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Projecto Hidroagrícola do Baixo Mondego Designação e Localização Situada na região da Beira Litoral, o Vale do Baixo Mondego corresponde a uma extensa planície de origem aluvial, que globalmente perfaz cerca de 14.000 hectares, situada entre as cidades de Coimbra e da Figueira da Foz. É constituído por uma faixa que se desenvolve ao longo do rio Mondego — o Vale Principal — e por algumas ramificações laterais, que constituem os seus afluentes — os Vales Secundários — casos dos rios Cernache, Ega, Arunca e Pranto, na margem esquerda, e Ançã e Foja na margem direita. Administrativamente está disperso por cinco municípios do distrito de Coimbra: Montemor-o-Velho, Figueira da Foz, Coimbra, Soure e Condeixa-a- Nova. A distribuição da superfície abrangida é a seguinte : Vale Principal 59,7% zonas de montante e intermédia 51,1% zona de jusante 8,6% Vales Secundários 40,3% Ançã/S. Facundo (margem direita) 1,4% Cernache/Arzila (margem esquerda) 2,2% Ega (margem esquerda) 4,3% Arunca (margem esquerda) 11,0% 1

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Projecto Hidroagrícola do Baixo Mondego

Designação e Localização

Situada na região da Beira Litoral, o Vale do Baixo Mondego corresponde a uma

extensa planície de origem aluvial, que globalmente perfaz cerca de 14.000

hectares, situada entre as cidades de Coimbra e da Figueira da Foz.

É constituído por uma faixa que se desenvolve ao longo do rio Mondego — o Vale

Principal — e por algumas ramificações laterais, que constituem os seus

afluentes — os Vales Secundários — casos dos rios Cernache, Ega, Arunca e

Pranto, na margem esquerda, e Ançã e Foja na margem direita.

Administrativamente está disperso por cinco municípios do distrito de Coimbra:

Montemor-o-Velho, Figueira da Foz, Coimbra, Soure e Condeixa-a-Nova.

A distribuição da superfície abrangida é a seguinte:

Vale Principal 59,7%

zonas de montante e intermédia 51,1%

zona de jusante 8,6%

Vales Secundários 40,3%

Ançã/S. Facundo (margem direita) 1,4%

Cernache/Arzila (margem esquerda) 2,2%

Ega (margem esquerda) 4,3%

Arunca (margem esquerda) 11,0%

Foja (margem direita) 6,1%

Pranto (margem esquerda) 15,3%

 Objectivos

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Apesar de dotado de um elevado potencial produtivo agrícola, todo o Aproveitamento do Baixo Mondego e em especial o Vale Principal, deparava-se com factores de estrangulamento, dos quais merecem relevância especial:

Ø   cheias violentas e frequentes, sujeitando o vale a inundações prolongadas e

a um processo de em assoreamento continuado.

Ø   acentuada variabilidade sazonal e anual de caudais.

Ø elevadas taxas de deposição de material sólido de arrastamento, atingindo

valores médios de cerca de 20 mm/ano.

Ø   rede de drenagem agrícola bastante incipiente e muito pouco funcional, rede de rega insuficiente e degradada, rede viária quase inexistente, dificultando o acesso às explorações agrícolas.

Ø estrutura fundiária desordenada e dispersa, com inúmeros prédios, de

grandes diferenciações de tamanho e forma.

As obras primárias que incidiram no

Aproveitamento Hidráulico tiveram como

objectivos essenciais, entre outros, o

controlo dos caudais sólidos e líquidos do

rio e seus afluentes, a defesa contra as

cheias, a condução de água de rega

derivada a partir de um açude no Mondego,

junto a Coimbra.

Após uma primeira fase de estudos de base — cartográficos, pedológicos,

agronómicos, económicos, hidrológicos e hidráulicos — procedeu-se à definição dos

Blocos Hidroagrícolas, a qual permitiu sistematizar a intervenção da equipa do

Projecto.

Pretende-se equipar cada um destes blocos com redes secundárias de rega, de

drenagem e de caminhos, devidamente adaptadas a um novo ordenamento da

propriedade rústica, através de operações de emparcelamento rural.

