BAQUERO Marcello. Pesquisa quantitativa nas ciências sociais Porto Alegre UFRGS, 2009..pdf
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A PESQUISA QUANTITATIVA NAS CINCIAS
SOCIAIS
Marcello Baquero
EDITORA UFRGS
Porto Alegre, 2009.
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SUMRIO
INTRODUO .................................................................................................. 6
A pesquisa nas Cincias Sociais ......................................................................... 7
Os conflitos do uso de diferentes mtodos ........................................................ 11
CAPTULO 1 ................................................................................................... 21
Os elementos da pesquisa social ..................................................................... 21
Ontologia ..................................................................................................... 23
Epistemologia ............................................................................................... 27
Metodologia .................................................................................................. 31
CAPTULO 2 ................................................................................................... 38
O que significa pesquisa e pesquisar nas Cincias Sociais ................................... 38
Pesquisa social .............................................................................................. 40
A pesquisa survey ......................................................................................... 48 I - Pesquisas de opinio pblica ................................................................... 53 II- Enquetes acadmicas de atitudes ............................................................ 54 A enquete acadmica nas Cincias Sociais .................................................... 56
CAPTULO 3 ................................................................................................... 57
A formulao do problema .............................................................................. 57
Mapeando conceitos ...................................................................................... 59
Os critrios para escolha do tema .................................................................... 62
Algumas sugestes para delimitar o problema a ser estudado. ............................ 65
Elementos da pesquisa. ................................................................................. 68
Formulao do problema: ............................................................................... 69
Objetivos ..................................................................................................... 73
Objetivo geral ............................................................................................... 74
CAPTULO 4 ................................................................................................... 74
Formulao de hipteses ................................................................................ 74
O que uma hiptese? .................................................................................. 76
Algumas confuses ........................................................................................ 78
Hiptese geral .............................................................................................. 78
Nveis de hipteses ........................................................................................ 83
Testando hipteses ........................................................................................ 85
Erro Tipo I .................................................................................................... 86
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Analogia jurdica ........................................................................................... 88
Testabilidade ................................................................................................ 90
CAPTULO 5 ................................................................................................... 92
Tipos de variveis ......................................................................................... 92 Conceitos .................................................................................................. 92 Identificao de variveis ............................................................................ 93
A varivel moderadora ................................................................................... 98
Conceito ...................................................................................................... 101
Variveis ..................................................................................................... 101
CAPTULO 6 ................................................................................................. 102
Reviso crtica da bibliografia ........................................................................ 102
Orientaes para elaborar revises crticas ..................................................... 106 1. Escolha do tema .................................................................................. 106 2.Tipo de audincia .................................................................................. 106 3. Pesquisa ............................................................................................. 106 4. Anlise crtica ...................................................................................... 106 5. Observaes gerais .............................................................................. 106
Outras consideraes ................................................................................... 112
CAPTULO 7 ................................................................................................. 113
Instrumentos de coleta de dados na pesquisa quantitativa ............................... 113
Entrevistas ................................................................................................. 118
Subsdios para a construo de questionrios ................................................. 123
O que o questionrio e a entrevista medem? ........... Erro! Indicador no definido.
Cuidados com o processo de entrevistas ........................................................ 131
CAPTULO 8 ................................................................................................. 132
Noes bsicas de tcnicas amostrais ............................................................ 132
Tamanho da amostra ................................................................................... 136
Pesquisa amostral (survey) .......................................................................... 138
Variabilidade da amostra. ............................................................................. 148
CONCLUSES
REFERNCIAS .............................................................................................. 152
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APRESENTAO
Os mtodos quantitativos de pesquisa cientfica tm sido historicamente vistos
com desconfiana pelos cientistas sociais na Amrica Latina. No entanto, e a despeito
dessa percepo, em algum momento da vida acadmica, o estudante de Cincias
Sociais enfrentar, por opo ou obrigao, a necessidade de compreender essa
terminologia.
Presentemente se observa que o debate metodolgico nas Cincias Sociais ocorre
num plano secundrio, o que contrasta com a carncia na formao de recursos
humanos nesta rea. Igualmente se constata que os recursos humanos formados no
campo das Cincias Sociais, na sua maioria, apresentam lacunas no que diz respeito a
como fazer pesquisa e, sobretudo, em relao compreenso do processo de
desenvolvimento de uma pesquisa, na dimenso quantitativa.
No mago da divergncia a respeito da utilidade, ou no, de mtodos
quantitativos nas Cincias Sociais, subjaz a idia de que fenmenos nesta rea so
mais bem explicados por teorias normativas do que por descries consideradas
pseudo-precisas. Nesse cenrio, infelizmente, parece que os alunos so obrigados a se
posicionar a favor ou contra determinado mtodo. realmente necessrio tomar
partido nessa discusso? Creio que, do ponto de vista da avaliao de determinadas
tcnicas de pesquisa (quantitativas ou qualitativas), o estudante de Cincias Sociais
no pode definir sua escolha com base na intuio, no achismo ou por ouvir falar.
O estudante precisa conhecer tanto as tcnicas quantitativas quanto as qualitativas
para discutir a sua opo por uma ou outra, no confundindo epistemologia com
mtodo. Presentemente, o profissional da rea de Cincias Sociais precisa dominar as
diferentes tcnicas da metodologia de pesquisa, pois ele no s um consumidor da
pesquisa, mas dele se espera tambm contribuies no processo de construo de
conhecimento. Toda e qualquer tcnica de anlise tem limites e deficincias. O
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pesquisador necessita conhecer essas deficincias para construir um conhecimento
sobre a realidade.
Essa tarefa implica na necessidade do pesquisador conhecer o processo de
desenvolvimento da pesquisa. Quando um profissional das Cincias Sociais se
compromete com alguns princpios de pesquisa crucial que ele conhea esses
princpios, sua natureza e o impacto dos compromissos ao assumi-los (TUCKMAN,
1972).
Neste livro, parte-se do princpio de que existem mais pontos de convergncia
entre tcnica(s) de pesquisa do que desacordos. Sendo necessrio trat-los
integradamente e no como reas separadas. A desarticulao entre esses dois plos
pode prejudicar a construo do conhecimento. Isto no significa adotar atitudes
eclticas banais onde tudo serve. Pelo contrrio, acredita-se que possvel estabelecer
linhas consistentes de anlise de fenmenos sociais com diferentes tcnicas de anlise
sem abdicar de determinadas orientaes epistemolgicas.
A construo do conhecimento cientfico no campo das Cincias Sociais ocorre
quando se estabelece uma ruptura do senso comum, o qual passa a ser trabalhado por
meio da pesquisa cientfica de maneira crtica.
Nesse contexto, necessrio um questionamento permanente das tcnicas de
pesquisa, para que o investigador tenha conscincia dos seus limites e alcances.
fundamental que o pesquisador entenda que uma pesquisa nunca neutra. Por trs de
qualquer estatuto ou pesquisa existem interesses com base nos pressupostos terico-
metodolgicos do pesquisador. Tais pressupostos raramente so explicitados, embora
sejam facilmente identificveis.
Por essas, entre outras razoes, penso que os cursos de metodologia esto em
crise. Por um lado, os alunos se sentem prejudicados por no terem oportunidades
para "praticar" a pesquisa, enquanto que, por outro, se verifica uma demanda de
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profissionais com conhecimento das diferentes formas de coleta de dados. No e
surpresa, portanto, a carncia de profissionais competentes na rea.
Embora neste livro se enfatize o uso do raciocnio quantitativo nas Cincias
Sociais, no se pretende argumentar a superioridade desta forma de construo de
conhecimento. Busca-se simplesmente tratar esta temtica, levando em conta a
necessidade de trabalhar compreensivamente os temas complexos do campo social.
Pretende-se, portanto, contribuir para uma melhor e mais aprofundada
compreenso dos limites e possibilidades do uso da metodologia quantitativa nas
Cincias Sociais, mas assumindo a perspectiva da necessidade de pensar quali-
quantitativamente o fenmeno social.
Agradeo s vrias pessoas que contriburam para a materializao deste livro,
principalmente, os membros do Ncleo de Pesquisa sobre a Amrica Latina NUPESAL-
pelas suas observaes pertinentes na elaborao de vrios captulos. Finalmente,
agradeo aos bolsistas do NUPESAL pela colaborao nos vrios estgios da elaborao
deste livro, sendo eles: Bianca Linhares, Ana Paula Diedrich, Simone Piletti Viscarra,
Bruno Mello Souza, Rafael Sabini Scherer, Luiza de Almeida Bezerra e rsula Sander
Stker.
INTRODUO
Cada conjunto de fenmenos pode ser interpretado consistentemente de vrias maneiras. nosso privilgio escolher, entre as possveis interpretaes, aquelas que nos parecem mais satisfatrias, quaisquer que sejam as razes dessa escolha. Se os cientistas se lembrassem que vrias interpretaes igualmente consistentes de cada conjunto de dados observveis podem ser feitas, eles seriam menos dogmticos do que geralmente so, e suas crenas numa finalidade ltima possvel de teorias cientficas iriam se esvaecendo. (MOULTON, 1937).
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A Pesquisa nas Cincias Sociais
O objetivo deste livro proporcionar uma formao complementar no estudo da
pesquisa quantitativa. O estudo de como fazer pesquisa numa dimenso quantitativa
enfrentou, sistematicamente, crticas severas da parte de quem considerava a
utilizao de mtodos fundamentados em princpios de probabilidade pouco valiosa
para o processo de construo de teorias. Uma das conseqncias desse
comportamento, na academia, foi a institucionalizao de esteretipos e preconceitos
em relao ao emprego de regras formais na formatao de um projeto de pesquisa.
Outro resultado foi a dicotomizao da rea entre qualitativistas e quantitativistas.
Pessoalmente, acho a distino entre qualitativo e quantitativo de pouca
utilidade. Muitas vezes as pessoas estabelecem diferenas absurdas que levam
confuso. Os quantitativistas argumentam que seus dados so rigorosos, crveis e
cientficos. Os qualitativistas propem que seus dados so sensitivos, detalhados e
contextuais. O que a realidade da pesquisa mostra, entretanto, que dados
quantitativos e qualitativos esto relacionados uns aos outros.
