trabalhos também encontraram baixos níveis de vitamina D em pacientes com

EMRR (SOILU-HÄNNINEN et al., 2005; KRAGT et al., 2008; SMOLDERS et al.,

2008; MOWRY, 2011). Contudo, tal observação diverge dos resultados

apresentados por Neau et al. (2010), nos quais se constatou haver maior

predominância de hipovitaminose D em pacientes com as formas primária

progressiva e secundária progressiva. Essa diferença se deve ao fato de que, em

nosso estudo, não houve pacientes com tais apresentações da doença.

Assim como no estudo de Becker et al. (2016), esse trabalho não

demonstrou correlação entre níveis séricos de vitamina D e sexo, idade e tempo de

atividade da doença. Ademais, nosso estudo não evidenciou associação entre níveis

séricos de vitamina D e idade de início dos sintomas da EM.

33

As várias limitações desse estudo devem ser enfatizadas. É um estudo

retrospectivo e a amostra foi selecionada por conveniência, restringindo a pesquisa

aos pacientes atendidos em um hospital, podendo, assim, reduzir sua validade. Em

segundo lugar, o tamanho da amostra (N=27) foi pequeno, devido, em grande parte,

à ausência de dados em prontuário. Por fim, não é esclarecido se os baixos níveis

de vitamina D precedem o desenvolvimento da EM ou se são consequentes às

limitações físicas dos pacientes. Contudo, o objetivo do estudo se limitou a

estabelecer a prevalência de hipovitaminose D nos pacientes com EM atendidos

nesse hospital no período em estudo.

34

6 CONCLUSÃO

Verifica-se haver, de fato, alta prevalência de hipovitaminose D em pacientes

com EM atendidos no Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, e que tal

deficiência vitamínica ocorre mais pronunciadamente em portadores de EMRR.

Evidencia-se, assim, a importância da realização do exame de mensuração da

concentração sérica de 25(OH)D em todos os pacientes com EM e de ser

considerada a suplementação de vitamina D individualmente.

35

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ANEXOS

ANEXO 1 – PARECER CONSUBSTANCIADO DO COMITÊ DE ÉTICA EM

PESQUISA DA INSTITUIÇÃO PROPONENTE

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