Descrição e Divisão em Blocos

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Quadro 1 – Vale do Mondego — Divisão em Blocos

Vale

Principal

Zona de

Montante

Margem Direita

Bloco nº 18 — Bolão 340 ha

Bloco nº 17 — S. Martinho e S. João 696 ha

Bloco nº 15 — S. Silvestre e S. Martinho 726 ha

de Árvore 700 ha

Bloco nº 14 — Tentúgal 593 ha

Bloco nº 13a — Meãs do Campo 722 ha

Bloco nº 13 — Carapinheira 515 ha

Bloco nº 10 — Alfarelos  

Margem

Esquerda

Bloco nº 16 — Margem Esquerda Vale

Central571 ha

Zona

Intermédi

a

Margem Direita

Bloco nº 8 — Montemor e Ereira 868 ha

Bloco nº 6 — Maiorca 460 ha

Zona de

Jusante

Margem Direita Bloco nº 3 — Quada/Lares 380 ha

Margem

EsquerdaBloco nº 4 — Moinho do Almoxarife 344 ha

Sub-Total     7.262 ha

Vales

Secundário

s

Zona de

Montante

Margem Direita Bloco nº 17a — Ançã/ S. Facundo 173 ha

Margem

EsquerdaBloco nº 12 — Ega e Arzila 720 ha

Zona

Central

Margem Direita Bloco nº 7 — Foja 767 ha

Margem

EsquerdaBloco nº 11 — Arunca 1.384 ha

Zona de

Jusante

Margem

Esquerda

Bloco nº 2 — Pranto (jusante) 1.282 ha

Bloco nº 5 — Pranto (montante) 782 ha

Sub-Total     5.108 ha

Total  12.370 ha

Como se observa no Quadro 1, o vale do Baixo Mondego abrange uma S.A.U. de 12.370

ha, em que o Vale Principal ocupa 7.262 ha (58,7%), enquanto os Vales Secundários

englobam 5.108 ha (41,3%). Nesta área existem cerca de 6.500 explorações agrícolas,

a que correspondem cerca de35 mil prédios.

O arroz continua a ser o cultivo predominante, ocupando 50 a 60% da S.A.U., com

maior implantação nas zonas intermédia e jusante do Vale Principal e nos Vales

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Secundários de Ançã/S. Facundo, Arunca, Foja e Pranto. A área restante é

essencialmente ocupada pela cultura do milho-grão, já que outros cultivos, como as

horto-industriais e a beterraba sacarina, apresentam ainda um peso bastante restrito.

Infra-estruturas

O critério geral que presidiu ao traçado das redes

secundárias foi o de conduzir água de rega à cabeceira

de cada parcela, o de assegurar a drenagem agrícola a

todos os prédios e o de facultar fácil acesso para a

maquinaria agrícola a cada um dos diferentes prédios.

Uma vez que o minifúndio é largamente dominante, as

redes secundárias já construídas e a construir

apresentam em geral uma malha bastante densa, além

de estarem adaptadas às exigências da cultura do

arroz. As redes secundárias, são no seu conjunto as

seguintes:

A – Rede Secundária de Rega

É essencialmente constituída por tubagem enterrada — as regadeiras —

ligando a infra-estrutura primária às caixas de rega localizadas em cada

parcela.

As tomadas ou caixas de rega são estruturas de betão, de secção

circular, fechadas e munidas de um tubo ventilador e a que se acoplam

2 válvulas de tanque, as quais conjuntamente debitam o caudal de

maneio preconizado — 30l/s.

O objectivo de uma regadeira é o de distribuir água às parcelas de rega

com eficiência. Para isso, o seu traçado deve-se articular perfeitamente

com a matriz fundiária resultante do emparcelamento.

O traçado da rede secundária de rega depende das características

agrícolas e estruturais de cada bloco, como sejam:

a) a parcela de rega

Para que esta parcela se apresente homogénea e consistente, torna-se

fundamental reestruturar a propriedade rústica, por via do emparcelamento

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rural. Esta parcela de rega, nesta zona de minifúndio, é usualmente composta

por mais de 1 lote/prédio. Como forma de proporcionar aos regantes uma certa

autonomia, foi adoptado o critério de as parcelas não incluírem mais de 5

prédios, nem apresentar uma área superior a 2,5 ha.