Neste livro, no estabelecemos a superioridade de um mtodo sobre outro. Uma
boa pesquisa, ou seja, uma pesquisa cientfica pode ser qualitativa ou quantitativa.
Todo e qualquer dado quantitativo est baseado em julgamentos qualitativos; e todos
os dados qualitativos podem ser descritos e manipulados numericamente. Entretanto,
atualmente se continua a observar resistncia e antagonismo de alunos e professores,
no campo das Cincias Sociais, ao uso das tcnicas formais de pesquisa.
A despeito dessa situao, nos ltimos anos tem se constatado certa diminuio
desses esteretipos e preconceitos, em virtude de modificaes do cenrio
internacional influenciadas pelo processo de globalizao. Tal fenmeno produziu
mudanas que contriburam para alterar as expectativas quanto formao de
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recursos humanos na rea das Cincias Sociais. Tornou-se uma necessidade dos
tempos atuais e das exigncias dos sistemas polticos contemporneos que os
pesquisadores no campo das Cincias Sociais consigam casar a pesquisa com a
aplicao. No caso do Brasil, de acordo com Schwartzman (2007), academicamente,
se avanou muito nas publicaes sito, mas no tanto do ponto de vista das
aplicaes, de uso da cincia (p.1). Para o autor, instituies de fomento a pesquisa,
tais como a Coordenao de Aperfeioamento de Ensino Superior (CAPES), est
chegando ao limite de seu modelo: montada para a valorizao do trabalho acadmico,
tem muita dificuldade para apoiar reas interdisciplinares e desestimula qualquer tipo
de atividade em que exista um benefcio que tenha a ver com resultados (p1).
Contemporaneamente, parece haver um consenso de que a formao no campo
das Cincias Sociais envolve o domnio de uma gama de diferentes mtodos de
pesquisa. Segundo Hentschel (2002), a ligao em um mtodo de pesquisa (qualitativo
ou quantitativo) est superada pela necessidade de conhecer e utilizar o que se tem
denominado de pesquisa quali-quantitativa. No entanto, alguns autores tm apontado
(LEWIS, 2003) a existncia de um dficit de cientistas sociais com competncia
suficiente para desenvolver estudos quantitativos (LEWIS, 2003).
Quando um pesquisador domina um amplo leque de opes metodolgicas, tal
capacidade abre perspectivas mais produtivas na anlise de problemas sociais, pois
possibilita que se integre teoria e mtodo de forma mais orgnica e propositiva, com
base em evidncia emprica. Esforos nessa direo rompem com a premissa de que
alguns mtodos so melhores do que outros. No contexto atual do conhecimento das
Cincias Sociais, no qual cada vez mais se torna imprescindvel gerar novas bases de
conhecimento, em virtude da defasagem terico-explicativa de fenmenos sociais
contemporneos, necessrio romper com princpios que tm se mantido ao longo do
tempo. A adeso a uma nica forma de construir conhecimento sem qustionar suas
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implicaes tericas, econmicas e sociais, pode redundar no estabelecimento do
conhecimento reativo. E isso, em detrimento da construo de um conhecimento mais
concreto da realidade na qual estamos inseridos.
Em pases em desenvolvimento como o Brasil, o pesquisador da rea de Cincias
Sociais no deve se subordinar ou ser subjugado pelo conhecimento estabelecido e que
no d respostas adequadas aos fenmenos sociais atuais. Pelo contrrio, deve propor
outras explicaes com base na compreenso da realidade que nos rodeia. Tais
explicaes se tornam, cada vez mais, necessrias pelas crescentes preocupaes em
avaliar especificamente o que as Cincias Sociais tm a oferecer no processo de
desenvolvimento de um pas.
Desde que os cientistas sociais passaram a ter espao prprio, desenvolveram
teorias e mtodos para ajud-los a compreender o comportamento social e poltico das
pessoas. Nessa perspectiva, Sandres (1976) compara detetives a cientistas sociais no
sentido de que os dois formulam teorias e desenvolvem mtodos na tentativa de
responder a duas questes: por que aconteceu e em que circunstncias
provavelmente iro acontecer novamente. Desse modo, a pesquisa quantitativa tem
como objetivo principal explicar e predizer. Nesse tipo de pesquisa, os cientistas
sociais, para testar suas teorias, dependem de evidncia emprica e de modalidades
lgicas de anlise. Utilizam tcnicas de observao, entrevistas, experimentos e outros
mtodos empricos para testar a validade dos seus resultados.
Igualmente, cientistas sociais desenvolvem teses que os levam a formular
determinadas questes e no outras, e essas indagaes os levam a perceber
determinados fatos e no outros. Por exemplo, a teoria de Max Weber (1989) a
respeito da relao entre sistemas religiosos de crena e sistemas econmicos o levou
a formular determinadas perguntas a respeito das estruturas econmicas da sociedade
com crenas predominantemente protestantes.
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Esse exemplo sugere que a maior parte dos esforos de construo de novas
teorias no campo das Cincias Sociais se materializa com base na tentativa dos
pesquisadores em examinar cientificamente associaes entre conceitos no mundo
real. Tais iniciativas requerem do pesquisador, alm do treinamento tcnico, uma
capacidade criativa para gerar outras fontes de construo de conhecimento.
Entretanto, nos nossos pases tem se materializado o conhecimento normativo e
reativo, desestimulando o processo de construo de conhecimento novo e autctone
com base em determinadas condies culturais e sociais. Tal conhecimento se torna
necessrio para preencher os dficits explicativos da maior parte dos temas
contemporneos.
No entanto, quem opta por este caminho metodolgico geralmente enfrenta a
descrena da comunidade acadmica, identificada com o estabelecido. Esse tipo de
conhecimento geralmente valida uma teoria pelo uso repetido de um princpio ou a
leitura continuada de um texto. De acordo com Fine (2007), este seria o grande
problema dos cientistas sociais contemporneos que caem naquilo que se denomina de
intelectualismo, ou seja, muitas vezes se investiga fenmenos que nada tm a ver ou
que tm pouca contribuio a dar na compreenso e soluo dos reais problemas de
um pas. O resultado no pode ser outro seno a reproduo do conhecimento
estabelecido, restando poucas condies e margem de manobra para propor diferentes
explicaes. Em tal cenrio, a criatividade est comprometida.
No incomum as Cincias Sociais se defrontarem com pressupostos ou
resultados que so difceis de compreender e estudos que, sobre a mesma temtica,
quantitativa e qualitativa, freqentemente se contradizem. De um lado, tal processo
normal, pois a polmica parte essencial da pesquisa nas Cincias Sociais. Porm, por
outro lado, freqentemente tais contradies ocorrem pelo uso inapropriado de
tcnicas de anlise e de estruturao de projetos. Tal situao decorre, s vezes, de
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posturas distorcidas de pesquisadores que sugerem e defendem o uso de um nico
mtodo, mesmo quando a natureza dos fenmenos sociais sugere outros caminhos de
anlise. O bom e competente pesquisador domina plenamente as vrias tcnicas de
pesquisa sem confundir epistemologia com tcnica.
Os conflitos do uso de diferentes mtodos
Neste livro no se busca desconstruir irresponsavelmente as teorias j
produzidas ou neg-las. Tal postura seria ingnua. Pelo contrrio, trata-se de
estabelecer um dilogo crtico com elas para poder avaliar a sua aplicabilidade em
contextos diferentes daqueles que lhes deram origem.
O desinteresse em tentar descobrir ou redescobrir outras formas de avaliao de
problemas sociais pode redundar na manuteno de atitudes de desprezo, por parte de
integrantes das cincias duras, de gestores pblicos e da prpria sociedade, e reforar
a viso de que as Cincias Sociais tm um custo, mas nada tangvel produzem. Assim,
segundo Dietrich (2002), esse campo de anlise passa a ser tolerado basicamente
porque ningum sabe o que fazer com ele.
Ao lado disso, como observa o mesmo autor, a crise das Cincias Sociais se
agrava, entre outros motivos, pela posio cada vez mais freqente dos pesquisadores
latino-americanos de assumir uma postura de submisso ao conhecimento
estabelecido que domina a rea. Dietrich (2002, p.13) contundente ao afirmar que:
Enquanto o regime garante os privilgios dos intelectuais acadmicos, estes se abstm de gerar teorias crticas e formar alunos crticos, que poderiam perturbar o status quo. Aceitam uma existncia de banalidade enquanto o regime aceita a fico de que se realiza Cincia Social nas academias. Tal trato unidirecional. A nica sada para deixar a banalidade para trs ir adiante: em direo criao de novos mitos de dominao a servio das elites. Dessa forma, o professor se converte em um padre secular, cujo desempenho se esgota nos cnones e liturgias da teologia poltica do sistema.
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O autor complementa esse argumento enfatizando que a conseqncia desta
prxis a institucionalizao do conhecimento reativo e que est na moda, em
detrimento da possibilidade de construir novos paradigmas explicativos (Idem).
A tarefa de questionar o estabelecido, entretanto, implica, para o pesquisador
que busca elaborar um conhecimento diferente do hegemnico, criar condies no s
de transitar multidisciplinarmente pelas diferentes reas de conhecimento (Sociologia,
Antropologia, Filosofia, Histria e Cincia Poltica), mas, sobretudo, dominar e
conseguir aplicar mtodos diferentes na explicao de um fenmeno social, mesmo
que isto signifique remar contra a mar. Hentschel (2002, p. 9) traz outro elemento
a este debate ao referir que tal empenho pessoal no deve se restringir a fazer parte
de alguma coisa, mas orientar-se para a participao, que outro conceito da maior
importncia. A participao significa se integrar por meio de uma contribuio e no
ser meramente uma imitao dos outros. Aqueles que participam cumprindo ordens
so, na melhor das hipteses, teis, funcionam, porm no participam.