A colocação das tomadas ou caixas de rega é feita essencialmente na parte

superior-central de cada parcela, junto ao caminho que a delimita, permitindo

assim um fácil acesso à água e às operações de manutenção e fiscalização.

b) os sistemas culturais predominantes

As culturas do arroz e do milho ocupam mais de 90% da S.A.U. do Vale. Mas o

cultivo do arroz — mais exigente em termos de necessidades hídricas — continua

a ser preponderante, mesmo em algumas áreas mais a montante. Este facto

levou a adoptar para todo o Vale uma rede secundária adaptada à cultura

orizícola, possibilitando a sua viabilização sem quaisquer restrições.

c) os métodos de rega

Pela mesma razão de dominância da cultura do arroz, a rega de

superfície é a que melhor se adequa às condições do Vale. O arroz

utiliza o processo de rega de submersão ou alagamento, enquanto para

as outras culturas o processo é o dos sulcos ou faixas.

Para garantir os mais elevados índices de eficiência das operações

culturais, sobretudo a rega, todos os novos lotes resultantes da

reestruturação fundiária são sujeitos a operações de regularização e

nivelamento das suas terras.

d) o módulo de rega

O caudal de maneio a disponibilizar por cada caixa de rega procura

traduzir de algum modo as características das práticas de rega já

existentes, tendo sido adoptado o valor de 30 l/s.

B – Rede de Drenagem

Formada por um conjunto de valas a céu aberto, não revestidas, de

secção trapezoidal. Visam a evacuação das águas em excesso e o

controlo limitado dos níveis freáticos.

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O dimensionamento desta rede foi definido de acordo com os seguintes

critérios de drenagem: o escoamento de um caudal udométrico de 2,5

litros/segundo/ha e a manutenção de um plano de água com uma

profundidade mínima de 0,60 metros.

Para cada Bloco Hidroagrícola, o traçado desta rede assume um papel

estruturante, pois permite definir o seu delineamento geométrico, onde

se irão inserir as outras redes — a de caminhos e a de rega.

C – Rede Viária

A concepção da rede viária assentou

num duplo objectivo:

- possibilitar o acesso a todos os

prédios ou parcelas, em cada Bloco

(caminhos agrícolas ou secundários);

- fazer a ligação deste tipo de caminhos com os núcleos populacionais

confinantes (caminhos rurais ou principais).

A implantação procurou ligar as povoações onde se radicam os centros

de lavoura com as explorações agrícolas, qualificando e quantificando o

tráfego, adequando distâncias médias de transporte e racionalizando

os trabalhos da maquinaria agrícola.

O emparcelamento rural.

A componente da reestruturação

fundiária tem sido sentida por parte

dos agricultores, como a medida de

maior impacto no reforço das

vertentes técnico-agrícola esócio-

económica.

É que, perante a estrutura fundiária

original, assente numa malha predial profundamente fragmentada,

dispersa e irregular e em consequência muito pouco funcional, a outorga

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de novos prédios (lotes) submetidos a uma radical e profunda alteração

geométrica e física, inteiramente remodelados e corrigidos nas suas

assimetrias, converte-se numa ampla acção de ordenamento sustentado

do espaço agrícola, potenciando a dinamização económica de toda a zona.

Os traçados das redes de caminhos e de drenagem constituem uma malha

de unidades estrutural-fundiárias, com uma forma mais ou menos

rectangular, e em cujo interior se traçam os novos lotes de prédios

emparcelados. Tais unidades são por isso designadas por massas de

repartição.

As operações de emparcelamento são morosas, uma vez que, por força da

Lei estão subordinadas a um conjunto de preceitos faseados, que

envolvem sempre a participação interessada de centenas de

proprietários, o que obriga a um integral e perfeito conhecimento das

situações reais de campo e a um elevado grau de cooperação e consenso,

para se conseguir obter uma aprovação maioritária. Há assim um

conjunto de fases dos respectivos estudos e projectos, que vão sendo

submetidas à apreciação e consideração global dos interessados, até

atingirem o seu patamar último, a aprovação pela maioria dos

proprietários do bloco. Uma dificuldade adicional decorre do facto de a

forma de exploração predominante ser o arrendamento rural. A

abordagem da questão do emparcelamento foi pois feita no contexto dos

Blocos Hidroagrícolas. Conseguiu-se desta forma obter a flexibilidade

necessária a uma melhor identificação dos proprietários e das terras

abrangidas, à aplicação das medidas técnico-jurídicas a que ficam sujeitos

os titulares dos novos prédios e ainda à salvaguarda dos interesses do

agricultor-rendeiro. Muito sucintamente, a faseamento das operações de

emparcelamento é o seguinte:

1º. - Fixação das bases do projecto, com a delimitação do Perímetro, a

determinação da situação jurídica dos prédios, a classificação e

avaliação dos terrenos e benfeitorias, as condições de atribuição da

reserva de terras, etc.