Um dos princpios que tem se enraizado no pensamento moderno diz respeito
capacidade da pessoa de se adaptar. No caso das Cincias Sociais devemos perguntar:
adaptar-se a qu? globalizao? privatizao? castrao cultural? De maneira
geral, adaptar-se, no contexto latino-americano, tem significado aceitar passivamente
a destruio de valores culturais prprios e a internalizao de hbitos e
comportamentos que nada tm a ver com o sistema do qual fazemos parte. O
resultado desse processo tem-se plasmado em teorias vigentes que no explicam
adequadamente os fenmenos sociais, adotando como base um pensamento diferente.
Em tais circunstncias, qual a alternativa? Hentschel novamente nos diz que o
comportamento mais conveniente dos intelectuais contemporneos o de se adaptar
normativamente. Assim mais fcil dizer eu tambm do que eu no. Essa atitude
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resulta do temor de sermos excludos por manifestarmos um pensamento distinto
mostrando, coerentemente, atitudes diferentes.
Por exemplo, pesquisas realizadas no Brasil nos ltimos vinte anos mostram, de
forma contundente, que a sociedade, como um todo, no tem internalizado aspectos
de valorizao da democracia (DAMATA, 1993; MOISS, 1995; BAQUERO, 2006).
Embora de maneira geral e difusa as pessoas acreditem na superioridade da
democracia sobre o autoritarismo, quando examinadas suas atitudes e
comportamentos em relao s instituies polticas e aos gestores pblicos, constata-
se uma avaliao negativa. A prevalncia de tais atitudes no pode ser considerada
algo passageiro e temporrio. Parece ser uma dimenso mais estrutural que deve ser
analisada em profundidade, pois se uma das dimenses da inteligncia a adaptao,
imaginar que as pessoas esto destinadas a se adaptar a um sistema poltico com
essas caractersticas deixa pouco espao para pensar em dispositivos que auxiliem a
sair dessa situao, promovendo sistemas mais abertos e democrticos.
Essas circunstncias, de reproduo mecnica de procedimentos vindos de fora,
portanto, descontextualizados, possibilitam que os gestores pblicos argumentem que
polticas pblicas e sociais so difceis de serem aplicadas a curto prazo, pois o
contexto global cria inevitabilidades, por exemplo, na aplicao de reformas
econmicas que agem em detrimento do benefcio da maioria dos cidados. de supor
que todas as pessoas percebem esta situao mostrando-se cticas em relao ao
futuro e defendendo uma maior participao dos cidados. Porm, constata-se que
ningum est disposto a se envolver, inclusive quem critica as posturas passivas da
populao.
Uma conseqncia deste processo nas Cincias Sociais, segundo Gomes (1998,
p.2) de que os estudiosos tm se debruado sobre questes de relevncia
duvidosa, perdendo-se nos meandros das obrigaes burocrticas da academia, sem
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efetivamente conseguir produzir algo de novo e continua: E se no bastasse essa
limitao, temos por outro lado um enorme desperdcio de tempo e dinheiro na
produo de estudos irrelevantes, geralmente condenados ao ostracismo do fundo de
nossas bibliotecas.
Na mesma linha de anlise, Schwartzman (2007:1) argumenta que o
contratante que quiser algum para avaliar e legitimar seus projetos vai escolher quem
ele sabe que no vai dizer nada desagradvel. Isto pode levar, segundo o autor, ao
desenvolvimento de centros e grupos de pesquisa fazendo trabalhos muito financiados
e de m qualidade e credibilidade. Presentemente, no incomum constatar a
proliferao de pesquisas que com novos nomes e nomenclaturas realizam
investigaes que nada acrescentam ao j documentado, constituindo-se em
depositrios de informao incua. Neste sentido, importante desenvolver sistemas
de incentivos que favoream mais a aplicao e a busca de resultados, e no somente
os critrios acadmicos de qualidade.
No entanto, continuam a prevalecer atitudes aparentemente institucionalizadas
que se posicionam a favor da idia de que melhor adaptar-se do que empreender
caminhos alternativos de anlise e soluo de problemas. Nos ltimos anos tem se
observado a popularizao a respeito da idia de que uma sociedade madura e estvel
a que melhor sabe seguir instrues e obedecer a leis e procedimentos.
Evidentemente que nenhum sistema poltico pode sobreviver sem leis, normas, regras
e instituies eficientes. No entanto, reduzir o processo de consolidao democrtica
nica e exclusivamente a esses procedimentos, negligenciando o papel dos cidados,
pode contribuir para gerar comportamentos passivos e alienados. As razes so bem
conhecidas e documentadas (imposio dos valores do pesquisador populao
estudada; a inexistncia da opinio pblica; a impraticabilidade do uso de mtodos
estatsticos nas Cincias Sociais e a falta de aprofundamento de um tema). Esses
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posicionamentos parecem ter contribudo para que o aluno descarte o uso de mtodos
formais por consider-los pouco valiosos para a sua formao acadmica.
Nos anos que tenho ministrado seminrios de pesquisa quantitativa, no
incomum ou infreqente ouvir de um nmero significativo de alunos que a nica
pesquisa til a que possibilita a participao direta do pesquisador na realidade ou
que o papel do aluno na universidade no o de pensar propositivamente ou o de
refletir a respeito de solues para os problemas sociais, mas que esto meramente
num estgio de aprendizagem por etapas. Ou seja, passa-se a idia de que
preocupaes relacionadas com a possibilidade de resolver problemas no esto dentro
do universo da formao de recursos humanos nas Cincias Sociais.
Na verdade, tal postura revela uma situao grave na infraestrutura de nossos
cursos de ensino superior no que se refere formao metodolgica dos cientistas
sociais. A este respeito, Dietrich (2002, p.31) argumenta que a quantidade de
professores em Cincias Sociais que tm domnio satisfatrio da Metodologia e da
Epistemologia cientfica, quer dizer, suficiente para ensin-las adequadamente aos
seus alunos, muito escassa. O resultado se traduz na valorizao de ensaios que se
caracterizam muito mais pelo nmero de vezes que citam as autoridades
reconhecidas do que a tentativa de propor algo diferente. Tal atitude conduz
reproduo do conhecimento e no valorizao do conhecimento crtico e de
incidncia.
Essa postura tem incidido, em minha opinio, negativamente na formao
metodolgica dos alunos de Cincias Sociais, pois produz uma negligncia das regras
sistemticas que norteiam a pesquisa, impedindo que se contribua para uma melhor
compreenso dos fenmenos sociais. Apesar dos limites da pesquisa quantitativa, at
hoje no se conhece outro mtodo ou tcnica de pesquisa que permita descrever com
preciso as relaes entre fenmenos e problemas sociais e, ao mesmo tempo,
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proporcione fundamentos e informaes necessrias para a formulao de polticas
pblicas mais eficientes, torna-se necessrio que o futuro pesquisador no campo da
Cincias Sociais domine a sistemtica de pensar e aplicar a pesquisa de acordo com
procedimentos rigorosos.
Refletindo a respeito da formao metodolgica de recursos humanos nas
Cincias Sociais, Luna (1999), em relao ao ensino de mtodos da pesquisa, diz que:
Quanto mais me envolvo com eles, mais me conveno de sua insuficincia para a
formao de pesquisadores, sobretudo quando eles so usados como substitutos da
atividade de pesquisa. Para o referido autor, a metodologia um instrumento
poderoso, justamente porque representa e apresenta os paradigmas de pesquisa
vigentes e aceitos pelos diferentes grupos de pesquisadores, em um dado perodo de
tempo.
No o argumento desse livro postular que uma tcnica de pesquisa seja
superior outra. O uso de uma ou de outra tcnica depende do contexto, dos objetivos
e do que ser feito com os resultados gerados por uma investigao. O que se defende
uma formao mais atualizada dos recursos humanos que pretendem fazer das
Cincias Sociais seu campo de trabalho. Presentemente, o pesquisador nas Cincias
Sociais est obrigado, por dever profissional, a conhecer e, sobretudo, saber aplicar a
ampla gama de diferentes tcnicas de pesquisa sem que isso signifique abdicar da
teoria com a qual se identifica.
Atualmente tem se institucionalizado o princpio de que a pesquisa na ps-
graduao diferente do estudo na graduao. Supe-se que na graduao se opera
com um conjunto de estruturas, na qual se identificam e se unem unidades de
aprendizagem, por meio de cursos seqenciados, seminrios e classes. O aluno ocupa
um mundo compartilhado com outras pessoas, todas seguindo o mesmo caminho.
Cada ano visto como parte de uma totalidade que obedece a uma progresso natural
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que vai de generalidades amplas at os interesses mais especficos de uma pesquisa.
Contrariamente pesquisa na ps-graduao, a da graduao vista como uma
experincia de incerteza, ambigidade e falta de estrutura. Pressupe-se que o aluno
depende de seus prprios recursos, da vontade de ir em frente seguir seus prprios
interesses.
Um aspecto da noo de pesquisa crtica o de que em nvel de ps-graduao
se criam redes que tornam a pesquisa mais agradvel e produtiva. Na verdade, no
existem estudos que tenham aprofundado as diferenas do estudo na ps-graduao
em comparao com a graduao. Por exemplo, parte-se do pressuposto de que
alunos de graduao esto num processo de treinamento no qual se exige unicamente
a sua capacidade de assimilar teorias e reproduzi-las. No se enfatiza o uso da
criatividade e, tampouco, se incentiva o pensamento crtico. Isto, segundo grande
parcela da academia, ser alcanado na ps-graduao.
Sendo assim, recursos humanos graduados em Cincias Sociais praticamente
pouco sabem sobre o processo de pensar e executar pesquisas, sejam elas qualitativas
ou quantitativas. O mais grave que, de acordo com minha experincia na ps-
graduao nos ltimos vinte anos, e conforme relatos feitos por professores de
metodologia de pesquisa de outras universidades, tal fato se reproduz na ps-
graduao. No incomum, por exemplo, que pessoas formadas em nvel de
doutorado no saibam fazer pesquisa quantitativa ou interpretar dados dessa
natureza, sendo o seu comportamento o de desvalorizar aquilo que no dominam.
Acrescente-se a essa situao a introduo de um conjunto de exigncias aos
programas de ps-graduao, voltadas a produzir mais doutores em curtos perodos de
tempo. A meta a ser alcanada geralmente se sobrepe qualidade da formao.
Nessa circunstncia se torna imperativo comear a pensar numa formao que
integre no s o domnio de teorias, mas, tambm, de um amplo leque de opes
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metodolgicas, iniciando j nos estudos de graduao. Dessa forma, o ensino da
pesquisa cientfica passa pela possibilidade de praticar o que ensinado. Isso quer
dizer que o pesquisador na rea de Cincias Sociais deve ter um conhecimento
adequado da metodologia da pesquisa. A esse respeito, Luna (1999, p. 11) argumenta
que
uma coisa promover, entre os alunos, a discusso terico-metodolgica sobre a realidade que eles precisam aprender a representar para poder analisar; outra coisa substituir o fazer pesquisa pelo falar sobre pesquisa.
Na mesma linha de anlise, Demo (1985,p.7) sinaliza que s tem algo a ensinar
aquele que, por meio da pesquisa, construiu uma personalidade prpria cientfica,
aquele que tem uma contribuio original; caso contrrio, no vai alm de narrar aos
estudantes o que aconteceu por a.
Consciente ou inconscientemente, um pesquisador um consumidor de pesquisa
na medida em que sua leitura sobre os fenmenos sociais e suas concluses sobre eles
esto, preponderantemente, baseados em investigaes realizadas em diferentes
campos de conhecimento. Desse modo, para avaliar e interpretar os resultados
gerados por pesquisas, o cientista social tem como responsabilidade compreender as
limitaes impostas pelas tcnicas utilizadas na coleta e na anlise de dados.
Enquanto cientistas sociais tm uma abundncia de questes significativas que
podem ser investigadas, as ferramentas para compreender esses fenmenos so
escassas e relativamente cruas. Desse modo, essencial que o pesquisador tenha
clareza de todos os elementos que conformam a realizao de pesquisa, tanto tericos
quanto metodolgicos e de mtodos (estratgias ou procedimentos que indicam uma
seqncia ordenada de movimentos que o pesquisador deve seguir para alcanar o
objetivo da pesquisa).
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19
Partindo desses pressupostos, este livro objetiva discutir a importncia terica e
metodolgica das etapas de construo de um processo de investigao. No tem a
pretenso de inventar a roda, pois, como se sabe, existem centenas de textos sobre
metodologia de pesquisa nas Cincias Sociais. O esforo aqui empreendido, se que
ele pode ser considerado diferente, est na tentativa de tornar mais palpvel e tangvel
a utilidade da pesquisa quantitativa por meio de experincias adquiridas em mais de
duas dcadas de trabalho nesta rea.
Da mesma forma, no se pretende argumentar que o chamado mtodo
cientfico seja o nico caminho de construo de conhecimento. Existem vrias e
diferentes formas de desenvolvimento de paradigmas explicativos dos fenmenos
sociais. Alm do mais, do ponto de vista tcnico, o conhecimento pode ser produzido
pelo mtodo da tenacidade. Este tipo de conhecimento se estabelece pelas crenas das
pessoas em algo como sendo verdade em relao a alguma outra coisa. As pessoas
acreditam naquilo a despeito de evidncia em contrrio.
Outra forma de construo de conhecimento se d via o mtodo da autoridade.
Tal conhecimento se plasma em virtude de um processo de intersubjetividade
catalisada por uma autoridade no assunto pesquisado.
Uma terceira forma de conhecimento se constitui pelo mtodo apriorstico ou de
intuio. Nesta perspectiva de conhecimento, se aceita alguma coisa por parecer
razovel ou estar com a razo. Na medida em que cada pessoa pode se auto
considerar um socilogo, um cientista poltico, um filsofo ou um economista, e, na
medida em que muitos fenmenos sociais parecem ter explicaes com base no senso
comum, existe a tentao das pessoas de considerar que as Cincias Sociais so
dispensveis.
Tal situao se complica quando dois pesquisadores, estudando o mesmo tema
com os mesmos dispositivos terico-metodolgicos, chegam a diferentes concluses.
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Nesse caso, quem est com a razo? Finalmente, e sem excluir outras formas de
construo de conhecimento, temos o chamado mtodo cientfico, o qual
determinado por uma permanncia externa ou validade intersubjetiva externa.
Pressupe que as concluses de estudos sobre o mesmo assunto devem ser sempre as
mesmas. No entanto, a Histria tem se encarregado de mostrar que tal expectativa
no tem se materializado na prtica, principalmente nas Cincias Sociais. Basicamente
se refere impossibilidade de gerar princpios ou leis universais. No entanto, acredito
que do ponto de vista estritamente tcnico, o chamado mtodo cientfico proporciona
um conjunto de ferramentas que, se utilizadas com criatividade e sem dogmatismo,
podem auxiliar a produzir novas formas de compreenso dos fenmenos sociais, por
meio de um sistema interno de auto-correo.
nesta ltima perspectiva que este livro pode ser enquadrado. Pretende-se
discutir as regras que fazem parte de qualquer projeto de pesquisa. Porm, no se
apresenta tal abordagem como a nica alternativa para construir conhecimento
socialmente relevante. Como foi dito, h outras perspectivas, mas neste livro se
enfatiza a constituio de conhecimento por meio da estruturao de projetos de
pesquisa de carter emprico.
Para tal fim, o livro est estruturado em oito captulos. O primeiro dedicado
discusso de conceitos bsicos da pesquisa social, destacando-se as noes de
ontologia, epistemologia, metodologia, mtodos e fontes. O segundo captulo discute o
significado da pesquisa e pesquisador nas Cincias Sociais, dando nfase aos aspectos
que influenciam os temas a serem tratados pelas Cincias Sociais. No terceiro captulo
se examinam a formulao do problema de pesquisa e os objetivos, apontando a
necessidade da investigao acadmica satisfazer, concomitantemente, os critrios de
importncia, originalidade, e viabilidade, requisitos bsicos na elaborao do trabalho
cientfico. So apresentados exemplos de formulaes de problema e a sua delimitao
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21
com o uso de duas e trs variveis. O quarto captulo trata sobre a formulao de
hipteses, examinando aspectos relacionados sua natureza, aos seus nveis de
operacionalizao e de testagem. O quinto captulo aborda a questo das variveis,
identificando definies operacionais, nveis de mensurao, e exemplificando a relao
de causalidade que se estabelece entre varivel dependente e independente. O
captulo seis est voltado aos fundamentos da reviso crtica da literatura. A
elaborao de instrumentos de coleta de dados na pesquisa quantitativa o tema do
stimo captulo. No oitavo captulo so discutidas questes relativas aos processos e as
tcnicas de amostragem.
A partir desta estruturao, se busca oferecer aos leitores desta obra um
conjunto de conceitos e orientaes que sirvam de subsdio para o planejamento, a
organizao e a redao do seu trabalho acadmico. O propsito apontar caminhos,
do conceitual ao operacional, da elaborao do projeto apresentao dos resultados
da pesquisa, fundamentando e desmistificando as tcnicas de investigao e de
redao cientfica, valorizando a qualidade da produo do conhecimento e realando a
importncia da criatividade na realizao do processo de pesquisa.
CAPTULO 1
Os elementos da pesquisa social
Toda e qualquer pesquisa, independente do mtodo utilizado, precisa levar em
conta os aspectos filosficos subjacentes a esse empreendimento. necessrio,
portanto, que o pesquisador domine os elementos constitutivos da pesquisa social,
quer dizer, da linguagem bsica da pesquisa, o que deve anteceder fase de formao
tcnica em pesquisa na tradio disciplinar. So conceitos-chave na pesquisa social,
so ontologia, epistemologia, metodologia e mtodo. Esses conceitos quando
discutidos dentro da dimenso da pesquisa quantitativa, muitas vezes, so cercados
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por uma urea de mistrio, parcialmente criada pela linguagem abstrata utilizada para
explic-los, gerando confuso nos leitores, antes de comear a ouvir ou ler sobre a
temtica a ser investigada.
Um exemplo pode sinalizar a importncia da ontologia. Considere um pedreiro
que no sabe a diferena entre uma p, uma picareta e um martelo; sem o
conhecimento dessas diferenas, dificilmente ele poder construir uma parede ou uma
casa. Analogamente, um cientista social que no conhea a histria de seu pas, pode
incorrer no equvoco de construir conhecimento descontextualizado, que pouco ou
nada tm a ver com as condies do pas, produzindo uma postura normativa. Desse
modo, a forma como o cientista social enfrenta um problema a ser pesquisado, precisa
ser compreendida claramente pelos leitores. No entanto, h que se distinguir entre o
conhecimento do senso comum e o cientfico. A diferena entre o senso comum e o
conhecimento cientfico que este ltimo requer o domnio de um conjunto de regras
para sistematizar o tema que se pretende pesquisar e, dessa forma, construir
conhecimento.
De acordo com Kerlinger (1979), existem cinco diferenas significativas entre
cincia e senso comum, sendo elas:
(1) As divergncias a respeito das palavras sistemtico e de controle. O
homem comum utiliza quotidianamente teorias e conceitos de forma simplista,
ou seja, geralmente aceita explicaes metafsicas ou sem respaldo factual dos
fenmenos sociais. Por exemplo, uma pessoa pode considerar sua situao de
pobreza um castigo de Deus. O pesquisador, por sua vez, constri estruturas
tericas sistemticas e as testa por consistncia interna e empiricamente.
(2) Diferenas entre as formas como se testam as teorias e as hipteses. O
homem comum testa suas teorias e hipteses de forma seletiva, isto ,
escolhendo a evidncia que d consistncia s suas hipteses. O cientista social,
por sua vez, busca evidncias de fontes variadas, e muitas vezes contraditrias,
para testar suas teorias e hipteses.