2º. - Traçados dos novos lotes.

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3º. - Entrega dos novos prédios resultantes do plano de recomposição

predial, a todos os proprietários, com a inerente titulação por auto.

É no Baixo Mondego, designadamente na zona central do seu Vale Principal, que se situa a maior área emparcelada do País, cujo valor atinge os 4 150 ha, distribuídos pelos seguintes Blocos:

· Bloco de S. Martinho & S. João do Campo

Situação antes 696 ha 481 proprietários 1.883 prédios

Situação depois 673 ha 480 proprietários 513 prédios

· Bloco de Tentúgal

Situação antes 700 ha 739 proprietários 2.063 prédios

Situação depois 688 ha 737 proprietários 767 prédios

· Bloco de Meãs do Campo

Situação antes 593 ha 529 proprietários 868 prédios

Situação depois 565 ha 529 proprietários 537 prédios

· Bloco de S.Silvestre e S.Martinho de Árvore

Situação antes 726 ha 597 proprietários 1.590 prédios

Situação depois 699 ha 596 proprietários 734 prédios

· Bloco da Carapinheira

Situação antes 722 ha 625 proprietários 2.152 prédios

Situação depois 687 ha 624 proprietários 684 prédios

· Bloco de Montemor & Ereira

Situação antes 873 ha 409 proprietários 1.565 prédios

Situação depois 838 ha 407 proprietários 446 prédios

Como se verifica, a situação inicial abrangia uma área agrícola de 4.310 ha, ocupada por 10.121

prédios, pertencentes a 3.380 proprietários. Após a realização das operação de emparcelamento em

6 Blocos Hidroagrícolas, obtiveram-se os seguintes resultados da concentração parcelar: uma

superfície agrícola útil de 4.150 ha (uma dedução de 3,7% a fim de implantar as infra-estruturas de

engenharia), ocupada por 3.681 prédios (concentração de 63,6%) pertencentes a 3.373

proprietários.

Os benefícios mais sentidos da reestruturação fundiária no Baixo Mondego

referem-se a:

Ø  aumento da dimensão das explorações agrícolas, quer pela concentração das

diversas parcelas de cada proprietário, quer pela incorporação de terrenos da

reserva de terras.

Ø aumento da produtividade do trabalho, diminuição dos custos de produção,

menores custos de transporte, utilização mais racional dos meios de

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mecanização e mão-de-obra, aplicação mais adequada dos bens de produção

efémeros, menor precaução no capital de reserva, etc.

Ø  resolução de alguns conflitos de ordem social e patrimonial (servidões,

encraves, acesso a águas, estremas).

A complementar esta componente do emparcelamento rural, estão os trabalhos

de adaptação ao regadio, consubstanciados pela preparação, regularização e

nivelamento dos terrenos, o que tem tido um enorme impacto nos rendimentos

dos agricultores. Estes melhoramentos fundiários permitiram a recuperação e

correcção de vastas manchas de solos algo irregulares e mesmo improdutivas.

Verifica-se assim uma articulação perfeita de um conjunto de medidas

diferenciadas — as redes secundárias, as acções de emparcelamento a

preparação, regularização e nivelamento dos terrenos — as quais permitiram

potenciar as capacidades endógenas da região, contribuindo para a

intensificação da produção agrícola. Além disso, suprimiram-se problemas que

embaraçavam o êxito de uma agricultura competitiva, motivando e

responsabilizando os agricultores.

Certamente foram estes factos que vieram a determinar que os estudos de

emparcelamento, que numa primeira fase se circunscreveram aos Blocos

Hidroagrícolas da zona central do Vale Principal, estejam hoje alargados a todo

o Aproveitamento por desejo explícito dos agricultores.