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(3) Diferenas na conceituao de controle. O cidado comum no se preocupa
em examinar fontes potenciais que poderiam distorcer suas percepes e crenas
a respeito de um fenmeno social. O pesquisador procura identificar todos os
elementos que podem incidir na materializao do fenmeno estudado.
(4) Diferenas na interpretao de associao entre dois conceitos. Por
exemplo, uma pessoa pode acreditar que quando seu joelho di h uma grande
possibilidade de chover. O pesquisador, ao contrrio, para explicar o mesmo
fenmeno, recorre a um conjunto de indicadores e examina sua importncia
relativa.
(5) O pesquisador busca, na sua pesquisa, eliminar explicaes metafsicas.
Uma explicao metafsica se refere a uma proposio que no pode ser testada.
Isto no significa que atitudes e comportamentos dessa natureza no estejam no
horizonte do pesquisador. O pesquisador procura no se deixar influenciar por
essas explicaes ou as coloca na dimenso da ontologia.
Nas Cincias Sociais, portanto, a base de construo de conhecimento passa pela
compreenso e pelas implicaes dos termos que dizem respeito a: ontologia,
epistemologia, metodologia, mtodos e fontes.
Ontologia
A viso de mundo do pesquisador, independente de ser ingnua, crtica, racional
ou terica, tem dois componentes: o ontolgico e o epistemolgico. O termo
ontologia originou-se no sculo XVII com o intuito de designar a cincia do ser; no
sentido etimolgico da palavra, significa a lgica do ser: derivada do grego onthos
denota ser e logos, lgica. Segundo Steenberghen (1965): cincia do ser, ontologia,
metafsica geral, ou especificamente, metafsica.
Para Rezende (1986), a Filosofia compreende a ontologia como sendo o ramo da
Filosofia que estuda o ser enquanto ser, ou seja, independentemente de suas
determinaes particulares e naquilo que constitui sua inteligibilidade prpria; ou ainda
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como sendo a teoria da intuio racional do absoluto como fonte nica, ou pelo menos
principal do conhecimento humano (p.12).
Encontram-se controvrsias no que diz respeito ontologia. De um lado esto
aqueles que, embasados em Santo Toms de Aquino, defendem a teoria dos trs
estgios de abstrao e consideram a ontologia o cume da Filosofia, estando depois da
analogia, cosmologia, psicologia e a filosofia matemtica. De outro lado, encontramos
aqueles que atribuem ontologia o papel de uma disciplina da filosofia, com base na
epistemologia e constituda por uma dupla metafsica: a do homem e a do mundo
material. Segundo Steenberghen (1965, p. 38), o objeto da ontologia pode ser
construdo por meio de toda experincia humana, pois se ela humana
necessariamente do ser. Para o autor,
a ontologia tem como objeto precisamente o estudo do valor comum, da investigao do que implica a realidade desta representao sinttica, o determinar em que consiste, exatamente, a unidade que revela e expressa o conceito de ser. Em outros termos, o objeto formal da ontologia o valor do ser, incluindo em todo objeto de experincia: estuda o dado da experincia enquanto ser, enquanto real.
Nessa perspectiva, para o referido autor,
para um estudo posterior do objeto so abertos dois caminhos para ontologia: novas experincias, reveladoras de novas modalidades do ser, e o discurso da razo, a fim de descobrir as afirmaes implicitamente contidas na afirmao explcita do ser ou dos modos empiricamente conhecidos(p. 39).
Por esse prisma, todas as pessoas possuem determinada ontologia; uma viso e
uma maneira de justificarem a realidade na qual vivem, quer dizer, uma viso acerca
da totalidade do real que as circunda. Nesse sentido, a ontologia corresponde a uma
determinada leitura da realidade (SIGRISTI, 1997).
Se cada pessoa pudesse registrar no papel, em fita de vdeo ou na tela de um
computador como v a realidade, teramos a ontologia de cada ser humano. No
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podemos viver sem explicar o mundo que nos circunda, mesmo que faamos isso de
forma mstica, mtica ou mistificada. justamente porque conseguimos, de algum
modo, dar algum tipo de explicao sobre este mundo, que a vida tem sentido,
qualquer que ele seja. Sem fazer certa leitura da realidade, no se saberia como agir e
interagir dentro da sociedade, se ficaria sem normas de comportamento, no sabendo
o que fazer ou no que acreditar. Enfim, essa leitura corresponde nossa ontologia. Se
fizermos isso com um grau acentuado de racionalidade, um fundamento terico slido,
seria muito melhor. Mas em todos os nveis em que o ser humano pode operar -
emprico, racional e terico - h uma ontologia presente, e ela se constitui na diretriz
bsica do nosso comportamento.
A lgica hegeliana postula trs tipos de atitudes perante o real, que revelam trs
formas de conscincia. A primeira chamada de conscincia emprica; a segunda, de
conscincia racional e a terceira, de conscincia terica. A conscincia emprica a
atitude de quem apenas responde aos estmulos imediatos da experincia. A racional
a de quem responde a esses estmulos, mas tambm capaz de dar razes
explicativas aos elementos constitutivos desta experincia. A conscincia terica a de
quem responde a estmulos da experincia do cotidiano, d certas razes explicativas
aos seus elementos e, ao mesmo tempo, capaz de perceber e integrar esta
experincia na totalidade das coisas que compem o que Hegel chama de mundo,
realidade ou totalidade do ser.
Em se tratando da formao universitria, na qualidade de professores
comunicamos nossa ontologia aos nossos alunos em qualquer disciplina por ns
ministrada. A viso de mundo do professor se manifesta, implcita ou explicitamente,
em qualquer rea do conhecimento. Assim, todos trabalham, vivem e se expressam a
partir de uma ontologia, de uma leitura que se faz da realidade. Nossos
comportamentos veiculam uma leitura, uma compreenso de mundo, de sociedade.
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Quando falamos de leitura de realidade, no estamos pensando em uma
situao abstrata, indefinida, mas nos aspectos mais concretos da nossa vida, na vida
pessoal, na interpessoal, na profissional, na vida em sociedade. Em todos os
momentos, queiramos ou no, comunicamos a nossa ontologia, ainda que disso no se
tenha conscincia. Suponha, por exemplo, que voc no tenha religio, por nela no
acreditar, pois este fato influenciar a sua leitura do mundo e dos fatos e
acontecimentos sociais. As explicaes dos fenmenos sociais, portanto, estaro
relacionados com seus sentimentos sobre uma determinada temtica.
Da mesma forma, quando se lida, por exemplo, com o conceito de cultura poltica
e a forma como as pessoas constroem seus valores a respeito de como vem o mundo,
os posicionamentos em relao aos valores hierrquicos so diferentes dos valores
igualitrios. Segundo Almeida (2007, p.75), os que compartilham de uma viso
hierrquica de mundo consideram que h posies predefinidas e, portanto, deve-se
esperar que cada um desempenhe o papel determinado por sua condio social. J os
que se orientam por valores igualitrios, consideram que no h papis socialmente
predefinidos. A princpio, todos os indivduos so iguais e eventuais desigualdades ou
diferenas em papis sociais so estabelecidas apenas nos limites de um contrato.
Essa forma dicotmica de construo de valores numa cultura poltica influencia a
forma como o pesquisador examina e conclui a respeito de como lidar com valores
hierrquicos, so os pressupostos que esto subjacentes viso do mundo do
pesquisador. Sabendo os pressupostos, podemos entender o tipo de literatura com a
qual o pesquisador passa a se identificar e a forma como vai propor solues ao
problema examinado nessa perspectiva
Recapitulando, ontologia o ponto de partida de toda pesquisa. Neste plano, a
ontologia pode ser vista como a natureza da realidade social, sobre a qual a teoria est
construda, de outro modo, a ontologia se refere aos pressupostos sobre a natureza da
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realidade social, sobre o que existe, como so e como essas unidades do contexto
examinado interagem umas com as outras. Em suma, os pressupostos ontolgicos
referem-se a como o pesquisador acredita que se constitui a realidade social. Dessa
forma, no difcil entender porque diferentes tradies tericas, com base em
contextos culturais diversos, apresentam perspectivas divergentes do mundo e
diferentes pressupostos sobre a realidade pesquisada. , portanto, necessrio que o
aluno tome conhecimento e compreenda a forma como a ontologia impacta seu
conhecimento sobre a realidade na qual est inserido.
Esse posicionamento a resposta do pesquisador pergunta: Qual a natureza
poltica e social da realidade a ser investigada? Somente depois que esta pergunta
estiver respondida se pode discutir o que possvel saber sobre a realidade poltico-
social que se pensa existente.
Exemplos de posicionamentos ontolgicos so aqueles expressos nas
perspectivas do objetivismo e do construtivismo. De maneira ampla, o objetivismo
um posicionamento ontolgico segundo o qual os fenmenos sociais e seus
significados existem independentemente dos atores sociais, enquanto que o
construtivismo uma abordagem holistica de construo social. Isso implica que
fenmenos e categorias sociais no s so construdos pela interao social, mas que
esto num processo constante de reviso. Assim, se ontologia diz respeito ao que
sabemos, ento a epistemologia refere-se a como vamos saber o que sabemos.
Epistemologia
A epistemologia um conceito polissmico que se refere a diferentes aspectos da
filosofia do conhecimento, estudando a origem, a estrutura, os mtodos e a validade
do conhecimento e dos produtos intelectuais (JAPIASSU, 1992); crtica geral do
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conhecimento (LALANDE, 1999) e ao processo do pensamento
(STEEENBERGHEN,1965).
Deste modo, como uma das reas da filosofia, est preocupada com teoria e
conhecimento, especialmente em relao a mtodos, validao e as maneiras possveis
de obter conhecimento acerca da realidade social, de qualquer forma que essa
realidade seja entendida. Em suma, se refere a como saber aquilo que se presume
que existe. Derivada da palavra grega episteme (cincia/conhecimento) e logos
(lgica/razo), a epistemologia enfoca o processo de construo de conhecimento e se
preocupa com o desenvolvimento de novos modelos tericos, quer dizer, de modelos e
teorias que so considerados com potencial explicativo mais persuasivo do que outros
paradigmas.