Faseamento

Apesar de os estudos terem tido início em 1979, as obras de rega, drenagem,

caminhos e emparcelamento começaram em 1984. Já foram concluídas as obras

em 8 Blocos Hidroagrícolas, todos no vale principal, totalizando 4.996 ha, cuja

gestão foi já entregue à Associação de Beneficiários da Obra de Fomento

Hidroagrícola do Baixo Mondego:

Bloco nº 17 - S. Martinho & S. João

Bloco nº 15 - S. Silvestre & S. Martinho de Árvore

Bloco nº 14 - Tentúgal

Bloco nº 13a - Meãs do Campo

Bloco nº 13 - Carapinheira

Bloco nº 8 - Montemor & Ereira

Bloco nº 4 - Moinho do Almoxarife

Bloco nº 1 - Quinta do Canal

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Para além do Perímetro de Alfarelos, actualmente em fase de execução das

obras, é objectivo do IDRHa realizar as obras nos Blocos que ainda restam do

Vale Central: Bolão, Maiorca e Margem Esquerda. Ficarão por ultimar os Blocos

referentes aos Vales Secundários, que estão dependentes das infra-estruturas

primárias — regularização do curso de água principal e de drenagem primária —

a cargo do Ministério do Ambiente. Contudo, no âmbito de um protocolo

realizado com a Associação de Beneficiários, estão a realizar-se, desde já, os

projectos de emparcelamento e infra-estruturas dos Campos do Vale do Pranto,

de forma a encurtar os prazos para entrada em fase de obra.

Minimização de Impactes

No âmbito desta temática, foram adoptadas várias medidas de valorização da

paisagem, do património e da conservação da natureza, de forma a realçar e

salvaguardar os seus valores mais relevantes e manter o equilíbrio ecológico e a

qualidade paisagística que melhor se coadunem com as características da

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agricultura diversa que aqui se pratica. Com efeito, a paisagem é principalmente

construída pela actividade agrícola e, como tal, terá que ser coerente com ela.

Na sequência dos Estudos de Impacte Ambiental realizados para os Blocos de

Montemor-Ereira, Alfarelos e Margem Esquerda, foram preconizadas diversas

medidas de conservação e recuperação paisagística. Tais medidas deram origem

a projectos de recuperação da vegetação ribeirinha nas novas valas a construir.

No Bloco de Montemor-Ereira o projecto correspondente foi já implementado,

prevendo-se que o mesmo venha a suceder nos Blocos da Margem Esquerda e

Alfarelos, logo após a realização das obras. Outras medidas relevantes são as

referentes à qualidade das águas, encontrando-se em elaboração um plano de

monitorização da qualidade das águas subterrâneas e superficiais para os

referidos blocos.

Na implementação destas medidas foram envolvidos os agricultores,

representados pela Associação de Beneficiários da Obra de Fomento e as

Comissões de Agricultores Locais (C.A.L.).

Execução Financeira

No cômputo geral destas realizações públicas, foram despendidos, para os 8

Blocos descritos, cerca de 39,5 milhões de euros.

No momento presente, desenvolve-se um conjunto de obras que perfaz um

montante de cerca de 6,27 milhões de euros, em que só no Bloco Hidroagrícola

de Alfarelos se prevê despender 4,421 milhões de euros.

Quanto aos investimentos previstos executar no presente Quadro Comunitário

de Apoio, avaliam-se que atinjam os 33,2 milhões de euros, assim distribuídos:

Bloco da Margem Esquerda 5.552.085 euros

Adutor de Rega da Margem Esquerda 4.703.640 euros

Bloco do Bolão 4.658.170 euros

Bloco de Maiorca 5.770.930 euros

Bacia de Recepção de Maiorca/Foja 1.636.725 euros

Bloco do Pranto (1ª fase) 9.033.095 euros

Edifício-sede da Associação de Beneficiários 1.845.000 euros

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II - Caracterização do Paúl

Linhas de água (hidrografia)

O paúl propriamente dito é uma zona baixa, húmida, com cerca de 165 ha, que se alonga por parte da Ribeira de Cernache, no sentido N-S. Esta ribeira sofreu obras de regularização hidráulica no século passado, tendo sido dividida em dois braços (Vala da Costa, a oeste, e Vala dos Moinhos, a leste), que ladeiam o vale e recebem as escorrências das encostas. Foi aberto um terceiro canal (Vala do Meio), para escoamento da água das exsurgências do plaino aluvial, localmente designadas por «olheiros». As três valas confluem em frente à povoação de Arzila, indo desaguar no rio Mondego, a cerca de 1 km desta povoação. Apesar destas obras de drenagem, o vale manteve sempre características de paúl, não só devido às exsurgências já citadas, mas também ao facto de serem as cotas a montante, 2 a 3 metros mais baixas que a juzante.

As zonas húmidas foram, até não há muito tempo, consideradas como terras inúteis, sendo drenadas ou utilizadas como receptáculo de efluentes urbanos ou industriais. Os progressos verificados com a investigação científica, permitiram estabelecer que as zonas húmidas são as áreas de maior produtividade primária da Terra, estando a sobrevivência de inúmeras espécies dependente da existência deste ecossistema.

As zonas húmidas são igualmente importantes como reguladoras do regime hídrico, mantendo o nível freático, constituindo importantes reservas aquíferas, minorando os efeitos das enchentes e da erosão ou, ainda, em termos de precipitação biológica de impurezas.

Relevo (orografia)

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O paúl insere-se num pequeno vale aberto, com cerca de 6 km de extensão, oscilando a largura entre 300 e 600 metros; é ladeado por duas cadeias de montes, originadas por enrugamentos geológicos.

A altitude é baixa, mantendo as cumeadas uma certa uniformidade, atingindo 89 metros na margem esquerda (v.g. S. Tiago) e 120 metros na margem direita (v.g. Inculca); no paúl as cotas rondam os 6-7 metros, aumentando para juzante.

Os declives são medianamente acentuados, aumentando para norte e atingindo o maior pendente perto de Arzila, na vertente oposta à povoação.

Clima

O clima da RNPA, tendo em conta os registos meteorológicos das estações de Coimbra/Bencanta e Montemor-o-Velho, caracteriza-se como temperado húmido, de Verão seco, correspondendo à sobreposição dos climas Mediterrânico-Atlântico e Atlante-Mediterrânico da Carta Ecológica de Portugal.

Geologia

Em termos litológicos encontram-se na RNPA as seguintes unidades:

1. arenitos e argilas de Taveiro (do Cretáceo Superior);2. terraços aluviais do Plistocénico, constituídos por

cascalheiras ricas em seixos e calhaus;3. aluviões do Holocénico essencialmente argilo-

arenosos.

Flora

A Reserva está situada numa zona de transição florística atlântico-mediterrânica, caracterizada pela presença do carvalho-cerquinho. Assim, tanto se podem encontrar plantas mediterrânicas, como o medronheiro e o sobreiro, como também plantas tipicamente atlânticas como a aveleira e o carvalho alvarinho.

É uma área muito rica, em termos florísticos, evidenciada no seu extenso elenco de espécies, que atinge já cerca de 300 plantas, prevendo-se que venha a ser aumentado com a inclusão de novos taxa, uns cuja existência é provável (plantas aquáticas e anfíbias) e outros, já assinalados mas não identificados seguramente, supondo-

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se que possa vir a atingir um total de cerca de 400 espécies.

Este elevado número de plantas, encontra-se a par com a sua diversidade; pela sua situação geográfica e características climáticas e edáficas, esta área apresenta espécies xerófilas e espécies higrófilas, além de, em termos mais latos, surgir uma interpenetração entre a Região Mediterrânica e a Região Eurosiberiana, com a presença de espécies próprias de cada uma delas.

Encontramos, assim, a ocorrência, um tanto inesperada, da aveleira, feto-real, bonina, e, até, do raro selo-de-Salomão, em locais húmidos e sombrios, enquanto que, nas vertentes mais soalheiras e de menor humidade edáfica, se podem encontrar o rosmaninho, o lentisco-bastardo, o sanguinho-das-sebes, etc.

No que respeita à quantidade e variedade das associações vegetais, a sua riqueza não é menor; existe, nesta área, uma ecotonia entre os domínios climácicos do sobreiro e do carvalho alvarinho, além da presença do carvalho cerquinho — este como acompanhante do primeiro, já que o seu domínio climácico parece situar-se no Maciço Calcário Estremenho.

Sendo de destacar, ainda, a ocorrência das seguintes espécies: medronheiro, salgueiro, amieiro, choupo, caniço, bunho, tabúa, lírio-amarelo, espadana.

Fauna

A RNPA foi criada devido às riquezas faunísticas e florísticas que encerra, com destaque para a lontra e para a grande diversidade do ponto de vista ornitológico.