Isso significa que a nossa viso de mundo tem um outro componente alm do
ontolgico, sendo este o componente epistemolgico. A epistemologia nada mais do
que a lgica de uma cincia. A lgica de uma cincia est na teoria cientfica que vai
dar sustentao lgica s proposies que a compem. Quer dizer, a um conjunto
ordenado de proposies a respeito de um mesmo objeto, proposies estas que se
articulam entre si e encontram-se vinculadas a partir de um princpio geral.
A epistemologia relaciona-se, assim, com problemas que compreendem a
questo da possibilidade do conhecimento e dos limites deste, fazendo-nos oscilar
entre a resposta dogmtica ou a empirista e colocando a dvida se o ser humano
conseguir, algum dia, atingir realmente o conhecimento total ou se haver a distino
entre um mundo cognoscvel e um incognoscvel. Outra dvida diz respeito
tradicional questo sobre a origem do conhecimento: Por meio de que faculdades ele
atingido? Haver realmente um a priori no conhecimento humano? Acrescente-se a
essas questes relativas diferenciao entre os vrios tipos de conhecimento diante
da possibilidade de vrias formas de aprendizagem: pela memria, pelos livros, pela
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experincia cotidiana, de forma indireta ou direta e pelo contato do sujeito com o
objeto. Finalmente, surge o problema da verdade: Dever adaptar-se ao sistema de
proposies referido a um conjunto consistente de frases? Depender a verdade da
relao de correspondncia entre uma proposio e o seu objeto?
A dimenso epistemolgica da nossa conscincia pode ser examinada em nveis
diferentes. A tarefa do cientista social buscar os seus nveis mais profundos
(tericos). Por exemplo, conforme o lugar a partir do qual olhamos uma cidade, um
bairro, uma instituio, uma organizao ou uma comunidade, tal ser a cidade, o
bairro e a comunidade. A ttulo de exerccio, qual seria a sua opinio sobre Cuba e por
qu? A busca desse lugar chamado lugar epistemolgico outra tarefa que cabe a
cada um de ns conhecermos. Precisamos saber em que lugar estamos e a partir de
que lugar olhamos o mundo. A epistemologia discute esse ponto a partir do qual
vemos o mundo. Cada cincia tem a sua epistemologia. Temos a epistemologia da
Biologia, da Histria, da Sociologia, da Antropologia, da Cincia Poltica, e assim por
diante, ou seja, ela identifica o ponto a partir do qual se discute o objeto de uma
cincia.
A epistemologia existiu praticamente desde os incios da Filosofia e como
conhecimento mais ou menos sistemtico, data do sculo VII A.C. Mas, somente nos
sculos XVI e XVII, passou a ser vista como problema crtico da cincia. E em que
consiste este problema crtico? Kant, refletindo sobre este tema no sculo XVIII,
sugere que o problema crtico consiste em responder a duas questes: O que podemos
conhecer? Em que condies o conhecimento verdadeiro? Este o problema crtico,
discutido no apenas por Kant, mas tambm pelos racionalistas, como Descartes, e
pelos empiristas, como Hume. Mas foi Kant quem sistematizou, em seu livro Crtica da
razo pura, as questes que os racionalistas e empiristas j haviam discutido. Ele
chama de problema crtico da cincia o fato de que, antes de comearmos a fazer
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cincia, precisamos ter bem claras para ns mesmos, as respostas a duas questes. O
que ns podemos conhecer: a totalidade do real ou parte do real? Em que condies
esse conhecimento verdadeiro, inquestionvel, irrefutvel?
Para Kant, antes de fazer uso da razo devemos criticar, ou seja, apreciar o seu
limite. No podemos comear a usar a razo sem saber com clareza qual o seu alcance
e quais so as leis que ela deve respeitar para chegar verdade cientfica. Essas duas
questes guardam uma ligao muito grande, pois, ao definir as condies do
conhecimento verdadeiro, se definem tambm seus limites. Ao identificar o objeto, se
definem, igualmente, as condies de possibilidade do conhecimento verdadeiro. Esta
a base em que se assenta a Filosofia moderna e contempornea.
O conhecimento, e as formas de descobri-lo, no um processo esttico, mas
est sempre mudando. Quando so consideradas teorias e conceitos em geral, os
alunos devem refletir acerca dos pressupostos sobre os quais se basseiam e onde se
originam em primeiro lugar. Por exemplo, as teorias geradas nas democracias
ocidentais so suficientes para explicar processos de transio na Amrica Latina, cuja
histria se caracteriza pela presena de traos autoritrios, personalistas e
patrimonialistas?
Dois posicionamentos epistemolgicos contrastantes esto contidos nos termos
positivismo e interpretativismo. Estes conceitos podem ser encontrados na Histria
em relao a tradies especficas da filosofia da Cincia Social. O positivismo um
posicionamento epistemolgico que defende a aplicao dos mtodos das cincias
exatas ao estudo da realidade social. O interpretativismo, por seu turno, pode ser visto
como um posicionamento epistemolgico fundamentado na perspectiva de que uma
estratgia necessria a que respeita as diferenas entre as pessoas e os objetos das
cincias naturais; portanto, exige que o cientista social domine o significado subjetivo
da ao social.
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A escolha de um destes posicionamentos epistemolgicos leva o pesquisador a
escolher uma metodologia diferente em relao a outro pesquisador com
posicionamento epistemolgico distinto. Nessas circunstancias, o pesquisador precisa
desenvolver a capacidade de identificar como os posicionamentos ontolgico e
epistemolgico podem resultar em diferentes perspectivas sobre o mesmo fenmeno.
Metodologia
Antes de entrar na discusso sobre o significado da metodologia, cabe ressaltar
que no se postula uma relao unidirecional causal entre os diferentes aspectos da
pesquisa social. O objetivo discutir os elementos de forma cronolgica, como um
treinamento inicial para os estudantes de Cincias Sociais que pretendem aprofundar
sua compreenso sobre o processo de desenvolvimento da pesquisa quantitativa.
Busca-se, assim, desmistificar a aparente complexidade deste tipo de pesquisa, por
meio de uma discusso a respeito de como se estrutura a investigao nas suas etapas
iniciais e de que forma esses elementos iro nos acompanhar na nossa vida de
pesquisadores. de fundamental importncia que o aluno entenda como uma
perspectiva particular do mundo pode afetar todo o processo de pesquisa. Explicitando
claramente as inter-relaes entre o que o pesquisador pensa ser possvel ser
investigado (posio ontolgica), o que se pode saber sobre isso (posio
epistemolgica), e como coletar as informaes (posio metodolgica), o pesquisador
pode comear a compreender o impacto de sua pesquisa naquilo que decide estudar.
Freqentemente se costuma fundir ontologia e epistemologia, uma sendo vista
como parte da outra. Embora estejam relacionadas importante mant-las separadas,
posto que toda pesquisa comea necessariamente com o ponto de vista do pesquisador
sobre o mundo (ontologia), o qual por si s molda a experincia que traz para o
processo de pesquisa.
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A abordagem metodolgica reflete pressupostos ontolgicos e epistemolgicos
especficos, e representa a escolha da abordagem e dos mtodos de pesquisa num
determinado estudo. A metodologia se refere lgica da pesquisa cientfica, tratando,
especificamente com as potencialidades e limitaes de determinadas tcnicas ou
procedimentos. O termo se refere cincia e ao estudo de mtodos e aos
pressupostos sobre as formas em que o conhecimento produzido.
Em sentido etimolgico, metodologia significa o estudo dos caminhos, dos meios
de uma teoria (no caso da teoria cientfica). O que se discute, ento, so os caminhos,
a armao da teoria e no o seu contedo propriamente dito. Assim, ao falar de
metodologia, busca-se analisar a forma de estruturar um conhecimento que se
pretende ser reconhecido como cientfico (DEMO, 1985). Gomes (1996), por sua vez,
define a metodologia como o estudo analtico e crtico dos mtodos de investigao e
de prova ou como descrio, anlise e avaliao crtica dos mtodos de investigao.
Em sentido restrito, a metodologia tem como principal tarefa demarcar o que e
o que no uma produo cientfica, oferecendo critrios e parmetros para a
elaborao de projetos e pesquisas. Em sentido amplo, possibilita o questionamento
crtico e auto-crtico do fazer cincia, destacando suas limitaes, estabelecendo seus
pressupostos e avaliando suas conseqncias. A partir da anlise metodolgica pode-
se inferir o que possvel dizer sobre o que foi estudado (em qual nvel de
generalizao, de profundidade e de extenso) e o que no cabvel, dado o percurso
feito na pesquisa. Pelo seu exame podemos reconstituir as escolhas feitas pelo
pesquisador e a partir da tambm criticar suas hipteses explicativas. A anlise
metodolgica desconstri a idia de uma cincia automatizada porque nos apresenta
as decises e as ferramentas do cientista social na realizao de sua pesquisa,
possibilitando compreender sua relao com a cincia, bem como viabilizando a
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superao do conhecimento com base no senso comum por um conhecimento
sistematizado.
A metodologia, por ltimo, est conformada por procedimentos ou mtodos para
a construo da evidncia emprica. Esta se apia nos paradigmas, e sua funo na
investigao discutir os fundamentos epistemolgicos do conhecimento.
Especificamente, se reflete acerca do papel dos valores, a idia de causalidade, o papel
da teoria e sua vinculao com a evidncia emprica, o recorte da realidade, os fatores
relacionados com a validez do estudo, o uso e o papel da deduo e a induo,
questes referentes verificao e falsificao, e os contedos e alcances da
explicao e interpretao. Nas Cincias Sociais existem dois tipos de metodologias:
qualitativas e quantitativas, cada uma com diferentes pressupostos tericos e
procedimentos para obter a evidncia emprica.
No uso cotidiano, a noo de metodologia aparece vinculada a de mtodos.