A existência das diferentes comunidades faunísticas, bem como dos seus efectivos populacionais, não apresentam de forma alguma valores estáticos. Pelo contrário, são indicadores da evolução de um ecossistema naturalmente frágil.

Insectos

Na Reserva, encontram-se referenciadas 9 ordens de insectos, abrangendo 61 famílias num total de 171 espécies.

Peixes

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Foram referenciadas 6 famílias de peixes com um total de 13 espécies, merecendo destaque o ruivaco e a boga.

Anfíbios e répteis

Foram identificadas 9 espécies de anfíbios pertencentes a 6 famílias, e 5 famílias de répteis com um total de 10 espécies.

Sendo de destacar: o lagarto de água, o lagarto comum, a rã-de-focinho-ponteagudo, a rã-castanha e a rela.

Aves

A RNPA oferece abrigo e alimentação a numerosas espécies de aves aquáticas (cerca de 120), quer sedentárias — como o pato-real, a águia-de-asa-redonda, o guarda-rios, o tartaranhão-ruivo-dos-paúis — quer migradoras.

Destas, como visitantes de Verão, destacam-se a garça-vermelha, a cegonha, o milhafre-preto; de entre as invernantes, salientam-se a garça-branca, a franga-de-água, o marequinho e a garça-real; como visitantes de passagem, surgem o milhafre-real, a andorinha-das-barreiras, o pisco-de-peito-azul, etc.

A RNPA, Zona Húmida de Importância Internacional, destaca-se como local importante nas migrações outonais de passeriformes trans-sarianos, assim como local de reprodução e invernada de espécies que se encontram ameaçadas em grande parte das suas áreas de distribuição europeias; sendo também uma área importante como local de nidificação de aves de caniçal.

Mamíferos

Registaram-se, já, 12 espécies de mamíferos distribuídas por 7 famílias.

De entre as diversas espécies de mamíferos, destaca-se a presença da geneta e da lontra. Esta é uma espécie ameaçada devido à destruição do seu habitat, pela regularização das margens das linhas de água, poluição e perseguição de que é alvo pela cobiça do Homem, sendo uma espécie que urge preservar.

A presença de recursos que possibilitam satisfazer os requisitos da espécie (locais de abrigo, de reprodução e

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alimento) permitem a existência de uma população residente de lontra.

O acentuado declínio que se tem vindo a verificar nas últimas décadas provocou um aumento de interesse pela espécie. A lontra é objecto de vários estudos de investigação e campanhas de conservação.

Para conservar a lontra é necessário:

1. uma fonte alimentar adequada e não contaminada;2. vegetação ribeirinha que possibilite abrigo;3. perturbação humana disciplinada;4. fiscalização adequada em termos dos princípios vigentes

na legislação;5. programas de educação ambiental.

Caracterização morfológica e adaptações à vida aquática:

A pelagem é espessa, brilhante e uniformemente castanha, com excepção da região do ventre que é mais clara. O corpo alongado, a cabeça achatada e com olhos pequenos, os membros curtos e a cauda longa, ligeiramente achatada e afilada na ponta, são características que manifestam a sua perfeita adaptação à vida aquática. As patas, curtas e vigorosas, com 5 dedos ligados por uma membrana interdigital bem desenvolvida, permitem-lhe mover-se agilmente na água. Mergulham e chegam a estar submersas durante algum tempo.

Move-se dentro de água com o impulso das patas posteriores e do movimento sinuoso do corpo. A cauda desempenha a função de leme. A posição elevada das narinas e dos olhos permite-lhe manter-se à superfície sem ser notada.

Situação da espécie:

Nas últimas décadas têm vindo a reduzir de forma significativa, os locais de ocorrência e o seu número de efectivos.

Esta situação ocorre principalmente na Europa Ocidental, nos países do norte e centro, mais povoados e industrializados.

Factores que afectam a espécie:

a. abate furtivo;

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b. perturbação humana causada por actividades recreativas junto dos cursos de água;

c. mortalidade acidental: redes de pesca e acidentes de tráfego;

d. poluição química: agrícola e industrial;e. alteração dos cursos de água: drenagens, regularização,

extracção de inertes, construção de barragens, etc.;f. destruição da vegetação ribeirinha.