Entretanto, como dissemos, a metodologia trata da lgica interna da investigao, os
mtodos constituem uma srie de passos que o investigador segue no processo de
produzir uma contribuio ao conhecimento (DIESING, 1971:1). O mesmo autor
utiliza tambm o conceito de pautas de descobrimento, na medida em que os
mtodos so diferentes e se entrecruzam sempre. Por exemplo, o mtodo
experimental, a enquete, bem como os usos de tcnicas estatsticas de anlise, so
utilizados no marco de uma metodologia quantitativa, enquanto que as entrevistas
(interpretativas ou etnogrficas), a observao, a narrativa e a anlise de discurso so
utilizadas em estratgias qualitativas (SAUTU et al., 2005).
Dados de pesquisas qualitativas so considerados pelos fenomenologistas como
uma melhor fonte de avaliao ou relao entre conceitos do que observao emprica.
Os fenomenologistas acreditam que por meio da observao da essncia do
fenmeno social ao invs das aparncias que se consegue decodificar o fenmeno e
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aprofundar nosso conhecimento a respeito dele. Para avaliar a diferena entre a
observao fenomenolgica e a observao emprica, Bruyn (1966) prope o seguinte
quadro :
Quadro 1- Diferenas entre a observao fenomenolgica e a observao emprica
Observao fenomenolgica Observao emprica
1) Investigao e fenmenos especficos sentem concepes prvias a respeito de sua natureza.
Investiga fenmenos especficos a partir de concepes prvias definidas (hipteses) sobre sua natureza.
2) Observa o fenmeno que aparece na conscincia
Observa fenmenos que aparecem aos sentidos.
3)Procura semelhanas entre fenmenos com base no critrio da conscincia; distingue a essncia bem como o essencial das relaes de maneira intuitiva.
Procura semelhanas e diferenas entre o que observado e o que est definido operacionalmente, distingue correlaes estatisticamente.
4)Explora como se constituem os fenmenos na conscincia enquanto continuam a no ter concepes prvias em relao sua natureza.
Explora como os fenmenos se constituem na razo relativa s tipologias sociais.
5)Examina significados ocultos que podem ser descobertos por meio de aplicao de concepes ontolgicas da realidade.
Examina que significados ocultos podem ser descobertos por meio da aplicao de concepes tericas da ao social.
Fonte: Bruyig, 1966
Mesmo assim, a metodologia muitas vezes confundida com os mtodos de
pesquisa utilizados num projeto. Mtodos so simplesmente tcnicas ou procedimentos
usados para coletar e analisar dados. Tal confuso pode ser atribuda ao fato de que a
metodologia se preocupa com a lgica, as potencialidades e as limitaes de mtodos
de pesquisa.
O mtodo, por sua vez, refere-se ao procedimento ou conjunto de procedimentos
essenciais para se alcanar os objetivos propostos na pesquisa. O aspecto principal do
mtodo diz respeito a tentar solucionar problemas por meio da formulao de
hipteses passiveis de serem testadas. Em outras palavras, constitui-se numa resposta
provisria de um problema ou fato investigado.
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Os mtodos esto assentados em princpios epistemolgicos e metodolgicos.
Razo pela qual, muitas vezes, argumenta-se que no se pode utilizar determinados
mtodos dentro de uma metodologia determinada. Na prtica, na escolha de um
mtodo, respeitam-se os pressupostos da metodologia na qual se enquadra, embora,
na atualidade, existam alguns graus de liberdade, o que permite o uso de tcnicas
quali-quantitativas sem abdicar da metodologia utilizada.
No desenvolvimento cotidiano da pesquisa, sabe-se que toda pesquisa uma
construo terica, na medida em que esta permeia todas as etapas da mesma. O
quadro terico, os objetivos, a metodologia, os mtodos e as fontes utilizadas se
conectam de forma lgica, por meio de uma estrutura argumentativa que tambm
terica (SAUTU et al., 2005, p. 39).
Nessa perspectiva, o ato de pesquisar nas Cincias Sociais envolve um conjunto
de etapas que se entrecruzam permanentemente de maneira lgica e estruturada.
Com o objetivo de tornar mais claras essas articulaes, elaborou-se um esquema que
permite visualizar a conexo entre os elementos constitutivos da pesquisa e o seu
desdobramento no processo de pesquisa social.Quadro 2 A inter-relao entre os
blocos constitutivos da pesquisa
Ontologia
Epistemologia
Metodologia
Mtodos
Fontes
O que h para saber?
O que e como podemos saber sobre isso?
Como podemos adquirir esse conhecimento?
Quais procedimentos
podem ser usados?
Fontes
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Fonte: Grix (2002, p.180).
Um exemplo concreto das Cincias Sociais onde o Quadro 2 pode ser aplicado o
estudo de Capital Social desdobrado em duas dimenses: (a) a perspectiva
apresentada por Putnam (2000) e (b) uma abordagem alternativa.
No que se refere ao aspecto da ontologia, Putnam (2000) acredita na
predisposio inata da pessoa para se envolver em atividades de natureza coletiva.
Desse modo, parte da premissa que o Capital Social fruto de caractersticas
histricas de uma regio, freqentemente da capacidade associativa em redes e da
confiana recproca. fundacionalista na medida em que atribui um valor antecedente
aos aspectos histricos e culturais no fracasso do desenvolvimento democrtico de
uma nao. Na abordagem alternativa, pressupe-se uma abordagem mais
compreensiva, ou seja a pesquisa e realizada com base numa totalidade e num
processo multifatorial.
Quadro 3- Duas abordagens para estudar Capital Social
Abordagem Ontologia Epistemologia Metodologia Mtodos Fontes
Escola
de Putnam
Fundacionalist
a
Positivista Escolha de
Estratgia
Quantitativa
Survey Dados
de Survey
Abordagem
Alternativa
Anti-
fundaciona
lista
Interpretativis
ta
Quantitativo
Qualitativo
Entrevistas
Survey
Idem
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Fonte: Elaborao prpria
Da perspectiva epistemolgica, Putnam considerado positivista, pois acredita na
existncia de uma relao causal entre capital social e democracia. Na perspectiva
alternativa, a epistemologia considerada holstica, pois leva em conta a totalidade do
fenmeno, portanto, caracterizada como interpretativa ou compreensiva. Decorrente
desses posicionamentos epistemolgicos, a metodologia de Putnam de natureza
quantitativa, enquanto que no lado oposto, a metodologia de carter qualitativo.
Os mtodos utilizados, nesses contextos, so diferentes. Para Putnam, a
pesquisa ou opinio pblica survey o preferido, enquanto na perspectiva alternativa o
mtodo adequado o que utiliza entrevistas em profundidade, no estruturadas, e
somente em lugar secundrio a pesquisa de opinio.
Finalmente, os dados para respaldar as hipteses ou questes de pesquisa das
duas abordagens tambm so diferentes. Putnam utiliza os dados quantificados e que
se constituem em bancos de dados, enquanto na abordagem alternativa, os dados
resultam, em primeiro lugar, de entrevistas em profundidade, e em segundo lugar, de
pesquisas de opinio.
So essas consideraes que entram em jogo no processo inicial de pensar um
projeto de pesquisa, sendo que a prxima etapa a de refletir a respeito do que
significa pesquisar e pesquisa nas Cincias Sociais. este o tema do prximo captulo.
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CAPTULO 2
O que significa pesquisa e pesquisar nas Cincias Sociais
Uma avaliao geral da estrutura curricular da maioria das universidades mostra
que, de maneira geral, o campo das Cincias Sociais est assentado em duas linhas:
(1) teoria e, (2) mtodos de pesquisa. Este tipo de organizao, ao longo do tempo,
tem gerado a idia equivocada de que teoria e mtodo so independentes entre si e
que a sua integrao somente vivel num nvel elevado de abstrao. Tal
posicionamento tem produzido um pensamento entre os futuros pesquisadores das
Cincias Sociais a respeito de estudo da teoria e mtodo, em que so vistos como
aspectos desconexos, levando-os a optar por disciplinas ou de teoria ou de mtodo. A
conseqncia prtica tem sido de que freqentemente disciplinas de mtodos so
vistas com desconfiana, na medida em que os alunos esto convencidos que esta
disciplina menos relevante e mais difcil do que matrias tericas. Em muitos casos,
no fosse pelo fato de que estes cursos so obrigatrios, muitos estudantes os
evitariam a qualquer custo.
Na atualidade, constata-se que teoria e mtodo so inseparveis. Todo recurso
humano na rea das Cincias Sociais deve ser, ao mesmo tempo, terico e
metodlogo. Todo e qualquer conhecimento resultado da integrao dessas duas
dimenses. Embora em muitos casos teoria e mtodo sejam disciplinas ministradas
separadamente, um bom pesquisador desenvolve a habilidade de integr-los na
anlise dos fenmenos sociais. Quanto mais o futuro pesquisador domine esses
aspectos, maiores e melhores as possibilidades de avaliar ou tomar decises com base
em pesquisas realizadas por outros. Neste sentido, do ponto de vista da montagem de
uma pesquisa, o grfico a seguir diagrama a relao recproca dessas dimenses.
Quadro 4 - O contexto dinmico da pesquisa
Dados Informaces sobre o mundo emprico
Teoria Explicaes lgicas sobre o mundo emprico
Mtodo Formas de obter informaes teis para explicaes de fenmenos sociais.
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Fonte: Elaborao prpria
Ao contrrio do que o senso comum sugere, fatos nas Cincias Sociais no falam
por si mesmos. A explicao dos fenmenos sociais se torna significativa quando se faz
uma anlise dentro de molduras tericas. Desse modo, necessrio organizar os fatos,
analis-los sistematicamente, submet-los a testes de validade e avaliar,
posteriormente, as implicaes desses fatos na construo de conhecimento e a
relevncia para, por exemplo, o desenvolvimento social do pas. Tal tarefa sinaliza para
a necessidade de o pesquisador dominar e saber integrar teoria e mtodo. Desse
modo, precisamos definir o significado de pesquisa nas Cincias Sociais.