Factores de perturbação

Os principais problemas que afectam esta área protegida são a diminuição do nível freático, devido às obras de regularização efectuadas no Baixo Mondego, e a poluição da água, provocada pelos efluentes industriais e urbanos, e pela utilização de agro-químicos. Outros problemas são a diminuição de clareiras na vegetação aquática, provocada pela invasão do caniço, e a modificação do coberto vegetal nas vertentes devido à tendência para a substituição da vegetação natural pelo eucalipto.

Apesar de já se terem dado alguns passos significativos para o atenuar destes problemas, a sua resolução depende do esclarecimento e colaboração de todos, em particular dos agricultores, industriais e autarcas.

Aspectos Humanos - esteiras de Arzila

A ligação da população de Arzila ao seu paúl perde-se na memória dos tempos. Há alguns anos, quando a agricultura era para muitas famílias o principal meio de subsistência, o espaço alagadiço, era o local onde crescia o bunho, matéria-prima essencial no fabrico das esteiras, cuja venda proporcionava rendimento extra, bastante apreciado numa época marcada por grandes dificuldades.

As esteiras de Arzila assemelham-se a outras existentes nalguns locais do distrito de Aveiro, tais como a zona Estarreja-Canelas ou em Fermentelos, lugares onde existem zonas alagadiças e ocorre a presença do bunho.

Os processos rudimentares utilizados no fabrico artesanal das esteiras mantiveram-se inalterados ao longo dos tempos.

O corte do bunho é efectuado por homens, no final do Verão, utilizando o «foição», sendo uma tarefa de grande dureza; os trabalhos de escolha, ajuntamento e recolha, assim como os cuidados com a secagem, são efectuados

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por mulheres, que igualmente cortam o junção para fazer a «baraça», utilizada, também, no fabrico das esteiras.

São feitas num tear rudimentar, composto por duas varas laterais — os «canenhos» — encostadas a uma parede, que sustentam uma tábua horizontal com entalhes, onde é colocado o bunho, prendendo-se com as «baraças» a cujas pontas foram amarradas pedras, com a função de contrapesos. Dos dois molhos de bunho encostadas aos «canenhos», a esteireira vai retirando as hastes, colocando-as horizontalmente na tábua sobre as baraças; estas, são viradas alternadamente, as do lado direito com as do lado esquerdo, trocando as pedras da frente com as pedras de trás. Ao colocar as últimas hastes de bunho, a esteireira retira as pedras e ata as pontas da baraça.

A maior parte das esteiras são comercializadas através de intermediários que as procuram em Arzila. São utilizadas pelos viveiristas para protecção de árvores jovens no transporte; servem, ainda, para forrar adegas e esplanadas, para o acondicionamento de mobiliário e vasilhame, para protecção de vegetais aquando das geadas, como capacho, etc.

A melhoria das condições económicas, através da ocupação nos sectores secundário e terciário na cidade de Coimbra, aliada à dureza do trabalho do corte do bunho, levou a uma progressiva diminuição do seu fabrico.

Com a criação da RNPA, procura-se incentivar esta actividade artesanal, não só pela componente económica e social, mas também pela manutenção e conservação do ecossistema.

Conclusão

Zona húmida do vale inferior do Rio Mondego. Paúl com cerca de 165 ha, alonga-se por parte do percurso da Ribeira de Cernache. É drenado por 3 valas denominadas, de nascente para poente, Vala dos Moinhos, Vala do Meio e Vala da Costa. As 3 valas confluem em frente à povoação de Arzila, indo desaguar no Rio Mondego. A cobertura de vegetação hidrófila é essencialmente formada por bunho, caniço e tabúa. Nas margens das valas e nas zonas de transição para a área florestada encontram-se plantas arbustivas e arbóreas típicas de zonas alagadiças (choupos e salgueiros).

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A área tem um incontestável valor biológico, com elevada biodiversidade, particularmente sob o ponto de vista faunístico, com várias espécies estritamente protegidas por convenções internacionais. É a única zona húmida, até à data, integrada na Rede Europeia de Reservas Biogenéticas.

A reserva possui um centro de interpretação onde os visitantes poderão obter todo o tipo de informações, e possui um trilho pedestre, que permite um contacto directo com o ambiente paludícola.

Merece ainda destaque o artesanato característico da povoação de Arzila, que consiste no aproveitamento do bunho, espécie abundante no paúl, para a confecção de esteiras.

A principal actividade da área do paúl é a agricultura, seguindo-se a pesca artesanal nas valas, embora em menor grau

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