No incomum que o aluno iniciante considere a pesquisa uma tarefa abstrata e
complicada. Tal pensamento, em minha opinio, normal, pois o que desconhecido
pressupe o domnio de algumas habilidades, e pode gerar um pouco de temor.
Entretanto, na medida em que o futuro pesquisador compreende e comea a
sistematizar as diferentes etapas de um projeto de pesquisa e, na prtica, aplica esses
ensinamentos, desmistifica a sua aparente complexidade. De maneira sinttica, um
projeto de pesquisa tem uma estrutura bem conhecida: incio, meio e fim. Os filsofos
costumavam utilizar o termo raciocnio lgico para caracterizar o processo de
pesquisa.
Toda e qualquer pesquisa est baseada em pressupostos sobre como o mundo
percebido (ontologia) e como melhor compreend-lo (epistemologia). Nas Cincias
Sociais, a forma como o mundo decodificado e entendido se d com base em linhas
disciplinares: Sociologia, Antropologia, Cincia Poltica, Filosofia, entre outras. Do
ponto de vista do chamado mtodo cientfico, duas escolas filosficas se destacam a
este respeito: o positivismo e o ps-positivismo, as quais so importantes para a
pesquisa social contempornea. Isso no significa que no se leve em conta a
importncia de outras perspectivas, tais como: relativismo, subjetivismo,
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hermenutica, desconstrutivismo, feminismo, entre outros. O que se quer ressaltar
que a forma como se faz pesquisa segue um conjunto de regras que se aplicam a
qualquer rea.
Pesquisa social
De maneira geral, a pesquisa se materializa quando o cientista social identifica
um problema, e se prope a buscar solues para o mesmo. Pensando nesses termos,
a pesquisa diz respeito construo de conhecimento original dentro de um conjunto
de regras e princpios denominados de cientficos. Tal conhecimento pode ser de ordem
terica ou emprica, embora uma no esteja dissociada da outra. De fato, a pesquisa
precisa ser sempre de natureza terico-emprica, pois o trabalho emprico sempre
feito com base no conhecimento da realidade e na epistemologia que a explica. Nessa
direo, Sautu el al. (2005, p.34) definem a pesquisa social como uma forma de
conhecimento que se caracteriza pela construo de evidncia emprica elaborada a
partir da teoria aplicando regras explicitas de procedimento. Com base nessa definio
se pode inferir que em toda pesquisa esto presentes trs elementos que se articulam
entre si: marco terico, objetivos e metodologia.
De acordo com Gomes (1998), fazer pesquisa no significa simplesmente coletar
dados, mas fundamentalmente, coletar dados e analis-los luz de uma teoria, um
mtodo, revelando uma organicidade entre a pergunta formuladora e a realidade
abordada(p. 9).
Nesse sentido, o processo de pesquisa um conjunto de operaes sucessivas e
distintas, mas interdependentes, realizadas por um ou mais pesquisadores, a fim de
coletar sistematicamente informaes vlidas sobre um fenmeno observvel para
compar-lo ou compreend-lo. um trabalho complexo que rene diferentes
competncias (escrever, sistematizar, analisar), organizao pessoal e domnio de
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tcnicas especializadas (documentao, instrumentos de pesquisa, etc.) (CHIZZOTTI,
1998, p. 35). Para alguns pesquisadores, a pesquisa definida como uma atividade
voltada para a soluo de problemas, por meio da descoberta de respostas para
perguntas por meio da utilizao de processos cientficos (CERVO E BERVIAN, 1972,
p.65).
A este respeito, Demo (1985, p. 103) argumenta que:
o conceito de pesquisa designa, de modo geral, o trabalho de produo de conhecimento, incluindo sempre a idia velada de que a produo no seria meramente repetitiva, mas produtiva, ou seja, investigadora original. Ao usarmos aqui o termo relativo pesquisa social, queremos acentuar que nos interessa o quadro mais especfico da pesquisa diretamente ligada a uma preocupao emprica, que nos parece ser o caso mais importante, metodologicamente considerando. Dentro dessa tica, desejamos ressaltar a problemtica fundamental que normalmente aparece no quadro do teste de uma hiptese. Ainda que a base emprica seja sempre muito mais problemtica, porque depende intrinsecamente de sua alocao terica, no h meios de preconizarmos a fuga dela como teste das teorias. Ou seja, a base emprica essencial para a demarcao cientfica delas, mesmo que servisse apenas para falsificar, no para verificar. Ao estudarmos o relacionamento metodolgico entre teoria e empiria, no se trata nunca de secundarizarmos uma ou outra, mas de enquadrarmos teoricamente suas funes especficas dentro da pesquisa, que, por suposio nossa, no existe sem os dois elementos.
No campo das Cincias Sociais, a pesquisa social um processo, entendido como
uma prtica profissional, dirigida especificamente para a produo e comunicao de
conhecimentos, desenvolvida dentro de um marco de prticas e tradies que
permitem reconhec-la como tal (BRUNNER E SUNKEL, 1993)
Conceituada dessa maneira, a pesquisa social, enquanto especialidade
profissional, requer o domnio das diferentes etapas que fazem parte dela. Para ser um
pesquisador competente, portanto, preciso ter um treinamento formal que capacite
os profissionais das Cincias Sociais a exercer a referida atividade.
A pesquisa sistemtica e cientfica busca ir alm do senso comum e se orienta
na direo de produzir conhecimento no-cotidiano. Trata-se, portanto, de uma
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capacitao terico-tcnica direcionada para decodificar, compreender, explicar e
intervir nos fenmenos sociais estudados. Dessa forma, um pesquisador social precisa
conhecer e dominar as tradies metodolgicas de sua rea, bem como operacionalizar
prticas que o habilitem a dar respostas cientficas aos fenmenos sociais. esta a
essncia da pesquisa social.
Uma caracterstica fundamental que decorre do ato de pesquisar a habilidade
do pesquisador em comunicar os resultados do seu trabalho para um pblico mais
amplo. A este respeito, Blalock (1970) j alertava que os cientistas sociais, de maneira
geral, parecem no ter se esforado para comunicar claramente sobre o que a sua
pesquisa trata. Para o autor, a maior parte de artigos de revistas especializadas esto
escritos de forma excessivamente tcnica ou numa direo do que convencionou
chamar de sociologia popular, combinando um estilo jornalstico com quase uma
tentativa deliberada de evitar informar ao leitor sobre o que a pesquisa examina,
passando a idia de que uma atividade muito simples ou desnecessria.
Desse modo, pode-se afirmar que, de maneira geral, a percepo de que as
Cincias Sociais nada mais so do que uma verso melhorada do senso comum
continua a permear o meio acadmico. Propor regras mais sistemticas de anlise dos
fenmenos sociais, nesse contexto, geralmente enfrenta resistncias no s por parte
das cincias duras, por exemplo, mas da prpria comunidade de cientistas sociais que
aderem freqentemente ao princpio de que os fenmenos sociais unicamente fazem
sentido por meio do envolvimento do pesquisador no contexto estudado ou, por outro
lado, via procedimento rgidos. Naturalmente, esses posicionamentos devem se
relativizados, pois independente do mtodo que o pesquisador deseje utilizar, algumas
prticas norteadoras e organizativas so necessrias.
Mas em que consistem essas prticas e tradies aceitas no meio acadmico
como necessrias para a pesquisa social?
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De acordo com Brunner e Sunkel (1993):
Em primeiro lugar, trata-se -como j vimos- de prticas explicitamente organizadas para produzir conhecimento. Segundo, essas prticas, assim dirigidas, supem o uso de um determinado instrumental de produo. Terceiro, esse instrumental consiste em conceitos e mtodos que a tradio foi selecionando e consagrando, como os conceitos e mtodos que devem ser empregados quando se deseja realizar uma prtica reconhecida de investigao social. Quarto, o ncleo mais formalizado desses conceitos e mtodos provido de um tipo peculiar de tradies conceituais e metodolgicas, encarnadas em especialistas profissionais, que chamamos de disciplinas, as quais definem, por si, tambm o ncleo mais formalizado do que se entende por investigao social. Quinto -no entanto- a investigao social como prtica profissionalizada vai mais alm do crculo das disciplinas, at abarcar uma multiplicidade de atividades que tm em comum: (i) uma finalidade explicitamente produtiva de conhecimentos; (ii) uma referncia (por mais solta que seja) a conceitos e/ ou mtodos que servem para analisar (explicar, interpretar) a realidade social; (iii) a pretenso de produzir conhecimento no-cotidiano e, por ltimo, (iv) alguns agentes que desenvolvem uma atividade contnua em torno do uso desses conceitos e mtodos (frouxamente definidos), sendo reconhecido o resultado de seu trabalho como algo que permite conhecer melhor (iluminar em um sentido no-cotidiano) a realidade social. Neste ltimo sentido se diz, por exemplo, que certas novelas tm o carter de uma verdadeira investigao social ou, com maior razo ainda, que o ensaio produz conhecimento no-cotidiano sobre a sociedade, ainda que se separe dos cnones conceituais e metodolgicos comumente aceitos por uma comunidade disciplinar.
A palavra social diz respeito pesquisa que produz conhecimentos sobre a
sociedade, alm do senso comum. Em sentido restrito, trata-se daquelas prticas de
investigao que se enquadram -e so reconhecidas como tais- dentro do campo das
disciplinas chamadas Cincias Sociais. Nesta rea o que considerado como
investigao se materializa, por exemplo, na comunicao e na publicao dos
resultados produzidos por um estudo. E esses resultados precisam ter uma
intersubjetividade acadmica.
Definida nesses termos, a pesquisa social envolve prticas e resultados diversos
que podem ser sintetizados da seguinte forma:
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Um estudo sobre o carter cientfico de uma investigao. Um estudo de alguma teoria nas Cincias Sociais. Um estudo emprico sobre qualquer aspecto da realidade social. Uma enquete de opinio. Uma descrio conceitual e metodologicamente organizada de um fenmeno